Prévia do material em texto
DIDÁTICA E METODOLOGIA DO ENSINO DA MÚSICA AULA 4 Prof. Flávio Denis Dias Veloso 2 CONVERSA INICIAL Esta aula concentra-se nas contribuições dos três educadores musicais que integram o período dos métodos instrumentais: o húngaro Zoltán Kodály (1882-1967) e sua proposta de ensino de música por meio do canto; o alemão Carl Orff (1895-1982) e seu olhar sensível às práticas instrumentais coletivas; e o japonês Shinichi Suzuki (1898-1998) e sua pretensão de formar indivíduos mais completos e felizes na música e pela música. Como complemento, apresentaremos algumas das propostas educativo- musicais do Sistema Orff-Wuytack, uma iniciativa que associa a produção de Carl Orff às contribuições do educador musical belga Jos Wuytack. TEMA 1 – ZOLTÁN KODÁLY (1882-1967): APRENDER MÚSICA CANTANDO Promover o enriquecimento da vida de forma humanizada e criativa por meio da arte musical é, segundo Fonterrada (2008), o objetivo central das proposições de Zoltán Kodály (1882-1967), um compositor e educador húngaro cujas contribuições ao ensino da música o posicionam entre os mais importantes pedagogo-musicais do século XX. Dois aspectos principais fundamentam a metodologia idealizada por esse autor: (1) o anseio de musicalizar as pessoas por meio das acessíveis1 práticas vocais – perspectiva que encontrou lugar na realidade brasileira pelas propostas educacionais de Heitor Villa-Lobos (1887- 1959) –; e (2) promover a alfabetização musical, desmistificando que a leitura musical é uma competência inalcançável (Silva, 2012). O objetivo de Kodály era “ensinar o espírito do canto a todas as pessoas, além da alfabetização musical para todos, trazendo a música para o cotidiano, nos lares e nas atividades de lazer, de modo a formar público para a música de concerto” (Silva, 2012, p. 56), sem perder de vista os valores nacionalistas e a identidade cultural do seu povo. Para Kodály, os programas de educação musical devem proporcionar às pessoas a vivência artístico-musical por meio da prática do canto e da alfabetização musical para todos os indivíduos. Do ponto de vista curricular, deve-se considerar o desenvolvimento de competências para a leitura e a escrita 1 Na perspectiva defendida por Kodály, “o uso da voz como ponto de partida para a musicalização permite que o ensino aconteça em grupo e possibilita a inclusão de participantes independentemente de seu poder aquisitivo, pois não há necessidade de adquirir um instrumento” (Silva, 2012, p. 66). 3 musical, a percepção auditivo-musical, as habilidades rítmicas e o canto. Segundo Fonterrada (2008, p. 157), nas proposições educacionais de Kodály, “a consciência e o sentido rítmico são desenvolvidos nas crianças por meio de movimentos e jogos, que auxiliam no reconhecimento e na compreensão sensorial” do ritmo. Evidenciam-se, desse modo, dois aspectos compartilhados por essa concepção metodológica com as demais pedagogias musicais ativas: o envolvimento integral do corpo nas experiências da ludicidade e de fazer e aprender música. Nessa visão, para desenvolver aspectos métricos e rítmicos (como a consciência de pulso, acento e organização rítmica), recomenda-se a realização de atividades que envolvam a gestualidade e o uso da voz, explorando recursos de improvisação. Como exemplo, “ao ouvir uma frase [rítmica], as crianças respondem criando suas próprias frases” Fonterrada (2008, p. 157). Embora possamos tratar de uma diferenciação entre a aprendizagem do ritmo e da melodia em um plano teórico, Kodály explica que, na prática: O ritmo não é ensinado separadamente da melodia, mas conjugado a ela; a experiência de vivenciar a melodia é tão estruturada quanto a do ritmo. Para Kodály, é importante desenvolver o hábito de entonação desde muito cedo [...]. O canto é baseado em modelos melódicos simples, que as crianças podem cantar, e provêm do repertório folclórico húngaro, geralmente construído sobre a escala pentatônica. (Fonterrada, 2008, p. 157) A respeito da iniciação ao solfejo, há dois aspectos fundamentais observados por Kodály. O primeiro é o fato de que as crianças comumente utilizam os intervalos de terça menor2 em suas improvisações (particularmente na forma descendente), indicando que assimilam com maior facilidade esse intervalo. O segundo aspecto é a importância de iniciar-se as práticas de canto em grupo pela escala pentatônica menor, passando, posteriormente, às escalas modais e, finalmente, às tonais. Nesse processo, assim como na aquisição de habilidades rítmicas, deve-se considerar procedimentos como o envolvimento integral do corpo, as atividades de imitação e os exercícios de improvisação. O aumento da dificuldade nas práticas de canto deve acontecer gradativamente, tanto em nível rítmico quanto melódico, a exemplo do “acréscimo de novas alturas ao solfejo, alternância entre modo maior e menor, ou aumento na distância intervalar entre as alturas” (Silva, 2012, p. 67). 2 Intervalos de terça que conservam a distância de um tom e meio, por exemplo: Lá-Dó; Si-Ré; Ré-Fá; Mi-Sol. 4 Como vimos nesse breve resumo da vasta produção de Kodály e seus colaboradores, as inquietações desse educador musical o levaram a preocupar- se com a qualidade das práticas musicais voltadas à musicalização (especialmente por meio da voz), com a acessibilidade aos processos de alfabetização musical e à formação de indivíduos mais conscientes da função e do valor de suas realizações musicais. “Segundo ele [Kodály] ‘a música pertence a todos, e uma correta educação musical oferece os meios para apreciá-la e desfrutá-la’” (Silva, 2012, p. 68), na perspectiva de quem produz ou contempla essa arte. As considerações aqui realizadas não findam o amplo aporte teórico- prático e filosófico que compõe a pedagogia musical proposta por Zoltán Kodály e seus colaboradores. Realizamos uma síntese com foco em alguns dos principais elementos dessa perspectiva educativo-musical. Para um aprofundamento, é imprescindível a consulta ao livro-base desta disciplina. Leitura complementar Leia o Capítulo 2 “Zoltán Kodály – alfabetização e habilidades musicais” (p. 55-88), de Walênia Marília Silva, autora de Pedagogias em Educação Musical. TEMA 2 – A PROPOSTA PEDAGÓGICA DE KODÁLY: UMA ABORDAGEM PRÁTICA Vimos anteriormente que o ensino da música na perspectiva defendida por Kodály é fortemente apoiado nas práticas vocais coletivas e no solfejo, partindo da escala pentatônica3 para, posteriormente, integrar as escalas modais e tonais. Em termos de procedimentos didático-pedagógicos, destacam-se as iniciativas dos métodos precursores (apresentadas anteriormente) – com ênfase à tônica-solfa e à silabação rítmica – e, de caráter relativamente original, a abordagem da manossolfa – uma sequência de gestos manuais utilizada na aprendizagem de alturas. Na manossolfa, cada altura (isto é, as notas musicais: Dó, Ré, Mi, Fé, Sol, Lá e Si) “possui um gesto correspondente; cada gesto deve ser feito pelo 3 A escala pentatônica possui cinco notas. A pentatônica menor é originada da diatônica menor incompleta (na qual faltam os graus II e VI). Como exemplo, vamos pensar na pentatônica menor de Lá, temos: Lá – (Si) – Dó – Ré – Mi – (Fá) – SOL. 5 professor”, podendo, ainda, ser realizada pelos “alunos ao cantarem a altura correspondente” (Silva, 2012, p. 73). Essa abordagem consiste em um solfejo gestual que auxilia na visualização das relações, direções e sensações intervalares, oferece suporte à memória, fomenta a educação auditivo-musical, entre outros benefícios. Desse modo, além de oportunizar a prática do solfejo sem a necessidade da partitura, a manossolfa “torna o solfejo visualmente concreto,um fator importante na aprendizagem de iniciantes em música. Ela reforça a sensação intervalar, auxilia na visualização espacial da direção sonora (agudo-grave/grave-agudo) e na relação entre as alturas cantadas” (Silva, 2012, p. 73). Figura 1 – Sinais da manossolfa Fonte: Adaptado de Silva, 2012, p. 74. Os gestos são feitos em movimento vertical à frente do corpo, onde as alturas são apresentadas no sentido grave (embaixo) e agudo (em cima), subindo e descendo e simulando a distância intervalar entre cada uma das alturas cantadas [...]. A velocidade de movimentação da(s) mão(s) na manossolfa indica a duração das notas cantadas (o ritmo). (Silva, 2012, p. 75, grifo do autor) TEMA 3 – CARL ORFF (1895-1982): AS PRÁTICAS INSTRUMENTAIS COLETIVAS EM FOCO O ensino da música deve valorizar a integração entre as artes e focalizar os aspectos rítmicos da experiência musical por meio de iniciativas como a improvisação e a ênfase no movimento. Esses pressupostos – semelhantes às ideias do pioneiro Jaques-Dalcroze – representam os fundamentos da proposta de educação musical pensada pelo compositor e educador alemão Carl Orff (1895-1982). Entre os contributos centrais da proposta desse autor, destaca-se 6 o desenvolvimento do instrumental Orff, um conjunto de instrumentos (com ênfase nos instrumentos de pequena percussão e de teclas percussivas) que focaliza a iniciação musical pela prática instrumental. Figura 2 – Exposição parcial do instrumental Orff: teclas (xilofones e metalofones), membranas e demais instrumentos de pequena percussão Crédito: Vereshchagin Dmitry/Shutterstock Outro aspecto fundamental à metodologia Orff é o conceito de música elementar, isto é, o repertório com o potencial para o desenvolvimento infantil (repertório que faz parte do universo das crianças), envolvendo as práticas corporais (gesto e voz), a ludicidade e a ênfase nos aspectos rítmicos (Bourscheidt, 2007). Em Bona (2012), compreendemos que a música elementar congrega quatro dimensões de relevância para a aprendizagem musical: a linguagem, a música, o movimento e a improvisação. No que concerne à iniciação musical, em termos procedimentais, Orff recomenda o trabalho com breves trechos rítmicos e pequenas melodias “simples e facilmente assimiláveis pelas crianças” (Fonterrada, 2008, p. 161), sem que os exercícios propostos percam o caráter substancial ou estejam alheios à finalidade central da musicalização: oferecer ricas experiências musicais que possibilitem uma formação para a música e por meio dela. Nesse sentido, Fonterrada (2008, p. 161) complementa que as recomendações de Orff 7 e seus colaboradores, no tocante aos materiais musicais e pedagógicos, partiam “de cantilenas, rimas e parlendas, assim como dos mais diversos jogos infantis que faziam parte do vocabulário sonoro infantil”. Além disso, é importante frisar que a abordagem de Orff apoia-se fortemente na improvisação (especialmente com ostinatos4) com base nas escalas pentatônicas. A escala pentatônica favorece a realização de atividades de improvisação por não estar subordinada às relações de tensão e relaxamento (dissonância e consonância) do sistema tonal. Desse modo, pode-se explorar livremente melodias e harmonias sem receios quanto à presença excessiva de dissonâncias. Diferentemente de Kodály (que focaliza inicialmente a escala pentatônica menor), Orff recomenda o uso da pentatônica maior, originada das escalas diatônicas maiores sem os graus IV e VII (por exemplo: Dó – Ré – Mi – (Fá) – Sol – Lá – (Si). Em complemento, além das atividades de improvisação, destaca-se o “importante papel das atividades de eco (repetir [imitar] o que se ouviu) e pergunta e resposta (improvisar um segmento musical depois de ouvido um estímulo)” (Fonterrada, 2008, p. 161). A partir do material básico, as crianças são levadas a tocar desde o início, nos grandes conjuntos de instrumentos Orff, o que as faz imergir numa sonoridade poderosa, que as motiva a executar música em grupo desde os primeiros estágios. Embora a abordagem siga estruturas musicais muito bem definidas, paulatinamente oferecidas às crianças, elas se confrontam muito mais estreitamente com a expressão do que com o aprendizado de regras. Se essas regras existem, são estruturais na composição das obras musicais, não são enfatizadas às crianças além do necessário. É de grande auxílio o instrumental Orff, especialmente pensado para o fim educacional a que se destina [...]. (Fonterrada, 2008, p. 162) As considerações aqui realizadas não findam o amplo aporte teórico- prático e filosófico que compõe a pedagogia musical proposta por Carll Orff e seus colaboradores. Realizamos apenas uma síntese com foco em alguns dos principais elementos dessa perspectiva. Leitura complementar Leia o Capítulo 4 “Carl Orff – um compositor em cena” (p. 125-156), de Melita Bona, autora do livro Pedagogias em Educação Musical. 4 Os ostinatos consistem em “figurações rítmicas ou melódicas repetidas, sobre as quais se pode improvisar vocalmente ou ao instrumento” (Fonterrada, 2012, p. 161). 8 TEMA 4 – A PROPOSTA DE ORFF E AS INFLUÊNCIAS DE JOS WUYTACK (1935-): UMA ABORDAGEM PRÁTICA A expansão da pedagogia Orff foi possível graças à atuação de educadores e colaboradores, entre os quais se destaca o belga Jos Wuytack. Esse movimento deu origem ao chamado Sistema Orff-Wuytack, que concebe as experiências musicais como a junção “de três formas de expressão: a musical, a verbal e a corporal”, à luz dos princípios da atividade, da comunidade e da criatividade. Com base em Bomfim (2012), podemos inferir que a centralidade desse sistema (do ponto de vista prático) reside nas “atividades de eco/imitação”, nos exercícios de “pergunta e resposta” (em uma espécie de diálogo musical), na “utilização de ostinatos” e no exercício de “exploração sonora” no âmbito da improvisação. É importante que essas atividades sejam orientadas pelo professor, que deve reforçar aspectos melódicos e rítmicos das canções (executando-as com os alunos), acompanhando a prática vocal harmonicamente (com o uso do violão, por exemplo). Sob a perspectiva do sistema Orff-Wuytack, “o fazer musical não está apenas vinculado à música, mas também à fala e ao movimento” (Bourscheidt, 2007, p. 11). Nessa visão, o ritmo assume papel central, sem desmerecer a relevância da melodia, estando ambos os elementos musicais vinculados ao corpo: o ritmo, ao movimento; a melodia, à fala. A referida abordagem salienta a relevância da improvisação, especialmente por meio de atividades de imitação, pergunta e resposta (diálogo musical) e improvisação dirigida (orientada por regras que caracterizam uma atividade ou jogo). Em termos de material musical, destaca-se o uso de ostinados (rítmicos ou melódicos) e da escala pentatônica, em consonância com as metodologias já apresentadas (Bomfim, 2012). A seguir, veremos alguns exemplos práticos do sistema Orff-Wuytack – extraídos de Veloso (2019, no prelo) –, que contemplam particularmente atividades de pergunta e resposta e o uso de ostinatos envolvendo a percussão corporal. 9 4.1 Atividades de pergunta e resposta Crédito: Speedkingz/Shutterstock. Partindo de um diálogo musical, é possível realizar uma atividade com foco na exploração de contraentes entre parâmetros sonoros (sons agudos e graves, fortes e fracos, longos e curtos, por exemplo). Trabalhando com dois grupos de alunos, podemos especificar os limites da improvisação (em termos de compassos ou alguma outra delimitação temporal), deixando clara a duração de cada intervenção improvisatória. A ideia é que a realização sonoro-musical de um grupo A (com base no uso do corpo e demais recursos sonoros) crie demanda para uma resposta de um grupo B, que deve explorar sons contrastantes comas inflexões musicais do primeiro grupo. Note que essa proposta resgata aspectos do jogo (atividade lúdica), em uma espécie de brincadeira sonora guiada pela improvisação musical. 4.2 O uso de ostinatos envolvendo a percussão corporal As atividades (especialmente de improvisação), baseadas no uso de ostinatos, podem ser introduzidas por meio da percussão corporal. Para exemplificar, podemos considerar o trabalho com canções folclóricas brasileiras (a exemplo do Samba-lelê ou Peixinhos do mar), orientado pelo uso de ostinatos rítmicos em diferentes níveis de complexidade que acompanham as realizações vocais. Como sugestão, considere as referências percussivo-corporais apontadas no Quadro 1. 10 Quadro 1 – Exemplos de ostinatos ritmícos Alturas Sons agudos Médios e agudos Médios e graves Graves Relação com a percussão corporal Estalar os dedos; tocar com os dedos indicador e médio na palma da mão Bater palmas (com a mão côncava ou aberta – espalmada) Tocar com as mãos no peito, barriga, coxa ou joelho Tocar com os pés no chão (explorando diferentes superfícies) Vídeos Assista aos vídeos Samba-lelê e Peixinhos do mar do Grupo Barbatuques, disponíveis em: e . As considerações aqui realizadas não resumem o aporte teórico-prático do sistema Orff-Wuytack, tampouco dão conta das amplas contribuições oferecidas por Jos Wuytack. Leitura complementar Leia o Capítulo 10: “Jos Wuytack – a pedagogia musical ativa” (p. 305- 342), do livro Pedagogias em Educação Musical, de Graça Boal Palheiros e Luís Bourscheidt. TEMA 5 – SHINICHI SUZUKI (1898-1998): POR UMA FORMAÇÃO GLOBAL POR MEIO DA ARTE MUSICAL “Toda criança, potencialmente, tem capacidade para aprender música, do mesmo modo que para aprender a falar a língua de seu país – sua língua mãe” (Suzuki citado por Fonterrada, 2008, p. 165). Foi apoiado nessa premissa – acreditando que o desenvolvimento dos indivíduos depende das influências do meio no qual se insere – que o japonês Shinichi Suzuki desenvolveu suas propostas para o ensino de música. Outros pontos de interesse de Suzuki são: a valorização da ludicidade e das particularidades do universo infantil; a centralidade do suporte parental na criação de ambientes estimuladores para a aprendizagem musical; a aquisição progressiva de habilidades; a imersão musical para a constituição de referenciais auditivos; o estímulo à memorização (por meio da prática de “tocar de ouvido”); entre outros. “O objetivo do método 11 não é formar instrumentistas, mas seres humanos completos e felizes, com o auxílio da arte” (Suzuki, citado por Fonterrada, 2008, p. 171). Vídeo Assista ao vídeo “Shinobu Saito – Compasso virtual”, do canal Oficinas culturais do estado de São Paulo, cujo tema é o método Suzuki, sua ideia geral e funcionamento, disponível em: . Segundo Ilari (2012, p. 197), “Suzuki define o desenvolvimento musical através da Educação do talento5 em dez passos”, a saber: (1) a figura materna deve oferecer orientação musical; (2) as habilidades aprendidas devem ser repetidas; (3) deve haver a exposição a modelos auditivos (contato direto com repertórios e práticas); (4) a figura materna deve atuar como um modelo visual (tocando o instrumento para o filho); (5) a criança deve imitar os comportamentos musicais da mãe (aprendizagem observacional); (6) o aprendiz deve desenvolver habilidades motoras para empreender as imitações; (7) a criança deve fazer uso da inteligência (e demais componentes cognitivos) para realizar as imitações; (8) o que se aprende por imitação deve ser memorizado (permitindo a autonomia da partitura); (9) os aprendizes devem ter conhecimento quanto ao significado, função e valor da aprendizagem musical; (10) deve haver oportunidades para a imersão na dimensão emocional da experiência musical. Em síntese, a metodologia Suzuki destaca aspectos ambientais e contextuais (frisando a importância dos estímulos musicais, especialmente no ambiente familiar), aspectos psicológicos e cognitivos (atenção, consciência, memória, modelação comportamental – e imitação –, motivação e emoção); e aspectos comportamentais (como o desenvolvimento de competências motoras, a repetição e as experiências musicais diretas). É importante frisar que essas considerações não findam o aporte teórico- prático da pedagogia Suzuki. Leitura complementar Leia o Capítulo 6 “Shinichi Suzuki: a educação do talento” (p. 185-218), por Beatriz Ilari, no livro-base da disciplina – Pedagogias em Educação Musical. 5 O termo educação do talento remete ao cerne do posicionamento filosófico da metodologia Suzuki, a qual concebe o “talento como sendo um produto cultural”, e não como uma propriedade exclusivamente inata à natureza humana (Ilari, 2012, p. 196). 12 NA PRÁTICA Para exercitar alguns dos princípios apresentados nesta aula, recomendamos o retorno ao Tema 2, mais especificamente à proposta da manossolfa, postulada por Zoltán Kodály. Reúna um grupo de pessoas do seu círculo de convívio (familiares e amigos) e experimente orientar uma atividade de solfejo com base nos princípios gestuais da manossolfa (consulte-os na Figura 1). Inicialmente, revise com seu amigos e familiares o nome das notas musicais e, com a ajuda de um teclado (na ausência do instrumento, utilize um aplicativo para celular), trabalhe a entoação das notas Dó, Ré e Mi, reforçando as diferenças de altura. Na sequência, apresente os gestos característicos para cada nota e certifique-se que estão memorizados por todos. Inicie a condução da atividade privilegiando notas longas (poucas variações rítmicas); criando melodias em grau conjunto; trabalhando inicialmente com as notas Dó e Ré, posteriormente com Ré e Mi, e, por fim, variando entre as três alturas. À medida que a atividade avançar, inclua as demais notas da escala pentatônica. Os participantes também podem ser convidados a realizar a regência do solfejo por meio da manossolfa, assumindo a condução da atividade. Essa atividade pode (e deve) tornar-se um momento descontraído e motivador de prática e da aprendizagem musical. FINALIZANDO Para resumir nossa incursão pedagógico-musical pela primeira geração de métodos ativos (como visto anteriormente), podemos recorrer a Penna (2012, p. 17), que esclarece que “todos esses métodos [precursores, ativos e instrumentais] configuram proposta de ‘como desenvolver uma prática de educação musical’, estruturando-se sobre princípios, finalidades e orientações gerais explicitados em maior ou menor grau”. Segundo a autora, essas propostas educativo-musicais são uma síntese para os achados de diferentes estudiosos da educação musical, elas são fruto de prática educacionais extensivas e do questionamento “como ensinar música?”. Embora a relevância de tais contribuições seja inegável, sabemos que todas essas metodologias – de Dalcroze a Suzuki – não esgotam as possibilidades (tampouco as necessidades) da educação musical enquanto campo do conhecimento. Portanto, em breve 13 voltaremos nosso olhar à segunda geração para compreender suas inquietações e suas valorosas contribuições diante dos inúmeros desafios da contemporaneidade. 14 REFERÊNCIAS BOMFIM, C. C. Pensadores do início do século XX: breve panorama. In: JORDÃO, G. et al. (Org.). A música na escola. São Paulo: Alucci & Associados Comunicações, 2012. p. 82-84. BONA, M. Carl Orff: um compositor em cena. In: MATEIRO, T.; ILARI, B (Org.). Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibpex, 2012. p.125-155. BOURSCHEIDT, L. Música elementar para crianças: arranjos de canções infantis brasileiras para instrumentos Orff. Curitiba: DEARTES-UFPR,2007. FONTERRADA, M. T. O. De tramas e fios: um ensaio sobre música e educação. 2.ed. São Paulo: UNESP, 2008. ILARI, B. Shinichi Suzuki: a educação do talento. In: MATEIRO, T.; ILARI, B (Org.). Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibpex, 2012. p. 185-218. PENNA, M. A função dos métodos e o papel do professor: em questão, “como ensinar música”. In: MATEIRO, T.; ILARI, B (Org.). Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibpex, 2012. p. 13-24. SILVA, W. M. Zoltán Kodály: alfabetização e habilidades musicais. In: MATEIRO, T.; ILARI, B (Org.). Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibpex, 2012. p. 55-88.