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Apesar de reconhecer a existência de certas situações laborais nocivas, para a psicopatologia do trabalho dos autores anteriores, as particularidades do sujeito entram em cena. Na década de 1920, na França, o processo crescente de industrialização impulsionou os estudos sobre o trabalho e as relações entre os indivíduos. Precisamos lembrar, que nesse período, o principal era classificar os trabalhadores, através de testes, para coloca-los em uma “posição” que mais se adequasse a ele, influenciado pela escola psicotécnica, onde inicialmente não havia uma preocupação com o fator humano. A modernização crescente da indústria francesa desde a I Guerra Mundial, e as reflexões a respeito do trabalho a partir das necessidades impostas também pela II Guerra, trazem à tona, às novas interrogações a respeito do papel do trabalho na gênese da doença mental, mas também na integração dos indivíduos (principalmente dos pacientes psiquiátricos) à vida social. A busca de respostas a tais interrogações levou ao surgimento de novas formas de compreensão e de tratamento da doença mental, cujos expoentes mais importantes são Paul Sivadon e Louis Le Guillant (LIMA, 1998) A contribuição maior para o campo da saúde mental no trabalho, foi a sistematização de uma nova forma de abordar o doente mental: a ergoterapia. Onde aborda o trabalho como fonte de crescimento e integração social (VEIL, 1985 apud LIMA,1988). Mas foi também Sivadon, que empregou pela primeira vez o termo Ou seja, apesar de ter seus esforços voltados à compreensão do valor terapêutico do trabalho na evolução do psiquismo humano, e de doentes mentais, ele foi capaz de constatar (LIMA, 1998): Na década de 1950, escreve um artigo onde tenta compreender as possíveis relações entre alienação mental e alienação social, isto é, as repercussões patológicas do condicionamento social e da alienação no trabalho vinculando-se às teorias que tentam captar os determinantes sociais da doença mental, mas sem perder de vista a dimensão psicológica. De forma geral, tenta verificar o papel do meio e do trabalho no surgimento e no desaparecimento dos distúrbios mentais (LIMA, 1988). Em suma, Le Guillant tenta articular condições sociais, condições de trabalho e fatos clínicos. Ele admite a relação entre certos distúrbios psíquicos e certas situações de trabalho (LIMA, 1988). Ambas diferenciam-se na forma como entendem e conceituam o trabalho; como definem o sujeito; como compreendem as relações entre trabalho e trabalhador; Nexo causal; como direcionam seu olhar para o trabalho em si; na transformação do trabalho e do trabalhar. Do ponto de vista teórico, esses limites são inúmeros, mas vamos nos ater a alguns autores principais sobre os limites do campo da saúde mental e do trabalho (LIMA, 2013). De acordo com Lima (2013), quando falamos de SM & T, o máximo que os estudos tem avançado consiste em explicitar um paralelismo estreito entre certas experiências de vida e de trabalho e a emergência de transtornos mentais específicos. dificuldade em apreender como se dá a passagem entre uma situação vivida, e o distúrbio mental, propriamente dito Essa questão permanece em aberto para todo o campo das ciências que tratam dos transtornos psíquicos, não se limitando a POT. Antes das pessoas é precisamente do trabalho que se deve cuidar em todos os sentidos do termo (LIMA, 2013): Como consequência da dificuldade para se estabelecer o nexo entre seus transtornos e a vida profissional, fica em aberto a questão do atendimento adequado a esses trabalhadores. Além disso, o autor expõe os limites da prática do psicólogo nos contextos de trabalho constatando um retorno ao "higienismo" ou seja, a psicologia estaria novamente entrando nas empresas por um caminho equivocado: o de oferecer um atendimento psicológico aos empregados com o intuito de permitir que suportem melhor o que é insuportável buscando que eles se adequem ao serviço sendo colocados no molde da normalidade higienista (LIMA, 2013). Trata-se de um problema grave, sobretudo se levarmos em conta que os transtornos mentais ocupam os primeiros lugares nas estatísticas em torno dos motivos de afastamentos do trabalho pelo nosso sistema previdenciário. Trazendo ainda, a partir de Codo, o adoecimento por tipo de trabalho exercido. Por exemplo: bancários, seriam mais depressivos etc... (é apenas um exemplo ilustrativo) Na atualidade, parece existir uma tendência de banir o sofrimento do mundo do trabalho e desconsiderá-lo como uma dimensão contingente à produção (BRANT; MINAYO-GOMEZ, 2004) Por isso, cabe explicitar o seguinte: A percepção de que o trabalho pode ter consequências sobre a saúde mental dos indivíduos é relativamente antiga, como postulou Merlo (2002). O pressuposto adotado a partir dessas ideias de saúde mental é o de que basta identificar e denunciar esses problemas para que sejam sanados (LIMA, 2013). isso não conduz a avanços significativos, já que não resolve nada. Ao que parece, estamos vivendo no Brasil o mesmo identificado pelo autor na Itália de sua época: a ênfase quase exclusiva na crítica e na denúncia em relação às condições inaceitáveis de trabalho, sem ações efetivas para transformá-las, ou seja, não adiante só falar sem fazer nada (LIMA, 2013). Todos os autores que foram demonstrados até agora, tratavam da chamada psicopatologia do trabalho que precedeu a psicodinâmica do trabalho. A psicodinâmica nasce da psicopatologia, porém não devem ser consideradas como sinônimos, pois o objeto de estudo se diferencia. É uma abordagem teórica, clínica e metodológica, que busca estudar as relações entre trabalho e a saúde mental, tendo em C. Dejours seu principal e primeiro autor a partir dos estudos anteriores produzidos pela psicopatologia do trabalho, tendo influência de áreas como: ergonomia, psicologia, psicanálise etc... (AMPARO SOBRINHO et al, 2018). Ana Magnólia Mendes (2007), uma das principais referências em psicodinâmica no Brasil, dividi esse histórico da psicodinâmica do trabalho em 3 fases principais: Por que, quando expostas às mesmas condições hostis de trabalho, algumas pessoas adoecem e outras não? Dejours, que foi o principal expoente sobre o assunto, passa a se questionar, o que as pessoas que não adoecem em situações hostis, fazem para continuar trabalhando sem adoecimento? Diante dessa perspectiva Dejours (1994) faz o seguinte questionamento: “ A psicodinâmica, diferentemente da psicopatologia (que buscava compreender o que acontece para gerar o adoecimento, ou quais as características do sujeito e da doença X ou Y relacionada ao trabalho e tratar) se interessa pelos recursos que as pessoas que não adoecem, desenvolvem para se manterem a saúde mental, e resistir aos ataques ao seu psiquismo, com ideia de prevenção, a clínica do trabalho, no geral visa a prevenção. A maioria dos trabalhadores não consegue manter um equilíbrio psíquico e manter-se na normalidade o tempo todo, ou seja, se antes a psicopatologia buscava chegar a essa normalidade, hoje, com a psicodinâmica do trabalho, essa normalidade implica estratégias para lidar com o sofrimento que é inerente a todas as relações humanas (RODRIGUES; ALVARO; RONDINA, 2006). Dejurs (1994) faz uma afirmação a respeito de normalidade: Sendo assim o estado de normalidade, seria um equilíbrio dinâmico e instável na luta contra o adoecimento, onde de um lado temos as situações de trabalho, e de outro as defesas psíquicas dos próprios trabalhadores (RODRIGUES; ALVARO; RONDINA, 2006). Ser normal, não significa não sofrer, mas sim, realizar essas defesas na luta contra o adoecimento. O equilíbrio é instável, pois está constantemente sendo ameaçado pelas adversidades impostas pela organização do trabalho. Sintetizando, para este autor, seu objeto de estudo no contexto do adoecimento do Trabalho é, acima de tudo, o sofrimento,mas isto não significa que tudo fique reduzido à constatação desse sofrimento O sentido do trabalho; seu significado para o sujeito, possibilitando seu crescimento pessoal e o reencontro com sua subjetividade e (criatividade) A pessoa com dimensões biológicas, psicológicas e sociais. Além da Gênese e transformações da saúde mental na relação com o trabalho. Dejours, estudou o papel da organização do trabalho em relação aos efeitos positivos e negativos que este pode exercer sobre o funcionamento psíquico do trabalhador. Os indivíduos reagem de forma diferente às dificuldades das situações de trabalho e chegam a este trabalho com a sua história de vida pessoal (MENDES, 1995). Década de 80, quando a psicodinâmica ainda fazia parte da psicopatologia do trabalho. O foco era o estudo das perturbações psíquicas ocasionadas pelo trabalho, ou seja, a doença. Década de 90, quando é fundada a psicodinâmica do trabalho de fato, que se afasta da psicopatologia, por buscar compreender as vivências de prazer e sofrimento no trabalho e não mais apenas o adoecimento nas situações Final da década de 90 até hoje, o foco é no efeitos do trabalho sobre os processos de subjetivação, estratégias defensivas e as patologias sociopsíquicas relacionadas ao trabalho, além de continuar o objeto de estudo centrado nas vivências de prazer e sofrimento, só que, voltado para como o trabalhador lida com elas A forma como o trabalho está estruturado, de acordo com Dejuors, dividi os homens que não se apropriam do que fazem, retirando a sua possibilidade de autoria. É a atividade manifestada por homens e mulheres para realizar o que ainda não está prescrito pela organização do trabalho. Ou seja, não são apenas as normas impostas. Afirma assim, que: "A organização do trabalho exerce sobre o homem uma ação específica, cujo impacto é o aparelho psíquico. Em certas condições emerge um sofrimento que pode ser atribuído ao choque entre uma história individual, portadora de projetos, de esperanças e de desejos e uma organização do trabalho que os ignora." (DEJOURS,1987) A organização, diz respeito também a: Corresponde as prescrições, isto é, as normas de trabalho como: Regras, normas, manuais, procedimentos. É tudo o que está previamente estabelecido na descrição de um determinado cargo. Corresponde ao que realmente, aquele trabalho vai impor ou seja, os acontecimentos inesperados que podem ocorrer naquele determinado trabalho em seu dia a dia. Em outras palavras, é o trabalho na prática. A prescrição, nunca é suficiente para abarcar todas as possibilidades do real, pois o real, exige que o trabalhador entre em movimento com a sua criatividade e possibilidade de transformação da realidade, e ai acontece o trabalho de fato, indo muito além do que está prescrito. Trabalhar assim, envolve esse equilíbrio dinâmico entre o que eu tenho que fazer(prescrito), e o que de fato eu vou fazer(real). Sendo assim, pode-se dizer que normalmente é no trabalho real que ocorre adoecimento. O sofrimento faz parte da condição humana em todas as esferas de sua vida, e o objetivo da psicodinâmica, não é eliminar o sofrimento, mas elaborar formas de “ressignificação” desse sofrimento. Dessa forma, a experiência com o trabalho real, é onde normalmente o sofrimento ocorre, pois os imprevistos trazem a experiência do “não saber agir” resultando em sentimento de insuficiência, decepção, irritação etc...(MENDES, 2007). Sofrimento torna-se criativo quando é transformado, e o trabalho é ressignificado por meio da criatividade. Ou seja, de acordo com Dejuors, é quando o sujeito consegue elaborar esse sofrimento criando estratégias de enfrentamento, tornando a condição menos dolorosa com estratégias de mobilização subjetiva (REIS et al., 2013). O sofrimento vai acontecer de toda forma, mas, quando se tem um espaço, onde esse sofrimento pode ser elaborado, através da criação de soluções para a fonte de mal-estar que o trabalhador está enfrentando, pode ocorrer a sublimação do sofrimento. Se torna patogênico quando não há espaço para essa flexibilização dos modos de trabalho e criação de novas formas de trabalhar, conduzindo o sujeito a um adoecimento. Quando as tentativas de transformar esse sofrimento se esgotam, devido a uma organização de trabalho que não deixa espaço para a autonomia do trabalhador, se desenvolvem estratégias defensivas para tentar transformá-lo em sofrimento criativo. Não existe possibilidade de negociação (liberdade) entre o sujeito e a organização do trabalho prescrito (REIS et al., 2013). Dessa forma, a organização do trabalho deve ser flexível e dar liberdade para o trabalhador exercer sua atividade de forma prazerosa, acolhendo a inventividade e a criatividade do trabalhador. As vivências de prazer estão relacionadas ao sentido que o indivíduo atribui ao seu trabalho, às condições disponibilizadas pela organização e à liberdade de utilização de estratégias operatórias pelo trabalhador (MENDES; LINHARES, 1996). Organização que impossibilita a flexibilização do trabalho Uma organização que possibilita flexibilização Como já foi mencionado, quando o trabalhador tem a impossibilidade de desenvolver-se com essa flexibilidade no trabalho real, ocorre o sofrimento patogênico. Por outro lado, quando ocorre essa possibilidade de flexibilidade, o sofrer criativo se torna a fonte de prazer e ocorre o processo de sublimação da situação. A leitura de Dejours sobre o processo de sublimação concebido por Freud e sua utilização na compreensão da relação do sujeito com o trabalho, permite ampliar a conceituação original e lançar luzes sobre a forma como o sujeito mobiliza-se subjetivamente no trabalho. O sujeito transforma o sofrimento patogênico em algo palatável ou seja, aceitável, transformando o impulso em algo novo (AMARAL et al., 2017 p200). O trabalho, ao mesmo tempo em que traz a possibilidade de sofrimento, pode ser um elemento de prazer. Portanto, considera-se que a busca pelo prazer e a fuga do desprazer, muito utilizados pela teoria psicanalítica, também acontecem na relação do sujeito com o trabalho, em que, por meio do mecanismo da sublimação, o trabalhador pode obter satisfação advinda do chamado sofrimento criativo (AMARAL et al., 2017). Uma vez que, o real seria a parte da realidade que demanda reconfigurações subjetivas constantes dos trabalhadores. Inspirando-se no mecanismo de defesa da sublimação, Dejours trouxe o conceito de mobilização subjetiva relacionada ao sofrimento criativo. Entendida como um processo intersubjetivo que se caracteriza pelo engajamento da subjetividade do trabalhador e pela dinâmica da contribuição-retribuição simbólica (que pressupõe o reconhecimento do fazer do trabalhador) e pela cooperação. Esse processo possibilita a transformação do sofrimento por meio de uma operação simbólica de resgaste do sentido do trabalho (AMARAL et al., 2017). O trabalhador lida com esse sofrimento utilizando-se de estratégias defensivas, que podem ser tanto individuais quanto coletivas (OLIVEIRA; MENDES, 2014). são os mecanismos de defesa operantes, que estão interiorizados e operam mesmo sem a presença do outro. Essas estratégias possuem importante papel para a adaptação ao sofrimento, porém são de natureza individual, não atuando sobre a violência social (DEJOURS, 2006 apud OLIVEIRA; MENDES, 2014). necessitam de um consenso do grupo e dependem de condições externas ao sujeito (DEJOURS et al., 1994). Essas estratégias são construídas por um grupo de trabalhadores para resistir aos efeitos desestabilizadores e para lidar com as contradições advindas do trabalho. Uma forma de estratégia coletiva, por exemplo, poderia ser: um grupo de trabalhadores que toda sexta vão para um barzinho “reclamar” do trabalho e beber. Mas,até que ponto essa é uma atitude saudável? Dejuors ainda, divide essas defesas em algumas categorias, são as chamadas de proteção, de adaptação e de exploração (DEJUORS, 2004): são formas de pensar e agir que visam proteger do sofrimento advindo do trabalho, dessa forma, torna-se alheio às causas do sofrimento, tendo por consequências a intensificação deste ou o adoecimento. O trabalhador se sujeita a comportamentos inconscientes que atendam à produção e ao funcionamento, por vezes, perverso da organização do trabalho, se submetendo aos desejos da empresa (MENDES, 2007). Segundo Dejours, a carga psíquica do trabalho constitui-se no regulador da carga global do trabalho. O trabalho que permite a diminuição da carga psíquica é equilibrante. O trabalho que se opõe a esta diminuição é fatigante. O prazer resulta da descarga de energia psíquica que a tarefa autoriza, ocorrendo uma diminuição da carga psíquica, e por conseguinte essa organização equilibrante (LUNARDI FILHO, 1997). Dejours (1994) afirma que, as condições de trabalho prejudicam a saúde do corpo do trabalhador, com a chamada carga física enquanto a organização do trabalho atua no nível do funcionamento psíquico, com a carga psíquica. Toda a atividade, tem pelo menos três aspectos: físico, cognitivo e psíquico. Cada um deles pode determinar uma sobrecarga sobre o trabalhador. Dessa forma, a questão central, é: Qual a via de descarga dessa pessoa? assim, Dejours (2007), postula que o prazer do trabalhador resulta da descarga de energia psíquica que a tarefa autoriza, o que corresponde a uma diminuição da carga psíquica do trabalho. Todos nós, possuímos essas 3 vias de descarga, porém, uma vai ser a nossa “preferida” para descarregar a tensão, visto que, um desses três níveis pode ficar sobrecarregado devido à organização do trabalho. Imagine que uma pessoa gosta bastante de conversar, mas a organização inflexível do trabalho, impede que ela se expresse e se comunique, pode ocorrer um acumulo de carga psíquica. Essa retenção gera um acumulo no aparelho psíquico, ocasionando sentimentos de desprazer e tensão, assim, se não houver meios para a descarga, esta recuará para o corpo através de: dor de cabeça, fadiga etc... O aparato psíquico é responsável pela transformação da energia pelo adiamento da descarga e pela elaboração de experiências. (elaboração psíquica – pulsão – catexia - libido) Ou seja, de forma geral, pode “adiar” a descarga necessária para não sobrecarregar o sistema (engolindo a raiva) e elaborando aquela experiência em algo novo. Essa é uma das ideias da psicanálise sobre fluxo de energia, prazer etc...
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