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3Maio/Junho 2025 • ULTIMATO U lti m at o im ag em Experiências de jardim O Cântico das criaturas1, de São Francisco de Assis (1182–1226), o mais antigo poema religioso em lín- gua italiana, está completando 800 anos. O autor estava cego e muito doente quando o escreveu, morrendo um ano depois. Os quatro primeiros versos são uma doxolo- gia semelhante à de Apocalipse 4.8: “Altíssimo, onipotente, bom Senhor, / teus são o louvor, a glória e a honra e toda a bênção. / Somente a ti, ó Altíssimo, eles convêm, / e homem algum é digno de mencionar-te”. As demais estrofes começam com a expres- são “Louvado sejas, meu Senhor”, listando, em seguida, o motivo do louvor: “Com todas as tuas criaturas, especialmente o Senhor Irmão Sol / pela irmã lua e pelas estrelas, / pelo irmão vento, e pelo ar e pelas nuvens e pelo sereno e todo o tempo, / pela irmã água / pelo irmão fogo / pela irmã nossa, a mãe terra”. Esse cântico, com adaptações, está presente na maioria dos hinários usados nas igrejas evan- gélicas, com o título “Vós, criaturas de Deus Pai”. Alguns consideram que esse hino tenha sido inspirado no Salmo 148, um chamado ao louvor cósmico. Mas certamente é também fruto das “experiências de jardim” de seu autor – “Francisco ama todas as criaturas que vê, encontra, com que interage. Ele as vê, não só as olha, contempla-as até exultar e alegrar-se por sua existência ou pre- sença” (Enzo Bianchi).2 “Experiências de jardim” é o selo editorial de Ultimato que acolhe textos ou imagens que nascem a partir da contemplação da criação de Deus, quando nos deparamos com os “ecos de Deus” – “Com seu sopro [Deus] deu beleza aos céus […] Essas são apenas bordas do seu cami- nho, e dele só percebemos um frágil eco. Quem poderia compreender o estrondo do seu poder?” (Jó 26.14). São momentos em que somos tomados por deslumbramento diante da criação e por um enorme sentimento de gratidão e louvor a Deus. Davi é o personagem bíblico que mais regis- trou experiências de jardim. Como Francisco de Assis, ele também escreveu poemas a partir delas. No Salmo 19, Davi fala do testemunho mudo da criação – “Os céus declaram a glória de Deus; o firmamento proclama a obra das suas mãos” (v. 1) – e, em seguida, do testemunho da Lei do Senhor. Juntos, eles produzem em Davi certezas a respeito do Deus Criador e Salvador. No Salmo 104, depois de listar as obras do Criador, o autor exclama: “Que variedade, Senhor, nas tuas obras! Todas com sabedoria as fizeste; cheia está a terra das tuas riquezas” (v. 24). São riquezas de Deus, obras dele, que o tornam excelso, majestoso e com as quais ele próprio se deleita – “E viu Deus que era bom” (Gn 1). Como não admirá-las e reverenciar o seu Criador? É preciso recuperar a capacidade de se espan- tar com a criação. As experiências de jardim apon- tam para o Criador – e para Cristo, “o primogênito da criação, por meio de quem e para quem todas as coisas foram criadas, no qual tudo subsiste” (Cl 1.15-20). Elas nos lembram que a criação geme, mas que ela também está abraçada pela reconci- liação realizada na cruz, e que nossa esperança é de novo céu e nova terra, uma cidade-jardim onde todas as coisas serão feitas novas (Ap 21). E, não menos importante, elas nos inspiram no cuidado do jardim e no envolvimento com boas práticas de cuidado do meio ambiente. Notas 1. Cântico do Irmão Sol. Disponível em bit.ly/413-irmao-sol. 2. O Cântico do Irmão Sol – Francisco de Assis “já não era mais um homem que orava, havia se tornado uma oração viva”. Dis- ponível em bit.ly/413-francisco. Klênia Fassoni, diretora da Editora Ultimato, é avó de quatro netos. ABERTURA 4 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 CARTA AO LEITOR A capa desta edição traz a oração ensinada por Jesus destacando o pedido: “Livra-nos do mal”. O mal e o Maligno existem. E precisamos recorrer a Deus, o nosso Pai, por proteção. Seguindo a tradição edi- torial da revista, não poderíamos deixar de incluir entre os artigos o Antes de amarrar Satanás, amarre a si mesmo, de Elben César (p. 20) e deixar claro que, para nós, essa pequena oração traduz dois pedidos: “Guarda-nos de nós mesmos e do Diabo” (Bíblia A Mensagem). A presença do mal está descrita nas Escrituras. Em Gênesis, um jardim, a árvore do conhecimento do bem e do mal, uma serpente, uma palavra de desconfiança a respeito da bondade de Deus, a desobediên- cia da humanidade e as portas abertas para o sofrimento e a maldade. Nos Salmos, a lembrança do Deus fiel, que guarda os que são seus: “O Senhor te guardará de todo mal; guardará a tua alma” (Sl 121.7). Nos profetas, o ministério dedicado a exortar o povo de Deus a desviar-se do mal: “Buscai o bem e não o mal, para que vivais” (Am 5.14). Do Novo Testamento, como não se lembrar de Paulo confessando: “Não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero, esse faço” (Rm 7.19) e, também, alertando: “A nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os domi- nadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes” (Ef 6.12). E de Pedro e João: “Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar; resisti-lhe firmes na fé.” (1Pe 5.8-9) e “Amado, não imiteis o que é mau, senão o que é bom. Aquele que pratica o bem procede de Deus; aquele que pratica o mal jamais viu a Deus” (3Jo 1.11). Pela 29ª vez Ultimato está apoiando o Mutirão Mundial de Oração por Crianças e Adolescentes Socialmente Vulneráveis, que em 2025 acontecerá de 6 a 8 de junho, com o tema “Vida plena para todas as crianças” (p. 9). Conheça essa iniciativa e participe! Será uma alegria para nós saber o que achou desta edição. Escreva para cartas@ultimato.com.br. Boa leitura! Klênia Fassoni e Ariane Gomes Guarda-nos de nós mesmos e do Diabo ISSN 1415-3165 Revista Ultimato – Ano LVIII – N° 413 Maio/Junho 2025 www.ultimato.com.br Publicação evangélica não denominacional destinada à evangelização e edificação, Ultimato relaciona Escritura com Escritura e acontecimentos com Escrituras. Visa contribuir para criar uma mentalidade bíblica e estimular a arte de encarar os acontecimentos sob uma perspectiva cristã. Pretende associar a teoria com a prática, a fé com as obras, a evangelização com a ação social, a oração com a ação, a conversão com santidade de vida, o suor de hoje com a glória por vir. Circula em meses ímpares Fundadores Elben M. Lenz César Djanira Momesso César Projeto gráfico: Rick Szuecs Diagramação: Ana Cláudia Nunes Impressão: Esdeva Tiragem: 8.000 exemplares Colunistas: Alderi Matos • Carlos “Catito” Grzybowski Carlinhos Veiga • Dagmar Fuchs Grzybowski • Gladir Cabral Marcos Bontempo • Paul Freston • Ricardo Barbosa de Sousa • Valdir Steuernagel Participam desta edição: André Daniel Reinke • Ariane Gomes • Arthur Henrique Soares dos Santos • Christian Gillis • Christopher Wright • Délio Porto • Elben César Emiliano Cambuim • Jony W. de Almeida • Jorge Nelson de Oliveira Júnior • Klênia Fassoni • Rebeca Sousa • Shih Li Li Yoshimoto • William Lacy Lane Publicidade: anuncio@ultimato.com.br Assinaturas e edições anteriores: atendimento@ultimato.com.br Reprodução permitida: Favor mencionar a fonte. Publicado pela Editora Ultimato Ltda., membro da Associação de Editores Cristãos (AsEC) Editora Ultimato Telefone: (31) 3611-8500 Caixa Postal 43 36570-970 — Viçosa, MG EQUIPE ULTIMATO: Klênia Fassoni, diretora geral Emmanuel Bastos, diretor financeiro Marcos Bontempo, diretor editorial Colaboradores: Ro be rt A na sc h Filipe Rodrigues Larissa Fávero Laura Queiroz Lucas Carvalho Lúcia Viana Romilda Oliveira Vanilda Costa Ana Laura Morais Ariane Gomes Bernadete Ribeiro Cristina Pereira Daniel César Érica Oliveira Fábio Freitas 6 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 PASTORAIS JONY W. DE ALMEIDA O choque, a aceitação e a exclamação Ao ler o capítulo 6 do livro bíblico deTRATA DA INFLUÊNCIA SOBRE CRIANÇAS E ADOLESCENTES 27Maio/Junho 2025 • ULTIMATO 28 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 �FAZER TUA VONTADE� Há alguns textos bíblicos que nos fazem companhia fre- quente. Reaparecem de vez em quando. É possível que, à medi- da que você lê estas linhas, algum texto assim pipoque em sua mente. Acontece comigo. Às vezes dife- rentes um do outro, eles vão nos enriquecendo em nossa caminhada de fé. Dois deles voltaram à minha memória quando me preparava para escrever este artigo. Ambos fazem parte de uma longa conver- sa de Paulo em Antioquia da Pisí- dia, lá nos inícios de sua primeira viagem missionária. É importante lembrar que Paulo está falando numa sinagoga, num sábado, e menciona diferen- tes personagens e episódios da histó- ria do povo de Isra- el ao apontar para Jesus, por meio de quem é justificado aquele que crê (At 13.38-39). Em dois momentos diferentes, Paulo faz alusão a Davi, com quem seus ou- vintes estavam familiarizados. Primeiro, Paulo diz que Davi foi uma pessoa segundo o coração de Deus, fazendo tudo segundo a vontade dele (13.22); e, mais adian- te, diz que Davi serviu aos propósi- tos de Deus na sua geração e depois foi sepultado com os seus antepas- sados (v. 36). Essas duas palavras têm me acompanhado faz um bom tempo e voltaram à minha mente diante dos complexos desafios que marcam os nossos dias e lapidam a vivência da nossa vocação hoje. Por um lado, diz Paulo, Davi foi uma pessoa segundo o coração de Deus, e não consigo pensar numa forma mais expressiva do que essa ao se desenhar o que foi a vida de uma pessoa. Ser alguém que vive de acordo com aquilo que Deus es- pera de nós significa, usando uma expressão de Jesus, fazer da vonta- de de Deus a nossa comida, como ele fez (Jo 4.34). É uma comida que alimenta o nosso interior e pauta o nosso exterior. As Escrituras cui- dam para não deixar que fazer a vontade de Deus seja transforma- do em algo abstrato, intimista ou mesmo um ritual, mas se expresse no cotidiano da vida. Há um pro- feta que, como se falasse conosco, diz de forma bem específica que Deus �mostrou a você, ó homem, o que é bom e o que o Senhor exige: Pratique a justiça, ame a fidelidade e ande humildemente com o seu Deus� (Mq 6.8). Se atentarmos para a palavra deste profeta, veremos que ele está condenando tanto meras práticas ritualísticas, como a oferta de mi- lhares de carneiros (v. 7), balanças desonestas e pesos falsos (v. 11), em alusão a um comportamento social injusto. Em contraposição a essas práticas, Deus espera uma relação de transparência, de intimidade e de adoração para com ele, e uma prática de cuidado, de acolhimen- to e de equidade para com o outro � especialmente o que está sendo injustiçado e oprimido. Em sua outra alusão a Davi, Paulo afirma que este serviu ao pro- pósito de Deus em sua geração, no seu tempo, e assim cumpriu a sua missão de vida. A vocação com a qual Deus nos agracia visa o cum- primento do propósito de Deus, e isso sempre acontece no tempo e no espaço, na história e na geo- grafia. Não existe obediência cristã sem endereço, e disso Jesus é nosso exemplo e inspiração. Ele viveu en- tre nós e fez questão de qualificar essa vivência como sendo a de cha- mar pecadores para si e de cuidar dos doentes que lhe traziam � o que lhe causou enorme dificuldade com os que se consideravam justos e saudáveis (Mc 2.17). A missão que Deus tem para nós precisa marcar a nossa sociedade com o jeito de Je- sus, com o impacto de Jesus e com o tipo de consequência com que o próprio Jesus teve de lidar. Ao O Rei Davi, Peter Paul Rubens Re pr od uç ão A VOCAÇÃO COM A QUAL DEUS NOS AGRACIA SEMPRE ACONTECE NO TEMPO E NO ESPAÇO, NA HISTÓRIA E NA GEOGRAFIA REDESCOBRINDO A PALAVRA DE DEUS VALDIR STEUERNAGEL 29Maio/Junho 2025 • ULTIMATO reverberar esta palavra dentro de mim, temo que, às vezes, entenda- mos a nossa missão como sendo de tal forma isolada de um endereço que nos tornemos intimistas e ir- relevantes. Não seria o nosso papel nos misturarmos com as coisas do mundo; portanto, o abandonamos ao seu próprio destino, como se dele não fizéssemos parte. A vida cristã não é claustrofóbica, mas encarnada. Do outro lado desse isolamento está uma �misturança� (permitam-me usar essa palavra) tal que perdemos qualquer nota distintiva. Jesus, no entanto, assu- miu a humanidade plena sem nun- ca se adequar a este mundo. Sempre o criticou, tanto em sua dimensão religiosa como na sociopolítica, e sempre buscou a sua transforma- ção, curando enfermos, libertando oprimidos e anunciando o tempo restaurador de Deus. Onde quer que ele chegasse, as coisas mudavam, pois passavam a ser confrontadas e transformadas pelo poder do reino de Deus. Essas duas referências a Davi têm me servido como molduras para viver neste tempo, em busca da vivência da vontade de Deus, que é sempre graciosa e transfor- madora, e nunca meramente ex- cludente e discriminatória, como o profeta nos ensinou e como Jesus modelou. É a ele que somos chama- dos a seguir no afã de viver segun- do o coração de Deus. Num hino intitulado �Tua vontade�, o com- positor Marcell Steuernagel assim o expressa: Fazer tua vontade, seguir tuas pegadas, é o pão de cada dia para nós. Servir em tua mesa, saber lavar os pés, cantando de alegria a ti, Senhor! Buscar em tua presença sustento para [a] alma, vivendo cada dia aos teus pés. Bebendo da Palavra que torna morte em vida e dá-nos alegria pra servir! Como tu fizeste, Senhor, nós queremos fazer! Tua vontade, ó Pai, transforma em nosso querer Tua vontade.1 Nota 1. “Tua vontade”. LCI321. Livro de canto da IECLB. Portal Luterano. Disponível em: https://www.luterano.org.br/lci-321-tua- -vontade/. Valdir Steuernagel é pastor lute- rano, membro da Comunidade do Redentor, em Curitiba, PR, e embai- xador da Aliança Cristã Evangélica Brasileira e da Visão Mundial. @silva. steuernagel. Nossa identidade, nossa vocaçãoNossa identidade, nossa vocação bit.ly/413-redescobrindobit.ly/413-redescobrindo MAIS NA INTERNET 30 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 A rq ui vo p es so al CAMINHOS DA MISSÃO EMILIANO CAMBUIM Que é um privilégio fazer parte da missão de Deus nenhum cristão genuíno discorda. Mas ver de perto ou- tras pessoas sendo despertadas, abrindo os olhos para o mundo missionário, se sentindo irresis- tivelmente atraídas a Deus a pon- to de desejar ser instrumento em suas mãos para impactar vidas com suas ações � ah, isso é mais que um privilégio! É algo único, que me enche de um sentimento indescritível! Desde 2012, o Senhor tem me permitido desfrutar desse sentimento ao acompanhar a trajetória de diversos jovens pelo caminho missionário, passando pelo despertamento, engajamen- to, prática e envio. Tudo começou numa cida- dezinha do interior da Paraíba no Projeto Missionário do Betel Brasileiro. Uma cidade muito pe- quena. Uma escola sem grande estrutura. Racionamento de água e outros desafios. Foi assim que Cubati recebeu um grupo de se- tenta missionários. E foi nesse ce- nário que Deus me mostrou como é lindo fazer missões e como ele tem levantado uma geração que deseja servi-lo. Ver jovens saindo daquela ex- periência já fazendo a matrícula no seminário, firmando-se na equipe de evangelização em pra- ças, pregando por meio da arte e mostrando a todos o evange- lho pelo qual se apaixonaram... Fiquei convicto de que éramos meros coadjuvantes de um ator principal: Deus. Mas ele tinha reservado pla- nos ainda maiores do que os meus: me fez atravessar o Atlân- tico, ao lado de um grupo divi- namente selecionado, para ver que o que ele estava fazendo no Velho Continente. Ele me deu a oportunidade de pregar e ver pessoas seconvertendo no inte- rior de Portugal � um país com tão pouca presença evangélica e tão carente de Jesus. Conhecer a cultura cigana e ver jovens dan- çando e cantando para o Senhor de forma exuberante e com uma alegria contagiante reforçou ain- da mais em mim a certeza de que os caminhos missionários eram preciosos demais para não serem percorridos. Como se não fosse suficiente, Deus me fez cair de paraquedas no movimento que realmente virou meu mundo de cabeça pra baixo, o Vocare. Conhecer e me envolver com uma juventude que está buscando entender seu lugar na missão de Deus, que está consciente de que �não veio a esse mundo a passeio� e que tem uma missão a cumprir foi um presente! Com tanta coisa massa que Deus tem me permitido viver, uma coisa ficou escrita nas tábuas do meu coração: o Deus da mis- são está agindo em muitos luga- res e pessoas, na sua rua, na sua igreja, no sertão, na capital, no Brasil e fora dele. Ele está levan- do a Água da Vida a uma geração sedenta, alcançando e transfor- mando vidas. Termino com um breve con- selho: não perca tempo e venha também. Acredite, você não vai querer ficar de fora dessa! Emiliano Cambuim, casado e pai de três meninos, é pastor do Betel Brasileiro em João Pessoa, PB, mobi- lizador de missões e coordenador nacional do Movimento Vocare. A INCRÍVEL JORNADA DE ACOMPANHAR JOVENS NA TRAJETÓRIA MISSIONÁRIA Nova liderança, mesmo DeusNova liderança, mesmo Deus bit.ly/413-caminhos-missaobit.ly/413-caminhos-missao MAIS NA INTERNET O DEUS DA MISSÃO ESTÁ AGINDO EM MUITOS LUGARES E PESSOAS, NA SUA RUA, NA SUA IGREJA, NO SERTÃO, NA CAPITAL, NO BRASIL E FORA DELE 32 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 Confesso que sempre que eu lia o verso 12 do Salmo 90 tinha dúvidas sobre o que significava a expressão �contar os nossos dias�. A primeira ideia vem quando a vemos nesse contexto da oração de Moisés, na qual ele nos traz a cons- ciência da brevidade, da fragilidade da nossa vida, e que nossos dias �voam� e, em poucas décadas, nossa vida desa pare- cerá (v. 10). Somos como a relva, que nasce pela manhã, floresce, mas, à tarde, murcha e seca. Na Nova Versão Transformadora (NVT), esse versículo foi traduzido assim: �Ajuda-nos a entender como a vida é breve, para que vivamos com sabedoria�. Diante dessa constatação, o piedoso Moisés faz quatro pedidos: �Satisfaze-nos a cada dia com o teu amor, para que cantemos de alegria até o final da vida� (v. 14). �Dá-nos alegria em meio ao inevitável sofrimento� (v. 15). �Que nós e nossos filhos pos- samos ver a glória e os feitos do Senhor� (v. 16). �Que a bondade do Senhor seja sobre nós e faze prosperar nossos esforços� (v. 17). Tais coisas são essenciais para uma vida abundante e significativa: satisfação, cantoria, alegria para aguentar o sofrimento, contempla- ção e vislumbre da glória de Deus, e ver que os nossos esforços não foram em vão, que frutificaram, perpetuaram e prosperaram. Outro pensamento me ajudou a entender melhor como �con- tar os nossos dias� (inspirei-me nas quatro operações básicas de matemática): Ordenar: definir o que vem pri- meiro, o que é mais importante � o que me fez lembrar do que Jesus disse sobre �buscar em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas as coisas vos serão acrescentadas� (Mt 6.33). Somar: Uma busca por acres- centar virtudes e aprofundar no conhecimento de Deus, bem mais do que as riquezas e conhecimen- tos do mundo (2Pe 1.5-9). Subtrair: Tirar os excessos, os vícios, as distrações e tudo aquilo que nos impede de enxergar Deus e experiementar mais dele, e nos envolver nos negócios de seu reino (Ef 4.22 e Hb 12.1). Dividir e multiplicar: Para mim, essas duas operações se comple- mentam, pois saber dividir as tare- fas, no sentido de não fazer tudo sozinho, saber encarregar e treinar outros faz com que, de um lado, não nos sobrecarreguemos; e, de outro, façamos discípulos e multi- pliquemos os dons e talentos con- fiados por Deus a nós (Mt 28.19). Precisamos aprender a carre- gar e a dividir os fardos também (Gl 6.2) Muitas vezes nos torna- mos resmungões e ranzinzas por- que esquecemos de levar nossos sofrimento e sentimentos ruins a Jesus, e de ouvi-lo a nos admoestar, como ele fez com a querida Marta: �Andas inquieta e te preocupas com muitas coisas. Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada� (Lc 10.40-42). Continuo nessa busca por alcançar um coração sábio, um coração como o de Maria num mundo de Marta; com os olhos fitos no que é eterno, com alegria e satisfação no coração, transmi- tindo uma fé profícua que sustenta nos dias difíceis, e claro... recheado de canções, e aguardando com grande expectativa o encontro com o meu amado Salvador. Shih Li Li Yoshimoto, 55 anos, psicó- loga, é mestre em divindades e em aconselhamento bíblico. Fundadora do ministério de formação e capaci- tação de conselheiros bíblicos Mais Barnabés (@maisbarnabes). Casada com o pastor Daniel Yoshimoto e mãe de Jonathan, Ester e Sayuri. “ENSINA-NOS A CONTAR OS NOSSOS DIAS” SESSENTA + SHIH LI LI YOSHIMOTO QUANDO SABEMOS DIVIDIR AS TAREFAS COM OS OUTROS, FAZEMOS DISCÍPULOS E MULTIPLICAMOS OS DONS E TALENTOS CONFIADOS POR DEUS A NÓS A rq ui vo p es so al 33Maio/Junho 2025 • ULTIMATO 34 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 REFLEXÃO REBECA SOUSA MELHOR, MAIOR E MAIS TANGÍVEL Ainda que os homens voltassem a errar, teriam um lugar seguro para recorrer: ao Nome de Jesus Não muito tempo atrás, Aquele que é sempre forte vivenciou um horror des- concertante. Descalço, caminhou um lon- go e tortuoso desfile de zombaria e vergonha. O nosso Amigo foi rodeado por uma horda infernal que lhe batia, lhe cuspia, lhe dava pontapés, insultavam-no. Sobressaltado com inúmeras dores, foi coroado com espinhos grossos que penetraram sua pele e batizaram sua face com mais e mais sangue. Arrastado até a cruz, não hou- ve silêncio quando um dos vilões atravessou seu corpo com uma lança afiada (Jo 19.34). A multi- dão, furiosa, dirigia palavras cru- éis ao Autor da vida. Sua roupa foi retirada e sorteada (Mc 15.24) e, amarrado à áspera cruz por gros- sos pregos que lesaram ainda mais seu corpo, ouviu o riso mesquinho de seus assassinos (Lc 23.33-43). Como um cordeiro, não ofen- deu os seus ofensores: ele ergueu seus olhos para o céu e disse: �Pai, perdoa-lhes, pois eles não sabem o que fazem� (Lc 23.34). A razão de seu doloroso sacri- fício era a redenção das criaturas humanas. O pecado endureceu o coração daquele povo, deixando- -o tão rígido como uma rocha. As pessoas viviam segundo o prínci- pe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da deso- bediência (Ef 2.1-10). Somente um sacrifício perfeito poderia rever- ter a situação. A terra foi coberta por trevas. Tudo estava escuro (Mc 15.33-34). O sol escondeu a sua face da crueldade. Após horas de tor- tura, o Cristo anunciou: �Está consumado!�, curvou a cabeça e entregou o espírito (Jo 19.28-30). Naquele instante, uma história melhor, maior e mais tangível começou a agir. O véu do santuário rasgou-se em duas partes e a terra tremeu (Mt 27.51). Os amigos do Nazare- no, com medo, fugiram e algumas amigas do Cristo assistiam a cena com pesar (Mt 27.56). O mal pensou ter triunfado, certo de que aquele que é o Início havia chegado ao seu fim. Cristo foi sepultado e, certo dia, seu túmulo recebia a visita de duas amigas. Imagino que não foi um momento fácil para elas: quem nunca chorou ao perder um amigo? Elas desejavam ficar ali por horas e horas, quando ou- viram um grande barulho segui- do de uma notícia melhor, maior e mais tangível do que qualquer outra: �Não tenham medo! Sei que vocês estão procurandoJe- sus, que foi crucificado. Ele não está aqui; ressuscitou, como ti- nha dito� (Mt 28.5-6). Depressa, as amigas saíram do túmulo para anunciar aos demais que o Rei estava vivo. As sombras haviam ido em- bora e todas as cores estavam de volta. Iluminado e ainda maior do que o sol nascente, o Ungido es- tava vivo; a própria morte andou para trás. O Messias, Deus forte e Príncipe da paz, ressuscitou. Depois dali, o Herói ressurre- to foi rever o seu povo. O governo sádico de seu inimigo era muito perverso, mas o seu sacrifício re- viveu os corações. O Rei resgatou o povo do domínio das trevas e o inseriu num reino de amor, e, ain- da que os homens voltassem a er- rar, teriam um lugar seguro para recorrer: ao seu Nome (At 4.12). Esse é o nosso Senhor � melhor, maior e mais tangível que os de- mais senhores. Depois disso, os corações en- durecidos foram revertidos, subs- tituídos por corações reais (Ez 36.26-28) e aos que predestinou, a estes também chamou; e aos que chamou, a estes igualmente justi- ficou; e aos que justificou, a estes também glorificou (Rm 8.30). Por toda a terra, nunca se ouviu história igual à do Carpin- teiro: alguém que deu a própria vida por causa de seus amigos (Jo 15.13). Esse é o princípio do final feliz melhor, maior e mais tangível que qualquer outro ofe- recido a nós. Em Jesus Cristo, pessoas de todas as gerações encontrarão o mesmo amigo precioso de sempre, que se sacrificou por nós, e a quem devemos nos dirigir nas horas es- curas em nossos jardins de afli- ções. Ele oferecerá à alma de cada um consolo melhor, maior e mais tangível que qualquer outro. Rebeca Sousa é teóloga pernam- bucana, escritora de ficção cristã e especialista em teologia bíblica e exe- gética em Novo Testamento. Versão ampliada de “Melhor, maior e mais tangível”Versão ampliada de “Melhor, maior e mais tangível” bit.ly/413-reflexaobit.ly/413-reflexao MAIS NA INTERNET 500 Anos do Anabatismo O ano de 2025 é de comemoração para a comunidade anabatista mundial INFORME Há 500 anos, um movimento que começou na cidade de Zurique se espalhou pela Europa e deu origem às igrejas anabatistas em todo o mundo. A reforma de Zurique, iniciada pelas ações do sacerdote Ulrich Zwinglio, se intensificou com um grupo que ficou conhecido como os “Irmãos Suíços”. O aprofundamento dos estudos das Sagradas Escrituras os levou a questionar algumas práticas dentro da igreja da época, como a presença de imagens e o batismo infantil. Isso fez com que o grupo praticasse o rebatismo (anabatismo), com o sacramento sendo ministrado como fruto de uma decisão pessoal, de acordo com a fé do indivíduo. Os Irmãos Suíços sofreram perseguições por suas posições teológicas em Zurique, e foram expulsos da cidade. A fé anabatista se espalhou para outras regiões da Europa, onde havia tolerância religiosa. A essência deste movimento foi sintetizada nos sete pontos da Confissão de Schleitheim, de 1527, que defendia o batismo como decisão pessoal, a separação da igreja do Estado, o pacifismo cristão, entre outros fundamentos da fé cristã. O movimento anabatista, através da comunidade menonita, se estabeleceu no Brasil no século XX. Diversas dessas igrejas estão reunidas na Convenção Brasileira das Igrejas Evangélicas Irmãos Menonitas - COBIM. Cremos que Deus guiou este povo para também ser luz e testemunho nesta nação. No mundo os menonitas estão presentes na África (804 mil), na América do Norte (611 mil), na Ásia e Pacifico (442 mil), na América Latina (201 mil) e na Europa (67 mil), totalizando 2,126 milhões. Os primeiros anabatistas no Brasil No final de 1929, um grupo de alemães, em sua maioria menonitas, decidiu deixar a Rússia via Moscou devido à perseguição comunista. Após um período de transição na Alemanha, a partir de 1930, cerca de 1.200 pessoas chegaram ao Brasil como refugiados, estabelecendo-se na cidade de Ibirama, em Santa Catarina. No próprio navio, os líderes já iniciaram a organização da igreja. Como vieram menonitas das mais diferentes regiões da Rússia, não havia uma coordenação central. Alguns anos mais tarde, outro grupo veio da Rússia ao Brasil, fugindo pela China. Na década de 1960, menonitas norte-americanos também chegaram ao nosso país para atuar como missionários em diversos estados. Hoje, o total dos membros das igrejas filiadas às Convenções menonitas é de 12,5 mil. Os princípios anabatistas essenciais são: 1 – Jesus é o centro da nossa fé; 2 – A comunidade é o centro da nossa vida; 3 – A reconciliação é o centro do nosso ministério. Em resumo, o foco da atuação dos menonitas tem sido a transformação de vidas — tanto na esfera espiritual quanto na social — sempre com o objetivo de integrar as pessoas à vida da igreja e da comunidade. Confissão de Schleitheim, impressa em 1550, exposta na Sala Anabatista do Museu de História Local em Schleitheim, Suíça. E-book gratuito: Desperta, Igreja! – 40 Dias de Missão e Propósito Uma jornada intensa e transformadora de oração, jejum e busca fervorosa por Deus PDF gratuito: Refugiados e Embaixadores – Missões Menonitas no Brasil No site www.cobim.com.br você encontra: 0 5 2 7 9 1 36 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 Muitos povos do mundo são duramente assolados por guerras, epidemias ou ca- tástrofes climáticas. O Brasil tem a sua tragédia peculiar: a pavorosa realidade do crime, em suas múl- tiplas manifestações, que aflige e contamina de modo crescente toda a sociedade. Os brasileiros de hoje vivem com medo, seja nos grandes centros ou mesmo no interior, es- condendo-se atrás de muros refor- çados, arame farpado e câmeras de segurança. Quando saem às ruas, nunca se sabe o que pode acontecer. Os delitos que mais chocam são os atentados violentos contra a vida e a propriedade. Em 2024, um querido casal amigo, muito dedi- cado ao trabalho cristão, dirigia-se da Zona Leste de São Paulo para o litoral, onde deveriam participar da despedida de um neto que estava indo para o exterior. No caminho foram assaltados por dois bandidos, que os levaram no carro. Avisada, a polícia saiu em perseguição e o veículo acidentou-se gravemente. A senhora morreu na hora e o marido, que havia sido colocado no porta- -malas, ficou muito ferido, vindo a falecer algumas semanas depois. Por horrendos que sejam, os latrocínios são apenas uma parte desse flagelo. A lista de delitos é interminável, muitas vezes asso- ciados a grave violência: roubo de celulares, roubo de cargas, contra- bando, garimpo ilegal, destruição do meio ambiente, sem falar nos crimes de trânsito e no pavoroso espectro do feminicídio. Existe ainda uma infinidade de golpes que as pessoas sofrem dentro de suas residências, pelo telefone ou pela internet. A cada quadrilha que é presa, surgem inúmeras outras. O número de brasileiros envolvi- dos com atividades criminosas é assustador, o que confirma o Brasil como uma sociedade retrógrada e subdesenvolvida, muito distante dos padrões de ética e conduta dos povos mais evoluídos. Essa dura realidade nacional traz à mente algumas invectivas dos profetas bíblicos contra o Israel antigo: �Ai da nação pecaminosa, povo carregado de iniquidade, raça de malignos, filhos corruptores� (Is 1.4). Oseias sentenciou: �O que só prevalece é perjurar, mentir, matar, furtar e adulterar, e há arrombamen- tos e homicídios sobre homicídios� (4.2). Miqueias foi além, denun- ciando que, à semelhança do Brasil atual, nenhuma classe escapava às condutas delituosas: �[...] O prín- cipe exige condenação, o juiz aceita suborno, o grande fala dos maus desejos da sua alma, e, assim, todos eles juntamente urdem a trama� (7.3). A criminalidade brasileira tem origens históricas e culturais. Começou no longo período colonial, sem lei, sem ordem, sem autoridade, sem instituições sólidas. A formação educacionale moral do povo brasi- leiro foi precária, solidificando-se o individualismo e o pouco respeito às normas. A cultura do jeitinho e da esperteza, reforçada geração após geração, resultou na lamentável situ- ação atual. As carências do presente � na educação, na economia e na política � perpetuam e agravam esse quadro. A falta de acesso de imenso número de famílias a oportunidades de estudo, de trabalho e de vida con- digna é uma parte dessa equação. Os responsáveis pela solução do problema � os agentes governamen- tais � se mostram, com frequência, passivos, inaptos ou, em casos mais graves, envolvidos em práticas deso- nestas. A corrupção de mandatários públicos é por demais conhecida e até aceita com certa naturalidade. Um recente relatório da Transparência Internacional sobre percepção da corrupção mostra que o Brasil ocupa sua pior posição na série histórica. Ainda assim, a suprema corte do país vem sistematicamente anulando condenações e acordos de delação premiada nesse âmbito. Tal realidade contamina todos os poderes da república. No legis- lativo, as emendas parlamentares e os orçamentos secretos se prestam NAÇÃO PECAMINOSA �Tudo quanto quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles� (Mt 7.12). É disso que o Brasil precisa HISTÓRIA ALDERI SOUZA DE MATOS Ad ob e St oc k 37Maio/Junho 2025 • ULTIMATO para todo tipo de irregularidades. No judiciário, multiplicam-se os casos de juízes de altas cortes estaduais envolvidos em venda de sentenças, com punições que ficam muito aquém do desejável. Outro elemento deletério é a busca ansiosa de ampliação de rendimentos por meio de ações que, se não são pro- priamente delituosas, revelam-se antiéticas e contribuem indireta- mente para o crime. Ainda recen- temente, o jornal O Estado de S. Paulo publicou uma longa série de reportagens com o título �País dos privilégios�, escancarando essa prá- tica nociva. E quem está tomando providências quanto a isso? As soluções são conhecidas: aperfeiçoamento da legislação cri- minal, agravamento das penas para delitos hediondos, aperfeiçoamento do sistema prisional, modernização do aparato policial, combate eficaz ao crime organizado, moralização do serviço público e, em especial, elimi- nação dos bolsões de miséria, princi- palmente nas periferias das grandes cidades. Outra ação imprescindível é a mobilização da sociedade civil, rei- vindicando, indo às ruas e exigindo o direito à segurança em contrapres- tação à opressiva carga tributária recolhida pelo Estado. E os cristãos, o que têm a ver com tudo isso? Em primeiro lugar, como integrantes da população, eles também são impactados pela crimi- nalidade que angustia o país. Porém, mais que isso, são herdeiros do mais grandioso legado moral e ético que o mundo já conheceu � a tradição judaico-cristã �, com sua vigorosa ênfase no direito, na justiça, na ver- dade e na equidade. �Antes, corra o juízo como as águas; e a justiça como ribeiro perene� (Am 5.24). O apóstolo Paulo sabiamente observou que a autoridade é �ministro de Deus� para o nosso bem, devendo recompensar os bons e castigar os maus, e fazer isso constantemente (Rm 13.4-6). Por sua vez, o Senhor Jesus, o Mestre dos mestres, insistiu na célebre �regra de ouro�, um dos princípios mais subli- mes de todos os tempos, indispen- sável para que a vida em sociedade seja viável e fraterna: �Tudo quanto quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles� (Mt 7.12). O Brasil precisa disso, nós precisamos disso. Alderi Souza de Matos é doutor em história da igreja pela Universidade de Boston e professor no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper. É autor de Erasmo Braga, o Protestantismo e a Sociedade Brasileira; A Caminhada Cristã na História; Fundamentos da Teologia Histórica e Às Ciências Divinas e Humanas (150 anos do Instituto Pres- biteriano Mackenzie). Está residindo por um ano nas proximidades da Filadélfia, nos Estados Unidos. Corrupção – do Éden ao jeitinho brasileiro bit.ly/413-historia MAIS NA INTERNET Presencial e EAD Duração: 3 anos Processo Seletivo 2º Semestre 2025 A FATIPI - Faculdade de Teologia de São Paulo é uma faculdade centenária e consta entre as melhores instituições de ensino teológico do Brasil, segundo o MEC. Prova do Vestibular Totalmente Online! TEOLOGIA 38 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 �Durante quarenta dias, [Jesus] foi tentado pelo Diabo.� Lucas 4.2 Jesus passa quarenta dias no de- serto. É claro que há um signi- ficado no número: os israelitas passaram quarenta anos no deserto. Jesus, o perfeito israelita, passa qua- renta dias e vence as tentações mais fortes. Há também outro significa- do: Jesus, nas condições mais adver- sas, venceu; quando Adão, nas con- dições mais favoráveis, sucumbiu. Porém, atentemo-nos para outro aspecto dessa estada prolongada no deserto. Estamos falando da única vez que o Criador se encarna em seu próprio mundo. Um evento sui generis, prenhe de potencialidades. Em vez de aparecer de repente, já como adulto, pregando e operando maravilhas, o Deus encarnado des- perdiça nove meses no útero e trinta anos no anonimato. Agora, quando esperamos que ele finalmente entre em ação, vai para um retiro espiri- tual por quase um mês e meio. Será que ele não teve tempo suficiente no céu? Ele só viverá uns 33 anos (outro absurdo); mesmo assim já desperdiçou mais de 90% do tempo. Começamos a desconfiar que o relógio de Deus não é igual ao nosso. Segue outros critérios de mensuração, mais qualitativos que quantitativos. Até durante os três anos de intensa atividade que se iniciam, Jesus buscará regu- larmente a solidão. Novamente vemos a realidade da encarnação; como homem, Jesus precisava da solidão, e por isso pode ser modelo para nós. Nesses quarenta dias no deserto, ele assenta uma estratégia ministerial. Ninguém pode andar com se- gurança entre os homens, salvo aquele que ama a solidão. Ninguém pode falar com segurança, salvo aquele que ama o silêncio.1 Nossas vidas na cidade moderna tornam-se demasiado complexas e cheias [...]. Os momentos para as profundezas do silêncio do coração parecem tão raros [...] [Mas] esta- mos dando uma explicação falsa da complexidade de nossas vidas. Culpamos o ambiente complexo [...]. As distrações exteriores dos nossos interesses refletem a falta in- terior de integração [...]. Queremos ser vários egos ao mesmo tempo, sem que todos esses egos sejam organizados por uma única e so- berana vida dentro de nós [...]. Se aceitamos servir na comissão de uma obra social, continuamos a sentir remorso por não poder também ensinar na igreja [...]. No entanto, desde além das margens da vida vem um sussurro, um apelo indistinto, um presságio de uma vida mais rica [...]. Ah! se pudéssemos ao menos passar para aquele centro! Se pudéssemos des- cobrir o silêncio que é a fonte do som! [...] �Se o teu olho for singelo, todo o corpo será cheio de luz� [...]. Se centrarmo-nos e vivermos no silêncio que é mais precioso que a vida, e levarmos nosso programa para os lugares silenciosos do co- ração, com abertura total, prontos a fazer ou renunciar segundo a sua direção, muitas das coisas que atu- almente fazemos perderão a sua importância [...]. Estou falando de um estilo re- volucionário de viver. A religião não é algo que acrescentamos às nossas outras tarefas, tornando as nossas vidas ainda mais comple- xas. A vida com Deus é o centro da vida, e tudo mais é remoldado e PARA QUE SERVE A SOLIDÃO? O relógio de Deus não é igual ao nosso, segue outros critérios de mensuração ÉTICA PAUL FRESTON Be rn ar do R am on fa ur O Espítito o leva ao deserto, Bernardo Ramonfaur 39Maio/Junho 2025 • ULTIMATO integrado de acordo. É isso que dá a singeleza de visão [...]. Deste cen- tro santo vêm os encargos davida.2 Esses quarenta dias no deserto foram fundamentais para os anos seguintes de Jesus. A retirada total da presença humana sedimentou as estratégias e acumulou os recur- sos interiores para os três anos de intensa atividade e crescimento vertiginoso de sua fama. Atividade e fama: duas coisas que costumam virar a cabeça de qualquer um e derrubar as boas intenções � o caso de muitos políticos e muitos líderes religiosos. Ter tido consciência de sua identidade desde antes dos 12 anos não seria suficiente para que o homem de 30 anos desenvolvesse o seu ministério (quantos cristãos hoje, sob a desculpa de serem �filhos do rei�, cometem os maio- res disparates!). Muitas questões ainda estavam por resolver. Era somente no silêncio, privado dos apoios externos que tão facilmente confundimos com a nossa própria força, que as tentações da fama, do poder, do estilo de vida e estilo de missão podiam ser reconhecidas e enfrentadas. Que lástima alguns dos nossos lí- deres eclesiásticos e políticos não cultivarem tal prática! �Não seja o adorno [...] o que é exterior [...]; seja, porém, o homem interior do coração, unido ao incorruptível trajo de um espírito manso e tran- quilo� (1Pe 3.3-4). O líder religioso, como também o político, são acos- sados pela tentação de assegurar o seu �adorno exterior� (dinheiro, fama, poder). Em última análise, a única salvaguarda é a incorrup- tibilidade de um espírito formado na mansidão e no silêncio interior. A aceitação do silêncio é elemento necessário para o autoconhecimento e a oração. Pascal disse que �a maioria dos problemas do homem provém da sua incapacidade de ficar em si- lêncio no seu quarto� [...]. [O si- lêncio] é uma condição da alma caracterizada pela sobriedade, vi- gilância interior, atenção a Deus. Para haver a verdadeira oração, deve haver uma disciplina men- tal através da prática do silêncio, e uma disciplina do corpo através da prática de certo grau de solidão e quietude.3 Porém, temos de entender que silêncio não é simplesmente não falar. É, antes que qualquer outra coisa, o silêncio interior fecundo, e é o controle da língua e dos julga- mentos internos [...]. �Um homem pode parecer silencioso, mas se em seu coração está condenando os outros, está falando sem cessar�.4 Desenvolver os recursos inte- riores de silêncio e quietude é uma das tarefas centrais da educação na oração. Numa cultura que quase proíbe o silêncio, urge que os cris- tãos criem oásis, centros para o cultivo do silêncio interior.5 Notas 1. A imitação de Cristo. Livro 1, capítulo XX. 2. Thomas Kelly (autor quaker do século 20). A simplificação da vida. mimeo. 3. Kenneth Leech. Soul friend. Londres: Sheldon Press, 1977. p. 179. 4. Segundo Galilea. Op. cit., p. 56. 5. Kenneth Leech. Op. cit., p. 180. Publicado originalmente no livro Nem Monge, Nem Executivo (Editora Ultimato). Paul Freston, inglês naturalizado brasileiro, é professor colaborador do programa de pós-graduação em sociologia na Universidade Federal de São Carlos e professor catedrático de religião e política em contexto global na Balsillie School of International Affairs e na Wilfrid Laurier University, em Waterloo, Ontário, Canadá. Celebramos 5 anos da Pro Nobis Editora, uma jornada repleta de dádivas vindas das mãos bondosas de Deus. Para comemorar esse marco, oferecemos um cupom exclusivo de 40% de desconto nas obras listadas abaixo: 18/03/2025 PRONOBISEDITORA.COM.BR PRONOBIS5ANOSPRONOBIS5ANOS CUPOM VÁLIDO PARA OS TÍTULOS: 40 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 A RELAÇÃO APAIXONADA DOS EVANGÉLICOS COM ISRAEL Em que consiste �a paixão evangélica por Israel�? Quais são os motivos desta �paixão�? Este fenômeno se tornou mais evidente nas últimas décadas? TENDÊNCIAS ANDRÉ DANIEL REINKE Fr ee pi k Minha adolescência foi marcada pelo entusiasmo escatoló- gico estimulado por livros como A Agonia do Grande Planeta Terra, de Hal Lindsey. A teologia de fundo dessa obra teve sua versão ficcional na série Deixados para trás, de Tim LaHaye, publicada no Brasil no início dos anos 2000. O sucesso desse tipo de literatura era sinal da vitalidade da hermenêutica dispensacionalista entre evangéli- cos brasileiros. E, nessa linha esca- tológica, o povo judeu e o Estado de Israel desempenham um papel central. Essa era a forma tradicio- nal pela qual nós, evangélicos, nos aproximávamos de Israel: o país era o �relógio de Deus� nos derradeiros capítulos do tempo do fim. Desde então, a aproximação evangélica a Israel ganhou novos contornos. As viagens à Terra San- ta aumentaram significativamente, mais acessíveis ao bolso e guiadas por pastores atendendo a todos os gostos teológicos, com direito a batismo no Jordão e souvenirs os mais diversos. Produtos de origem judaica são oferecidos por lojas evangélicas físicas e virtuais, resul- tado comercial que reflete um fenô- meno mais recente: a aproximação simbólica aos judeus e a Israel. Nas últimas décadas tem ocorrido uma certa judaização de costumes em muitas igrejas, espe- cialmente no meio neopentecostal. Em alguns casos, vemos apenas uma aproximação litúrgica, como a celebração de festas judaicas (que também estão determinadas na Torá) em versões contemporâneas. Eventualmente, a aproximação se ampliou pelo uso de símbolos judaico-bíblicos, como o menorá, o shofar e o talit; também passaram a se usar ornamentos pós-bíblicos, como o quipá; e inclusive o símbolo extra-bíblico da estrela de Davi. Em muitas igrejas, a bandeira de Israel está ostentada junto ao púlpito, embora seja um símbolo nacional laico. Trata-se de um desenvol- vimento novo na aproximação evangélica aos judeus e a Israel, não pautada pela escatologia, mas pela imitação de suas liturgias e símbolos. É um fenômeno complexo e normalmente sujeito a avaliações muito apressadas. Trincheiras cos- tumam ser cavadas antes mesmo de se verificar o que está aconte- cendo. Por isso, cabem algumas ponderações. A busca das origens da fé A história da Reforma está encra- vada em uma ideia: a de retornar aos fundamentos da fé, à igreja primitiva. A tendência de buscar as fontes mais �puras� do cristianismo viria a permear inúmeras vertentes do protestantismo, incluindo os movimentos pentecostais (neste caso, pela via da experiência dos primitivos com o Espírito Santo). Estudos acadêmicos, tanto da teologia como da história, trouxeram um crescente entendi- mento de Jesus e de Paulo como autênticos judeus dialogando no judaísmo, não mais como per- sonalidades anti-judaicas (como fora a tendência do cristianismo ao longo de séculos). Com isso, gradativamente se olhou com mais simpatia para a religião judaica, compreendido como a origem do cristianismo. 41Maio/Junho 2025 • ULTIMATO Nossas igrejas não estudam a história do cristianismo, tam- pouco a formação das doutrinas. Tornam-se presas fáceis para especulações que creditam a Constantino uma imposição da ortodoxia e das crenças funda- mentais do cristianismo. Com isso, cresceu a desconfiança na doutrina tal como foi gestada nos primeiros séculos, entendida como produto de uma helenização indesejada e submissa à filosofia pagã. A incer- teza com as doutrinas fundamen- tais (como a Trindade e a cristo- logia), somada ao vazio simbólico deixado pela iconoclastia do puri- tanismo e do anabatismo � recebi- dos do contexto norte-americano � levou muitos grupos brasileiros a buscarem suas liturgias e símbolos na própria Bíblia � e nela estão o menorá e as festas da Torá. Não deixa de ser uma busca pela pureza das origens da fé, mas que não chega sem alguns anacronismos. O imaginário em torno das origens Muitos evangélicos buscam uma expressão eclesiástica mais �pura�, despida do que se tem entendido como uma �paganização� da fé bíblica. Então veio a rejeição de festas cristãs, como o Natal � subs- tituído pelo Chanucá, porexem- plo � e a busca de uma celebração da Páscoa mais próxima dos ritos judaicos. A tentativa é retornar à igreja primitiva de Atos, uma igreja judaica da qual os gentios passaram a fazer parte. Ou seja, uma igreja que celebrava o culto ao modo do judaísmo. Entretanto, como buscar esse judaísmo primitivo a fim de resgatar uma tradição mais pura? Entram em cena alguns anacronismos. Muitos rituais foram desenvolvidos nos séculos posteriores a Cristo, como o Sêder (o cerimonial judaico do Pessach), e novos símbolos foram agregados ao longo do tempo � caso do quipá, do segundo século, ou da estrela de Davi, implementada no judaísmo de Praga a partir do século 17. As vertentes do judaísmo mudaram ao longo de dois mil anos. Como os símbolos possuem a peculiaridade de se vincularem à essência de um povo, acabam sendo entendidos como supra-his- tóricos. Muito facilmente se passa a imaginar os judeus da época de Cristo usando talit azul e branco e uma correntinha com a estrela de Davi, quando esses elementos são de culturas materiais posteriores. O judaísmo da igreja primitiva acaba sendo imaginado como o judaísmo que os evangélicos encontram diante de si no mundo contem- porâneo. Não deixa de ser uma aproximação de um Israel imagi- nário. Por isso, pode ocorrer certa ambiguidade: quando o evangélico encontra o Israel ou o judeu real (como o secularizado e progres- sista, por exemplo) pode acabar descambando para algum tipo de antissemitismo, uma vez que, para ele, parece ter �algo de errado� com o judeu que encontrou. Enfim, a aproximação dos ele- mentos judaicos é uma tentativa de se aproximar dos símbolos bíblicos do tempo de Jesus e dos apóstolos. O que acontece é um entrecruzamento, na imaginação evangélica, dos ele- mentos judaicos do presente com aqueles supostamente utilizados pelos primeiros seguidores de Jesus. A pluralidade da judaiza- ção evangélica Não pense que esse fenômeno é homogêneo. Há movimentos de aproximação ao judaísmo nas mais diversas vertentes. Não é porque alguém está usando um talit para orar que se trata da judaização criticada por Paulo, pois nem todo caso tem caráter legalista ou soteriológico. Há grupos fazendo uso de ele- mentos judaicos por pura estética. Outros, como os restauracionistas, procuram uma teologia e liturgia primitivas. Há muitos evangélicos gentios se aproximando de algum tipo de judaísmo messiânico, enquanto outros descobrem sua origem judaica (os marranos são comuns no Brasil). Mas tam- bém há aqueles que apostatam definitivamente da ortodoxia e adentram para um ebionismo moderno, negando a divindade de Cristo. Cada caso deve ser obser- vado com cuidado para não sermos injustos com irmãos que estão apenas preocupados em obedecer a Deus. Em outras palavras: observe e compreenda antes de julgar. Esse e outros desdobramen- tos da relação apaixonada dos evangélicos por Israel é tema do livro recém-publicado Paixão por Israel: judaização, sionismo cristão e outras ambiguidades evangélicas, produto de pesquisas de mestrado e doutorado do autor. É uma leitura essencial para compreender melhor o fenômeno e suas implicações para a doutrina, a política e o diálogo religioso no Brasil. André Daniel Reinke é bacharel em desenho industrial (habilitação em programação visual), licenciado em história, mestre e doutor em teologia (concentração em história das teolo- gias e religiões). Autor dos livros Os Outros da Bíblia, Aqueles da Bíblia, Nós e a Bíblia, Atlas Bíblico Ilustrado e Paixão por Israel. A APROXIMAÇÃO DOS ELEMENTOS JUDAICOS É UMA TENTATIVA DE SE APROXIMAR DOS SÍMBOLOS BÍBLICOS DO TEMPO DE JESUS E DOS APÓSTOLOS 44 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 Re vi st a M ag ya r H íre k ARTE E CULTURA LITERATURA E CULTURA GLADIR CABRAL Humor, reflexões profundas sobre a vida humana, diálogo criativo com a tradição literária inaugura- da por Miguel de Cervantes, crítica aos regimes au- toritários da Espanha e de outras partes do mundo, reflexões teológicas e éticas sensíveis � tudo isso num pequeno livro que vai se tornando um novo clássico da literatura ocidental: Monsenhor Quixo- te, de Graham Greene, publicado em 1982. O personagem principal da história é o padre Quixote, que cuida de uma pequena paróquia na vila de Toboso, na Espanha, e que inesperadamente acolhe um bispo italiano em sua casa, um visitante acidental que seguia para Madri, mas cujo auto- móvel ficara sem gasolina. Padre Quixote recebe o bispo em sua casa e o ajuda a seguir viagem. Sema- nas depois, uma carta direto de Roma concede-lhe o título de monsenhor. Como um homem simples e que nunca havia saído de sua paróquia ao longo de décadas, padre Quixote não se sente confortável com o título que lhe é concedido. Cheio de dúvidas em relação às mudanças em sua vida, mas ajudado por seu amigo Sancho, an- tigo prefeito da cidade de Toboso e comunista con- victo, eles partem em uma aventura pelas estradas da Mancha até o destino final. A história se pas- sa na Espanha de 1975, período logo após o final da ditadura do general Franco. O país vivia uma abertura política, mas as forças repressoras ainda estavam muito vivas naquele momento. Era tam- bém um período marcado por grandes mudanças na Igreja Católica pós-Vaticano II. Internamente, as tensões entre a vanguarda e a força do conserva- dorismo ainda era muito forte. Logo no início da narrativa já se anuncia a es- treita ligação entre o padre Quixote e seu ances- tral famoso, Dom Quixote de la Mancha. É assim mesmo que ele se vê, como descendente de Dom Quixote. Muito natural, não fosse o fato de que o ancestral do padre é, na verdade, um personagem de ficção, o que empresta à história uma boa dose de ironia e humor. No final, a questão da busca pela identidade é uma das temáticas centrais do ro- mance. O que somos nós? O que é a subjetividade senão uma ficção que vamos articulando ao longo da vida? �Talvez sejamos to- dos ficções, padre, na mente de Deus� (Greene, 1982). Ao colocar os personagens em cir- culação pelo país e em situações inusita- das, chamando a atenção de policiais, observadores e vigilantes, a história mostra como um simples passeio se torna uma verdadeira fuga. O romance evidencia quanto as instituições políticas e eclesiás- ticas tentam controlar a vida das pessoas, conforme seu comportamento revela algum sinal de rebel- dia, dissenso ou rejeição dos dogmas que a todos envolvem. Em meio a diálogos muito bem construídos e espirituosos, o romance mostra também como a amizade tem o poder de fazer com que as pessoas superem suas diferenças e preconceitos. Um ho- mem religioso tem muito a aprender com seu amigo ateu, e vice-versa, pois, no fundo, o que nos move e nos transforma é a empatia, a compaixão, que nada mais é do que o amor pelo outro, além da honesta reflexão sobre a própria vida. Cada um desses perso- nagens tem seus defeitos, suas fragilidades � como, por exemplo, o descontrolado consumo de bebidas alcoólicas �, mas eles conseguem transcender esses desafios pela força da dignidade e do afeto. Este livro é uma grande celebração da vida huma- na, cheio de amor, humor e sabedoria. Estamos em movimento contínuo, tudo muda. �Não há pássaros este ano nos ninhos do ano passado� (Greene, 1982). Gladir Cabral é pastor, músico e professor de letras na Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc). Acompanhe o seu blog pessoal: ultimato.com.br/sites/gladircabral. AS PEREGRINAÇÕES DO PADRE QUIXOTE NA OBRA MONSENHOR QUIXOTE, DE GRAHAM GREENE O exercício da leitura em Dom Quixote bit.ly/413-literatura MAIS NA INTERNET VAMOS LER! ARTHUR HENRIQUE SOARES DOS SANTOS COMO PENSAR SOBRE A ÉTICA DE DEUS E O PROBLEMA DO MAL? O problema do mal é amplamente reconhecido como um dos principais desafios à crença em Deus. Resumidamente, existem filósofos que argumentamque o mal e o sofrimento � ou talvez a quantidade e a intensidade do mal que existe no mundo � colocam em xeque a existência de um Deus perfeitamente bom, onipotente e onisciente. Esse tema é muito deba- tido em materiais da filosofia analítica da religião. Na própria série Filosofia e Fé Cristã, o Manual Oxford de Teologia Filosófica aborda esse problema em três capítulos. Mas será que não existem pressupostos que precisam de mais atenção? Por exemplo, como a visão que assumimos sobre a ética de Deus impacta nossa reflexão acerca do problema do mal? No livro A Ética de Deus, nova publicação da Editora Ultimato em parceria com a Associação Brasileira de Cristãos na Ciência (ABC2), Mark C. Murphy, professor de filosofia religiosa na Universidade Georgetown, se dedica a lidar atentamente com a relação entre a ética da agência divina e o problema do mal. Para fazer isso, Murphy, em primeiro lugar, ana- lisa o conceito de Deus a partir da tradição do filósofo medieval Santo Anselmo. Para a tradição anselmiana, Deus é o ser cujas perfeições são todas elevadas a seu nível máximo intrínseco. Por exemplo, Deus não é apenas conhecedor, Deus é onisciente; Deus não é apenas bom, ele é perfeitamente bom. A partir dessa maneira de compreender Deus, Murphy tenta com- preender qual o núcleo da ética de Deus, isto é, como devemos pensar sobre as razões de Deus para agir de uma maneira em vez de outra. Ao fazer isso, ele defende � de modo bastante rigoroso � que Deus tem uma ética própria distinta das normas morais às quais suas criaturas estão sujeitas. Isso tem uma implicação central para o debate acerca do problema do mal. Boa parte dos filósofos que debatem sobre tal questão, seja a favor ou contra a existência de Deus, tendem a adotar uma posição que trata Deus como se ele estivesse sujeito às mesmas normas morais que nós, suas criaturas, estamos sujeitos. Contudo, Murphy sugere boas razões para pensarmos que talvez isso seja um pressuposto pro- blemático. E, se Murphy estiver correto, isso signi- fica que os argumentos contra a existência de Deus que partem do mal e do sofrimento estão fadados ao fracasso. Afinal de contas, tais argumentos seriam embasados em uma visão da ética de Deus que eles não pode- riam presumir. Assim, o trabalho de Murphy implica que não é pos- sível usar o problema do mal para argumentar contra a existência de Deus. Dito isso, gostaria de elencar alguns motivos pelos quais a leitura da obra de Mark Murphy vale muito a pena para teó- logos, filósofos e até cristãos em geral que tenham interesse em temas da teologia filosófica. Em pri- meiro lugar, A Ética de Deus é um exemplo primo- roso da reflexão filosófica séria e rigorosa acerca de Deus, de modo que pode levar o leitor a compre- ender melhor o que significa Deus ser perfeitamente bom e perfeitamente amoroso. Em segundo lugar, a obra oferece uma ótima alternativa para pensar uma resposta teísta ao problema do mal. Em contextos de igrejas nas quais os jovens têm dúvidas intelectuais sobre a fé cristã, inclusive sobre o problema do mal, essa obra se torna imprescindível para líderes cujo coração pastoral deve levar ao cuidado amoroso com esses jovens. E, em terceiro lugar, uma das teses mais interessantes de Murphy é a de que o amor de Deus é algo contingente: Deus poderia não nos amar, mas ainda assim ele livremente nos ama. Refletir filosoficamente sobre isso não é útil apenas inte- lectualmente, é algo que deve nos encher de louvor e admiração por um Deus que livremente decidiu nos amar. E, em meio a todo o rigor filosófico, A Ética de Deus nos leva ao louvor e à admiração por esse Deus amoroso. Arthur Henrique Soares dos Santos é graduado e mestrando em filosofia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). 45Maio/Junho 2025 • ULTIMATO ACONTECEU COMIGO MEU ENCONTRO COM JESUS O PRIMEIRO SERMÃO QUE OUVI A rq ui vo s pe ss oa l JORGE NELSON DE OLIVEIRA JUNIOR Conheci a Cristo quando tinha 10 anos de idade. Estava doente e os médicos não sabiam o que era. Foi quando minha mãe me convidou para as- sistir a uma oração na televisão. Era a nossa última esperança. Alguns meses depois de co- meçarmos a orar diariamente pela minha saúde, me vi curado! Foi um milagre! Deus respondeu às nossas orações. Nessa época, ganhei do meu pai uma Bíblia que pertencera à minha bisavó. Eu a lia todos os dias, queria saber mais sobre esse Jesus que me curou. Aos 16 anos, fui convidado por um amigo para visitar sua igreja. Ali aceitei Jesus Cristo como meu Salvador. E depois fui batizado. Meu relacionamento com o Senhor se aprofundou. Mas, algum tempo depois, saí dessa igreja. Na procura de uma nova comunidade, fui fazendo amigos. Conheci uma jovem especial, que, percebendo a minha decep- ção com a igreja e o meu coração endurecido, me dizia: �Não exis- te nada que você faça, que fará o Senhor te amar mais ou menos�. Hoje, essa jovem é a minha espo- sa. Sou grato por ela e outras pes- soas que Deus colocou em minha vida. Em 2013, comecei a frequen- tar um ponto missionário da Igre- ja Metodista no interior de São Paulo. Tinha acabado de me mudar para a cidade! Nesse período, minha vida espiritual foi se re- novando. E um dia, conversan- do com Deus sobre a história da minha vida, ouvi a seguinte per- gunta: �Sabe qual foi o primeiro sermão que você ouviu?�. Com temor, respondi que não. Então surgiu uma memória da infância. Minha mãe e eu está- vamos na cidade de Pirapora, in- terior de São Paulo, em excursão com vizinhos e familiares, e uma cena chamou a minha atenção: duas senhoras sentadas no chão, pedindo ajuda. Alguém passou e deu um saco de pão para uma delas, que começou a comer rapi- damente. A outra senhora pediu um pão, e sua colega negou. Ela baixou a cabeça triste e parou de pedir ajuda. Diante da cena, eu disse: �Mamãe, dá dinheiro pra ela�. Ela respondeu: �Eu não tenho�. Insisti, pois sabia que ela tinha. Então calmamente andamos até um banco e sentamos. Ela me explicou que só tinha dinheiro para pagar a nossa entrada no parque, que era a razão da via- gem.Vendo a tristeza da senhora, eu disse que ela precisava do di- nheiro. Ela respondeu: �Filho, se dermos o dinheiro, não iremos ao parque!�. Aceitei a condição e me comprometi a não chorar por não ir ao parque com todos. Ela me entregou o dinheiro e o levei para a senhora, que agradeceu: �Deus abençoe, filho, que nada lhe falte!�. Depois dessa lembrança, o Senhor falou ao meu coração: �Esse foi o primeiro sermão que você ouviu. Foi sua mãe quem pregou�. Eu chorei. Dias depois, fui visitar a mi- nha mãe e contei a experiência. Ela ficou surpresa com essas lembranças, pois eu tinha apenas 3 anos de idade. Contei o que o Senhor me falou, que ela pregou o primeiro sermão que ouvi. Acho que foi naquele dia que conheci Jesus. Pensando melhor, acredito que posso dizer como o salmista Davi: �Tu formaste o meu interior e me teceste no ventre da minha mãe [...] Tu me observavas quando estava sendo formado em segredo [...] Como são preciosos os teus pen- samentos ao meu respeito. (Adaptação de Salmos 139.13-17) Poder escrever isso hoje é um milagre, ou melhor, uma dádiva. Jorge Nelson de Oliveira Junior, 39 anos, casado com Carla Oliveira e pai de Jordan. Formado em jorna- lismo e membro da Igreja Metodista Livre Saúde (IMeL) em São Paulo, SP. O cão de caça do céu e o menino sorriso bit.ly/413-testemunho MAIS NA INTERNET 46 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 PÓS GRADUAÇÃO EM COSMOVISÃO CRISTà E EDUCAÇÃO Inscreva-se 100% EAD Tutoria Especializada Corpo Docente Qualificado ● Capacite-se para atuar com excelência na educação fundamentada em princípios cristãos ● Estude de onde estiver, com autonomia e qualidade ● Indicado paraprofessores, gestores, pastores e missionários. unievangelica.edu.brEclesiastes, escandalizo-me de pronto. Pois deparo-me com frases como esta: “[…] aquele a quem Deus conferiu riquezas, bens e honra, e nada lhe falta de tudo o que a sua alma deseja, mas Deus não lhe concede que desfrute disso; ficará para um estranho” (v. 2). Essa falta de desfrute imposta por Deus àquele que primeiramente ele agra- ciou incomoda-me profundamente. Outra frase muito desagradável: “Todo trabalho do ser humano é para a sua boca; contudo, o seu apetite nunca se satisfaz” (v. 7). Continua aqui a ênfase na falta de satisfação do ser humano, como algo apa- rentemente determinista que lhe impõe uma rotina escravizante. Porém a mais chocante de todas as afirmativas, que me deixa extremamente desconfortável, à beira de uma desistência existencial da vida é: “Se alguém gerar cem filhos e viver muitos anos, até uma idade avançada, e se a sua alma não se fartar do bem, e além disso não tiver sepultura, digo que um aborto é mais feliz do que ele” (v. 3). A continuação dessa expressão é, no mínimo, macabra: “Pois o aborto vem ao mundo para nada e desaparece na calada da noite, e as trevas encobrem o seu nome. Não viu o sol, nada conhece, porém tem mais descanso do que o outro, ainda que aquele vivesse duas vezes mil anos, mas não desfrutasse do bem. Por acaso, não vão todos para o mesmo lugar?” (v. 4-6). Será que estamos todos em um circo de horrores que debocha de nós minuto a minuto e por um tempo insuportável e infindável? Somos esse espetáculo de alguém sem graça alguma? “Que dor, meu Deus!” Eu grito do mais entranhável do meu ser. Assim como Jó (31.35), resolvi entregar a minha tensa angústia da alma diante do Senhor Deus. E ele ouviu-me e acolheu-me com uma simples e impressio- nante lembrança: “Não é isso que incomoda intima- mente seu coração há anos?”. Lembrei-me de tantas e tantas vezes que me perturbei na alma com a falta de contentamento pleno neste viver em meio a um tempo fugidio. É aquele sentimento que contempla a eternidade a partir da perspectiva temporal e perce- be-a totalmente sem sentido. Pois que graça tem viver para sempre nesta falta de plenitude? Até o momento em que me dei conta que a Palavra de Deus aqui em Eclesiastes expressa de maneira viva e completa o meu sentimento mais uterino, algo que eu sinto, mas nunca consegui expressar tão bem. Como é bom reconhecer o ser recebido e compreendido em minha angústia mais opressiva e lamentável! E agora verbalizá-la lendo a passagem de Eclesiastes 6 como se fossem palavras ditas por mim. “Que aceitação, meu Senhor!” Eu grito do mais entranhável do meu ser. A seguir, ouvi de Jesus, assim como o intérprete da lei diante da parábola do samaritano (Lc 10.37): “Vá e viva este seu tempo fugaz a partir da realidade eterna”. Tão simples, tão revelador e tão libertador! É o contrá- rio do que eu enxergava até aqui. O chamado é para viver o hoje na perspectiva do plano vindouro cheio de plenitude. Agora e já. Tudo muda de horizonte. “Ó profundidade da riqueza, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus!” (Rm 11.33). Junto com o após- tolo Paulo, eu exclamo do mais entranhável do meu ser. Jony W. de Almeida é pastor na Igreja Presbiteriana de Viçosa, em Viçosa, MG. Contentamento – “Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação” (Fp 4.13) bit.ly/413-pastorais MAIS NA INTERNET Fr ee pi k A na C lá ud ia N un es 7Maio/Junho 2025 • ULTIMATO SUMÁRIO 14 CAPA SEÇÕES A capa desta edição traz a oração ensinada por Jesus destacando o pedido: “Livra-nos do mal”. O mal e o Maligno existem. E precisamos recorrer a Deus, o nosso Pai, por proteção. O que sabemos sobre o mal? A que textos bíblicos recorremos para refletir e falar do assunto? Como o mal nos afeta [e como afetamos os outros com o mal] e por que pedimos para sermos livres dele? Por que os cristãos e a igreja precisam levar esse assunto a sério? SERVIÇO DE ATENDIMENTO AO LEITOR Para assinar ou adquirir exemplares anteriores, consultar dados de sua assinatura, comunicar alteração de endereço, tirar dúvidas sobre pagamento ou entrega, renovação e outros serviços. • 31 3611 8500 31 99437 0043 de segunda a sexta, das 8h às 18h • atendimento@ultimato.com.br Editora Ultimato – Caixa postal 43 | CEP 36570-970, Viçosa, MG ABERTURA CARTA AO LEITOR PASTORAIS CARTAS MAIS DO QUE NOTÍCIAS ARTE E CULTURA FAMÍLIA O perigo das telas Carlos “Catito” e Dagmar Grzybowski 26 ACONTECEU COMIGO – MEU ENCONTRO COM JESUS O primeiro sermão que ouvi Jorge Nelson de Oliveira Junior 46 REFLEXÃO Melhor, maior e mais tangível Rebeca Sousa 34 /editora.ultimato Podcast Ultimato /editoraultimato @ultimato @editoraultimato Mais de 86 mil pessoas já “curtiram” a página da Editora Ultimato no Facebook. Junte-se a nós! Ouça devocionais diárias, playlists, histórias e mais! Siga-nos no Spotify. Inscreva-se em nosso canal e acompanhe as lives Ultimato. Quer saber o que a Editora Ultimato e seus blogueiros estão falando? Siga-nos no X. Acompanhe o dia a dia, os bastidores e as promoções da Editora Ultimato no Instagram. Mais de 83.700 pessoas já nos seguem. 44 REDESCOBRINDO A PALAVRA DE DEUS �Fazer tua vontade� Valdir Steuernagel 28 HISTÓRIA Nação pecaminosa Alderi Souza de Matos 36 TENDÊNCIAS A relação apaixonada dos evangélicos com Israel André Daniel Reinke 40 SESSENTA+ �Ensina-nos a contar os nossos dias� Shih Li Li Yoshimoto 32 CAMINHOS DA MISSÃO A incrível jornada de acompanhar jovens na trajetória missionária Emiliano Cambuim 30 ÉTICA Para que serve a solidão? Paul Freston 38 8 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 CARTASCARTAS Estou lendo e relendo cada artigo da edição que tem Esperança na capa! Como estava precisando disso! Que Deus continue abençoando vocês por nos trazer esse alimento dos céus! Lilian Mendes, São Paulo, SP Li e gostei dos artigos desta edição. Ultimato tem sido um instrumento muito útil para seus leitores. Aprecio com interesse os temas abordados, especialmente os que tratam de assuntos contemporâneos, que os cristãos evangélicos devem inserir no contexto de nossas igrejas. Espero que adolescentes e jovens tenham acesso aos diversos temas nas publicações da revista. Zefanias Lima, Rio de Janeiro Obrigado, Cynthia e Ultimato, pela excelente elaboração e exposição do artigo Como vivem os que têm espe- rança?. É uma ótima e atual questão que, na minha percepção, foge dos aspectos tradicionais que são ofer- tados. Sem dúvida, como mencionado, “ter esperança” passa ou passará em algum momento por possuir e exercer o contentamento. Adriano Alves Queridíssima Ultimato, o Cacau Marques (Esperança engajada com a vida) tem que ser colunista fixo de vocês! Do portal e da revista impressa. Ele é um dos melhores que temos atu- almente! Fica a dica! Tiago Melo AS CAPAS DE ULTIMATO É uma alegria receber Ultimato. Cada edição bem recheada de muito conhecimento e reflexões que nos ajudam a construir uma fé mais sólida e racional. Mas, além do exce- lente conteúdo, Ultimato tem trazido capas maravilhosas que encantam e prendem a atenção de tão lindas. Meu pedido-sugestão é de compartilhar essas imagens em tamanho maior para o leitor. Eu adoraria ter uma dessas capas tão lindas e com tanto signifi- cado adornando a minha casa. Andressa B. Barella A TENTATIVA DE GOLPE E A REAÇÃO EVANGÉLICA Quero agradecer e cumprimentar o doutor Paul Freston pela lucidez, profundidade, qualidade e coragem expressos no texto de sua lavra A ten- tativa de golpe e a reação evangélica, publicado na edição de janeiro/feve- reiro de Ultimato. João Batista Pereira O QUE SUA IGREJA PRECISA SABER SOBRE OS 60+ A igreja somos todos nós, independen- temente da idade. É necessário viver o nosso momento com sabedoria e fruti- ficando até o fim. Nós, 60+, pavimen- tamos a estrada e abrimos caminho para as novas gerações. No final, tudo dará certo e estaremos juntos na Nova Jerusalém. Levi Capellari Não aguento mais ficar em pé por quase meia horapara uma oração em conjunto. Não me falta respeito ao Senhor, assim espero. Mas minhas pernas doem. Claire Scorzi Falta sabedoria a alguns pastores mais jovens. Assumem igrejas tradicionais, com história e longa trajetória. Na pri- meira oportunidade, levantam slogans evocando uma pretensa “nova menta- lidade”, “novos rumos” e coisas seme- lhantes. A princípio sutilmente, depois de forma ostensiva, vão pondo de lado líderes experientes. Alguns chegam a ponto de proclamar, de púlpito, o “orgulho em não ter ninguém com mais de 50 anos de idade na diretoria”. Esquecem-se que a idade é algo inexo- rável. E o pior, esquecem que a igreja ainda é conduzida, em sua maioria, pelos mais experientes. Washington Fazolato CARTA DA PRISÃO Ultimato, agradeço o envio de um livro e da revista. Gostaria de saber se vocês conhecem pessoas evangélicas que queiram se corresponder comigo. Há poucos evangélicos aqui e me sinto muito só. Gosto de fazer amizades, especialmente com pessoas que pro- fessam a fé e amam Jesus Cristo. Tenho boas intenções, mente sã e conheço a Palavra de Deus. A. L. F. C., Iaras, SP – Se você tem interesse em se corres- ponder com A. L. F. C., escreva para cartas@ultimato.com.br. PORTAL E REDES SOCIAIS Muito obrigado pelo post “O que o autismo tem me ensinado” (Instagram Ultimato, 9/4/2025). Viver e conviver com o autismo é um exercício de fé diário, e 95% das vezes, um exer- cício solitário, tornando-se um triste indicativo de como a convivência cristã tem de extrapolar a barreira do conforto, do desconhecido, e abraçar os milhares de “estrangeiros” que frequentam os cultos todos os domingos, mas sentem receio de se envolver mais, por causa de suas difi- culdades. Que a igreja desenvolva sabedoria e maturidade para alcançar o próximo. Ronei Jr. Como poeta cordelista, fico extrema- mente feliz em ver a obra O Peregrino – adaptação da obra de John Bunyan, de Jénerson Alves, ganhar espaço na literatura cristã brasileira (“Notícia”, 19/3/2025). Parabéns ao autor e a Ultimato por divulgar o evangelho e a cultura para o Brasil. Euriano Sales Parabéns pelo excelente artigo publi- cado no editorial do boletim Últimas, edição 741 (18/2/2025), Arte para todo lado! Sou professora de arte, educação e também uso a arte como expressão maior. Já li alguns dos livros citados no boletim. Parabéns por desenvolverem uma revista tão importante e bem elaborada para os cristãos poderem divulgar a fé cristã. Sônia V. Gattaz 9Maio/Junho 2025 • ULTIMATO 10 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 // NOTÍCIAS ARIANE GOMES de reais é o valor do prejuízo com a pirataria de livros no Brasil em 2024 1.200.000.000 espécies de plantas, 3,3 mil de fungos, 2 mil de borboletas, 900 de aves, 625 de anfíbios, 350 de peixes de água doce, 320 de mamíferos e 300 espécies de répteis colocam a Mata Atlântica entre as maiores biodiversidades do mundo 17.400 crianças e adolescentes são vítimas de violência sexual no Brasil a cada hora. Apenas 8,5% dos casos são denunciados 8 toneladas de embalagens PET foram recicladas no Brasil em 2024, montante 14% superior às 359 mil toneladas recicladas em 2022 410.000 de pessoas no Japão � população total � têm menos de 10 mil igrejas à disposição, incluindo católicas e ortodoxas. Em 2016, 81% das igrejas protestantes tinham menos de cinquenta participantes e quase três quartos dos pastores tinham mais de 60 anos 125.000.000 + DO QUE NOTÍCIAS Há nove anos a Missão Evangélica de Assistência aos Pescadores (MEAP) estendia os braços – acostumados com trabalhos nas áreas litorâneas do Brasil há trinta anos – para lançar as redes em comunidades ribeirinhas no norte do país. Na época, o pastor Oscar Oliveira contou: “Chegamos em junho de 2016 com dois casais e hoje somos 22 obreiros trabalhando com igrejas e agências missionárias para levar o evangelho às comunidades não alcançadas do rio Purus”. O tempo passou e as comunidades da região conti- nuam sendo alcançadas pelo evangelho. Em carta escrita em março de 2025, um dos obreiros da MEAP contou: Três igrejas foram plantadas, todas com obreiros envol- vidos em ações de discipulado. As crianças continuam sendo ensinadas na Palavra de Deus e aconselhadas. Concluímos o primeiro curso bíblico de formação de liderança nativa, com 28 alunos de cinco comunidades. Mais dez sistemas de abastecimento de água foram instalados, promovendo saúde e bem-estar aos ribeiri- nhos e indígenas. Novos alunos estão estudando a dis- tância e alguns deles foram capacitados para instalar internet via satélite em outras comunidades, obtendo renda extra para sua família. Contudo, o que mais alegrou nosso coração foi o despertar evangelístico dos obreiros nativos. Em janeiro, realizamos uma escola de missões e um pro- jeto missionário para prática. Todos se empenharam na evangelização dos seus parentes. Os corações estão queimando por missões. EVANGELIZANDO RIBEIRINHOS EM PURUS, AM Jesus Film Project, um ministério da Cruzada Estudantil Internacional, alcançou a marca de tradução do filme Jesus para 2.200 línguas em março de 2025. A versão mais recente foi lançada em Bouna, um dialeto da língua kulango, falado na Costa do Marfim, na África Ocidental. A ideia do filme teve início em 1950, com Bill Bright, fundador da CRU Internacional, e seu lançamento acon- teceu trinta anos depois, graças aos esforços de Paul Eshleman, fundador do Jesus Film Project. Desde o início, o objetivo do projeto é apresentar o evangelho em línguas nativas, dando oportunidade para muitas pessoas conhe- cerem Jesus. Exibido em diversos países, Jesus é conside- rado o filme mais traduzido no mundo. De acordo com o Jesus Film Project, há muitos anal- fabetos em Bouna, e apenas um pequeno grupo de mora- dores é cristão. Neste contexto, o filme é valioso tanto para apoiar a comunidade cristã como para ajudar os não cristãos a conhecerem a história de Jesus. A atenção aos detalhes culturais e linguísticos na tra- dução do filme é central. Segundo os responsáveis pelo projeto, para muitos que nunca ouviram o evangelho em sua língua, Jesus não é apenas um filme, mas um encontro com o Senhor. FILME JESUS É TRADUZIDO PARA A 2.200ª LÍNGUA, O BOUNA M EA P Je su s Fi lm P ro je ct 11Maio/Junho 2025 • ULTIMATO FRASES Deus quer que amemos as pessoas e usemos as coisas, não o contrário. Jaime Fernández Escritor, músico e colunista do site Protestante digital O descanso não é merecimento após grande esforço de trabalho, mas é ponto de partida. A semana começa com o domingo, com o descanso na graça, e desse descanso dado por Cristo vem a força – graciosa – para trabalhar! Cássia Coutinho Mestre em teologia filosófica Não apenas devemos nos esforçar para criar, como temos também o dever de criar coisas dignas, nobres, belas e boas, pois o papel do artista só seria arbitrário em um mundo sem Deus. Humberto Schubert Coelho Professor de filosofia moderna e metafísica e historiador A banalização da violência nos videogames, nas redes sociais – que trazem a automutilação, a morte, o suicídio como atos que apenas respondem aos cliques e interações geradas por consoles – tem dificultado a percepção de crianças e jovens não apenas do que é concreto e factível, mas também de suas consequências. Januária Cristina Alves Mestre em comunicação social, jornalista e educomunicadora ALGUNS DOS VISTOS ⬛ O Discípulo Radical John Stott ⬛ A Bíblia Toda, o Ano Todo John Stott ⬛ Lendo o Sermão do Monte com John Stott John Stott ALGUNS DOS LIDOS ARTIGOS LIVROS A UM CLIQUE Todo o conteúdo oferecido em “MAIS NA INTERNET” des- ta edição em bit.ly/ ult413-mais A C E S S E U L T I M A T O . C O M . B R E L E I A A S N OV I DA D ES D E U LT I M ATO TO D OS OS D I AS PARA LER O CONTEÚDO DESTA SEÇÃO, ACESSE: WWW.ULTIMATO.COM.BR/SITES/BLOGDAULTIMATO/ULT413ULTIMATOONLINE SENHOR, NÃO CONCEDAS AOS ÍMPIOS OS MAUS DESEJOS; NÃO PERMITAS QUE SEU PLANO PERVERSO SE CONCRETIZE. Salmos 140.8 ⬛ Maria Juraceia Ferreira (1970–2025): Ela tornou visível o Deus invisível Obituário ⬛ Há esperança de êxito na criação de nossos filhos hoje? Ana Paula P. Formigari ⬛ A gratidão mata a ansiedade Ronaldo Lidório ULTIMATO LANÇA APLICATIVO Ultimato acaba de lançar seu aplicativo, que reúne todo o conteúdo da revista em um só lugar. Além das edições da revista Ultimato na íntegra, o leitor vai encontrar estudos bíblicos, notí- cias e artigos publicados no site, além de vídeos e podcasts. Entre as funcionalidades, destacamos: compartilhar ou salvar conteúdos, fazer down- load da edição da revista para ler quando estiver sem conexão com a internet, acesso à loja Ul- timato, entre outras. O app funciona em celula- res e tablets dos sistemas iOS e Android e está disponível para download na App Store (Apple) e Play Store (Google). Baixe o aplicativo, é gratui- to. Se você já tem a assinatura da revista Ultimato (impressa + digital) ou apenas digital, basta se cadastrar usando os seus da- dos para ter acesso completo ao acervo Ultimato. Fr ee pi k 12 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 + DO QUE NOTÍCIAS+ DO QUE NOTÍCIAS “Geração Z lidera reviravolta emocionante na frequência à igreja” Essa afirmação é feita a partir de dados da pesquisa Reavivamento silencioso – conduzida pela Sociedade Bíblica Inglesa – que mostra que o crescimento marcante da igreja no Reino Unido nos últimos anos está acontecendo graças à aproxima- ção do público jovem de suas atividades. Dados da pesquisa mostram que, em 2018, ape- nas 4% dos jovens de 18 a 24 anos frequentavam a igreja pelo menos mensalmente. Atualmente, esse número subiu para 16%. Em relação a seis anos atrás, mais de dois milhões de pessoas estão fre- quentando a igreja atualmente. Essa é uma boa notícia em dois sentidos: a geração Z é protagonista do reavivamento da igreja num país europeu, continente que durante vários anos tem sido destacado pelo marcante declínio no número de cristãos e de igrejas. A pesquisa revela também outros dados: • Os homens (13%) são mais propensos a fre- quentar a igreja do que as mulheres (10%); • A igreja está se tornando mais etnicamente diversificada – Uma em cada cinco pessoas per- tence a uma minoria étnica; • A leitura da Bíblia e a confiança nela aumen- taram – cerca de 67% dos cristãos da igreja leem a Bíblia semanalmente fora da igreja; • Os cristãos relatam maior satisfação com a vida e maior conexão com sua comunidade do que os não cristãos; • O nível de estresse, ansiedade, depressão, particularmente entre mulheres, é menor entre as frequentadoras da igreja. Acesse o relatório The Quiet Revival em bit.ly/413-gera- caoz. Nascido em 4 de fevereiro de 1906, Dietrich Bonhoeffer legou de sua família um intelecto agu- çado, aptidão musical distinta e confortável situa- ção de vida. Mas não foi o legado que recebeu o que determinou sua vocação e trabalho. Contrariando as expectativas familiares, estudou teologia e atuou como pastor, escritor e ativista social. Bonhoeffer atuou abertamente na contramão do regime nazista: com suas palestras e ensino teológico, com seus escritos, com militância ativa como parte do serviço alemão antiespionagem e, com a morte – foi preso em março de 1943, julgado e condenado ao enforcamento em 9 de abril de 1945 – há oitenta anos. Suas últimas palavras foram: “É o fim, para mim é o começo da vida”. Para Eduardo Delás, pastor e doutor em teolo- gia sistemática, “a vida de piedade que distinguiu Bonhoeffer é relevante não só porque seu pen- samento tem sido uma fonte de inspiração para a teologia contemporânea, mas porque o valor de sua exemplaridade constitui um convite permanente para deixar nossa zona de conforto onde se instam a mediocridade e os conformismos inapresentáveis”. E mais, “o seguimento de Jesus, que deve ser prati- cado no mundo, não é a redenção da nossa angús- tia, preocupações e sofrimentos, como se pudésse- mos ser magicamente separados da realidade, mas a proposta de que a vida terrena seja provada no meio dos conflitos desta história a partir do poder do Espírito”. GERAÇÃO Z LIDERA REAVIVAMENTO DA IGREJA NO REINO UNIDO BONHOEFFER – UM COMEÇO NO FIM Fr ee pi k liv in gl ut he ra n. or g // IGREJA EM AÇÃO ARIANE GOMES ˜ 14 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 MATÉRIA DE CAPA A oração que Jesus ensinou aos discípulos (Mt 6.9-13, Lc 11.2-4) é um dos textos mais lem- brados e, talvez, mais recitados das Escrituras. É uma oração ousada quanto ao tratamento a Deus, que nela é chamado Pai – não apenas Pai de Jesus, mas Pai nosso. Ele é a pessoa central da ora- ção, e dele o nome deve ser santificado, e a vonta- de feita na terra como é feita no céu. A oração inclui também assuntos que dizem respeito àqueles que invocam o Pai: o pão, o per- dão e a proteção. O pão referindo-se à dependên- cia do Criador e Provedor; o perdão para um viver livre e sadio com Deus e com os outros; e a prote- ção da tentação e do mal, que são parte da expe- riência de toda a humanidade, incluindo os filhos de Deus. Sobre o pão e o perdão, bastante tem sido dito, escrito, refletido, e todos nós temos histórias pes- soais e comunitárias de provisão e de perdão. Mas, e quanto ao ser livre do mal, o que sabemos? A que textos bíblicos recorremos para refletir e falar do assunto? Como o mal nos afeta [e como afetamos os outros com o mal] e por que pedimos para ser- mos livres dele? Um olhar panorâmico sobre as Escrituras per- mite lembrar episódios, ensinos e exortações sobre o mal e sua influência sobre o coração hu- mano – onde a injustiça, a opressão, a destruição, a impiedade, a corrupção são geradas – e per- mite também saber que os desígnios do Maligno (diabo, Satanás, adversário, opositor, acusador), são contra a humanidade e contra Deus. Os artigos a seguir são unânimes ao afirmar que a desobediência a Deus é responsabilidade da humanidade e que o resultado dela são oposi- ção ao bem e à vida, tragédia, inimizade e morte. Por isso o destaque tanto para a consciência pes- soal do mal quanto para a necessidade de salva- ção e de reconciliação com Deus garantidas pela vitória de Cristo na cruz. Há unanimidade também quanto à esperança cristã. Porque têm esperança, os cristãos aguar- dam com confiança o dia em que o mal terá o seu fim, e vivem submissos ao poder do Espírito para vencê-lo. Por outro lado, enquanto aguardam, os crentes resistem e denunciam o mal, e traba- lham em favor do bem, do que é bom e justo. Há pessoas ao redor que aguardam boas notícias de salvação, libertação e reconciliação. Como água para o sedento, a bondade, a liberdade e o perdão são desejados por aqueles que anseiam pelo pão, perdão e proteção que só Deus dá. Ultimato deseja que o pedido “livra-nos do mal” seja levado a sério por cada cristão e por toda a igreja – até o dia em que o tabernáculo de Deus [o Pai] estará com os homens e “Deus habi- tará com eles. Eles serão povos de Deus, e Deus mesmo estará com eles. E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor” (Ap 21.3-4). S empre que nos deparamos com calamidades e tragédias individuais ou coletivas somos levados a refletir sobre a realidade do mal e como enfrentá-lo. A pecaminosidade humana, a imoralidade e tantas formas de opressão e de injustiça despertam também questionamentos sobre o mal e as angústias que ele provoca nas pessoas. A narrativa bíblica mostra que Deus criou todas as coisas e viu que eram muito boas (Gn 1.31). Mas a ordem da criação foi perturbada pela desobediência humana ao mandamento de Deus. Consequentemente, o ser humano foi expulsoda presença de Deus e a desordem e a maldade se instalaram na criação e nas criaturas de Deus. Contudo, a esperança cristã se pauta na realidade do desfecho da história: quando a ordem criada será restaurada e toda maldição será eliminada (Ap 22.1-5). Apesar de a Bíblia não oferecer grandes de- bates sobre a origem do mal, ela não deixa de reconhecê-lo e apontar para a resposta divina e a solução final sobre toda a maldade. Esse realis- mo bíblico a respeito do mal humano e estrutu- ral, assim como da bondade divina, não deixa de ser muito apropriado para combater ideias tanto antigas quanto modernas sobre o mal. Entre as pesso- as, há desde um pessimismo quanto a força e a inevitabi- lidade do mal humano uni- versal como um otimismo que subestima e nega o mal ou o idealiza na forma de uma espiritualidade triun- falista. É muito fácil, mesmo aos cristãos, cedermos a uma visão maniqueísta da realidade que entende que estamos em meio a um conflito entre o bem e o mal, e cabe a nós, por meio da oração, da escra- vização do corpo, da vida ascética, vencer o mal. Esse dualismo tem reflexos diretos na espiritua- lidade cristã e no modo como entendemos nossas ações e intenções no corpo de Cristo, a Igreja. A Bíblia não promove essa visão, embora reconheça a existência do mal. Uma compreensão dualista leva a uma rup- tura radical entre vida religiosa e espiritual e vida secular e carnal. Do ponto de vista ético, é uma visão desastrosa. A espiritualidade se torna A RESPOSTA HUMANA AO SOFRIMENTO E À MALDADE É RESISTIR A ELES NÃO SÓ EM OBEDIÊNCIA E FIDELIDADE A DEUS, MAS, SOBRETUDO, NA ESPERANÇA E NA CONVICÇÃO DE QUE O MAL FOI DERROTADO EM CRISTO JESUS O MAL ENTRE NÓS E A PAZ DE CRISTO William Lacy Lane Ad ob e St oc k 1515Maio/Junho 2025 • ULTIMATO um enlevo sobrenatural desconexo da vivência relacional e ética. Por outro lado, as responsabili- dades humanas, sociais e econômicas se reduzem a obras mortas, carnais e sem importância para Deus. Não é de se surpreender que pessoas mui- to �espiritualizadas� se envolvem em escândalos morais e éticos tão danosos ao corpo de Cristo. A ruptura radical entre espírito e corpo precisa ser superada por uma visão holística da obra de Deus e da espiritualidade humana. Isso só é possível por meio de uma lucidez a respeito do mal. A Bíblia mostra que há uma distinção entre o mal qualitativo e o moral. Algo pode ser mal por sua natureza ou condição. Nesse sentido, denota algo desagradável, inútil, corrompido, sem um sentido moral. Coisas, lugares, pessoas, situações e épocas são caracterizadas como ruins, amea- çadoras e danosas. Causam muita aflição e angústia nas pessoas. Contudo, o mal é também en- tendido no sentido espiritual ou moral. Está relacionado a tudo que envolve desobediência aos mandamentos de Deus e a atos imorais e pecaminosos. As Escrituras indicam que a desobediência a Deus levou o ser humano a ser expulso da presença de Deus e a viver sob as consequências e maldições dessa desobediência. Atos de rebeldia a Deus têm consequências dano- sas aos indivíduos e à comunidade.1 Apesar da distinção, em certo sentido, o mal qualitativo ou natural é também consequência do mal moral.2 A Bíblia indica que a desobediência humana leva a tragédias. Porém, nem sempre se percebe uma relação direta de causa e efeito entre uma tragédia e a causa moral do indivíduo ou da comunidade. É muito comum ao cristão querer encontrar o pecado humano individual que le- vou alguém a se acidentar ou a contrair alguma enfermidade terminal. Muito do que acontece de ruim às pessoas não se deve a atos imorais e pe- caminosos, mas ao mal estrutural que, em última instância, se origina no pecado humano. Além disso, a Bíblia, especialmente no Novo Testamento, se refere ao Maligno (Mt 13.19), que vem e arranca a semente do reino plantada no coração humano, também chamado de Satanás na passagem paralela de Marcos 4.15 e Diabo em Lucas 8.12. Trata-se de um agente não humano e não divino que atenta contra o próprio Deus e contra a humanidade. Para muitos, o diabo é a causa última de todo mal e é ele quem tem de ser combatido e resistido. Mas, novamente, isso não deve nos levar a um dualismo, nem à negação da responsabilidade humana do mal existente den- tro do coração humano (Pv 6.14). A boa notícia é que �vem o dia [em que] todos os arrogantes e todos os malfeitores serão como palha, e aquele dia, que está chegando, ateará fogo neles � diz o Senhor dos Exércitos. � Não sobrará raiz ou galho algum. Mas para vocês que reveren- ciam o meu nome, o sol da justiça se levantará trazendo cura em suas asas. E vocês sairão e salta- rão como bezerros soltos do curral. Depois esma- garão os ímpios, que serão como pó sob as solas dos seus pés, no dia em que eu agir � diz o Senhor dos Exércitos� (Ml 4.1-3, NVI). As Escrituras nos ensinam que a resposta hu- mana ao sofrimento e à maldade é resistir a eles não só em obediência e fidelidade a Deus, mas, sobretudo, na esperança e na convicção de que o mal foi derrotado em Cristo Jesus (Hb 2.14-15; Ap 12.9). A realidade do mal não nos torna comba- tentes contra as forças do mal. A realidade do mal nos torna pessoas confiantes na proteção do Pai que não nos tira do mundo, mas nos protege do Maligno (Jo 17.15), confiantes em Cristo, que se manifestou para destruir as obras do diabo (1Jo 3.8), e esperançosos que o dragão será lançado no abismo (Ap 20.2-3). Essa confiança e esperança dão ao cristão o alento diante do sofrimento e lhe permite expe- rimentar a paz de Cristo que excede todo enten- dimento (Fp 4.7) mesmo em meio às aflições (Jo 16.33). Mesmo diante do mal natural, das tenta- ções do pecado e das artimanhas do diabo, o fiel encontra força, dignidade e paz em Cristo. Notas 1. Watson, Duane F. “Evil”, in: Freedman, David Noel, org. The Anchor Yale Bible Dictionary. New York: Doubleday, 1992. 2. Gerstner, J. H. “mal”, in: Elwell, Walter A., org. Enciclopé- dia histórico-teológica da igreja cristã. Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 1990, p. 466-467. A REALIDADE DO MAL NOS TORNA PESSOAS CONFIANTES NA PROTEÇÃO DO PAI QUE NÃO NOS TIRA DO MUNDO, MAS NOS PROTEGE DO MALIGNO William Lacy Lane (Billy) é pastor presbiteriano e doutor em Antigo Testamento. É também professor e capelão no Seminário Presbiteriano do Sul, e tradutor de obras teológicas. É autor do livro O Propósito Bíblico da Missão. 16 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 MATÉRIA DE CAPA Primeiramente, ele não é Deus. Nem mesmo outro deus. A Bíblia deixa claro que não de- vemos cair em tipo algum de dualismo � um deus bom, que fez um mundo bom e agradável, e um deus mau, que bagunçou tudo. Algumas lendas cristãs populares vão exatamente nessa direção e dão a Satanás um poder bem maior e uma atenção bem mais obsessiva do que é reco- mendada na Bíblia. E tal dualismo alimenta boa parte das ficções semirreligiosas, as quais muitos cristãos leem mais frequentemente e com mais fé do que suas Bíblias. Porém, Satanás não é Deus, nunca foi e nunca será. Isso significa que, apesar de a Bíblia clara- mente retratar Satanás como realmente poderoso, ele não é onipotente. Da mesma forma, apesar de a Bíblia dizer que Satanás comanda legiões de ou- tros anjos caídos (demônios) que fazem seu traba- lho sujo, ele não é onipresente. Satanás não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo (como só Deus pode e está). E, apesar de a Bíblia mostrar que Satanás é inteligente, arguto e traiçoeiro, ele não é onisciente. Ele não sabe todas as coisas e não tem o soberano conhecimento do futuro da for- ma que Deus tem para realizar seus planos para a criação e para a história. Sendo um anjo entre outros anjos caídos, mes- mo sendo o príncipe deles, o diabo é um ser cria- do. Isso significa que ele está sujeito à autoridade de Deus e ao seu controle. Como tudo o mais na criação, Satanás é limitado, dependente, contin- gente e, em último caso,destrutível. Devemos levar Satanás a sério, mas não devemos honrá-lo com mais credibilidade e poder do que aquilo que é próprio de uma criatura. Mas seria o diabo pessoal? Será que Satanás é uma pessoa como nós? Será que ele é uma pessoa como Deus? Devemos ter cuidado ao responder a essa per- gunta. Parece-me que há perigos em simplesmen- te responder sim ou não. Por outro lado, a Bíblia é clara ao referir-se ao diabo de uma forma que normalmente associamos a pessoas. Ele é um agente ativo, com capacidade de inteligência, de intencionalidade e de comunicação. Ou seja, a Bíblia descreve o diabo agindo, pensando e falando do mesmo jeito que nós e de formas que certa- mente são mais complexas que as de um animal comum. Quando a Bíblia fala a respeito do diabo, fica claro que ela se refere a algo maior que uma atmosfera ou tendência maligna ou uma personi- ficação meramente metafórica dos desejos do mal dentro de nós � individual ou coletivamente. A Bíblia nos adverte que, no diabo, confrontamos uma realidade objetiva inteligente com a intenção implacável do mal. E os Evangelhos reforçam essa análise ao descrever a batalha que Jesus teve com o diabo em seu mi- nistério. As Escrituras afirmam que o diabo é muito real, muito po- deroso e muitas vezes age exatamente como as pessoas que sabemos que somos. Em Satanás não há relacionamento amoroso duradouro, apreço pelo bem ou pela beleza, não há misericórdia, honra, �lado bom� ou �atos re- dentores�. E, acima de tudo, enquanto nenhuma pessoa neste mundo, por mais cruel e corrompida que seja, está privada de nossa compaixão amorosa e de nossas orações para que se arrependa e seja salva, não há informação alguma na Bíblia de que Satanás é uma pessoa que podemos amar, alguém por quem podemos nos compadecer e orar ou que pode ser redimido. Pelo contrário, Satanás é descrito como totalmente malevolen- te, inflexivelmente hostil a tudo que Deus é e faz, um mentiroso e assassino incansável, implacavel- mente violento, impiedosamente cruel, perpetua- mente traidor, pervertido, destruidor, maligno e condenado. Trecho do livro O Deus Que eu Não Entendo, de Christopher J. H. Wright (Editora Ultimato, 2011). DEVEMOS LEVAR SATANÁS A SÉRIO, MAS NÃO DEVEMOS HONRÁ-LO COM MAIS CREDIBILIDADE E PODER DO QUE AQUILO QUE É PRÓPRIO DE UMA CRIATURA O QUE É O DIABO OU SATANÁS? Christopher J. H. Wright Christopher J. H. Wright é teólogo e diretor interna- cional da Langham Partnership, onde assumiu a função ocupada por John Stott. 17Maio/Junho 2025 • ULTIMATO MATÉRIA DE CAPA “Está consumado!� Esta foi a última sentença de Jesus na cruz antes de expirar. Ele não fez essa declaração depois de sua ressur- reição, nem quando assumiu seu lugar no trono em sua ascensão. �Está consumado� aconteceu na cruz, em meio ao sofrimento e à morte. O que está consumado? O que foi feito naquela sexta-feira no Gólgota que está definitivamente feito? Será que entendemos o que Jesus realizou de uma vez por todas no Calvário? Sabemos que alguma coisa extraordinária, única e definitiva aconteceu naquelas três horas em que as trevas cobriram a terra no meio do dia; quando se ouviu o grito: �Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?�; quando o véu do santuário se rasgou de cima a baixo; a terra tremeu, as rochas fenderam- -se; os túmulos se abriram e muitos corpos de santos res- suscitaram. O centurião romano responsável pelos soldados que guardavam o Calvário, vendo tudo o que estava acontecendo, com grande temor, disse: �Verdadeira- mente este era o Filho de Deus�. Ele, como os outros soldados, reconheceu que aquele homem na cruz, com seu corpo desfigurado, não era um ser humano comum, e sua morte não foi como a morte dos outros dois ladrões ou de qualquer outro ser humano. Algo extraordinário aconteceu. Será que conseguimos compreender o que aconteceu na- quela sexta-feira? Será que conseguimos com- preender que o preço pelo nosso resgate foi definitivamente pago na cruz? Que o sangue derramado pelo Cordeiro de Deus foi para nos resgatar da escravidão do pecado e da morte? Que naquela cruz Deus estava reconciliando consigo o mundo? Não apenas o ser humano, mas toda a criação? Que o Deus santo estava ali, nos salvando da ira de Deus, para sermos acei- tos por Deus e vivermos para a glória de Deus? Será que compreendemos isso? Será que conseguimos compreender que naquela cruz os poderes foram definitivamen- te vencidos? Que não precisamos mais viver subjugados pelos principados e potestades que atuam no mundo e na cultura porque na cruz eles foram expostos ao total desprezo? Será que compreendemos que não são eles que deter- minam a forma como vivemos ou nos relacio- namos? Que podemos perdoar uns aos outros como Cristo nos perdoou? Será que consegui- mos compreender que a morte de Jesus na cruz foi a mais perfeita manifestação da glória de Deus? Que, por causa de sua obediência até a morte, e morte de cruz, ele foi exaltado e re- cebeu um nome acima de todo nome para que diante dele se dobre todo joelho no céu, na terra e em todo lugar, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai? Será que compreendemos tudo isso e muito mais? Não, claro que não. O MAL E A CRUZ DE CRISTO – “ESTÁ CONSUMADO!” Ricardo Barbosa ALGUMA COISA EXTRAORDINÁRIA, ÚNICA E DEFINITIVA ACONTECEU NAQUELAS TRÊS HORAS EM QUE AS TREVAS COBRIRAM A TERRA NO MEIO DO DIA O Calvário, Gustave Doré, 1877 18 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 Não conseguimos compreender por que a cruz, o crucificado e a sua mensagem são um escândalo e uma loucura. Ela não pode ser compreendida pelos mesmos critérios que usamos para compreender qualquer outro as- sunto. Foi o que aconteceu com os dois discí- pulos que retornavam para sua casa em Emaús depois daquela semana intensa. No meio do caminho recebem a companhia de um desco- nhecido e comentam com ele suas tristezas e frustrações. Reconhecem que Jesus foi �um varão profeta, poderoso em obras e palavras, diante de Deus e de todo o povo�, que realizou muitos sinais, curas e milagres que somente Deus poderia realizar. Tinham certeza de que Deus estava com ele. Ele era o Salvador espe- rado, mas, de repente, surge uma cruz no meio do caminho, e tudo fica confuso. O que pa- recia ser claro como o sol do meio-dia, agora ficou obscuro e incompreensível. Se por um lado havia os sinais visíveis que facilitam a fé, por outro, havia uma cruz sem qualquer sinal poderoso, apenas uma vergonhosa e maldita cruz. Não compreendemos o que aconteceu ali porque a cruz não faz sentido, porque o que ve- mos nela é grotesco e vil. O que de bom poderia vir de uma cruz e do crucificado? Todos, inclusive ateus, admiram a vida e o ensino de Jesus. Não encontraremos ninguém que despreze ou mesmo critique o Sermão do Monte, a Parábola do Filho Pródigo, Jesus curando um cego de nascença ou fazendo um paralítico andar. A vida e os feitos de Jesus são admiráveis. A ressurrei- ção é também conside- rada com apreço como expressão da esperança que temos em relação ao que virá depois da mor- te. Mas e a cruz? A visão da cruz e do crucificado agride o ser humano in- telectual, cultural, mo- ral e religiosamente. No fundo, gostaríamos de um evangelho sem cruz. A fé cristã é real e viva por causa da cruz de Cristo. Por causa dela e somente por ela é que podemos compreender o que aconteceu naque- la sexta-feira. Todo o poder do mal, do pecado e de Satanás foram vencidos � não aniquilados, mas vencidos. Todos estes poderes foram expos- tos ao desprezo na cruz do Calvário.Expressões como salvação, libertação, redenção, resgate, tem o mesmo significado. Na cruz, fomos sal- vos da escravidão do pecado, libertos do medo e da opressão dos poderes, incluindo a própria morte. �Graças a Deus, que nos dá a vitória por intermédio de nosso Senhor Jesus Cristo.� Ricardo Barbosa de Sousa é pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto e coordenador do Centro Cristão de Estudos, em Brasília, DF. É autor de, entre outros, A Cruz e o Paradoxo da Autoestima, Quando a Alegria Não Vem pela Manhã, A Espiritualidade, o Evangelho e a Igreja, Pensamentos Transformados, Emoções Redimidas e O Caminho do Coração. POR CAUSA DA CRUZ DE CRISTO E SOMENTE POR ELA TODO O PODER DO MAL, DO PECADO E DE SATANÁS FORAM VENCIDOS � NÃO ANIQUILADOS, MAS VENCIDOS. TODOS FORAM EXPOSTOS AO DESPREZO NA CRUZ DO CALVÁRIO 19Maio/Junho 2025 • ULTIMATO MATÉRIA DE CAPAMATÉRIA DE CAPA Antes de amarrar Satanás, amarre seus pés. São eles que o levam para o conselho dos ím- pios, para o caminho dos pecadores e para a roda dos escarnecedores (Sl 1.1). Retire o seu pé do mal, da casa da mulher adúltera, do caminho largo, do altar dos ídolos, da multidão dos que não servem a Deus (Pv 4.26-27). Antes de amarrar Satanás, amarre seus joe- lhos, para eles não se dobrarem diante do tenta- dor (Lc 4.7), diante de Baal (1Rs 19.18) e diante das riquezas (Mt 6.24). Antes de amarrar Satanás, amarre suas mãos. Se elas o fazem tropeçar, corte-as. Pois é �melhor entrar na vida eterna sem mão ou sem pé do que ficar com eles e ser jogado no fogo eterno� (Mt 18.8). As mãos precisam ser santas (1Tm 2.8). Antes de amarrar Satanás, amarre seu cora- ção. Ele não pode amar outra pessoa além de seu cônjuge, outro deus além de Deus. Ele não pode amar o mundo nem o que há no mundo (1Jo 2.15). Antes de amarrar Satanás, amarre sua língua. Ela é um mal incontrolável, cheio de veneno mor- tífero. Ela contamina a pessoa por inteiro, incen- deia todo o curso de uma vida (Tg 3.1-12). Antes de amarrar Satanás, amarre seus ouvi- dos. Eles não podem ouvir blasfêmias, irreverên- cias e mentiras. Antes de amarrar Satanás, amarre seus olhos. Se os seus olhos forem maus, o seu corpo todo fi- cará na escuridão. Olhos altivos, olhos de cobiça, olhos cheios de adultério, olhos que nunca olham para cima, precisam ser amarrados dia após dia. Antes de amarrar Satanás, amarre sua men- te. Ela precisa ficar cativa a Cristo. Você só pode pensar naquilo que é verdadeiro, nobre, correto, puro, amável e de boa fama. Antes de amarrar Satanás, amarre seu gênio. Se você não suporta um revés, uma ofensa, uma crítica, uma dor, você é incapaz de viver neste mundo. Você não pode pedir fogo do céu para consumir os que não batem palma para você. Antes de amarrar Satanás, amarre sua vaida- de pessoal. A soberba é um pecado latente que precisa ser dominado. É um pecado perigoso. A desgraça está a um passo depois do orgulho e logo depois da vaidade vem a queda. Antes de amarrar Satanás, amarre sua incredulidade. Ela é um entrava enorme e uma ofensa contra Deus, pois sem fé é impossível agradá-lo. Antes de amarrar Satanás, amarre sua pre- guiça. Preguiça faz cair em profundo sono e in- venta mil desculpas para você não se mover. Antes de amarrar Satanás, amarre seu �eu�. Você foi crucificado com Cristo. Assim já não é você quem vive, mas Cristo vive em você. Você não tem direitos. Convém que Jesus cresça e que você diminua. Antes de amarrar Satanás, amarre o pecado que habita em você. Deixe à míngua o apetite da pecaminosidade latente. Ofereça-o em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus. Depois de tudo amarrado, sinta-se à vontade para amarrar também o próprio Satanás. Peça a Deus proteção não só do pecado residente, mas também do �príncipe da potestade do ar�. Ele co- manda um exército de anjos caídos, todos às suas ordens no espaço e no tempo, enquanto não chega até nós a plenitude visível e universal da salvação já obtida por Jesus. Troque o leão com l minúsculo pelo Leão com L maiúsculo. Feche cada vez mais a porta para o leão que ruge (1Pe 5.8) e abra cada vez mais a porta para o �Leão da tribo de Judá�, aquele Leão que desatou os sete selos e deu continuidade à história para que chegássemos ao grand finale, ao clímax da salvação (Ap 5.8)! Elben César (1930-2016), fundador e diretor-redator de Ultimato. ANTES DE AMARRAR SATANÁS, AMARRE A SI MESMO Elben César Ed so n Fa ss on i 20 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 A igreja que frequento implantou recentemente uma política de proteção à criança e ao ado- lescente, visando um ambiente seguro e o bem-estar dos menores. Por que a necessidade dessa ação? Não seria a igreja, por definição, um lugar seguro, uma espécie de embaixada do rei- no? Acontece, porém, que o privilégio de circular pelos corredores dessa embaixada não preserva a pessoa da maldade � sua própria e a de outros �, seja em ações ou em palavras. Oferecer proteção é, portanto, admitir que sempre haverá uma bre- cha de oportunidade para o mal. O mal está presente em cada lugar e em cada pessoa, sejam lugares sagrados, sejam pessoas que confessam um compromisso cristão. Essa característica do mal é muitas vezes relegada e difícil de tolerar. Deveria deixar as igrejas mais alertas e a cristandade menos ufanista. “Se vocês, apesar de serem maus, sabem dar boas coisas aos seus filhos, quanto mais o Pai de vocês, que está nos céus, dará coisas boas aos que lhe pedirem!” (Mt 7.11) Pelos atos de bondade aprendemos um pouco do caráter de Deus. Temos a capacidade de oscilar entre a bondade e a maldade. Há bondade naquele que não teme a Deus, pois ele demonstra amor, solidariedade, sacrifício, empatia, laços de famí- lia etc. Por sua vez, aquele que teme a Deus não está livre de expressar o mal na forma de inveja, facções, ganância, insensibilidade social etc. Al- gumas pessoas se destacam pela sua bondade; ou- tras, pela maldade. A Bíblia não apoia aqueles que desejam traçar uma linha para separar uns e ou- tros. Os seres humanos são mais surpreendentes. Em suma, o mal e a bondade estão juntos e misturados. “Só se veem maldição, mentira e assassinatos, roubo e mais roubo, adultério mais adultério; ultrapassam todos os limites! E o derramamen- to de sangue é constante. Por causa disso a terra pranteia, e todos os seus habitantes desfalecem; os animais do campo, as aves do céu e os peixes do mar estão morrendo.” (Os 4.2-3) O propósito do mal é a destruição da humanidade e da criação. A Bíblia contém muitos alertas desse perigo. Apenas no Novo Testamento listei noven- ta menções das palavras �mal� e �maligno�, como substantivos e adjetivos, dentre as quais algumas poucas vezes empregando maligno para designar um ser espiritual. Ao contrário da tendência po- pular, que atribui a maior parte do mal do mun- do à ação do diabo, a ênfase bíblica está no que as pessoas fazem com a sua capacidade inata de realizar o mal. No que tange à realidade visível � não a seres espirituais �, há três aspectos sobre o mal per- cebidos nos textos da Bíblia. Primeiro, o mal é a maldade, é a perversidade: uma malignidade dirigida pelo ser humano a outro ser humano e à criação, tornada concreta no mundo natural e na comunidade. O segundo é a ideia do mal como defeito, ou mácula: são as realidades que negam o plano original de Deus para o coração humano e para as relações humanas. No terceiro aspecto, o mal é entendido como desgraça, como infelicidade: uma piora na vida das pessoas e da sociedade. “Não retribuam mal com mal nem insulto com insulto; pelo contrário, bendigam; pois para isso vocês foram chamados, para receberem bênção por herança.” (1Pe 3.11) Por ter rédeas soltas, não há limites para o que o mal é capaz. As pessoas podem até mesmo en- contrarsatisfação na prática do mal. A bondade, por sua vez, anda um pouco contida e necessi- tada de incentivos, pois não oferece benefícios imediatos para satisfazer um coração desejoso de reparação. É na comunidade que essa tensão se verifica. Uma comunidade sadia é aquela que restringe os destemperos de seus membros e se torna uma bênção na oposição ao mal. Ela provê tanto o ter- ritório quanto a motivação para seus membros se expressarem em oposição ao mal. Ai daquele que não possui um círculo de amizade, ou perdeu a aferição de amigos e amigas quanto aos seus atos e palavras! E caso esteja O MAL E A BONDADE, JUNTOS E MISTURADOS Délio Porto 21Maio/Junho 2025 • ULTIMATO afastado da igreja, perdeu o benefício da disciplina comunitária � um meio de graça importante para o progresso da vida espiritual. “Amo a lei de Deus de todo o coração. Contudo, há outra lei dentro de mim que está em guerra com minha mente e me torna escravo do pecado que permanece dentro de mim. Como sou mi- serável! Quem me libertará deste corpo mortal dominado pelo pecado?” (Rm 7.22-24) Onde está, ou de onde vem, o remédio para nos livrar do mal que habita em nós? A visão bí- blica usa a metáfora da escravidão para se referir à ação do mal nas pessoas: o escravo é constan- temente humilhado, defraudado e exigido pelo poder que o subjuga. Há uma imposição do mal sobre a natureza humana. Não é a prática da bondade que tornará al- guém livre do mal, mas outra coisa muito mais poderosa. A respeito dessa condição humana e do poder libertador, Jesus disse: �Eu lhes digo a verdade: todo o que peca é escravo do pecado. O escravo não é membro permanente da família, mas o filho faz parte da família, para sempre. Portanto, se o Filho os libertar, vocês serão livres de fato� (Jo 8.34-36). Como escreveu Blaise Pas- cal a respeito da vinda de Cristo: �A encarnação mostra ao homem a grandeza de sua miséria pela grandeza do remédio que se fez necessário�.1 Encontrar a Cristo pela fé não é, portanto, encontrar um bom exem- plo de resignação e de conduta diante do mal, mas é encontrar um amor libertador. A intervenção de Deus em Cristo criou as condições para a vitó- ria sobre o mal. O após- tolo Paulo lembra que, �se o Espírito de Deus que ressuscitou Jesus dos mortos habita em vocês, o Deus que ressuscitou Cristo Jesus dos mortos dará vida a seu corpo mortal, por meio desse mesmo Espírito que ha- bita em vocês� (Rm 8.11). Para os que começa- ram a conhecer a Cristo, a exigência é a bonda- de, não o mal. Mas a bondade em si não soluciona a presença do mal e suas consequências. Alguns gostariam que a solução viesse na forma de poderes militares das hostes celestiais. Porém, a ira dos cavaleiros do apocalipse não retirará o mal da terra. A vitória sobre o mal já está entre nós, na forma de perdão. “Que outro Deus há semelhante a ti, que perdoas a culpa do remanescente e esqueces os pecados dos que te pertencem? Não permanecerás irado com teu povo para sempre, pois tens prazer em mostrar teu amor. Voltarás a ter compaixão de nós; pisarás nossas maldades sob teus pés e lançarás nossos pe- cados nas profundezas do mar.” (Mq 7.18-19) Uma metáfora para o perdão é o mal sendo jo- gado no mar do esquecimento. A Bíblia ensina que o perdão faz parte do processo de cura deste mun- do e que isso foi planejado por Deus e realizado por meio de Cristo. Quando este processo estiver completo, o mal já não existirá. Como escreveu N. T. Wright: �O Novo Testamento promete um mundo em que o perdão será oferecido por Deus e também por seu povo. Parte da alegria dos redimi- dos é que, ao conseguirem, por fim, perdoar com- pletamente tudo o que foi feito contra suas vidas e contra a sua felicidade, não haverá mais sombra do passado trazendo sofrimento e injustiça�.2 Quando você e eu pudermos perdoar todo o mal que nos foi infligido; quando você e eu rece- bermos o perdão por todo o mal que infligimos a outros; quando nossa mente não for mais assom- brada pela culpa, nem pelo ressentimento, nem pelo desejo de retaliação, então saberemos que conseguimos dar e receber o perdão que vence o mal. Por isso há uma luta sendo travada contra o mal em nosso ser interior. A petição final da oração ensinada por Jesus é mais que um pedido genérico de proteção contra forças espirituais. É o reconhecimento dessa luta. “Pai nosso, que estás nos céus! [...] livra-nos do mal” (Mt 6.9, 13) Enquanto espera a resposta dessa oração, pro- cure discernir seus próprios desejos, não aja des- cuidadamente, não fale precipitadamente, nem deixe de olhar para Jesus. Notas 1. PASCAL, Blaise. Pensamentos (La 352 e Br 526). Folha de São Paulo, 2015. 2. WRIGHT, N. T. O mal e a justiça de Deus. Viçosa: Ultimato, 2009. Délio Porto é engenheiro aposentado e mora em Viçosa, MG. NÃO É A PRÁTICA DA BONDADE QUE TORNARÁ ALGUÉM LIVRE DO MAL, MAS OUTRA COISA MUITO MAIS PODEROSA 22 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 MATÉRIA DE CAPA Alguns imaginam fantasiosamente que podem amarar o mal por meio de declarações e de- cretos proferidos do alto de morros, ou nas correntes de oração às sextas-feiras à noite ou ainda colando adesivos nas casas e carros. Até a Bíblia aberta no Salmo 91 é usada como amuleto para afastar o mal do lar, entre outras mandigas inventadas pelo povo para precaver-se do que é ruim, perverso, danoso, maligno, maldoso, ad- verso, desfavorável, que traz dor, sofrimento ou prejuízo para a vida pessoal, conjugal, familiar ou nos negócios. De qualquer forma o mal é levado a sério � não como categoria filosófica, teológica ou moral para ser considerada conceitualmente, mas como realidade prática que afeta negativamente a existência. Jesus considerou o mal, a malignidade e o Ma- ligno como realidades das quais era necessário precaver-se e proteger-se. Jesus percebeu e cons- tatou a ação e as insinuações malignas do Adver- sário e libertou as pessoas que sofriam os efeitos dolorosos da presença e da proximidade das for- ças do mal. Jesus foi pessoalmente tentado a desviar-se de sua vocação e missão pelo mal personificado em Satanás; Jesus enfrentou espíritos malignos e percebeu o mal nas ações de líderes religiosos que usavam a própria Lei Mosaica para oprimir e explorar pessoas e nos sistemas sociais injus- tos da época. O mal não é apenas uma realidade moral subjetiva e psicológica. O mal se manifesta também em estruturas sociais injustas, eivadas de racismo, machismo, sistemas de castas e clas- ses, desigualdades econômicas e concentração de riqueza. Jesus desafiou essas práticas e pregou o amor, a justiça e a misericórdia. Ele experimentou a força do mal social e político quando foi traído, abandonado pelos seus amigos, julgado de forma injusta, entregue para ser crucificado, sofrendo o máximo de dor física e emocional, experimentan- do o mal espiritual absoluto que é a sensação do afastamento do Pai Celeste. Jesus nos ensinou a orar pedindo preventi- vamente por livramento do mal. Mas que �mal� Jesus tinha em mente? Seria o infortúnio nos relacionamentos afetivos ou nos negócios? Considerando a própria oração de Jesus, o mal é não conhecer a Deus como Pai; é não relacio- nar-se com o Pai Celestial pessoalmente; é não perceber a santidade, a exclusividade, a distinção e a prioridade que o Nome e a Pessoa de Deus têm, no coração, sobre toda a cria- ção; é viver aqui na terra querendo que no Céu seja feita a vontade egoísta do próprio ego; é experimentar a falta do pão e do que é bá- sico para a sobrevivência; é andar sobrecarregado pela culpa, tentando por meio de ritos, observâncias religiosas e justiça própria obter operdão; é carre- gar no coração amargura, ira e desejo de vingança contra aqueles que eventualmente nos feriram e deixar-se ser regido por isso; é deixar-se ser le- vado pelos encantamentos, seduções e enganos que nos atravessam diariamente na forma de toda sorte de tentações. Tudo isso é considerado mal na perspectiva da oração básica que Jesus ensinou aos seus discípulos e discípulas. O mal está no interior, no coração e na mente das pessoas. Christian Gillis é pastor na Igreja Batista da Redenção, em Belo Horizonte, MG. QUE �MAL� JESUS TINHA EM MENTE QUANDO NOS ENSINOU A ORAR PEDINDO PREVENTIVAMENTE POR LIVRAMENTO? LIVRAMENTO E LIBERTAÇÃO DE TODO O MAL Christian Gillis Fr ee pi k 23Maio/Junho 2025 • ULTIMATO MATÉRIA DE CAPAMATÉRIA DE CAPA Levante-se e clame de noite, no princípio das vigílias. Derrame, como água, o coração diante do Senhor. (Lamentações 2.19) Degradação, violação de direitos, agressão, doença, desigualdade, inimizade, ameaça, separação, fome, indiferença, briga, afronta, trapaça, angústia. Quem nunca se deparou com um dessse males? Viver tendo diante dos olhos e, muitas vezes, debaixo do próprio teto � em casa, na igreja, na cidade ou no país � realidades como essas não é fácil. Sentimo-nos esgotados, ficamos perplexos e sem perspectivas. Nos aborrecemos, choramos, la- mentamos e perguntamos: �Até quando, Senhor?�. As orações de lamento são importantes por- que atribuem a Deus toda a grandeza e o poder � Ah! Meu senhor! Se o Senhor Deus está conos- co, por que nos aconteceu tudo isto? E onde estão todas as suas maravilhas que os nossos pais nos contaram? (Jz 6.13). Pela manhã vocês dirão: �Ah! Quem dera já fos- se noite!� E, à noitinha, vocês dirão: �Ah! Quem dera já fosse dia!� Isso pelo pavor que sentirão no coração e pelo espetáculo que terão diante dos olhos (Dt 28.67). Cheguem perto de Deus, e ele se chegará a vo- cês. Limpem as mãos, pecadores! E vocês que são indecisos, purifiquem o coração. Reconheçam a sua miséria, lamentem e chorem (Tg 4.8-10). Sacerdotes, vistam roupa feita de pano de saco e pranteiem. Ministros do altar, lamentem. Minis- tros do meu Deus, venham e passem a noite vesti- dos de panos de saco. Reúnam os anciãos e todos os moradores desta terra na Casa do Senhor, seu Deus, e clamem ao Senhor (Jl 1.13-14). DIANTE DO MAL – DEUS ESPERA NOSSO LAMENTO Orem também para que sejamos livres das pessoas perversas e más; porque a fé não é de todos. Mas o Senhor é fiel. Ele os fortalecerá e os guardará do Maligno (2Ts 3.2-3). � Lamentamos, Senhor, que haja homens maus. E recorremos ao Senhor em busca de proteção deles e do Maligno. Sejam sóbrios e vigilantes. O inimigo de vocês, o diabo, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar. Resistam-lhe, firmes na fé, certos de que os irmãos de vocês, espalhados pelo mundo, estão passando por so- frimentos iguais aos de vocês (1Pe 5.8-9). � Que triste e que difícil, Senhor, que o nosso ini- migo esteja sempre ao nosso redor a fim de nos desviar. Oramos para que tenhamos firmeza na fé e possamos resistir-lhe. Até quando, Senhor, te esquecerás de mim? Será para sempre? Até quando esconderás de mim o teu rosto? Até quando estarei relutando em minha alma, com tristeza no coração cada dia? Até quan- do o meu inimigo se exaltará sobre mim? (Sl 13.1-2). ele ouve, age e transtorna o mal porque é todo- -poderoso, justo, amoroso, fiel e vitorioso. O lamento sincero nos lembra de que somos pe- cadores e necessitados, nos ajuda a reconhecer nossas limitações e a confessar que provocamos muitos males e somos vítimas deles. Lamentar ajuda a fazer frente e resistir ao mal e às suas consequências, declarando abertamente que ele incomoda, constrange, af lige, e não é bem-vin- do. Por fim, o lamento permite escolher deixar tudo diante de Deus e confiar nele. Ultimato selecionou versículos que podem ajudar o leitor a lamentar o mal que está diante de seus olhos. Escrevemos a nossa oração a par- tir de alguns deles. Você também pode escrever uma lista pessoal de lamentos e orar a partir dela. 24 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 26 ULTIMATO • Maio/Junho 2025 Ad ob e St oc k Crianças, adolescentes e o uso excessivo das telasCrianças, adolescentes e o uso excessivo das telas bit.ly/413-familiabit.ly/413-familia MAIS NA INTERNET O PERIGO DAS TELAS A tecnologia caminha a passos largos em nossos dias e as conquistas alcançadas nos últimos anos são fantásticas. É surpreendente que, há pouco mais de trinta anos, para se reali- zar uma chamada telefônica para alguns países era necessária a in- termediação de uma telefonista e, algumas vezes, uma espera de muito tempo até a ligação efeti- var-se. Hoje podemos conversar tranquilamente com alguém que esteja do outro lado do planeta caminhando pela rua e de forma imediata. Todavia, se por um lado a tecnologia nos traz benefícios, por outro ela é igualmente ia- trogênica, e talvez os problemas causados ultrapas- sem os benefícios alcançados � pelo menos quando se trata da influência sobre crianças e adolescentes. O primeiro si- nal de alerta foi dado pelo neuro- cientista Michel Desmurget1. Ele demonstra que o uso dos disposi- tivos digitais afeta o desenvolvi- mento neural das crianças e tem produzido a redução da capaci- dade intelectual das mesmas. Por causa desses dados de alerta, vá- rios países europeus � e também alguns estados brasileiros � têm tomado iniciativas restringindo o uso de celulares nas escolas2. A Austrália foi mais radical e proi- biu o uso de redes sociais para menores de 16 anos, e o primei- ro-ministro do país foi categó- rico ao afirmar que a legislação é necessária para proteger os jovens dos �danos� causados pelas redes sociais3. Na contramão desses estudos e iniciativas, muitos pais, espe- cialmente no Brasil, são condes- cendentes e alguns até promo- vem o uso de telas pelos filhos já em tenra idade. Uma mãe (cristã) afirmou para mim alguns dias atrás: �Quando meu filho [de 5 anos] está com o celular, pelo menos fica quietinho e não quer a minha atenção o tempo todo!�. É chocante saber que pais terceirizam para as redes sociais e a internet o privilégio de edu- car seus filhos e os expõem às influências de todo tipo de valo- res anticristãos veiculados nesses meios. E, quando os filhos apre- sentam comportamentos dis- funcionais, tais pais recorrem a profissionais � que muitas vezes tentam corrigir essas condutas por meio de controles químicos e diagnósticos autojustificantes. O apelo bíblico sempre foi para que os pais assumam ple- namente a responsabilidade pela transmissão de valores aos filhos (Dt 6.6-7; Ef 6.4). Delegar essa tarefa a terceiros, sejam as telas ou até mesmo a escola dominical, pode ser um equívoco de conse- quências catastróficas no seio da vida familiar. Notas 1. ‘Geração digital’: por que, pela 1ª vez, filhos têm QI inferior ao dos pais. Coor- denadoria Futuro. Disponível em: https:// sites.ufpe.br/institutofuturo/2020/11/10/ geracao-digital-por-que-pela-1a-vez-filhos- -tem-qi-inferior-ao-dos-pais/ 2. Mais um país: Dinamarca vai proibir celu- lares nas escolas. Olhar Digital. Disponível em: bit.ly/413-mais-um. 3. Os argumentos a favor e contra veto de redes sociais para menores de 16 anos na Austrália. BBC News Brasil. Disponível em: bit.ly/413-redes-australia. Carlos �Catito� e Dagmar são casados, ambos psicólogos e tera- peutas de casais e de família, e mem- bros da Igreja Luterana. São autores de Pais Santos, Filhos Nem Tanto. Acompanhe o blog: ultimato.com.br/ sites/casamentoefamilia/ FAMÍLIA CARLOS �CATITO� E DAGMAR GRZYBOWSKI TALVEZ OS PROBLEMAS CAUSADOS PELA TECNOLOGIA ULTRAPASSEM OS BENEFÍCIOS ALCANÇADOS, PELO MENOS QUANDO SE