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Curso de Física Básica – Volume II I Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS C URS O D E F ÍS IC A B Á S I C A – V OL UME I I CAMPO GRANDE - 200 9 Curso de Física Básica – Volume II II Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS C URS O D E F ÍS IC A B Á S I C A VOLUME I I Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física Universidade Federal de Mato Grosso do Sul Campo Grande – 2009 Curso de Física Básica – Volume II III Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS O material aqui apresentado pode ser livremente distribuído e utilizado, desde que citada a fonte. Curso de Física Básica – Volume II IV Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Conteúdo do Volume II Capítulo I - Partículas e Campos ....................................................................................... 1 Introdução ........................................................................................................................................ 3 O conceito de campo ........................................................................................................................ 3 Campos e o Princípio da Superposição ......................................................................................... 7 Linhas de força .............................................................................................................................. 9 Fluxo e circulação de um campo vetorial .................................................................................... 11 A Lei de Gauss para campos cuja dependência seja do tipo 1/r2 .................................................. 17 Interação gravitacional entre partículas: o Campo Gravitacional (gg) ......................................... 21 Massa inercial e massa gravitacional .......................................................................................... 22 Campo gravitacional de uma partícula pontual (gg) ..................................................................... 23 Consequências da gravitação universal: as Leis de Kepler ......................................................... 28 Interação elétrica entre partículas: o Campo Elétrico (EE) ........................................................... 32 Campos de corpos extensos ........................................................................................................... 41 Cálculo de campos produzidos por corpos extensos: utilizando o Princípio da Superposição .. 41 Cálculo de campos produzidos por corpos extensos: utilizando a Lei de Gauss ........................ 44 A circulação dos campos E e g. ....................................................................................................... 54 Interação devida a correntes: o Campo Magnético (BB) ................................................................. 56 Definindo o campo magnético: a Força de Lorentz .................................................................... 58 Movimento de partículas em campos: o movimento de cíclotron ............................................. 60 Corrente elétrica ......................................................................................................................... 63 Força magnética sobre um condutor carregado ......................................................................... 65 Torque sobre uma espira de corrente ............................................................................................ 70 Campo magnético criado por correntes estacionárias ............................................................... 73 Fontes do campo magnético .......................................................................................................... 75 Curso de Física Básica – Volume II V Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS A Lei de Biot-Savart ......................................................................................................................... 79 A Lei de Ampère .............................................................................................................................. 81 Força entre fios paralelos portadores de corrente ........................................................................ 98 Solenóides e toróides ................................................................................................................... 100 Trabalho ........................................................................................................................................ 103 O teorema trabalho energia ......................................................................................................... 109 Campos Conservativos .................................................................................................................. 110 Um exemplo de forças conservativas: forças centrais ................................................................. 112 Calor .............................................................................................................................................. 114 Modos de transferência de energia sob forma de calor .............................................................. 118 Processo de condução ............................................................................................................... 118 Processo de convecção ............................................................................................................. 118 Processo de radiação ................................................................................................................. 119 O que é a temperatura? ............................................................................................................... 119 Potência ........................................................................................................................................ 120 A Primeira Lei da Termodinâmica ................................................................................................. 121 Capítulo II - Potenciais e Energia Potencial ................................................................. 122 Potencial e Energia Potencial ....................................................................................................... 124 O conceito de energia potencial ................................................................................................... 124 O potencial (C) ............................................................................................................................ 130 Energia Potencial Gravitacional .................................................................................................... 132 Cálculo da energia potencial gravitacional: pontos próximos da superfície da Terra e sistema isolado composto pela Terra, campo gravitacional criado pela Terra e uma partícula............ 133 Partícula que se move sob ação de uma força externa, F, do chão até uma altura h. ............. 138 Cálculo da energia potencial gravitacional para trajetórias nas quais o campo gravitacional não pode ser considerado constante. .............................................................................................. 139 Curso de Física Básica – Volume II VI Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Potencial Gravitacional .................................................................................................................143 A energia potencial eletrostática e o potencial eletrostático ...................................................... 145 Superfícies equipotenciais ............................................................................................................ 148 Potencial devido a uma distribuição de partículas carregadas ou partículas pontuais com massa ...................................................................................................................................................... 148 Método 1 – Cálculo a partir do trabalho realizado para trazer cada uma das cargas a partir do infinito. .................................................................................................................... 152 Método 2 - Usando o conceito de potencial ....................................................................... 155 Exemplos de cálculo do potencial criados por corpos extensos .................................................. 157 Potencial e campo gravitacional devidos a um anel de massa m. ............................................ 158 Cálculo do campo e do potencial criados por um disco uniformemente carregado sobre o eixo do disco. .................................................................................................................................... 160 Cálculo do campo e do potencial criados por um cilindro uniformemente carregado sobre o eixo do cilindro. ......................................................................................................................... 164 Energia potencial eletrostática ..................................................................................................... 168 Definição – Divergente de um campo vetorial .......................................................................... 170 Teorema da Divergência de Gauss ............................................................................................ 170 Outro exemplo de cálculo da energia potencial: o oscilador harmônico ................................. 173 Outro potencial: a temperatura. .................................................................................................. 178 Um novo potencial: a pressão ...................................................................................................... 181 Capítulo III - Campos em meios materiais ................................................................... 187 Materiais dielétricos e materiais condutores ............................................................................... 189 Polarização ................................................................................................................................ 190 Carga volumétrica e carga superficial de polarização ............................................................... 192 Lei de Gauss em materiais dielétricos ....................................................................................... 195 Capacitores ................................................................................................................................ 197 Curso de Física Básica – Volume II VII Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Campo eletrostático no interior de dielétricos lineares ........................................................... 200 Energia armazenada em meios dielétricos lineares .................................................................. 202 Materiais magnéticos: diamagnetismo, paramagnetismo e ferromagnetismo. .......................... 203 A origem microscópica do magnetismo. Parte 1: o momento de dipolo orbital ..................... 204 Momento de dipolo magnético orbital e o momento angular ................................................. 205 A origem microscópica do magnetismo. Parte 2: o spin do elétron ......................................... 207 Materiais diamagnéticos, paramagnéticos e ferromagnéticos ................................................ 210 A magnetização (M) e correntes de magnetização ................................................................... 212 Campos magnéticos em meios materiais: o vetor H ................................................................ 215 Propriedades dos materiais ferromagnéticos ........................................................................... 218 Curso de Física Básica – Volume II 1 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Capítulo I - Partículas e Campos Curso de Física Básica – Volume II 2 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Curso de Física Básica – Volume II 3 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Introdução Vimos anteriormente que a energia é uma propriedade de todos os sistemas físicos e que pode se manifestar na forma de energia cinética (de translação, de vibração ou de rotação) das partes que compõem o sistema ou na forma de energia potencial (gravitacional, elástica, eletrostática, etc.) que está associada às interações que ocorrem entre as várias partes dos sistemas analisados. O conteúdo total de energia de um sistema é o que chamamos de Energia Total ou Energia Interna, estes dois nomes sendo sinônimos para nós. Quando colocados em contato, dois ou mais sistemas físicos podem trocar energia entre si. A energia pode fluir de um sistema para outro de duas formas: calor ou trabalho. Naturalmente, o aumento ou a diminuição do conteúdo energético de um sistema corresponde a uma diminuição ou aumento do conteúdo energético dos outros sistemas que estão em interação com ele, de modo a satisfazer o princípio da conservação da energia. Da mesma forma, o momento linear e o momento angular podem ser trocados entre sistemas físicos em interação. A natureza das trocas entre os diferentes sistemas interagindo depende do tipo de interação e da natureza dos limites dos sistemas, e os tipos de trocas que esses limites permitem. Quando falamos da troca de energia entre sistemas físicos, essas trocas podem acontecer por dois processos básicos: um sistema realiza Trabalho sobre outros sistemas físicos ou recebe Trabalho de outros sistemas; a segunda forma é através de Calor: ganhando energia sob a forma de Calor ou cedendo energia sob a forma de Calor. Para introduzir a ideia de Trabalho precisamos introduzir a ideia de campo e a forma como a força que um sistema exerce sobre o outro pode ser deduzida do conceito de campo e, a partir daí, como o Trabalho pode ser realizado. Relacionados com o conceito de campo, os conceitos de Linhas de Força e Fluxo de um campo vetorial são importantes na formalização dessas trocas. Passaremos a analisar cada uma das formas de troca de energia acessíveis aos diferentes tipos de sistemas físicos nas próximas seções. O conceito de campo Considere a seguinte situação: um asteróide (de massa m) se aproxima da Terra com certa velocidade, atraído pela força gravitacional da Terra (Fg). Veja a Figura 1. Como esta força Curso de Física Básica – Volume II 4 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS depende do inverso do quadrado da distância entre a Terra1 e o asteróide, quanto mais perto da Terra, mais intensa ela é. Se desprezarmos a atração gravitacional do Sol, da Lua e dos demais planetas sobre o asteróide, esta será a única força a agir sobre o asteróide. Logo, a aceleração do asteróide será dada, em módulo, por: gFa m Figura 1 - Interação Terra - Asteróide. Submetido a essa aceleração, o asteróide terá a sua velocidade aumentada percorrendo uma distância maior a cada segundo, à medida que se aproxima da Terra. No entanto,a informação sobre a posição do asteróide em certo instante de tempo viaja até a Terra a velocidade da luz (c). Será necessário certo intervalo de tempo t para que a informação da posição atual do asteróide chegue a Terra para que a força seja “ajustada” de acordo (supondo que isso aconteça instantaneamente) e o mesmo intervalo de tempo para que a informação seja mandada de volta e o asteróide possa “saber” qual a nova aceleração a que está submetido. Naturalmente, que o esquema acima é inviável, se quisermos analisar problemas para os quais a velocidade relativa entre a Terra e os objetos na sua vizinhança tornem o intervalo t suficientemente grande. Mas como o asteróide pode “saber” então qual sua aceleração? Uma forma alternativa de descrever esse problema é utilizarmos o conceito de Campo. 1 Isto será discutido mais adiante. r Terra Asteróide Curso de Física Básica – Volume II 5 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Suponhamos que a Terra possa colocar um “rótulo” em cada posição do espaço, e que nesse rótulo esteja escrito o valor da força que uma massa unitária experimentaria ao ocupar essa posição do espaço (veja a Figura 2). Assim, ao passar por uma dada posição, o asteróide “saberia” o valor da força naquela posição: bastaria multiplicar o valor da força por unidade de massa impressa no rótulo pela sua massa total. Desse modo, a interação que antes acontecia entre o asteróide e a Terra, diretamente, passa a acontecer entre o asteróide e o campo e este com a Terra. Ao conjunto dos valores da força por unidade de massa chamamos de Campo Gravitacional da Terra. Figura 2 - Asteróide na posição indicada pelo vetor r. Definimos como a fonte de um campo à propriedade da matéria que cria o campo. Para que duas partículas interajam é necessário que ambas possuam algum tipo de propriedade que seja comum às duas: massa, carga elétrica, etc. No exemplo do asteróide, vamos supor que exista uma propriedade da matéria, que chamaremos provisoriamente de carga gravitacional, por analogia com a carga elétrica. É essa propriedade da matéria que cria o campo gravitacional. Digamos que a carga gravitacional seja medida por uma quantidade chamada de massa gravitacional (mg) Se retirarmos a propriedade carga gravitacional da matéria, não teríamos interação gravitacional entre os objetos. A relação entre a massa gravitacional e o conceito de massa como estudamos antes, relacionada com a Inércia, daí ser chamada de massa inercial (mi), será explorada por nós mais adiante. O campo é o resultado da ação de uma partícula sobre as propriedades do espaço na sua vizinhança. Sem a presença da partícula, as propriedades do espaço são de certa natureza. Com a r Terra Asteróide 1 2 2 3 Curso de Física Básica – Volume II 6 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS presença da partícula, e das propriedades que ela carrega (inércia, estado elétrico, estado nuclear, etc.), o espaço a sua volta se modifica. A esta modificação nas propriedades do espaço chamamos campo. Cada propriedade da partícula modifica certas propriedades do espaço, daí falarmos nos diferentes tipos de campos: campo gravitacional, campo elétrico, campo magnético, campo nuclear, etc. Em geral, podemos definir o campo gerado por uma propriedade da matéria (a fonte do campo) como o conjunto dos valores de certa propriedade (alterada pela presença da fonte do campo) em cada ponto do espaço. No exemplo dado acima, do campo gravitacional, esses valores são a força gravitacional por unidade de massa (a fonte do campo gravitacional) em cada posição do espaço. Quando a propriedade do espaço alterada é representada por um vetor (como o campo gravitacional do nosso exemplo) os campos são chamados de campos vetoriais. Por outro lado, quando a propriedade alterada é representada por quantidades escalares o campo é dito campo escalar (como o campo de temperatura em uma sala). Mas, como saber o valor do campo criado por uma partícula em certa posição do espaço? Não podemos medir campos diretamente (assim como a força). Podemos, apenas, medir alterações no estado de movimento de partículas (acelerações). Para medirmos campos precisamos introduzir o conceito de partícula de teste. Considere a situação do asteróide e da Terra que comentamos antes. A massa do asteróide pode ser suficientemente grande para modificar a posição da Terra devido ao campo do próprio asteróide. Logo, o campo medido a partir da alteração do estado de movimento do asteróide é perturbado pela ação do asteróide sobre a Terra. A partícula que usamos para avaliar o campo deve ser suficientemente pequena para que não altere significativamente o estado da fonte do campo. Essas partículas são chamadas de partículas de teste. Naturalmente, que essa é uma abstração, pois partículas reais sempre afetarão as fontes dos campos. Tendo definido o que é uma partícula de teste, vamos definir o valor do campo pela modificação que este causa no estado de movimento de uma partícula de teste. Sabendo que, para que ocorra uma modificação no estado de movimento, é necessário que uma força atue sobre a partícula de Curso de Física Básica – Volume II 7 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS teste, definimos o campo como a razão entre a força experimentada pela partícula de teste e a propriedade da partícula de teste2. Vamos particularizar nossa análise para campos vetoriais. Seja C o vetor que representa o campo e F o valor da força experimentada por uma partícula de teste que tem certa quantidade da propriedade da matéria (qf) em certa posição do espaço (que denotaremos por r) então: 0 lim fq fq F r C r eq. 1 Observe que a força F é a força experimentada pela partícula de teste que contém certa quantidade de propriedade qf. Lemos essa equação como: o campo C na posição r é dado pelo limite da razão entre a força experimentada pela partícula de teste quando a partícula está na posição r e a quantidade da propriedade responsável pela existência do campo (qj) quando a quantidade de propriedade responsável pela criação do campo presente na partícula de teste vai a zero. A operação de tomada do limite quando a quantidade da propriedade que é a fonte do campo contida na partícula de teste tende a zero expressa matematicamente a ideia de que a partícula de teste não afeta a fonte do campo. O estudante deve observar que no processo de tomada do limite, a força experimentada pela partícula de teste também vai a zero, o que garante a finitude do valor de módulo de C. No nosso exemplo da Terra e do asteróide, a propriedade da matéria é a massa, portanto: qf = m (a massa do asteróide) e a força F é a força gravitacional, Fg. Logo, o campo gravitacional (g) na posição r será dado por: Campos e o Princípio da Superposição Como calcular o campo criado por muitas partículas? Observe que nossa definição de campo é geral (eq. 1) e depende somente da força experimentada pela partícula de teste colocada na 2 Lembrando sempre que a propriedade da partícula de teste que interessa é aquela responsável pela criação do campo. 0 lim g m m F r g r eq. 2 Curso de Física Básica – Volume II 8 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS posição em que queremos medir o campo C. A força que aparece no lado direito é a resultante de todas as forças que atuam na partícula de teste. Vamos supor que a força resultanteda ação de um conjunto de n partículas atuando na partícula de teste seja escrita como a soma das forças exercidas por cada uma das partículas individualmente. Então, podemos escrever que: 1 2 1 ... n n i i F F F F F eq. 3 Usando esse resultado, o campo experimentado pela partícula de teste será dado por: 1 0 0 0 1 lim lim lim f f f n i i q q f f n i q i f q q q F r F r C r F r C r Na passagem da primeira para a segunda linha foi usado o fato de que o limite de uma soma é a soma dos limites. Identificando o lado direito como o campo criado pela i-ésima partícula na posição r, podemos então escrever que: 1 ( ) n i i C r C r eq. 4 A conclusão a que a eq. 4 nos leva é de que o campo total criado por um conjunto de partículas em uma dada posição do espaço, denotada pelo vetor r, é a soma dos campos criados por cada uma das partículas naquela posição. Esse princípio é chamado de Princípio da Superposição. Observe que há uma hipótese escondida na nossa derivação: é a de que a força resultante é a soma total das forças que atuam na partícula, calculadas de forma independente (eq. 3), como se uma partícula ao atuar sobre a partícula de teste não soubesse da ação das outras partículas sobre a mesma partícula de teste. Poderia acontecer de que a força com a qual uma partícula atua sobre a partícula de teste fosse diferente pela presença de uma outra partícula. Nesse caso a eq. 3 não seria mais válida. Curso de Física Básica – Volume II 9 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Linhas de força O conceito de linhas de força é devido a Faraday3. A ideia das linhas de força surge da necessidade de visualizarmos os campos. Dado um campo C as linhas de força do campo são as linhas às quais o campo C é tangente em cada ponto. Por exemplo, consideremos o campo gravitacional. Como veremos mais adiante o módulo do campo gravitacional criado por uma partícula em certa posição do espaço é inversamente proporcional à distância entre o ponto onde o campo é calculado e a partícula que gera o campo. A sua direção é a reta que passa pela partícula que cria o campo e o ponto onde o campo é calculado. O sentido do campo gravitacional é do ponto onde o campo é calculado para a partícula que o cria. A Figura 3 mostra o sentido do campo gravitacional para várias posições no espaço (indicado pelas setas). Como podemos ver da Figura 3, os vetores que representam o campo gravitacional em cada posição do espaço estão sobre retas que passam pelo centro da partícula de massa m. As retas que são tangentes ao campo em cada posição são as próprias retas suporte dos vetores mostrados na figura. Figura 3 – Linhas de força do campo gravitacional. Para o campo elétrico vale a mesma coisa, já que como também veremos na mais adiante o campo elétrico apresenta uma dependência com posição que é equivalente ao caso do campo gravitacional. A única diferença aqui é que a carga elétrica pode ser de dois tipos. Usando a 3 Físico Inglês. Para uma biografia de Faraday veja http://pt.wikipedia.org/wiki/Michael_Faraday. g m Curso de Física Básica – Volume II 10 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS definição de carga de prova positiva é fácil ver que as linhas de campo de uma carga negativa são como mostradas na Figura 4, painel a, enquanto as linhas de campo de uma carga positiva são como mostradas no painel b da mesma figura. Naturalmente que nem todos os campos têm linhas de força como as mostradas nas figuras anteriores. Um caso típico é o campo magnético, cujas linhas de força são mostradas na Figura 5. Figura 4 – Linhas de força para o campo elétrico de cargas pontuais. Painel (a) para uma carga negativa e painel (b) para uma carga positiva. O desenho das linhas de campo é mais complicado nesse caso. Ao contrário das linhas mostradas para os campos gravitacional e eletrostático, as quais são abertas, as linhas de campo do campo magnético são fechadas sobre si mesmas. Para o imã mostrado na Figura 5, as linhas de campo entram no pólo sul do imã e saem do pólo norte do mesmo. A Terra funciona como um grande imã, com o pólo sul magnético perto do pólo norte geográfico e o pólo norte magnético perto do pólo sul geográfico. São as linhas de campo do campo magnético da Terra que nos protegem contra boa parte do vento solar, partículas altamente energéticas emitidas pelo Sol durante períodos de grande turbulência. A Figura 5 mostra a estrutura bastante complexa desse campo. De fato, o campo na proximidade da Terra é basicamente o campo gerado pela própria Terra. Contudo, à medida que nos afastamos da Terra, o campo é o resultado da superposição do campo magnético terrestre com o campo magnético solar. Para pontos mais distantes, o campo magnético solar é o campo dominante. Eg q- Eg q+ a b Curso de Física Básica – Volume II 11 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Figura 5 – Linhas de campo magnético geradas por um imã. Figura 6 – Campo magnético terrestre. As linhas de força são ótimas ferramentas para se visualizar a direção e o sentido do campo C. Contudo elas não permitem o cálculo do módulo do campo C. Entretanto, há uma convenção que, se não permite o cálculo do módulo do campo, permite que se tenha uma ideia de onde o campo é mais intenso (maior módulo). Por convenção, o campo é mais intenso nas regiões onde as linhas de força estão mais próximas, e menos intenso (menor módulo) naquelas regiões nas quais as linhas de força são mais espaçadas. Fluxo e circulação de um campo vetorial Dois conceitos importantes quando falamos de campos vetoriais são os conceitos de fluxo e de circulação. Estes dois conceitos podem ser mais bem visualizados se pensarmos em um fluido que escorre através de uma tubulação. Veja a Figura 7. S N Curso de Física Básica – Volume II 12 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Figura 7 – Líquido escorrendo por uma tubulação. Nesta figura mostramos um reservatório repleto de certo líquido, o qual escorre pela tubulação de seção reta retangular (a base da tubulação é retangular). O escoamento do fluido é caracterizado, basicamente, pela sua velocidade. Podemos falar de um campo de velocidades para o fluido da seguinte maneira: em cada ponto do fluido supomos que temos um elemento infinitesimal de volume. Esse elemento de volume é pequeno o suficiente para que possa ser considerado como um ponto quando comparado com o tamanho do reservatório e da tubulação, mas ainda suficientemente grande para conter um grande número de moléculas do fluido. Cada elemento infinitesimal é caracterizado pela sua velocidade v, a qual é a velocidade do fluido nesse ponto, e por certa densidade m 4. Consideremos agora a superfície retangular que é a base do cano de escoamento. Os pontos nessa superfície retangular são também caracterizados pela sua velocidade v e pela sua densidade . Se quisermos saber qual a quantidade de fluido que atravessa a superfície de área A = a.b na base da tubulação temos que calcular a componente da velocidade perpendicular à superfície em todos os pontos e multiplicar essa velocidade pela densidade local para saber a quantidade de fluído que está atravessando a superfície de área A naquele ponto. Vamos chamar a essa quantidade de densidade de fluxo de massa do fluído, simbolizada por m:4 A densidade de massa é a quantidade de massa por unidade de volume. Reservatório de Líquido Tubulação a b Sentido de escoamento Elemento infinitesimal de fluido Vetor velocidade no elemento de fluido (v). Curso de Física Básica – Volume II 13 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Figura 8 Esquematicamente a situação é mostrada na Figura 8. m = mv.n O vetor n que aparece nessa equação é o vetor unitário perpendicular à superfície no ponto considerado. O estudante deve observar que essa é uma quantidade escalar. A quantidade de massa que atravessa a superfície total é o que chamamos de fluxo de massa (). O valor do fluxo é o valor da densidade de fluxo de massa multiplicada pela área da superfície: . n m mA A ab v.n v.n eq. 5 Nesse caso, temos uma situação relativamente simples, pois consideramos que a velocidade e a densidade eram as mesmas em todos os pontos da superfície. No caso mais geral isto não é mais verdadeiro, teremos valores de velocidade e de densidade diferentes em cada ponto da superfície. Assim, teremos que realizar uma integração sobre os pontos da superfície ao invés de simplesmente multiplicar pela área da superfície sob consideração: m S da v.n eq. 6 Na eq. 6 da indica um elemento de superfície e S indica que estamos realizando uma integral de superfície, cuja forma explícita depende do sistema de coordenadas que estamos utilizando. Exemplo 1 Utilizando as eq. 6 e eq. 5 calcule o fluxo para o caso de a velocidade e a densidade do fluído serem constantes e a velocidade do fluído ser perpendicular à superfície S. v n ds Curso de Física Básica – Volume II 14 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Vamos primeiro utilizar a eq. 5. Como a velocidade é perpendicular à superfície considerada temos que os vetores v e n são paralelos entre si e, portanto: v . n = v (lembre: o módulo do vetor normal é 1). Portanto, pela eq. 5 o fluxo será dado por: . n m mA A ab v v.n eq. 7 É fácil ver que a unidade do fluxo de massa é (usando unidades do Sistema Internacional): 3 kg m kg m.m. . = m s s Ou seja, o fluxo de massa nos diz quantos quilogramas de fluido atravessam a superfície de área A a cada segundo. Vamos agora calcular pelo método da integração mostrado na eq. 6: 0 0 0 0 m m S S a b a b m m m da vda dx dy v v dx dy ab v v.n eq. 8 Os dois resultados são idênticos. No cálculo mostrado na eq. 8, utilizamos coordenadas cartesianas pois temos uma simetria de tipo caixa, mostrada na Figura 7. Consideremos a situação mostrada na Figura 9. Nessa figura mostramos as linhas de campo do campo C que entram e saem do volume V limitado pela superfície S. Algumas linhas (as que saem do volume limitado por S) têm origem na partícula dentro do volume V. Outras (as que entram) têm sua origem em outras partículas na vizinhança. Figura 9 – Linhas de campo atravessando uma superfície S. Definimos como o fluxo do campo C através da superfície S ao número líquido de linhas de força que entra ou sai do volume V limitado por S. Essa definição, embora permita uma visualização da S C Curso de Física Básica – Volume II 15 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS ideia de fluxo mais simples, não é prática, já que o desenho das linhas de campo é arbitrário. Para ser operacional, a ideia de fluxo deve ser expressa de forma matematicamente precisa. Para fazer isso observemos a Figura 10 Nela é mostrada uma posição na superfície S e uma região em torno dessa superfície suficientemente pequena para que possamos considerar que no elemento de área ds o campo C seja constante. O vetor n, chamado de vetor normal a S, é um vetor unitário, perpendicular à superfície S no ponto considerado, formando um ângulo com o vetor C na posição considerada. Figura 10 – Campo na superfície S. O campo C pode ser descrito em termos de dois outros vetores, componentes do campo C em um sistema de coordenadas com um dos eixos perpendicular a S e os outros dois eixos paralelos à superfície S. O eixo perpendicular à superfície S, e paralelo ao vetor n, chamaremos de C, a componente normal de C, e outro, paralelo à superfície, o qual chamaremos por C, a componente tangencial de C. Veja a Figura 11. A componente do campo C responsável pelo fluxo do campo é a componente normal, já que é ela que “atravessa” a superfície S. Essa componente normal do campo C é dada por: cos(θ) .C C n C n Nessa expressão, C é o módulo do campo C. O fluxo através do elemento de área ds será dado então pelo produto do módulo da componente normal do campo C pelo elemento de área ds: .ds ds C n eq. 9 S C n Elemento de área ds. Curso de Física Básica – Volume II 16 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Na eq. 9, o fluxo é representado pela letra (lê-se fi) e o índice ds indica que estamos calculando apenas no elemento de área ds. Para obter o fluxo em toda a superfície S, basta que somemos sobre toda a superfície. Assim se dividirmos a superfície S em uma rede de n elementos de área dsi então, o fluxo total através da superfície S será dado por: 1 . n S i i i i ds C n O índice i indica que, nas parcelas, os vetores são tomados no elemento de área rotulado por i. Tomando o limite dessa expressão, quando o tamanho dos elementos de área dsi vai a zero: 0 1 lim . . i n S i i i S ds i S ds ds C n C n eq. 10 Figura 11 – Componentes do vetor C. O símbolo S na eq. 10 indica que a integral é uma integral de superfície5. Observe que o fluxo é uma quantidade escalar. Vamos agora discutir o conceito de circulação de um campo vetorial. Observe a Figura 12. Nessa figura temos uma curva fechada e um campo vetorial C. Definimos a circulação do campo C sobre a curva , denotada por C como sendo a integral ao longo da curva do produto escalar de C por dl, um elemento de comprimento da curva : 5 O acadêmico que ainda não estudou esse tipo de integração deve consultar o capítulo Complementos de Matemática. S C n C C|| Curso de Física Básica – Volume II 17 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS .C C dl eq. 11 Figura 12 – Circulação de um campo vetorial. Qual a interpretação física dessa quantidade? Suponhamos que o campo C seja o campo de velocidades de um fluido. Então a eq. 11 se escreveria: .v v dl eq. 12 A quantidade v.dl nos dá, em cada ponto ao longo da curva , a componente do vetor velocidade ao longo da curva . Vamos supor que a quantidade tenha um valor diferente de zero. Nesse caso, a circulação nos indica que a soma das projeções de v ao longo da curva é diferente de zero. Isto nos dá uma direção preferencial para a velocidade do fluido ao longo da curva . Com isso, o fluido será impulsionado a girar, seguindo a curva . A consequência é a criação de um redemoinho, com o fluido espiralando ao longo da curva . Caso a circulação seja nula, então não haverá uma direção preferencial do fluxo do fluido ao longo da curva e não teremos a formação de redemoinhos. A Lei de Gauss para campos cuja dependência seja do tipo 1/ r2 Podemos demonstrar uma lei geral, chamada Lei de Gauss, a qual relaciona o fluxo de um campo C através de uma superfície fechadaS qualquer quando esse campo depende apenas do módulo da distância da fonte ao ponto considerado (r) na forma 1/r2. Nesse tipo de situação o campo apresenta simetria esférica: todos os pontos em uma esfera de raio r têm o mesmo valor do módulo do campo C. Exemplos desse tipo de campo são os campos gravitacional e eletrostático. dl C C C C Curso de Física Básica – Volume II 18 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Considere a situação mostrada na Figura 13. Seja uma superfície fechada S. Suponhamos que no seu interior haja uma partícula portadora de certa quantidade da propriedade qc responsável pela existência do campo C (massa ou carga elétrica, por exemplo). Figura 13 – Superfície gaussiana e os vetores C e n. Podemos calcular o fluxo do campo C através da superfície S usando a definição de fluxo: .S S ds C n . Se soubermos o valor de C em cada ponto da superfície S e o ângulo desse vetor com o vetor normal à superfície, n, em cada ponto. Esse cálculo nem sempre é fácil de fazer e, muitas vezes, queremos saber o valor de C sobre a superfície a partir do valor do fluxo do campo. Quando temos uma situação de alta simetria esse cálculo é enormemente simplificado se usarmos a Lei de Gauss. Essa lei relaciona o fluxo do campo C à quantidade da propriedade qc dentro da superfície S. A Lei de Gauss estabelece que se a partícula fonte do campo está dentro da superfície S então o fluxo do campo é certa constante, a qual depende do campo considerado, vezes o valor de qc. Se, por outro lado, a quantidade qc não está dentro da superfície S o valor do fluxo do campo C é zero. A demonstração da Lei de Gauss exige o uso de matemática avançada e, por isso, não a demonstraremos aqui, apenas a enunciaremos: r qc S C n Superfície fechada. Curso de Física Básica – Volume II 19 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Lei de Gauss Seja um campo vetorial C , criado por partículas portadoras da propriedade qc. O módulo de C depende do inverso do quadrado do módulo da distância da fonte até o ponto considerado ( 2| |~1/| |C r ). O fluxo de C , através de uma superfície fechada S, é dado por: se estiver no volume limitado por S . 0 se não estiver no volume limitado por S c c c S cS q q ds q C n eq. 13 A constante c que aparece na expressão da Lei de Gauss depende do campo considerado. Por exemplo, no caso gravitacional essa constante é -4G, G sendo a Constante da Gravitação Universal. No caso eletrostático, essa constante vale 1/0 (0 é chamada de permissividade do vácuo, cujo valor será definido mais adiante). A quantidade qc é a massa no caso gravitacional e a carga elétrica no caso eletrostático. A eq. 13 é válida tanto para uma partícula como para um corpo extenso, totalmente contido em S. Observe que na Lei de Gauss, a posição em que a partícula está dentro da superfície S não importa. Na Figura 13, desenhamos a partícula no centro da superfície, na origem do sistema de referências, mas esse fato não influencia o resultado obtido. Podemos usar a Lei de Gauss junto com o princípio da superposição para calcular o fluxo de um corpo extenso, entendido como um corpo que pode ser decomposto em inúmeras partículas. Veja a Figura 14. Podemos escrever o campo total em qualquer ponto do espaço, com sendo a soma dos campos criados por cada um dos elementos de volume no ponto considerado. Assim no ponto P, por exemplo, o campo C será dado por: 1 2 ... n C C C C Pela Lei de Gauss, o fluxo criado pelo campo de cada partícula, em uma superfície S qualquer será dado por: Curso de Física Básica – Volume II 20 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS 1 1. c c S ds q C n eq. 14 Figura 14 – Cálculo do fluxo do campo de um corpo extenso. Se somarmos agora sobre todos os fluxos, teremos o fluxo total que atravessa a superfície S: 1 1 1 1 . . . . n n n n i i i i i i i iS S S S ds ds ds ds C n C n C n C n Por outro lado, se somarmos sobre o lado esquerdo da eq. 14, obteremos: 1 1 1 n n n c ic c ic c c c ic i i i q q Q Q q Reunindo esses dois resultados, podemos então escrever a Lei de Gauss para um corpo extenso: . c c S ds Q C n eq. 15 Elemento de volume 1 Elemento de volume 2 Elemento de volume 3 Elemento de volume n r P Curso de Física Básica – Volume II 21 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Na eq. 15, a quantidade Qc que aparece no lado direito é a quantidade líquida 6 da propriedade qc dentro da superfície S. Como antes, se a quantidade líquida da propriedade que cria o campo C for nula dentro da superfície S teremos o fluxo nulo. A Lei de Gauss é extremamente útil para calcularmos o módulo do campo C quando temos situações com alto grau de simetria. Isso porque temos que realizar a integração do produto escalar do vetor C e do vetor unitário n, o que pode ser difícil de ser feito se não tivermos simetria. Por exemplo, considere a Figura 15, na qual mostramos uma situação desse tipo. Observe que o produto C.n é diferente em cada ponto da superfície mostrada. Figura 15. Interação gravitacional entre partículas: o Campo Gravitacional (gg) Denominamos de Gravitação Newtoniana (ou Lei da Gravitação de Newton) a lei formulada por Isaac Newton7 que descreve uma propriedade intrínseca da matéria: atração entre corpos que contêm massa. Além da própria importância dessa teoria para descrever vários fenômenos, ela representa historicamente o triunfo de um processo de produzir conhecimento iniciado por Galileu Galilei8: experimentação, linguagem matemática e previsão de fenômenos. Estas etapas, tão comuns hoje na produção do saber científico, não eram importantes até o século XVII. Desde a antiguidade até o Renascimento prevaleceu nas civilizações ocidentais o conhecimento do mundo físico baseado apenas no senso-comum e nas ideias do filósofo grego Aristóteles. Isaac Newton nasceu na Inglaterra e em 1664 foi forçado a se isolar em uma fazenda devido a uma peste que assolava a Europa. Newton ficou nesse local por dois anos, aproximadamente. Durante 6 Veja que no caso elétrico, como as cargas têm sinais opostos, a quantidade líquida é obtida a partir da soma algébrica das cargas, levando-se em conta o sinal. 7 Isaac Newton (1642-1727)): filósofo, matemático, físico e astrônomo. Inglês. 8 Galileu Galilei (1564-1642): filósofo, matemático, físico e astrônomo. Italiano. C C n n Superfície S. Curso de Física Básica – Volume II 22 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS esse período, dedicou-se ao estudo de fenômenos da Ótica, da Mecânica Celeste e da Dinâmica dos corpos perto da superfície da Terra, entre outros assuntos. Nos anos de 1664 e 1665 concebeu conceitos físicos que somente alguns anos mais tarde puderam ser demonstrados matematicamente, graças à criação e ao desenvolvimento do cálculo diferencial e integral pelo próprio Newton e, paralelamente, por Leibniz9. Os resultados da aplicação da Gravitação Newtoniana aos fenômenos da natureza foram tão bons que essa teoria passou a ser tratada como verdade inquestionável pela maioria dos físicos durante os duzentos anos seguintes. A explicação do movimento dos astros, das marés,do lançamento de projéteis, etc., são exemplos do sucesso de seu emprego. Somente com o advento da Teoria da Relatividade Geral em 1915 é que os limites de aplicabilidade da Gravitação Newtoniana ficam determinados. Estudos históricos10 levantam a hipótese de que o conceito de uma interação entre os corpos materiais proporcional ao inverso do quadrado da distância entre eles seria de autoria de Robert Hooke11, um físico contemporâneo de Newton (Hooke teria proposto a teoria dessa interação, mas nunca a teria desenvolvido ao ponto em que Newton o fez). A briga pela autoria desse conceito teria sido a causa da inimizade entre eles. Além disso, Newton polemizou com Leibniz pela autoria do Cálculo Integral e Diferencial. Uma das grandes contribuições de Newton, talvez a maior de todas, foi acreditar que as leis que governam o mundo celeste são as mesmas que governam a queda da maçã. Com Newton se inicia definitivamente o pensamento científico moderno. Massa inercial e massa gravitacional Vimos no Capítulo III do Volume I que a lei da inércia nos diz que em um Sistema de Referências Inercial uma partícula mantém o seu estado de movimento inalterado se sobre ela não agir nenhuma força. Naquele contexto, definimos força como sendo a ação de algum agente externo ao sistema (a partícula no nosso caso) capaz de alterar o estado de movimento e que a propriedade das partículas (e também da energia) de opor resistência a essa mudança é chamada de inércia e sua medida é a massa. Essa massa, entendida como uma medida da inércia da partícula (ou de qualquer porção de matéria ou energia) recebe o nome de massa inercial. É essa 9 Wilhelm Leibniz (1646-1716): matemático alemão. 10 http://www-groups.dcs.st-andrews.ac.uk/%7Ehistory/HistTopics/Orbits.html, acessado em 19 de fevereiro de 2004. 11 Robert Hooke, 1635-1703. Curso de Física Básica – Volume II 23 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS massa inercial que entra na Segunda Lei de Newton: i d m dt p F a (o índice i indica que estamos falando da massa inercial). No estudo da gravitação, contudo, surge a pergunta: qual a propriedade das partículas que as faz atraírem umas as outras? Qual a fonte do campo gravitacional? Essa propriedade, digamos, por analogia, a carga gravitacional, é também medida por uma quantidade chamada de massa, mas essa massa, para diferenciá-la da massa inercial recebe o nome de massa gravitacional, a qual indicaremos por mg. Quando a única força que age em um objeto é a força gravitacional, então podemos escrever: r gF F Adiantando um pouco o que veremos mais adiante, perto da superfície da Terra a força gravitacional é dada simplesmente pelo produto da massa gravitacional pela aceleração gravitacional, g. Então podemos escrever: i gm ma g Dessa equação podemos ver que a aceleração da partícula será a aceleração gravitacional se e somente se a massa gravitacional (mg) for igual à massa inercial (mi). Esta equivalência, só foi completamente compreendida com o desenvolvimento da Teoria Geral da Relatividade (Princípio da Equivalência) por Albert Einstein12 em 1915. Modernamente se assume que a massa inercial, a qual mede a inércia, e a massa gravitacional, a qual mede a carga gravitacional, são uma mesma e única quantidade. Falamos então simplesmente da massa de certa porção de matéria ou quantidade de energia. Campo gravitacional de uma partícula pontual (gg)13 Partículas com massa possuem a propriedade de modificar o espaço a sua volta de tal forma que outras partículas com massa são atraídas por elas. O campo gravitacional é sempre atrativo, o que 12 Albert Einstein, 1879 – 1955. 13 No que segue, derivaremos a lei da gravitação universal com base nos experimentos da balança de torção realizados por Cavendish, mais de 100 anos após o trabalho de Newton baseado na observação astronômica. Com base nessas observações, a derivação da Lei da Gravitação Universal pode ser encontrada em vários livros de Física. Veja, por exemplo, o texto de Nussensveig nas referências bibliográficas. Curso de Física Básica – Volume II 24 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS significa que duas partículas com massa não se repelem mutuamente. Esse é um ponto interessante que diferencia o campo gravitacional dos outros campos que veremos mais adiante. Os outros campos conhecidos pela Física são ora atrativos ora repulsivos. A explicação do campo gravitacional pertence ao domínio da Relatividade Geral e foge ao escopo deste texto. No entanto, podemos apontar que a unificação (se possível) do campo gravitacional aos outros campos conhecidos (eletromagnético, nuclear forte e nuclear fraco) é o grande desafio da Física neste início de século14. Já vimos antes que o conceito de ação à distância coloca uma questão incômoda: como uma partícula “sabe” que a outra mudou sua posição e que a força que experimenta deve ser alterada? Veja a Figura 16. Nessa figura, mostramos o movimento de uma partícula de massa m sob a ação de outra partícula de massa M (colocada na origem por simplicidade) em dois pontos da trajetória, localizados pelos vetores r1 e r2. Como a partícula fonte do campo sabe das modificações de posição da partícula de massa m? Isto implica em uma comunicação instantânea entre as duas partículas, o que é vedado pela Relatividade Restrita que nos ensina que a maior velocidade com a qual a informação pode se propagar é a velocidade da luz, c15. Figura 16 – Interação gravitacional entre duas partículas. Experimentalmente, aprendemos que a força experimentada por uma partícula devido ao campo criado por outra partícula depende, basicamente, de dois fatores: a) Da massa da partícula que cria o campo 14 Como já comentamos anteriormente essa afirmação seria estritamente verdadeira até a alguns anos. Atualmente, com a possibilidade ainda não comprovada, da existência da Energia Escura, cuja interação gravitacional seria repulsiva, essa característica da força gravitacional, tal como a conhecemos atualmente, pode não ser verdadeira. 15 Aproximadamente 300.000 km/s. M r1 r2 m z y x m ˆ r r r Curso de Física Básica – Volume II 25 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Quanto maior a massa da partícula que cria o campo maior o efeito do campo sobre outras partículas. Podemos expressar isto matematicamente dizendo que o campo é, em módulo, diretamente proporcional à massa da fonte16: |g | M b) Da distância entre o ponto onde o campo é calculado e a fonte do campo A ação de uma partícula decai com o inverso do quadrado da distância à fonte. Se chamarmos de r o vetor que une o ponto analisado e a posição da fonte, então (r |r|): 2 1 | | r g . Estes dois resultados experimentais são complementados por um terceiro resultado: a ação do campo ocorre ao longo da linha que une o ponto onde o campo está sendo calculado e a posição da fonte (veja a Figura 16). O vetor unitário nesta direção, se colocarmos a fonte na origem do sistema de referência, pode ser escrito simplesmente como ˆ r rr . Observe que o sentido desse vetor é o mesmo do vetor r. Reunindo esses resultados, podemos escrever que o campo gravitacional g criado por uma partícula de massa M, situada na origem do sistema de referência, é dado pelo produto dos dois resultados parciais acima, com uma constante de proporcionalidade:2 M G r r r g eq. 16 O sinal negativo é colocado para indicar o caráter atrativo do campo gravitacional, já que o sentido da força é da partícula de massa m para a partícula de massa M. A constante G é chamada de Constante da Gravitação Universal e seu valor é (nas unidades do Sistema Internacional, SI): 2 11 2 Nm 6,67 10 kg G . 16 O símbolo lê-se: diretamente proporcional a. Curso de Física Básica – Volume II 26 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Lembrando da nossa definição de campo, se uma partícula de massa m for colocada na posição r, essa partícula experimentará uma força dada por: 2g mM m G r r r F g eq. 17 Você deve observar que a quantidade g é a aceleração que a partícula de massa m experimentaria se colocada na posição r: 2 M G m r r F r a g . No caso específico da Terra, perto da superfície, dados experimentais mostram que a aceleração provocada pelo campo gravitacional é aproximadamente constante, com módulo 9,81 m/s2. Portanto, nas proximidades da superfície da Terra, o módulo da força que a partícula experimenta (chamada de força peso, símbolo P) é dado por: P = m g = 9,81m N (a massa dada em quilogramas) Caso nenhuma das partículas esteja na origem temos a situação mostrada na Figura 17. Nesse caso, a expressão do campo gravitacional criado pela partícula fonte (m1) é um pouco mais complicado, pois envolve o vetor que localiza a partícula fonte do campo e o vetor que localiza o ponto onde o campo está sendo calculado (r1 e r2 respectivamente): 1 1 2 2 1 2 1 2| | | | m G r r g r r r r eq. 18 Essa expressão nos fornece o vetor campo gravitacional criado pela partícula de massa m1, localizada na posição r1, na posição indicada pelo vetor r2. Se colocarmos uma partícula de massa m2 na posição indicada pelo vetor r2 então essa partícula experimentará uma força dada por (painel b da Figura 17): 1 2 1 2 1 2 12 2 1 12 122 2 1 2 1 2 12 ˆ | | | | m m m m m G G r r r r F g F r r r r eq. 19 O índice em g indica que estamos falando do campo criado pela partícula de massa m1 na posição da partícula de massa m2. Observe que o sinal negativo está automaticamente contido no vetor r12 r1 – r2, o qual aponta da partícula de massa m2 para a partícula de massa m1. Na eq. 19, r12 é Curso de Física Básica – Volume II 27 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS o módulo da distância entre as duas partículas. Observe que nessa equação o sentido da força gravitacional e sua direção são dados pelo vetor unitário 12 12 ˆ r r r . Portanto, tem sentido da partícula 2 para a partícula 1. É comum denominarmos a partícula 1 de carga fonte ou massa fonte e a partícula 2 de carga objeto ou massa objeto. Figura 17 - Partículas interagindo via força gravitacional quando nenhuma das partículas está na origem. (a) campo criado pela partícula 1 na posição indicada pelo vetor r2; (b) Força gravitacional experimentada pela partícula 2 colocada na posição indicada pelo vetor r2. Pela Lei da Ação e Reação (3ª Lei de Newton) podemos escrever que: 21 12 F F eq. 20 Nessa expressão, F21 é a força gravitacional exercida sobre a partícula 1 devido à partícula 2. Como todas as forças de Ação e Reação, elas não se cancelam porque são aplicadas em corpos diferentes. Essas forças tendem a aproximar as partículas, alterando o valor da distância que as separa. Conseqüentemente, seus valores mudam com o tempo. Mais do que uma simples notação matemática, o conceito de campo gravitacional tem um significado físico importante. Podemos interpretar o campo gravitacional como sendo a modificação das propriedades do espaço em torno da partícula de massa m devido ao fato desta ter massa gravitacional. Se modificarmos a grandeza m, o valor do campo gravitacional devido à partícula também é modificado em todos os pontos do espaço. Mantido constante o valor da massa da partícula (m) o campo gravitacional criado por ela depende exclusivamente da distância do ponto considerado à partícula fonte do campo. Esta é uma maneira de solucionar o problema m1 x r1 r2 z y r12 (a) r1 r2 z y r12 (b) g F12 m1 m1 Curso de Física Básica – Volume II 28 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS da ação à distância percebido por Newton, em que corpos distantes são capazes de perceber a presença uns dos outros e interagirem entre si, mesmo na ausência de um meio material entre eles. Consequências da gravitação universal: as Leis de Kepler Conta a lenda, que Newton, quando procurado por Halley17, ao ser perguntado qual seria a forma da órbita de um cometa, respondeu que seria uma elipse. Incrédulo com a pronta resposta, Halley perguntou como Newton tinha conhecimento disso. Newton simplesmente respondeu que havia calculado essa órbita alguns anos antes: qualquer objeto que orbitasse o Sol seguiria uma lei do inverso do quadrado da distância e a trajetória imposta por esta dependência seria uma elipse com o Sol em um dos seus focos. A forma da órbita de um planeta é um dos capítulos mais interessantes da Física, o qual vem sendo escrito desde a Antiguidade. Você provavelmente já estudou essa história em um curso de História da Física (ou outro equivalente). As leis que governam o movimento dos planetas em torno do Sol (e de qualquer objeto sujeito à atração gravitacional de outro) são conhecidas como Leis de Kepler, em homenagem a Johanes Kepler, o primeiro a enunciá-las18. Kepler havia trabalhado com o astrônomo Tycho Brahe, do qual herdou uma série extremamente precisa de observações astronômicas sobre o movimento dos planetas. Trabalhando em cima desses dados observacionais, Kepler foi capaz de identificar as três leis do movimento planetário que levam o seu nome. É importante observar que o trabalho de Kepler é um trabalho típico de indução: dado um conjunto particular de dados, Kepler obtém as leis do movimento planetário e as generaliza. O trabalho de Newton, no entanto, é um trabalho de natureza dedutiva: supondo que a lei que liga os planetas ao Sol obedece a uma dependência com o inverso do quadrado da distância, Newton obtém as órbitas do movimento planetário, recuperando as Leis de Kepler. Em certo sentido, um trabalho complementa o outro. As três Leis de Kepler para o movimento planetário nos dizem que: 17 Veja um resumo da biografia de Halley em http://pt.wikipedia.org/wiki/Edmond_Halley. 18 Veja uma pequena biografia de Kepler no endereço http://pt.wikipedia.org/wiki/Johannes_Kepler. Curso de Física Básica – Volume II 29 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Lei das Órbitas As órbitas dos planetas são elipses e o Sol fica localizado em um dos focos dessa elipse; Lei das Áreas O vetor que liga o Sol aos planetas varre áreas iguais em tempos iguais; Lei dos Períodos O quadrado do período dos planetas é proporcional ao cubo do raio maior de sua órbita. Vamos agora interpretar cada uma dessas leis. A Primeira Lei de Kepler, Lei das Órbitas expressa o fato de que o movimento dos planetas em torno do Sol não é um círculo, como queriam os antigos gregos e escolásticos, mas uma elipse. O Sol ocupa um dos focos dessa elipse. Deve-se, contudo, ter cuidado e observar que, embora sejam elipses, essas elipses são quaseum círculo, com uma excentricidade muito pequena19. De fato a representação das órbitas dos planetas mostradas nos livros textos exagera um pouco a forma dessa elipse (veja a Figura 18). Para obter essa Lei devemos fazer uso de recursos matemáticos mais avançados dos que dispomos nesse momento. Você poderá comprovar esse fato em cursos avançados de Mecânica Clássica. A Segunda Lei de Kepler nos diz que o segmento de reta que une o planeta ao Sol percorre áreas iguais em tempos iguais. Uma as consequências dessa lei é que a velocidade angular dos planetas é diferente em diferentes pontos da órbita: quando o planeta está mais próximo do Sol a velocidade é maior do que quanto está mais afastado. Na Figura 18 representamos essa situação. Considere que o raio vetor do planeta se desloque da posição localizada pelo vetor r para a posição localizada pelo vetor r+dr em certo intervalo de tempo dt. 19 A excentricidade e de uma elipse é definida de tal modo que o produto ea (a o raio menor da elipse) seja igual à distância entre o centro da elipse e qualquer um dos dois focos. Usando o teorema de Pitágoras podemos escrever que a excentricidade da elipse é dada por: 2 2 1 b e a , a e b sendo os raios maior e menor da elipse. Veja que para o círculo, e = 0, já que em um círculo os raios maior e menor são iguais e os dois focos e o centro coincidem, portanto. Curso de Física Básica – Volume II 30 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Figura 18 – Órbita de um planeta em torno do Sol. A elipse está exagerada para fins de clareza. Nesse tempo, o deslocamento angular foi d. Então a velocidade angular será dada por: d dt Figura 19 – Área coberta pelo raio vetor do planeta em dois intervalos de tempo iguais. Por outro lado, para um deslocamento angular suficientemente pequeno, a área entre os dois vetores (r e r+dr) será dada aproximadamente por: 21 1( ) 2 2 dA r rd r d A variação dessa área no tempo será dada por: Sol Raio maior da elipse. Raio menor da elipse Órbita Periélio Afélio Planeta r Sol r d r + dr r’ r’ + dr’ d’ Curso de Física Básica – Volume II 31 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS 2 21 1 2 2 dA d r r dt dt eq. 21 Vamos analisar agora o momento angular do planeta. Esse momento angular, em módulo é dado por: 2( )L rp mrv L mr r mr eq. 22 Nessa expressão foi usado que v=r e que os vetores r e p são perpendiculares entre si. Comparando as equações eq. 21 e eq. 22 vemos que podemos escrever a variação da área percorrida pelo planeta no intervalo de tempo dt como: 21 1 2 2 dA r L dt m Entretanto, o planeta e o Sol formam um sistema fechado e, pela conservação do momento angular, a taxa instantânea de variação da área percorrida pelo planeta também será constante. O que vem a ser justamente a Segunda Lei de Kepler. Vamos agora analisar a Terceira Lei de Kepler. Para obtê-la faremos uso do fato de que as órbitas, apesar de serem elipses, podem ser aproximadas por uma circunferência, já que a excentricidade da elipse é pequena. Assim, podemos escrever que a força centrípeta sobre o planeta é a força gravitacional: 2 2 2 2 ( )sGM m mv m r mr r r r Vamos usar agora a relação entre o período T e a freqüência angular, : 2 T . Logo, podemos escrever que: 2 2 2 3 2s sGM m GMmr r r T 2 2 34 s T r GM eq. 23 A eq. 23 vem a ser justamente a Terceira Lei de Kepler. Curso de Física Básica – Volume II 32 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Interação elétrica entre partículas: o Campo Elétrico (EE) A carga elétrica é outra propriedade das partículas capaz de alterar o espaço no entorno da partícula, criando um campo: o campo elétrico. Diferentemente do campo gravitacional, o campo criado por partículas com carga elétrica pode ser de natureza atrativa ou repulsiva. Da observação dos experimentos sabemos que existem dois tipos de carga elétrica que são chamados, arbitrariamente, de positivo e negativo. A razão pela qual existem somente dois tipos de carga elétrica é desconhecida. O fato é que partículas portadoras de carga elétrica de mesmo tipo se repelem enquanto que partículas portadoras de carga elétrica de tipos diferentes se atraem. A carga elétrica de uma partícula é medida pela quantidade de carga elétrica de que a partícula é portadora. Utilizaremos para simbolizar a quantidade de carga elétrica a letra q. Esta quantidade pode ser positiva (indicando uma carga elétrica de tipo positivo) ou negativa (indicando uma carga elétrica de tipo negativo). A unidade de medida da carga elétrica é o Coulomb20. Também da observação experimental sabemos que existe um valor mínimo de quantidade de carga elétrica: a quantidade de carga elétrica dos elétrons (carga elétrica de tipo negativo) ou dos prótons (carga elétrica de tipo positivo). As quantidades de carga elétrica de todas as outras partículas sendo múltiplos inteiros da quantidade de carga elétrica destas partículas fundamentais. Indicamos a quantidade de carga elétrica de um elétron por – e enquanto que a quantidade de carga elétrica de um próton é indicada pela letra e21. Com essa notação, a quantidade de carga elétrica de uma partícula qualquer será dada por (n é um número inteiro): q = ne (carga elétrica de tipo positivo) ou q = -ne (carga elétrica de tipo negativo). Partículas com carga elétrica modificam o espaço a sua volta de forma muito semelhante às partículas com massa: 1. Quanto maior a quantidade de carga elétrica da fonte, mais a partícula de teste é acelerada pelo campo: E Q 20 Lê-se Culom. Esse nome foi escolhido em homenagem ao físico francês Charles Augustin de Coulomb (nascido em 14 de Junho de 1736 em Angoulême e morto em 23 de Agosto de 1806 em Paris). 2121 No Sistema Internacional de unidades e = 1,6 x 10 -19 C. Curso de Física Básica – Volume II 33 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS 2. Quanto mais próxima da fonte, mais a partícula de teste será acelerada pelo campo. Do mesmo modo que para o campo gravitacional, o campo elétrico de uma partícula depende com o inverso do quadrado da distância à fonte do campo: 2 1 E r Também como o campo gravitacional, o campo elétrico de uma partícula atua na direção da linha que une a partícula fonte do campo e a partícula de teste (veja a Figura 20). No entanto, diferentemente do campo gravitacional, para o qual somente existe um tipo de massa, as cargas elétricas podem ser de dois tipos. Conseqüentemente, o sinal da carga de teste é importante na determinação do sentido do campo elétrico. Se a carga de teste fosse do mesmo tipo que a carga da partícula que cria o campo então o sentido do campo elétrico seria na direção do vetor rˆ e caso a carga da partícula teste fosse de tipo diferente da carga da partícula que cria o campo o sentido do campo seria oposto ao do vetor rˆ . Para evitar essa ambiguidade, define-se, arbitrariamente por certo, que o sentido do campo elétrico em uma dada posição indicada pelo vetor r será dado pelo sentido da aceleração experimentada por uma partícula de teste com carga positiva colocada nessa posição. Reunindo esses resultados, o campo elétrico E criado por uma partícula colocadana origem do sistema de coordenadas, a qual tem certa quantidade de carga Q, será dado por: 2 Q k r r r E . Figura 20 - Carga de prova para determinação do campo elétrico. r rˆ carga de prova (de tipo positivo) Fonte do campo (Q) Curso de Física Básica – Volume II 34 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Nesta expressão, o vetor r é o vetor que localiza a carga de teste em relação à origem (onde a fonte do campo está colocada). A força elétrica Fe experimentada pela carga de prova será dada pelo produto da quantidade de carga da carga de prova (que simbolizaremos pela letra q) pelo valor do campo: 2e qQ q k r r r F E eq. 24 O estudante deve observar a semelhança formal entre esta expressão para a força elétrica e a expressão anterior para o campo gravitacional (eq. 16). A constante k que aparece na eq. 24 depende do sistema de unidades utilizado. No Sistema Internacional de Unidades (SI), essa constante é dada por: 9 2 2 0 1 8,99 10 N.m /C 4 k A constante 0 é chamada de permissividade elétrica do vácuo, e seu valor é: 12 2 2 0 8,85 10 C . m /N . Cabe aqui um comentário a respeito dos diferentes sistemas de unidades e o eletromagnetismo. Diferentemente dos problemas em Mecânica, onde o sistema de unidades utilizado não interfere na forma final das equações, no Eletromagnetismo deve-se ter muito cuidado com a definição clara de qual sistema de equações se está utilizando, pois a forma das equações se modifica caso mudemos de sistema de unidades. Por exemplo, no sistema CGS a eq. 24 seria escrita como: 2e qQ q r r r F E . Ou seja, a constante k vale 1 nesse sistema de unidades. Ao longo desse texto usaremos sempre o Sistema Internacional de unidades (SI). Observe que no que foi exposto acima, a posição da partícula que cria o campo é considerada constante. Logo, o campo elétrico criado por essas partículas também é constante e não varia no tempo. As situações em que essa hipótese é válida compõem o domínio da Eletrostática22. No domínio da Eletrostática, apenas cargas elétricas podem criar campos elétricos. Mais adiante 22 O campo calculado a partir da hipótese de que as cargas estão em repouso é chamado de campo eletrostático algumas vezes. Curso de Física Básica – Volume II 35 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS estudaremos situações onde cargas elétricas podem se movimentar (criando correntes elétricas e estas, campos magnéticos). Nessa situação, se a corrente elétrica variar no tempo, então haverá campos magnéticos variando no tempo. Esses campos magnéticos que variam no tempo também podem ser fontes de campos elétricos. Exemplo 2 - Cálculo de campos elétricos: o dipolo elétrico. Como um primeiro exemplo de aplicação do cálculo do campo elétrico, consideremos um sistema de duas cargas pontuais de cargas opostas, separadas por uma distância d. As duas cargas elétricas são iguais em módulo (qd > 0). Chamamos a esse tipo de arranjo de dipolo elétrico (veja a Figura 21). Figura 21 – o dipolo elétrico. Consideremos agora a seguinte pergunta: Qual a ação de um campo elétrico sobre o dipolo? Para responder a essa pergunta, vamos considerar um dipolo em uma região onde temos um campo elétrico uniforme. Podemos, sem perda de generalidade, chamar a direção do campo elétrico como sendo o eixo y. Consideraremos a situação na qual o dipolo está no plano (y,z) e o eixo do dipolo faz um ângulo com a direção y, a direção do campo elétrico uniforme. Veja a Figura 22 na qual não mostramos o eixo x por simplicidade. Nessa situação, as cargas elétricas que compõem o dipolo experimentarão uma força elétrica dada por: dq F E + - d/2 -q q Curso de Física Básica – Volume II 36 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Como as cargas são iguais em módulo, o módulo da força elétrica em cada uma delas será igual, já que o campo elétrico é uniforme (o mesmo em todo o espaço). Contudo, as forças elétricas aplicadas nas duas cargas têm sentidos diferentes: enquanto a força aplicada na carga positiva aponta para a direita, no sentido positivo do eixo y, a força aplicada na carga negativa aponta para a esquerda, no sentido negativo do eixo y. Portanto, a força resultante aplicada sobre o sistema será nula: 0r F F F (F+ é a força que atua na carga positiva e F- é a força que atua na carga negativa). Figura 22 – O dipolo elétrico na presença de um campo elétrico uniforme. Embora a força resultante seja nula, existe um torque atuando sobre o dipolo. Vamos calcular esse torque aplicando a definição de torque: τ r F eq. 25 O torque total sobre o dipolo será escrito como a soma dos torques sobre cada uma das partículas do dipolo: τ τ τ . Escrevendo estes torques explicitamente: d dq q r F r F r E r Eτ Nesta expressão, os subscritos + e – indicam os torques calculados sobre as partículas do dipolo com carga positiva e negativa respectivamente. + - y z E q -q Curso de Física Básica – Volume II 37 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS O torque que atua em cada partícula tem direção perpendicular ao vetor r e ao vetor E. Portanto, esse torque atua na direção x. Tomando o dipolo no plano (y,z) e a força que atua na carga positiva será na direção +y, portanto, o torque que atua na carga positiva terá o sentido dado por: ( )) ( ) ( ) ( ) ( ) d d y z y d y y d z y d x q q y z E q yE q zE q zE r E e e e e e e e e τ τ τ Logo, o torque que atua na carga positiva será no sentido negativo do eixo x. Para a carga negativa, a componente no eixo z será dada por –z, mas, por outro lado, a força terá sentido –y. Obteremos, portanto, o mesmo resultado: ( )) ( ) ( ) ( ) ( ) d d y z y d y y d z y d x q q y z E q yE q zE q zE r E e e e e e e e e τ τ τ . A coordenada z que aparece na expressão do torque Pode ser escrita em função do módulo do vetor r, que localiza cada uma das cargas do dipolo, e do ângulo mostrados na Figura 22 como: sen(θ)z r . Logo, o módulo do torque que atua sobre cada uma das partículas será dado por: | | sen( ) | | sen( ) sen( ); 2 2 d d d d d q rE pd q E E p q d τ = τ = . Nessa expressão, pd é chamado de momento de dipolo elétrico. Essa quantidade tem um caráter vetorial e, por definição, é um vetor que aponta da carga negativa em direção à carga positiva e cujo módulo é dado por: pd qd d (veja a Figura 23). O módulo do torque total será a soma desses dois torques: | | 2| | sen( ) sen( )d dq dE p E τ = τ eq. 26 Curso de Física Básica – Volume II 38 Prof Dr Paulo Ricardo da Silva Rosa Departamento de Física - UFMS Figura 23 – O momento de dipolo Na eq. 26, vemos que o módulo do torque é dado pelo produto do módulo do momento de dipolo elétrico pelo valor do campo elétrico multiplicado pelo seno do ângulo entre os dois vetores, o que tem a mesma estrutura do módulo de um produto vetorial . Figura 24 – Torque em um momento de dipolo. Podemos então generalizar essa equação, escrevendo-a na forma vetorial: d p Eτ eq. 27 Atuado por esse torque, o dipolo começará a girar no
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