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FARMACOTÉCNICA E TECNOLOGIA DE MEDICAMENTOS LÍQUIDOS E SEMISSÓLIDOS Identificação interna do documento Boas práticas na produção industrial de medicamentos Marcella Gabrielle Mendes Machado ]OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: > Descrever os aspectos relacionados à fabricação de medicamentos. > Formular procedimentos operacionais padrão da indústria farmacêutica. > Estabelecer boas práticas de fabricação de medicamentos. Introdução O processo de fabricação de medicamentos envolve as etapas de aquisição de matérias-primas, produção, liberação, armazenamento e expedição de produtos Identificação interna do documento acabados. Durante o processo de fabricação, são observados procedimentos operacionais padrão com instruções sequenciais para a realização de deter- minadas operações. As preparações industriais devem ser submetidas a um rigoroso controle de qualidade antes de serem liberadas para uso, distribuição e comercialização. A indústria farmacêutica deve seguir os requisitos mínimos de acordo com as Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos a fim de fornecer produtos seguros, eficazes e de qualidade. Neste capítulo, você vai conhecer as Boas Práticas de Fabricação de Me- dicamentos que devem ser atendidas pelas indústrias farmacêuticas, com base nas Resoluções RDC nº. 658/2022 e RDC nº. 430/2020. Além disso, você vai compreender como devem ser formulados os procedimentos operacionais padrão utilizados na indústria farmacêutica e em quais situações eles devem ser elaborados. Fabricação de medicamentos O início do processo de fabricação de medicamentos em escala industrial foi marcado pela descoberta da salicilina, ou ácido salicílico, extraída da casca do salgueiro-branco (Salix alba), por Raffaele Piria em 1829. Esse composto atraiu grande interesse devido à sua atividade analgésica e antitérmica, o que levou, em 1897, a indústria farmacêutica alemã Bayer a realizar a síntese do ácido acetilsalicílico (Aspirina®) a partir de uma modificação estrutural no ácido salicílico, sendo este o primeiro fármaco sintético da história da indústria farmacêutica (WANCZINSKI et al., 2016). No Brasil, a indústria farmacêutica se originou e começou a evoluir entre os anos 1890 e 1950, impulsionada pela necessidade de mudar o quadro sani- tário nacional decadente e pela prevalência de doenças infectocontagiosas. Atualmente, somente em relação ao mercado de medicamentos genéricos, existem no Brasil 133 empresas fabricantes. Em 2019, os medicamentos ge- néricos corresponderam à 34,37% das vendas nacionais, foram responsáveis por mais de 3,7 mil registros de medicamentos e geraram um faturamento de aproximadamente 9,8 bilhões de reais em preço pago pela farmácia (PPP) (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS INDÚSTRIAS DE MEDICAMENTOS GENÉRICOS, [201-?]). No país, as indústrias farmacêuticas devem atender aos requisitos das Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos. Com o intuito de alinhar a regulamentação nacional com os guias adotados pelo Esquema de Coope- ração em Inspeção Farmacêutica (Pharmaceutical Inspection Co-operation Boas práticas na produção industrial de medicamentos2 Identificação interna do documento Scheme — PIC/S), a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou a Resolução RDC nº. 301, de 21 de agosto de 2019 (BRASIL, 2019a), atualizada pela RDC 658/2022 (BRASIL, 2022) que dispõe sobre as diretrizes gerais de Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos. Essa adesão do Brasil ao PIC/s contribui para uma melhor imagem, além do aumento da qualidade, dos medi- camentos produzidos no país, o que permite um aumento da competitividade dos produtos nacionais nos mercados internacionais. É importante distinguir as diferenças dos processos de manipulação e fabricação de medicamentos. A manipulação de medicamentos visa atender de forma individualizada a necessidade do paciente. Com isso, tem-se a obtenção de um produto manipulado obtido mediante procedimento farmacotécnico como o resultado de uma prescrição. De acordo com Thompson e Davidow (2013, p. 157), a fabricação pode ser definida como: [...] Produção, preparação, propagação, conversão ou processamento de um me- dicamento ou correlato, direta ou indiretamente, por extração das substâncias de origem natural ou por meio de síntese química ou biológica. A fabricação inclui o acondicionamento ou reacondicionamento de um medicamento ou correlato, a rotulagem ou nova rotulagem do recipiente de um medicamento ou correlato, para revenda por farmácias, médicos ou outras pessoas. Segundo o artigo 3º, inciso XXI, da RDC nº. 658/2022 da Anvisa, a fabricação é definida como “[...] todas as operações envolvidas no preparo de determinado medicamento, incluindo a aquisição de materiais, pro- dução, controle de qualidade, liberação, armazenamento, expedição de produtos acabados e os controles relacionados” (BRASIL, 2022, documento on-line). A fabricação de qualquer medicamento depende da produção de fármacos, os quais são os responsáveis pela ação farmacológica no organismo, por conterem o princípio ativo do medicamento. Os fármacos também podem ser chamados de insumos farmacêuticos ativos. Normalmente, os fármacos são desenvolvidos na matriz das multinacionais e fabricados em grande escala nas filiais espalhadas em diversos países. Segundo dados de associações da indústria, o Brasil importa cerca de 90% dos fármacos que são necessários para a indústria farmacêutica nacional, tendo empresas chinesas, norte- -americanas e alemãs como as principais fornecedoras (FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DO PARANÁ, 2019). Boas práticas na produção industrial de medicamentos 3 Identificação interna do documento Além do fármaco, um medicamento é composto por excipientes, que, de acordo com Thompson e Davidow (2013), são componentes inativos da formulação, como edulcorantes, conservantes, aglutinantes de comprimidos, entre outros. Os excipientes garantem a eficácia dos fármacos, ao propor- cionar características importantes para a formulação e consequentemente obtenção do efeito terapêutico. A aquisição de matérias-primas (como insumos farmacêuticos ativos e excipientes) deve ser supervisionada pelo profissional farmacêutico respon- sável, que deve educar os fornecedores quanto aos critérios de qualidade, assegurando que todas as matérias-primas entregues sejam acompanhadas do certificado de análise emitido pelo fabricante/fornecedor. As especifica- ções técnicas para as matérias-primas devem conter: matéria-prima referida segundo a denominação comum brasileira (DCB ) ou, na sua ausência, segundo a denominação comum internacional (DCI); ensaios de qualidade realizados e as metodologias de análise; limites de aceitação quantitativos e qualitativos; condições de armazenamento; e demais precauções. Para insumos farmacêuti- cos ativos e adjuvantes, deve-se informar a referência de monografia nacional ou de compêndios internacionais reconhecidos pela Anvisa. A qualidade das matérias-primas é avaliada pela análise do seu laudo técnico, no momento do recebimento, devendo os fabricantes de produtos acabados realizar quaisquer testes de matérias-primas descritos no dossiê de registro. Para a fabricação, somente devem ser utilizadas matérias-primas que tiverem sido liberadas pelo departamento de Controle de Qualidade. O Controle de Qualidade é responsável por coletar amostras e realizar testes de matérias-primas, materiais de embalagem, produtos intermediários, produtos a granel e produtos acabados. Nenhum produto é liberado para utilização, comercialização ou distribuição até que esse departamento ateste que sua qualidade é satisfatória. Os métodos analíticos utilizados nos testes devem ser atestados e os resultados das análises devem ser registrados a fim de demonstrar que os valores foram avaliados em relação à especificação. Além disso, devem ser mantidas amostras de referência dematérias-primas e pro- dutos acabados para permitir, quando necessário, a análise futura do produto. A produção deve utilizar procedimentos por escrito a fim de assegurar que os medicamentos fabricados apresentem concentração, qualidade e pureza desejadas. Em seguida, esses procedimentos devem ser encaminhados para a garantia de qualidade, e qualquer mudança nos procedimentos deve ser registrada e justificada. Esses procedimentos incluem: aspectos relativos ao carregamento de todos os produtos, controles de processo, análise de amostras e validação de processos e equipamentos (ALLEN JR.; POPOVICH; ANSEL, 2013). Boas práticas na produção industrial de medicamentos4 Identificação interna do documento O operador deve registrar a hora e a data de cada operação, enquanto o supervisor deve assinar o documento. Caso as operações sejam controladas por equipamentos automatizados, eles devem ser periodicamente conferi- dos. Os controles de processo realizados pelo setor de produção durante a operação devem assegurar que os equipamentos gerem produtos com as propriedades esperadas dentro dos limites estabelecidos (tamanho do comprimido, dureza, etc.). Caso os produtos apresentem propriedades dife- rentes das especificadas, podem ser reprocessados conforme os protocolos pré-estabelecidos (ALLEN JR.; POPOVICH; ANSEL, 2013). De acordo com Allen Jr., Popovich e Ansel (2013), o armazenamento, a distribuição e o transporte de medicamentos também devem ser realizados com base em procedimentos registrados por escrito, sendo que, em geral, os produtos aprovados e mais antigos devem ser distribuídos primeiro. Os produtos devem ser armazenados e transportados em condições que garantam sua estabilidade e não afetem sua qualidade, devendo atender aos requisitos da RDC nº. 304/2019 (BRASIL, 2020), que dispõe sobre as Boas Práti- cas de Distribuição, Armazenagem e Transporte de Medicamentos. De acordo com essa resolução, além da área de armazenagem geral de medicamentos, é preciso dispor de uma área ou local de armazenagem para medicamentos reprovados, vencidos, recolhidos, suspeitos de falsificação ou falsificados, assim como um local para medicamentos devolvidos. Os medicamentos não devem ser armazenados em contato direto com o chão e nem encostados nas paredes, e devem ser mantidos ao abrigo da in- cidência direta de luz solar. A armazenagem de medicamentos termolábeis deve obedecer às recomendações do detentor do registro, e sua expedição deve ser feita de forma a minimizar a exposição à temperatura ambiente. É responsabilidade dos contratantes dos serviços de transporte de me- dicamentos qualificar os transportadores, bem como prestar orientações caso ocorra acidentes envolvendo os medicamentos durante o transporte. Para medicamentos termolábeis, o transporte deve ser feito em condições térmicas, com monitoramento e controle constantes da temperatura. Procedimento operacional padrão O procedimento operacional padrão (POP) é definido pela RDC nº. 17/2010, a qual foi revogada pela RDC nº 301/2019 e posteriormente atualizada pela RDC 658/2022, como: Boas práticas na produção industrial de medicamentos 5 Identificação interna do documento [...] procedimento escrito e autorizado que fornece instruções para a realização de operações não necessariamente específicas a um dado produto ou material, mas de natureza geral (por exemplo, operação, manutenção e limpeza de equi- pamentos; validação; limpeza de instalações e controle ambiental; amostragem e inspeção). Certos procedimentos podem ser usados para suplementar a docu- mentação mestre de produção de lote de um produto específico (BRASIL, 2022, documento on-line). Os POPs transmitem informações acerca dos mais diversos processos, dando segurança ao executor e sendo considerados documentos indispensáveis para a realização das operações industriais com qualidade, eficiência e eficácia e para o cumprimento dos critérios técnicos e das normas das legislações aplicáveis. Os POPs são utilizados tanto para o treinamento de pessoal quanto para garantir que os procedimentos sejam realizados de forma consistente, uniforme e em tempo hábil (EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES, 2014; THOMPSON; DAVIDOW, 2013). É preciso haver um POP para cada instrumento e equipamento utilizado no processo de fabricação, incluindo os utilizados no controle de qualidade. O mesmo vale para os procedimentos de recebimento de matéria-prima e de materiais de embalagem, e também para a amostragem de matérias-primas, produtos acabados, etc., com a especificação da área responsável e do pessoal responsável pela coleta das amostras. Outros exemplos de POPs que devem ser formulados na indústria far- macêutica incluem: montagem e qualificação de equipamentos; aparato analítico e calibração; manutenção, limpeza e sanitização; pessoal, incluindo qualificação, treinamento, uniformes e higiene; monitoramento ambiental; controle de pragas; reclamações; recolhimentos; e devoluções. A Figura 1 apresenta um exemplo de POP utilizado em análises de con- trole de qualidade. Na elaboração do POP, todos os equipamentos a serem utilizados devem ser listados e o item “Descrição das tarefas/métodos” deve indicar o passo a passo a ser executado de forma detalhada durante as diversas etapas da tarefa. Os POPs devem ser revisados periodicamente, de acordo com a necessidade do processo, e o número da revisão deve constar no procedimento escrito. Boas práticas na produção industrial de medicamentos6 Identificação interna do documento Após o controle de qualidade, devem ser feitos registros demonstrando que todos os testes foram realizados e que quaisquer desvios foram devi- damente registrados e investigados. De acordo com o Conselho Regional de Farmácia do Estado do Paraná (WANCZINSKI et al., 2016), os registros dos ensaios realizados devem conter no mínimo os seguintes dados: � nome do material ou do produto e, quando for o caso, a forma farmacêutica; � número do lote e, quando for o caso, o fabricante e/ou fornecedor; � referências para procedimentos de análise; � resultados analíticos, incluindo observações, cálculos e referências utilizados e as especificações (limites); � data em que são realizados os ensaios; � identificação das pessoas que tenham realizado os ensaios; � identificação das pessoas que tenham conferido os ensaios e os cálculos; � declaração de aprovação ou reprovação (ou outra decisão), datada e assinada pela pessoa responsável. Figura 1. Exemplo de POP. Boas práticas na produção industrial de medicamentos 7 Identificação interna do documento Boas práticas de fabricação de medicamentos A RDC nº. 301/2019 dispõe sobre as Diretrizes Gerais de Boas Práticas de Fa- bricação de Medicamentos, com o objetivo de garantir qualidade, segurança e eficácia das preparações farmacêuticas (BRASIL, 2019a). Como a fabricação de medicamentos ainda envolve processos de armazenamento e transporte, a RDC nº. 304/2019 também deve ser cumprida pelas empresas que realizam tais operações (BRASIL, 2019b). As normas gerais dispostas na RDC nº. 301/2019 são complementadas por 14 Instruções Normativas (IN) vinculadas a essa resolução, descritas a seguir (CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO RIO GRANDE DO SUL, 2019). � IN nº 35 — medicamentos estéreis; � IN nº 36 — insumos e medicamentos biológicos; � IN nº 37 — medicamentos radiofármacos; � IN nº 38 — gases substâncias ativas e gases medicinais; � IN nº 39 — medicamentos fitoterápicos; � IN nº 40 — atividades de amostragem de matérias-primas e materiais embalagens utilizados na fabricação de medicamentos; � IN nº 41 — medicamentos líquidos, cremes ou pomadas; � IN nº 42 — medicamentos aerossóis pressurizados dosimetrados para inalação; � IN nº 43 — sistemas computadorizados utilizados na fabricação de medicamentos; � IN nº 44 — radiação ionizante na fabricação de medicamentos; � IN nº 45 — medicamentos experimentais;� IN nº 46 — medicamentos hemoderivados; � IN nº 47 — atividades de qualificação e validação; � IN nº 48 — amostras de referência e de retenção. Apesar da RDC 301/2019 ser atualizada pela RDC 658/2022, as instruções normativas permanecem vigentes como complemento necessário ao bom processo de medicamentos em escala industrial. Além da etapa de fabricação comercial de um produto, a aplicação das Boas Práticas de Fabricação abrange também a fabricação de medicamentos experimentais e a descontinuação de produtos. No âmbito do Gerenciamento Boas práticas na produção industrial de medicamentos8 Identificação interna do documento da Qualidade, tais práticas referem-se tanto ao processo de produção quanto ao controle de qualidade, e devem assegurar que os produtos sejam produzidos e controlados conforme os padrões de qualidade apropriados e estabelecidos para o uso pretendido. De acordo com a RDC nº. 658/2022 (BRASIL, 2022), as Boas Práticas de Fabricação determinam que: � os processos de fabricação devem ser definidos, revisados e capazes de produzir medicamentos com o nível de qualidade exigido e em conformidade com suas especificações; � todas as etapas críticas dos processos de fabricação devem ser atesta- das, inclusive quaisquer mudanças significativas que venham a ocorrer; � devem ser fornecidos todos os recursos necessários como: pessoal qualificado e treinado; instalações, áreas, equipamentos e serviços apropriados; materiais, recipientes e rótulos corretos; procedimentos e instruções aprovadas; e armazenagem e transporte adequados; � os procedimentos e instruções devem ser escritos de forma clara, instrutiva e inequívoca; � os procedimentos devem ser seguidos corretamente, com treinamento dos operadores para tal; � devem ser realizados registros durante a fabricação, de forma manual ou não, que demonstrem o cumprimento das etapas exigidas pelos procedimentos, bem como que a quantidade e qualidade do produto estão conforme o previsto; � devem ser registrados e investigados quaisquer desvios significativos a fim de encontrar sua causa-raiz, identificar soluções adequadas e implementar ações preventivas; � devem ser mantidos todos os registros que permitam o rastreamento do histórico completo de um lote; � a distribuição dos produtos deve atender às boas práticas de distri- buição a fim de minimizar qualquer risco à sua qualidade; � deve-se dispor de um sistema para recolher qualquer lote de produto em comercialização ou distribuição; � todas as reclamações sobre os produtos devem ser examinadas; quando constatados desvios de qualidade, deve-se implementar ações corretivas adequadas, além de ações preventivas para evitar recorrência. Boas práticas na produção industrial de medicamentos 9 Identificação interna do documento Pessoal e treinamento Para o desempenho adequado das atividades que cabem ao fabricante, é necessário haver pessoal qualificado e em quantidade suficiente. Tal pessoal deve receber treinamento inicial e contínuo a respeito das Boas Práticas de Fabricação, incluindo instruções de higiene, conforme a seção V da RDC nº. 658/2022, na qual pode-se destacar: [...] Art. 54. Toda pessoa que entrar nas áreas de fabricação deve usar roupas protetoras adequadas às operações a serem executadas. Art. 55. É proibido comer, beber, mascar, fumar ou armazenar alimentos, bebidas, materiais derivados do tabaco ou medicamentos de uso pessoal nas áreas de produção e armazenamento. Art. 56. Qualquer prática que não seja higiênica dentro das áreas de fabricação ou em qualquer outra área em que o produto possa ser adversamente afetado deve ser proibida. Art. 57. Deve ser evitado contato direto entre as mãos do operador e o produto exposto, assim como com qualquer parte do equipamento que entre em contato com os produtos. Art. 58. O pessoal deve ser instruído sobre a utilização das instalações para lavagem das mãos (BRASIL, 2022, documento on-line). Além do treinamento básico sobre a teoria e a prática do Sistema da Qualidade Farmacêutica e das Boas Práticas de Fabricação, o pessoal recém- -contratado deve receber um treinamento adequado às tarefas que lhe são atribuídas. O pessoal principal da gestão designado pela administração da empresa inclui o responsável pela produção, o responsável pelo controle de qualidade e o responsável pelo sistema de gestão da qualidade farmacêutica para a liberação dos produtos. Para empresas que dispõem de tamanho e estrutura organizacional adequados, pode ser nomeado um responsável pela garantia da qualidade. Instalações e equipamentos As instalações e os equipamentos devem ser projetados e estar localizados de forma que sejam adequados às operações a serem executadas, devendo permitir limpeza e manutenção efetiva, a fim de minimizar o acúmulo de pó ou sujeira, contaminação cruzada e demais prejuízos que possam afetar a qualidade dos produtos fabricados. As instalações devem ser divididas em: Boas práticas na produção industrial de medicamentos10 Identificação interna do documento áreas de produção, áreas de armazenamento, áreas de controle de qualidade e áreas auxiliares. A estrutura física das áreas de produção deve ser planejada de modo que a produção apresente uma ordem lógica, com áreas interligadas. Podem ser necessárias instalações dedicadas à fabricação de certos medicamentos, dependendo do seu nível de risco. Geralmente, deve-se dispor de uma sala separada para a pesagem de matérias-primas. As instalações que realizam a embalagem de medicamentos devem ser especialmente projetadas para evitar misturas ou contaminação cruzada. As áreas de armazenamento devem ser planejadas de modo a terem capa- cidade suficiente para realizar o estoque ordenado das diferentes categorias de materiais e produtos, como: matérias-primas, materiais de embalagem, produtos intermediários, a granel e terminados, incluindo os produtos libe- rados, em quarentena, rejeitados, devolvidos ou recolhidos. Alguns produtos requerem condições especiais de armazenamento quanto a temperatura e umidade. Tais condições devem ser cumpridas, verificadas e monitoradas. Ademais, produtos altamente ativos devem ser armazenados em áreas pro- tegidas e seguras. Os laboratórios de controle de qualidade devem ser separados em áreas dedicadas de controle de produtos biológicos, microbiológicos e radioisótopos (quando aplicável). Além disso, também devem ser separados das áreas de produção. Esses laboratórios devem ser projetados para as operações a serem realizadas, devendo existir espaço suficiente para o armazenamento das amostras coletadas e dos registros. Podem ser necessárias salas separadas para equipamentos sensíveis a umidade, vibração, etc. As áreas auxiliares incluem as salas de descanso e os refeitórios, as quais devem ser separadas das demais áreas. Os vestiários e os sanitários devem ter fácil acesso e ser suficientes ao número de usuários, sendo que os sani- tários não devem se comunicar diretamente com as áreas de produção ou armazenamento. Quanto às áreas de manutenção, devem ser separadas das áreas de produção. Os equipamentos utilizados na fabricação devem ser projetados e man- tidos conforme a finalidade pretendida, devendo permitir uma limpeza fácil e completa em conformidade com procedimentos detalhados por escrito, a fim de evitar qualquer risco de contaminação. As balanças e os equipamen- tos de medição, com precisão e escala apropriadas, devem ser calibrados e verificados periodicamente, estando sempre disponíveis para operações de produção e controle. Boas práticas na produção industrial de medicamentos 11 Identificação interna do documento Autoinspeção De acordo com o artigo 361 da RDC nº. 658/2022: “[...] devem ser realizadas autoinspeções a fim de monitorar a implementação e a conformidade com os princípios das Boas Práticas de Fabricação, e propor as medidas corretivas necessárias” (BRASIL, 2022, documento on-line).Essas autoinspeções devem ser registradas e conduzidas de forma independente. O artigo 362 dessa mesma resolução ainda determina que: [...] As questões relacionadas com pessoal, instalações, equipamento, documen- tação, produção, controle de qualidade, distribuição dos medicamentos, proce- dimentos para gerenciamento de reclamações e recolhimentos, bem como a au- toinspeção, devem ser examinadas em intervalos regulares, seguindo um programa pré-estabelecido com o fim de verificar sua conformidade com os princípios de garantia da qualidade (BRASIL, 2019a, documento on-line). Requisitos específicos quanto a reclamações e recolhimento de produtos e sobre as atividades terceirizadas também estão descritos na RDC nº. 658/2022 (BRASIL, 2022). Com base em todas as normas regulatórias apresentadas, conclui-se que o cumprimento das Boas Práticas de Fabricação pela indústria farmacêutica requer treinamento e aperfeiçoamento constantes do pessoal envolvido em todas as etapas do processo, além de procedimentos muito bem descritos, garantindo a fabricação de produtos com elevada qualidade, eficácia e segurança. Uma boa dica de consulta é o documento intitulado “Compilado de procedimentos do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária”, prepa- rado pelo Grupo de Trabalho para Gestão de Documentos do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária. Nele podem ser encontrados inúmeros POPs e anexos relativos à inspeção de Boas Práticas de Fabricação, com última atualização em agosto de 2019. Como visto, a produção tem passado por grandes mudanças, seja no as- pecto técnico ou legal. Como forma de inserção em um mercado internacional cada vez mais exigente, a Anvisa, por meio das novas normativas e resoluções, modernizou todos os processos relativos às boas práticas na produção in- dustrial de medicamentos. Ainda existem muitos passos importantes a serem Boas práticas na produção industrial de medicamentos12 Identificação interna do documento adotados, no entanto, o Brasil tem caminhado de forma representativa na busca pela melhoria na qualidade dos medicamentos a serem comercializados dentro do país e para exportação. Nesse contexto, não apenas a produção em si, mas todo o processo de logística e armazenamento passam a compor pontos importantes no controle de qualidade e estabilidade de medicamentos. Referências ALLEN JR., L. V.; POPOVICH, N. G.; ANSEL, H. C. Formas farmacêuticas e sistemas de liberação de fármacos. 9. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS INDÚSTRIAS DE MEDICAMENTOS GENÉRICOS. Mercado. [201-?]. Disponível em: http://progenericos.org.br/mercado. Acesso em: 16 ago. 2020. BRASIL. Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº. 301, de 21 de agosto de 2019. Dispõe sobre as Diretrizes Gerais de Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos. Diário Oficial da União, Brasília, 22 ago. 2019a. Disponível em: http://portal.anvisa. gov.br/documents/10181/5389382/RDC_301_2019_.pdf/2e049461-1e8a-4bbb-8e09- 8d3c04dea07d. Acesso em: 16 ago. 2020. BRASIL. Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº. 304, de 17 de setembro de 2019: Dispõe sobre as Boas Práticas de Distribuição, Armazenagem e de Transporte de Medicamentos. Diário Oficial da União, Brasília, 18 set. 2019b. Disponível em: http:// portal.anvisa.gov.br/documents/10181/2957539/RDC_304_2019_.pdf/57303640-91ef- 4d2e-9577-0c9657a5a9a3. Acesso em: 16 ago. 2020. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO RIO GRANDE DO SUL. Esclareça suas dúvidas sobre a nova RDC nº. 301/2019 sobre BPF de medicamentos. 2019. Disponível em: https:// crfrs.org.br/noticias/ot-informa--esclareca-suas-duvidas-sobre-a-nova-rdc-no-301- -2019-sobre-bpf-de-medicamentos. Acesso em: 16 ago. 2020. EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES. Manual de padronização de POPs. Brasília: EBSERH, 2014. (E-book). FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DO ESTADO DO PARANÁ. Indústria farmacêutica. 2019. Disponível em: http://www.fiepr.org.br/fomentoedesenvolvimento/cadeiasprodutivas/ uploadAddress/farmaceutica%5B19550%5D.pdf. Acesso em: 16 ago. 2020. THOMPSON, J. E.; DAVIDOW, L. W. A prática farmacêutica na manipulação de medica- mentos. Porto Alegre: Artmed, 2013. WANCZINSKI, B. J. et al. Diretrizes da indústria farmacêutica. 2. ed. Curitiba: Conselho Regional de Farmácia do Estado do Paraná, 2016. (E-book). Leitura recomendada SISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Compilado de procedimentos do sistema nacional de vigilância sanitária. 2019. Disponível em: http://portal.anvisa. gov.br/documents/33864/0/Compilado+de+Procedimentos+SNVS+-+Revis%C3% A3o+16+%2801.02.2020%29/a9d23041-d676-4109-aec5-5a23fef71c70?version=1.13. Acesso em: 16 ago. 2020. Boas práticas na produção industrial de medicamentos 13 Identificação interna do documento Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os edito- res declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Boas práticas na produção industrial de medicamentos14 Identificação interna do documento Identificação interna do documento