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TÉCNICAS E LINGUAGENS Rafael Sbeghen Hoff S a SOLUÇÕES INTEGRADASFotografia e seus aspectos simbólicos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir semiologia e sua aplicação na fotografia. Identificar elementos conotativos e denotativos da fotografia. Reconhecer a intencionalidade da fotografia. Introdução Leitura é mais do que identificar aquilo que é visível, trata-se de entender e produzir sentido. Esse exercício mental articula experiências anteriores, elementos culturais e capacidade criativa dos sujeitos. Assim, a leitura de imagens é um processo de significação complexo e de fundamental importância para quem produz imagens profissionalmente. Neste capítulo, você vai ver, a partir dos conceitos de semiologia, que é possível identificar níveis diferentes de leitura da imagem. Além disso, vai reconhecer pistas do ponto de vista de quem produz a imagem sobre um determinado tema ou quais referências um fotógrafo utiliza para compor seu discurso. Por fim, identificando a intencionalidade contida em cada imagem, poderá fazer uma leitura crítica sobre próprio trabalho e sobre campo da fotografia a partir de um olhar que mescla elementos técnicos e teóricos para orientar as produções. Elementos básicos de semiologia Semiologia advém do termo grego sêmion, que significa "signo". Pela semio- logia, a palavra assume o sentido de uma teoria dos signos ou dos sentidos e dos processos interpretativos em na sociedade. Já o termo semiótica é usado de forma análoga para uma teoria geral dos signos e suas relações no pensamento,2 Fotografia e seus aspectos simbólicos mas a partir de uma outra vertente de autores (Pearce, Eco e outros). Neste capítulo, teremos como base teórica os conceitos do francês Roland Barthes e, portanto, o termo utilizado a seguir será semiologia. Saiba mais Semiologia se difere de semiótica com base nas proposições teóricas e conceituais de pesquisadores como Charles Sanders Peirce e, no Brasil, de Lucia Santaella. Na prática, os pontos divergentes entre as teorias se encontram na conceituação de signo e como ele se articula com outros elementos no processo de significação. Ambas as perspectivas têm como matriz os estudos linguísticos. No caso do fotojornalismo, conhecer as relações entre aquilo que compõe a imagem e os processos de decodificação da mensagem visual contribui para a reflexão e para a prática profissional. A partir do uso de signos, o articula elementos para direcionar, tanto quanto possível, os processos de leitura e de entendimento das mensagens a partir da composição fotográfica. No texto de Barthes (2001) intitulado A cozinha dos sentidos, o autor explica a forma como a leitura dos signos que nos rodeiam impacta a nossa vida. autor francês enfatiza que as pessoas estão o tempo todo realizando a atividade mental de ler o mundo que as cerca, extraindo daí sentidos e significados, seja de peças de vestuário, manchetes de jornal, anúncios publicitários em um outdoor, um filme, uma música ou os gestos de um casal de namorados. Tudo é passível de leitura por se tratar de linguagem, constituída a partir de signos. semiólogo explica o processo: [...] tal carro me diz o status social do proprietário, tal roupa me diz exatamente a dose de conformismo ou de excentricidade do seu portador, tal aperitivo (uísque, pernod ou vinho branco com cassis), o estilo de vida do meu hóspede. Mesmo quando se trata de um texto escrito, é-nos continuamente proposta uma segunda mensagem nas entrelinhas da primeira: se leio, em manchete com letras garrafais: Paulo VI tem medo, isso quer dizer também: se você lerFotografia e seus aspectos simbólicos 3 a continuação, saberá por quê. Todas essas "leituras" são importantes demais na nossa vida, implicam demasiados valores sociais, morais, ideológicos para que uma reflexão sistemática não tente assumi-Ias: é essa reflexão que, por enquanto pelo menos, chamamos de semiologia (BARTHES, 2001, p. 177-178). A semiologia, segundo o autor, trata de encontrar um elemento comum a todas essas expressões de linguagens e unificá-las sob o tratamento científico por meio daquilo que ele chama de sentido. Em outras palavras, Barthes (2001, p. 179) diz que a função dessa ciência é "[...] estudar essa operação misteriosa pela qual uma mensagem qualquer se impregna de um sentido segundo, difuso, em geral ideológico, a que se chama 'sentido conotado". Fique atento Conotação: sentido ampliado pela articulação entre vários signos, que toma forma e expressão pelo uso, pelo contexto e pela articulação com outros discursos; a mensagem sem código. Denotação: sentido restrito do signo utilizado a partir de um sistema de significantes em relação direta a esse sistema; a mensagem com código. estudioso de Barthes e pesquisador brasileiro Rodrigo Fontanari (2016, documento on-line) amplia as explicações dos dois conceitos semiológicos: A denotação refere-se ao sentido usual ou literal que é dado a uma determinada palavra ou significante, enquanto a conotação é a capacidade que o signo linguístico tem de receber novos significados que acoplam ao seu sentido original em decorrência do seu uso pelos falantes da língua, como se fossem notas, anotações. o termo co-notar, notar duas vezes. Esses conceitos são facilmente identificáveis em fotografias como a da Figura 1, registrada por Alfred Eisenstaedt e imortalizada pela revista norte- -americana Life, em 1945.4 Fotografia e seus aspectos simbólicos Figura 1. O Beijo - Alfred Fonte: Ballard documento Na imagem, o sentido denotativo é o que a figura mostra, ou seja, um casal formado por um homem vestido como um marinheiro beijando uma mulher (identificada em 1970 como Edith Shain) em uma rua movimentada de um centro urbano. A conotação amplia o sentido da imagem, uma vez que o ano é 1945 e o beijo remete às comemorações pelo fim da Segunda Guerra Mundial. homem, então, torna-se um signo que remete a todos os jovens convocados à guerra naquele período. A mulher da fotografia remete a todas as pessoas que aguardavam pelo fim da guerra para ver o retorno de irmãos, pais, amigos ao seu convívio. beijo, por fim, traz à leitura da imagem o sentido de prazer, felicidade, celebração. Dessa maneira, a fotografia de Alfred registra mais do que um encontro casual entre dois jovens e passa a significar o fim da guerra, o alívio das famílias que aguardavam os jovens retornarem do front e um ponto de vista dos vitoriosos sobre o período. Na obra Elementos de Semiologia, também de Roland Barthes (2006), são explicados os elementos básicos da semiologia: signo, significado e signifi- cante. como já foi dito, é tudo aquilo colocado no lugar de outra coisa para referenciá-la.Fotografia e seus aspectos simbólicos 5 Cabe, então, conceituar os outros dois elementos. Quando explica o significado, Barthes (2006) parte da linguagem e da linguística para falar sobre as formas de expressão e comunicação entre as pessoas. autor diz que toda linguagem se utiliza de signos, que, quando postos em relação de acordo com regras e códigos compartilhados entre os interlocutores, formam um sintagma. A partir dos sintag- mas, ou seja, da formação de sentido sobre os corpos de signos articulados dentro de um processo comunicativo, ele explica a formação do significado: Esses corpos de significados implicam, por parte de consumidores de sistemas (isto é, "de leitores"), diferentes saberes (segundo as diferenças de "cultura"), o que explica uma mesma lexia (ou grande unidade de leitura) possa ser dife- rentemente decifrada segundo os indivíduos, sem deixar de pertencer a certa "língua"; vários léxicos e, portanto, vários corpus de significados podem coexistir num mesmo indivíduo, determinando, em cada um, leituras mais ou menos "profundas" (BARTHES, 2006, p. 50). Em uma aplicação prática desse conceito, podemos imaginar a imagem de um punho cerrado, em um enquadramento fechado (plano de detalhe), com o fundo borrado (sem profundidade de campo). Para um leitor envolvido com questões políticas e sindicais, a imagem pode produzir a significação de luta, de reivindicação por direitos dos trabalhadores, um protesto. Para outra pessoa, a mão erguida pode remeter ao voto, a um passo de dança ou, ainda, à letra A da linguagem de sinais. Portanto, podemos entender que o significado depende do contexto cultural de quem a imagem. O reforço sobre o processo de leitura e dos significados implica, na lógica de Barthes, o entendimento sobre as partes do processo. Se, de um lado, temos o significado, de outro, temos o significante: é a parte material do significado, usado para referenciar algo que não é ele em si mesmo. "Tudo o que se poderia dizer do significante é que este seria um mediador (material) do significado" (BARTHES, 2006, p. 52). Outra vez, na tentativa de exemplificar, vamos pensar em uma aplicação prática. Uma bandeira de um país não é o país em si, mas remete a ele. Esse elemento físico (bandeira) está no lugar do território, da cultura, das pessoas e da política de um país. A bandeira é um significante do signo país, que tem por significado os elementos descritos.6 Fotografia e seus aspectos simbólicos Entre o significante e o significado de um signo, existe um processo de com- paração, aproximação e relação sobre essas partes, o que o teórico chama de significação. "A significação pode ser concebida como um processo; é o ato que une o significante e o significado, ato cujo produto é o signo" (BARTHES, 2006, p. 51). A significação é marcada por questões de um tempo e um lugar específicos, onde estão inseridos o locutor e o interlocutor de um processo comunicacional. A leitura da Figura 2 pode facilitar o entendimento do conceito de sig- nificação. Para uma pessoa que nasceu nos anos 1970 no Brasil e viveu, na década de 1990, o processo de impeachment do então presidente Fernando Collor de Melo, o rosto pintado com as cores da bandeira do país simboliza um processo de exercício de cidadania e austeridade política. Figura 2. Cara pintada. Fonte: Prostock-studio/Shutterstock.com Para alguém que nasceu na década de 1980 e viveu nos anos 2000 a Copa do Mundo, a mesma imagem pode remeter à torcida organizada pela seleção brasileira na competição. Assim, percebe-se que a leitura da imagem depende do contexto, ou seja, do lugar e do tempo em que se encontra o decodificador da mensagem (ou a quais elementos sócio-histórico-culturais ele tem acesso) durante o processo de significação.Fotografia e seus aspectos simbólicos 7 Se um signo linguístico é arbitrário de início, pela significação, ele pode adquirir outros significados. Assim, Barthes (2006, p. 53-54) abre a classifi- cação dos signos a partir da significação para as seguintes classes [...] diremos que um sistema é arbitrário quando seus signos se fundam não por contrato mas por decisão unilateral: na língua, o signo não é arbitrário, mas o é na moda; e diremos que um signo é motivado quando a relação entre seu significante e seu significado é analógica, [...] poderemos ter então sistemas arbitrários e motivados; outros não-arbitrários e imotivados. Desse modo, fica mais fácil entender como uma bandeira é um signo arbitrário de um país, ou seja, alguém elegeu que a bandeira seria "esta" e não "aquela", de maneira unilateral, e, a partir dessa convenção, foi adotada pelos demais integrantes daquele processo comunicacional. Para o autor, existem quatro tipos de sistemas de significação: motivados, imotivados, arbitrários e não arbitrários (Quadro 1). Quadro 1. Sistemas de significação Motivados Imotivados Relação de correspondência Relação de correspondência sem por analogia, ou seja, pelo signo analogia, ou seja, signo não parecer-se com significante. tem relação com significante. Exemplo: o desenho de um tubarão Exemplo: o silvo do apito de em uma placa na praia apontando um guarda de trânsito para que aquela é uma área de ocor- indicar que o motorista deve rência de ataques de tubarões. parar ou seguir em frente. Arbitrários Não arbitrários Decisão unilateral de correspon- Correspondência dada por con- dência entre signo e significante. dições sociais e participativas Exemplo: a do uniforme dos entre locutor e interlocutor. funcionários de uma fábrica indi- Exemplo: o entardecer como cando a qual setor eles pertencem. sinalização do término do expe- diente de trabalho no campo.8 Fotografia e seus aspectos simbólicos Barthes aponta, ainda, que toda ciência pode, em resumo, ser tratada como metalinguagem dos seus objetos de estudo. "A noção de metalinguagem não deve ficar restrita às linguagens científicas; quando a linguagem articulada, em seu estado denotado, se incumbe de um sistema de objetos significantes, constitui-se em 'operação', isto é, em metalinguagem" (BARTHES, 2006, p. 98). Exemplo Quando um livro fala de literatura, um filme mostra como se faz cinema, um programa de rádio trata de jornalismo radiofônico, quando um artigo científico registra estado da arte de um campo ou área de estudo ou quando uma fotografia mostra fotografias e ato de ler imagens, esses elementos configuram metalinguagem. A partir das conceituações, Barthes (2006), em suas análises em busca de desconstruir e tornar acessíveis esses conhecimentos, aplicou parte deles à leitura das fotografias. É disso que trataremos no tópico a seguir. Semiologia e a fotografia Na obra A câmara clara, Barthes (1984) define três elementos básicos do processo de construção imagética: o fotógrafo (Operator), o leitor da imagem (Spectator) e o assunto a ser fotografado (Spectrum). Em suas palavras, a imagem tem o poder de perenizar e trazer os mortos de volta à relação com os vivos. Em uma construção textual que flerta com a poesia, fala que o sujeito que se deixa fotografar é transformado em objeto, ou seja, morre como sujeito na fotografia. É a partir dessas digressões que o autor vai formulando suas questões e sensibilizações a respeito da imagem fotográfica. Apresentando outros conceitos de semiologia aplicados à produção fo- tográfica, tratamos agora das categorias de Punctum e Studium de Barthes, também explanadas no livro A câmara clara. Quando escreve sobre as imagens fotográficas, o autor relata que algumas dessas são consumidas de forma passageira, sem se fixarem diante do olhar. Porém, algumas imagens provocam- -no a ponto de que se detenha diante delas. No processo de significação, ele divide e classifica essas imagens especiais em dois tipos: Punctum e Studium.Fotografia e seus aspectos simbólicos 9 As do primeiro tipo, Punctum, são definidas como imagens que possuem algo no enquadramento, um elemento (ou um conjunto deles) na composição que parece "saltar" da imagem e atingi-lo como uma flecha, uma punção. Essas imagens provocam afetos como desconforto ou prazer a partir daquilo que mostram. De outro lado, ele classifica as imagens do tipo Studium, que também provocam o processo de significação, mas não a partir de algo específico na imagem, e, sim, a partir do diálogo que ela provoca com as experiências, os traumas, a cultura do espectador. Para Barthes, essa significação se dá em um outro lugar para além da imagem. Reconhecer o studium é fatalmente encontrar as intenções do entrar em harmonia com elas, aprová-las, desaprová-las, mas sempre compreendê-las, discuti-las em mim mesmo, pois a cultura (com que tem a ver o studium) é um contrato feito entre os criadores e os consumidores. Studium é uma espécie de educação (saber e polidez) que me permite encontrar o Operator, viver os intentos que fundam e animam suas práticas, mas vive-las de certo modo ao contrário, segundo o meu querer de Spectator (BARTHES, 1984, p. 48). Em sua crítica à fotografia nesse livro, o semiólogo aponta que a teatrali- zação diante da lente do fotógrafo é o que torna a prática fotográfica uma arte. "Por mais viva que nos esforcemos por concebê-la (e esse furor de 'dar vida' só pode ser a denegação mítica de um mal-estar de morte), a Foto é como um teatro primitivo, como um Quadro Vivo, a figuração da face imóvel e pintada sob a qual vemos os mortos" (BARTHES, 1984, p. 53-54). Esse pensamento expressa o poder que a fotografia exerce em trazer à presença e ao conhecimento dos vivos elementos que não se modificam, não expressam um grau mínimo de imprevisibilidade e pulsação que caracteriza os seres vivos. Poeticamente falando, a fotografia, segundo Barthes, inerte, é a expressão de algo que nunca mais será do jeito que ela nos apresenta, assim como, se entrarmos duas vezes em um rio, ele nunca será o mesmo. Uma pessoa nunca mais terá aquele tempo de vida pois, no mínimo, estará segundos mais velha do que a fotografia mostra. A partir da forma como são produzidas ou consumidas as imagens, podemos ampliar os sentidos dos discursos imagéticos ou ancorá-los a situações marcadas em um determinado tempo e espaço. De qualquer maneira, como linguagem, Barthes (1984, p. 62) afirma: "No fundo, a Fotografia é subversiva, não quando aterroriza, perturba ou mesmo estigmatiza, mas quando é pensativa".10 Fotografia e seus aspectos simbólicos Intencionalidade e a fotografia "Fotografar é colocar na mesma alça de mira o olho, a cabeça e o coração". Essa frase é atribuída a Henri Cartier-Bresson (1908-2004), importante fotógrafo francês e um dos pioneiros da fotografia de rua, e reforça a ideia de que o ao praticar o ato fotográfico, trabalha com a sensibilidade sobre o instante e aquilo que se coloca diante do olho e da câmera, assim como com os afetos, os lugares de fala, as experiências, a ética que lhe são próprios e que o conduzem a uma abordagem específica sobre o tema. Mesmo escolhas técnicas que parecem sem grande importância podem afetar a forma como se uma imagem. Dois exemplos são o ângulo e o enquadramento. No caso do ângulo, existem três possibilidades de registro da imagem: o ângulo reto, em que a câmera é colocada na linha dos olhos e a perspectiva da imagem é a de uma pessoa, de pé, diante do assunto; o ângulo alto (plongée, que em francês significa "mergulho"), quando a perspectiva do "olhar" da câmera é de cima para baixo; o ângulo baixo (contra-plongée), quando a câmera é colocada abaixo da linha dos olhos, permitindo visualizar o assunto de cima para baixo. Quando a câmera assume um ângulo alto, torna o assunto distante do espectador, como se esse assumisse um ponto de vista do onisciente e onipre- sente, que assiste a tudo sem interferir. Já quando a câmera toma o assunto em ângulo baixo, torna-o onipotente, forte e grandioso ao olhar do espectador. Não é a à que a história afirma: Hitler, um homem de baixa estatura para a média orientava que seus optassem pelo ângulo baixo para apresentá-lo sempre como um grande estadista (Figura 3).Fotografia e seus aspectos simbólicos 11 Figura 3. Adolf Hitler Segunda Guerra Mundial Fonte: Everett No caso dos enquadramentos, acontece o mesmo impacto sobre a significa- ção e influência sobre a linguagem cinematográfica, por exemplo. É por meio da fotografia que se percebem planos ou enquadramentos mais fechados, que mostram o personagem bem próximo, que se reforçam aspectos emocionais e psicológicos do retratado. Por outro lado, planos mais abertos inserem o personagem em um contexto, servindo melhor para descrever a ambientação das cenas ou os locais dos fatos em que os personagens são registrados. Acessar a intencionalidade por trás do ato fotográfico torna-se, então, um jogo de conectar elementos técnicos com elementos culturais e estilísticos. A composição - distribuição e hierarquização dos elementos dentro do plano - fotográfica revela, por vezes, muito mais do que apenas aquilo que mostra. Expressa as escolhas do sobre o que deveria ser fotografado (aquilo que ele elegeu fotografável) e o que ficou fora do enquadramento. Se ampliarmos a leitura de um único fragmento para um conjunto de fotografias, teremos, então, um discurso imagético, revelando posições ideológicas sobre os temas e sobre o próprio ato de fotografar.12 Fotografia e seus aspectos simbólicos Outro importante fotojornalista, Robert Capa (1913-1954), influenciou forte- mente o que conhecemos por fotografia jornalística a partir da cobertura de guerras. Com uma câmera portátil, de filme, com objetivas pouco potentes, registrou, por exemplo, o dia do desembarque dos aliados na costa da Normandia evento conhecido como Dia D que, segundo historiadores, daria início ao processo de vitória contra as tropas nazistas na Segunda Guerra Mundial. A esse profissional é atribuída outra frase de impacto sobre o processo de significação fotográfica: "Se a fotografia não está boa é porque você não chegou perto suficiente". O sentido mais imediato da fala atribuída à Capa é o de que, com lentes pouco potentes (de pequena distância focal 50 mm), fica difícil conseguir foco sobre os assuntos. Assim, é preciso chegar perto (literalmente) para dar visibilidade e legibilidade àquilo que se quer registrar. De outro modo, é possível interpretar que o fotojornalista, para fazer um bom trabalho, precisa "mergulhar" na pauta e apropriar-se do tema para noticiá-lo. Sem essa aproxi- mação, essa apropriação sobre o tema, o profissional corre o risco de registrar apenas a superficialidade dos fatos a partir do senso comum. Exemplo O fotojornalismo esportivo é um exemplo de situação em que precisa apropriar- -se da pauta para, a partir dela, realizar seu trabalho. Em uma partida, a situação daquele evento se impõe à lente como assunto principal. Porém, na ordinariedade cotidiana de treinos táticos e físicos de um time de futebol, se não souber da situação de saúde dos jogadores, históricos de lesão, reconhecer táticas futebolísticas, regras e campeonatos, a fotografia poderá registrar apenas a superficialidade de um treino sem dar a ver as mais específicas e os detalhes mais interessantes à pauta jornalística. Link O Lalo de Almeida fez um vídeo com making of da sua cobertura em dois conclaves (momento em que a Igreja Católica reúne os bispos para a escolha de um novo papa). No vídeo, ele compara as imagens que conseguiu obter e mostra como as condições do evento a ser coberto (locais de acesso, ritualística) restringem trabalho fotojornalístico. A partir dessas imagens, ele propõe que mais interessante para uma redação que paga a um fotojornalista para cobrir um evento desses seja a orientação em busca do exclusivo, do diferencial, do inusitadoFotografia e seus aspectos simbólicos 13 Lalo de Almeida exemplifica que, com lentes mais potentes do que as que dispunha e com um local reservado mais estrategicamente posicionado, os das agências de notícias internacionais conseguiam imagens (que são vendidas ao mundo todo) com maior qualidade técnica e informativa que as dele. Em uma provocação, o autor das imagens sugere que, para encontrar esses elementos diferenciais e exclusivos para jornal em que trabalha, talvez seja importante ter a coragem de voltar as costas para evento e fotografar que ninguém vê: as pessoas que se reúnem na Praça de São Pedro à espera do anúncio de um novo Sumo Sacerdote. Para assistir ao vídeo Conclaves por Lalo de Almeida, acesse link a seguir. A intencionalidade do então, estará expressa com maior clareza ou menos legibilidade conforme o domínio de técnicas fotográficas associadas ao processo de significação que este profissional quer orientar com suas imagens. Sem o domínio dessa linguagem e dessas ferramentas, talvez até seja possível estabelecer uma comunicação, mas, com elas, certamente o processo se dará com menor ruído e maior expressão. É por esse conjunto de razões que a semiologia de Roland Barthes é - a fotografia como linguagem em um processo de comunicação faz uso de signos que buscam orientar processos de signficação. Referências BALLARD, K. Alfred Eisenstaedt: V-J Day at Times Square, New York City. Internatio- nal Cener of Photography, 2019. Disponível em: https://www.icp.org/browse/archive/ objects/v-j-day-at-times-square-new-york-city Acesso em: 4 nov. 2019. BARTHES, R. A aventura semiológica. São Paulo: Martins Fontes, 2001. BARTHES, R. A câmara clara: notas sobre a fotografia. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. BARTHES, R. Elementos de semiologia. 16. ed. São Paulo: Cultrix, 2006. FONTANARI, R. Como ler imagens? A lição de Roland Barthes. Galaxia, n. 31, p. 144-155, 2016. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/gal/n31/1982-2553-gal-31-0144.pdf Acesso em: 4 nov. 2019. Leitura recomendada MOTTA, L. FONTANARI, R. Roland Barthes diante do signo fotográfico. Comunicação & Educação, V. 17, n. 1, p. 31-37, 2012. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/comue- duc/article/view/45436 Acesso em: 4 nov. 2019.14 Fotografia e seus aspectos simbólicos Fique atento Os links para sites da Web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.Encerra aqui trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra.Conteúdo: S a SOLUÇÕES GaH EDUCACIONAIS INTEGRADAS

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