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Comunicação e Expressão – Profª Margarida Rocha VARIEDADES LINGUÍSTICAS São as variações que uma língua apresenta em razão das condições sociais, culturais e regionais nas quais é utilizada. Assim, além de variar de uma época para outra e de um lugar para outro, a língua também se modifica dependendo da pessoa que a utiliza. Uma língua nunca é falada de maneira uniforme pelos seus usuários: ela está sujeita a muitas variações. O modo de falar uma língua varia: De época para época: o português de nossos antepassados é diferente do que falamos hoje; De região para região: o carioca, o baiano, o paulista e o gaúcho falam de maneiras nitidamente distintas; De grupo social para grupo social: pessoas que moram em bairros chamados nobres falam diferente dos que moram na periferia. Costuma-se distinguir o português das pessoas mais prestigiadas socialmente (impropriamente chamada de fala culta ou norma culta) e o das pessoas de grupos sociais menos prestigiados (a fala popular ou norma popular); De situação para situação: cada uma das variantes pode ser falada com mais cuidado e vigilância (a fala formal) e de modo mais espontâneo e menos controlado (a fala informal). Um professor universitário ou um juiz falam de um modo na faculdade ou no tribunal e de outro numa reunião de amigos, em casa e em outras situações informais. Além dessas, há outras variações, como, por exemplo, o modo de falar de grupos profissionais, a gíria própria de faixas etárias diferentes, a língua escrita e oral. Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Diante de tantas variantes linguísticas, é inevitável perguntar qual delas é a correta. Resposta: não existe a mais correta em termos absolutos, mas sim, a mais adequada a cada contexto. Dessa maneira, fala bem aquele que se mostra capaz de escolher a variante adequada a cada situação e consegue o máximo de eficiência dentro da variante escolhida. Usar o português rígido, próprio da língua escrita formal, numa situação descontraída da comunicação oral é falar de modo inadequado. Soa como pretensioso, pedante, artificial. Por outro lado, é inadequado em situação formal usar gírias, termos chulos, desrespeitosos, fugir afinal das normas típicas dessa situação. Quando se fala das variantes, é preciso não perder de vista que a língua é um código de comunicação e também um fato com repercussões sociais. Há muitas formas de dizer que não perturbam em nada a comunicação, mas afetam a imagem social do falante. Uma frase como “o povo exageram” tem o mesmo sentido que “o povo exagera”. Como se sabe, o coletivo, sob o ponto de vista do conteúdo, é sempre plural. Nada impede que, mesmo na forma singular, mande o verbo para o plural. Houve mesmo época em que o “chique” era a concordância com o conteúdo. Hoje, a concordância é com a forma. Nesse particular, há uma aproximação máxima entre língua e etiqueta social. No português atual, uma frase como “o povo exageram”, embora não contenha nenhum absurdo, deprecia a imagem do falante. Linguagem “... Atividade humana que, nas representações de mundo que constrói, revela aspectos históricos, sociais e culturais. É por meio da linguagem que o ser humano organiza e dá forma as suas experiências. Seu uso ocorre na interação social e pressupõe a existência de interlocutores.” “Dizer que somos seres falantes significa dizer que temos e somos linguagem, que ela é uma criação humana (uma instituição sociocultural), ao mesmo tempo que nos cria como humanos (seres sociais e culturais). A linguagem é nossa via de acesso ao mundo e ao pensamento [...]. Ter experiência de linguagem é ter uma experiência espantosa: Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha emitimos e ouvimos sons, escrevemos e lemos letras, mas, sem que saibamos como, experimentamos sentidos, significados, significações, emoções, desejos, ideias.” A Linguagem nos faz elaborar entendimento sobre o mundo, interagir com as pessoas. Este entendimento á materializado através de um veículo social - LÍNGUA. Língua é utilizada por um grupo de indivíduos que constituem uma comunidade. o Ela é uma construção humana e histórica; o É organizadora da identidade dos seus usuários; o Ela também dá unidade a uma cultura , a uma nação; o Uma língua viva é dinâmica e, por isso está sujeita a variações. TIPOS DE VARIAÇÃO LINGUÍSTICA: 1. Os dialetos 2. Os registros 1. Os dialetos – são variedades originadas das diferenças de região ou território, de idade, de sexo, de classes ou grupos sociais e da própria evolução histórica da língua. Segundo Travaglia (1997), ocorre em função das pessoas que utilizam a língua. Vamos conhecer essas variedades? Variedade histórica Acontece ao longo de um determinado período de tempo, pode ser identificada ao se comparar dois estados de uma língua. O processo de mudança é gradual: uma variante inicialmente utilizada por um grupo restrito de falantes passa a ser adotada por indivíduos socioeconomicamente mais expressivos. A forma antiga permanece ainda entre as gerações mais velhas, período em que as duas variantes convivem; porém com o tempo a nova variante torna-se normal na fala, e finalmente consagra-se pelo uso na modalidade escrita. As mudanças podem ser de grafia ou de significado. Um exemplo bastante representativo é a questão da ortografia. Se levarmos em consideração a palavra “farmácia”, podemos observar que há muitos anos era escrita com “ph”. Hoje nos deparamos com a linguagem do internauta, caracterizada pela supressão de vocábulos. Leia o texto de Drummond Antigamente Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha "Antigamente, as moças chamavam-se mademoiselles e eram todas mimosas e muito prendadas. Não faziam anos: completavam primaveras, em geral dezoito. Os janotas, mesmo sendo rapagões, faziam-lhes pé-de-alferes, arrastando a asa, mas ficavam longos meses debaixo do balaio. E se levantam tábua, o remédio era tirar o cavalo da chuva e ir pregar em outra freguesia. As pessoas, quando corriam, antigamente, era para tirar o pai da forca e não caíam de cavalo magro. Algumas jogavam verde para colher maduro, e sabiam com quantos paus se faz uma canoa.” O texto é um bom exemplo da variação histórica da língua. Alguns termos são muito utilizados em determinada época, e com o passar dos anos, alguns se “aposentam” e outros se incorporam ao acervo linguístico da população. Talvez alguns dos termos utilizados no texto de Drummond você não os conheça. Vamos conferir? Mademoiselle (francês) = senhorita Janotas = elegantes, bem vestidos Pé-de-alferes = namorador Debaixo do balaio = esconder Levantam tábua = levar um fora Tirar o cavalo da chuva = desistir de alguma coisa Pregar em outra freguesia = comentar com outra pessoa Tirar o pai da forca = apressado para algo Não caiam de cavalo magro = não se deixa enganar Jogavam verde pra colher maduro = usar uma informação pequena pra conseguir outra mais importante Com quantos paus se faz uma canoa = aplicar corretivo Outro exemplo dessa variação se encontra nas cantigas medievais portuguesas, produzidas entre os séculos XII-XIV: Ai dona fea! Foste-vos queixar Porque vos nunca louv’en meu trobar Mais ora quero fazer um cantar Em que vos loarei toda via; Fea: feia. Trobar: trovar, cantar. Mais ora: mas agora. Loarei: louvarei. Veja outro exemplo: Num consultório entram o avô (65 anos) e o neto (10 anos). O avôolha para o médico e fala: — Doutor, quero que o senhor me receite um remédio para meu neto que está com difruço. O médico, meio que aturdido, porém compreende a fala do senhor e começa a prescrever a medicação. Eis que o neto interrompe: — Vovô, eu não tenho essa doença aí não, tenho apenas um leve resfriado. Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Para refletir... Assista ao vídeo e reflita sobre a música “Oito anos” (3:06), interpretada por Adriana Calcanhoto. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=1ACVnOEoKtE Como você pôde observar, o vocabulário de crianças de oito anos é bastante particular. Em seu discurso, estão presentes vários questionamentos sobre coisas do mundo e expressões desconhecidas. Com base na letra da música, reflita sobre as seguintes questões: a) Qual expressão é desconhecida pelas crianças de oito anos? b) Como a criança deve ter tido contato com tal expressão? c) Identifique o seu significado. Ainda pensando nas diferentes formas de se expressar, pesquise, na Internet e em entrevistas com pessoas próximas a vocês, expressões linguísticas que mudaram ao longo do tempo (como no exemplo da conversa entre o avô e o neto. Procure o seu significado. Variação social Agrupa alguns fatores de diversidade: o nível socioeconômico, determinado pelo meio social onde vive um indivíduo; o grau de educação; a idade e o gênero. A variação social não compromete a compreensão entre indivíduos, como poderia acontecer na variação regional; o uso de certas variantes pode indicar qual o nível socioeconômico de uma pessoa, e há a possibilidade de alguém oriundo de um grupo menos favorecido atingir o padrão de maior prestígio. Isso também está relacionado ao convívio social. Observe: Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Pessoas que têm maior acesso a leituras variadas, escolas, filmes, internet, etc. apresentam uma variedade da língua, digamos, mais próxima do falar exigido pela sociedade letrada. Não se trata de mais pobres ou menos pobres, trata-se apenas das oportunidades de leitura desses falantes. O nível de instrução do falante também faz com que a língua sofra variações. Isso quer dizer que falantes com maior escolarização tendem a usar a língua de modo mais formal que os falantes de menor escolaridade. Fato que, em muitos casos, provoca o surgimento do preconceito linguístico. Observe esta conversa entre um agricultor (analfabeto) e um meteorologista: Agricultor:- Sinhô, hoje chove de todo jeito! Meteorologista: -Não, as previsões só anunciam chuvas para o final do mês. Agricultor: -Num concordo, não sinhô e até pruque o mei miô, o mei findô e hoje já é 15. Assim, tá no miado e vai chuver. Meteorologista: - Mas e as previsões? O senhor não entende de nada, nem falar sabe... Agricultor: - Me disculpe, falá bunito como o sinhô eu possa num sabê, mas se o sinhô tem istudo num parece pruque num sabe nem arrespeitar or mai véi. E se eu num sei falá como dixe, como é que eu tenho 65 ano e nunca deixei de falá com o povo daqui e nunca errei um paipite de chuva?! A variação social pertence a um grupo específico de pessoas. Nesse caso, podemos destacar as gírias, as quais pertencem a grupos de surfistas, tatuadores, entre outros; os jargões, que pertencem a uma classe profissional mais específica, como é o caso dos médicos, profissionais da informática, dentre outros. AS GÍRIAS A gíria é um dos dialetos de uma língua. Quase sempre é criada por um grupo social, como o dos fãs do rap, de heavy metal, o dos que praticam certas lutas, etc. Gírias atuais Azarar – paquerar Bóia, rango – comida Do bem – alguém confiável É dez – é muito bom Firmeza – pessoa legal Galera – turma, torcida Mão-de-vaca – pessoa mesquinha Maneiro – algo bem interessante Tá ligado? – está atento, esperto? É fria – é perigoso Dar uma – transar Fica na moral – fica quieto, calado Gírias antigas Bafafá – confusão Bicho – forma de tratamento Boko-moko – pessoa que não sabe se comportar Carango – carro Chuchu beleza – bom, bem-feito Cricri – chato Nos trinques – ótimo, certo. Plá – conversa Prafrentex – avançado Ta ruço – está ruim Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha O JARGÃO O jargão é um tipo de código linguístico. É um conjunto de termos ou expressões comuns a um grupo de especialistas: termos especializados de economia, de informática, de publicidade, de jornalismo e de outras atividades. EXEMPLOS DE JARGÕES RELATIVOS A VÁRIAS ÁREAS DO CONHECIMENTO: Literatura: A linguagem é moderna e a edição conta ainda com um glossário sobre termos hoje em desuso, notas esclarecedoras, índice onomástico e remissivo e fac- símile do documento. Seu caráter didático é claro, pois o estudioso objetiva clareza e iluminação do texto, o que atende aos nossos propósitos. Fala de um advogado, explicando a linguagem que ele usa no Forum: • " As expressões são data venia, permissa venia, concessa venia. O senhor, para não usar de aspereza com o juiz, o senhor bota data venia, que quer dizer "com o devido respeito", bota antes data venia e aí fala o que quiser para o juiz. Os sinônimos de data venia seriam permissa venia, concessa venia. Eu jamais repito data venia no mesmo processo. Só data venia, data venia, fica enfadonho, né?" Fala de um médico explicando algumas doenças do coração: • "Tem gente que nasce com coração maior ou menor, com vários defeitos. Essas são as cardiopatias congênitas, né, o coração pode nascer com inúmeros defeitos. Agora, o tamanho do coração também tem a ver com outros problemas que não são congênitos, como a insuficiência coronariana." Fala de um professor de academia de ginástica: • "É importante que a gente faça a maromba, que a gente utilize o trabalho de maromba que é pro corpo ficar sarado, pra que a gente possa ficar casca grossa." Artes: Essa obra tem notável dinamismo, aliado à perfeita harmonia dos movimentos e expressão das personagens plasticamente representadas. Negócios: Agradecemos sua consulta e anexamos à presente nossa tabela de fretes e cronograma de nossos carregamentos. Medicina / Farmácia: Assim como ocorre com outros agentes trombolíticos, a hemorragia é o efeito indesejável mais comum associado ao uso do medicamento X... Pós-graduação: A presente dissertação consiste na revisão da obra de (...). A análise e a interpretação de sua produção ficcional são realizadas por meio de uma leitura dialogada entre os três variados blocos que compõem a obra do autor. A proposta desenvolvida é a de contribuir para uma maior compreensão da obra deste escritor brasileiro, e seus efeitos nos campos formal e temático dos textos de ficção. Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha COMO E QUANDO USAR O JARGÃO? Quando a linguagem for adequada ao público a que é dirigida: um físico fazendo uma comunicação em um congresso de físicos; Quando o veículo de comunicação for especializado: um artigo científico, de Direito, por exemplo, em revista especializada de sua área ou um texto de TCC em linguagem acadêmica; Quando os envolvidos na conversa ou na leitura forem do mesmo grupo de profissionais ou especialistas: encontro entre médicos; reunião entre arquitetos; congresso de jornalistas; debate entre geneticistas. CONSEQUÊNCIASDA INADEQUAÇÃO DA LINGUAGEM: Distorções na compreensão da mensagem:Você pode ser mal compreendido ou não entender sobre o que as pessoas estão falando; Animosidade entre as partes envolvidas: Cria-se um clima de falta de respeito que pode provocar problemas de comunicação; Equívocos no cumprimento do objetivo do texto: Você pode não conseguir transmitir sua mensagem porque ela está fora de contexto (mas não necessariamente incorreta). Muitas vezes as pessoas acham que têm de "falar difícil" para impressionar o ouvinte ou leitor. Fazem, então, aquele discurso enfeitado, com termos rebuscados. O resultado é um texto incompreensível e que afasta o interlocutor, que deveria ser cativado. O português arrevesado, cheio de enfeites e termos incompreensíveis, é um vício de linguagem. É um tipo de jargão a ser evitado. Há até um sufixo para eles: o "ês": o juridiquês, o publicitês, o economês, o politiquês. Seguem dois exemplos de mau uso de jargões. Procure identificar porque a linguagem está inadequada. Jargão inadequado: Ao tomar da pena para escrever-lhe esta célere missiva, dois sentimentos se debatem em fúria dentro do meu coração. De um lado, a dúvida, de outro, a esperança... Texto claro e simples: Ao escrever-lhe esta rápida carta, dois sentimentos me deixam em conflito: a dúvida e a esperança. Jargão inadequado: Com um instrumento cortante, devidamente afiado, destaque o couro que deve recobrir a estrutura muscular do trem posterior de um suíno, bem como parte do revestimento adiposo. Texto claro e simples: Com uma faca bem afiada, retire a pele e a gordura de um pernil de porco. Observe, agora, a linguagem “dos manos”, utilizada por diversos grupos sociais: Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Mano não bate....................................dá porrada. Mano não acha interessante................acha irado. Mano não vai em festa...............vai pra Balada Mano não bebe.........................chapa o coco Mano não cai............................capota Mano não entende.....................se liga Mano não fuma.........................puxa Mano não come........................engole Mano não entra........................invade Mano não mata.........................destrói Mano não pede.........................impõe Mano não fala..........................troca ideia Mano não vai embora.................vaza Mano não dorme........................apaga Mano não namora.......................dá uns pega Mano não se masturba...............bate uma Para refletir... Assista a uma reportagem sobre as gírias (5:34), disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=OiLePwCC-zU Para saber mais... Pesquise na Internet e leia a crônica de Luis Fernando Veríssimo: “O jargão” Para praticar... Reflita sobre a música “Inútil” do grupo Ultraje a Rigor (2:39), disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=kiyvRs7JEAU Percebemos na música construções linguísticas que não são comuns a pessoas mais instruídas na população. Com base em sua experiência como falante da língua portuguesa, responda: a) Quais construções são consideradas inadequadas segundo a gramática da língua portuguesa? b) Reescreva essas construções, adequando-as às regras da gramática. c) Segundo a letra da música, quem seriam os “inúteis”? Explique, destacando algum trecho. d) Podemos considerar a linguagem utilizada própria para uma música? Variação Regional ou Geográfica Variação geográfica ou regional trata das diferentes formas de pronúncia, vocabulário e estrutura sintática entre regiões. Dentro de uma comunidade mais ampla, formam-se comunidades linguísticas menores em torno de centros polarizadores, política e economia, que acabam por definir os padrões linguísticos utilizados na região de sua Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha influência e as diferenças linguísticas entre as regiões são graduais, nem sempre coincidindo. Conforme a região do falante, o uso da língua varia, pois este tem vocabulário e pronúncia próprios de sua região. O que não significa dizer que região X fala “melhor” ou mais “bonito” do que região Y. Quem assim pensa comete preconceito linguístico. Veja este exemplo: Um falante nordestino, ao chegar numa feira livre no Rio de Janeiro, diz ao vendedor: — Quero um quilo de macaxeira. E o vendedor responde: — Caramba, não tenho. Tenho mandioca, serve? O falante nordestino examina o produto e diz:— Vou levar, é a mesma coisa! Já nesta letra de uma canção de Paulo Vanzolini temos uma variedade regional do interior de alguns Estados brasileiros, conhecida como “variedade caipira”. Veja: Cuitelinho Cheguei na bera do porto Onde as onda se espaia. As garça dá meia volta, Senta na bera da praia. E o cuitelinho não gosta Que o botão da rosa caia. Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Vamos refletir sobre o texto seguinte? No nordeste é diferente, é assim que a gente fala (Ismael Gaião da Costa) No Brasil pra se expressar Há diferenciação Porque cada região Tem seu jeito de falar O Nordeste é excelente Tem um jeito diferente Que a outro não se iguala Alguém chato é Abusado Se quebrou, Tá Enguiçado É assim que a gente fala Uma ferida é Pereba Homem alto é Galalau Ou então é Varapau E coisa ruim é Peba Cisco no olho é Argueiro O sovina é Pirangueiro Enguiçar é Dar o Prego Fofoca aqui é Fuxico Desistir, Pedir Penico Lugar longe é Caxaprego Ladainha é Lengalenga E um estouro é Pipoco Qualquer botão é Pitoco E confusão é Arenga Fantasma é Alma Penada Uma conversa fiada Por aqui é Leriado Palavrão é Nome Feio Agonia é Aperreio E metido é Amostrado O nosso palavreado Não se pode ignorar Pois ele é peculiar É bonito, é Arretado E é nosso dialeto Sendo assim, está correto Dizer que esperma é Gala É feio pra muita gente Mas não é incoerente É assim que a gente fala O texto a seguir é um bom exemplo de algumas variantes regionais, quanto à pronúncia, marcadores conversacionais que caracterizam os diversos falares, identificando suas identidades linguísticas. Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Assaltante Cearense: Ei, bixim… Isso é um assalto… Arriba os braços e num se bula nem faça munganga… Passa vexado o dinheiro senão eu planto a peixeira no teu bucho e boto teu fato pra fora… Perdão meu Padim Ciço, mas é que eu tô com uma fome da moléstia… Assaltante Mineiro: Ô sô, prestenção… Isso é um assartin, uai… Levanto os braço e fica quetin que esse trem na minha mão tá cheio de bala… Mió passá logo os trocados que eu num tô bão hoje… Vai andando, uai, tá esperando o que, uai. Assaltante Gaúcho: O gurí, ficas atento… Báh, isso é um assalto… Levantas os braços e te aquieta, tchê! Não tente nada e tome cuidado que esse facão corta que é uma barbaridade…tchê! Passa os pilas prá cá! E te manda a la cria, senão o quarenta e quatro fala! Assaltante Carioca: Seguiiiinnte, bicho… Tu ta lascado, isso é um assalto… Passa a grana e levanta os braços rapa… Não fica de bobeira que eu atiro bem pra cacete… Vai andando e se olhar pra trás vira presunto… Assaltante Baiano: Ô meu rei…(longa pausa)… isso é um assalto… Levanta os braços, mas não se avexe não… Se num quiser nem precisa levantar, pra num ficar cansado…Vai passando a grana, bem devagarinho… Num repara se o berro está sem bala, mas é pra não ficar muito pesado… Não esquenta, meu irmãozinho, vou deixar teus documentos na próxima encruzilhada… Assaltante Paulista: Ôrra, meu… Isso é um assalto, cara… Alevanta os braços, meu… Passa a grana logo, ô meu… Mais rápido,ô meu, que eu ainda preciso pegar a bilheteria aberta pa comprar o ingresso do jogo do Curintia, meu… Pô, se manda, meu… Apesar da língua oficial ser a Língua Portuguesa, o português do Brasil é diferente do português de Portugal. Observe algumas diferenças: Na pronúncia: Pronúncia no Brasil Pronúncia em Portugal Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha menino m'nino esperança esp'rança pedaço p'daço No vocabulário: Português do Brasil Português de Portugal abridor tira-cápsulas açougue talho aeromoça hospedeira de bordo apostila sebenta bala rebuçado banheiro casa de banho cafezinho bica caixa, caixinha boceta calcinha cueca carteira de identidade bilhete de identidade carteira de motorista carta de condução celular telemóvel conversível descapotável faixa de pedestres passadeira fila fila ou bicha (gíria) geladeira frigorífico grampeador agrafador história em quadrinhos banda desenhada injeção injeção ou pica (gíria) meias peúgas ônibus autocarro pedestre peão ponto de ônibus paragem professor particular explicador sanduíche sandes sorvete gelado suco sumo trem comboio vitrine montra xícara chávena Na sintaxe: - Colocação do pronome oblíquo em início de frase. Português do Brasil Português de Portugal Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Me dá um presente? Dá-me um presente? - Emprego da preposição em, ao invés de a. Português do Brasil Português de Portugal Vou na escola hoje. Vou à escola hoje. - Uso frequente de gerúndio, ao invés de infinitivo precedido de preposição. Português do Brasil Português de Portugal Estou preparando o almoço. Estou a preparar o almoço. As diferentes modalidades de variação linguística não existem isoladamente, havendo um inter-relacionamento entre elas: uma variante geográfica pode ser vista como uma variante social, considerando-se a migração entre regiões do país. Observa-se que o meio rural, por ser menos influenciado pelas mudanças da sociedade, preserva variantes antigas. O conhecimento do padrão de prestígio pode ser fator de mobilidade social para um indivíduo pertencente a uma classe menos favorecida. 2. Os registros – Para Travaglia (1997), são variedades que ocorrem em função do uso que se faz da língua, conforme a situação em que o usuário e o interlocutor estão envolvidos. Podem ocorrer tanto na língua padrão quanto nas variedades da língua não padrão. As principais delas dizem respeito ao uso da língua em situações de oralidade/escrita e de formalidade/informalidade. . Oralidade e escrita Nos dias de hoje, a maior parte dos brasileiros sabe ler e escrever. Por isso existe a tendência de a língua oral e a língua escrita se tornarem parecidas, pois, quanto mais as pessoas têm acesso à língua escrita, mais utilizam na fala as características da escrita. Apesar disso, quando escrevemos, temos condições de escolher bem as palavras, de corrigir o texto e melhora-lo até transmitir exatamente o que desejamos. Já na fala não há essa possibilidade. As correções, quando existem, são feitas na hora; além disso, a linguagem apresenta repetições, quebras na seqüência de idéias, problemas de concordância e várias expressões de apoio, como né?, tá?, entendeu?, hum...etc. Formalidade e informalidade Às vezes, mesmo sem perceber, falamos em determinadas situações de modo diferente do habitual. Por exemplo, quando falamos em público, quando conversamos com pessoas mais instruídas do que nós ou com pessoas que ocupam cargos ou posição elevada. Nessas situações, quase sempre empregamos a língua formal, isto é, falamos de modo cuidadoso, evitando gírias, expressões grosseiras e palavras ou expressões que demonstrem intimidade com o interlocutor, como fofinha, safado, pra caramba, dia de cão, é um saco!, etc. Se, entretanto, temos familiaridade com a pessoa com quem falamos, empregamos normalmente a língua informal. Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Principais diferenças entre oralidade e escrita Oralidade Escrita O momento de produção e o de recepção do texto são simultâneos. Há defasagem entre o momento de produção e o de recepção. É possível negociar o sentido com o interlocutor e, também, corrigir-se. O autor deve antecipar possíveis dúvidas do leitor e tratar de esclarecê-las ainda no momento de produção. O texto é construído para comunicar-se melhor, os interlocutores interagem o tempo todo, usando tanto a linguagem verbal quanto a não verbal. O autor produz o texto solitariamente e, depois, o leitor deve reconstruir seus significados também sozinho. É impossível “voltar atrás” no que foi dito. ´´E possível revisar o texto quantas vezes for necessário. O processo de produção é transparente: o interlocutor “vê” seus erros e correções. O processo de produção fica oculto: o leitor tem acesso apenas ao texto final. É impossível consultar outras fontes durante a produção. É possível consultar outras fontes e checar as informações. O planejamento é local; enquanto está falando uma frase, a pessoa pensa na próxima. O planejamento é global: a pessoa planeja o texto como um todo e, caso se desvie do plano inicial, pode aceitar a nova ordem ou voltar atrás. Tende a haver maior tolerância a erros e, portanto, mais informalidade. Tende a haver maior cobrança e, portanto, mais formalidade. A obediência à norma padrão costuma ser menos rígida. Por exemplo, as marcas de plural às vezes desaparecem. A norma padrão costuma ser seguida com mais rigor, até porque é possível revisar o texto. Predomínio de frases curtas e simples: “Bom dia, pessoal! Hoje a gente vai dar uma recordada na equação de segundo grau. Vamos abrir o livro na página 10 que eu já explico”. Predomínio de frases longas e complexas: “Para a primeira aula, está prevista uma revisão dos fundamentos de cálculo, a começar pela equação de segundo grau. Os alunos resolverão uma série de problemas em sala, sob a supervisão do professor”. Predomínio da voz ativa e da ordem direta: “Vamos revisar os fundamentos de Uso frequente da voz passiva e da ordem indireta: “Serão revisados os fundamentos Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha cálculo”. de cálculo”. Abundância de “frases quebradas” (anacolutos): “Essas optativas, precisa fazer o pré-requisito primeiro”. Maior linearidade na composição das frases: “Para inscrever-se nas disciplinas optativas, é preciso ter cumprido os pré- requisitos". Fonte: GUIMARÃES, Thelma de Carvalho. Comunicação e Linguagem. São Paulo: Pearson, 2011. Para aprofundar seu conhecimento... Algumas diferenças regionais no Brasil (influência) Amazônia Região Nordeste Tupi importado: A Amazônia fala de um modo bem diferente do vizinho Nordeste. A razão para isso é que lá quase não houve escravidão de africanos. Predominou a influência do tupi, língua que não era falada pelos índios da região, mas foi importada por jesuítasno processo de evangelização. Minha tchia: O litoral nordestino recebeu muitos escravos negros, enquanto o interior encheu-se de índios expulsos da costa pelos portugueses. Isso explica algumas diferenças dialetais. No Recôncavo Baiano, o "t" às vezes é pronunciado como se fosse "tch". É o caso de "tia", que soa como "tchia". Ou de "muito", frequentemente pronunciado "mutcho'". No interior, predomina o "t" seco, dito com a língua atrás dos dentes. Minas Gerais São Paulo Maternidade: A exploração do ouro levou gente do Brasil todo para Minas no século XVIII. Como toda a mão-de-obra se ocupava da mineração, foi necessário criar rotas de comércio para importar comida. Uma delas ligava a zona do minério com o atual Rio Grande do Sul, onde se criavam mulas, via São Paulo. As mulas, que não se reproduzem, eram constantemente importadas para escoar ouro e trazer alimentos. Também espalharam a língua brasileira pelo centrosul Porrrrta: Até o século passado, a cidade de São Paulo falava o dialeto caipira, característico da região de Piracicaba. A principal marca desse sotaque é o "r" muito puxado. A chegada dos migrantes, que vieram com a industrialização, diluiu esse dialeto e criou um novo sotaque paulistano, fruto da combinação de influências estrangeiras e de outras regiões brasileiras. Rio de Janeiro Região Sul Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha Chiado europeu: Quando a família real portuguesa mudou-se para o Rio, em 1808, fugindo de Napoleão, trouxe 16.000 lusitanos. A cidade tinha 50 mil habitantes. Essa gente toda mudou o jeito de falar carioca. Data daí o chiado no "s", como em "festa", que fica parecendo "feishta". Os portugueses também chiam no "s". Tu e você: Os tropeiros paulistas entraram no Sul no século XVIII pelo interior, passando por Curitiba. O litoral sulista foi ocupado pelo governo português na mesma época com a transferência de imigrantes das Ilhas Açores. A isso se deve a formação de dois dialetos. Na costa, fala-se "tu", como é comum até hoje em Portugal. No interior de Santa Catarina, adota-se o "você", provavelmente espalhado pelos paulistas. Disponível em: http://www.ple.uem.br/3celli_anais/trabalhos/estudos_linguisticos/pfd_linguisticos/095.pdf Vimos, então, que nossa língua é rica e permite diversas variações, como as que vimos. É bom lembrar que não há uma ou outra forma de se expressar melhor do que outra. As pessoas, em cada lugar, em cada época, de acordo com suas necessidades, utilizam a linguagem necessária para se comunicarem. Devemos, então, buscar a adaptação a essas diversas formas de expressão, para que possamos nos comunicar de maneira eficiente, sem qualquer tipo de preconceito. Por falar nisso, você tem algum tipo de preconceito linguístico? Para refletir sobre o Preconceito Linguístico, recomendo a leitura do livro de Marcos Bagno “Preconceito linguístico: o que é, como se faz” (Ed. Loyola) Disponível em: http://files.comunidades.net/ramalde/marcosbagnopreconceitolinguistico100619193317 phpapp01.pdf Para aprofundar... Assista o vídeo sobre variações linguísticas (10:28), disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=_Y1-ibJcXW0#aid=P8Ii3Bz5zzw Comunicação e Expressão – Variedades lingüísticas (TEXTO) Profª Margarida Rocha REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAMACHO, R. (1988). A variação lingüística. In: Subsídios à proposta curricular de Língua Portuguesa para o 1º e 2º graus. Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, p. 29-41 CEREJA, William Roberto; MAGALHÃES, Thereza Cochar. Gramática Reflexiva: Texto, semântica e interação. São Paulo: Atual. 1999. __________________. Português: Linguagens. São Paulo: Atual. 2006. CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. SP: Ática, 1994. FERREIRA, Mauro. Entre palavras. São Paulo:FTD,2006 www.dsignos.com.br. Dicas de Português.Virgínia Maria Antunes de Jesus.
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