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Uma Ideia Nova para a Europa A declaração Schuman 1950-2000 Por Pascal Fontaine Pascal Fontaine, nascido em 1948, doutorado em Ciências Políticas, foi o último assistente de Jean Monnet, com quem trabalhou de 1973 a 1977. Chefe de gabinete do presidente do Parlamento Europeu de 1984 a 1987. Professor no Institut d’études politiques de Paris. Assinado pelo seu autor, este texto não implica a responsabilidade da Comissão Europeia. Segunda edição INTRODUÇÃO 5 • A EUROPA AO SERVIÇO DA PAZ E DA DEMOCRACIA 5 • UM ÊXITO HISTÓRICO 5 • OS DESAFIOS DO FUTURO 8 • A ACTUALIDADE DO MÉTODO COMUNITÁRIO 8 I — O PLANO SCHUMAN, UMA RESPOSTA ADAPTADA AOS PROBLEMAS DO PÓS-GUERRA 10 • CONTEXTO HISTÓRICO 10 • AS IDEIAS DE JEAN MONNET 11 • A DECLARAÇÃO DE 9 DE MAIO DE 1950 12 • ELABORAÇÃO DO TRATADO CECA 15 II — O PLANO SCHUMAN, CERTIDÃO DE NASCIMENTO DA EUROPA COMUNITÁRIA 17 • OS PRINCÍPIOS INOVADORES DA PRIMEIRA COMUNIDADE EUROPEIA 17 • A CECA, PRIMEIRA PEDRA DO EDIFÍCIO EUROPEU 20 III — QUESTÕES PARA A EUROPA DO SÉCULO XXI 23 • PROCESSO DE ALARGAMENTO EM CURSO: UM INVESTIMENTO PARA A PAZ NA EUROPA 24 • REFORMAR AS INSTITUIÇÕES PARA UMA UNIÃO FORTE E DEMOCRÁTICA 26 • UMA UNIÃO POLÍTICA PARA GARANTIR A SEGURANÇA DOS CIDADÃOS EUROPEUS 29 CONCLUSÃO: O CIDADÃO NO CERNE DO PROJECTO EUROPEU 35 ANEXOS 36 • A DECLARAÇÃO DE 9 DE MAIO DE 1950 36 • CRONOLOGIA DA CONSTRUÇÃO EUROPEIA 38 3 SUMÁRIO A Europa ao serviço da paz e da democracia A Europa comunitária festeja o seu cinquentenário. Quando, em 9 de Maio de 1950, propôs à República Federal da Alemanha e aos outros países europeus que quisessem asso- ciar-se a criação de uma comunidade de interesses pacíficos, Robert Schuman realizou um acto histórico. Ao estender a mão aos adversários da véspera, não só apagava os rancores da guerra e o peso do passado como desencadeava um processo totalmente novo na ordem das relações internacionais, ao propor a velhas nações, pelo exercício conjunto das suas próprias soberanias, a recuperação da influência que cada uma delas se revelava impotente para exercer sozinha. A Europa que, desde essa data, se constrói dia a dia representou o grande desígnio do século XX e uma nova esperança para o século que se inicia. A sua dinâmica nasce do projecto visionário e generoso dos pais fundadores saídos da guerra e animados pelo desejo de criar entre os povos euro- peus as condições de uma paz duradoura. Esta dinâmica renova-se sem cessar, alimentada pelos desafios que se colocam aos nossos países num universo em rápida e profunda mutação. Alguém tinha previsto este imenso desejo de democracia e de liberdade que fez cair o muro de Berlim, devolveu o controlo do seu destino aos povos da Europa Central e Oriental e hoje, com a perspectiva de próximos alargamentos que consagrem a unidade do continente, confere uma nova dimensão ao ideal da construção europeia? Um êxito histórico Uma rápida análise dos 50 anos de história da integração europeia mostra que a União Europeia é, nos alvores deste terceiro milénio, um êxito histórico. Países outrora rivais e, na sua maior parte, destroçados pelos mais terríveis massacres que este continente conheceu, partilham hoje a mesma moeda, o euro, e gerem os seus interesses económicos e comerciais no quadro de instituições comuns. Os europeus solucionam os seus diferendos através de meios pacíficos, recorrendo ao direito e procurando a conciliação. O espí- rito de supremacia e a discriminação são banidos das relações entre os Estados-Mem- bros que confiaram às quatro instituições da Comunidade (Conselho, Parlamento, Comissão e Tribunal de Justiça), a missão de arbitrar os seus conflitos, definir o interesse geral dos europeus e desenvolver políticas comuns. 5 INTRODUÇÃO 6 Outro país candidato Países candidatos com os quais foram abertas negociações de adesão Grécia Portugal Espanha Itália França Luxemburgo Bélgica Reino Unido Irlanda Chipre Malta Turquia Bulgária Polónia República Eslovaca Hungria Eslovénia Roménia Finlândia Suécia Áustria Dinamarca Alemanha Países Baixos Estónia Letónia Lituânia República Checa Estados-Membros da UE (*) (*) Os territórios não continentais e ultramarinos não aparecem. O nível de vida da população melhorou consideravelmente, muito mais do que sem o benefício que representam para as econo- mias nacionais as economias de escala e os ganhos de crescimento resultantes do mercado comum e da intensificação das trocas. Os cidadãos circulam e os estudantes trabalham livremente num espaço sem fronteiras internas. Estão lançadas as bases de uma política externa e de defesa comum. Recentemente foram abertos novos estaleiros para aprofundar as polí- ticas comuns de solidariedade no domínio social, regional e do ambiente, da investi- gação e dos transportes. A integração económica torna cada vez mais necessários e possíveis os progressos rumo à união política. A União Europeia exerce no mundo uma crescente influência compatível com o seu peso económico, o nível de vida dos seus cidadãos, o seu lugar nos círculos diplomáticos, comerciais, monetários. A pujança da Europa comunitária decorre dos valores comuns de democracia e direitos humanos, partilhados pelos povos que a compõem, sabendo preservar a diver- sidade das culturas, das línguas e das tradições que fazem a sua riqueza. Graças à solidariedade atlântica e ao carácter atractivo do seu modelo, a Europa unida soube resistir às pressões dos totalita- rismos e fazer progredir o Estado de direito. A Europa comunitária tornase um pólo de convergência de todas as expectativas dos países, próximos ou longínquos, que atentam na dinâmica da União e querem consolidar a sua democracia renascida ou reconstruir uma economia devastada. Hoje, a União dos Quinze negoceia as suas próximas adesões com 10 países da Europa Central e Oriental e também com Malta e Chipre. Mais tarde, será a vez de reque- rerem a sua adesão outros países oriundos da ex-Jugoslávia ou pertencentes à esfera europeia. As negociações de alargamento giram em torno da aceitação do acervo comunitário e, em geral, dos grandes objec- tivos da União por parte dos países candi- datos. Pela primeira vez na sua longa história, o continente prepara-se para se reunificar na paz e na liberdade. Um movimento deste tipo representa um desafio considerável para o equilíbrio do mundo. As relações da Europa com os Estados Unidos, a Rússia, o mundo asiá- tico e a América Latina sofrerão grandes transformações. A Europa já não é simples- mente uma potência que soube preservar o seu lugar no mundo; a Europa constitui uma referência e uma esperança para os povos que amam a paz e o respeito dos direitos do Homem. Porquê este êxito? Estará inscrito para durar na lógica da História do continente, sufi- cientemente enraizado na memória e na vontade colectivas dos povos, de modo a erradicar os germes de qualquer guerra intraeuropeia? As experiências dolorosas do passado e os conflitos que ainda hoje minam a Europa Balcânica e ensanguentam o Cáucaso devem incitar os europeus a não considerar a paz como uma situação natural e dura- doura mas a preservála com os cuidados necessários. 7 Os desafios do futuro Após meio século de História comunitária, os europeus continuam a ser confrontados com interrogações fundamentais: quais são os valores elementares que os movem e quais as vias mais eficazes para os preservar? Qual é o grau de união dese- jável e possível para se poder retirar o máximo partido da força implícita na unidade, sem alterar a identidade nem destruir a especificidade que faz a riqueza das nossas nações, regiões, culturas? É possível avançar a compasso, jogando com a harmonia natural que favorece o consenso entre 15 Estados ou será neces- sário reconhecer as divergências de abor- dagem e diferenciar os ritmos de integração? Quais são os limites da Europa comunitária, quando tantas nações, a começar pelas novas democracias da Europa Central, Oriental e Balcânica até à Turquia, pedem para se associar ao processo de unificaçãoem curso? Como empenhar os indivíduos na empresa comu- nitária, despertar o sentimento de pertença à Europa que complete e ultrapasse as soli- dariedades originais? Como aproximar o cidadão europeu das instituições da União, dar a cada um a oportunidade de «assi- milar» o projecto de uma Europa unida, por longo tempo reservado às decisões das chancelarias e ao engenho dos funcioná- rios? Estas algumas questões de princípio que não é possível evitar, sob pena de enve- redar por becos sem saída. Questões de fundo cujas respostas determinarão em si múltiplas escolhas mais precisas, mais técnicas com que deverão confrontar-se quotidianamente os responsáveis da empresa comunitária. Para os europeus, a questão é simples: ou continuam a organizarse, reunindo as suas forças para fazer ouvir a sua voz no mundo, promover o ideal democrático e defender os seus interesses tanto económicos como estratégicos (deste modo a Europa conti- nuará a representar mais do que «o pequeno cabo da Eurásia» de que falava Paul Valéry; a Europa será um factor de equilíbrio e de moderação nas relações entre potências hiperindustrializadas e países de desenvolvimento difícil) ou então não perceberão de forma suficientemente clara as solidariedades que os unem nem criarão os instrumentos capazes de traduzir em factos os seus interesses comuns. Neste caso, as economias de cada um dos países serão reduzidas a papéis de subcontratação e o nível de vida dos consumidores regre- dirá. A Europa, simples entidade geográ- fica, será colocada na zona de influência de potências que lhe ficam à margem e lhe farão pagar o preço da sua dependência e da sua necessidade de proteccionismo. A actualidade do método comunitário A decisão tomada em 11 de Dezembro de 1999 pelo Conselho Europeu reunido em Helsínquia, no sentido de convocar uma conferência intergovernamental especial- mente encarregada de adaptar os Tratados às condições de bom funcionamento de uma União alargada a mais de 20 membros, representa a primeira pedra de um novo edifício institucional. A Europa quinquagenária encontrase em plena efervescência. As esperanças estão à altura das ambições e dos desafios, o que não elimina os riscos de fracasso. 8 Europa simples zona de livre câmbio ou Europa motor no mundo? Europa tecnocrá- tica ou Europa democrática? Europa do cada um por si ou Europa solidária? Perante tantas opções críticas, tantas incer- tezas, o método comunitário que resulta do diálogo organizado entre os Estados- -Membros e as instituições comuns, que exercem em conjunto a soberania por dele- gação, surge com uma retumbante actuali- dade. Há 50 anos possibilitou a criação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, logo seguida pela Comunidade Económica Europeia e pelo Euratom, completada pelo Acto Único Europeu, pelos Tratados de Maastricht e de Amesterdão. Penetrou nas relações intereuropeias um «fermento de mudança» que todos os dias produz novos efeitos. Amanhã, este método pode gerar a melhor contribuição possível para a solução dos grandes problemas com que os europeus se defrontam. O alcance dos princípios fundadores da construção europeia ultrapassa a simples mecânica institucional. Inventado e consubstanciado por homens de Estado que queriam antes de mais construir uma Europa ao serviço do Homem, o espírito comunitário confere à ideia europeia a amplitude de um projecto de civilização. A declaração Schuman permanece sem dúvida uma «ideia nova para a Europa». 9 O contexto histórico Os europeus não conheceram a trégua que deveria ter sucedido ao final das hostili- dades. Mal terminara a Segunda Guerra Mundial, não tardou a perfilar-se a ameaça de uma terceira, opondo o Leste e o Ocidente. Em 24 de Abril de 1947, o fracasso da Conferência de Moscovo sobre a questão alemã convencia os ocidentais de que a União Soviética, parceira na luta contra o nazismo, ia tornar-se uma fonte de perigo imediato para as democracias ocidentais. A tensão recrudesce com a criação do Kominform em Outubro de 1947, que coligava os partidos comunistas do mundo inteiro, o «golpe de Praga» de 25 de Fevereiro de 1948, que assegurou aos comunistas do domínio da Checoslo- váquia, seguido do bloqueio de Berlim em Junho de 1948, como prelúdio à divisão da Alemanha em dois Estados. Ao assinar o Pacto Atlântico com os Estados Unidos em 4 de Abril de 1949, os europeus do Ocidente lançaram as bases da sua segu- rança colectiva. Mas a explosão da primeira bomba atómica soviética, em Setembro de 1949, e a multiplicação das ameaças proferidas pelos dirigentes do Kremlin contribuíram para espalhar o clima de medo que, na época, foi designado por «guerra fria». O estatuto da República Federal da Alemanha, que dirigia ela própria a sua política interna desde a promulgação da Lei Fundamental de 23 de Maio de 1949, tornouse então o pomo da discórdia Leste- -Oeste. Mal os Estados Unidos manifestaram o desejo de acelerar a recuperação econó- mica de um país situado no âmago da divisão do continente, logo em Washington ecoaram vozes pedindo o rearmamento da antiga potência vencida. A diplomacia fran- cesa debatia-se com um dilema: ou cedia à pressão americana e, contra a sua opinião pública, consentia na reconstituição da potência alemã no Rur e no Sarre, ou então mantinha-se numa posição rígida, no confronto com o seu principal aliado e conduzindo a sua relação com Bona a um impasse. A Primavera de 1950 viu soar a hora da verdade. O ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Robert Schuman, foi incum- bido pelos seus homólogos americanos e britânicos de uma missão imperativa: fazer uma proposta para reintegrar a Alemanha Federal no concerto das nações ocidentais. Estava programada para 10 de Maio de 1950 uma reunião entre os três governos, pelo que a França não podia escapar às suas responsabilidades. Aos bloqueios políticos sucediam as difi- culdades económicas. Uma crise de super- produção do aço parecia então iminente devido ao potencial siderúrgico dos vários países europeus. A procura abrandava, os preços baixavam e tudo fazia temer que os produtores, fiéis às tradições dos ferreiros de entre as duas guerras, reconstituíssem um cartel para limitar a concorrência. Em10 I — O PLANO SCHUMAN, UMA RESPOSTA ADAPTADA AOS PROBLEMAS DO PÓS-GUERRA plena fase de reconstrução, as economias europeias não podiam darse ao luxo de entregar as suas indústrias de base à espe- culação ou à penúria organizada. As ideias de Jean Monnet Para destrinçar esta meada de dificuldades que revelava a impotência da diplomacia tradicional, Robert Schuman recorreu ao génio inventivo de um homem ainda desconhecido do grande público, mas que tinha adquirido uma experiência excep- cional ao longo de uma longa e rica carreira internacional. Jean Monnet, então comissário francês do Plano de Moderni- zação, nomeado por Charles de Gaulle em 1945, para assegurar a recuperação econó- mica do país, era um dos europeus mais influentes do mundo ocidental. Já na Primeira Guerra Mundial, tinha organizado as estruturas comuns de abastecimento das forças aliadas. Secretário-geral adjunto da Sociedade das Nações, homem da Banca nos Estados Unidos, na Europa Oriental, na China, foi um dos conselheiros do presi- dente Roosevelt e o artífice do «Victory Program» que assegurou a supremacia militar dos Estados Unidos sobre as forças do Eixo. Mesmo sem mandato político, aconselhava os governos e adquirira a reputação de um homem pragmático, sobretudo preocupado com a eficácia. O ministro francês confiara ao comissário do Plano as suas preocupações: «Que fazer com a Alemanha?», era a obsessão de Robert Schuman, cristão natural da Lorena movido pelo desejo de impedir para 11 Jean Monnet e Robert Schuman (C E) sempre qualquer guerra entre as duas nações. À testa da pequena equipa da rua de Martignac, sede do comissariado do Plano, Jean Monnet tinha também envere- dado pela reflexão. A sua principal preocu- pação era a política internacional. Em seu entender, a guerra fria tinha nascido da competição entre os dois grandesda Europa, porque a aposta era a Europa divi- dida. Ao fomentar a unidade da Europa, atenuavase a tensão. Jean Monnet reflectia numa iniciativa de alcance internacional cujo objectivo essencial fosse a distensão e a instauração da paz mundial graças ao efectivo papel desempenhado por uma Europa reconstruída e reconciliada. Jean Monnet tinha observado as diferentes tentativas de integração que se tinham desenvolvido sem êxito desde que o congresso organizado pelo Movimento Europeu em Haia em 1948 apelara solene- mente à união do continente. A Organização Europeia de Cooperação Económica, criada em 1948, tinha apenas atribuições de coordenação e não pudera impedir que a recuperação económica dos países europeus se efectuasse em moldes puramente nacionais. A instituição do Conselho da Europa em 5 de Maio de 1949 mostrava que os governos não estavam dispostos a deixar amputar as suas prerro- gativas. A assembleia consultiva tinha exclusivamente poderes deliberativos, podendo cada uma das suas resoluções, que devia ser aprovada por uma maioria de dois terços, ser bloqueada pelo veto do comité de ministros. Jean Monnet chegara à convicção de que era ilusório pretender criar, de um jacto, um edifício institucional completo, sem suscitar nos Estados-Membros resistências que votassem ao fracasso qualquer inicia- tiva. Os espíritos não estavam maduros para aceitar transferências maciças de sobe- rania, que teriam ferido as susceptibilidades nacionais ainda vivas, poucos anos após o final da guerra. Para ter êxito, era preciso limitar os objec- tivos a domínios precisos, de grande alcance psicológico, e instaurar um meca- nismo de decisão em comum que gradual- mente fosse recebendo novas competências. A declaração de 9 de Maio de 1950 Jean Monnet e os seus próximos colabora- dores redigiram durante os últimos dias de Abril de 1950 uma nota de algumas páginas que continha ao mesmo tempo a exposição de motivos e o dispositivo de uma proposta que iria subverter todos os esquemas da diplomacia clássica. Longe de proceder às tradicionais consultas junto dos serviços ministeriais competentes, Jean Monnet velou por que este trabalho fosse rodeado da maior discrição, a fim de evitar as inevitáveis objecções ou contrapropostas que teriam alterado simultaneamente o seu carácter revolucionário e o benefício ligado ao efeito de surpresa. Ao confiar o seu documento a Bernard Clappier, director do gabinete de R. Schuman, Jean Monnet sabia que a decisão do ministro podia alterar o curso dos acontecimentos. Por isso, quando, de regresso de um fim de semana na sua Lorena natal, Robert Schuman anun- ciou aos seus colaboradores: «Li o projecto. Eu trato do assunto», a iniciativa atingira o campo da responsabilidade política. No próprio momento em que o ministro francês defendia a sua proposta, na manhã de 9 de Maio, perante os seus colegas do governo, um emissário do seu gabinete comunicava-a em mão própria ao chan- celer 12 Adenauer, em Bona. A reacção deste último foi imediata e entusiasta. Respondeu logo que aprovava de todo o coração a proposta. Por conseguinte, foi devidamente munido do duplo acordo dos governos francês e alemão que Robert Schuman tornou pública a sua declaração numa conferência de imprensa realizada às 16 horas no salão de l’Horloge do Quai d’Orsay. A sua comu- nicação foi precedida de algumas frases introdutórias: «Não é uma questão de palavras vãs, mas um acto ousado, um acto construtivo. A França agiu e as consequên- cias da sua acção podem ser imensas. Espe- remos que assim seja. Agiu essencialmente pela paz. Para que a paz possa verdadeira- mente ter a sua oportunidade, é necessário que primeiro exista uma Europa. Quase exactamente cinco anos após a capitulação sem condições da Alemanha, a França cumpre o primeiro acto decisivo da cons- trução europeia e associa a esse acto a Alemanha. Com isto, é de esperar que as condições da Europa se transformem completamente. Essa transformação permi- tirá outras acções comuns até agora impos- síveis. Tudo isto será o nascimento da Europa, uma Europa estreitamente unida e solidamente construída. Uma Europa onde o nível de vida subirá graças à concen- tração das produções e ao alargamento dos mercados, que provocarão uma descida dos preços […]». O tom estava dado. Não se trata de um novo arranjo técnico sujeito ao ávido rega- 13 Lançamento do plano Schuman, em 9 de Maio de 1950: salão de l’Horloge do Quai d’Orsay, Ministério francês dos Negócios Estrangeiros. Ao microfone, Robert Schuman; à direita, Jean Monnet (CE) 14 Fac-símile do projecto definitivo da declaração de Robert Schuman de 9 de Maio de 1950. Este projecto definitivo era o nono; a equipa de Robert Schuman dava-lhe a última demão em 6 de Maio de 1950 (fonte: Fundação Jean Monnet para a Europa, Lausana) tear de negociadores. A França estende a mão à Alemanha, propondo-lhe que se associe em pé de igualdade, no seio de uma nova entidade inicialmente incumbida de gerir em comum o carvão e o aço de ambos os países, mas também, a mais longo prazo, de constituir a primeira pedra da federação europeia. A declaração (ver texto em anexo) enuncia uma série de princípios: — a Europa não se fará de uma só vez, far-se-á por meio de realizações concretas. É necessário antes de mais criar « solidariedades de facto»; — a secular oposição entre a França e a Alemanha deve ser eliminada. A proposta interessa principalmente estes dois países, mas está aberta à partici- pação de todas as outras nações euro- peias que partilhem os seus objectivos; — a acção imediata deve incidir num ponto «limitado, mas decisivo»: a produção franco-alemã de carvão e de aço, que deverá submeter-se a uma Alta Autoridade comum; — a fusão destes interesses económicos contribuirá para a melhoria do nível de vida e para a criação de uma comuni- dade económica; — as decisões da Alta Autoridade terão força executiva e vincularão os países que a ela aderirem. Será integrada por personalidades independentes numa base paritária. Elaboração do Tratado CECA Para que a iniciativa francesa — logo convertida numa iniciativa franco-alemã — conservasse todas as possibilidades de se transformar em realidade, era preciso agir rapidamente. Em 20 de Junho de 1950, a França convocou em Paris uma conferência intergovernamental presidida por Jean Monnet. Responderam ao apelo e sentaram-se à mesa das negociações os três países do Benelux e a Itália. Jean Monnet definiu o espírito dos debates que se iam inaugurar: «Estamos aqui para realizar uma obra comum. Não para negociar vantagens, mas para procurar as nossas vantagens na vantagem comum. Só eliminando da discussão qualquer sentimento particula- rista poderemos encontrar uma solução. Na medida em que, aqui reunidos, soubermos mudar os nossos métodos, contribuiremos para transformar pouco a pouco a mentali- dade de todos os europeus» (1). Os debates permitiram afirmar o projecto do edifício internacional previsto. A inde- pendência e os poderes da Alta Autoridade não foram postos em causa, porque consti- tuíam o ponto central da proposta. A pedido dos Países Baixos, foi instituído um Conselho de Ministros representando os Estados, o qual devia emitir em certos casos o seu parecer conforme. Uma Assembleia Parlamentar e um Tribunal de Justiça completarão o dispositivo que está na base do sistema institucional das Comunidades actuais. Os negociadores nunca perderam de vista que tinham o mandato político de cons- truir uma organização totalmente nova nos 15 (1) Monnet, J.: Mémoires, edições Fayard, Paris, 1976, p. 378. seus objectivos e nos seus métodos. Era essencial não enfraquecer a instituição prestes a ser criada com todos os defeitos próprios das organizações intergoverna- mentais clássicas: exigência da unanimi- dade, contribuições financeiras nacionais, subordinação do executivo aos represen- tantes dos Estados nacionais. Em 18 de Abril de 1951 foi assinado o Tratado que institui a Comunidade Euro- peia do Carvão e do Aço, em vigor por um período de 50 anos. Foiratificado pelos seis Estados signatários e, em 10 de Agosto de 1952, a Alta Autoridade presidida por Jean Monnet, pôde instalar-se no Luxem- burgo. 16 À declaração de Robert Schuman de 9 de Maio de 1950 seguiu-se, em 18 de Abril de 1951, a assinatura do Tratado de Paris, o primeiro dos Tratados fundadores da Comunidade Europeia (C E) Os princípios inovadores da primeira Comunidade Europeia Foi necessário quase um ano para concluir as negociações do Tratado de Paris porque, ao longo dessas negociações, surgiram uma série de questões fundamentais às quais Jean Monnet queria dar as respostas mais adequadas. Como vimos, não se tratava de uma negociação diplomática clássica. As personalidades designadas pelos seis governos estavam reunidas para inventar um sistema jurídico-político inteiramente novo e que aspirava a perdurar. O preâmbulo do Tratado CECA, constituído por cinco breves parágrafos, contém toda a filosofia que ainda hoje continua a inspirar os promotores da construção europeia: «considerando que a paz mundial só pode ser salvaguardada por esforços criadores à altura dos perigos que a ameaçam; convencidos de que a contribuição dada à civilização por uma Europa organizada e viva é indispensável à manutenção de relações pacíficas; conscientes de que a Europa só se cons- truirá por meio de realizações concretas que criem, antes de mais, uma solida- riedade efectiva e por meio do estabe- lecimento de bases comuns de desenvolvimento económico; preocupados em contribuir para a melhoria do nível de vida e para o progresso da causa da paz mediante a expansão das suas produções funda- mentais; resolvidos a substituir as rivalidades seculares por uma fusão dos seus inte- resses essenciais, a assentar, pela insti- tuição de uma comunidade económica, os primeiros alicerces de uma comuni- dade mais ampla e mais profunda entre povos há muito divididos por conflitos sangrentos e a lançar as bases de insti- tuições capazes de orientar um destino doravante compartilhado, […]» 17 II — O PLANO SCHUMAN, CERTIDÃO DE NASCIMENTO DA EUROPA COMUNITÁRIA «As propostas Schuman são simplesmente revolucionárias. O seu princípio fundamental é a delegação de soberania num domínio limitado, mas decisivo. Um plano que não parta deste princípio não pode dar qualquer contributo útil para a solução dos grandes problemas que nos debilitam. A cooperação entre as nações, por mais importante que seja, não resolve nada. O que é necessário procurar é uma fusão dos interesses dos povos europeus e não a mera manutenção dos equilíbrios entre esses interesses.» Jean Monnet «Paz mundial», «realizações concretas», «solidariedade efectiva», «fusão dos inte- resses essenciais», «comunidade», «destino doravante compartilhado»: eis algumas palavras-chave que contêm em germe simultaneamente o espírito e o método comunitários e conservam hoje todo o seu poder mobilizador. Embora o Tratado CECA, relativo à gestão do mercado do carvão e do aço, tenha deixado de representar hoje, pelo seu objecto, a importância que tinha, para a economia europeia, nos anos 50, os princí- pios institucionais que instaurou conservam toda a sua actualidade. Desencadearam uma dinâmica que continua a dar os seus frutos e alimenta uma visão política que convém seguir de perto, sob pena de pôr em causa o precioso acervo comunitário. Do plano Schuman, podemos destacar quatro princípios comunitários, que consti- tuem a base do actual edifício comunitário. A supremacia das instituições A aplicação às relações internacionais dos princípios de igualdade, arbitragem e conciliação, em vigor no próprio interior das democracias constitui um progresso de civilização. Os pais fundadores tinham vivido a experiência da desordem, da violência e do arbitrário que a guerra traz consigo. Todo o seu esforço tendia para a criação de uma comunidade de direito onde a lei prevaleça sobre a força. Jean Monnet citava muitas vezes o filósofo suíço Amiel: «A experiência de cada homem desvanece-se. Só as instituições se tornam18 O primeiro lingote de ferro europeu foi fundido em 30 de Abril de 1953 em Esch-sur-Alzette, no Grão-Ducado do Luxemburgo. Jean Monnet, presidente, e os membros da Alta Autoridade da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço celebram o acontecimento (fonte: Fundação Jean Monnet para a Europa, Lausana) mais sábias: acumulam a experiência colectiva e, com essa experiência, essa sabedoria, os homens sujeitos às mesmas regras, ainda que a sua natureza se mantenha, verão o seu comportamento transformar-se gradualmente». Pacificar e democratizar as relações entre os Estados, conjurar o espírito de domi- nação e o nacionalismo, eis as motivações profundas que deram à primeira Comuni- dade o seu conteúdo político e a colocaram no plano das grandes realizações históricas. A independência dos órgãos comunitários Para que as instituições desempenhem a sua missão, devem dispor de uma autori- dade própria. As garantias inerentes à Alta Autoridade da CECA, que revertem em benefício das actuais instituições comuni- tárias, são de três ordens: — a nomeação dos membros, hoje comis- sários, efectuada de comum acordo entre os governos (2). Não se trata de delegados nacionais mas de personali- dades que exercem o seu poder de forma colegial, que não podem receber instruções dos EstadosMembros. A função pública europeia deve obedecer a este mesmo e único princípio comu- nitário; — a independência financeira, concreti- zada na afectação de recursos próprios e não, como no caso das organizações internacionais, no pagamento de contri- buições nacionais, que podem ser postas em causa; — a responsabilidade da Alta Autoridade, e hoje da Comissão, exclusivamente perante a Assembleia (hoje Parlamento Europeu) que, deliberando por maioria qualificada, pode votar a moção de censura. A colaboração entre as instituições A independência da Alta Autoridade era, para Jean Monnet, a pedra angular do novo sistema. Mas, ao longo das negociações, admitiu a necessidade de dar aos Estados- -Membros a possibilidade de invocarem os interesses nacionais. Era o meio mais seguro de impedir a Comunidade nascente de se limitar a objectivos demasiado técnicos. Com efeito, era necessário que a Comunidade pudesse igualmente intervir em sectores onde fossem tomadas decisões de natureza macroeconómica, do âmbito da competência governamental. Assim, ao lado da Alta Autoridade, foi criado um Conselho de Ministros, cujo papel foi estri- tamente delimitado: não decidia por unani- midade, mas por maioria. O seu parecer favorável só era exigido em casos extremos. A Alta Autoridade conservava o monopólio da iniciativa legislativa: esta prerrogativa alargada às competências da actual Comissão, é essencial, porque confere a garantia de que o conjunto dos interesses comunitários será defendido numa proposta do Colégio. A partir de 1951, é organizado o diálogo entre as quatro instituições, numa base não de subordinação, mas de colabo- ração, exercendo cada uma delas as suas funções próprias no interior de um sistema decisório completo de natureza préfederal. A igualdade entre os Estados Tendo sido aceite o princípio da represen- tação dos Estados no seio do Conselho, 19 (2) A Comissão Europeia está igualmente sujeita ao voto de investidura do Parlamento Europeu. permanecia por resolver a delicada questão do seu peso respectivo. Os países do Benelux e a Itália, que receavam ficar em minoria pela proporção da respectiva produção de carvão e de aço na produção total, defendiam a regra da unanimidade. Por sua vez, a Alemanha preconizava um sistema de representação proporcional à produção. O que, naturalmente, não podia deixar de assustar os seus parceiros. Jean Monnet estava convencido de que só o princípio de igualdade entre os Estados poderia criar uma nova mentalidade. Tinha no entanto consciência da dificuldade que acarretava persuadir seis países de dimensões diversas a renunciar às facili- dades inerentes ao direito de veto. «O direito de dizer não era a segurança dos grandes nasrelações entre eles, bem como a garantia dos pequenos contra os grandes» (3). Neste contexto, em 4 de Abril de 1951, o presidente da conferência encontra-se em Bona com o chanceler Adenauer a fim de o persuadir das virtudes do princípio de igualdade. «Estou autorizado a propor-lhe que as relações a nível da Comunidade entre a Alemanha e a França sejam regidas pelo princípio da igualdade, quer no Conselho, quer na Assembleia, bem como em todas as instituições europeias actuais e futuras [...] Tenho a acrescentar, pessoalmente, que foi nesse espírito que sempre considerei a proposta de união que está na origem deste Tratado e julgo ter compreendido, aquando do nosso primeiro encontro, que também assim o entendia. O espírito de discrimi- nação foi a causa das maiores calamidades do mundo. A Comunidade é um esforço para o fazer recuar.» A resposta do chanceler foi imediata: «Conhece o meu empenhamento na polí- tica da igualdade de direitos para o meu país, no futuro, e sabe como condeno as acções de busca do predomínio para que este se deixou arrastar no passado. Felici- to-me por poder exprimir o meu acordo incondicional à sua proposta, pois não concebo a Comunidade sem a igualdade total.» Estabelecia-se assim um dos fundamentos jurídicos, de alcance moral, que confere o seu pleno sentido à noção de Comunidade. A CECA, primeira pedra do edifício europeu Na ausência de um tratado de paz entre os antigos beligerantes, a primeira Comuni- dade Europeia é ao mesmo tempo um acto de confiança na vontade da França e da Alemanha, e dos seus parceiros, de sublimar os erros do passado, e um acto de fé num futuro comum de progresso. Apesar dos sobressaltos da História e das resistências nacionalistas, a obra iniciada em 1950 estava destinada a não parar. O fracasso do projecto de Comunidade Euro- peia de Defesa, consumado em 30 de Agosto de 1954 após a rejeição pela Assembleia Nacional francesa do Tratado assinado em 27 de Maio de 1952, não quebra o impulso inicial. Em Junho de 1955, foi decidido dar um passo em frente em Messina, por iniciativa dos homens de Estado do Benelux, Paul Henri Spaak, Jan Beyen e Joseph Bech. A marcha rumo ao Tratado de Roma, assinado em 25 de Março de 1957, que institui a Comunidade Económica Europeia e o Euratom, é acele- rada por uma série de acontecimentos20 (3) Monnet, J.: Mémoires, edições Fayard, Paris, 1976, p. 413 e seguintes. externos: a crise de Suez e a repressão na Hungria pressionam de novo a Europa a cerrar fileiras. As Comunidades Europeias instaladas em Bruxelas e no Luxemburgo enriquecem o seu conteúdo e o número de participantes. Ao mercado comum geral vêm enxertarse políticas comuns agrícola, comercial, regional, social, de investigação, do ambiente, da educação, da cooperação com o Terceiro Mundo. Em 1972 integram as Comunidades o Reino Unido, a Irlanda e a Dinamarca; mais tarde, Grécia, Espanha e Portugal completam a Europa comunitária no seu flanco meridional. Em 1995, nasce a Europa dos Quinze com a adesão da Áustria, Finlândia e Suécia. Embora debilitada pela dupla crise petrolí- fera de 1973 e 1979, a Comunidade resiste às forças centrífugas e consolida a sua coesão instaurando o sistema monetário europeu em 1979. Este cria gradualmente as condições de uma lenta mas irreversível marcha para a união económica e mone- tária, alcançada em 1 de Janeiro de 1999 com a adopção do euro por 11 Estados da União. Como qualquer empresa em permanente evolução, a Europa não escapa às crises de crescimento: crise institucional em 1965, quando um Estado-Membro tenta pôr em causa o voto maioritário; crise financeira, marcada pela inadequação dos recursos próprios ao forte aumento das despesas, resultantes da multiplicação de novas polí- ticas e dos custos crescentes da política agrícola comum. Mas o facto é que nenhum Estado-Membro, por mais categóricas que tenham podido ser as suas exigências, encarou a possibili- dade de abandonar a Comunidade, porque é vista como o quadro insubstituível do seu desenvolvimento e da sua presença no mundo. Em 1984, o Parlamento Europeu adoptou um projecto de Tratado da União Europeia que propõe às instituições um salto qualita- tivo na respectiva integração. Ao adoptar, em 1985, o Livro Branco sobre o Grande Mercado Interno, a Comissão presidida por Jacques Delors confere um conteúdo concreto a esta vontade de progresso e fixa uma data-chave: 1 de Janeiro de 1993. Ao assinarem o Acto Único, em 1986, os Estados-Membros retiraram directamente do plano Schuman a sua fonte de inspiração e o seu método institucional: completaram o Tratado de Roma por uma série de objec- tivos precisos articulados em torno do objectivo principal do grande mercado sem fronteiras e elaboraram um calendário. Renovaram o processo decisório alargando o número de decisões a tomar por maioria qualificada. Deste modo, devolveram a esperança a milhões de cidadãos europeus ao propondo-lhes um horizonte mais vasto e oferecendo-lhes os meios de se adap- tarem à nova situação mundial. No momento em que as instituições euro- peias completam o mercado interno e alargam a dimensão económica e social da Europa comunitária, a História ressurge, imprevisível, em massa, e testa as capaci- dades dos europeus para se adaptarem às novas condições do mundo. A queda do muro de Berlim, a que se seguiu a unificação da Alemanha em 3 de Outubro de 1990, e a democratização dos países da Europa Central e Oriental, libertos da tutela da União Soviética, ela própria 21 confrontada com a sua própria autodisso- lução em Dezembro de 1991, transformam profundamente a estrutura política do conti- nente. Mais uma vez, os Estados são confrontados com um dilema: a facilidade da condução de políticas nacionais que privilegiem o interesse imediato ou a visão e a gestão concertadas do seu futuro comum. Privile- giando o respeito do seu compromisso europeu e conscientes da necessidade de integrar tão vastas transformações numa perspectiva comum, os Estados-Membros enveredaram por um processo de aprofun- damento da União ao negociarem um novo Tratado, cujas directrizes foram adoptadas no Conselho Europeu de Maastricht, em 9 e 10 de Dezembro de 1991. O Tratado da União Europeia, que entrou em vigor em 1 de Novembro de 1993, fixa aos Estados-Membros um programa ambi- cioso: união monetária até 1999, novas políticas comuns, cidadania europeia, Polí- tica Externa e de Segurança Comum, segu- rança interna. Uma cláusula de revisão consignada no Tratado de Maastricht levou os Estados-Membros a negociarem um novo Tratado, assinado em Amesterdão em 2 de Outubro de 1997, que adapta e reforça as políticas e os meios da União, nomeada- mente nos domínios da cooperação judi- ciária, livre circulação de pessoas, política externa e saúde pública. Ao Parlamento Europeu, expressão democrática directa da União, são atribuídas novas competências que confirmam o seu papel de co-legis- lador. Cinquenta anos de existência não enfra- queceram o potencial de inspiração que viu nascer a Comunidade Europeia. Os herdeiros dos pais fundadores, hoje responsáveis pelo destino dos povos de todo o continente, de Lisboa a Tallin, de Dublim a Varsóvia, saberão compreender a derradeira mensagem de Jean Monnet (4), o inspirador e animador desta primeira Comunidade que os exorta a apoderarem-se da sua própria visão do futuro? 22 (4) «Não podemos parar quando à nossa volta o mundo inteiro está em movimento. Consegui fazer compreender que a Comunidade que criámos não tem um fim em si mesma? É um processo de trans- formação que continua aquele que deu origem às nossas formas de vida nacionais ao longo de uma fase anterior da História. Como ontem as nossas províncias, hoje os nossos povos devem aprender a viver em conjunto com regras e insti- tuições comuns livremente aceites, se quiserem atingir as dimensões necessárias ao seu progresso e manter o controlo do seu destino. As nações sobe- ranas do passado deixaram de ser o quadro onde se podem resolver os problemas do presente. E a própria Comunidade é apenas uma etaparumo a formas de organização do mundo de amanhã», in Monnet, J.: Mémoires, edições Fayard, Paris, 1976, p. 616. Os historiadores da construção europeia deverão certamente considerar que o Conselho Europeu reunido em Helsínquia, em 10 e 11 de Dezembro de 1999, marcou uma viragem na evolução da União. De facto, foi nesta data que os chefes de Estado e de Governo decidiram elevar para 12 o número de países admitidos a negociar a sua adesão à União. Foi também em Helsínquia que a Turquia viu ser-lhe confe- rido o título de candidato com o qual poderão começar as negociações uma vez preenchidos os critérios políticos e econó- micos. Ao fixar em 1 de Janeiro de 2003 a data em que a União deverá estar em condições, após a Conferência Intergover- namental sobre a revisão dos Tratados, de acolher a primeira vaga de países candi- datos, os chefes de Estado e de Governo estabeleceram um calendário ambicioso para as instituições da União. Ao mesmo tempo, o Conselho Europeu quis aproveitar a lição da guerra do Kosovo que subli- nhara a necessidade de meios militares compatíveis com a projecção da Europa para além das suas fronteiras e o seu contri- buto para a solução de um conflito que se desenrolava à sua porta. Por isso, a Cimeira de Helsínquia colocou as primeiras pedras de um imenso edifício com o qual culminará sem dúvida a cons- trução encetada há 50 anos pelos pais fundadores. Cabe agora aos actores institu- cionais da União mas também aos cidadãos responder a três grandes questões funda- mentais para o futuro. • A Europa, até onde e para quem? Actualmente coloca-se a questão dos limites geográficos da União: que critérios, para além dos que respondem à exigência do respeito dos princípios democráticos e da capacidade de integrar o acervo comu- nitário, isto é, o conjunto das políticas comuns e da legislação comunitária, poderão justificar a recusa do acesso à União a todos os países limítrofes dos Estados actuais e dos futuros membros da União? • A Europa, como? A passagem, na próxima década, de uma União de 15 para quase 30 membros, coloca naturalmente a questão do seu funcionamento, da eficácia dos seus proce- dimentos de decisão, da sua homogenei- dade e da sua relação com o cidadão: União Federal dos Estados incluindo a moeda, a defesa e a cidadania comum ou zona de livre câmbio enquadrada por 23 III — QUESTÕES PARA A EUROPA DO SÉCULO XXI simples órgãos de arbitragem que velem pelo respeito das regras de concorrência? • A Europa, para quê? Quando a mundialização exige aos Estados e às sociedades um gigantesco esforço de adaptação e os conduz a redefinir as bases do contrato social pela bitola de novas regras válidas para o conjunto do planeta, os europeus deverão interrogar-se sobre o que lhes confere a sua identidade e os une enquanto europeus. Existe um modelo de desenvolvimento original para o nosso continente, baseado em valores comuns e na consciência de pertencer à mesma civi- lização? Será que os europeus partilham a mesma representação do lugar do homem na sociedade e dão uma resposta comum aos desafios do futuro, tais como o desen- volvimento duradouro e a bioética? Estarão prontos a assumir juntos a sua segurança interna e a sua defesa colectiva? Eis algumas questões que tornam o debate europeu indissociável do debate político interno em que todos os cidadãos são chamados a participar, no quadro de uma democracia activa. Processo de alargamento em curso: um investimento para a paz na Europa «A Europa não foi construída, tivemos que enfrentar a guerra.» Declaração de Robert Schuman em 9 de Maio de 1950. A queda do muro de Berlim em 9 de Novembro de 1989 foi vivida como uma magnífica aberta no céu do continente. A aspiração do povo alemão à liberdade e à democracia, depressa partilhada pelos povos do conjunto do bloco comunista, revelou-se mais forte do que a ditadura dos partidos leninistas e sobrepôs-se à ameaça dos exércitos do Pacto de Varsóvia. Por sua vez, em 26 de Novembro de 1991, o Soviete Supremo ratifica o desaparecimento da União Soviética. Com o fim da «guerra fria», surge um mundo novo, mais instável mas mais propício à vontade legítima e irre- pressível dos povos disporem do seu destino. A visão de Robert Schuman no sentido de ver reunificar o conjunto do continente na paz e na prosperidade irá enfim cumprir-se? A Comunidade Europeia tenta fornecer respostas adaptadas às novas necessidades de países finalmente libertos do domínio externo, mas enfraquecidos por um sistema económico arruinado e à procura de um sistema político estável e democrático. A partir de 1990 o Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento e o programa Phare concedem apoio financeiro às novas democracias da Europa Central e Oriental. São firmados acordos de associação com a Bulgária, a Eslováquia, a Hungria, a Polónia, a República Checa, a Roménia e depois com os três Estados Bálticos e a Eslo- vénia. Mas, para além do auxílio económico de urgência e da assistência destinada a faci- litar a transição para a economia de mercado, desenha-se um processo mais ambicioso para cada um destes países a que se juntam Chipre e Malta: o da adesão a prazo à União Europeia. O Conselho Europeu reunido em Cope- nhaga em 22 de Junho de 1993 regista esta aspiração e enumera as condições exigidas para a adesão de um país associado: — instituições estáveis que garantam a democracia, o primado do direito, os direitos do Homem e a sua protecção;24 — a existência de uma economia de mercado viável e a capacidade de fazer face à pressão da concorrência e às forças do mercado no interior da União; — a capacidade do país candidato assumir as obrigações decorrentes da adesão, nomeadamente, subscrever os objec- tivos da União política, económica e monetária. Estes critérios políticos e económicos impõem esforços consideráveis aos países candidatos e fazem pagar à respectiva população os pesados sacrifícios de uma economia de reconstrução e de transição. Mas a União Europeia comprometeu-se ela própria a assumir as suas responsabilidades morais e políticas perante povos durante muito tempo condenados ao imobilismo pelos dramas da História. A unificação da Alemanha, a aplicação do Tratado de Maastricht, assinado em 7 de Fevereiro de 1992 que conduziu, para 11 Estados-Mem- bros, à instauração do euro em 1 de Janeiro de 1999, depois da assinatura e entrada em vigor do Tratado de Amesterdão, traduzem a vontade da União no sentido de conti- nuar na via da integração. Readaptar as políticas comuns, lançar polí- ticas novas em sectores de futuro, conso- lidar o mercado interno na base de uma moeda única, e fomentar assim a criação de empregos, assegurar a liberdade de circu- lação dos cidadãos no interior de um espaço de justiça e de segurança interna, são as principais tarefas que as instituições se propuseram para consolidar o edifício antes de abrir as portas aos países candidatos. 25 A assinatura do Tratado de Amesterdão, em 2 de Outubro de 1997, marcou uma nova etapa na via da integração europeia. É este o acervo a subscrever pelos países candidatos (C E) O imperativo de estabilidade nas fronteiras da União foi a preocupação principal dos governantes durante a década de 90. Existia um vivo receio de ver ressurgir os conflitos territoriais, os ódios étnicos e as pulsões nacionalistas em zonas durante longo tempo sujeitas à férula de regimes totalitá- rios. A decomposição da exJugoslávia que gerou os conflitos desastrosos da Bósnia e do Kosovo, ameaçava atingir outras regiões. O esforço de solidariedade por parte da Europa Ocidental devia estar à altura do perigo de fazer da Europa Oriental e Balcâ- nica um braseiro. A perspectiva de anco- rarem na União Europeia, nas suas instituições democráticas e na sua economia aberta foi e continua a ser para o futuro um estimulante dos progressos a efectuar pelas jovens democracias da Europa Central e Oriental. Ao decidir consagrar uma parte substancial dos recursos do orçamento europeu ao auxílio de pré-adesão e adesão dos países candidatos — 80 milmilhões de euros, ou seja, 11,83% das dotações de autorização para o período de 2000-2006 — o Conselho Europeu reunido em Berlim em 25 de Março de 1999 concretizou este impera- tivo de solidariedade. Na realidade, trata-se de um investimento capital para a estabili- dade do continente e o futuro da sua reuni- ficação. Mas o desafio não é simplesmente de ordem financeira, é antes de mais polí- tico e inscreve-se na própria vocação do projecto de Robert Schuman. A reconci- liação dos inimigos da primeira metade do século XX foi o grande êxito do final deste século. A tarefa que espera os povos desta outra parte do continente que converge para a União apresenta uma amplitude equivalente: aprender a viver em conjunto na paz e na tolerância, ultrapassar os preconceitos étnicos e os ódios do passado, conciliar identidades e interdependências. Será igualmente necessário que estes novos Estados que acabam de conquistar pacifi- camente a sua soberania nacional consintam em sujeitar-se às regras comuns da União. Deverão compreender que a força de uma Comunidade assenta no exer- cício em comum de poderes livremente transferidos para instituições encarregadas de gerir o bem comum da União. Reformar as instituições para uma União forte e democrática «Criar progressivamente entre os homens da Europa o mais vasto interesse comum gerido por instituições comuns democráticas nas quais se delega a soberania necessária: eis a dinâmica que não deixou de funcionar desde o início da Comunidade Europeia, quebrando preconceitos, apagando fronteiras, alargando em poucos anos à dimensão de um continente o processo que ao longo dos séculos tinha formado os nossos velhos países.» Jean Monnet (Memórias, p. 615) Uma União alargada a mais 25 Estados- -Membros no termo da década que se inicia e que poderá contar, mais tarde ainda, cerca de 30 ou 35 países poderá funcionar com instituições concebidas em 1950 para seis Estados? Não há dúvida de que esta mutação espec- tacular, ao consagrar o próprio êxito da empresa comunitária, ameaça, sem reforma prévia, desnaturar os seus fundamentos e enfraquecer os seus mecanismos de decisão. A Comunidade Europeia transfor- mou-se progressivamente numa união polí- tica com base na dupla legitimidade de uma União de Estados e de uma união de povos. A eleição do Parlamento Europeu26 por sufrágio universal directo desde 1979 e o aumento progressivo dos seus poderes legislativos e de controlo introduziram nas instituições um fermento democrático. Uma União de 25 Estados que se exprime em nome de 500 milhões de cidadãos será um dos principais protagonistas do mundo de amanhã. As negociações do Tratado de Amesterdão, que entrou em vigor em 1 de Maio de 1999, já tinham tido por objecto traduzir em textos e na prática institucional este aumento de responsabilidades da União face aos seus próprios nacionais e ao resto do mundo. Mas era igualmente necessário tomar disposições para manter a eficácia dos procedimentos de decisão e garantir o equilíbrio original entre os Estados, de acordo com o seu peso demográfico respectivo. O Conselho Europeu reunido em Helsínquia em 11 de Dezembro de 1999 decidiu convocar uma nova Conferência Intergovernamental destinada a adoptar as modificações a introduzir aos Tratados europeus até Dezembro de 2000. Esta conferência, que se desenrola no primeiro semestre do ano sob a presidência portuguesa e no segundo semestre sob a presidência francesa, tem por mandato explícito analisar a dimensão da Comissão Europeia, a ponderação dos votos no seio do Conselho de Ministros e a eventual extensão do número de decisões que poderão ser tomadas por maioria qualifi- cada. Poderão ser adoptadas outras reformas que correspondam aos impera- tivos de uma União mais vasta mas também capaz de decidir eficazmente e de responder às expectativas dos cidadãos. Estes manifestaram por ocasião das eleições europeias de Junho de 1999 a sua exigência de uma maior transparência e de uma maior proximidade das instituições: quem decide na União, como são tomadas as decisões, como reforçar os controlos sobre a utilização dos dinheiros públicos pagos ao orçamento comunitário? Numa resolução votada em 18 de Novembro de 1999, o Parlamento Europeu mediu a importância da reforma institu- cional em curso, tendo-lhe fixado um objectivo ambicioso: a «constitucionali- zação» da União. Destinada a aproximar a Europa dos cidadãos, clarificar e tornar mais compreensíveis as competências das instituições comuns, esta constitucionali- 27 O Parlamento Europeu em sessão plenária: um papel político essencial, ao serviço dos cidadãos europeus (P E) zação implicará a unificação dos Tratados num texto único, com duas partes distintas: — uma parte constitucional, integrando os objectivos da União, os direitos funda- mentais e as disposições relativas às instituições e aos procedimentos de decisão; — uma parte que inclua as políticas comuns, e cujos procedimentos de revisão sejam mais flexíveis. Com os representantes dos Estados-Mem- bros, os parlamentos nacionais e a Comissão Europeia, o Parlamento Europeu é também parte na elaboração da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Os trabalhos tiveram início em Dezembro de 1999 com base num mandato estabele- cido pelo Conselho Europeu de Colónia em 4 de Junho de 1999. Presidida desde 15 de Setembro de 1999 por Romano Prodi, a Comissão comprome- teu-se, decididamente, com o apoio do Parlamento Europeu, na reforma da União. Num documento apresentado em 10 de Novembro de 1999 pelo presidente da Comissão e pelo comissário competente, Michel Barnier, intitulado «Adaptar as insti- tuições para garantir o êxito do alarga- mento», a Comissão observa que a reforma em curso não é apenas uma condição prévia para o alargamento mas também uma possibilidade de estabilizar o sistema institucional europeu. A Comissão sublinha a necessidade de alargar o voto por maioria qualificada ao nível do Conselho: «A quase duplicação do número de Esta- dos-Membros impõe ir muito mais longe, porque a diversidade dos interesses em breve será tal que o funcionamento da União facilmente poderá ser bloque- ado [...]. A decisão por maioria qualificada deve pois passar a ser a regra salvo excepções limitadas a algumas questões realmente fundamentais ou sentidas como politicamente muito sensíveis.» Para Jean Monnet, que tinha vivido pesso- almente a experiência da Sociedade das Nações e vira os limites de uma instituição onde se exercia o direito de cada Estado poder dizer não, «o veto é a causa profunda e simultaneamente o símbolo da impotência para ultrapassar os egoísmos nacionais». A extensão do voto por maioria qualificada ao Conselho, associada ao procedimento de co-decisão com o Parlamento Europeu e no respeito do direito de iniciativa que compete à Comissão, é a chave da abóbada do sistema institucional comuni- tário desde a sua criação. Será viável uma União de 30 Estados, se um ou outro dos seus membros for autorizado, apenas com o seu veto, a bloquear permanentemente qualquer decisão? O reforço, o aprofundamento da União e o seu alargamento não devem em caso algum ser dissociados nem considerados como imperativos inconciliáveis. É do interesse dos países candidatos obter um conjunto institucional coerente nas suas estruturas e eficaz nos seus modos de decisão. Este conjunto deve permanecer igualmente legí- timo aos olhos dos cidadãos e identificável por países terceiros que esperam que a União lhes fale a uma só voz. A Conferência Intergovernamental em curso deverá terminar no final do ano 2000 e dar à União luz verde para assinar os primeiros Tratados de adesão a partir de 2003 se as negociações com os países candidatos esti- verem concluídas nessa data, e os Tratados forem ratificados pelos Estados-Membros e28 sujeitos ao parecer conforme do Parla- mento Europeu. As eleições de Junho de 2004 para o Parlamento Europeu, seguidas a partir de 2005 pela entrada em funções duma nova Comissão Europeia, verão sem dúvida a participação de povos da Europa Centrale Oriental ou Mediterrânica. Esta perspectiva pressupõe por parte das insti- tuições da União e dos governos dos Esta- dos-Membros como dos Estados candidatos, uma mobilização à altura dos desafios. Uma União que tenha sido capaz de reformar as suas instituições, alargar-se sem se debilitar, consolidar o seu acervo conti- nuando a progredir no caminho da cons- trução política, será o prolongamento e depois a concretização do sonho dos pais fundadores. Uma União política para garantir a segurança dos cidadãos europeus A União Europeia dispõe de um braço armado ao serviço da paz A aspiração dos povos à segurança e à paz constitui um dos fundamentos mais fortes e mais legítimos do contrato social que liga o cidadão à autoridade pública. De facto, a sociedade internacional não esteve na época moderna em condições de garantir essa segurança à escala do continente europeu. Os dramáticos conflitos da Bósnia, do Kosovo e da Chechénia atingem populações inocentes. Recordam as sinis- tras memórias das exacções maciças come- tidas ao longo do século XX por exércitos ou milícias ao serviço de ideologias de ódio e exclusão. A União Europeia decidiu aceitar o desafio da violência. Não só ao fazer da solução pacífica dos conflitos de interesses o prin- cípio fundador dos Tratados, mas também ao projectar para além das fronteiras uma dinâmica de paz e de segurança servida por uma diplomacia preventiva activa. Esta diplomacia assenta em meios financeiros, na assistência económica e numa compro- vada competência em matéria de solução de conflitos. O Tratado de Maastricht, que entrou em vigor em 1 de Novembro de 1993, codi- ficou e reforçou um conjunto de regras e práticas de cooperação diplomática já iniciadas no quadro das Comunidades Europeias. O objectivo foi fixado no título V do Tratado: «A Política Externa e de Segu- rança Comum (PESC) abrange todas as questões relativas à segurança da União Europeia, incluindo a definição, a prazo, de uma política de defesa comum que poderá conduzir, no momento próprio, a uma defesa comum». O Tratado de Ames- terdão dá novos instrumentos à PESC reforçando a sua coerência com a acção externa tradicional da Comunidade Euro- peia. A União passa a dispor de estruturas políticas e administrativas que lhe permitem exprimirse a «uma só voz» na política inter- nacional. O alto-representante para a PESC, igualmente secretário-geral do Conselho de Ministros, actua sob a autoridade do Conselho Europeu e em estreita cooperação com a Comissão para aplicar as orientações diplomáticas da União. Esta está vocacio- nada para exercer responsabilidades à escala mundial. Deve zelar pela salva- guarda dos valores comuns, dos interesses fundamentais, da independência e integri- dade da União, e da sua segurança. Age no sentido da manutenção da paz, do reforço da segurança internacional, da promoção da democracia e do Estado de direito. 29 Actualmente a União Europeia, potência económica, monetária e comercial surge como agente diplomático que dispõe de meios para fazer ouvir a sua voz. O processo evolutivo conduz a União a apoiar-se na União da Europa Ocidental (UEO) competente em matéria militar. O Tratado de Amesterdão torna possível a prazo a plena integração da UEO na União Europeia. O Conselho Europeu reunido em Helsín- quia em 11 de Dezembro de 1999 ajudou a franquear uma nova etapa na construção da identidade europeia de segurança e de defesa. O princípio de uma capacidade autónoma para lançar e conduzir operações militares sob a direcção da União Europeia representa um progresso considerável na afirmação do papel político da Europa. A cimeira que reuniu em Washington em 24 de Abril de 1999 os chefes de Governo da NATO tinha-se «congratulado com o novo impulso dado ao reforço de uma política europeia comum de segurança e de defesa pelo Tratado de Amesterdão». A cimeira confir- mara «que um papel mais forte da Europa só pode contribuir para a vitalidade da nossa Aliança no século XXI, fundamento da defesa colectiva dos seus membros». Assim, a NATO declarou-se pronta a «permitir o fácil acesso da União Europeia aos meios e capacidades colectivos da Aliança para operações em que esta, no seu conjunto, não fosse militarmente comprometida enquanto Aliança». Por conseguinte, o Conselho Europeu de Helsínquia podia retirar as consequências concretas da vontade política da União no sentido de assumir uma capacidade de acção autónoma dos europeus ao nível da Aliança. Decidiu que «os Estados-Membros, cooperando voluntariamente no quadro de operações dirigidas pela União Europeia, deverão estar em condições, até 2003, de expor num prazo de 60 dias e apoiar durante pelo menos um ano forças mili- tares que podem atingir 50 000 a 60 000 pessoas». Estas forças deverão ser capazes de efectuar o conjunto «das missões huma- nitárias e de evacuação, as missões de manutenção da paz e as missões de força de combate para a gestão das crises, incluindo as missões de restabelecimento30 A União da Europa Ocidental A UEO integra 28 países para os quais constitui um verdadeiro quadro de diálogo e cooperação em matéria de segurança e de defesa. Destes países, 10 têm a qualidade de Estados-Mem- bros; são igualmente signatários dos Tratados da União Europeia e do Atlântico Norte. Os cinco outros países da União Europeia têm um estatuto de observadores; trata-se da Dinamarca e dos quatro Estados-Membros da UE que não fazem parte da NATO: Áustria, Finlândia, Irlanda e Suécia. Encontramos ainda na UEO, como membros associados ou como asso- ciados parceiros, os membros euro- peus da NATO que não aderem à UE bem como os países da Europa Central e Oriental que concluíram acordos europeus com a UE. da paz», enumeradas no artigo 17.° do Tratado da União Europeia, alterado pelo Tratado de Amesterdão. A criação de um comité político e de segurança, de um comité militar e de um estado-maior comum fornecerá à União Europeia os instrumentos operacionais necessários ao cumprimento daquelas missões. Assim a União Europeia apaga progressi- vamente a pesada recordação do fracasso da Comunidade Europeia de Defesa que, em 1954, marcara com uma travagem a dinâmica da integração. Os acontecimentos do Kosovo, a nova situação geopolítica, resultante do final da «guerra fria», a neces- sidade de construir uma União política à altura do peso crescente da União nos negócios do mundo permitiram fazer renascer a perspectiva de uma Europa forte e autónoma, capaz de afirmar os seus inte- resses no respeito das suas alianças. A diplomacia preventiva para garantir os direitos das minorias A intervenção armada é apenas o último argumento à disposição das democracias quando todos os recursos da diplomacia e da negociação se revelaram vãos. A política externa da União assenta prioritariamente na exportação dos princípios que assegu- raram o seu próprio desenvolvimento pací- fico: a procura do interesse comum, o respeito do direito, a arbitragem ao nível das instituições, a rejeição da discriminação e do espírito de supremacia. Tais princípios, que estão na base da PESC, já deram os seus frutos e são promissores para o futuro das regiões perturbadas do continente. Uma das primeiras acções comuns conduzidas pela União Europeia em aplicação do Tratado de Maastricht favoreceu a conclusão em Paris, em 21 de Março de 1995, do Pacto de Estabilidade. O objecto deste pacto, dirigido desde então pela Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa, consistia em asse- gurar a consolidação das fronteiras e o respeito dos direitos das minorias na Europa Central e nos Estados bálticos. A União preconizou o método de negociação das mesas-redondas regionais na Europa Central e Oriental. Esta dinâmica do diálogo tornou possível a assinatura de Tratados bilaterais e multilaterais entre os Estados interessados, o que pôs fim a antigos contenciosos históricos. Ao apoiar o Pacto de Estabilidade para o Sudeste da Europa, nascido em Colónia em Junho de 1999 do desejo de aprender com a guerra do Kosovo, a União quis uma vez mais provar as virtudespacificadoras do diálogo e da procura do interesse comum. Poderá o método das mesas-redondas regio- nais aplicar-se aos Balcãs, ao Cáucaso, à bacia mediterrânica? A União Europeia está vocacionada para se tornar «engenheiro da paz» e da integração regional, prolongando assim a mensagem que Jean Monnet entre- gara ao Parlamento de Estrasburgo em 30 de Novembro de 1954: «Entre países sepa- rados, a vantagem de cada um limita-se ao resultado do seu esforço isolado, aos ganhos que obtiver sobre o vizinho, às difi- culdades que lhe conseguir transferir. Na nossa Comunidade, a vantagem de cada um dos países membros é o efeito da pros- peridade do conjunto». Circular na União com toda a liberdade e segurança A liberdade de circular sem controlos nem restrições no interior do território comuni- tário já estava inscrita como um objectivo e 31 um direito dos cidadãos da União no Acto Único Europeu de 1986 e no Tratado de Maastricht de 1992. Era possível construir um mercado único que permitisse às mercadorias, capitais e serviços ultrapassar os obstáculos das fronteiras sem conceder essa mesma facilidade às pessoas? Para além da lógica económica que visa faci- litar a mobilidade da mão-de-obra e a melhor afectação dos recursos humanos, foi de facto o conceito de cidadania euro- peia que se impôs para justificar a supressão dos controlos de pessoas. Os acordos de Schengen, concluídos em 14 de Junho de 1985 entre cinco países membros e progressivamente alargados a todos os Estados da União, com excepção do Reino Unido e da Irlanda, permitiram concretizar esta medida muito bem aco- lhida pela população. Quem aceitaria hoje rever este direito elementar de viajar de Berlim até Lisboa ou de Roma até Estras- burgo com o mesmo sentimento de liber- dade que se experimenta quando nos deslocamos no nosso próprio país? O Tratado de Amesterdão introduziu em 1997 o acervo de Schengen nos textos constitu- tivos da União. Pôr em causa uma das prerrogativas tradi- cionais de um Estado no quadro da sua soberania nacional, o controlo das suas 32 No centro do dispositivo comunitário, a livre circulação de pessoas e bens regista constantemente novos progressos. O espaço comunitário de liberdade, segurança e justiça definido em 1997 pelo Tratado de Amesterdão deve facilitar a liberdade de circulação das pessoas e aplicar normas comuns para a imigração e o direito de asilo. Uma cooperação judiciária e policial reforçada contribuirá simultaneamente para prevenir e sancionar a criminalidade internacional (C E) fronteiras, não podia fazer-se sem assegurar aos cidadãos que a respectiva segurança seria garantida tanto à escala europeia como do seu país. A opinião pública está cada vez mais preocupada com a insegu- rança quotidiana, com a pequena e a grande delinquência, acentuada por tráficos ilegais de armas e de drogas, pela crimina- lidade internacional, pela imigração clan- destina e pelo terrorismo. Para poder ser visto como uma vantagem da União, o espaço de liberdade deve ser acompa- nhado por um espaço de segurança e de justiça. Foi aberto um enorme estaleiro que trabalha no sentido de harmonizar as regu- lamentações em matéria de direito de asilo e imigração, e aproximar as legislações nacionais relativas ao direito civil e ao processo civil. A cooperação judiciária penal e a cooperação policial devem igual- mente ser reforçadas para jugular a crimi- nalidade transnacional. Seria paradoxal que os delinquentes pudessem escapar à lei e às perseguições por encontrarem refúgio noutro Estado-Membro, faltando a polícias e juízes os meios para cumprirem a sua missão. O Tratado de Amesterdão deu um novo impulso à construção de um espaço comu- nitário de segurança, liberdade e justiça. Foi adoptado um programa quinquenal que reúne as instituições da União no estabele- cimento de normas comuns para a imigração, o direito de asilo, fundado no respeito dos direitos fundamentais e asse- gurando a prazo a livre circulação dos imigrantes na União. Para além desta primeira ao longo da qual se exige a unani- midade para as decisões a tomar pelo Conselho, será possível recorrer ao voto por maioria qualificada e à co-decisão que permita ao Parlamento Europeu, à Comissão e ao Tribunal de Justiça desem- penhar plenamente o respectivo papel. No quadro da cooperação intergovernamental, os Estados-Membros vão igualmente fixar normas obrigatórias em matéria penal e policial. Os meios da Europol serão reforçados, para melhor lutar contra o tráfico de droga e a criminalidade interna- cional. Será criada uma nova unidade, Eurojust, composta de procuradores, magis- trados e oficiais de polícia para facilitar a coordenação dos esforços das autoridades nacionais na sua luta contra o crime orga- nizado. O Conselho Europeu efectuou sob a presidência finlandesa, em 15 e 16 de Outubro de 1999, em Tampere, uma reunião especial consagrada à aplicação das disposições de Amesterdão. Foi subli- nhada a sua incidência na vida quotidiana dos europeus: «O cidadão só pode gozar de liberdade num verdadeiro espaço de justiça onde cada um possa dirigir-se aos tribunais e às autoridades de todos os Esta- dos-Membros tão facilmente como no seu próprio país. Os autores de infracções não devem poder de modo algum aproveitar-se das diferenças entre os sistemas judiciários dos Estados-Membros [...]. Os cidadãos têm o direito de esperar da União que ela reaja à ameaça que a grande criminalidade representa para a respectiva liberdade e os direitos que a lei lhes reconhece. Para debelar as ameaças é necessário agir em concertação, em toda a União, em matéria de prevenção e luta contra a criminalidade e as organizações criminosas. É necessária uma mobilização comum dos recursos poli- ciais e judiciários no sentido de velar por que os autores de infracções e o produto dos seus crimes não encontrem qualquer refúgio na União.» «Nós não fazemos coligações de Estados, nós unimos homens», dizia Jean Monnet. Esta perspectiva duma União de segurança, 33 externa e interna, deve suscitar o apoio dos cidadãos e ser construída num clima de transparência e de controlo democrático. O Conselho Europeu manifestou a sua intenção de entabular com a sociedade civil um diálogo aberto sobre os objectivos e as modalidades deste espaço em cons- trução. Ninguém duvida de que o debate democrático é indispensável para se realizar um projecto de tal amplitude; também ninguém duvida de que a União terá de enfrentar uma tarefa importante e delicada quando tiver de negociar com os países candidatos da Europa Central e Oriental a adopção do acervo neste domínio, a fim de assegurar o controlo das fronteiras externas numa União alargada aos confins da Ásia e da Rússia. 34 Seria cometer um grave erro de apreciação reduzir a integração europeia a um simples esforço de adaptação das economias dos nossos Estados aos desafios do livre câmbio mundial e da globalização. A ideia euro- peia nasceu da constatação de que «os homens colocados numa situação de facto nova, ou num sistema de obrigação dife- rente, adaptam o seu comportamento e tornam-se diferentes. Tornam-se melhores se o contexto novo for melhor: é a história muito simples do progresso das civili- zações, e é a história da Comunidade Euro- peia». O homem está no centro do projecto europeu, numa visão voluntarista e posi- tiva da sua capacidade de retirar ensina- mentos dos erros do passado para preparar um mundo melhor às gerações futuras. Continente de todos os dramas, terreno de confrontos entre nações soberanas e ideo- logias totalitárias que conduzem à guerra ou à exterminação programada de batalhões de inocentes, a Europa do século XX perfaz a sua transformação e aborda o terceiro milénio tendo consolidado os instrumentos que garantem a todos a promessa de uma paz duradoura. Com base nas instituições e na mensagem deixada por Robert Schuman e pelos cons- trutores do seu tempo, cabe agora às mulheres e aos homens europeus completar a unidade do continente interrogando-se constantemente sobre a contribuição que esta União continuaráa dar à civilização. 35 CONCLUSÃO: O CIDADÃO NO CERNE DO PROJECTO EUROPEU «Aquilo que devemos agora construir é uma União de corações e de espíritos que assenta no sentimento partilhado de uma comunidade de destino, na consciência de uma cidadania europeia.» Romano Prodi, presidente da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu, em 14 de Setembro de 1999. Os jovens são o futuro da Europa. A União elaborou em sua intenção importantes programas em domínios como a educação, a formação, os intercâmbios e o emprego. É um dos aspectos essenciais da Europa dos cidadãos (C E) ANEXOS A declaração de 9 de Maio de 1950 A paz mundial não poderá ser salvaguar- dada sem esforços criativos à altura dos perigos que a ameaçam. O contributo que uma Europa viva e orga- nizada pode dar à civilização é indispen- sável para a manutenção de relações pacíficas. Ao assumir-se há mais de 20 anos como defensora de uma Europa unida, a França teve sempre por objectivo essencial servir a paz. A Europa não foi construída, tivemos que enfrentar a guerra. A Europa não se fará de uma só vez, nem numa construção de conjunto: far-se-á por meio de realizações concretas que criem primeiro uma solidariedade de facto. A união das nações europeias exige que seja eliminada a secular oposição entre a França e a Alemanha: a acção deve envolver prin- cipalmente estes dois países. Com esse objectivo, o Governo francês propõe actuar imediatamente num plano limitado mas decisivo: «O Governo francês propõe subordinar o conjunto da produção franco-alemã de carvão e de aço a uma Alta Autoridade comum, numa organização aberta à parti- cipação dos outros países da Europa.» Colocar em comum as produções de carvão e de aço garantirá imediatamente o estabelecimento de bases comuns de desenvolvimento económico, primeira etapa da federação europeia, e mudará o destino de regiões durante muito tempo condenadas ao fabrico de armas de guerra, das quais foram as primeiras vítimas. A solidariedade de produção assim alcançada revelará que qualquer guerra entre a França e a Alemanha se torna não só impensável como também material- mente impossível. A criação desta pode- rosa unidade de produção aberta a todos os países que nela queiram participar permitirá fornecer a todos os países que a compõem os elementos fundamentais da produção industrial em condições idênticas, e lançará os fundamentos reais da sua unificação económica. Esta produção será oferecida a todos os países do mundo sem distinção nem exclusão, a fim de participar na melhoria do nível de vida e no desenvolvimento das obras de paz. Com meios acrescidos, a Europa poderá prosseguir a realização de uma das suas funções essenciais: o desen- volvimento do continente africano. Assim se realizará, simples e rapidamente, a fusão de interesses indispensável à criação de uma comunidade económica e introdu- zirá o fermento de uma comunidade mais vasta e mais profunda entre países durante muito tempo opostos por divisões sangrentas. Esta proposta, por intermédio da colocação em comum de produções de base e da instituição de uma nova Alta Autoridade cujas decisões vincularão a Alemanha, a França e os países aderentes, lançará as36 primeiras bases concretas de uma fede- ração europeia indispensável à preservação da paz. A fim de prosseguir a concretização dos objectivos assim definidos, o Governo francês está disposto a iniciar negociações nas seguintes bases. A missão atribuída à Alta Autoridade comum consistirá em assegurar, a breve trecho: a modernização da produção e a melhoria da sua qualidade; o fornecimento, em condições idênticas, de carvão e de aço aos mercados alemão, francês e dos países aderentes; o desenvolvimento da expor- tação comum para outros países; a harmo- nização no progresso das condições de vida da mão-de-obra dessas indústrias. Para atingir estes objectivos a partir das condições muito díspares em que actual- mente se encontram as produções dos países aderentes, deverão ser tomadas, a título provisório, determinadas disposições, incluindo a aplicação de um plano de produção e de investimentos, a instituição de mecanismos de perequação dos preços e a criação de um fundo de reconversão destinado a facilitar a racionalização da produção. A circulação do carvão e do aço entre os países aderentes será imediata- mente isenta de qualquer direito aduaneiro, não podendo ser afectada por tarifas de transporte distintas. Progressivamente, criar- -se-ão condições para assegurar espontanea- mente a repartição mais racional da produção ao mais elevado nível de produ- tividade. Ao contrário de um cartel internacional que tende a repartir e explorar os mercados nacionais com base em práticas restritivas e na manutenção de elevados lucros, a orga- nização projectada assegurará a fusão dos mercados e a expansão da produção. Os princípios e compromissos essenciais acima definidos serão objecto de um tratado assinado entre os Estados. As nego- ciações indispensáveis para precisar as medidas de aplicação serão realizadas com a assistência de um mediador designado de comum acordo; este terá a missão de velar por que os acordos respeitem os prin- cípios e, em caso de oposição irredutível, fixará a solução a adoptar. A Alta Autori- dade comum, responsável pelo funciona- mento de todo o regime, será composta por personalidades independentes designadas numa base paritária pelos governos; o presi- dente será escolhido de comum acordo entre os governos; as suas decisões serão de execução obrigatória na Alemanha e em França e nos restantes países aderentes. As necessárias vias de recurso contra as decisões da Alta Autoridade serão assegu- radas por disposições adequadas. Um representante das Nações Unidas junto da referida Alta Autoridade elaborará semes- tralmente um relatório público destinado à ONU, dando conta do funcionamento do novo organismo, nomeadamente no que diz respeito à salvaguarda dos seus fins pacíficos. A instituição da Alta Autoridade em nada prejudica o regime de propriedade das empresas. No exercício da sua missão, a Alta Autoridade comum terá em conta os poderes conferidos à autoridade interna- cional da região do Rur e quaisquer outras obrigações impostas à Alemanha, enquanto estas subsistirem. 37 1950 9 de Maio Robert Schuman, ministro francês dos Negócios Estrangeiros, propõe, num discurso inspirado por Jean Monnet, a gestão conjunta dos recursos de carvão e de aço da França e da República Federal da Alemanha numa organização aberta aos outros países europeus. 1951 18 de Abril Os Seis assinam em Paris o Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA). 1952 27 de Maio Assinatura em Paris do Tratado que institui a Comunidade Europeia da Defesa (CED). 1954 30 de Agosto A Assembleia Nacional francesa rejeita o Tratado sobre a CED. 20 a 23 de Outubro Conclusão dos acordos de Paris, na sequência da conferência de Londres: estes acordos estabe- lecem as modalidades de alargamento do Pacto de Bruxelas que dá origem à União da Europa Ocidental (UEO). 1955 1 e 2 de Junho Conferência de Messina: os ministros dos Negó- cios Estrangeiros dos Seis decidem o alargamento da integração europeia a toda a economia. 1957 25 de Março Assinatura em Roma dos Tratados que instituem a Comunidade Económica Europeia (CEE) e a Euratom. 1958 1 de Janeiro Entrada em vigor dos Tratados de Roma e insta- lação, em Bruxelas, das comissões da CEE e da Euratom. 1960 4 de Janeiro Assinatura da Convenção de Estocolmo que institui, por iniciativa do Reino Unido, a Asso- ciação Europeia de Comércio Livre (EFTA). 1962 30 de Julho Entrada em vigor da política agrícola comum (PAC). 1963 14 de Janeiro No decurso de uma conferência de imprensa, o general De Gaulle anuncia que a França exprime o seu veto contra a entrada do Reino Unido na CEE. 20 de Julho Assinatura em Iaundé do Acordo de Associação entre a CEE e 18 países africanos. 1965 Abril Assinatura do acordo sobre a fusão dos órgãos executivos das três Comunidades (CECA, CEE e CEEA), que institui uma Comissão
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