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MANUAL_OBJETIVO_DE_DIREITO_DAS_OBRIGACOES

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Enio Duarte Fernandez Junior 
 
 
 
 
 
 
 
 
MANUAL OBJETIVO DE 
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES 
 
 
 
1ª edição 
 
 
 
 
Rio Grande 
Edição do Autor 
2014 
2 
 
 
Dedicatória 
_____________________________________________________________________________ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A dedicação nominal de uma obra caminha por sobre uma linha tênue e fina 
na qual, qualquer deslize, faz o seu autor sucumbir pela da omissão e, dela, para a 
injustiça. Entregar um trabalho em agradecimento conduz à exclusão dos demais, 
inominados, que de uma forma ou outra, ativa ou passivamente, contribuíram para a sua 
concretização. 
Por isso, mas principalmente pela prudência de não cometer o erro, esta 
obra é dedicada aos meus familiares porque, de maneira ativa me incentivaram na 
criação e, complacentes, suportaram e entenderam a minha ausência e aos meus alunos 
porque, também de maneira ativa, me provocaram ao pensamento, questionando, 
indagando, sugerindo, plantado suas dúvidas na ânsia do aprendizado. 
A vocês, o meu muito obrigado. 
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Motivação 
_____________________________________________________________________________ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Quando, pela primeira vez, adentrei em uma sala de aula na condição de 
docente, ali, exatamente ali e naquele momento, senti a grande importância do encargo 
que recaia sobre meus ombros e quão importante e decisiva é essa atividade do 
profissional do ensino na formação humana. 
Foi um momento único, prostrar-me diante de uma platéia repleta de alunos, 
ávidos por conhecimento e sedentos para uma aula de direito civil, parte geral das 
obrigações. 
Premido por um senso prévio de responsabilidade, busquei preparar-me para 
aquela aula, e para as demais que se seguiriam naquele ano letivo que começava, de 
maneira plena, de forma que nenhuma pergunta, nenhuma dúvida saísse dali sem a 
devida resposta. 
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Era a expressão viva da insegurança. 
Desde então, e ai já vai mais de uma década, aprendi que o direito não é 
uma ciência que aponte respostas e, tampouco, que se exaure em si mesmo e por mais 
que se prepare uma aula, por mais que se estude a doutrina e a jurisprudência, as 
dúvidas sempre virão e cada vez de maneira diferente da anterior. 
Não há continente para esse conteúdo. 
Descobri que o direito por isso não é uma ciência pronta. Assim fosse, não 
seria o direito. 
E que exatamente como fruto dessa certeza que, por mais que se estude a 
ciência jurídica, por mais que se prepare uma aula, sempre vai ter algo novo, uma 
pergunta, uma dúvida, que ficará sem a pronta resposta ou, também, que encontrará uma 
resposta diferente do que planejamos. Um novo conceito, uma nova fonte, uma nova 
leitura, uma nova construção surge a cada nova situação. 
Essa certeza sai da sala de aula, a cada ano e é o que motiva ao estudo 
constante desse ramo da ciência jurídica que é, talvez, o mais importante de todos e 
exatamente por isso o menos mutável quando se refere ao direito das obrigações. 
Quanto ao direito das obrigações, como se pretende demonstrar no presente 
manual, a razão do estudo reside na fundamentação conceitual e doutrinária que 
estabelece para todos os demais ramos da ciência jurídica. 
É por sua construção que se entende a ciência jurídica. 
Daí a razão da provocação ao estudo que é, em verdade, o fruto que extraí 
das minhas leituras, dos meus planos de aula e das dúvidas que, ao longo de anos, fui 
procurando dirimir em sala de aula. 
Espero, assim, estar contribuindo de alguma forma para uma visão objetiva 
e direta, todavia sistêmica e didática, do direito das obrigações com o presente manual. 
É com ele que pretendo transmitir aos alunos uma rápida e eficaz análise do 
direito obrigacional sem a pretensão de esgotar o assunto justamente porque este 
conteúdo também não encontrará, jamais, continente. 
Boa leitura. 
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Biografia 
_____________________________________________________________________________ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Graduado em Direito (FURG, Rio Grande, Brasil, 1992). Pós-Graduado, 
Especialização, em Direito Civil e Empresarial (FURG, Rio Grande, Brasil, 1994). 
Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais (Universidad del Museo Social Argentino, 
Buenos Aires, Argentina, 2004). Mestrando em Direitos Fundamentais, PUCRS. Pós-
Graduado, Especialização, em Responsabilidade Civil Extracontratual (Universidad 
Castilla La Mancha, Toledo, Espanha, 2010). Professor Adjunto da Fundação 
Universidade Federal do Rio Grande e Professor Assistente da Faculdade Atlântico Sul 
- Rio Grande / Anhanguera Educacional S.A. (Disciplinas: Direito Civil - Obrigações e 
Direito Processual do Trabalho). Professor da Pós Graduação da Faculdade Atlântico 
Sul - Rio Grande / Anhanguera Educacional S.A. Professor da Pós Graduação da 
Faculdade Atlântico Sul - Pelotas / Anhanguera Educacional S.A. Membro de Conselho 
Editorial. Integrante da Comissão da OAB/RS para a defesa das prerrogativas. 
Advogado. 
Currículo Lattes - http://lattes.cnpq.br/0158186272674623 
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SUMÁRIO 
 
CAPÍTULO I – Estudos Propedêuticos 
 
Introdução 
Posição no Direito Civil 
Marcos Conceituais 
A evolução histórica. A historicidade presente no direito obrigacional. Noção histórica 
de obrigação, evolução da teoria das obrigações, codificações e importância do direito 
obrigacional. Pacta Sunt Servanda e sua crítica. A visão do novel direito civil sobre o 
dogma da vontade. 
Fontes 
Elementos Constitutivos – Sujeitos, Objeto e Vínculo Jurídico 
Natureza Jurídica da Obrigação 
Constitucionalização das Relações Obrigacionais – dignidade da pessoa humana, 
despatrimonialização das relações jurídicas, repersonificação das relações obrigacionais 
e aspecto moral/extrapatrimonial das obrigações 
 
CAPÍTULO II – Modalidade das Obrigações 
 
Modalidade das Obrigações 
Generalidades 
Classificação das obrigações segundo seus elementos constitutivos 
Classificação quanto ao Objeto 
Classificação quanto aos Sujeitos 
Das Obrigações Divisíveis e Indivisíveis, Das Obrigações Solidárias 
Classificação das obrigações segundo o fator determinante da obrigação 
Das Obrigações de Meio e de Resultado 
Classificação das obrigações segundo o respaldo da obrigação 
Das Obrigações Civis, Morais e Naturais 
Classificação das obrigações segundo o elemento acidental 
Das Obrigações Puras e Simples, Condicionais, à Termo e Modais 
Classificação das obrigações segundo o momento do cumprimento 
Das Obrigações Diferidas, Instantâneas e de Trato Continuado 
Classificação das obrigações segundo a liquidez 
Das Obrigações Líquidas e Ilíquidas 
Classificação das obrigações segundo o previsto no Código Civil vigente 
Das Obrigações de Dar 
Da Obrigação de Dar Coisa Certa: 
Das Obrigações de Dar Coisa Incerta 
Das Obrigações de Restituir 
Das Obrigações de Fazer 
Das Obrigações de Não Fazer 
 
CAPÍTULO III – Da Extinção das Obrigações 
Teoria do Pagamento 
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Da extinção do direito obrigacional. Notas introdutórias. 
Noções e espécies de pagamento. 
Natureza jurídica e requisitos de validade do pagamento. 
De quem deve pagar. 
A quem se deve pagar. 
Do objeto do pagamento. 
Da prova do pagamento. 
Do lugar do pagamento. 
Do tempo do pagamento. 
Da extinção indireta da obrigação pela consignação em pagamento 
Da extinção indireta da obrigação pela dação em pagamento 
Da extinção indireta da obrigação pela novação 
Da extinção indireta da obrigação pelacompensação 
Da extinção indireta da obrigação pela remissão. 
A transferência obrigacional pela Sub-Rogação. 
A suspensão da eficácia obrigacional pela Confusão. 
A ordenação do pagamento pela Imputação. 
A transação e o compromisso. 
Do pagamento indevido. Conceito. Espécies. Requisitos. Repetição do Pagamento. 
Exclusão da Repetição 
 
CAPÍTULO IV – Do Descumprimento Obrigacional 
A Mora e o Inadimplemento 
 
Do descumprimento obrigacional. 
A Mora e Inadimplemento Absoluto. Marcos Conceituais. 
Espécies de Mora. Mora do Devedor. Mora do Credor. Mora de Ambos os Contraentes. 
Purgação da Mora. 
Cláusula Penal e Multa Contratual. 
Juros – Remuneratórios e Moratórios. 
Perdas e Danos. Perdas e Danos nas obrigações pecuniárias. 
Danos Emergentes e Lucro Cessante. 
Correção Monetária – Conceito e Espécies. 
 
CAPÍTULO V – A Transferência do Direito de Crédito 
 
A cessão de crédito. 
A assunção de dívida. 
A cessão da posição no contrato 
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CAPÍTULO 01 
ESTUDOS PROPEDÊUTICOS
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CAPITULO I – Estudos Propedêuticos 
 
Introdução; Posição no Direito Civil; Marcos Conceitual; 
Historicidade; Fontes; Elementos Constitutivos – Sujeitos, Objeto e 
Vínculo Jurídico; Natureza Jurídica da Obrigação; 
Constitucionalização das Relações Obrigacionais – dignidade da 
pessoa humana, despatrimonialização das relações jurídicas, 
repersonificação das relações obrigacionais e aspecto 
moral/extrapatrimonial das obrigações. A boa-fé, a probidade e a 
função social na prática dos negócios jurídicos. A repressão ao abuso 
do direito e o dever de conduzir-se com lealdade e boa-fé. O princípio 
da boa-fé. A função hermenêutico-integrativa do princípio da boa-fé. 
A boa-fé como fonte de deveres de conduta. O limite ao exercício de 
direitos. Temperamentos do princípio da boa-fé. Conclusões. A 
função social do contrato. 
 
Título 01 
Introdução, importância e sua posição no direito Civil 
 
Para uma visão possível da ciência jurídica, o direito, em uma visão 
primeira ser fracionado em dois grandes grupos: os direitos não-patrimoniais e os 
patrimoniais. 
Por direitos não-patrimoniais tem-se aqueles direitos ligados à vida, à 
liberdade, ou seja, com a tutela voltada aos bens não-corpóreos, portanto, impassíveis 
de valoração. 
Já os direitos ditos corpóreos, são aqueles que são suscetíveis de, 
imediatamente, uma atribuição de valor econômico e patrimonial, por isso, vinculados a 
bens materiais ou de crédito. 
Os direitos corpóreos, ou também conhecidos como patrimoniais 
subdividem-se em reais e obrigacionais. 
Os direitos reais integram o direito das coisas, ou seja, a ligação do ser 
humano com um bem material e o exercício do direito em face e função desta ligação. 
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É prudente, e de suma importância aliás, mencionar desde já que, quando se 
refere a direitos corpóreos, não se está fazendo menção aos direitos corporificados, ou 
seja, os materiais que são aqueles suscetíveis de palpabilidade, ou seja, toque. 
O que de fato se pensa é os direitos corpóreos entendidos como os 
corporificados, materiais propriamente ditos. De outro lado os não-corporificados, ou 
imateriais, como por exemplo, o patrimônio moral e o crédito das pessoas, sejam estas 
físicas ou jurídicas, muito embora suscetíveis de valoração, não apresentam uma forma 
física que os torne possíveis de toque. 
De outro turno, os direitos obrigacionais, também encontrados na doutrina 
como direitos pessoais ou direitos de crédito, compõe o que se conhece por direito das 
obrigações. 
É importante dizer que, muito embora integrantes dos direitos patrimoniais, 
diferem-se entre si os reais dos obrigacionais quanto ao objeto, quanto ao sujeito, 
quanto à duração, quanto a sua formação, quanto ao seu exercício e quanto à sua forma 
de ação. 
Vejamos: 
Os direitos reais incidem sobre uma coisa, tem sujeito passivo 
indeterminado, em regra são duradouros e a eventual ação que lhe prestará uma tutela 
possui destinatário indeterminado. Quando se refere destinatário indeterminado é 
porque não interessa quem agride o direito real, porque a tutela não se voltará contra 
uma determinada pessoa, mas sim buscará proteger o direito do autor da pretensão sobre 
a coisa. 
Direitos Reais Incidência sobre a coisa 
 Sujeito passivo indeterminado 
 Vigentes enquanto existente o 
vínculo com o bem 
 A tutela possui destinatário 
indeterminado 
Já os direitos obrigacionais exigem o cumprimento de uma obrigação 
positiva (agir) ou negativa (abster-se de agir), os sujeitos são determinados ou, no 
mínimo, passíveis de determinação, os direitos são transitórios e se extinguem pelo 
cumprimento direto ou indireto, exige sempre a presença de um devedor para o seu 
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exercício e eventual ação será contra o sujeito passivo do pólo obrigacional formado 
pelo contrato ou pelo ato ilícito. 
Direitos Obrigacionais Conduta (ativa ou passiva) 
 Sujeitos determinados ou 
determináveis 
 São transitórios 
 A tutela é contra o transgressor 
de um dever de conduta 
Também é importante referir, como possível marco de diferenciação, as 
fontes de um e outro. 
A fonte dos direitos reais é a Lei. 
Há previsão taxativa no disposto no artigo 1.225 do Código Civil de 2002 
referindo quais são os direitos reais não havendo vazio normativo que permita a criação 
de qualquer outra forma de direito real diversa do que ali previsto. 
Assim, os direitos reais são: 
1. a propriedade, 
2. a superfície, 
3. as servidões, 
4. o usufruto, 
5. o uso, 
6. a habitação, 
7. o direito do promitente comprador do imóvel, 
8. o penhor, 
9. a hipoteca e 
10. a anticrese. 
A doutrina ainda indica a posse com um direito real, todavia, a posse, salvo 
melhor juízo, é tão somente um dos caracterizadores do exercício de qualquer direito 
real. 
Já os direitos obrigacionais se concretizam exatamente na previsão legal ou 
na lacuna legal, na possibilidade de criação humana em verdadeiro processo de 
descentralização nomogenética. 
Por descentralização nomogenética entende-se o permissivo que o legislador 
concede ao particular para criação de obrigações, observando alguns mínimos requisitos 
legais. É um vazio normativo no qual pode o particular regrar suas condutas e 
obrigações com o permissivo legal. 
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Assim, um negócio jurídico, ao observar o disposto no artigo 104 do Código 
Civil é recepcionado pela ordem jurídica, produzindo efeitos entre as partes, de tal 
modo que seus efeitos torna-se similares como se emanados de uma determinada 
legislação. 
Na literalidade, é a descentralização da gênese da norma, ou seja, sai do 
legislador e vai ao particular que, ao ter legitimidade e capacidade, pode estipular um 
negócio jurídico observando ou a previsão legal ou a ausência de proibição quanto à 
forma, desde que, igualmente, o objeto desse negócio seja lícito. Assim, na síntese, para 
que um negócio jurídico seja lícito, basta que tenha agente capaz, objeto lícito e forma 
prescrita ou não defesa em lei. 
A contar de então o negócio jurídico passa a produzir efeitos para as partes 
nele envolvidas e irradiam ao entorno seus efeitos. 
Por essa linha, são lícitas todas aquelas obrigações que, segundo a regra 
contida no artigo 104 do Código Civil de 2002, forem concretizadas por agentes 
capazes, possuírem objeto lícito e atentarem à previsão legal ou forma não defesa na lei, 
não encontrando o direito obrigacional a taxatividade legal que encontra o direito real. 
Como se vê, inúmeras são as diferenças que dão margem à clareza da 
distinção. 
São bens, tuteláveis tantopelo direito obrigacional quanto pelo real, todas as 
coisas, materiais ou imateriais que podem servir de objeto de uma relação jurídica. 
A noção de bem, enquanto gênero é mais ampla do que a de coisa, enquanto 
espécie. 
A coisa sempre tem um valor econômico inicialmente definido, o que não 
ocorre nos bens, principalmente quando estes bens são imateriais, portanto, sem 
materialidade. Todavia, não quer dizer que não possam ser suscetíveis de 
reparabilidade. 
É importante referir que uma obrigação, na pura literalidade, tem 
hermenêutica de impossível limitação, vez que o dever, seja ele imposto (lei) ou 
assumido (contrato), não se restringe ao cumprimento de uma obrigação material e/ou 
patrimonial. Vai mais além, ou seja, está presente em qualquer esfera ou campo de 
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vivência do homem, sendo impossível dissociá-la da vida humana e de seu complexo e 
intrincado relacionamento enquanto ente social. 
Por isso que não raras as vezes que se encontra na doutrina que o direito 
obrigacional não deve estar inserto dentro do direito civil, porque tratar-se de disciplina 
das ciências jurídicas que dá noções conceituais para diversos outros ramos do direito. 
Foi por causa dessa discussão, inclusive, que se pensou na estruturação de 
um código específico para o direito obrigacional, retirando-lhe do direito civil privado. 
Por exemplo: o conceito da responsabilidade tributária está intimamente 
ligado na obrigação imposto a quem (devedor), inserto no fato dito pela lei (vínculo) 
como geradora da obrigação tributária (prestação), nele incide passando, assim, a ser 
devedor do Erário (credor). 
Também o é quando se pensa na responsabilização de um criminoso por 
eventual conduta típica, ilícita e culpável. Daí tempos as partes da obrigação (Estado e 
Réu), o vínculo jurídico (Lei Penal) e a prestação (Pena). 
Como bem salienta Levenhagem: 
"o conceito de obrigação é o substrato não apenas do direito, mas de 
todas as relações sociais." 
E o direito obrigacional está cada dia mais vinculado ao ser humano e seus 
relacionamentos com os seus pares pois, como dito por Jorge Pinheiro Castelo, em seu 
artigo Efetividade e Segurança Jurídica na Evolução do Pensamento Ocidental: 
“A busca da segurança jurídica constitui o elemento preponderante na 
formação do conceito moderno de direito”. 
Esta segurança jurídica, ainda que no plano subjetivo, vislumbra-se pelo 
direito obrigacional, ramo do direito privado que dá ao titular do direito o mínimo de 
garantia da tutela de sua pretensão. 
Trata o direito das obrigações de bens, sejam estes corpóreos ou não e, 
muitas vezes, nominados na doutrina pelo sinônimo de direito de crédito, que é o direito 
daquele em favor de quem o devedor terá a obrigação de satisfazer o crédito. 
Poucas são as coisas, ou melhor, condutas na vida não regidas por contratos, 
existindo sempre de um lado o credor e no pólo oposto o devedor. Há, nessa 
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necessidade mútua, uma divisão de funções, que se agigantam com o passar dos tempos 
e o crescimento da população e, como diz Sílvio Rodrigues: 
"...daí depender a pessoa, dia a dia, mais e mais de seu semelhante..." 
Por isso que é correto dizer que o direito obrigacional, pois, é elemento 
civilizatório do processo social ao estabelecer dentro da ciência jurídica, a exata visão 
de Isaac Newton para que: 
“para toda ação corresponde uma reação em igual sentido e força, em 
destino inverso” 
Ou seja, tudo aquilo que se faz (ação) ou não se faz (omissão) tem uma 
conseqüência e essa pode interessar ao mundo jurídico porque pode interferir no 
patrimônio jurídico de terceiro que, lesado, terá o direito de ver indenizado (reparado ou 
compensado) pelo prejuízo experimentado. 
E esse exercício, claramente, é fruto do que o direito das obrigações nos 
outorga, ou seja, a noção da conduta vinculada ao dano e a indenização. 
Como tal, pode ser entendido como o coração da própria ciência jurídica 
porque traz a esse campo da ciência os seus preceitos e princípios basilares e estruturais. 
Por ciência, posiciona-se o Direito das Obrigações, ou o Direito de Crédito 
como referido por parte da doutrina, na Parte Especial do Código Civil de 2002, a 
contar do Livro I e assim acha-se ali distribuído, no primeiro título tratando das 
modalidades obrigacionais, focada a conduta do agente em dar, seja a coisa certa e coisa 
incerta, em obrigações de fazer e não fazer, em obrigações alternativas, divisíveis e 
indivisíveis, obrigações solidárias ativas, passivas e mistas. No segundo título está 
objetivada a transmissão das obrigações pela cessão de crédito e a assunção de dívidas. 
No terceiro capítulo trata do adimplemento e da extinção das obrigações focando o 
pagamento propriamente dito pelas figuras de quem deve pagar, a quem se deve pagar, 
o objeto e a prova do pagamento, o tempo e o lugar. Posteriormente, pelos meios 
indiretos de extinção obrigacional e aponta, para tanto, a consignação em pagamento, a 
sub-rogação, a imputação do pagamento, a dação em pagamento, a novação, a 
compensação, a confusão e a remissão das dívidas. No título quarto trata do 
inadimplemento obrigacional e suas conseqüências, verificando a mora, as perdas e 
danos, juros legais, cláusula penal e arras e sinal. 
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De início, buscando uma objetividade do estudo, é propedêutico que se 
estabeleçam alguns marcos conceituais, marcos estes que, conhecidos, podem ser 
apropriadamente exportados aos outros ramos da ciência jurídica e igualmente aqui 
utilizados, na seqüência para entendimento da estrutura toda. 
Título 02 
Marcos Conceituais 
 
Conceito de Obrigação 
 
Várias são as formas através das quais a doutrina conceitua „obrigações‟. 
Em verdade, são similares e todas convergem ao comum. 
Vejamos: 
"É A PARTE RELATIVA AOS VÍNCULOS JURÍDICOS, DE 
NATUREZA PATRIMONIAL, QUE SE FORMAM ENTRE 
SUJEITOS DETERMINADOS PARA A SATISFAÇÃO DE 
INTERESSES TUTELADOS PELA LEI E QUE SE ACHAM 
SISTEMATIZADA NUM CONJUNTO DE NOÇÕES, PRINCÍPIOS 
E REGRAS." (Orlando Gomes). 
"COMPLEXO DAS RELAÇÕES DE DIREITO PATRIMONIAL, 
QUE TÊM POR OBJETO FATOS OU PRESTAÇÕES DE UMA 
PESSOA EM FAVOR DA OUTRA." (Clóvis Bevilacqua). 
"OBRIGAÇÃO É A RELAÇÃO JURÍDICA EM VIRTUDE DA 
QUAL UMA OU MAIS PESSOAS DETERMINADAS DEVEM, EM 
FAVOR DE OUTRA OU OUTRAS, UMA PRESTAÇÃO DE 
CARÁTER PATRIMONIAL." (Arnoldo Wald). 
"OBRIGAÇÃO É O VÍNCULO DE DIREITO PELO QUAL 
ALGUÉM (SUJEITO PASSIVO) SE PROPÕE A DAR, FAZER, OU 
NÃO FAZER QUALQUER COISA (OBJETO), EM FAVOR DE 
OUTREM (SUJEITO ATIVO)." (Sílvio Rodrigues) 
Assim, é possível estabelecer uma síntese em que se conclui que ... 
Obrigação é o vínculo no qual alguém se compromete em dar, pagar, 
fazer ou não fazer determinada coisa em favor de outro. Este vínculo 
pode ser legal ou contratual. 
A definição utilizada por Roberto Senize Lisboa, é bastante feliz ao dizer 
que: 
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Obrigação jurídica é um vínculo de direito de natureza transitória que 
necessariamente compele alguém a solver aquilo a que se 
comprometeu, garantindo o devedor que pagará a prestação 
economicamente apreciável, seja por meio de seu patrimônio ou de 
outrem.‟ 
De fato, tal definição envolve todas as demais, traduzindo-se em uma forma 
de limitar o conceito das obrigações jurídicas. 
E isso porque o seu Autor destaca a presença de um elemento de obrigação 
– vínculo de direito – sua natureza limitada temporalmente, ou seja, de que haverá uma 
forma de extinção ou pelo adimplemento voluntário ou coagido, bem como reconhece 
que a presença do bem, que é gênero – tanto material quanto imaterial – mas apreciável 
economicamente e, ao final, porque prevê a responsabilização patrimonialpara a 
satisfação do crédito o que, num todo, pode se dizer, são os elementos que efetivamente 
melhor conceituam o direito obrigacional. 
Mas, antes de adentrar ao conteúdo, impar se faz sua análise histórica. 
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Título 03 
A Evolução Histórica. 
A historicidade presente no direito obrigacional. 
Noção histórica de obrigação. 
Evolução da teoria das obrigações, codificações e importância do direito 
obrigacional. 
Pacta Sunt Servanda e sua crítica - A visão do novo direito civil sobre o 
dogma da vontade. 
 
Jorge Pinheiro Castelo, já citado, bem assenta que: 
“A nossa formação jurídica continua, até hoje, sendo uma formação 
calcada no direito decorrente da Revolução Francesa, do racionalismo, 
do positivismo e do liberalismo. Não se ensina nas faculdades de 
direito nada (ou muito pouco e sem efetiva preocupação e nem 
adequada co-relação) sobre história, filosofia, sociologia, psicologia e 
psicanálise (psicologia profunda). Viramos meros exegetas da Lei. 
Ensinamos Direito como se ensina matemática ou geometria.” 
Aberlardo Levaggi, em sua obra Manual de Historia del Derecho Argentino, 
à fls. 06 e ss. bem assenta que: 
 „el derecho se presenta com un cuerpo o sistema de normas, un 
sistema formado com critérios diferentes, dada esta naturaleza 
sistemática, su estúdio histórico deve hacerse sistemáticamente.‟ 
E vai mais além o Professor Levaggi ao assentar as razões de seu 
pensamento e apontar a necessidade de um estudo histórico de cada instituto quando 
justifica o estudo para: 
 „conocer y aplicar el derecho actual, para prever los câmbios 
futuros y para saber qué es el derecho.‟.... „Sólo quien conoce 
las normas jurídicas, las interpreta bien y las aplica sabiamente, 
sin perder de vista el concepto de derecho, merece ser llamado 
jurisconsulto.‟ 
Como o próprio conceito já ensina, em poucas palavras, é um 
comprometimento de um para com outro e tal remonta às épocas propedêuticas da 
história. 
18 
 
Já salientado anteriormente, sempre que existiram duas pessoas, lá já existia 
o direito, bem como, e principalmente, a obrigação que é reciproca. 
Na conceituação acima apontada de criação de Sílvio Rodrigues, por 
exemplo, remonta à Institutas de Justiniano, e é sua fiel reprodução, encontrando 
guarida, ainda, nos tempos atuais. 
Como cita Sílvio Rodrigues: 
"Diz o texto justinianeu tratar-se de um vínculo de direito que 
compele alguém (devedor) a fornecer uma prestação (objeto), segundo 
a lei do País." 
Flavius Petrus Sabbatius Justinianus, em suas Institutas, já tratava do direito 
obrigacional através do Título XIII – Das Obrigações (De obligationibus), assim 
conceituando obrigação como : 
„um vínculo de direito, formado segundo o nosso direito civil, que nos 
coage a pagar alguma coisa.‟ 
Tal conceito remonta a 533 d.C. e, até os dias atuais, é importante marco 
conceitual. 
Efetua, para melhor compreensão e desenvolvimento de seu raciocínio duas 
divisões que chamou de principal e subseqüente. 
Para as Principais Justiniano apontava as civis, estabelecidas pela lei ou 
reconhecidas no direito civil e as Pretorianas aquelas instituídas pelo Pretor no exercício 
do seu poder de jurisdição e que em algumas notas históricas também ficaram 
conhecidas como Honorárias. 
Já as Subseqüentes seriam os contratos formados pela tradição da coisa, por 
palavras, por escritos ou por mero consenso e os quase contratos, além dos delitos e dos 
quase delitos. 
Traduzindo-se ao atual, a obrigação principal civil são os nosso atuais 
contratos, sejam eles tipificados pela legislação civil ou atípico e a obrigação principal 
pretorianas aquelas decorrentes das sentenças judiciais, partição utilizada pelo legislador 
processual de 1973 para dividir os títulos executivos em extrajudiciais e judiciais. 
19 
 
Quando fala da obrigação pela tradição da coisa (quibus modis re 
contrahitur obligatio), em verdade, lecionou Justiniano o contrato de mútuo, ou 
empréstimo onde 
 „o mutuo recai sobre coisas que podem ser pesadas, contadas e 
medidas, como o vinho, o óleo, o trigo, o dinheiro, o cobre, a prata, o 
ouro. Quando estas coisas são dadas por peso, número e medida, 
entram na propriedade daquele que as recebe; este não deve restituí-
las ulteriormente, dando, porém, outras da mesma natureza e 
qualidade. Daí veio o nome de mútuo, porque o que eu te dou de meu 
fica sendo teu.‟ 
Como se vê, nada mais é do que a nossa obrigação de restituir objeto/coisa 
fungível. 
Quando fala da obrigação por palavras (de verborum obligatione), 
Justiniano diz que se contrai a obrigação verbal pela utilização de certas palavras, em 
perguntas e respostas, oportunidade em que se estipula que se dê ou faça determinada 
coisa. 
Assenta que, para formar a obrigação verbal usam-se palavras, pouco 
importando o idioma, impondo-se, outrossim, que ambas as partes tenham 
conhecimento do que está sendo estipulado.Veja, já lá importava mais o sentido, a 
intenção, que a literalidade. 
Tais perguntas são: Respondes ? Respondo. Prometes ? Prometo. Garantes ? 
Garanto. Afianças ? Afianço. Darás ? Darei. Farás ? Farei. Posteriormente, tais 
formalidades (perguntas) foram suprimidas e substituídas pela intenção e conhecimento 
concordes. 
Quando refere obrigação escrita (de litterarum obliatione), ou literal, diz ser 
aquelas assentadas nos escritos. E, quando menciona obrigação consensual (de consensu 
obligatione), fala da venda, da locação, da sociedade e do mandato, onde as obrigações 
formam-se pelo consenso mutuo das partes e por isso formam-se mesmo entre ausentes, 
por carta ou por intermediários (procuradores) e se apreciam segundo a equidade. O que 
a faz diferençar-se da verbal pois naquela um estipula e o outro promete, aceita. 
Remonta, ainda, a própria idéia da obrigação a Roma antiga, à idade da 
pedra, à primeira co-habitação de dois homens no mesmo espaço e tempo. 
20 
 
Com a vivência tribal, os homens pré-históricos subdividiam-se em suas 
tarefas, primeiramente quanto à caça, agricultura, segurança da tribo, procriação e 
manutenção da raça. 
Porém, como as relações humanas foram se aprimorando e se agigantando, 
com o passar dos tempos, o direito buscou tutelá-las, como não poderia deixar de ser, e 
acompanhou tal evolução, até chegarmos aos dias atuais, com os dispositivos legais 
hodiernamente existentes, que regulam tais relações, sejam de mercancia, de co-
habitação, de subsistência coletiva, enfim. 
Deixou-se de lado o constrangimento pessoal do devedor inadimplente, com 
a disposição de seu próprio corpo, aplicando-se, ainda, de forma excepcional a prisão 
civil pelo inadimplemento alimentar e do depositário infiel, nos termos da Carta Política 
hoje vigente. 
Leciona Sílvio Venosa que 
“no tocante à execução das obrigações, como o vínculo incidia sobre a 
pessoa do devedor, a substituição para fazer recair a execução sobre os 
bens parece ter sido lenta e ditada pelas necessidades da evolução da 
própria sociedade romana. A princípio, a sanção do nexum, velho 
contrato do direito quiritário, era a manus iniectio, que, pela falta de 
adimplemento, outorgava ao tradens o direito de lançar mão do 
devedor. A lei Papiria Poetelia do século IV a.C. suprimiu esta forma 
de execução, a qual, tudo indica, já estava em desuso na época.” 
Na idade média a teoria obrigacional estava vinculada aos princípios do 
BGB (código civil alemão) que, por sua vez, estavam calcados no direito germânico 
onde a autonomia da vontade era reduzida e a formalização dos contratos era presente e 
forte. 
Cita Venosa que a responsabilidade pelo descumprimento estaria vinculada 
à possibilidade da vingançaprivada e a responsabilidade penal. 
No renascimento francês, então, volta-se ao estudo romântico e a influência 
da igreja através dos princípios morais, onde a palavra passa a ter maior força nos 
contratos, dando início ao dogma da vontade – pacta sunt servanda – inserida pela 
codificação napoleônica que traz forte influência para o código civil brasileiro de 1916 
que, em verdade, foi gestado no século XIX e concebido segundo os marcos conceituais 
21 
 
daquela sociedade – liberalismo francês – o que hoje entra em choque com o constante 
intervencionismo do estado no direito privado. 
É que com a Constituição de 1824, onde foram recepcionados os diplomas 
legais portugueses, através do artigo 179, XVIII, estabelecia-se o início da estruturação 
de um código civil para o Brasil. 
Tal iniciativa não se deu por livre expressão de vontade nacional. Foi, de 
fato, influência da cultura européia onde Thibaut, em 1814, já defendia a necessidade de 
um código civil para a Alemanha, tese que foi contraposta por Savigny em sua célebre 
obra “Sobre a vocação de nossa época para a jurisprudência e a legislação”. 
Todavia, forte, e por conseqüência vencedora, foi a corrente codificadora e, 
em 1896, é promulgado o Código Civil Alemão. Antes, porém, em 1804, Napoleão já 
agraciava o povo francês com o Code Civile ou Code Napoléon e em 1811 foi a vez da 
Áustria ganhar o seu diploma civil. 
Justamente nesse panorama jurídico cultural – 1804 – 1896 – é que o 
civilismo brasileiro finca suas primeiras raízes e dá-se, em 1845, através de Carvalho 
Moreira (Barão de Penedo) a primeira estrutura de um código civil chamado Da revisão 
geral e codificação das leis civis e do processo no Brasil. 
A contar de então, inúmeros projetos e esboços foram efetuados e neles 
sempre contido o direito obrigacional até que, em 1941, foi apresentado perante o 
congresso nacional um anteprojeto de código civil das obrigações o qual não teve 
maiores desenvolvimento e análise até 1963/1964, que fundiram os três anteprojetos 
anteriores em um só e que foi esquecido pelo projeto de 1975, atual Código Civil, que 
manteve o direito obrigacional em seu corpo. 
Na antes mencionada evolução social que, paralelamente, o direito 
obrigacional vê-se atrelado pois, como muito bem ensina Sílvio Venosa: 
 “A importância das obrigações revela-se por ser projeção da 
autonomia privada no direito” pois “estão presentes desde a 
atividade mais simples até a atividade mais complexa da 
sociedade. O direito das obrigações dá o suporte econômico da 
sociedade, porque é por meio dele que circulam os bens e as 
riquezas e escoa-se a produção.” 
E contra tal posicionamento é impossível levantar-se objeções porque 
22 
 
atende-se, assim, a uma necessidade imperiosa de dar maior segurança aos 
relacionamentos. 
O aumento do consumo de bens duráveis, conseqüência inexorável do 
progresso industrial, e o crescimento do chamado mercado de capitais, notadamente 
com os efeitos do mercado global, foram fatores determinantes para que ao sistema 
normativo brasileiro fossem agregadas regras disciplinadoras de diversas questões. 
É evidente que tais questões relativas ao crédito não são novas. Desde há 
muito está presente no âmbito do comércio de bens intensa preocupação em torno da 
necessidade de se criarem instrumentos jurídicos capazes de permitir a ampla circulação 
dos bens, acompanhados de mecanismos de proteção ao crédito, ao credor e ao devedor, 
enfim, ao exteriorizar do convívio social representado, no caso, pelo comércio. 
De fato, há necessidade de garantias que permitam ao crédito como 
instrumento de realização de negócios, a necessária „credibilidade‟ e, se possível como 
objeto final, a praticidade de seus mecanismos na garantia de resgate destes créditos. 
O negócio jurídico há de ser tutelado como forma de manutenção da ordem 
social. 
Este é o escopo primeiro do direito obrigacional ao nosso ver, ou seja, 
efetivamente dar ao cidadão o que nominou Jorge Pinheiro Castelo de Segurança 
Juridica. 
Nesse contexto, há que se pensar na integridade do sistema jurídico, que 
deve acolher novos instrumentos em harmonia com seus princípios e regras, de forma 
que o advento de novos mecanismos não cause fissuras na ordem constitucional ou 
provoque desarranjos no sistema normativo infraconstitucional. 
Em benefício do credor, engendram-se garantias que permitam a ele o 
recebimento de seus haveres diante do devedor, de modo a que, mantido o seu capital, 
possa continuar exercendo suas atividades comerciais ou financeiras. 
E, em favor do devedor, tem-se criado sistemas que permitam, a um só 
tempo, o acesso cada vez maior à fruição dos bens que se encontram no comércio e o 
mínimo possível de sacrifícios e constrangimentos diante das situações advindas da 
contratação (e principalmente do inadimplemento) do crédito. Cite-se, nesse caso 
específico, o micro sistema de direito obrigacional jurisdicizado pelo Código de Defesa 
23 
 
do Consumidor. 
Não é fácil a tarefa consistente em conciliar tantos interesses, 
principalmente diante do crescente desprestígio das garantias eminentemente pessoais, 
fruto da massificação do consumo e do alargamento do crédito. 
O sistema, por razões notórias de evolução social, tem preferido estabelecer 
garantias que recaiam sobre os próprios bens, como por exemplo a venda com reserva 
de domínio, a alienação fiduciária em garantia, etc., de modo a que estes possibilitem ao 
credor, na hipótese do inadimplemento, o imediato recebimento de seu crédito. 
Se, por um lado, há o reclamo das classes empresariais, que pedem melhores 
regras de disciplina do tráfego comercial e financeiro, há, por outro lado, necessidade de 
se preservarem direitos e garantias dos usuários do crédito. 
Mas, não é só. É preciso ver-se o sistema de oferta de crédito não como 
vilão inafastável. Antes é preciso filosofar a economia. 
De fato, tudo é economia, porque as pessoas se movem, se relacionam por 
motivos de ordem econômica, mas o direito é exatamente o limite ético da economia. 
Importante dizer que para que se possa ter uma idéia aproximadamente 
correta do complexo mecanismo de funcionamento do sistema de crédito para 
financiamento do consumo, é preciso lembrar que os recursos destinados ao 
fornecimento de crédito ao consumidor são oriundos, fundamentalmente, da captação 
que a instituição financeira realiza perante terceiros, chamados investidores. 
Trata-se de uma longa cadeia de interesses econômicos que, grosso modo, 
assim funciona: a instituição financeira capta recursos de investidores no mercado 
financeiro, contratando remuneração de acordo com critérios de mercado; esses 
recursos, captados no mercado, são aplicados em operações de crédito; o favorecido 
com o crédito adquire bens de consumo; com o „retorno‟ desses recursos à instituição 
financeira, esta paga aos investidores. 
Nesse exemplo, o inadimplemento das obrigações assumidas pelo devedor 
(que do crédito se serviu para a aquisição de bens) acarretará sem dúvida alguma na 
ruptura do sistema de captação de recursos, pois, se a instituição financeira não contar 
com recursos para honrar seus próprios compromissos diante dos investidores, 
dificilmente terá meios para fazê-lo e, nessa hipótese, de certo não conseguirá ampliar a 
24 
 
captação. 
A conseqüência direta da diminuição da captação de recursos será o 
encolhimento da oferta de crédito, com elevação nas taxas de juros e interesses o que 
oportunizará, por certo em evidente prejuízo para o consumidor dos bens de produção 
que necessite de crédito para adquiri-los e para tanto assumirá o encargo elevado 
representado pelos juros e taxas de interesseselevados pelo risco crescente da 
inadimplência. 
Como vasos comunicantes, o inadimplemento obrigacional afeta toda a 
sociedade, portanto porque, se ao crescimento econômico impar se faz um sistema 
financeiro saudável, com taxas de juros compatíveis com o mercado, tais taxas de juros 
devem ser reduzidas para tanto e, para a redução das taxas de juros, impar se fazem 
instrumentos aptos e capazes de minimizar o risco do fornecedor do crédito. 
Juros somente reduzem-se, em prol da sociedade como consumidora final 
do crédito, com um sistema econômico-financeiro-empresarial-jurídico de regras claras 
e sérias, além de eficazes, impondo-se ao Estado fazer viger tal sistema de pesos e 
contrapesos pois, como leciona Venosa: 
„em todas estas atividades, da produção à distribuição de bens e 
serviços, imiscui-se o direito obrigacional‟. 
Linhas atrás falou-se no Pacta Sunt Servanda como princípio do direito 
obrigacional e que, forte nesse, parte da doutrina assenta a impossibilidade do 
intervencionismo estatal nos relacionamentos privados. Tal posição, aliás, encontra 
respaldo da jurisprudência. 
Contudo, tem de ser visto com cautela tal posicionamento porque sua plena 
aceitação está limitada e dependente de duas condições fáticas de inafastável presença 
que são a compreensão do trato celebrado e também deve ter-se em conta a 
possibilidade de entendimento do alcance dos efeitos dos mesmos pelas partes tratantes. 
Enquanto isso não se verifica, não há o que se falar em dogma da vontade, 
traduzido no Pacta Sunt Servanda. 
O negócio jurídico é conceituado de formas diversas por renomados 
doutrinadores, porém, todos conformes ao defini-lo, sinteticamente, como o ato ou atos 
25 
 
pelo qual ou os quais o indivíduo regula, por si, seus interesses nas relações com os seus 
semelhantes. 
É o ato pelo qual o direito liga os efeitos mais conformes à função sócio-
econômica que lhe caracteriza o tipo. 
Orlando Gomes, por exemplo, o define como sendo o: 
ato de autonomia privada, ou seja, a atividade humana simples ou 
complexa correspondente à essência da autodeterminação dos 
interesses particulares dirigida à esse fim. 
Conforme sua natureza, o contrato, inspirado no dogma da vontade, passou 
a ser considerado lei entre as partes, no momento em que a autonomia individual passou 
a ser considerada, simplesmente, como a liberdade de querer algo. 
A vontade é somente a fonte, o pressuposto normal da autonomia em seu 
sentido mais amplo. 
Respeitando a autonomia privada, o direito toma como objeto de suas 
previsões, os fatos em seu significado natural, que visa orientar a noção de negócio 
jurídico como fato natural ou social. 
Ou seja, para esses atos de auto-regulamentação de interesses privados, 
realizados nas condições permitidas, a lei os dota de eficácia jurídica. 
Santoro-Passareli, citado pela professora Raquel Schmiedel, em seu Livro 
Negócios Jurídicos - Nulidades e Medidas Sanatórias, 2a. Ed., São Paulo, Ed. Saraiva, 
1985, traduz bem esse ponto, ao definir o negócio jurídico como 
ato de autonomia privada dirigida a um determinado fim que o 
ordenamento jurídico reputa merecedor de tutela. 
A autonomia privada não consiste nem na liberdade de querer nem em 
poder criar normas jurídicas, mas sim em auto-regulamento de interesses particulares 
dos contraentes, posto que, nem todos os atos de autonomia privada apresentam 
relevância jurídica e, segundo a professora Raquel Schmiedel: 
 ainda que possuam, poderão ser juridicizados não como atos de 
autonomia privada, mas como atos jurídicos stricto sensu, meros atos 
materiais, operacionais 
Na terminologia de Pontes de Miranda, Atos-Fatos Jurídicos. 
26 
 
A competência de criar normas jurídicas é de quem, investido legalmente, 
tem tal atribuição, o que não é, em momento algum, atribuído aos contraentes, segundo 
as normas legais vigentes. 
A autonomia privada tem relevância jurídica enquanto é elemento fático de 
uma categoria jurídica, que irá fazer parte do mundo jurídico através da incidência de 
uma determinada regra jurídica - fenômeno da jurisdicização. 
Essa autonomia privada, contudo, não é ilimitada, encontrando barreiras, 
seja na moral, bons costumes, no ideal do bem comum, submissão ao ordenamento 
jurídico, dentre outros, o que impedirá os contraentes de buscar obter, mediante o uso da 
autonomia privada, interesses particulares contrários aos ditames legais, reprovados pela 
moral e pelos bons costumes. Tais limites constituem, contudo, prova suficiente do 
reconhecimento da autonomia privada pelo ordenamento jurídico e é por tal 
reconhecimento que esta tem acesso ao mundo jurídico. 
Logo, quanto ao aspecto de sua estrutura (como é) o Negócio Jurídico é um 
ato que consiste numa declaração ou em um simples comportamento. Tal ato deve ser 
reconhecido no ambiente social, por declarações, comportamentos, passando a ser um 
fato social, suscetível de interpretações e valorações por parte dos consorciados. 
Quanto à sua essência, já que o negócio jurídico é um ato de vontade e esta 
é essencial àquele, é elemento que integra sua estrutura. Essa vontade é qualificada, 
tendo em vista que é determinada, ou seja, dirigida a um determinado fim, socialmente 
relevante. 
A intenção negocial é o elemento nuclear do suporte fático, mas só há 
efeitos jurídicos se a regra jurídica os determina, atribuindo-os ao fato jurídico. 
Para Pontes de Miranda 
 a vontade só produz efeitos se a regra jurídica o estabeleceu, se 
deixou no figurante branco para auto-regulamento. 
Ou seja, a aptidão do negócio jurídico não decorre do ato, mas da norma 
legal que o faz penetrar no mundo jurídico, ou o recebe e juridiciza. Os efeitos se 
produzem para atender às finalidades pleiteadas pelos particulares contraentes, enquanto 
secundados pelo ordenamento jurídico. 
Raquel Schmiedel assim sentencia que 
27 
 
a vontade negocial só será operante no mundo jurídico enquanto 
manifesta. A chamada vontade interna ou real só 
excepcionalmente poderá ser avocada quando indispensável à 
compreensão do verdadeiro escopo perseguido pelos 
declarantes, ou, como causa de invalidade, toda vez que se 
configurar um dos vícios de consentimento. 
Negócio Jurídico é, portanto, um preceito de autonomia privada dirigido a 
interesses concretos, próprios de quem os estabelece. Tem caráter vinculativo. É a 
estatuição ordenadora de uma linha de conduta, por meio das quais o indivíduo regula 
as suas relações com os demais pares e possui eficácia se manifesta no plano social e 
depois se destina a produzir também no plano jurídico. (Schmiedel) 
Por fim, cabe estudar a conceituação segundo sua função (porquê). 
Inegável que a autonomia privada tem cunho social e seu reconhecimento 
pelo mundo jurídico se faz impar para regular e tutelar certas situações que o 
ordenamento jurídico assim o determinar, como garantia de equilíbrio e coesão sociais. 
É o negócio jurídico o principal instrumento, colocado à disposição pelo 
ordenamento aos contraentes, para que regulem seus interesses, restando como a 
principal categoria do direito privado e, por seu intermédio, a ordem jurídica instaura 
sua função dinâmica, regulando a distribuição de bens e serviços, indispensáveis à 
coletividade. 
Não há, pois, como negar-se a conceituação de negócio jurídico, sob o ponto 
de vista de sua função, como sendo o ato em que as partes regulam seus interesses, 
tutelados pelo ordenamento jurídico, para manter a estrutura social indispensável à 
sociedade, de interesse da comunidade. 
Conclui-se, portanto, que o negócio jurídico, sob o ponto de vista funcional, 
é o ato pelo qual o indivíduo regula, por si, seus interesses nas relações comseus pares, 
ato de autonomia privada ao qual o direito liga os efeitos mais conformes à função 
sócio-econômica que caracteriza o tipo, visando resguardar o interesse social de 
distribuição de bens e serviços. 
Com o passar dos tempos, o negócio jurídico passou a ser tratado como uma 
declaração de vontade em que o indivíduo, como já visto, regula suas atividades com os 
28 
 
demais. Tal qualificação do negócio como declaração de vontade é o resultado de 
elaboração arbitrária segundo a tendência e no sentido daquele dogma. 
Através da Crítica do Dogma da Vontade nega-se que a mesma se encontre 
em primeiro plano no negócio jurídico e que os efeitos jurídicos e a razão do mesmo 
deva ser querida, como se pretende quando postulado uma vontade individual orientada 
para os efeitos jurídicos. 
A vontade pertence à formação (Gênese) do negócio jurídico, mas não ao 
conteúdo do ato de autonomia privada como fato social, posto que, contrariu sensu, 
exagera-se o contributo que a vontade dá à produção daquele efeito, fazendo descobrir 
ou procurar nela a sua razão exclusiva ou precípua. 
A declaração de vontade significa a faculdade, ou atividade, do querer, 
como fato psíquico interno que, na sua realidade integral, é estranho ao negócio e não se 
torna socialmente reconhecível. 
Crendo-se na onipotência da vontade individual, induz-se a desconhecer o 
múltiplos limites sociais e jurídicos da autonomia privada (moral, bons costumes, 
ordenamento jurídico, etc). Faz pensar que a essência do negócio jurídico consiste 
apenas na vontade e que, em referência a esta, a declaração só tem uma função 
puramente complementar ou instrumental, como meio de prova, revelação ou 
reconhecimento exigido apenas no interesse e para garantia da contraparte, mas não 
necessária. 
Leva-nos a crer que, na interpretação do negócio, se deve investigar 
primeiro qual foi a vontade interna, ainda que mantida em segredo, oculta, ou nutrida 
apenas por uma das partes contraentes e, só depois, se deverá verificar se a declaração 
tornou-se manifesta, ou se ela está realizada no comportamento ou era compartilhada 
pela outra parte. 
Mas, o preceito de autonomia privada aparece pela primeira vez, com a 
declaração e com o comportamento. É a partir desse momento que adquire vida como 
entidade duradoura, exterior e separada da pessoa de seu autor. Funciona para o futuro, 
vivendo vida própria, ou seja, independente da vontade que lhe deu o ser e até, por 
vezes, contrapondo-se à ela, ao passo que a vontade, como fato psíquico, é qualquer 
29 
 
coisa que se confunde com a pessoa e não é aceitável se independente desta. O preceito 
do negócio é qualquer coisa separada da pessoa e pode contrapor-se-lhe. 
O que gera o preceito contratual não é um encontro oculto, uma fusão dos 
quereres, mas a permuta das respectivas declarações e a sua consciente congruência, ou 
a intencional reciprocidade e congruência dos comportamentos. 
Tal acordo de intenções somente possui valor jurídico na medida em que 
seja reciprocamente reconhecível, e, portanto, em função dessa troca ou reciprocidade e 
congruência. 
Onde falta o acordo (consciência/congruente), falta a própria essência do 
contrato e é inútil procurar saber se terá havido, ou não, uma intenção comum, que seria 
irrelevante. 
A crítica cinge-se em questão de que a essência normativa do negócio, 
escapa, completamente, à evanescente qualificação da vontade. O perigo da 
ambigüidade não está menos próximo sempre que a aposição qualificativa da vontade 
ou é inteiramente inútil ou imprópria e usurpa o lugar de uma referência à personalidade 
e à liberdade individual. Isto torna claro que a qualificação induz a estabelecer entre 
poder e vontade um vínculo, conexão esta que não existe. O poder (ou vínculo) somente 
existe conceitualmente, a referência pura e simples a um sujeito, ainda que incapaz de 
querer e, portanto, a palavra vontade limita-se a ocupar o lugar da idéia de pessoa. 
Tal discussão surge no momento em que se atribui à declaração um valor 
puramente indiciário e complementar e, portanto, obriga a presumir como normal uma 
vontade, mesmo quando não há nenhuma, e a figurar como declarada uma vontade, 
quando não o foi. 
Tudo uma ficção. 
O regulamento escolhido pelas partes deve corresponder à conveniência 
particular, sendo esta apenas índice à sua determinação causal, dirigida a um resultado 
prático, a sua intenção prática. 
Porém, deve ter-se em conta que, como a vontade, não menos significativa é 
a norma, que ninguém põe em dúvida que a vontade constitui elemento normal do 
negócio jurídico e que ela deve atender-se ao apreciar um comportamento. Apenas, se 
pretende relevar que o elemento vontade, como fato psicológico do indivíduo, deve 
30 
 
tornar-se exteriorizado e reconhecido no ambiente social para, só então, adquirir 
relevância em face dos consórcios e obter tutela pelo ordenamento jurídico. 
Ao exteriorizar-se a vontade como fator psicológico interno dos contraentes, 
as normas jurídicas tem um valor sintomático, indicativo da orientação legal ao tratar da 
autonomia privada exteriorizada, na medida, como já alegado, em que mostram uma 
valoração. 
Se a vontade, como fator psicológico interno, fosse o único fator decisivo, 
não haveria razão para manter de pé, ou só afastar mediante reação da parte interessada, 
negócios em que se mostra deficiente o elemento subjetivo, ou a própria capacidade de 
entender e querer. O erro, ainda que essencial, não justifica um ação de anulação, a não 
ser quando seja reconhecível pela outra parte, tendo em conta o conteúdo, as 
circunstâncias e as partes do contrato. Se o único fator decisivo fosse o interno, não 
haveria razão para, em caso de simulação por exemplo, estabelecer a inoponibilidade da 
relação interna aos adquirentes de boa-fé do simulado adquirente. 
A boa-fé do contraente, ou dos terceiros, merece, pois, a tutela jurídica. 
Em todo direito positivo a disciplina da autonomia privada constitui um 
todo harmônico que tem em si uma coerência e um estilo próprios. Princípio este que se 
deduz da relevância jurídica atribuída à exigência de recognoscibilidade e, de um modo 
especial, ao valor social da aparência, no que se refere à relação qualificante do ato que 
justifica, por exemplo, a aquisição, unida à conseqüente necessidade de tutelar o 
adquirente, no caso, que tem razão para prestar fé a essa aparência. Verifica-se não só 
no caso de simulação, mas também em casos de alienação, de disposição, etc... 
Para Mengoni (apud Schmiedel), a credibilidade, e portanto a boa-fé da 
contraparte, é constituída pela aparência como fato social, pelo que deve ser tutelada 
pela ordem jurídica. 
Não se contesta, assim, que as valorações normativas da lei sejam inspiradas 
pela exigência social da recognoscibilidade e destinadas à tutela da correspondente 
confiança. Trata-se de declaração preceptiva que nela deveria estar realizada. Não se 
supera o inevitável dualismo entre a declaração e a atividade preceptiva que nela 
deveria estar realizada, mas, muda o ponto de vista a perspectiva da qual o dualismo 
deve ser olhado e valorado. A vontade, como já alegado, será sempre uma coisa interna, 
31 
 
inseparável da pessoa, coisa incontrolável. O preceito é uma coisa estabelecida, 
exprimida externamente no ambiente social e verificável sem possibilidade de equívoco. 
Por conclusão, se o negócio é um ato de autonomia privada, que têm 
relevância social em relação aos demais, resta evidenciado que não bastará saber se o 
autor o quer e tinha capacidade para realizá-lo, sobretudo, se podia dar-lhe vida, dentro 
de que limites e por quais caminhos. 
O preceito do negócio jurídiconão é só, e não tanto, o resultado normal de 
uma vontade, mas é, sobretudo, a manifestação de um poder, de autonomia privada que 
é, acima de tudo, uma realidade da vida social e encontra a sua legitimidade no 
reconhecimento jurídico. 
E é justamente esse o papel que cumpre ao Estado, segundo os novéis 
ditames do CC/02, ou seja, de fiscalizador da jurisdicização do negócio juridico, ou 
seja, se existem agentes capazes, forma prescrita ou não defesa em lei e se o objeto é 
lícito. Preenchidos tais requisitos objetivos, e atendidos aqueles subjetivos antes 
mencionados, ai sim presente estará o dogma da vontade. 
Como sentencia Venosa: 
“como é no Direito das Obrigações que reside o grande baluarte da 
autonomia da vontade, cabe aos julgadores não esquecer este aspecto, 
como razão da própria existência do direito privado. Temos de 
encontrar um meio-termo, o que procurou fazer o Projeto de 1975, que 
redundou no presente Codigo de 2002, entre o espírito liberal do 
Código, que dá confiança ao indivíduo e sua vontade, e a corrente 
social que, sob o manto da justiça social e das necessidades modernas 
de produção, procura inserir o individuo numa disciplina coletiva.” 
Assim, a autonomia privada, ou da vontade, é o campo de atuação do 
particular sem infringir a lei, está limitada no novo diploma civil àquelas condicionante 
– trata-se da descentralização nomogenética, onde o ao estado cumpre o papel 
fiscalizador e ao privado a gênese legal de seus relacionamentos. 
Além, alguns institutos jurídicos são de peculiar importancia ao direito 
obrigacional e, por isso, são marcos conceituais que devem estar sempre presentes. 
Nesse sentido, é fato jurídico todo o acontecimento previsto em norma 
jurídica que gera consequeências jurídicas – cria, modifica ou extingue direitos. Em 
sentido estrito, é o acontecimento independente da vontade humana que produz efeitos 
32 
 
jurídicos modificando ou extinguindo direitos. Pode decorrer de um fato natural, por 
isso ordinário como a morte, o nascimento, etc. ou humano e, por isso, extraordinário, 
como os atos e os negócios jurídicos e o ato ilícito. 
O ato jurídico é o que surge como mero pressuposto de efeito jurídico, pré-
ordenado pela lei, sem função ou natureza de auto-regulamento. Nos atos jurídicos em 
sentido estrito, o elemento vontade situa-se no plano secundário. A ênfase é na função 
que a ordem jurídica estabelece para o ato. 
O negócio jurídico, previsto no artigo 104 e ss. do CC/02, tem elementos 
essenciais previstos no próprio diploma (agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou 
não defesa em lei) e acidentais, relacionados com a eficácia, o modo, a condição e o 
termo do próprio negócio. É maculado, segundo o novel Diploma, pelos vícios de 
consentimento e sociais. 
Os de consentimento são o erro, o dolo, a coação, a lesão e o estado de 
perigo e os sociais são a simulação e a fraude contra terceiros. 
O erro é a distância entre a intenção e o gesto, está previsto nos artigos 
138/144 e deve ser substancial para macular o ato, posto que o acidental não vicia. 
O dolo é o erro a que foi levado o autor do ato por comportamento de 
outrem com intenção de prejudicar. Só vicia se o dolo for substancial, artigos 145/150, 
por ação ou omissão, próprio ou de terceiro. 
A coação é a vontade manifestada sob ameaça que força o conteúdo da 
declaração a qual, sem a existência, não seria externada. A ameaça deve ser séria e 
injusta, iminente e considerável, dirigida ao próprio declarante, bens ou familiares. 
Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de 
salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume 
obrigação excessivamente onerosa. 
Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por 
inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da 
prestação oposta. 
E, verifica-se a simulação quando o ato aparente encobre e disfarça uma 
declaração real de vontade ou que simula uma declaração que não se fez. Difere de 
33 
 
dissimular que é ocultar o que é. A simulação caracteriza-se pela conformidade entre as 
partes no fim de enganar. É conluio. 
34 
 
 
Título 04 
Fontes das Obrigações 
 
Se antes foi dito que a única fonte do direito real é a lei, tal premissa não se 
aplica as obrigações que, como veremos adiante, possui fonte legal e contratual. 
Fonte é origem, vertente, nascedouro. Ou seja, de onde nasce. 
Por isso, inexorável é sua análise. 
Roberto S. Lisboa cita que Gaio classificou as fontes das obrigações nos 
contratos e nos delitos. Por seu turno, diz que Justiniano estabeleceu como fonte o 
pagamento e, por conseqüência, as obrigações nascem de um contrato, de um quase-
contrato, de um delito ou de um quase-delito. 
Contrato é, grosso modo, um acordo de vontade das partes, como por 
exemplo a compra e venda, o que não acontece, contudo, em um contrato de adesão 
firmado, também por exemplo, para abertura de um crédito aditivo à conta corrente 
(limite), no qual a parte aderente não manifesta sua vontade, porém, subentende-se que 
esta aceitou o que estava estipulado. 
Quase-Contrato é um ato voluntário e lícito, porém unilateral, em que uma 
determinada pessoa gera obrigações sem a aquiescência da outra. Por exemplo a gestão 
de negócios, título ao portador, proposta com tempo certo no caso de venda de imóvel 
locado, promessa de recompensa. 
Delito entende-se por uma ação ilícita e intencional que gera danos a outra, 
decorrendo daí a obrigação da indenização. Ex. Furto. 
Quase-delito que é a ação ou omissão, ainda que não intencional, 
ocasionadora, por negligência, imprudência ou imperícia de quem a praticou, 
ocasionado danos reparáveis. Ex. Batida de Carro. 
Arnoldo Wald, por seu turno, elenca, seguindo as Institutas de Justiniano, 
como fontes das obrigações os Atos Jurídicos (os contratos e os quase contratos) e os 
Atos Ilícitos (os delitos e os quase delitos) além, é claro, da lei. Ultrapassada mostra-se 
35 
 
essa posição porque, segundo o disposto no artigo 186 do Código Civil vigente o Ato 
Ilícito está previsto, ou melhor, conceituado na Lei. 
A atual legislação prevê que são fontes de obrigações o negócio jurídico 
(mais amplo que o contrato), a declaração unilateral de vontade, o ato ilícito e a lei, 
sendo o negócio jurídico e a declaração unilateral de vontade fonte obrigacional 
voluntária e os demais, fonte obrigacional legal o que, segundo Roberto Lisboa, leva à 
conclusão de que são fontes, efetivamente, de obrigações, a vontade pessoal e a lei. 
Quando a transgressão se dá à um contrato ou quase-contrato diz-se de 
culpa contratual e quando se dá à um delito ou quase-delito, diz-se de culpa aquiliana. 
Por culpa aquiliana, pois, entende-se o dever de não transgredir preceitos 
não-contratuais de agressão a direito de outrem. A culpa, aqui, entende-se o dolo 
tradicional e a culpa propriamente dita, em sua mais ampla acepção da palavra. 
A doutrina civilista, ultimamente, tem agrupado as duas últimas fontes das 
obrigações (delito e quase-delito), nominando-as como "Atos Ilícitos", entendidos, de 
modo amplo, aquelas ações ou omissões que transgridem direitos de outrem, sejam 
estes objetivos (ordenamento jurídico) ou subjetivos (moral e bons costumes). 
Maria Helena Diniz, por sua vez, classifica como fontes obrigacionais os 
atos jurídicos de sentido estrito, os negócios jurídicos bilaterais e unilaterais e os atos 
ilícitos. 
Outras, e não menos importantes, fontes são citadas por Orlando Gomes e 
Washington de Barros Monteiro, dentre outros, à critério da corrente doutrinária de cada 
um. 
Todos, uníssonos, aduzem ser a fonte imediataa lei, pois é ela que 
efetivamente tutela todo e qualquer outro direito e, todas as demais fontes, são mediatas. 
Sílvio Rodrigues, divergindo um pouco, aduz que as obrigações sempre tem 
por fonte a lei, e as classifica pela fonte imediata a vontade humana e o ato ilícito e por 
fonte direta a lei. 
Já o Professor Fernando Noronha, o que penso ser a melhor e mais atual 
classificação, diz que a única fonte da obrigação é a Lei, tanto pela previsão nela inserta 
de que dali nasce uma obrigação imposta, como por exemplo o disposto no artigo 186, 
36 
 
quanto na sua omissão permissiva de que, no seu vazio normativo e observado o que ela 
(Lei) determina, uma obrigação possa existir. Ou seja, a lei determina ou possibilita a 
existência da obrigação. 
Tudo, segundo essa senda interpretativa, correta ademais, passa pelo 
positivado, ou seja, ou a Lei prevê a obrigação ou a Lei permita que ela exista. 
37 
 
 
Título 05 
Elementos Constitutivos das Obrigações 
 
Mas do que se compõe uma obrigação ? quais são os ingredientes dessa 
receita ? 
Quando nos reportamos à conceituação das obrigações antes mencionada (É 
o vínculo no qual alguém se compromete em dar, pagar, fazer ou não fazer determinada 
coisa em favor de outro. Este vínculo pode ser legal ou contratual) bem podemos ter 
presente a resposta do anterior questionamento. 
De tal conceito extrai-se, com facilidade, todos os elementos constitutivos 
das obrigações, a saber: Sujeitos, Vínculo Jurídico, Prestação ou Objeto. 
Por sujeitos, da conceituação antes mencionada, são o devedor e o credor. 
Por prestação ou objeto, endente-se o que será dado, pago, feito ou não feito. E o 
vínculo jurídico é a base da obrigação, podendo ser legal ou contratual. 
O vínculo assim o é porque vem acompanhado de uma sanção (implícita ou 
explícita), estipulada em lei ou contrato. Por exemplo, um devedor torna-se 
inadimplente, acarretando ao credor o direito de recorrer para a tutela do judiciário e, 
através da execução patrimonial, ver o crédito satisfeito. 
Na Roma antiga, era costume ao credor dar o direito sobre a pessoa do 
devedor, tornando-o escravo ou até levando-o para a morte. 
Hodiernamente, exclui-se a pessoa do devedor, passando a responder pela 
dívida o seu patrimônio. 
Transformou-se, como visto, o direito pessoal de crédito em direito real, 
onde quem responde pelo débito é o patrimônio do devedor e não a pessoa do mesmo. 
O devedor que descumpre sua obrigação se sujeita a ressarcir o dano 
causado e se não colabora para o adimplemento do débito vem o Judiciário e penhora 
tantos bens quantos sejam suficiente para, com o fruto da praça, quitar o débito (em 
regra, pelo penhor e hipoteca, em exceção a anticrese). 
38 
 
Verificam-se, pelo conteúdo da obrigação, dois elementos nítidos, como 
bem salienta Sílvio Rodrigues: a dívida, que é o dever que incumbe ao sujeito passivo 
de prestar aquilo a que se comprometeu; e a responsabilidade, representada pela 
prerrogativa conferida ao credor, uma vez verificada a inadimplência, de proceder na 
execução do patrimônio do devedor, para satisfazer o seu crédito, desobrigando o 
devedor e obrigando o patrimônio (de direito pessoal para direito real). 
Da dívida o devedor pode se esquivar, para tanto bastando descumprir sua 
obrigação, contudo da responsabilidade não há como. Quer dizer, isso é relativo, e 
impõe, para a concretização da assertiva que o devedor tenha patrimônio passível de 
suportar a carga da responsabilização. 
Processualistas sustentam que a dívida é de direito privado, enquanto 
restringe-se ao credor e devedor, enquanto que a responsabilidade é de direito público, 
posto que deve ser tutelada pelo Estado, através do judiciário, onde o credor buscará a 
tutela para satisfazer o seu crédito (direito processual civil - exemplo execução). 
Maria Helena Diniz bem leciona que o vínculo: 
“sujeita o devedor à realização de um ato positivo ou negativo no 
interesse do credor, unindo os dois sujeitos e abrangendo o dever da 
pessoa obrigada (debitum) e sua responsabilidade no caso de 
descumprimento (obligatio). Assim, na obrigação reúnem-se e se 
completam, constituindo uma unidade, o dever primário do sujeito 
passivo de satisfazer a prestação e o correlato direito do credor de 
exigir judicialmente o seu cumprimento, investindo contra seu 
patrimônio, visto que o mesmo fato gerador do débito produz a 
responsabilidade. 
Ainda na conceituação supra citada, podemos extrair a prestação ou objeto 
alvo do compromisso entre duas ou mais pessoas. 
É, simplificadamente, o dar, o pagar, o fazer ou não fazer alguma coisa, 
inserido no texto conceitual. É o objeto propriamente dito da obrigação, prestação 
positiva ou negativa do devedor, desde que lícita, possível física e juridicamente, 
determinada ou determinável e suscetível de estimação econômica (Maria Helena 
Diniz). 
Tem conteúdo patrimonial, tendo em vista que quem responde é o 
patrimônio, no caso de inadimplemento. 
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Sílvio Rodrigues, contudo, vai mais longe e alega ser direito real, pois: 
"O direito real, ligando uma coisa ao seu titular, permite que este 
a busque onde quer que se encontre, nas mãos de quem quer 
que, injustamente, a detenha, a fim de sobre ela exercer seu 
direito. O Credor Hipotecário, por exemplo, pode requerer a 
apreensão da coisa hipotecada, esteja ela com quem quer que 
esteja, para proceder à execução de seu crédito. A essa 
prerrogativa do titular do direito real, de perseguir a coisa até 
encontrá-la, chama-se de direito de seqüela e é peculiar a esse 
tipo de direito... " 
Salvo melhor juízo, e com a vênia merecida ao Mestre, mas equivocada 
mostra-se sua posição. 
Na verdade, o direito é obrigacional sim e a responsabilização, então 
incidente sobre o direito real do devedor culposo decorre justamente desse direito 
obrigacional. 
No exemplo citado o credor hipotecário o é em face de uma obrigação 
mutuaria que é a relação de crédito e débito e a hipoteca, como acessório, traduz-se em 
uma garantia real, como adiante estudaremos, do direito obrigacional, e não um direito 
real portanto. 
Ainda quanto a conceituação, retira-se duas figuras nitidamente distintas 
que se relacionam, aquele que assumiu o compromisso em fazer, não fazer, dar ou pagar 
e com que o outro assumiu o compromisso. Na ordem o Devedor e o Credor. Ainda, 
sujeitos Passivo e Ativo. 
Porém é preciso cautela na conceituação assodada. 
Se visto pelo prisma da conduta, o devedor do direito de crédito torna-se o 
sujeito ativo da conduta, ou seja, de quem se espera uma conduta de índole positiva ou 
negativa e vice-versa. 
Há uma limitação na vontade do devedor, tendo em vista que deve dar, fazer 
ou não fazer ou pagar alguma coisa em favor de outrem. 
Tal limitação existe em virtude da obrigação que o devedor assumiu, surgiu 
de sua vontade (contratação) ou de seu comportamento desastrado (atos ilícitos) ou 
ainda por imposição legal (lei). 
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Título 06 
Natureza Jurídica da Obrigação 
 
A obrigação tem por natureza jurídica uma relação jurídica patrimonial, 
seja tal relação de cunho contratual ou legal, em virtude da qual o devedor é vinculado à 
uma prestação de índole positiva, ou negativa em relação ao credor. 
Já o direito obrigacional, ou direito das obrigações ou direito de crédito, 
é o ramo da ciência jurídica, pontualmente do direito privado, através do qual se 
regulam tanto as formas, quanto as conseqüências do adimplemento e do 
inadimplemento de determinado dever de conduta (obrigação) seja de origem legal ou 
de próprio ato de vontade. 
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Título 07 
Constitucionalização das Relações Obrigacionais– dignidade da pessoa 
humana, despatrimonialização das relações jurídicas, repersonificação das 
relações obrigacionais e aspecto moral / extrapatrimonial das obrigações 
 
Roberto S. Lisboa, em seu Livro Manual de Direito Civil, vol. 02, nos 
convida à divagar sobre a transdiciplinariedade do direito obrigacional no quanto dá 
braços ao direito constitucional. 
Alude o Jurista que a referência legislativa constitucional está prevista no 
preâmbulo da Carta Magna e artigos 1, III, e 3, I e III. 
De fato, como bem menciona, o direito obrigacional está relacionado com o 
problema de pagamento de dívidas, sejam estas monetárias ou não, preocupando-se com 
a satisfação dos interesses de credor e devedor. No que tange ao primeiro, para que o 
Estado, mediante seu corpo legal, lhe dê guarida ao seu agir e, no que concerne ao 
devedor, preocupa-se o Estado com o fenômeno cada vez mais crescente do super-
endividamento, seja pela má-gestão dos recursos próprio ou pela elevada imputação de 
juros e técnicas bancárias que, usualmente, tornam impagáveis os débitos ali contraídos. 
Fundada originariamente na concepção de uma justiça retributiva, nos 
primórdios a obrigação subjugava o devedor inadimplente ou faltoso ao arbítrio do 
credor, que poderia dispor de sua pessoa como melhor lhe conviesse (Roberto Lisboa). 
Como visto, os tempos mudaram e, em decorrência dessa evolução temporal 
a própria sociedade mudou seus conceitos, relendo, alterando, reinterpretando o que, até 
então, lhe eram dogmas e por decorrência, seus hábitos e costumes e, assim, o próprio 
direito que lhe regula. 
A evolução chegou ao Código Civil de 2002, evoluindo para regular os 
direitos da personalidade e ao dispor sobre soluções judiciais ao entrave negocial 
privado, atentando-se ao princípio da boa-fé objetiva nos negócios jurídicos e a função 
social dos contratos. 
O liberalismo clássico imposto pelas elites e que desprestigia a proteção dos 
pobres, segundo a previsão constitucional, precisava de fato ser contido e disciplinado 
de forma a atender aos anseios da grande massa de hipossuficientes. 
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Tal alteração no corpo legislativo, de fato, não ocorreu de forma única e em 
dado momento da vida social. 
Ao contrário, é fruto do aprimoramento das relações e deriva, diretamente, 
do que Roberto Lisboa nomina de sociedade pós-industrial que é, sem dúvida, a 
sociedade da informação onde é cada dia mais crescente a massificação contratual 
mediante os contratos de adesão. 
Nesse sentido, veja-se as vendas virtuais, por exemplo. 
Tal situação obrigou o Estado a adoção de políticas públicas que busquem o 
equilíbrio dos negócios jurídicos em geral, introduzindo normas jurídicas de ordem 
pública e de interesse social que passaram a limitar a liberdade contratual e a 
predisposição dos conteúdos das avenças – conjunto de instrumentos principiológicos 
de redução das desigualdades sociais e busca da erradicação da pobreza – artigo 3, I e 
III, da CF/88. 
Anton Menger, apud Roberto Lisboa, reafirma que as bases do direito 
privado estão, de fato, na propriedade, na liberdade contratual e no direito hereditário. 
Marcos, assim, de uma sociedade liberal. 
Ocorre, e é verdade o que diz, que tem certas pessoas que tem condições de 
defender tais direitos e outras não e ai deve entrar o Estado com uma função retributiva 
para reequilibrar o direito. Esse é o norte. Esses são os princípios da Carta Política de 
1988. É assim que estão fundados os pilares da sociedade moderna. 
De fato não se pode permitir que o direito obrigacional seja utilizado como 
forma de humilhação pessoal ou de atentado aos direitos natos de personalidade. 
A inadimplência contratual, hoje, não pode mais ser analisada como caso 
isolado, mas antes como fato-fenômeno social, adotando-se maneiras de minorar os 
efeitos sobre credores e devedores em geral pois a derrocada não será unilateral, senão 
que da sociedade como um todo. 
Veja-se, nesse sentido, as crises econômicas que, de quando em vez, 
assolam este ou aquele País. Lembra-se do Efeito Tequila da Crise Mexicana, ou do 
Efeito Orloff da Crise Russa, ou do Quebra da Crise Imobiliária Americana de 2007 ? 
Pois é, estoura lá. Sente-se aqui. Essa é a nova ordem econômica, logo, um contrato não 
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vincula mais, tão somente A e B, mas todo o entorno que pode sofrer as conseqüências, 
ainda que indiretas, da contratação. 
Quando por exemplo também, se impede que determinada companhia de 
saneamento básico suste o fornecimento de água potável pelo inadimplemento pelo seu 
tomador de serviço da fatura vencida, na verdade não se está tutelando a inadimplência, 
mas sim afastando as conseqüências que serão suportadas pela coletividade ao ver que 
determinado ente social está privado de sanibilidade atingido, por decorrência, todo o 
entorno. 
Por isso dizer que os mecanismos previstos no direito obrigacional adotados 
pelo legislador de 2002, ou seja, pelo direito civil moderno devem ser adotados sob uma 
perspectiva protetiva da dignidade da pessoa humana inclusive, como salienta Roberto 
Lisboa, com o estabelecimento de um patrimônio mínimo ao cidadão, como forma de 
inserção digna do cidadão na sociedade, dando-lhe condições de subsistência como 
saúde, alimentação, educação e vestuário, direitos personalíssimos e não simples 
objetivos políticos. 
E, se feita análise de forma pormenorizada desta construção legal, 
deparamo-nos com dispositivos ou mesmo diplomas os quais dão início, antes mesmo 
do texto constitucional, à tal proteção, ou melhor, à repersonificação do direito civil. 
Veja-se o Instituto do Bem de Família, a lista dos bens impenhoráveis do 
CPC, em seu artigo 649, o Código de Defesa do Consumidor, dentre outros tantos. 
Todos estes dispositivos e diplomas, frutos da necessidade do restauro da 
primazia da pessoa sobre a propriedade, o estabelecimento de normas jurídicas que 
devam atender ao bem comum e aos reais destinatários da norma posto que o direito 
positivo deve ser construído mediante regras ao serviço das pessoas. 
A Carta Magna, em seus princípios, não somente consagrou a dignidade da 
pessoa humana. Foi mais além e estabeleceu como meta básica da sociedade brasileira a 
solidariedade social e a erradicação da pobreza. Assim, norteou o direito privado para a 
despatrimonialização do direito privado, colocando, como leciona Roberto Lisboa, a 
pessoa no centro da análise jurídica. 
Digamos Antropocentrismo Jurídico. 
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É importante afirmar que tal despatrimonialização não quer dizer 
desimportar a propriedade, pois o próprio texto constitucional, em vários dispositivos, 
consagrou também a importância da propriedade. A leitura correta é no sentido de que 
apenas assentou princípios de que o patrimônio não é a razão da relação jurídica, senão 
que a pessoa humana, dizendo que o vínculo de direito existe por causa das pessoas e 
não do patrimônio e em face delas é que deve criar, extinguir ou modificar-se direitos. 
Veja-se a razão do na própria construção do Código Civil de 2002 onde por 
primeiro tratam-se das pessoas e, tão somente após, do seu patrimônio. 
Logo, a repensar na personificação da relação jurídica, assim, traduz-se 
como o enobrecimento da pessoa como motivo da tutela do direito conduzindo a ratio 
de que a exigibilidade do cumprimento das obrigações pressupõe a abertura outorgada 
pelo sistema jurídico a fim de obter a satisfação do crédito sem sacrifícios do direitos 
extrapatrimonais vinculados à pessoa, como liberdade, por exemplo. 
É, de fato, a despatrimonialização das relações jurídicas em atenção ao 
princípio da função social dos institutos jurídicos, onde a aplicação das normas privadas 
deve observar, na sua

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