Buscar

Cap 2 Psicodinâmica do Trabalho

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 27 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 27 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 27 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

Capítulo 2 
Contribuições de Estudos Teóricos e Empíricos 
em Psicodinâmica do Trabalho
Este capítulo aborda as principais contribuições teóricas e empíricas realizadas pela psicodinâmica do trabalho.
 
2.1 O Surgimento da Psicodinâmica do Trabalho 
A psicodinâmica do trabalho é oriunda da psicopatologia do trabalho que emergiu na França por volta dos anos 50/60 tendo como principais pesquisadores Le Guillant, Veil, Sivadon, Fernandez-Zoila e Begoin. Os estudos desses pesquisadores visavam à investigação das adversidades do trabalho partindo do pressuposto que tais adversidades desencadeavam distúrbios psicopatológicos (Dejours, 1993/2004).
Nos anos 80, o autor se distancia do modelo causal de pesquisa e cria a psicodinâmica do trabalho, sustentando que nenhum tipo de trabalho gera doença mental. Na concepção de Dejours, o sofrimento no trabalho origina-se do conflito entre a organização do trabalho e o funcionamento psíquico do sujeito (Dejours, 1980/1992). 
Dejours (1993/2004, p.49), denomina a psicodinâmica do trabalho como a “análise do sofrimento psíquico resultante do confronto dos homens com a organização do trabalho” ou ainda, como “a análise psicodinâmica dos processos intersubjetivos mobilizados pelas situações de trabalho”.
O percurso desta abordagem caracteriza-se por três fases. A primeira fase ainda sob a denominação de psicopatologia do trabalho era centrada no estudo da origem do sofrimento e nas conseqüências do confronto do psiquismo do trabalhador com a organização do trabalho. Devido às precárias condições de trabalho da época e da predominância do modelo taylorista, os estudos buscavam compreender o sofrimento e as estratégias defensivas individuais e coletivas utilizadas pelos trabalhadores para lidar com o sofrimento. 
A segunda fase centra-se no estudo da normalidade, aqui entendida como sinônimo saudável e não de normal. Investiga como os trabalhadores conseguem manter a saúde, evitar o adoecimento, manter a produtividade e, sobretudo busca entender como o trabalho pode propiciar vivências de prazer (Dejours & Abdoucheli, 1994; Mendes, 2004). 
Nesta fase, o trabalho deixa de ser apenas sinônimo de sofrimento, mas também lugar de realização, pois como sustenta Dejours (1999b), a conquista da identidade faz-se em dois registros: no amor, como construção da identidade no campo erótico e no trabalho, dando acesso à construção da identidade no campo social.
Assim, é lícito afirmar que o trabalho pode ser estruturante para a construção do sujeito, contudo, torna-se perigoso para o aparelho psíquico quando se opõe à sua livre atividade não permitindo a descarga pulsional a fim de diminuir a carga psíquica. Logo, um trabalho que permite a diminuição da carga psíquica, é equilibrante, contudo, quando o mesmo se opõe a essa diminuição desta, torna-se fatigante (Dejours, 1994).
O autor assevera que para haver a transformação de um trabalho fatigante em um trabalho equilibrante, faz-se necessário flexibilizar a organização do trabalho, de modo a propiciar maior liberdade ao trabalhador para rearranjar seu modo operatório identificando ações capazes de propiciar vivências de prazer. 
A terceira etapa da disciplina investiga a psicodinâmica do reconhecimento como um dos meios possíveis para vivenciar o prazer. A dinâmica do reconhecimento possibilita ao sujeito a conquista da identidade no campo social que é viabilizada pela relação que o sujeito mantém com o real através do julgamento do outro (Dejours, 1999b).
Observa-se então que o desafio real para a psicodinâmica do trabalho, é definir ações suscetíveis de modificar o destino do sofrimento e favorecer sua transformação e não sua eliminação. Quando o sofrimento pode ser transformado em criatividade, ele traz uma contribuição que beneficia a identidade. Aumenta a resistência do sujeito ao risco de desestabilização psíquica e somática e funciona como um mediador para a saúde. Quando, ao contrário, a situação, as relações sociais de trabalho e as escolhas gerenciais empregam o sofrimento, o trabalho funciona como um mediador para a desestabilização e fragilização da saúde (Dejours & Abdoucheli, 1994).
A seguir, serão apresentados os conceitos da psicodinâmica do trabalho que fundamentam este estudo.	
2.2 Sofrimento, Defesas e Adoecimento no Trabalho
Para a psicodinâmica, o sofrimento no trabalho surge quando a relação do trabalhador com a organização do trabalho é bloqueada em virtude da impossibilidade de negociação com a organização do trabalho impedindo dessa maneira, a gratificação dos desejos (Dejours, 1980/1992).
O sofrimento no trabalho articula aspectos que dizem respeito à história singular do sujeito e aspectos relativos à situação atual. É atravessado pela dimensão temporal e espacial, sendo que a última compreende processos que se desenrolam no espaço doméstico e na economia familiar do trabalhador (Dejours, 1996). 
Esta idéia é partilhada por Brant e Minayo-Gomez (2004), quando afirmam que o sofrimento depende da significação que assume no tempo e no espaço. Acrescentam ainda que o sofrimento denota dimensão psicológica e existencial.
Ao reconhecer o trabalho, ora como meio para se construir a identidade, ora como fonte de alienação, a psicodinâmica direciona o estudo do sofrimento psíquico para a inter-relação dos trabalhadores com a organização do trabalho e para as estratégias defensivas utilizadas por estes para lidar com o trabalho. 
Dejours (1980/1992) e Mendes (1999), afirmam que a forma como o sofrimento se apresenta varia conforme a organização do trabalho.
Nesta perspectiva, a organização do trabalho é definida como a divisão do trabalho, o conteúdo da tarefa, o sistema hierárquico, as modalidades de comando, as relações de poder, as questões de responsabilidade (Dejours, 1980/1992).
O autor entende por condições de trabalho o ambiente físico, o ambiente químico, o ambiente biológico, as condições de higiene, de segurança e as características antropométricas do posto de trabalho e relações de trabalho são entendidas como todos os laços humanos originados na organização do trabalho, ou seja, as relações com hierarquia, com chefias, com supervisão e com os outros trabalhadores.
O autor ao investigar outros modelos de organização amplia o conceito de organização do trabalho sugerindo ser esta o resultado de compromissos entre os homens para definir regras defensivas e regras de ofício, sendo descrita como a divisão de tarefas e a divisão de homens (Dejours, 1994).
A divisão das tarefas e o modo operatório incitam o sentido e o interesse do trabalho para o sujeito, enquanto a divisão de homens solicita, sobretudo, as relações entre pessoas e mobiliza os investimentos afetivos, o amor e o ódio, a amizade, a solidariedade, a confiança.
Mendes (1999), assinala que os elementos característicos da organização do trabalho, conteúdo das tarefas e relações sócio-profissionais são formados a partir de padrões específicos do sistema de produção determinando a estrutura organizacional na qual o trabalho é desenvolvido. Acrescenta ainda, que cada categoria profissional está submetida a um modelo peculiar de organização do trabalho, podendo conter elementos homogêneos ou contraditórios, facilitadores ou não das vivências de prazer-sofrimento do trabalhador.
Assim, o sofrimento surge quando não é mais possível a negociação entre o sujeito e a organização do trabalho. O autor assinala que o sofrimento aumenta quando a organização do trabalho inviabiliza que os trabalhadores negociem a discrepância que existe entre o trabalho prescrito e trabalho real (Dejours, 1980/1992; 1997; 1999a; 1999b). 
Trabalho prescrito refere-se à tarefa ou modos operatórios prescritos. A tarefa, aquilo que se deseja fazer, jamais pode ser exatamente atendida, sendo sempre necessário rearranjar os objetivos fixados no início (Dejours, 1997; 1999a;1999b). 
Já o real refere-se a atividade de trabalho que contém sempre uma parte de revés em face do qual o trabalhadorajusta os objetivos e a técnica. O real é aquilo que no mundo se faz conhecer por sua resistência ao domínio técnico e ao conhecimento científico.
 Dejours sustenta que sempre haverá discrepância entre o trabalho prescrito e o trabalho real, sendo que a produtividade e qualidade resulta, às vezes, da subversão do trabalho prescrito, pois como observa o autor citando pesquisa realizada em central nuclear, o trabalho só era executado com êxito nesta empresa devido a não observância estrita dos procedimentos. Em contrapartida, a execução à risca das prescrições resulta na chamada greve do zelo que pode levar à morosidade do trabalho e o não atingimento das metas (Dejours & Jayet, 1994; Dejours, 1997; 1999b).
A intolerância da organização do trabalho para negociar a discrepância entre o trabalho prescrito e trabalho real gera maior sofrimento aos trabalhadores, por não haver margem de liberdade para os mesmos utilizarem sua inteligência, sua inventidade que seria um dos caminhos para a transformação do sofrimento. 
Investigando organizações tipicamente tayloristas, o autor identificou a rigidez da organização do trabalho como precursora do sofrimento em virtude dos gestos repetitivos, da dominação e ocultação da vida mental do trabalhador (Dejours, 1980/1992). 
O autor justifica sua afirmação, comentando pesquisa conduzida por Dessors com telefonistas. Em virtude do monitoramento do trabalho, as telefonistas exerciam autocontrole devido ao medo de serem monitoradas em situação atendimento e à ansiedade em ter que realizado o trabalho conforme prescrição da organização do trabalho.
Para se defender do sofrimento resultante do trabalho repetitivo, vazio de conteúdo e de sentido, as telefonistas laçam mão de comportamentos condicionados.
No caso destas trabalhadoras, o sofrimento resulta da organização do trabalho robotizante, que expulsa o desejo inerente do sujeito. A frustração e a agressividade resultantes, assim como a tensão e o nervosismo, são utilizados especificamente para aumentar o ritmo de trabalho.
Para o autor, a frustração e as provocações dos clientes acumulam seus efeitos, provocando em conjunto uma agressividade reativa. A única saída para a agressão não canalizada diante do cliente desagradável, é trabalhar mais depressa, ou seja, quanto mais irritadas e tensas, melhor é a produtividade das telefonistas. É o fenômeno da auto-aceleração que produz a degradação da saúde mental das telefonistas.
Dejours (1980/1992) então conclui que o sofrimento psíquico é uma ferramenta para obtenção da produtividade. O trabalho não causa o sofrimento, é o sofrimento que produz o trabalho. O que é explorado pela organização não é o sofrimento, em si mesmo, mas principalmente os mecanismos de defesa utilizados contra esse sofrimento.
Segundo essa reflexão, é possível afirmar que o sofrimento gerado pela organização do trabalho vem de certo modo beneficiar a produtividade e à própria organização do trabalho. 
Desse modo, quando o trabalho perde sua função de estruturante psíquico o sofrimento aparece, pois, a fragmentação do trabalho entra em choque com as aspirações e desejos dos sujeitos que já usaram de todos os recursos intelectuais, psicoafetivos, de aprendizagem e de adaptação para conter o sofrimento.
Nessa perspectiva, o sofrimento é entendido como uma vivência subjetiva, um espaço de luta que cobre o campo situado, entre, de um lado, o bem-estar, e, de outro, a doença mental ou a loucura (Dejours, 1994; 1996). 
Na visão da psicodinâmica, o sofrimento é uma experiência vivenciada que preexiste ao encontro do sujeito com a situação do trabalho pertencendo à ordem do singular. É antes de tudo um sofrimento do corpo, individual, seguido de descompensação e mediado por defesas coletivas (Dejours, 1999b).
Para Mendes (1999), o sofrimento é entendido por sensações dolorosas advindas do conflito entre sujeito e realidade. Estas sensações podem ser inconscientes e relacionadas aos desejos dos sujeitos e às vezes revelados ao consciente em forma de projetos e expectativas de vida.
Brant e Minayo-Gomez (2004), observam que o sofrimento está ligado com um saber acerca da existência que não se consegue apreendê-lo de todo. Para os autores, o sofrimento se apresenta como uma reação, uma manifestação da insistência em viver em ambiente que nem sempre é favorável para o sujeito.
Para a psicodinâmica, um dos modos de enfrentamento da realidade permeada pelo sofrimento no trabalho é a utilização de estratégias defensivas. Mesmo que intenso, o sofrimento é razoavelmente controlado pelas defesas individuais ou coletivas, pois evitam decompensações psíquicas e o aparecimento de patologia (Dejours, 1980/1992; 1994; 1996; 1999a; 1999b).
Os primeiros estudos em psicodinâmica revelaram como expressões do sofrimento a insatisfação, a ansiedade, a indignidade, a inutilidade e a desqualificação que nos trabalhadores semi-qualificados vão gerar a vivência depressiva que se alimenta, sobretudo da sensação de adormecimento intelectual resultante da experiência do trabalho taylorizado (Dejours, 1980/1992).
Nesse sentido, estratégias defensivas são regras de condutas construídas e conduzidas por homens e mulheres. Variam de acordo com as situações de trabalho, sendo marcadas pela sutileza, engenhosidade, diversidade e inventividade fazendo com que os trabalhadores suportem o sofrimento sem se abater.
As estratégias defensivas são construídas em comum acordo pelo grupo de trabalhadores existindo um acordo tácito de todos os membros na manutenção da defesa para que ela não se rompa e quebre o pseudoequilíbrio gerado pela própria defesa.
Têm como alvo principal a eufemização da percepção do sofrimento, elas dão ao sujeito um suporte o qual as defesas individuais não conseguem suprir. Caracterizam-se basicamente pelo enfrentamento do sofrimento no trabalho e funcionam como regras do coletivo de trabalho.
As defesas coletivas são criadas para lidar com diferentes tipos de sofrimento. Desvelam-se sob diversas formas, como: segredos internos ao coletivo de trabalho, de mentira, de dissimulação, de segredo guardado individualmente, de desesperança de ser reconhecido, pelo descomprometimento, pelo individualismo, pelo surgimento da violência, pela psicologia perjorativa do executivo, pelo desprezo, por inflingir dano aos subordinados, pela negação do risco inerente ao trabalho, pela banalização do mal; pelo medo de perder o emprego, pela distorção da comunicação, pelo sofrimento ético.
As defesas coletivas são específicas das diferentes categorias profissionais sendo construídas e sustentadas pelos trabalhadores coletivamente e utilizadas para lidar com as contradições suscitadas pelas situações de trabalho.
Um estudo emblemático sobre as conseqüências do sofrimento no trabalho para a saúde dos trabalhadores e o uso de defesas é a pesquisa conduzida por Le Guillant com telefonistas da central telefônica de Paris.
Dada a natureza repetitiva e desgastante do trabalho e do uso reduzido de habilidades cognitivas, o autor identificou que as telefonistas adotaram a estratégia da auto-aceleração para lidar com o nervosismo provocado pelo trabalho. 
Como efeito do trabalho, as telefonistas relataram presença de sintomas de natureza diversa: distúrbios do sono, manifestações somáticas, irritação, agressividade, ansiedade latente e uso de medicamentos para atenuar tal situação. Aparecem ainda tristeza e depressão como resultante desta situação que as acompanhava após a saída do trabalho impactando também na vida doméstica e convivência familiar. 
A contaminação da vida fora do trabalho se dá pela adoção do automatismo, das fraseologias e modos operatórios do trabalho fora do trabalho. Segundo o autor, essa síndrome intitulada de neurose das telefonistas parecia ser resultante das condições materiais e morais do trabalho. Os distúrbios relatados com maior incidência são: distúrbios digestivos em 35% dos casos e dores de cabeça em 34% dos casos.
O comportamento defensivocomo estratégia para suportar o sofrimento no trabalho foi investigado por Mendes (1995) com engenheiros da área técnica de uma empresa de telecomunicações. As estratégias identificadas foram a racionalização, o individualismo e a passividade, não obstante, a autora observa que o uso corrente dessas defesas favoreceria a alienação das causas do sofrimento impossibilitando o processo de mudanças das situações de trabalho geradoras de sofrimento. 
Estudo empírico realizado por Lemos, Mazzilli e Klering (1998) junto a apenados que realizam trabalho como meio de ressocialização, aponta para vivências de sofrimento gerado pelo de trabalho baseado nos princípios tayloristas rigidamente prescritos pela legislação. O estudo indica que o trabalho não permite a fantasia, a imaginação, ou seja, a transformação do sofrimento em prazer, o que resulta em pessoas alienadas, que confundem seus desejos com os da organização. Dessa forma, o trabalho que teria como objetivo de ressocializar o apenado não cumpre seu objetivo. 
Uchida (1998) investigando o sofrimento psíquico de analistas de sistemas identificou o uso de estratégias compensatórias para lidar com sofrimento no trabalho que provém de duas fontes: o sofrimento advindo da imprevisibilidade da produção e o sofrimento originado da possibilidade de ruptura (estresse), ou seja, o analista de sistemas deve dizer em dois níveis, não à atividade, mesmo que vivida prazerosamente, e não à invasão de sua vida pessoal pela organização. Para lidar com esta situação realizam atividades fora do trabalho como formas compensatórias do prazer renunciado no trabalho. Para o autor, as experiências fora do trabalho adquirem um valor inestimável para os analistas, visto que a possibilidade de construção de uma estratégia defensiva no interior dessa organização de trabalho é mínima.
Ainda de acordo com o autor, a necessidade do descanso, do lazer, dos hobbies, das atividades lúdicas ou alternativas fora do trabalho não é uma característica particular dos trabalhadores deste tipo específico de organização do trabalho, o que varia é o sentido da necessidade destas atividades fora do trabalho para o trabalhador que varia de organização para organização. 
No caso dos analistas o sentido do lazer é o de ser uma forma compensatória e substitutiva de prazer para evitar o efeito de ruptura (estresse) e para sublimar a frustração de sua renúncia ao prazer, que em última instância torna-se auto-destrutivo. Exemplifica com o caso de um analista que gosta de pescar nos fins de semana, alegando que o prazer não é o de pegar o peixe e sim o prazer advindo da espera. O ficar parado relaxa, não fisicamente, mas emocionalmente. 
Veronese (2000) ao investigar as implicações do trabalho em turno sobre a vida de trabalhadores, observa que a fonte de sofrimento provém das pressões por produção feitas em nível descendente do diretor até ao auxiliar. Nesta empresa, o trabalho é combinado de modo a executar múltiplas tarefas rapidamente, é realizado sob a percepção do risco de acidentes e sob a competição entre equipes dos diferentes turnos, inviabilizando assim, a possibilidade de vivenciar prazer. 
A autora identificou que os trabalhadores constroem coletivamente estratégias de resistência e resignação para lidar com o sofrimento advindo do trabalho noturno. 
Segundo a autora, na percepção dos trabalhadores o trabalho em turno é um empecilho à qualificação e a convivência familiar, não obstante, observam que há mais cooperação entre os trabalhadores do turno noturno. Tal processo é viabilizado pelo espaço público de discussão. 
Almeida (2002) ao realizar análise psicossocial de motoristas de transporte coletivo urbano identificou a utilização de defesas para lidar com o sofrimento no trabalho. As estratégias defensivas utilizadas por esses trabalhadores são a: racionalização, individualismo e passividade. Estas defesas ao mesmo tempo em que possibilitam aos motoristas a manutenção do equilíbrio psíquico favorece a alienação das causas do sofrimento, impossibilitando o processo de mudança das situações de trabalho. Esses dados corroboraram os achados de Mendes (1995). 
Palácios, Duarte e Câmara (2002) em estudo conduzido com bancários identificaram que nos trabalhadores investigados o sofrimento provém da diferença de caixa; minimizada pelo uso de estratégias operatórias e das agressões dos clientes. Tal situação é acentuada pelas regras impostas pela organização do trabalho e falta de suporte organizacional. Os baixos salários, o processo de reestruturação produtiva que favorece o isolamento, a insegurança em relação ao futuro é entendida como falta de reconhecimento e fonte de sofrimento. Não há coletivo de trabalho pautado na coesão e confiança, o que dificulta a criação de defesas coletivas, fazendo com que as defesas individuais sejam ineficientes para lidar com esse contexto de serviço. 
Mendes, Costa e Barros (2003) em estudo sobre o sofrimento psíquico no trabalho bancário identificaram sofrimento decorrente do descontentamento com o trabalho em virtude da sobrecarga e do estresse gerado pelo trabalho. Esses trabalhadores enfrentam o estresse por meio de estratégias defensivas de negação e controle através da racionalização. 
Brant e Dias (2004) ao investigar o sofrimento em gestores de uma organização pública em processo de reestruturação organizacional identificaram como expressões do sofrimento a ansiedade, tensão, preocupação, sendo a falta de prazer e insatisfação com os resultados associados à tristeza. Identificaram também o predomínio de sofrimento no gênero feminino. 
Os autores ainda observam que ocorre nestes trabalhadores o esfriamento da relação amorosa e sintomas físicos como possível destino dado ao sofrimento. Os sintomas mais freqüentes foram: dor de cabeça, sono incompleto ou intranqüilo, sensações desagradáveis no estômago, má digestão, tremores nas mãos e falta de apetite.
Conforme é possível observar nos estudos apresentados, tanto o sofrimento como as defesas desempenham importante papel a fim de assegurar a saúde dos trabalhadores. Não obstante, as defesas encerram uma armadilha: a criação da ideologia defensiva da profissão que pode culminar na alienação dos trabalhadores (Dejours 1980/1992; 1999b).
A ideologia defensiva tem por objetivo mascarar, conter e ocultar uma ansiedade particularmente grave sendo específica de um grupo social particular. Destina-se a lutar contra um perigo e um risco reais, como citado. Ela é coletivamente elaborada e alimentada. 
Para ser eficaz e operatória a ideologia defensiva deve conseguir a participação de todos os interessados no encobrimento do sofrimento. Aquele que não contribui ou que não partilha do conteúdo é, cedo ou tarde, excluído. Para ser funcional ela deve ser dotada de uma certa coerência, o que supõe arranjos relativamente rígidos com a realidade. Tão inevitável quanto à própria realidade, a ideologia defensiva torna-se obrigatória. Ela substitui os mecanismos de defesa individuais, tornando-os impotentes (Dejours, 1980/1992).
O autor, utiliza o caso de trabalhadores da construção civil franceses que produziram a ideologia defensiva de ignorar o risco, por meio de atitudes viris. Fazem isto justamente para lidar com o sofrimento resultante do trabalho embrutecedor. Esta ideologia defensiva também foi identificada entre trabalhadores da construção civil no Brasil (Souza, 2002).
O perigo gerado por essa ideologia ocorre quando ela deixa de ser defesa e passa a ser o próprio objetivo dos trabalhadores. Neste momento surge o risco de alienação.
	Mendes (1995) esclarece que se por um lado as defesas permitem a convivência com o sofrimento, por outro, podem levar à alienação das suas verdadeiras causas. 
	A autora enfatiza a importância da alienação para a ideologia dominante, visto que a mesma não tem interesse nas mudanças das relações de trabalho e, desse modo, explora e usa o paradoxo próprio das defesas para evitar discussões sobre a organização do trabalho emanter os trabalhadores produtivos e desconhecendo as causas de seu sofrimento e fazendo a manutenção de seu emprego.
O aparecimento de sintomas e adoecimento relacionados ao trabalho é outra dimensão a ser considerada quanto à relação dos trabalhadores com as situações de trabalho. O uso exacerbado de defesas pode culminar no seu esgotamento abrindo caminho para o adoecimento.
Mendes (2004) afirma que o processo de adoecimento no trabalho resulta de um processo de sofrimento freqüente e intenso, sem êxito de enfrentamento, originado na frustração da realização do desejo pela cultura ou na padronização, restrição e homogeinização dos comportamentos organizacionais, que inviabilizam os ajustes necessários à expressão da autenticidade no trabalho.
	Observa-se então que o adoecimento decorre quando não é possível negociação com a organização do trabalho que ocorrendo em virtude da inviabilidade ou fracasso das defesas individuais e coletivas ou ainda quando as mesmas são exaustivamente utilizadas culminando em adoecimento. 	
Estudo realizado por Tavares (2000) é ilustrativo do processo de sofrimento, fracasso das defesas e sintomas de adoecimento. Ao analisar as representações sociais do sofrimento no trabalho de um grupo de servidores públicos federais, a autora, identificou como representações do sofrimento a injustiça no ambiente de trabalho, a sobrecarga de trabalho, o não reconhecimento no trabalho, a falta de autonomia e a estagnação profissional. O sofrimento é expresso através do medo, da desesperança, do desalento, contaminação do pensamento e do sono por conteúdos do trabalho, e sentimentos de auto-desvalorização. 
As estratégias que atenuam o sofrimento são constituídas por critérios explícitos de concessão de gratificações, relações sociais positivas no trabalho, aprendizado no trabalho e gerenciamento adequado do volume de trabalho por parte dos gestores.
As estratégias defensivas para lidar com o sofrimento referem-se ao distanciamento afetivo das causas dos processos, descomprometimento com o trabalho e as compensatórias dizem respeito à busca de outras oportunidades dentro da instituição por meio de contatos pessoais, estudar para ingressar na carreira jurídica, investimento afetivo e intelectual em dimensões da vida fora do trabalho.
Entretanto, a mobilização dos trabalhadores não tem sido suficiente para conter os sintomas de adoecimento que são apontados pelo estudo como resultantes desse contexto de trabalho. Os sintomas recorrentes são: tensão, enrijecimento dos músculos, dores de cabeça, problemas gastro-intestinais, problemas músculo-esqueléticos, desgaste físico, esgotamento, cansaço, alcoolismo, pânico e depressão. 
Pellizzaro (2002), ao investigar as possíveis interferências da reestruturação produtiva e da precarização do trabalho na saúde mental de trabalhadores têxteis relata a ocorrência de processo de tensão e fadiga, insatisfação no trabalho em virtude da inadequação entre o desejo do trabalhador e a tarefa executada, desvalorização que se reflete nos baixos salários amparados por sobrecarga de trabalho e à pressão pela ameaça constante do desemprego. 
A expressão do sofrimento psíquico nestes trabalhadores se dá sob a forma de forte ansiedade vinculadas às condições de trabalho próprias das formas de gestão que aliam taylorismo-fordismo com técnicas oriundas do modelo japonês. Os trabalhadores mencionam idéia de suicídio e conflitos familiares. 
As somatizações mais freqüentes são insônias, dores de cabeça, diarréias nervosas, hipertensão, taquicardias acompanhadas de depressão, medo, desânimo, pensamentos negativos e irritabilidade Para a autora, a fragilidade psíquica aumenta à medida que, a tensão e o sufocamento ascendem.
Brant e Minayo-Gomez (2004) ao investigar o processo de transformação do sofrimento em adoecimento em uma fábrica observaram que ocorre uma tentativa de silenciamento do sofrimento e uma cultura de promoção do adoecimento no trabalho que envolve os trabalhadores, os profissionais de saúde e gestores mediante a cumplicidade dos familiares dos pacientes. 
Dessa forma, as defesas elaboradas para lidar com o sofrimento são brincadeiras criadas no espaço fabril, que segundo os autores figuram como formas veladas de desrepressão e de manipulação utilizadas por gestores e trabalhadores.
Com a redefinição dos estudos em psicodinâmica do trabalho, o olhar da disciplina recai sobre a possibilidade do trabalho operar como fonte de prazer. É sobre este tema que trata a próxima subseção do capítulo.
	2.1.2 Do Sofrimento à Normalidade no Trabalho
Dejours e Abdoucheli (1994) ao redefinirem o objetivo do estudo da psicodinâmica do trabalho, introduzem o conceito de normalidade como sendo resultante de um compromisso entre o sofrimento e as estratégias de defesas individuais e coletivas num movimento pela manutenção da saúde. 
Nesta fase, Dejours (1997; 1999a; 1999b; 2000) caracteriza o trabalho como sendo fonte de prazer e sofrimento. A psicodinâmica é entendida no sentido psicanalítico como sendo constituída por forças contraditórias e conflitantes sendo as vivências de prazer-sofrimento entendidas como um construto único e dialético. 
Dejours (1999b) citando Politzer, denomina o sofrimento como um drama, que impele o sujeito no mundo e no trabalho em busca das condições de auto-realização. As defesas figuram uma alternativa para os trabalhadores buscarem a saúde. 
Essa redefinição conceitual evoca o caráter do sofrimento como sendo uma busca pelo prazer, desse modo, nem o sofrimento no trabalho tampouco as estratégias de defesas individuais e coletivas são patológicas e sim uma saída para a saúde.
Diante dessa evolução conceitual, Dejours e Abdoucheli (1994), redefinem o conceito de sofrimento no trabalho, desdobrando-o em sofrimento patogênico e sofrimento criativo. 
O sofrimento patogênico surge quando não é mais possível para o sujeito adaptar ou ajustar-se à organização do trabalho. Aqui há um bloqueio da relação subjetiva com a organização do trabalho, ou seja, o sujeito já utilizou todos os recursos para buscar concordância entre o seu desejo e a organização do trabalho. 
O sofrimento criativo aparece quando existe a possibilidade de transformar o sofrimento em criatividade propiciando a formação da identidade. Enfim, ele funciona como um mediador para a saúde, pois com ele o trabalhador pode transformar o seu trabalho, evitando assim a desestabilização psíquica e somática. Neste momento, o trabalho passa a ser também uma alternativa para a vivência de prazer. 
Assim, prazer e sofrimento são vivências subjetivas que implicam um ser de carne e um corpo onde ele se exprime e se experimenta, da mesma forma que a angústia, o desejo e o amor. Esses termos remetem ao sujeito singular, portador de uma história e, portanto, são vividos por qualquer um de forma que não pode ser, em nenhum caso, a mesma de um sujeito para outro (Dejours & Abdoucheli, 1994).
Na visão de Mendes (1999), o prazer-sofrimento caracteriza-se por vivências psíquicas, que são manifestadas através de sintomas que estão relacionados com situações específicas do trabalho. Manifesta-se de forma diferente para cada indivíduo de acordo com o sentido que ele atribui ao trabalho a partir dos aspectos simbólicos da sua subjetividade e das particularidades da organização do trabalho.
Dessa forma, o sofrimento e o prazer são oriundos da dinâmica interna das situações de trabalho, ou seja, são produtos dessa dinâmica, das relações subjetivas e de poder, das condutas e ações dos trabalhadores permitidas pela organização do trabalho (Lima Júnior & Ésther, 2001).
Nessa perspectiva, transformar a organização do trabalho é a contribuição para o processo de transformação que permite aos sujeitos conjurar o sofrimento, transformando-o em sentido, em inteligibilidade e em ação, o que não significa anulá-lo, mas transformá-lo em sentido e eventualmente em prazer: o prazer da reapropriação do vivido pela ação (Dejours & Jayet, 1994).O trabalhador para alcançar e manter a saúde psíquica trava uma luta constante no trabalho de modo a evitar o sofrimento e até mesmo transformá-lo em prazer. O interesse da psicodinâmica é compreender como ocorre esta dinâmica e o lugar das defesas para manutenção ora da saúde, ora da alienação.
Pressupondo o prazer-sofrimento como um constructo dialético, Dejours (1994a; 1999b) e Mendes (1999), afirmam que o prazer pode ser alcançado não apenas através da transformação do sofrimento, mas também como resultado direto do trabalho por meio do processo de sublimação ou ainda quando existe o contato do trabalhador com certas tarefas e relações sociais de trabalho.
Dejours (1994a; 1999b), salienta que o prazer direto seria advindo de profissões livremente escolhidas, como o trabalho do artista e do pesquisador. Esse processo é resultante da sublimação da pulsão sexual de natureza perversa e libidinosa da infância que ao serem elaborados, escolhem na fase adulta um objeto de prazer socialmente aceitável.
Outra saída citada pelo autor para o caminho do prazer no trabalho seria a mobilização subjetiva (Dejours, 1997) identificada como um meio para lidar com o sofrimento e buscar o prazer. O que a diferencia das estratégias individuais e coletivas de defesa é a resignificação do sofrimento para obtenção de prazer.
A mobilização subjetiva é o processo que o trabalhador através de sua subjetividade lança mão de seus recursos intelectuais, de sua inventidade para transformar as situações causadoras de sofrimento.
	A mobilização subjetiva viabiliza a dinâmica do reconhecimento que á "a forma específica da retribuição moral-simbólica dada ao ego, como compensação por sua contribuição à eficácia da organização do trabalho, isto é, pelo engajamento de sua subjetividade e inteligência". (Dejours, 1997, p.56).
Segundo Mendes (2002), a mobilização subjetiva constitui um processo que se caracteriza pelo uso dos recursos psicológicos do trabalhador e pelo espaço público de discussões sobre o trabalho, permitindo a resignificação das situações geradoras de sofrimento em situações geradoras de prazer. Acontece a partir do resgate do sentido do trabalho. Este sentido depende da inter-relação entre a subjetividade do trabalhador, do saber fazer e do coletivo de trabalho.
Estudos empíricos sinalizam a possibilidade de vivenciar prazer e sofrimento no trabalho e, que o predomínio de uma vivência em relação à outra depende da relação intersubjetiva resultante da dinâmica entre trabalhadores e contexto de trabalho. 
Mendes e Abrahão (1996) ao investigar a relação dinâmica entre a organização do trabalho e o prazer-sofrimento de trabalhadores qualificados identificaram relação entre o sofrimento gerado pela situação em que o trabalhador percebe seu trabalho como taylorizado. Esse sofrimento é expresso por sentimentos de desvalorização e impotência diante do poder ideológico, econômico, tecnológico e político e da restrita margem de liberdade. A falta de um coletivo de trabalho e espaço de discussão incrementa o sofrimento; já as vivências de prazer ocorrem quando os trabalhadores conseguem obter uma representação global do processo de trabalho. O sofrimento é mediado por meio do uso de estratégias defensivas. 
Em pesquisa realizada por Lunardi Filho e Mazzilli (1996) com trabalhadores de enfermagem foi identificado que o trabalho opera como responsável pela construção do sujeito e de sua identidade. A natureza do trabalho em enfermagem suscita situações geradoras de sofrimento que são acentuadas pelo ritmo acelerado da organização do trabalho e pela precariedade das condições de trabalho; o prazer quando raramente ocorre, manifesta-se pela expectativa de obter essa vivência por meio da relação com o paciente ou organização do trabalho, o que na maioria das vezes é inexistente.
Estudo de caráter exploratório descritivo realizado com servidores de carreira sobre o impacto da gratificação por desempenho e produtividade sobre o prazer-sofrimento identificou que este tipo de remuneração funciona como fonte de sofrimento, em razão da sua ênfase no produtivismo impedindo o reconhecimento social pelo esforço dispendido. A falta de um espaço público de discussão acentua o sofrimento por impedir sua resignificação (Mazzilli & Carvalho Neto, 1999). 
Mendes e Tamayo (1999) ao estudar as relações entre valores organizacionais e prazer-sofrimento no trabalho em trabalhadores de uma organização pública de abastecimento e saneamento observaram uma preponderância das vivências de prazer, sendo que o sofrimento é vivenciado moderadamente. O prazer tem como melhores antecedentes os pólos harmonia, domínio e autonomia, já o sofrimento é explicado inversamente pelo pólo da autonomia. Observam ainda que o prazer depende mais de variáveis culturais do que o sofrimento. 
Para os autores, a busca do prazer e a evitação do sofrimento é inerente à condição humana, fazendo com que os trabalhadores utilizem estratégias para evitar, minimizar ou transformar o sofrimento. 
Ao investigar as representações de prazer-sofrimento vivenciadas por profissionais de enfermagem que trabalham em UTI, Shimizu e Caimpone (1999), identificaram que as enfermeiras representam esse trabalho como desgastante. Fazem uso das estratégias defensivas de negação, projeção e distanciamento para suportar o sofrimento que é acentuado devido à ausência de reconhecimento por parte de pacientes e familiares, pois a gratidão pelos cuidados recebidos é demonstrada apenas aos médicos do hospital. 
Pesquisa realizada por Bosi (2000) com nutricionistas sociais aponta para vivências de sofrimento expressas por sentimentos de medo em virtude da violência urbana, ansiedade, desânimo e impotência diante da realidade da saúde coletiva no Brasil, entretanto, vivenciam sentimentos de satisfação devido à pouca rigidez da organização do trabalho que possibilita a realização do grupo por meio da autonomia e criatividade no trabalho. Diante desse quadro, a autora infere que as nutricionistas vivenciam mais prazer que sofrimento no trabalho. 
Lima Júnior e Ésther (2001) ao investigar o prazer-sofrimento de profissionais de enfermagem em um hospital universitário observam que para as enfermeiras participantes da pesquisa, o trabalho em enfermagem tem sido marcado por preconceitos, desgaste devido à sobrecarga de trabalho, sofrimento vinculado a sentimentos de desvalorização social, a precariedade das condições de trabalho com ênfase nos baixos salários, espaço de trabalho mal equipado, inexistência de refeitório e local apropriado para descanso. O trabalho em turno é vivenciado como o mais fatigante. 
Nessa atividade, o prazer advém da alegria em concretizar intervenções eficazes que auxiliem o paciente em eventos críticos. A organização do trabalho estruturada sob princípios tayloristas faz emergir problemas de saúde e segurança envolvidos na gênese do sofrimento. 
Ferreira e Mendes (2001) em estudo exploratório no serviço de atendimento ao público identificaram predomínio de sofrimento oriundo tanto das condições nas quais as atividades são realizadas, quanto das relações sociais de trabalho. Os autores sugerem que o sofrimento vivenciado pode estar sendo enfrentado mediante uso de estratégias defensivas e criativas de modo visando à atenuação do custo humano do trabalho buscando transformar o sofrimento de modo a vivenciar o prazer no trabalho. 
Fernandes, Ferreira, Albergaria e Conceição (2002), em estudo sobre representações de enfermeiras e prazer-sofrimento no trabalho, identificaram uso de estratégias defensivas e adaptativas para lidar com o sofrimento no trabalho. O sofrimento é comumente gerado pela dificuldade de negociação e de controle sobre a organização do trabalho, da precariedade das condições de trabalho e também porque o sofrimento no trabalho lhe reporta ao papel de mulher e de mãe. O prazer advém da possibilidade de preencher o tempo, a vida, das amizades construídas no trabalho, busca por ascensão profissional e dos cuidadosdispensados aos pacientes. 
As estratégias defensivas usadas pelas enfermeiras são negação, fuga pela fantasia, engajamento no trabalho; já as estratégias de adaptação referem-se atividades de lazer, como: nadar, caminhar, sair com amigas para tomar cerveja, tirar alguns dias de folga e negociações com a chefia. 
Estudo realizado por Resende e Mendes (2004) com bancários a fim de investigar as vivências de prazer-sofrimento e suas relações com os valores individuais apontam para vivências moderadas de prazer e sofrimento. É frágil a correlação entre estas vivências e os valores, o que permite as autoras inferirem que o sofrimento é influenciado pela organização do trabalho. 
A pesquisa ainda aponta que o sentimento de liberdade é influenciado por questões relativas a automatização e desqualificação do trabalhador bancário, o que pode resultar em prejuízo para o sentimento de autonomia e para a dinâmica do reconhecimento. A falta de reconhecimento é ainda manifestada pelos concursos internos que são percebidos, ora como oportunidade para os que pleiteiam novo posto, ora como ameaça para quem perde o posto.
O sentimento de insegurança vivenciado pelos bancários tem origem no receio de não ser capaz de realizar as tarefas em razão da organização do trabalho, que no trabalho bancário é caracterizada por elementos de rigidez, pressão temporal, reclamações de clientes, metas acirradas que levam ao temor de perder o emprego.
Para lidar com tais adversidades, os bancários investigados laçam mão da sobrevivência como estratégia defensiva para manterem o emprego, propiciando segurança para si e para a família, em lugar de se constituir em elemento para auto-realização.
Esses estudos demonstram que o bem-estar psíquico a despeito de ter origem na inércia ou na ausência de atividade, resulta do engajamento numa tarefa gratificante onde as energias possam dispor de um livre funcionamento, o que remete à valorização das condições e das modalidades a partir das quais o trabalho se organiza (Bosi, 2000).
Nessa linha de reflexão, Dejours e Abdoucheli (1994) formulam o conceito de inteligência astuciosa, que segundo o autor, tem raiz no corpo, na percepção e na intuição dos trabalhadores. Tem como fundamento a ruptura com regras e normas, ou seja, é uma inteligência que transgride o trabalho prescrito e funciona para atender aos objetivos de produção com procedimentos mais eficazes do que os impostos pela organização do trabalho. Assim, a inteligência astuciosa é um recurso utilizado pelos trabalhadores não só para minimizar o sofrimento, mas para transformá-lo em prazer.
Segundo Coelho (1999), o uso habitual dessa inteligência astuciosa pode levar o trabalhador a proteger-se eficazmente da fadiga, tanto física quanto psíquica, contribuindo inclusive para a produtividade na organização.
Como revisão do conceito de inteligência astuciosa, surge o termo inteligência da prática, adotado por Dejours (1997) para designar a inteligência mobilizada na situação real de trabalho.
	Para ser efetiva, a inteligência astuciosa (Dejours & Abdoucheli, 1994), ou inteligência da prática (Dejours, 1997) ou inteligência operária (Dejours, 1999b) precisa passar por uma validação social que pressupõe o reconhecimento da hierarquia através do julgamento de utilidade e o reconhecimento pelos pares através do julgamento da beleza.
A psicodinâmica considera os macetes construídos pelos trabalhadores a partir da experiência laboral como uma produção da inteligência astuciosa. Os macetes além de serem frutos dessa experiência, constituem resultado da observação contínua dos trabalhadores. Este saber operário possibilita a redução da carga de trabalho e faz a organização funcionar. É uma alternativa dos trabalhadores para subverter o trabalho prescrito. Os macetes são alternativas eficazes ao real de trabalho. 
Dejours (1999b) nomeia os macetes como habilidades de prudência que devem ser compatíveis com as estratégias coletivas de defesa. Por serem uma prevenção racional às incompatibilidades e ao real do trabalho, são por característica enigmáticas, por vezes até mesmo para os trabalhadores.
Essa reformulação conceitual conduziu para o estudo da dinâmica do reconhecimento como meio para construção da saúde e identidade do sujeito e se inscreve como o atual estado da arte em psicodinâmica do trabalho conforme é descrito a seguir.
2.1.3 Psicodinâmica do Reconhecimento 
Para Dejours (1999b), o processo de reapropriação que envolve a dinâmica coletiva, acontecendo quando os trabalhadores agem de forma a subverter os efeitos prejudiciais do trabalho. 
Essa dinâmica coletiva é viabilizada pelo coletivo de trabalho construído pelos trabalhadores. Seus elementos constitutivos a solidariedade, confiança, cooperação e pressupõe a existência de um espaço público de discussão (Dejours, 1995/1997; 1999b).
A dinâmica do reconhecimento no trabalho possibilita ao sujeito a construção de sua identidade, que é traduzido afetivamente por sentimento de alívio e prazer. Deste modo, o trabalho se inscreve na dinâmica de realização do ego.Observa-se então, que as pessoas não suportam passivamente as pressões do trabalho. A adversidade dessas condições funcionam como estratégia para oi sujeito utilizar o trabalho como forma de auto-realização. Nesse caso, o processo de reapropriação vai além do processo de resistir ao sofrimento e ao adoecimento, pois possibilita aos trabalhadores à construção da saúde.
Para o autor, a transformação das situações do contexto de trabalho exige um comprometimento poderoso com os próprios objetivos de tal contexto. Para ser durável, esse comprometimento é mantido na própria transação simbólica que, em contrapartida a essa contribuição, confere aos trabalhadores um reconhecimento.
Para que ocorra a dinâmica do reconhecimento é necessário que estejam presentes o julgamento de utilidade e julgamento de beleza.
	A inteligência astuciosa (Dejours & Abdoucheli, 1994) ou da prática (Dejours, 1997; 1999b) pressupõe a idéia de astúcia e é mobilizada diante de situações imprevistas do real de trabalho, está ligada aos recursos intelectuais e ao conhecimento da tarefa por parte dos trabalhadores. Tem como objetivo poupar o uso da força, privilegiando a habilidade, caracterizando-se pela inovação, frente ao trabalho prescrito pela organização do trabalho.
	Para que a inteligência da prática se afirme, é necessário que no coletivo de trabalho haja, sobretudo, ética e confiança, decorrentes da promessa de equidade quanto ao julgamento do outro sofrido pelo ego. Este julgamento denomina-se julgamento de utilidade que é feito pelos superiores e o julgamento de beleza feito pelos pares e subordinados.
Dejours (1997; 1999b) salienta que o reconhecimento ocorre em duas dimensões: primeiro, no sentido de constatação, pelos outros, da realidade da contribuição da pessoa ao contexto de trabalho; em segundo lugar, reconhecimento no sentindo da gratidão. 
Assim, o reconhecimento refere-se ao trabalho realizado e passa por julgamentos que em duas dimensões: no nível da utilidade e no nível da beleza.
 O julgamento de utilidade seja, econômica, social ou técnica, envolve as relações com os outros na linha hierárquica, ou seja, com os superiores, e, eventualmente, com os subordinados ou com os clientes. 
Já o julgamento de beleza que é dado conforme as regras do trabalho ou sobre a originalidade de seu estilo é outorgado pelas pessoas que conheçam muito bem o trabalho e suas regras, logo esse julgamento é efetuado pelos pares, pelos colegas de trabalho.
Nessa perspectiva, para que o trabalho opere como fonte de saúde há a necessidade do reconhecimento daquele que trabalha, uma vez que neste reconhecimento reside a possibilidade de dar sentido ao sofrimento vivenciado pelos trabalhadores. O reconhecimento é condição essencial no processo de mobilização subjetiva da inteligência e da personalidade no trabalho, desempenhando um papel fundamental na possibilidade de transformar o sofrimentoem prazer (Merlo et al.,2003).
	Alguns estudos empíricos tem demonstrado a importância do reconhecimento para a construção da saúde do trabalhador conforme demonstrado abaixo.
Seligmann-Silva (1997) ao investigar a inter-relação entre a saúde mental de trabalhadores do setor ferroviário e as transformações em curso no mundo do trabalho identificou como situações geradoras de sofrimento a existência da cultura do autocontrole. Os sentimentos que expressam o sofrimento são relacionados a falta de reconhecimento profissional, desvalorização do trabalho, injustiça e perda do orgulho profissional em virtude da perda de responsabilidade na execução das tarefas em virtude da automação do setor. Os sintomas físicos resultantes dessa situação são o alcoolismo, distúrbios digestivos, hipertensão arterial, irritação pelo barulho causado por dispositivos de controle e alterações do sono. 
Ferreira (2001) ao realizar estudo com bancários portadores de Dort identificou que quanto maior percepção de desgaste nos desempenho das tarefas, menor o bem-estar, sendo a percepção de reconhecimento e valorização propiciadores de bem-estar, já as variáveis que não contribuem para o bem-estar são: o desgaste profissional, as causas das Dort, estigmatização dos colegas, percepção de extinção da categoria e ameaça de exclusão do mercado de trabalho. 
Os resultados encontrados por Rocha (2003) apontam na mesma direção dos encontrados por Ferreira (2001), ou seja, os bancários que mais se engajaram e se identificaram com a profissão de bancário são os portadores de Dort que mais sofrem psicologicamente. Rocha (2003) identificou particularmente a incidência de depressão nos bancários portadores de Dort. 
Estudo realizado com profissionais de enfermagem relacionando a síndrome de burnout como uma reação à tensão emocional crônica gerada pelo contato direto e excessivo com pessoas identificou que na face oculta dessa síndrome são construídas estratégias defensivas como individualismo e descomprometimento com o trabalho como mobilização contra o sofrimento oriundo da falta de reconhecimento e da fadiga física e psíquica (Soboll, 2002). 
Estudo realizado com trabalhadores portadores de Ler/Dort em ambulatório de hospital público identificou sofrimento associado à dor física, às vivências subjetivas e à identidade social. A relação com o trabalho era marcada por ambivalência visto que, se por um lado o trabalho era lembrado como fonte de prazer, por produzir a base para a dinâmica do reconhecimento e construção da identidade, por outro, era fonte de sofrimento, pois além de lidarem com as pressões e exigências no cotidiano de trabalho, estas pessoas tiveram a doença como resultado de seu engajamento no trabalho (Merlo et al., 2003). 
Veronese (2000) afirma que a dinâmica do reconhecimento deve incluir participação, gratidão verdadeira e mútua, medidas de valorização amplas e bem divulgadas, sendo muito mais do que tapinha nas costas e fotos no jornal da empresa. É possibilitar o espaço de palavra aos trabalhadores, resgatar sua importância como ser humano em relação aos processos e máquinas, que acabam sobrepujando-os em importância. É recompensá-los dignamente, dar suporte quando estão doentes, acidentados, quando têm um problema grave na família, pois segundo, a autora, o que se observa nas organizações é que os sujeitos assim que é possível são descartados ao vivenciarem tais situações. 
No próximo capítulo será apresentado o objeto de investigação deste estudo amparado pelas contribuições anteriormente apresentadas. 
�PAGE �
�PAGE �27�

Outros materiais