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Globalização, Dependência e Exclusão Social - O Caso Brasileiro

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Globalização, Dependência e Exclusão 
 Social - O Caso Brasileiro
 Euclides André Mance
 Curitiba, janeiro, 1999
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Introdução
 
 Este texto tem por objetivo apresentar, concisamente, 
 um esboço de como a globalização vem afetando a realidade brasileira. Na primeira 
 parte caracterizamos brevemente o fenômeno atual da globalização, analisando 
 aspectos econômicos, políticos e culturais que lhe são inerentes e apresentando 
 um conjunto de suas consequências para os países do Terceiro Mundo. Na segunda 
 seção consideramos a trajetória dos modelos de desenvolvimento adotados no 
 Brasil nas últimas décadas, a transformação das mediações de hegemonia política 
 no país, a exclusão social e a alienação cultural provocada por estes movimentos, 
 enfatizando o modo como a nação vem se submetendo às medidas globalitárias 
 e adotando o neoliberalismo. Na terceira parte, referimo-nos a elementos da 
 teoria que suporta a conduta do governante Fernando Henrique Cardoso e a algumas 
 práticas globalitárias adotadas em sua eleição e em seu governo. Na quarta 
 parte, analisamos como vem se acentuando a negação das liberdades democráticas 
 (públicas e privadas) sob o capitalismo atual. Na quinta seção apresentamos 
 alguns elementos da construção de uma alternativa de esquerda - socialista, 
 ecológica, democrática e popular - ao presente cenário brasileiro, apontando 
 algumas iniciativas de transformação social. Por fim, na conclusão, apresentamos 
 alguns equívocos da teoria econômica de Fernando Henrique que, em razão dos 
 quais, pode ser tomada como um suporte ideológico na justificação do modelo 
 de desenvolvimento neoliberal que o país vem adotando, acentuando a dependência 
 e subserviência externa . 
 
 1. Um Breve Panorama Econômico, Político e Cultural da 
 Globalização
 O capitalismo, em sua atual etapa de globalização, em 
 seus aspectos econômicos, políticos, informativo-educacionais e éticos, restringe 
 cada vez mais o exercício das liberdades públicas e privadas da maioria da 
 população mundial em benefício da liberdade privada dos que dispõem de capital. 
 
 Sob o aspecto econômico, a humanidade assiste uma 
 nova revolução tecnológica, com um fabuloso aumento de produtividade 
 que, todavia, demanda menos trabalho vivo para a produção de um mesmo volume 
 de mercadoria, gerando ao capitalista um volume maior de excedente que não 
 pode ser reinvestido lucrativamente, em seu todo, na produção de uma maior 
 quantidade de bens, pois não há mercado - isto é, pessoas com dinheiro - que 
 possa consumi-los. Se tal reinvestimento ocorresse, a oferta seria muito superior 
 à procura e a superprodução provocaria uma queda catastrófica nos lucros. 
 Como consequência de tal modelo, têm-se o desemprego e o aumento capitais 
 voláteis girando o mundo em busca de valorização sob taxas de juros elevadas. 
 
 Com a disputa por mercados se acirrando internacionalmente 
 têm-se, em contrapartida, uma concentração de capital cada vez maior 
 - com certos grupos incorporado os grupos rivais ou dominando seus mercados 
 - e uma internacionalização do capital, forçando as economias dependentes 
 a uma inserção subordinada no mercado internacional.
 Neste contexto, a organização de blocos econômicos e mercados 
 comuns, criando uma peculiar regionalização do mundo, suprime mecanismos 
 políticos de preservação das economias nacionais frente ao movimento dos capitais 
 internacionais, gerando grandes mercados de diversas magnitudes e potencialidades 
 face à competição internacional (ver tabela 1)
 
 
 Algumas das novas tecnologias, como a biotecnologia e 
 tecnologia dos materiais, vem permitindo a substituição de matérias-primas, 
 enfraquecendo a posição internacional de países cuja economia centra-se em 
 sua exportação. Além disso, notam-se mudanças na cadeia produtiva, 
 com a concentração de capitais em diferenciados setores em razão das alterações 
 tecnológicas e de estratégias empresariais. Com a restruturação e racionalização 
 empresariais, têm-se a flexibilização do processo produtivo, que envolve 
 novas formas de organização empresarial, de informalização e de precarização 
 das relações de trabalho. 
 Outro aspecto peculiar e inovador é a gênese de uma economia 
 baseada no conhecimento, a economia centrada na produção e comercialização 
 de bens intangíveis (softwares e objetos sígnicos, por exemplo) que supõem 
 o valor de troca do conhecimento (que, entretanto, se reproduz sem necessitar 
 de novo trabalho vivo). Estes elementos geram um outro quadro econômico, demandando 
 novas especializações tanto nos países de capitalismo avançado quanto nos 
 de capitalismo dependente, criando também novas formas de exclusão e uma nova 
 forma de divisão internacional do trabalho. O setor de produção e comercialização 
 de bens intangíveis vem se tornando o principal segmento de concentração de 
 capital. 
 Esse quadro de mudanças provocou o drama do desemprego 
 e do emprego precário por toda a parte, uma vez que tais movimentos de 
 transformação produtiva ocorrem em função do lucro - e não da redução da jornada 
 de trabalho com distribuição de renda, da manutenção do emprego ou da cidadania 
 - provocando, por um lado, a concentração da renda e, por outro, o aumento 
 da pobreza e da exclusão social.
 Em particular, a dependência que os países do Terceiro 
 Mundo sofrem dos capitais externos sob esse modelo de globalização capitalista 
 é cada vez maior, sendo sentida tanto no peso das dívidas externas e internas 
 quanto nos sobressaltos das crises de fuga de capitais voláteis das bolsas 
 de valores desses países.
 Destaque-se também que urbanização verificada nas 
 últimas décadas, nas regiões para onde se deslocam os investimentos capitalistas, 
 acirra um conjunto de contradições urbanas que são agravadas pelo desemprego 
 dos que não são incorporados por estas novas unidades produtivas ali instaladas, 
 bem como, pela falta de políticas públicas no atendimento das demandas sociais, 
 uma vez que os estados, cobrando menos impostos sobre as atividades econômicas, 
 concedendo incentivos fiscais para o estabelecimento de novas empresas em 
 certas regiões e pagando juros sobre dívidas internas e externas, têm menos 
 recursos para cobrir tais despesas.
 A contrapartida deste modelo de globalização é a acelerada 
 degradação ambiental do planeta, com fenômenos de poluição do ar, solo, 
 rios e mares provocados tanto pela busca incessante do lucro, operada pelo 
 capital, quanto pela procura de paleativos para a sobrevivência, operada por 
 populações marginalizadas. O consumo irresponsável de recursos não renováveis 
 e a degradação dos ecossistemas aponta para dramáticas crises ecológicas com 
 fenômenos de mudanças climáticas, desertificações, etc, que se fazem sentir 
 com alterações climáticas em diversas regiões do planeta.
 Por fim, a revolução digital em curso, proporcionada 
 pelo desenvolvimento da informática, tende a interferir em medições econômicas, 
 políticas e culturais da maior parte do mundo, possibilitando: a) a produção 
 de mercadorias intangíveis que trafegam pelas redes digitais e que são reproduzíveis 
 virtualmente, b) o desenvolvimento de novos mecanismos hegemônicos e contra-hegemônicos 
 de informação que interferem nos cenários políticos e c) a interferência cultural 
 que redes, como a Internet, começam a desempenhar.
Aqui novamente se reencontram 
 mecanismos de exclusão e de dominação cultural, em particular, sob a forma 
 de dominação de padrões e sistemas que se impõem internacionalmente mesmo 
 sem serem os melhores. O correlato econômico dessa imposição é o fluxo do 
 capital acumulado pelos detentores dos padrões e sistemas, que tendo patentes 
 e direitos de cópia sobre os mesmos, recebem valores por sua adoção e constante 
 atualização. A desigualdade internacional e entre classes no interior das 
 nações também é gritante no uso dos aparelhos e instrumentos de comunicação 
 digital e analógica , que caracterizam as sociedades conectadas em rede (ver 
 tabela 2). 
 Assim, sob a lógica da globalização, economicamente considerada, 
 as mediações materiais que poderiam ser disponibilizadas para ampliar a margem 
 de exercício das liberdades pública e privada do conjunto da população do 
 planeta - provocando uma sensível redução da jornada de trabalho e proporcionando 
 incremento ao bem estar de todos - ficam sob o controle de um conjunto de 
 agentes privados que amplia cada vez mais sua liberdade restringindo cada 
 vez mais as liberdades dos demais. 
 
 Politicamente, o mundo assistiu nas últimas duas 
 décadas um processo de modernização conservadora, uma vez que as transformações 
 que vêm ocorrendo no conjunto dos países conservam as clássicas estruturas 
 capitalistas de organização social, reproduzindo as desigualdades econômicas 
 já consideras. Neste sentido, o neoliberalismo torna-se um corpo doutrinário 
 justificador de reformas políticas e econômicas que aparentemente visam promover 
 a liberdade da sociedade civil, mas que, de fato, ampliam a liberdade dos 
 grandes agentes econômicos internacionais, ao mesmo tempo em que restringem 
 as liberdades públicas em sua dimensão material, seja pelo desmonte das mediações 
 estatais estabelecidas com esse fim, seja pela subtração de mediações materiais 
 a uma grande parcela da sociedade que fica desempregada e marginalizada do 
 processo produtivo e de consumo. Em ambos os casos a liberdade pública fica 
 prejudicada em benefício da liberdade do grande capital.
 Com a queda do socialismo do leste europeu, uma nova 
 geopolítica internacional suplanta o conflito leste-oeste pelo conflito 
 norte-sul, ficando os países pobres e dependentes submetidos à política estabelecida 
 pelas sete grandes potências do mundo, organizadas em blocos econômicos que 
 se fecham sobre seus interesses, pressionando os demais países a adotarem 
 políticas subservientes. A nova configuração geopolítica não apenas considera 
 a importância de regiões estratégicas sob o aspecto de produção de matérias-primas 
 (como no caso do petróleo do golfo pérsico) como sob o aspecto do cinturão 
 de segurança que separa o norte rico das ondas de migrantes bárbaros do sul. 
 Desse modo, o conflito leste-oeste vai sendo substituído pelo conflito 
 entre norte e sul entre ricos e empobrecidos.
 Com o fim da guerra fria alteram-se também os parâmetros 
 de intervenção geopolítica. Certos organismos internacionais - como instâncias 
 da ONU - tendem a perder importância frente a decisões das potências vencedoras 
 da guerra do golfo que passam a definir critérios próprios para intervenções 
 internacionais.
 Emerge também o fenômeno da planetarização, caracterizando 
 a interferência de nações sobre outras ou, mesmo, de setores da sociedade 
 civil de diversos países pressionando outros países quanto a condução de suas 
 políticas. A planetarização, contudo, tem servido mais aos interesses dos 
 grandes capitais que aos interesses sociais, embora algumas pressões internacionais 
 por direitos humanos, contra testes nucleares, entre outras ações, tenham 
 significativa importância neste novo quadro. 
 Destaque-se ainda que o globalitarismo, como esvaziamento 
 substancial da democracia, se afirma em sociedades que sofrem alto impacto 
 das mídias - em particular a TV - promovendo a manutenção de governos formalmente 
 democráticos, eleitos e reeleitos com o concurso da formação da opinião pública 
 através dos grandes meios comunicativos, que asseguram a hegemonia política 
 do neoliberalismo, mesmo em meio à exclusão social que ele provoca. 
 Em síntese, o neoliberalismo, politicamente, tem enfraquecido 
 a capacidade de os governos promoverem políticas que assegurem a cidadania, 
 ao passo que coloca como tarefa prioritária destes - em particular no caso 
 dos países dependentes - assegurar a estabilidade de moedas nacionais, o que 
 significa adotar, conforme este projeto, políticas de juro e câmbio que acabam 
 por remunerar o capital financeiro com os recursos que poderiam, pelo contrário, 
 ser investidos em saúde, educação, etc. O globalitarismo, por sua vez, virtualiza 
 a prática política e fragiliza o controle substancialmente democrático do 
 poder político que é intrumentalizado por uma razão formalizada. 
 Sob o aspecto educativo e informativo, cabe considerar 
 que, com o surgimento e desenvolvimento dos novos meios de informação e comunicação, 
 o capitalismo adquiriu o estatuto de principal sistema semiótico modelizante. 
 Em outras palavras, as novas mediações comunicativas permitem não apenas gerar 
 signos mas agenciar interpretantes afetivos, intelectuais e energéticos que 
 engajam as subjetividades em processos de produção, consumo e eleição, sob 
 complexos fenômenos de alienação cultural nos quais as semioses hegemônicas, 
 geradas pela conversão de capitais em signos, permitem uma recuperação ainda 
 maior de lucro ou de prestígio político pelas ações humanas que desencadeiam 
 gerando-se interpretantes de diversas ordens. 
 Sob o aspecto da produção, a qualificação dos trabalhadores 
 (para que operem com as novas tecnologias) e processo de reestruturação 
 produtiva valem-se de inúmeras mediações pedagógicas, psicológicas e de 
 outras ordens que estratificam os sujeitos sob novos papéis tais como colaborador, 
 crítico, solidário, etc, situando em um novo patamar o processo de alienação 
 no trabalho, colocando a serviço do capital territórios subjetivos anteriormente 
 inexplorados, como a inteligência emocional. 
 Sob o aspecto do consumo, a disputa por mercado implica 
 em agenciar o consumidor, engajá-lo em determinados processos de consumo, 
 o que exige uma intervenção comunicativa capaz de mover-lhe à aquisição de 
 determinado produto e não outro, a recorrer a determinado serviço e não outro. 
 Com tal finalidade geram-se publicidades, agenciando-lhe interpretantes afetivos, 
 energéticos e intelectuais - o que coloca, também, em um novo patamar a alienação 
 no consumo.
 Com efeito, os agenciamentos semióticos e os processos 
 produção de subjetividade não apenas constróem representações de mundo 
 que são compreensões inadequadas da realidade objetiva, não apenas geram imaginários 
 e utopias alienantes, como especialmente, criam canais de vazão de fluxos 
 de desejos, medos, angústias e outras intensidades que são direcionados no 
 movimento de reprodução do capitalismo, recapturando até mesmo as linhas de 
 fuga do sistema sob sua semiose hegemônica. 
 A Semiose Capitalística torna-se, assim, capaz 
 de modelizar qualquer outro regime de signos ou ação sob a lógica do acúmulo 
 privado. As estratificações subjetivas, isto é, demarcações de papéis sociais 
 operados sob diversos regimes de signos das famílias, escolas, igrejas, clubes 
 e demais instituições sociais que cumprem especial papel mediador educacional 
 são modelizadas sob a lógica de reproduzir os ciclos do capital. Mesmo imagens 
 de protestos sociais ou de ações subversivas
podem ser modelizadas com a finalidade 
 de reproduzir o capital, isto é, de gerar lucro sendo esvaziadas de seu conteúdo 
 político, como ocorrem com inúmeras peças publicitárias que recuperam esses 
 signos para a venda de mercadorias - como a recuperação da imagem de Chê Guevara 
 para vender detergentes no Brasil - ou com a produção de filmes e seriados 
 televisivos que geram bons retornos financeiros explorando temas políticos 
 subversivos com leituras históricas distorcidas para tornar o enredo mais 
 atraente e palatável ao público. De outra parte, as semioses simbólicas sobre 
 os signos indiciais apresentadas nos telejornais fazem crer que inúmeras lutas 
 por justiça social e em defesa dos direitos adquiridos pelos trabalhadores 
 são motivadas por posições políticas retrógradas que dificultam a modernização 
 econômica que beneficiaria a todos. Os interpretantes hegemônicos gerados 
 sob as reformas neoliberais engajam a sociedade na defesa deste projeto agenciando, 
 ilusoriamente, a esperança de dias melhores para todos.
 Por sua parte, as políticas de financiamento internacional 
 para a educação exigem reformas educativas que concebem a educação como mediação 
 para o desenvolvimento econômico pela formação de capital humano ao invés 
 de compreender a educação como mediação do exercício da cidadania - o 
 que supõe não apenas a qualificação profissional, mas o desenvolvimento de 
 habilidades críticas que permitam o exercício das autonomias singulares em 
 meio aos conflitos e contradições sociais com vistas à construção da cidadania, 
 em particular, no desmonte das semioses que agenciam as subjetividades e na 
 singularização dos interpretantes afetivos, energéticos e intelectuais que 
 permitem qualificar os exercícios de liberdade pessoal em sintonia com a expansão 
 das liberdades públicas..
 O mito de que o desemprego se resolve com a educação difunde-se 
 massivamente, embora os que promovam tal difusão saibam que, mesmo havendo 
 a qualificação do conjunto dos excluídos e marginalizados, não haverá lugar 
 para todos no processo produtivo capitalista - o que já se nota pela quantidade 
 de doutores, técnicos e outros profissionais qualificados que não conseguem 
 nele inserir-se.
 Considere-se também que a privatização do ensino e a evasão 
 escolar, premida pela necessidade de o jovem contribuir com o orçamento doméstico 
 em meio à crise do desemprego, provocam exclusões dramáticas de amplos segmentos 
 do acesso ao saber.
 Por fim, os fenômenos de mundialização vem se expandindo, 
 com manifestações culturais locais sendo recuperadas sob a espira do capital. 
 Em contraposição, até o presente momento, ações culturais subversivas através 
 de redes internacionais de comunicação ainda não conseguem, em geral, transitar 
 da interferência cultural para intervenções de caráter político e econômico. 
 
 Em síntese, o desenvolvimento de novas tecnologias e procedimentos 
 educativos, que massivamente interferem no inconsciente das pessoas, possibilita 
 um novo fenômeno hegemônico de condução da organização social, seja nos processos 
 econômicos de produção e consumo, seja nos processos políticos de eleições 
 democráticas. Compreendida basicamente como fator de produção pelos organismos 
 internacionais de financiamento, a educação formal é esvaziada de seu papel 
 qualificador do exercício da cidadania. Mesmo as instâncias tradicionalmente 
 centrais no processo educativo como a família, a escola, as igrejas e os partidos 
 perdem cada vez mais terreno frente às novas mídias que, institucionalmente, 
 estão sob controle de grupos privados capitalistas que tratam a informação 
 e a cultura como mercadoria e não como mediações do exercício ético da liberdade. 
 
 Considerada sob a perspectiva ética, a globalização propõe 
 a iniciativa dos agentes privados em função de seu interesse particular 
 como a referência da conduta que contribui para o bem coletivo, uma vez que 
 a mão invisível do mercado faria com que ao buscar o seu bem privado o indivíduo 
 contribuísse para a realização do bem comum. Desse modo, um individualismo 
 exacerbado atravessa o conjunto das relações sociais e as subjetividades vão 
 ficando cada vez mais insensíveis ao sofrimento alheio. Graças a um solidarismo 
 virtual, os indivíduos podem mesmo discretamente chorar ao assistir um drama 
 semioticamente bem montado sobre crianças em um filme no cinema, mas não se 
 comovem com as crianças sujas que vivem pelas calçadas nas ruas dos centros 
 urbanos, cujo apelo estético está muito longe da beleza cinematográfica. Sob 
 o aspecto da ética, portanto, podemos considerar que um individualismo exacerbado 
 vai se afirmando promovido pelo neoliberalismo. Tal individualismo nega que 
 a promoção da liberdade pública seja um imperativo ético para a conduta privada, 
 desobrigando os indivíduos de preocuparem-se com transformações sociais que 
 visem garantir a cada pessoa as mediações materiais, políticas, educativas 
 e informacionais que lhe permitam exercer eticamente sua liberdade e realizar-se 
 dignamente como um ser humano.
 Alguns estudiosos têm analisado quais são as mais fortes 
 conseqüências desse modelo de globalização para os países do Terceiro Mundo(3). 
 Convém lembrar, todavia, que o processo de globalização inclui também em sua 
 espira de desenvolvimento e enriquecimento algumas regiões dentro dos países 
 do Terceiro Mundo e uma certa parcela da população em meio à totalidade social, 
 razão pela qual o projeto neoliberal é defendido também por certas elites 
 nos países do Terceiro Mundo. As conseqüências que apontamos a seguir consideram 
 o conjunto das relações que afetam a maioria ou todas as pessoas, e não as 
 possíveis vantagens de uma pequena parcela dos setores nacionais que se beneficiam 
 do atual modelo de globalização. Estes itens, com algum cuidado, podem ser 
 generalizados para os países ou regiões do Terceiro Mundo, considerando-se 
 os demais aspectos já analisamos anteriormente, verificando-se a sua ocorrência 
 em níveis variados caso a caso. 
 1) Incorporação de empresas de capital nacional por empresas 
 transnacionais em razão de não suportarem a concorrência, provocando a rápida 
 desativação de várias unidades produtivas em razão destes grupos transnacionais 
 produzirem sob novos procedimentos organizativos e com tecnologias mais avançadas, 
 o que permite a produção de um maior volume de mercadorias com um menor número 
 de trabalhadores empregados;
 2) Subalternização de empresas de capital nacional que 
 são contratadas de modo terceirizado pelas grandes empresas transnacionais 
 que se instalam nos países periféricos e que, tendo uma estratégia mundial 
 de crescimento, podem desativar grandes unidades a qualquer momento, deslocando-as 
 para outras regiões, deixando, assim, as empresas locais terceirizadas à sua 
 própria sorte, provocando graves conseqüências econômico-sociais. 
 3) Com a depreciação do valor das matérias-primas em razão 
 de inovações no setor de tecnologia dos materiais e de engenharia genética, 
 que possibilitam a substituição de inúmeros tipos destas matérias ou a sua 
 produção alternativa, ficam prejudicadas as economias dos países que têm na 
 exportação de matérias-primas sua principal fonte de divisas;
 4) Pressão de déficites na balança comercial dos países 
 periféricos em razão de importação de tecnologias para a modernização do parque 
 produtivo, bem como pela da degradação do valor dos produtos de exportação 
 e, ainda, em razão dos instrumentos de âncora cambial adotados com a finalidade 
 de manter estabilidade
monetária e de não afastar capitais estrangeiros que 
 atuam nos mercados de títulos públicos;
 5) Dependência de tecnologias de ponta, especialmente 
 da tecnologia da informação, ocorrendo significativas queimas de capital para 
 importá-las; contudo, a sua rápida obsoletização exige repetidas importações 
 sucessivas de bens tangíveis e intangíveis mais avançados, o que leva a uma 
 fabulosa sangria de capitais, sem nunca atingir um grau de modernização de 
 ponta nestes setores frente aos países de capitalismo avançado; 
 6) As economias ficam dependentes dos fluxos de capital 
 internacional, sobre os quais não têm autonomia; os fluxos de capitais voláteis, 
 fictícios ou especulativos geram um clima de aparente estabilidade econômica 
 que nada tem de duradoura, podendo gerar fortes crises ao sinal seguro de 
 alterações no câmbio ou na taxa de juros que lhes reduza a rentabilidade;
 7) Enfraquecimento do controle das economias nacionais 
 pelos governos federais, em razão da internacionalização das finanças, bem 
 como, pela acentuada penetração de capitais internacionais; 
 8) Submetimento da economia nacional a variadas oscilações 
 em razão da interdependência dos países nos blocos econômicos e mercados comuns 
 que integram, ocorrendo pressões sobre determinados segmentos econômicos nacionais 
 que ficam prejudicados por esses acordos; 
 9) Acirramento dos desequilíbrios econômicos regionais, 
 em razão das vantagens econômicas comparativas existentes em certas regiões 
 dos países ou blocos que possuem maiores economias de aglomeração, melhores 
 condições de infra-estrutura e maior facilidade de integração regional dentro 
 dos mega-mercados;
 10) Surgimento de ilhas de prosperidade, 
 isto é, de algumas regiões em que o desenvolvimento econômico se acentua por 
 nelas se investirem somas significativas de capital em atividades produtivas 
 modernizadas que alavancam o crescimento local; 
 11) Inchamento de cidades para onde os pobres se deslocam 
 em movimentos migratórios em busca de emprego, assistência pública e melhores 
 condições de vida, pressionando o surgimento de grandes metrópoles e megalópoles; 
 
 12) Ampliação do montante das dívidas externa e interna 
 em razão de empréstimos feitos para equilibrar pagamentos e rolagem de títulos;
 13) Transferência para o exterior de poder sobre importantes 
 decisões econômicas que envolvem investimentos e produção em amplos segmentos 
 econômicos, principalmente os setores mais modernos, que ficam desnacionalizados 
 em razão dos processos de privatizações; 
 14) Perda da soberania das nações em razão de sua subordinação 
 não apenas às regras da OMC, hegemonizada pelos países de capitalismo avançado, 
 mas especialmente de sua subordinação às decisões das empresas industriais 
 e financeiras multinacionais, bem como, aos interesses dos blocos econômicos 
 dos quais o país faça parte;
 15) Exclusão social de significativa parcela da população 
 das diversas regiões dos países, parcela essa que não participa dos resultados 
 do progresso econômico e social que ocorre nas ilhas de prosperidade. 
 
 16) Desemprego em massa, como resultado do processo de 
 modernização dos setores produtivos que se realiza com a finalidade de ampliar 
 os níveis de produtividade e competitividade das empresas nos mercados interno 
 e externo, introduzindo novas tecnologias e sistemas de gerenciamento.
 17) Ampliação da informalidade e de práticas econômicas 
 consideradas contravenção ou imoralidade, como contrabando, pirataria, narcotráfico, 
 prostituição, trabalho infantil, etc.
 18) Retorno de doenças infecto-contagiosas que já haviam 
 sido controladas, por falta de investimentos públicos em saúde e infra-estrutura 
 - água, esgoto, vacinação, etc.
 19) Pressões de devastação ambiental, sendo o meio ambiente 
 degradado tanto pela competição capitalista que busca maximizar lucros diminuindo 
 custos, instalando no Terceiro Mundo as "indústrias sujas" - aproveitando 
 brechas de legislação e fiscalização - quanto para promover alguma melhora 
 imediata à vida das pessoas excluídas dos processo produtivos e da assistência 
 por políticas públicas; 
 20) Decomposição do tecido social ampliando-se as desigualdades 
 sociais na distribuição de renda, no acesso às condições básicas de vida, 
 no acesso e na qualidade de interpretação da informação, etc;
 21) Agravamento dos indicadores da qualidade de vida;
 22) Aumento da violência e criminalidade, em razão das 
 tensões sociais provocadas pela exclusão econômica de significativas parcelas 
 da população com necessidades elementares insatisfeitas e que, concomitantemente, 
 são agenciadas pelas mídias a participarem de processos modelizados de consumo; 
 
 23) Ameaça de convulsões sociais com desdobramentos político-institucionais 
 que podem afetar os regimes democráticos liberais: saques, revoltas contra 
 a ausência de políticas públicas, contra a falta de empregos, etc, podendo 
 haver a ascensão de movimentos nacionalistas de direita que capitalizem tais 
 insatisfações;
 24) Perda nacional de referenciais culturais identificadores, 
 em razão de fenômenos transnacionais de produção de subjetividade em que operam, 
 especialmente, as mídias eletrônicas veiculando mensagens em tempo real pelo 
 mundo todo, e em razão da publicidade que produz imaginários em torno de uma 
 certa configuração de sociedade de consumo; 
 25) Tendência dos regimes políticos tornarem-se mais globalitários, 
 esvaziando-se a democracia de seu caráter de assegurar a liberdade pública, 
 reduzindo-a aos ritos eleitorais com escolhas orientadas pelas mídias, à adoção 
 legislativa de políticas que favorecem os grandes grupos econômicos transnacionais, 
 à implementação executiva da modernização conservadora e ao exercício judiciário 
 de assegurar a legalidade da imposição da nova ordem e, em casos extremos, 
 como vem ocorrendo no Brasil, assegurar o repasse do patrimônio público aos 
 grupos privados, manifestando-se favoravelmente à legalidade de processos 
 de privatização e concorrências entre outros. 
  
 2. O Caso Brasileiro: Da Crise do Desenvolvimentismo à 
 Adoção do Neoliberalismo -
     Aspectos históricos e indicadores sócio-analíticos
 Para compreendermos a situação atual de transformação 
 do Brasil em meio ao cenário da globalização, convém retomar o percurso histórico 
 do país, nas últimas três décadas, considerando alguns aspectos dos projetos 
 econômicos adotados no período.
 O modelo de desenvolvimento implantado autoritariamente 
 durante a última ditadura militar brasileira apoiava-se no fortalecimento 
 do papel do Estado, no endividamento externo, na substituição das importações, 
 na instalação de multinacionais atendendo demandas do mercado interno e na 
 manutenção de superávits na balança comercial, em que a exportação de produtos 
 agrícolas desempenhou um importante papel. A dívida externa que era de US$ 
 3 bilhões em 1964, no início da ditadura, passou a US$ 81,5 bilhões ao seu 
 final, em 1985. Em meados da década de 70 este projeto entrou em crise, surgindo 
 novos atores sociais exigindo, a partir de sua situação imediata, a satisfação 
 de demandas concretas.
 Se no período pós-guerra a economia do país registrou 
 um histórico crescimento do Produto Interno Bruto, em média, de 7% ao ano 
 até a década de 80, tendo o PIB por habitante crescido 4 vezes no período, 
 por outro lado, durante a década de 80 o Brasil permaneceu estagnado. Mesmo 
 com tal estagnação ele continuou sendo o país de industrialização mais avançada 
 no continente
latino-americano, embora não tivesse um projeto de desenvolvimento 
 coerente com o aproveitamento estratégico de seu potencial geo-econômico. 
 
 A década de 80, sob o aspecto do desenvolvimento econômico, 
 ficou conhecida como a década perdida. A estrutura produtiva envelheceu, 
 o fluxo positivo da poupança se inverteu em função da dívida externa que atingia 
 elevados patamares. Naqueles anos a economia brasileira perdeu competitividade 
 e tentou manter posições no comércio exterior valendo-se de recursos como 
 o arrocho salarial e a deterioração do câmbio (desvalorizando a moeda nacional), 
 reduzindo o custo da produção, no primeiro caso, e tornando as mercadorias 
 internacionalmente mais baratas com os dois expedientes, facilitando assim 
 a colocação de produtos brasileiros no mercado externo. O Estado, aos poucos, 
 vai se fragilizando e ficando sem condições de reverter com os expedientes 
 adotados, o quadro de agravamento da situação econômica e social. Neste período 
 verificam-se elevadas taxas inflacionárias e sucessivos planos que tentam 
 contê-las. Tanto a inflação quanto os planos anti-inflacionários, que fracassam 
 um após outro, promovem, em geral, uma concentração de renda ainda maior no 
 Brasil, que se vê às voltas com a hiperinflação no final do anos 80. 
 Na década de 75 a 85 verificou-se o fortalecimento da 
 sociedade civil em contraposição ao Estado autoritário. Vão emergindo e radicalizando-se 
 movimentos eclesiais que lutam por justiça social, movimentos populares, oposições 
 sindicais combativas, que vão retomando as lutas sindicais e Organizações 
 Não-governamentais, em particular, os centros de defesa dos direitos humanos 
 e organizações voltadas à educação popular. Das questões imediatas e específicas 
 como o custo de vida, a demanda por creches, o arrocho salarial, a situação 
 da educação e outras, estes movimentos vão ganhando uma conotação mais política, 
 surgindo grandes mobilizações nacionais, como as que se articularam em torno 
 da luta pela anistia e da luta pelas eleições diretas para presidente.
 Com o desgaste da ditadura, surgem projetos alternativos 
 de desenvolvimento: o neoliberalismo empunhado pelas elites dominantes 
 e o socialismo democrático e ecológico, defendido pelos setores populares. 
 
 O governo do presidente José Sarney (1985-1989), caracterizou-se 
 como o início da transição do modelo de desenvolvimento autoritário estatal 
 para o liberal, mas não foi essencialmente nem uma coisa, nem outra. Seu "liberalismo" 
 que atingiu a esfera política e ensaiou os primeiros passos no campo econômico, 
 efetivou-se praticamente como um regime de caráter populista, com forte intervenção 
 estatal. Tanto sob o modelo autoritário que saía de cena, quanto sob o modelo 
 neoliberal que começava a se implantar, cresceu e crescia no país a concentração 
 de renda, a marginalização social e a favelização das cidades - mesmo considerando-se 
 o desenvolvimento econômico da primeira etapa da ditadura, quanto o breve 
 surto econômico provocado pelo Plano Cruzado no Governo Sarney. A inflação 
 de preços subia em níveis alarmantes e seu combate serviu de justificativa 
 para medidas promotoras dos interesses das elites em detrimento da qualidade 
 de vida das camadas populares.
 Em 1989, com a eleição de Fernando Collor de Mello, tem-se 
 o fim de um ciclo de confronto entre o projeto neoliberal e o socialismo democrático, 
 sendo vitorioso o projeto neoliberal que propunha o livre mercado e menos 
 Estado. Ainda naquele ano, em Washington, foram sistematizadas as principais 
 propostas do programa neoliberal em um seminário com o título Latin American 
 Adjustment: How Much Has Happened, do qual participaram funcionários do 
 governo dos Estados Unidos e de organismos financeiros internacionais ali 
 instalados: o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e o Banco Interamericano 
 de Desenvolvimento. As conclusões desse encontro acadêmico, que não possuía 
 caráter deliberativo, passaram a ser denominadas informalmente por Consenso 
 de Washington(4). Elas ratificaram a proposta neoliberal, 
 que o governo norte-americano vinha defendendo, como condição necessária para 
 que qualquer país pudesse receber cooperação financeira externa bilateral 
 ou multilateral. A partir de então as políticas econômicas brasileiras buscaram 
 ajustar-se a esse modelo, como forma de obter financiamentos internacionais. 
 
 Em síntese o programa neoliberal apontava para os seguintes 
 pontos. a) A necessidade das privatizações, deixando o mercado ao livre jogo 
 dos agentes privados, gerando com a venda das empresas recursos que seriam 
 necessários ao equilíbrio das contas governamentais na fase dos ajustes estruturais. 
 b) Uma tributação mínima e regressiva, bem como o aumento da base de tributação 
 e a redução de impostos sobre os agentes econômicos, isto é, os possuidores 
 de grandes fortunas e os pobres pagariam as mesmas taxas de impostos, estendendo 
 a cobrança de impostos a segmentos pobres que antes estavam isentos, ao passo 
 que seria diminuída a cobrança de impostos das empresas. c) Abertura a importações 
 e investimentos estrangeiros, uma vez que o protecionismo de mercado seria 
 ineficiente tanto para captar recursos quanto para satisfazer os interesses 
 do consumidor nacional. O protecionismo inibiria a inserção competitiva do 
 país na economia mundial. O investimento estrangeiro direto complementaria 
 a poupança nacional necessária ao desenvolvimento e traria novas tecnologias, 
 aumentado a competitividade do país. d) Quanto ao regime cambial e política 
 monetária, o Consenso de Washington apontava a necessidade de estimular exportações 
 e inibir importações. Afirmava, contudo, que durante a fase de estabilização 
 econômica era válida a vinculação da moeda nacional a uma "âncora externa", 
 mesmo correndo o risco de uma sobrevalorização monetária. Esta política, que 
 era indicada como exceção, tornou-se posteriormente a praxe de dolarização 
 para a estabilização econômica.
 O projeto neoliberal, que saíra vitorioso das urnas brasileiras 
 graças, em grande medida, ao emprego político de técnicas semióticas de produção 
 de subjetividades - operadas em particular pela TV Globo, como veremos na 
 próxima seção - implantou-se no Governo Collor, apresentando-se como um programa 
 de desenvolvimento e modernização e provocando significativas mudanças na 
 economia do país. Tal projeto subordinou o Brasil ao modelo de "modernização 
 conservadora", estabelecido pelas pressões do capital globalizado internacional, 
 e acelerou a abertura da economia do país. Seguindo a linha neoliberal hegemônica, 
 este governo buscou uma posição mais fortalecida de inserção internacional, 
 participando ativamente na constituição do Mercosul, que foi criado pelo Tratado 
 de Assunção em 1991, mas que passou a existir de fato em 1995(5). 
 
 O Governo Collor diminuiu a capacidade reguladora do Estado 
 e fez inúmeras concessões ao FMI, Clube de Paris e credores internacionais. 
 Realizando ondas recessivas, visando combater a inflação, colocou em risco 
 a capacidade industrial e produtiva do país. Após dois anos deste governo, 
 o Brasil passou a viver uma das crises mais agudas de sua história.
 O processo de impeachment sofrido por Fernando Collor 
 (1992) em razão dos esquemas de corrupção, estabeleceu-se como um momento 
 de crise política conjuntural em que os setores da elite remanejaram suas 
 composições de força para a continuidade do mesmo projeto hegemônico. No Governo 
 Itamar Franco, nada de significativo foi mudado nas políticas
que vinham sendo 
 implantadas durante a gestão anterior. O receituário monetarista permaneceu, 
 com taxas de juros elevadas. O combate do déficit público realizou-se às custas 
 da precarização dos serviços prestados pelo Estado - afetando também as áreas 
 da saúde e educação - e com a introdução do Imposto Provisório sobre Movimentação 
 Financeira. Algumas iniciativas voltadas aos aposentados, aos indigentes e 
 à recomposição dos salários, foram mais de caráter administrativo e de gerenciamento, 
 no primeiro caso, e para efeitos de marketing nos dois últimos, uma vez que 
 ações efetivas requeridas pelas demandas reais não foram implementadas(6). 
 Fernando Henrique Cardoso, que assumiu o Ministério da 
 Fazenda do governo Itamar Franco, adotou as proposições do consenso de Washington, 
 organizando um plano econômico que estabilizou a moeda - com base na adoção 
 da âncora cambial, na elevação das taxas de juros, na introdução de um mecanismo 
 de conversão de preços (a Unidade Real de Valor, URV), na contenção dos salários 
 e no corte dos gastos do governo com políticas públicas. O capital político 
 adquirido com o controle da inflação garantiu a Fernando Enrique sua eleição 
 ao primeiro mandato na presidência nacional (1994-1998), período em que buscou 
 realizar um conjunto de reformas estruturais, entre outras: a Reforma 
 da Previdência, alterando os critérios para aposentadoria por tempo de 
 serviço, diminuindo o gasto com benefícios; a Reforma Tributária e Fiscal, 
 buscando ampliar a arrecadação pelo aumento da base tributária, isto é, do 
 número de pessoas que pagam impostos, bem como, reduzindo o número e o valor 
 de impostos sobre as empresas; a Reforma Econômica, buscando privatizar 
 as empresas e serviços estatais; e a Reforma Política, tanto aprovando 
 a possibilidade de reeleição do presidente, governadores e prefeitos, quanto 
 reduzindo as atribuições do Estado, bem como, visando promover uma reforma 
 eleitoral com a introdução do voto distrital misto, entre outros aspectos.
 A sobrevalorização do câmbio fez com que os produtos 
 importados ficassem muito baratos, o que ajudou a pressionar a queda da inflação 
 com o expediente das importações, mas também fez cair as exportações do país 
 tornando a balança comercial deficitária. Um estudo comparativo, considerando 
 vários indexadores no país, destacou que embora o dólar comercial estivesse 
 cotado - em 14 de novembro de 1997 - a R$ 1,1080 para a venda, ele deveria 
 ser reajustado entre R$ 1,24 e R$ 1,66(7). Conforme dados da fundação Centro de Estudos do Comércio 
 Exterior - FUNCEX, considerando a taxa de câmbio do real frente ao dólar, 
 iene, moedas européias e latino-americanas, em setembro de 1997 o real estaria 
 defasado 17,1% em relação do dólar, considerando-se a defasagem ocorrida desde 
 o início do Plano Real. Contudo, considerando-se os patamares prévios de 1991/92, 
 a defasagem alcançava 22,7%, uma vez que na véspera do real já havia uma defasagem 
 do câmbio - o que possibilitou o jogo de marketing político eleitoral ao fazer 
 um real valer mais que um dólar.
 A contenção dos salários, que sofreram perdas quando 
 da conversão à nova moeda, visava também inibir o consumo e evitar a inflação. 
 O poder de compra real dos salários ficou congelado por um ano a partir da 
 conversão do Cruzeiro Real pelo Real em julho de 1994, enquanto a inflação, 
 apenas em julho e agosto daquele ano, somou 12%. Em seu conjunto, o plano 
 econômico provocou perdas ainda maiores. Quando os salários foram convertidos 
 para URV(8) as perdas salariais variam de 26,91% a 47,50% 
 dependendo da categoria profissional e da data base de negociação salarial; 
 os trabalhadores de renda mais baixa, os 25% mais pobres, receberam em março 
 de 1994 um dos salários reais mais baixos dos últimos dez anos, cerca de 54% 
 do salário médio recebido em 1985. De março a junho houve uma inflação em 
 URV de 9% que também não foi incorporada ao salário. O salário mínimo, por 
 sua vez, perdeu 10,8% após a implementação da URV até a virada do Real.(9) 
 A perda salarial fica clara quando comparamos o valor do salário estabilizado 
 em URV com a elevação do preço da cesta básica que custava em dezembro de 
 1993 o valor de 80,79 URVs, passando a custar 97,33 URVs em abril e chegando 
 a R$ 110,00s em julho. O próprio então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique 
 Cardoso, reconheceu que havia ocorrido perdas salariais e sugeriu a concessão 
 de abono.(10) 
 A elevação das taxas de juros inibiu o consumo 
 contribuindo com a estabilização dos preços e atraindo capital externo para 
 equilibrar a balança de pagamentos, mas provocou um alto nível de inadimplência, 
 a quebra de muitas pequenas empresas, o aumento do desemprego e uma elevação 
 fabulosa da dívida interna do governo brasileiro. Nos períodos de sobressalto 
 econômico internacionais, os juros foram elevados a patamares ainda mais superiores. 
 Pequenos negociantes passaram, então, a liquidar seus estoques queimando capital 
 de giro para saldar suas dívidas. As mídias, entretanto, mostravam as liquidações 
 como um dos benefícios do plano econômico aos consumidores, pois teria provocado 
 a concorrência entre os comerciantes, melhorando a vida de todos os brasileiros. 
 
 Com efeito, o crédito ao consumidor e os saques de poupança 
 foram os principais vetores para o incremento do consumo popular após a estabilização 
 da moeda. Com a elevação dos juros, que ocorreu após a crise do México, elevou-se 
 acentuadamente o nível de inadimplência que cresceu 135% em fevereiro de 1995 
 em relação a fevereiro de 94, em São Paulo.(11) No ano 
 de 1997, a Associação Comercial de São Paulo, constatou que quase 20% dos 
 consumidores não estavam pagando pontualmente os carnês de crediário e que 
 os cheques sem fundos atingiam 20 milhões de unidades naquele ano, contra 
 12 milhões em 1996 e 11,6 milhões em 1995.(12) O percentual 
 de cheques sem fundo no primeiro trimestre de 1997, acusou o maior nível já 
 registrado no Brasil.(13) As causas da inadimplência 
 de consumidores finais estavam ligadas, principalmente, ao desemprego, descontrole 
 de gastos, diminuição de renda (ver Figura 1). 
 
 
 
 
 Sofrendo as consequências do não recebimento por vendas 
 já realizadas, os comerciantes também tornaram-se inadimplentes junto a fornecedores 
 e, por fim, teve-se a elevação do desemprego (ver figura 2), a quebra 
 de muitas empresas ou sua incorporação por empresas internacionais.
 
 Figura 2 - Taxa Média de Desemprego Aberto Total, Período 
 - 1995/1998 - Mês De Janeiro
 
 
 
                              
 Fonte: IBGE
 
 A elevação das taxas de juros ampliou a própria 
 dívida interna do governo, uma parcela da qual se refere à remuneração 
 do capital investido em títulos públicos por especuladores internacionais. 
 Com a alta de juros promovida em março 95, para enfrentar possíveis desdobramentos 
 da crise do México, as taxas dos títulos públicos ultrapassaram aos 50% anuais 
 em valores reais acima da inflação, ao passo que durante a crise dos Tigres 
 Asiáticos as taxas subiram nominalmente de 20,7% para 43,7% ao ano(15) 
 ou 37,5%, em juros reais, não havendo taxas de juros comparáveis a essas em 
 todo o mundo. Um editorial da Folha de São Paulo, em maio de 1995, sobre a 
 taxa de juros praticada no país afirmava o seguinte: "supondo-se que 
 até o final do ano o governo ofereça ao mercado, para continuar com a bomba-relógio 
 no colo, as taxas médias atuais de cerca de 4% ao mês, o dispêndio com juros 
 terá sido de mais de US$ 40
bilhões, ou seja, o suficiente para pagar por 
 mais de dez anos todas as internações hospitalares do INAMPS..." - Instituto 
 Nacional de Assistência Médica e Previdência Social(16). 
 
 Como destacou o economista Paulo Nogueira Batista Jr, 
 considerando-se as taxas de juros de curto prazo fixadas a partir de 31 de 
 outubro de 1997, enquanto no Brasil têm-se 37,5% ao ano, "nos países 
 do G-7 (EUA, Canadá , Japão, Alemanha, França, Itália e Reino Unido) a taxa 
 real média é 2,9 % variando entre o mínimo de 0,5% no Japão e o máximo de 
 5,4% na Itália. Os juros reais brasileiros são, portanto, 13 vezes maiores 
 do que os juros médios nos principais países desenvolvidos."(17) Por outra parte, se compararmos as taxas reais de juros 
 praticadas no Brasil em relação ao conjunto dos "mercados emergentes", 
 considerando-se os juros básicos de curto prazo, apresentados na tabela 
 3, perceberemos que somente cinco outros países mantém taxas de juros 
 anuais na casa dos 10% ou acima. 
       
 Se a queda da taxa de juros tende a ser - sob a lógica 
 do governo - lenta e gradual, levando a previsões de que estaria em 15% em 
 2001, conforme Ives Gandra Martins(19), a sua contrapartida 
 está em que a dívida mobiliária do país saltou gigantescamente de R$ 61,8 
 bi em junho de 1994 para R$ 304,9 bi em julho de 1998, experimentando um ligeiro 
 declínio dois meses depois (ver figura 3).
 Figura 3 - Divida Mobiliária da União -Valores em bilhões 
 de reais
   
                                                     
 Fonte: M. da NÓBREGA(20)
 Esta dívida mobiliária do governo federal é, contudo, 
 somente uma parte da dívida pública, tendo crescido também pela absorção de 
 dívidas estaduais, por uma explicitação de dívidas assumidas anteriormente 
 por outros governos e que eram contabilizadas de outro modo, bem como pela 
 acumulação de reservas internacionais. Assim, a queda da dívida verificada 
 entre julho e setembro de 1998 deveu-se à fuga de capitais do país em razão 
 da crise internacional e do temor dos aplicadores que o governo realizasse 
 uma desvalorização cambial. Embora alguns argumentem que a dívida tenha aumentado 
 cinco vezes no Brasil desde de 1994, crescendo R$ 240 milhões por dia(21), 
 outros economistas citando dados do Banco Central, preferem destacar que a 
 dívida líquida total variou "de 31,2% para 38,4% do PIB entre julho de 
 1994 e agosto de 1998, devendo chegar perto dos 50% do PIB em três anos."(22) 
 Fato é que em 1998 o governo gastou cerca de R$ 70 bilhões em pagamentos de 
 juros da dívida interna, ao passo que todos os recursos destinados ao pagamento 
 de benefícios da previdência social somam R$ 53,8 bilhões(23).
 A desconfiança do mercado quanto ao futuro da economia 
 do país, entretanto, fez com que a procura pelos títulos públicos que são 
 indexados à variação do câmbio. Em janeiro de 1997, estes títulos representavam 
 10,3% do total da dívida, passando a 29,5% em novembro de 1998(24).
 O Brasil permanece atado, ainda, a uma outra dívida, a 
 dívida externa que passou a crescer acentuadamente a partir da ditadura 
 militar, quando os acordos e o destino do dinheiro não foram discutidos com 
 o legislativo ou com a sociedade. Uma parcela deste dinheiro financiou obras 
 de infra-estrutura e integração nacional que contribuíram para o desenvolvimento 
 econômico dos anos 70; outra parte foi empregada em despesas militares em 
 geral, na compra de armamentos e desenvolvimento de tecnologia bélica; estima-se 
 que outro montante foi desviado para contas privadas em paraísos fiscais e, 
 por fim, que outras parcelas tenham engordado os cofres de empreiteiras com 
 o superfaturamento de obras faraônicas por elas realizadas naquele período. 
 Com o aumento das taxas internacionais de juros que incidiam sobre esta dívida 
 no fim da década de 60 - que de 4,5% saltaram para 21,5%, tendo em vista combater 
 a inflação nos países ricos - a dívida externa do Brasil elevou-se para valores 
 estratosféricos. Somente de 1975 a 1990 o Brasil pagou US$ 100 bilhões de 
 juros e serviços, mas a dívida que era de US$ 25 bilhões em 75, passou a US$ 
 115 bilhões em 1989 e a U$ 159 bilhões em 1995. De 1994, quando Fernando Henrique 
 era Ministro da Fazenda, até 1998, quando encerrou seu primeiro mandato presidencial, 
 o país pagou aproximadamente U$ 62 bilhões de dólares em juros e serviços 
 da dívida externa - ver figura 4. 
 Figura 4 - Pagamento de Juros da Dívida Externa - Valores 
 em bilhões de US$
 
                                                               
 * Estimativa
                                                                
 Fonte: Banco Central / Sobeet(25)
 Na última negociação com o FMI o governo assumiu novos 
 compromissos sobre o tema. Conforme o governo, "a dívida externa brasileira 
 não é muito elevada com relação ao PIB (29%) e seu prazo médio de vencimento 
 é relativamente longo. O componente do setor público na dívida externa representa 
 não mais do que um terço do total, e a dívida a curto prazo do setor público 
 é inferior a US$ 6 bilhões. É intenção do governo - segundo ele mesmo - manter 
 o aumento da dívida pública do setor externo dentro de limites prudentes, 
 em torno de US$ 10 bilhões em 1999. É também intenção do governo promover 
 uma prorrogação gradativa do vencimento médio do total da dívida externa, 
 conforme as condições do mercado permitirem."(26) 
 
 Considerando o conjunto dos gastos federais em 1995 (R$ 
 251,5 bilhões) percebe-se que significativa parcela refere-se ao serviço da 
 dívida pública federal interna e externa (R$ 117,6 bilhões) ao passo que a 
 parcela destinada ao gasto social federal foi inferior a esta (R$ 79,0 Bilhões) 
 - ver figura 5.
 
 Figura 5 - Produto Interno Bruto, Gasto Federal e Gasto 
 Social (R$ bilhões) - 1995
 
 
                   
 PIB - Produto Interno Bruto
                          
 GF - Gasto Federal
                          
 GFED - Gasto Federal (exclusive Serviço da Dívida Pública Federal)
                          
 GDPF - Gasto com o Serviço da Dívida Pública Federal
                          
 GSED - Gasto Social Federal ( exclusive Serviço da Dívida Pública Federal) 
 
                          
 Fonte: IBGE(27)
 Este quadro de sobrevalorização do câmbio, a elevação 
 das taxas de juros, a abertura às importações e a facilitação de movimentos 
 ao capital internacional, somada às inadimplências de consumidores finais 
 e comerciantes e à falta de financiamento à produção interna vem provocando 
 a subordinação do país aos capitais internacionais.
 Os investimentos estrangeiros diretos cresceram 
 no país de US$ 2,1 bilhões em 1994 a US$ 23 bilhões em 1998 (ver figura 6). 
 
 
 Figura 6 - Investimento Estrangeiro Direto - Valores em 
 Bilhões de Dólares
 
 
                                                     
 * Projeção 
                                                      
 Fonte: Banco Central e Sobbet(28)
 Aumentou também a participação do capital estrangeiro 
 no patrimônio líquido das empresas de US$ 65,9 bilhões para US$ 129, 4 
 bilhões em igual período - como mostra a figura 7. Inúmeras empresas nos setores 
 de indústria, comércio e serviços estão sendo incorporadas por empresas estrangeiras.
 
         Figura 7 - Participação 
 do Capital Estrangeiro no Patrimônio Líquido das Empresas -
                          
 Valores em Bilhões de Dólares
 
 
                                                        
 * Projeção
Fonte: Sobbet(29)
 Já os investimentos estrangeiros em bolsa e renda fixa 
 também cresceram no período de US$ 25,2 bilhões em 1994 a US$ 38,4 bilhões 
 em 1998, tendo atingido o pico de US$ 53,3 bilhões em 1997 (ver figura 8).
 Figura 8 - Investimento Estrangeiro em Bolsa e Renda 
 Fixa - Valores em Bilhões de Dólares
 
                       
 * Estimativa
                        
 Fonte: Sobbet(30)
 O movimento de fusões e aquisições de empresas 
 no Brasil tem feito surgir segmentos com alta concentração acima dos padrões 
 de mercado das economias avançadas. Para ter-se uma noção do que isto significa, 
 basta citar que os grupos Cragnotti & Partners e Gessy Lever 
 dominavam, em 1994, 90% de toda a produção de detergentes líquidos no Brasil(31). 
 Um estudo do IPEA constatou uma alta concentração oligopolizada em vários 
 outros setores do mercado no país(32). Utilizou-se, 
 neste estudo, o Índice Herfindhal Hirschman, que é calculado tomando por referência 
 a participação das empresas na receita global do mercado. Conforme este indicador, 
 considera-se desconcentrados os segmentos que atinjam um índice de até 1.000, 
 moderadamente concentrados os que ficam entre 1.000 a 1.800 e, por fim, extremamente 
 concentrados aqueles setores que têm um índice superior a 1.800. Sobre dados 
 de 1994, o IPEA constatou que, no Brasil, "no segmento de copiadoras 
 o índice chega a 9.224 (5,2 vezes o que os EUA consideram extremamente concentrado). 
 Nos mercados de computadores, baterias e montadoras de automóveis, o índice 
 ultrapassa 4.000. Nos segmentos de lâmpadas, máquinas de escrever, cobre, 
 higiene e limpeza, aços planos, elevadores, condutores elétricos e aços laminados, 
 o índice é superior a 3.000." Outros setores com índice de concentração 
 superiores ao considerado razoável nos Estados Unidos, são: metalurgia, torneiras/chuveiros/aquecedores, 
 tratores e colheitadeiras, freios e componentes, eletrodomésticos e centrais 
 telefônicas.
 Assim, por exemplo, Fiat, Valmet e Maxion respondem por 
 87% das vendas de equipamentos agrícolas. De outra parte, "a fusão da 
 Brasilit com a Eternit, que constituíram uma nova empresa chamada Eterbrás, 
 fez com que elas concentrassem 68% do mercado interno de caixas d'água e telhas 
 de amianto." Na área química, o estudo do IPEA "cita a fusão da 
 Rhodia com a Cia. Alcooquímica Nacional, através da qual as duas passaram 
 a deter 84,7% da produção de ácido acético." Conforme Lúcia Helena Salgado, 
 economista daquele Instituto, "as fusões e aquisições [no Brasil] têm 
 sido aprovadas sem maior análise econômica, sem apontar benefícios e riscos" 
 - sendo, grande parte delas, aprovada por decurso de prazo(33). 
 A Lei Antitruste, que foi aprovada em junho de 1994, por sua vez, previa punições 
 quando as empresas, que passaram por processos de fusão, não cumprissem determinadas 
 metas que haviam sido estabelecidas. 
 Este processo de fusões têm reflexo, em certos setores, 
 no aumento de importações. No caso das esponjas de aço, a 3M é, potencialmente, 
 o maior concorrente do grupo Cragnotti & Partners no Brasil, que respondeu 
 por 94% de todas vendas neste segmento em 1994. Com a redução das alíqüotas 
 de importação, a 3M, teria melhores condições para importar o Esponjaço 
 de sua matriz nos Estados Unidos, para concorrer com o Bombril que 
 é da Cragnotti & Partners. Por outra parte, conforme o gerente de marketing 
 da Phillips, Isac Roizenblatt, cerca de 20% das lâmpadas para faróis de automóveis 
 que, em 1994, eram utilizadas no mercado brasileiro, já eram importadas, o 
 que, segundo ele, estaria obrigando os fabricantes no país a investir buscando 
 melhorar a produtividade(34). Contudo, como os grupos 
 fabricantes do país são os mesmos do exterior, uma vez que esse é o segmento 
 mais concentrado do mundo, o resultado dessa "livre-concorrência" 
 com a entrada de produtos externos é a redução da produção interna, com a 
 conseqüente geração de desemprego no país. Se é possível importar lâmpadas 
 de qualquer marca, porque uma empresa multinacional investiria no Brasil para 
 enfrentar a importação de lâmpadas de seu concorrente, se suas próprias lâmpadas 
 - fabricadas em unidades produtivas mais sofisticadas em outras partes do 
 mundo - também poderiam ser importadas por um valor final mais baixo do que 
 o de sua produção no país, resultando-lhe assim um lucro ainda maior do que 
 se as fabricasse no Brasil ? 
 Assim, as importações continuam superando crescentemente 
 as exportações, com um déficit persistente na balança comercial (ver figura 
 9).
 Figura 9 - Importações e Exportações Brasileiras - Percentual 
 em relação ao PIB
 
                                           
 Fonte: IBGE(35)
 No período de 1994 a 1998 também cresceram as remessas 
 de lucro para o exterior de US$ 2,9 bilhões para US$ 7,1 bilhões (ver 
 figura 10). 
 Figura 10 - Remessas de Lucro para o Exterior -Valores 
 em Bilhões de Dólares
 
 
                                             
 * Previsão
                                              
 Fonte: Sobeet(36)
 Por fim, as reservas internacionais do país, após 
 crescerem entre 1994 e 1996, vem experimentando uma progressiva regressão, 
 chegando a US$ 41,6 bilhões em outubro de 1998 - ver figura 11.
 Figura 11 - Reservas Internacionais Brasileiras - Valores 
 em Bilhões de Dólares
 
                                           
 * Valor de outubro
                                           
 Fonte: Banco Central(37)
 A submissão aos agentes financiadores externos é cada 
 vez maior. No último acordo com o FMI, para assegurar um empréstimo de US$ 
 41,5 bilhões ao país, o governo brasileiro assumiu a meta de limitar o déficit 
 nominal das contas públicas nacionais - incluindo os resultados fiscais da 
 União, dos Estados e dos municípios (considerando-se o resultado primário, 
 isto é, as receitas menos as despesas, bem como os desembolsos realizados 
 com o pagamento de juros da dívida interna) - que atualmente giram na casa 
 de 8% do PIB, a um patamar de 4,7% em 1999, a uma cifra um pouco superior 
 a 3% no ano 2000 e de 2% em 2001(38). 
 Para cumprir o acordo feito com o FMI o governo terá que cortar gastos. 
 Como o corte de gastos não pode afetar o pagamento de juros da dívida mobiliária, 
 novamente serão penalizadas as áreas sociais. Conforme o economista Aloizio 
 Mercadante, 
 
"O socorro financeiro [negociado com o 
 FMI] terá um custo elevado e contrapartidas que apontam para aprofundar 
 o ajuste neoliberal, mantendo a abertura comercial, financeira, 
 privatizações e agora a implantação da segunda geração de reformas 
 sociais, com o ataque aos direitos trabalhistas e privatização da 
 Previdência Social."
 "A linha de crédito... recomporá as reservas, 
 permitindo a manutenção da âncora cambial. As privatizações de Petrobrás, 
 parte importante do Banco do Brasil e Banespa e saneamento básico, 
 acompanhadas da desregulamentação do mercado de trabalho e desorganização 
 sindical, devem assegurar a margem de manobra para dar continuidade 
 ao ajuste estrutural neoliberal do país."
 "O instrumento principal dessa estratégia 
 são os juros elevadíssimos e o pacote fiscal. Cortes de R$ 12,2 
 bilhões no gasto público, tendo como alvo o funcionalismo público, 
 investimentos em infra-estrutura e a área social. O corte de R$ 
 8,7 bilhões nos gastos
correntes e de capital representam 20% de 
 todas as despesas e incluem educação e saúde."(39) 
 
 
 
 
 
 
 Neste quadro, a política de privatizações tem como 
 finalidade ampliar a participação do capital externo no país, reduzir gastos 
 e abater a dívida interna(40). De 1994 a 1998 foram 
 privatizadas 39 empresas estatais. Contudo, as privatizações realizadas 
 desde 1991 até dezembro de 1997, renderam ao governo R$ 37,6 bilhões, em dinheiro 
 vivo ou títulos públicos - valor bastante inferior ao volume da dívida interna 
 contraída no período. A privatização da empresa Vale do Rio Doce por R$ 3,1 
 bilhões, é um signo da política neoliberal implementada no Brasil. A Vale 
 é a maior empresa exportadora do país e gerava, anualmente, um lucro superior 
 a R$ 500 milhões. Com sua venda o governo visava abater 1,5% da dívida pública(41). 
 Normalmente se justificam as políticas de privatização 
 e de redução do Estado afirmando-se que elas são necessárias para que o governo 
 possa gastar mais ou melhor com saúde, educação e programas sociais. Sob a 
 lógica do ajuste estrutural da economia, entretanto, todo o dinheiro adquirido 
 com as privatizações das empresas estatais, acabou desaguando no buraco negro 
 da dívida interna, que mantém estável o valor do Real. Em 1994, por exemplo, 
 o governo gastou R$ 7 bilhões com a saúde, ao passo que no mesmo período a 
 conta dos juros para a União, estados e municípios foi de R$ 20,3 bilhões, 
 três vezes mais que o gasto com saúde(42). 
 Os cortes nos gastos governamentais atingem, em 
 geral, as políticas públicas ao passo que os gastos no pagamento de juros 
 aumenta a cada dia. Em 1988 e 1989, antes de o programa de privatizações iniciar, 
 o governo federal gastava mais com saúde e educação. Em 1988, foram destinados 
 US$ 18,9 bilhões para essas áreas, ao passo que em 1989 foram US$ 19,8 bilhões. 
 Em 1995, contudo, o governo gastou US$ 17,8 bilhões com educação e saúde(43). 
 De 1995 para 1996, o governo cortou mais 8,6% na área da educação e cultura 
 e 10,3% na área da saúde e saneamento, conforme o relator do senado que avaliou 
 tanto as contas do governo quanto as análises do Tribunal de Contas da União 
 sobre as mesmas. O resultado dessa política é que ações básicas de saúde, 
 como a vacinação e prevenção a epidemias, por exemplo, ficaram prejudicadas. 
 Em 1996 caiu o número de bebês vacinados, uma vez que faltaram verbas, inclusive 
 para campanhas de rádio e TV (44). Por sua vez, em 1998, 
 segundo a previsão orçamentária, as pastas da área social perderam R$ 993 
 milhões em recursos, porque o governo teve de cortar gastos na ordem de R$ 
 6,3 bilhões do orçamento como um todo, em razão do pacote lançado para atenuar 
 os efeitos no Brasil da crise das bolsas asiáticas (45). 
 Assim embora o programa de privatizações continue avançando, destina-se cada 
 vez menos recursos às políticas sociais e às áreas de saúde e educação. 
 Conforme análise dos movimentos sociais, considerando-se 
 o total dos gastos do governo federal em 1998, o dispêndio com servidores 
 públicos representa 10%, os juros da dívida externa 8%, e os recursos destinados 
 a hospitais, estradas, escolas, apenas 1%. Todavia, aproximadamente 60% dos 
 gastos visam o pagamento da dívida interna(46). 
 Segundo outros analistas, o corte previsto no final de 
 1998 na ordem de R$ 25 bilhões nos gastos do governo significa um corte equivalente 
 ao montante de "todas as despesas do Estado, descontados os benefícios 
 da Previdência, os salários dos servidores e o pagamento dos juros"(47). 
 
 Os cortes atingiram também o funcionalismo público que 
 não tem reajuste há vários anos, com vencimentos corroídos pela inflação. 
 Com as privatizações, com a política de demissões voluntárias, com a não substituição 
 de todos os funcionários que se aposentam e com a terceirização dos serviços 
 públicos, o quadro de funcionários civis do executivo e das estatais federais 
 que era de 1.216.058 em 1994, caiu para 886.818 em 1998.(48)
 Embora todos esses cortes nas áreas de saúde, saneamento, 
 educação, cultura e outras, os gastos do governo em reais aumentaram na primeira 
 gestão de Fernando Henrique, mesmo desconsiderando-se os dispêndios com pagamentos 
 de juros. A elevação do montante gasto com seguro-desemprego e com a previdência 
 social, entre outros, fizeram os gastos do governo subir em R$ 50 bilhões, 
 aproximadamente, de 1995 a 1998(49). A figura 12 mostra, 
 entretanto, com dados de 1995, que a participação dos gastos com previdência 
 é muito superior ao dos demais setores do gasto social federal. 
 Figura 12 - Gasto Social Federal* por setores (R$ bilhões)* 
 - 1995 
 
                                              
 * Exclusive Serviço da Dívida Pública Federal
                                              
 ** R$ dezembro 1995
                                              
 Fonte: IBGE(50)
 
 Quando analisados em reais, sem levar em conta a inflação 
 do período, alguns afirmam que, em seu conjunto, as áreas de saúde, educação, 
 reforma agrária, saneamento e habitação passaram a receber mais em recursos, 
 entre 1995 e 1998.(51) Contudo, considerando-se cada área em particular e corrigindo-se 
 os valores tendo em consideração a inflação desses quatro anos, percebe-se 
 que a generalização dessa totalização para os elementos que a compõem acoberta 
 diferenças induzindo a erros de apreciação.
 Fazendo-se um balanço geral sobre a concentração de 
 riqueza e exclusão social nesses dez anos de ajustes do Brasil à nova 
 ordem globalitária, percebe-se que o quadro da pobreza no país tornou-se mais 
 dramático. Em 1990 a situação de distribuição de renda já era crítica, sendo, 
 o Brasil, o país de maior concentração de renda na América Latina. 
 Aproximadamente 44% dos pobres do continente latino-americano vivia em território 
 brasileiro, embora o país tivesse apenas um terço da população da região. 
 Aumentavam os seus pobres, diminuindo a participação deles na apropriação 
 da renda nacional. Em 1980, os 20% mais pobres tinham 2,6% da riqueza do país; 
 em 1989, detinham só 2,1%. O quadro geral da concentração de renda em 1990 
 era o seguinte: enquanto 50% dos mais pobres ficavam com 11,2% da renda nacional, 
 os 10% mais ricos ficavam com 49,7%, sendo que o 1% mais rico ficava com 14,6% 
 da renda nacional(52). Conforme dados do IPEA, em 1994 aproximadamente 22% da 
 população do Brasil (cerca de 32 milhões de pessoas) não tinham suas necessidades 
 alimentares atendidas, vivendo em situação de indigência. Aproximadamente 
 40% das famílias possuíam uma renda per capita de 0,5 salário mínimo e outros 
 15% de famílias uma renda per capita de 0,25 salário mínimo.
 Considerando-se os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares 
 realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística para os anos 
 de 1987 e 1996 - mesmo considerando-se a alteração metodológica nesta última 
 - percebe-se claramente a elevação do número de famílias pobres no Brasil 
 (ver figura 13). Conforme a amostragem, enquanto o número total de famílias 
 cresceu 14%, o número de famílias mais pobres cresceu 28%. 
 
 Figura 13 - Famílias por Faixa de Renda (em salários mínimos)
 Números Absolutos, Participação Relativa e Variação no Período
 
 
    Fonte: Pesquisas de Orçamentos 
 Familiares IBGE(54)
 Considerando particularmente o aspecto da alimentação, 
 percebe-se como é dramática a desigualdade na distribuição de renda no Brasil 
 (ver tabela 4). Uma família com rendimento de até dois
salários mínimos gastava 
 no ano de 1996, em média, R$ 77,74 por mês com alimentação, ao passo que uma 
 família com renda superior a 30 salários mínimos gastava em média, por mês, 
 R$ 507, 96 com alimentação; não apenas a quantidade e variedade, mas especialmente 
 a qualidade dos alimentos consumidos por estes dois segmentos também é distinta. 
 Manter uma família alimentada com R$ 77,74 por mês exige selecionar alimentos 
 de qualidade inferior ou em quantidade inferior. Conforme dados da POF de 
 1996, as famílias de até 2 salários mínimos gastavam em média, por mês, R$ 
 3,32 em arroz, R$ 2,41 em feijão, R$ 0,93 em macarrão, R$ 4,33 em leite, R$ 
 7,86 em pão, entre outros gastos (ver tabela 5).
 Tabela 4 - Valor da despesa média mensal familiar 
 com alimentação por classes de rendimento em moeda corrente e a participação 
 relativa da classe no consumo total 
 
 
 
 
                                                                        
 Fonte: Pesquisas de Orçamento Familiar - 1996
                                                                        
 Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA 97 
 
 
 Tabela 5 - Despesa Média Mensal Familiar em Alimentação por Classes Selecionadas 
 de Recebimentos em moeda corrente, segundo Itens Selecionados de Alimentos 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
              
 Fonte: IBGE - Pesquisa de Orçamentos Familiares 1996
 
 
 
 
 Outro vetor que provoca a exclusão social no país é a 
 concentração fundiária, rural e urbana, que se acentuou a partir do 
 modelo de desenvolvimento adotado sob a ditadura e que permanece compondo 
 um cenário peculiar à globalização que se verifica no Brasil. Conforme estudos 
 que subsidiaram em 1993 a preparação da Semana Social Brasileira, organizada 
 pela CNBB, "em todo o país existem apenas 5 milhões de proprietários 
 rurais. Os 20 maiores proprietários são donos de mais de 20 milhões de hectares 
 e os 3 milhões e 300 mil pequenos proprietários têm, todos juntos, menos de 
 20 milhões de hectares. Fazendo a média de um milhão de hectares para cada 
 grande proprietário e 6,6 hectares para cada pequeno"(55). 
 Em 1980, 0.8% dos proprietários rurais com mil ou mais hectares controlavam 
 45,8% das terras agricultáveis do país, sendo que 75% dessa área estava ociosa, 
 enquanto 4,8 milhões de famílias sem-terra lutavam por terra para plantar. 
 De outra parte, considerando-se a questão urbana, segundo o geógrafo William 
 Vesentini, espaços urbanos correspondentes a cerca de 40% a 60% das áreas 
 construídas nas capitais eram ociosos, tratando-se de vazios urbanos , cujo 
 principal objetivo era a especulação imobiliária(56). 
 
 Embora no período de 1992 a 1997 os índices de saneamento 
 e iluminação elétrica tenham melhorado (ver figura 14) - mesmo desconsiderando 
 que a água que chega às residências, embora encanada, nem sempre está isenta 
 de contaminação, dada a qualidade da rede de distribuição, bastante antiga 
 em muitas cidades - verificou-se durante a década de 90 o reaparecimento de 
 doenças que haviam sido controladas e o aumento de doenças contagiosas por 
 falta políticas básicas de saúde e saneamento, tais como meningite, malária, 
 tuberculose e hanseníase. 
 Figura 14 - Moradores em domicílios particulares permanentes 
 sem água encanada, esgotamento sanitário e iluminação elétrica (em percentuais).
 
                                         
 Fonte: IBGE(57) 
 No mesmo período cresceu o número de crianças e adolescentes 
 pelas ruas pedindo esmola, vendendo produtos ou se prostituindo. Em 1990 cerca 
 de 25 milhões de pessoas com dez anos e acima eram analfabetos e 22 milhões 
 de crianças entre 7 e 14 anos não freqüentavam a escola. De 1990 a 1995, contudo, 
 melhoraram os índices de escolarização como pode ser visto na figura 15.
 Figura 15 - Taxa de Escolarização de Crianças e Adolescentes 
 por faixa etária nos anos de 1990 e 1995
 
                                                  
 Fonte: IBGE(58)
 Frente ao cenário geral apresentado nesta seção cabe considerar 
 duas questões de fundo: a) qual é a teoria subjacente à compreensão de desenvolvimento 
 econômico adotada por Fernando Henrique Cardoso e b) como é possível que um 
 governo que adota as medidas que resenhamos, que têm as consequências que 
 analisamos, possa ser reeleito com significativo apoio popular. 
  
 3. Da Teoria da Dependência à Prática da Subserviência 
 Globalitária
 Nos anos 60 e 70, Fernando Henrique ficou conhecido por 
 sua contribuição ao desenvolvimento da Teoria da Dependência, sobre a qual 
 também trabalharam Theotonio dos Santos, Andrew Gunder Frank, Enzo Falleto 
 e vários outros teóricos(59). A Teoria da Dependência 
 - que de fato era um conjunto de elaborações diversas sobre o tema com um 
 certo arcabouço comum - teve uma repercussão positiva para a elaboração de 
 outras teorias críticas na América Latina, como a Teologia da Libertação e 
 a Filosofia da Libertação. A posição de Fernando Henrique, em particular, 
 possuía contudo uma peculiaridade frente àquelas que afirmavam ser o desenvolvimento 
 autônomo dos países dependentes somente possível com a ruptura da situação 
 de dependência - vertentes que apontavam, em alguns casos, para ações de revolução 
 política(60). 
 Fernando Henrique, pelo contrário, advogava que mesmo 
 sob uma situação de dependência de centros hegemônicos era possível promover-se 
 o desenvolvimento da periferia, desde que o Estado mantivesse a capacidade 
 de coordenar políticas estratégicas para tanto, promovendo um certo tipo de 
 participação do capital estrangeiro na economia nacional, presença que alavancaria 
 o crescimento econômico do país, embora continuasse a ser vigente o quadro 
 de dependência, uma vez que o capital nacional seria incapaz de promover, 
 por conta própria, um processo de desenvolvimento econômico sustentável na 
 extensão necessária ao crescimento do país:
 "a caracterização da atual etapa da dependência 
 mostra que existe a possibilidade de acelerar-se a industrialização 
 nas economias periféricas, redefinindo-se as bases de dependência.(...) 
 
 Com efeito, o processo atual de divisão internacional 
 do trabalho, impulsionado pelo capitalismo monopólico e pela organização 
 das empresas chamadas multinacionais, que passam a operar como ‘conglomerados’ 
 nos quais se incorporam distintos ramos de produção, abre as possibilidades 
 da industrialização de áreas periféricas do capitalismo."(61)
 
 
 
 Em 1967, em um trabalho conjunto com Enzo Faletto, Dependência 
 e Desenvolvimento na América Latina, ambos os autores afirmam que em certas 
 "...circunstâncias - de crise política do sistema quando não se pode 
 impor uma política econômica de investimentos públicos e privados para manter 
 o desenvolvimento - as alternativas que se apresentariam, excluindo-se a abertura 
 do mercado interno para fora, isto é, para os capitais estrangeiros, seriam 
 todas inconsistentes, como o são na realidade, salvo se se admite a hipótese 
 de uma mudança política radical para o socialismo."(62) 
 Como tal hipótese foi descartada nos anos 90 por amplos segmentos e como as 
 circunstâncias brasileiras apresentam as características apontadas, restaria 
 somente a abertura do mercado interno como mediação de desenvolvimento. Neste 
 caso, todavia, "...enquanto as decisões de investimento dependem, ainda 
 que parcialmente, do exterior, o consumo é interno."

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