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Neurocisticercose (NCC) 
1. Introdução e Importância 
A Neurocisticercose (NCC) é a infecção do Sistema Nervoso Central (SNC) pelas larvas 
(cisticercos) do cestódeo Taenia solium (a tênia do porco). É a principal causa de 
epilepsia adquirida em adultos em países endêmicos e uma doença de grande 
impacto na saúde pública devido à sua significante morbidade neurológica. 
2. Epidemiologia 
• Distribuição Geográfica: Endêmica em regiões da América Latina (incluindo 
Brasil), África Subsaariana, Sudeste Asiático e partes da Índia e China. A 
transmissão ocorre mundialmente, incluindo países desenvolvidos, devido à 
migração e viagens. 
• Prevalência: Estima-se que milhares de mortes anuais sejam atribuídas à NCC e 
que milhões de pessoas estejam infectadas, sendo uma doença 
negligenciada fortemente associada à pobreza. 
• Transmissão: A NCC é uma doença fecal-oral. O homem adquire a NCC 
pela ingestão acidental de ovos de T. solium presentes em: 
o Alimentos (verduras, frutas) ou água contaminada com fezes humanas. 
o Mãos contaminadas de um portador da tênia adulta intestinal (auto-
infecção ou hetero-infecção). 
3. Ciclo Biológico Relacionado à NCC 
É crucial entender que a NCC é um acidente de percurso no ciclo normal da Taenia 
solium. 
1. Hospedeiro Definitivo: Humano (portador da tênia adulta no intestino 
- Teníase). 
2. Eliminação: O portador da tênia elimina proglotes grávidas (cheias de ovos) nas 
fezes. 
3. Contaminação: Ovos liberados no ambiente contaminam água, solo e 
alimentos. 
4. Hospedeiro Intermediário (HI) Natural: O porco ingere os ovos e desenvolve 
cisticercos em seus músculos. 
5. Hospedeiro Intermediário Acidental (Homem): O homem ingere os ovos (não 
a larva da carne) e assume o papel de HI. No intestino, o ovo libera 
a oncosfera (embrião hexacanto), que penetra a parede intestinal, cai na 
corrente sanguínea e se dissemina. 
6. Localização no SNC: As oncosferas se alojam preferencialmente no parênquima 
cerebral, espaço subaracnóideo, ventrículos ou medula espinhal, onde se 
desenvolvem para a forma larval infectante, o cisticerco. 
4. Fatores de Risco 
• Residir em ou visitar área endêmica. 
• Contato domiciliar com um portador da tênia intestinal (Taenia solium) - é o 
principal fator de risco. 
• Baixas condições de saneamento básico e higiene pessoal. 
• Utilização de fezes humanas como adubo. 
5. Fisiopatologia 
Os sintomas da NCC não são causados pelo parasita vivo, mas pela resposta 
inflamatória do hospedeiro à sua presença e, principalmente, à sua degeneração. 
1. Fase Vesicular: O cisticerco vivo é um organismo encapsulado que secreta 
produtos que modulam a resposta imune do hospedeiro (fase de tolerância 
imunológica). Geralmente é assintomático. 
2. Fase de Coloidal: O cisticerco começa a degenerar e morrer. Sua membrana 
torna-se permeável, liberando antígenos parasíticos. Isso desencadeia 
uma forte reação inflamatória (edema, infiltrado de linfócitos, eosinófilos e 
plasmócitos) ao redor do cisto. É a fase mais sintomática (epilepsia, cefaleia). 
3. Fase Nodular-Granular: O cisto encolhe e a cápsula fibrosa engrossa. A 
inflamação persiste, mas diminui. 
4. Fase Calcificada: O cisto morto calcifica completamente. A reação inflamatória 
pode continuar de forma intermitente, e os focos de calcificação servem 
como foco epiléptico crônico. 
A localização e o número de cistos determinam a gravidade: 
• Parênquima Cerebral: Crises epilépticas, cefaleia. 
• Espaço Subaracnóideo: Pode causar meningite basilar crônica, hidrocefalia 
comunicante e vasculite com infarto cerebral. 
• Ventrículos: Pode obstruir o fluxo do líquido cefalorraquidiano (LCR), 
causando hidrocefalia obstrutiva aguda (síndrome de hipertensão 
intracraniana). 
• Medula Espinhal: Déficits motores e sensitivos. 
6. Manifestações Clínicas 
A NCC é notória pela sua heterogeneidade clínica. Pode ser assintomática ou se 
apresentar com: 
• Crises Epilépticas (a manifestação mais comum): Principalmente crises parciais 
simples ou complexas e crises tônico-clônicas generalizadas. 
• Cefaleia Crônica: Muito frequente. 
• Hidrocefalia: Decorrente de ventriculite ou cistos intraventriculares, levando a 
vômitos, papiledema e alteração do nível de consciência. 
• Déficits Neurológicos Focais: Hemiparesia, distúrbios visuais, disartria (devido a 
cistos únicos ou vasculite). 
• Distúrbios Psiquiátricos: Demência, alterações de personalidade, psicose (em 
casos crônicos com múltiplos cistos). 
• Meningite Crônica: Quando há inflamação das meninges da base do crânio. 
7. Diagnóstico 
O diagnóstico é complexo e baseado em uma tríade: quadro clínico sugestivo, achados 
de imagem e testes sorológicos. 
• Neuroimagem (Padrão-Ouro): 
o Ressonância Magnética (RNM): Melhor método. Mostra cistos em 
todas as fases (vesiculares, coloidais, nodulares), edema perilesional, 
inflamação meningea e lesões intraventriculares. 
o Tomografia Computadorizada (TC): Excelente para 
detectar calcificações (fase inativa) e hidrocefalia. 
• Sorologia: 
o Western Blot (EITB) no Líquor ou Soro: Altamente específico para 
detectar anticorpos. Útil para confirmar o diagnóstico, mas pode ser 
negativo em casos com cisto único ou calcificado. 
o ELISA: Menos específico (reação cruzada com outras helmintoses). 
• Exame do Líquor (LCR): Pode mostrar pleocitose linfomononuclear, eosinofilia, 
hipoglicorraquia e hiperproteinorraquia, especialmente nas formas 
subaracnóideas. 
• História Epidemiológica: Contato com área endêmica. 
8. Tratamento 
O manejo é complexo e deve ser individualizado, preferencialmente por neurologista. 
Nem todo cisto deve ser tratado com antiparasitários. 
• Antiparasitários: 
o Albendazol (15 mg/kg/dia, por 8-30 dias) - droga de escolha. 
o Praziquantel (50-100 mg/kg/dia, por 15-30 dias). 
o Sempre associado a corticosteroides (ex.: Dexametasona) para 
controlar a inflamação cerebral e o edema provocado pela morte dos 
cistos. 
• Corticosteroides: Fundamentais para minimizar a resposta inflamatória. Usados 
antes, durante e após o tratamento antiparasitário. 
• Antiepilépticos: Para controle das crises epilépticas, muitas vezes por tempo 
prolongado. 
• Cirurgia: 
o Derivação Ventriculoperitoneal (VP Shunt): Para tratamento da 
hidrocefalia. 
o Exérese Cirúrgica: Para cistos intraventriculares únicos, grandes ou que 
causam obstrução. 
o Neuroendoscopia: Para remoção de cistos ventriculares. 
• Conduta Expectante: Para cistos calcificados inativos (apenas controle de 
sintomas, como epilepsia) ou para cistos vesiculares únicos e assintomáticos. 
9. Prevenção 
A prevenção da NCC é a prevenção da teníase por T. solium: 
• Inspeção veterinária da carne suína. 
• Cozimento adequado da carne de porco (>60-70°C). 
• Saneamento básico (tratamento de esgoto). 
• Educação em saúde e higiene pessoal (lavagem das mãos). 
• Identificação e tratamento dos portadores da tênia intestinal (quebra do ciclo).

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