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Vasculares 2009 Manual de M o l é s t i a s Fábio Hüsemann Menezes George Carchedi Luccas John Cook Lane 1ª Edição • Rio de Janeiro • 2009 Vasculares Manual de M o l é s t i a s Fábio Hüsemann Menezes George Carchedi Luccas John Cook Lane Moléstias Vasculares 5 Prefácio George Carchedi Luccas O progresso científico das últimas décadas foi impressionante e o volume de conhecimentos cresceu exponencialmente, porém, o tempo de preparo do es- tudante de Medicina permaneceu nos mesmos seis anos. A equação não pode mudar no lado do tempo de formação profissional, pois o médico já começa tarde no mercado de trabalho, sem contar a necessária pós-graduação, incluindo-se de dois a cinco anos de residência médica. Na verdade a formação nunca será com- pleta, pois se há 50 anos o médico poderia praticar uma boa medicina com os conhecimentos obtidos nas grandes faculdades da época, hoje isto não é mais pos- sível, tanto pelo volume de conhecimentos disponível e necessidade constante de atualização, como pelas dúvidas e preocupação quanto à eficiência e a qualidade do ensino praticado nas inúmeras novas faculdades agora existentes. O ensino de Moléstias Vasculares na Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, aos 40 anos de existência, tem seguido de forma semelhante, com seus docentes dedicando-se ao ensino de graduação no período de internato, no sexto ano do curso médico. Os tópicos do currículo são discutidos em seminários que agrupam patologias afins, sendo fundamental para valorizar as discussões o pre- paro prévio dos alunos. Não acreditamos na eficiência da transmissão passiva de conhecimentos e por isto não se utilizam aulas teóricas clássicas para grandes gru- pos de alunos. Para haver qualidade no seminário exige-se conhecimento prévio do tema a ser abordado, sendo que o mesmo se inicia com uma prova, que serve como preparo e incentivo para a discussão dos assuntos programados. O obstáculo a ser resolvido era o preparo para o seminário. Como es- tudar? O Prof. John Cook Lane estimulou e protagonizou a edição de dois livros de Propedêutica Vascular. O conhecimento da história e exame físico das patologias vasculares é essencial para a realização do diagnóstico, fundamental para o efetivo e correto tratamento. A ideia do professor John Cook Lane era produzir livros que resistissem ao tempo, o que seguramente foi obtido. Tendo em mãos o conhecimento propedêutico, o questionamento dos internos passou Moléstias Vasculares6 a ser onde buscar informações sobre as principais condutas. Já dispomos de inúmeros livros da especialidade, incluindo-se dois compêndios nacionais, em dois volumes, de alto nível. Entretanto, sendo reduzido o período de estágio dos alunos de graduação, e ainda compartilhado simultaneamente com outras especialidades cirúrgicas (Cabeça e Pescoço / Tórax), torna-se impossível exigir o conhecimento do volume de informações contido nestes livros, previamente às discussões em grupo. Há cerca de uma década preparamos vídeo-tapes sobre as principais patologias para cobrir esta difi- culdade, porém ao longo dos anos descobrimos não ser a solução ideal. Os vídeos são de difícil produção e atualização, não permitem interação ágil e não se consegue competir com a qualidade dos programas que estamos todos acostumados a assistir na TV comercial. Além disto, os vídeos são grandes indutores do sono, pois se condenamos a aula clássica com professor presente pela dificuldade de prender atenção após 20 a 30 minutos, pior ainda assistindo passivamente as aulas pela televisão. Nos últimos anos o nosso entusiasmo se voltou aos recursos da informática e com o auxílio do Dr. Fábio Hüsemann Menezes passamos a editar um livro denominado “Angiologia Digital”, composto de vários CD-ROM (compact disc – read only memory) sobre os diferentes temas da especialidade, atingindo no momento o número de dezesseis temas. A capacidade de informações que comporta o disco digital fez com que aumentássemos e superássemos a quantidade de conhecimentos necessários ao nível da graduação, sem, contudo atrapalhar seu objetivo no aprendizado. Verificam-se os seguintes pontos favoráveis com o recurso didático do uso do CD-ROM: a) A geração atual de estudantes nasceu com o uso do PC, convivem com a Internet e navegam com destreza pelas diversas telas do programa da aula, interagindo e aprendendo com facilidade e em pouco tempo o conteúdo do programa. Ao contrário do vídeo a interação é fácil e efetiva. b) Como no velho provérbio que uma imagem vale mais que mil palavras, nestes CD-ROMs se privi- legiam as imagens para passar o maior volume de conhecimentos em curto espaço de tempo. c) No CD-ROM também é possível a utilização de vídeos, porém, neste caso utilizamos pequenas animações gráficas ou filmes de curta duração, para ilustrar acessos ou técnicas cirúrgicas relativas ao tema principal. A finalidade do recurso eletrônico não é substituir o professor, e sim gerar conhecimentos para incre- mentar o nível da discussão dos diferentes temas na presença do docente. O professor é poupado do ensino monótono e repetitivo, otimizando e valorizando o seu tempo com os alunos. É importante ressaltar que não pretendemos defender o ensino virtual, pois não há como aprender Medicina sem a prática diária, a experiência, e o contato com o paciente, na verdade nosso maior professor. O presente “Manual de Moléstias Vasculares” engloba: livro de texto composto de vinte capítulos com informações objetivas sobre os principais temas de moléstias vasculares direcionadas ao nível de graduação, DVD de propedêutica para orientar o exame físico vascular, CD-ROM com pequenos textos, animações gráficas e filmes, abordando os diferentes capítulos e, ao final, série de cem testes comentados com a função de auferir os conhecimentos e preparar para os exames de Residência Médica. Este Manual não substitui a leitura dos principais compêndios da Especialidade, apenas procura agilizar o ensino na fase de graduação, lembrando o quanto é importante esta formação básica, pois muitos dos jovens mé- dicos após a formação geral na faculdade estarão diante de situações clínicas de urgência, que no caso das moléstias vasculares a conduta decidirá o futuro do doente sem chances de erro ou de uma segunda opinião. Esperamos que a comunidade acadêmica possa receber e indicar este Manual e os alunos tenham todo o proveito que os editores planejaram alcançar. Prefácio George Carchedi Luccas Moléstias Vasculares 7 Índice Prefácio Colaboradores Visão Global Capítulo 1 - O Exame dos Pulsos Capítulo 2 - Laboratório Vascular Capítulo 3 - Angiografias e Técnicas Endovasculares Capítulo 4 - Aterosclerose e Dislipidemia Capítulo 5 - Arterites Capítulo 6 - Oclusão Arterial Crônica Capítulo 7 - Pé Diabético Capítulo 8 - Aneurismas Capítulo 9 - Obstrução Arterial Aguda Capítulo 10 - Traumas Vasculares Capítulo 11 - Doença Vascular Extracraniana Capítulo 12 - Síndrome do Desfiladeiro Torácico Capítulo 13 - Varizes dos Membros Inferiores Capítulo 14 - Doença Tromboembólica Venosa Capítulo 15 - Hipertensão Venosa Crônica Capítulo 16 - Linfedema Capítulo 17 - Isquemia Visceral Capítulo 18 - Malformações Vasculares Capítulo 19 - Vias de Acesso para Hemodiálise Capítulo 20 - Amputações e Reabilitação 5 8 9 11 15 23 31 37 47 55 61 73 81 87 97 105 115 125 133 139 147 153 159 Moléstias Vasculares8 Colaboradores John Cook Lane Prof. Titular de Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp João Potério Filho Prof. Adjunto em Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp George Carchedi Luccas Prof. Livre-Docente em Cirurgia Vascular pela FCM-UnicampAna Terezinha Guillaumon Profa. Livre-Docente em Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp Docente junto à Disciplina de Moléstias Vasculares FCM-Unicamp Fábio Hüsemann Menezes Doutorado em Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp Docente junto à Disciplina de Moléstias Vasculares FCM-Unicamp Eduardo Faccini Rocha Mestrado em Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp Médico contratado junto ao Hospital de Clínicas da Unicamp Carla Aparecida Faccio Bosnardo Mestrado em Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp Médica contratada junto ao Hospital de Clínicas da Unicamp José Luiz Cataldo Doutorado em Cirurgia pela FCM-Unicamp Médico Colaborador junto ao Hospital de Clínicas da Unicamp Sandra Aparecida Ferreira Silveira Doutora em Clínica Radiológica pela FCM-Unicamp Eduardo Valença Barel Doutorado em Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp Charles Angotti Furtado de Medeiros Mestrado em Cirurgia Vascular pela FCM-Unicamp Moléstias Vasculares 9 As moléstias vasculares periféricas englobam a artérias, veias e linfáticos. Existem poucas áreas da Medicina em que, pela anamnese e exame físico geral, pode-se obter um diagnóstico na maioria das vezes. De posse de um diagnóstico pre- suntivo, pode-se orientar as medidas terapêuticas. Os exames adicionais de medida de pressão e imagem são úteis para um detalhamento anatômico e funcional do sistema. No campo das moléstias arteriais, é mister levar em conta que a etiologia principal é a aterosclerose e, mais raramente, as arterites, que acometem com maior frequência as artérias menores e desafiam o médico quanto à sua causa e ao seu manejo terapêutico. Como a aterosclerose é uma doença generalizada, quando o paciente apresenta-se com uma queixa de insuficiência circulatória periférica, é importante não esquecer de averiguar se não há comprometimento simultâneo das artérias coronárias e dos vasos que nutrem o cérebro. Estes últimos poderão ser mais importantes do que a queixa que trouxe o paciente ao médico. O aparelho de ultrassom Doppler é útil para medir, de forma indireta, as pressões nas artérias distais, quantificando a perda de energia potencial pelas lesões obstrutivas proximais. No seguimento pós-operatório também é útil para avaliar a melhora da pressão, e por correspondência, da perfusão do membro. Os exames de ultrassom, tomografia computadorizada e ressonância mag- nética nuclear continuam a aperfeiçoar-se, trazendo imagens em terceira dimen- são e competindo com a tradicional arteriografia contrastada. No campo venoso o ultrassom Doppler contínuo serve bem para detectar trombose em vasos maiores, e a flebografia contrastada vem sendo substituída pelos exames de ultrassonografia dúplex e ressonância magnética nuclear, os quais revelam um mapa detalhado deste sistema, modificando as indicações cirúrgi- cas para as varizes primárias e nas recanalizações das tromboses venosas antigas. Também nesta área a cirurgia endovascular tem ganhado espaço, através do uso do LASER e da escleroterapia monitorada por ultrassom no caso das varizes e das Visão Global John Cook Lane Moléstias Vasculares10 trombólises e angioplastias com stents nas veias profundas. A cirurgia minimamente invasiva também tem atu- ado na ligadura endoscópica subfascial de veias perfurantes. Os curativos para as úlceras venosas têm progresso constante, somando à consagrada Bota de Unna os curativos oclusivos e os enfaixamentos multicamada. Quanto aos linfáticos, há progresso no estudo genético da doença primária e melhor entendimento do acometimento linfático nas doenças secundárias, promovendo diagnóstico mais precoce das alterações e melhor prevenção das complicações tardias. As tradicionais cirurgias arteriais abertas de enxertos, para fazer pontes vasculares com o objetivo de ultra- passar locais obstruídos, passam hoje por uma rápida transformação, tratando lesões por via endovascular, di- latando vasos e colocando endopróteses metálicas (stents) para mantê-los abertos. Também os aneurismas vêm sendo tratados colocando-se endopróteses por acessos distantes, diminuindo o trauma cirúrgico. Além disso a cirurgia laparoscópica abre novas perspectivas ao arsenal terapêutico do tratamento de moléstias vasculares. É importante ressaltar que na área de atuação da cirurgia vascular periférica os medicamentos são muito pouco utilizados. Com exceção dos anticoagulantes e trombolíticos, as demais drogas (vasodilatadores e flebo- tônicos) têm efeito limitado e uso bem específico. O controle da aterosclerose depende mais da educação do paciente quanto ao controle dos fatores de risco, os quais são normalmente tratados pelo clínico nas unidades básicas de saúde. Não é, portanto, do escopo deste manual apresentar o detalhamento do tratamento clínico das doenças vasculares, mas sim oferecer uma ideia das possibilidades do tratamento cirúrgico. Os horizontes da especialidade continuam a oferecer, cada vez mais, novas opções aos pacientes necessi- tados. Cumpre a todos continuarem atentos ao progresso nesta área. Visão Global John Cook Lane Moléstias Vasculares 11 O Exame dos Pulsos John Cook Lane1 Capítulo Quando o ventrículo esquerdo ejeta sangue na aorta, cria-se uma onda de pressão que é transmitida por todas as artérias. O exame dos pulsos arteriais resulta em informações cruciais sobre o sistema cardiovascular. Os pulsos devem ser palpa- dos não só por sua intensidade, mas também avaliados quanto à sua elasticidade; ou seja, se normal ou endurecida pela aterosclerose, bem como auscultados com o uso do estetoscópio. O fluxo normal nas artérias procede em forma laminar e silenciosa. Quando existe turbulência no fluxo, resulta em frêmito palpável e sopro à ausculta; sinais estes de que talvez haja uma placa de ateroma nas imediações. O pulso carotídeo pode ser facilmente localizado palpando-se inicialmente a cartilagem tireoide e deslizando os dedos até a sua borda posterior. Este pulso corresponde ao da artéria carótida comum. Ela deve ser auscultada desde o ângulo da mandíbula até o nível da clavícula à procura de sopros audíveis. Lembrar que o local mais comum de estenose por placa de ateroma é a origem da carótida interna, sendo, portanto, o local mais comum de sopro o ponto logo abaixo do ângulo da mandíbula. O volume do pulso carotídeo é tipicamente reduzido na insuficiência car- díaca e em estenose das válvulas aórtica e mitral. A amplitude deste pulso é aumentada em condições que redundam no aumento do débito cardíaco, tais como: febre, anemia, hipertireoidismo e fístulas arteriovenosas. O pulso da ca- rótida comum é o mais indicado também para o diagnóstico da parada cardíaca. A artéria carótida comum usualmente não tem ramos e se divide em carótidas externa e interna. A carótida externa supre as estruturas da face e couro cabeludo e sua continuação pode ser palpada um centímetro à frente do trago da orelha. Já a carótida interna só é palpável na fossa amigdaliana, o que exige a aplicação, na mucosa da orofaringe, de um spray anestésico. É importante lembrar que os pulsos, bem como a pressão arterial, devem ser pesquisados de ambos os lados do corpo para uma comparação. Em relação aos pulsos do membro superior, deve-se palpar o subclávio na fossa supraclavicular (e auscultá-lo), axilar no sulco delto-peitoral e no cavo axilar, braquial, radial e ulnar. Moléstias Vasculares12 O Exame dos Pulsos John Cook Lane Para sentir o pulso axilar, comprimem-se os dedos da mão direita profundamente no cavo axilar. O pulso braquial é sentido na borda medial do músculo bíceps, comprimindo o vaso contra o úmero. O pulso braquial também pode ser sentido na face anterior da dobra do cotovelo, medial ao tendão do bíceps (mesmo local onde colocamos o estetoscópio para mediras pressões arteriais sistólica e diastóli- ca). O pulso radial, bem superficial, é palpado lateralmente ao tendão do grande palmar. O pulso ulnar, mais profundo que o radial, é palpado medialmente ao tendão do flexor superficial dos dedos. Se houver dúvida quanto a este pulso, faça a manobra de Allen1. Para tal, o pulso radial é palpado pelo polegar do(a) examinador(a) que faz um sistema de pinça, comprimindo a artéria fortemente, o qual resulta em sua completa oclusão. Antes da compressão da artéria, pede-se que o(a) paciente feche a mão com força e, após a compressão, abra-a. Se a artéria ulnar estiver ocluída, a palidez da palma da mão permanecerá. Ao liberar a pressão sobre a radial, a cor rósea da palma da mão volta imediatamente. A aorta abdominal inicia-se quando atravessa o diafragma. Ela diminui rapidamente de diâmetro ao distribuir sangue aos grandes vasos do abdômen (tronco celíaco, mesentérica superior e vasos renais). Ela deve ser auscultada en- tre o apêndice xifoide e o umbigo. A presença de sopro é mais fácil de se detectar quando o(a) paciente expira forçadamente e o estetoscópio é comprimido sobre o vaso. Na maioria das vezes, a presença de sopro apenas significa que existe turbulência do fluxo sanguíneo causada por placas de arteroma. Não podemos nos esquecer de que em um(a) paciente hipertenso(a), principalmente jovem, poderá haver um estreitamento da artéria renal e a presença de sopro audível sobre a região renal ou abdômen anterior poderá sinalizar a doença. A importância de palpar a aorta está na procura de um aneurisma. Usando as duas mãos, os dedos se aprofundam na linha média do abdômen e, com o(a) paciente em expiração forçada, mantendo a aorta entre os dedos, estima-se o calibre da artéria. Como regra grosseira, o diâmetro da aorta é igual ao diâmetro do polegar do(a) paciente. A presença de um aneurisma é detectada quando o seu diâmetro alcança duas vezes o normal. A palpação da aorta deve ser rotina no exame físico, principalmente após a idade dos 40 anos. À altura do umbigo, a aorta se divide em artérias ilíacas comuns e, devido à sua localização mais profunda na pélvis, as artérias ilíacas não são sempre palpáveis, prin- cipalmente no obeso. No entanto, deve-se tentar palpá-las já que, não raramente, podem estar aneurismáticas. As artérias ilíacas têm um comprimento de aproximada- mente cinco centímetros quando se dividem em externas e internas. Os pulsos das ar- térias ilíacas internas não são palpáveis. Todavia, no sexo masculino, pode-se ter uma ideia se pelo menos uma das artérias está pérvia quando o paciente consegue manter a função erétil. As duas artérias ilíacas internas são vasos curtos, de cerca de quatro centímetros de comprimento, que irrigam a musculatura e as vísceras da pelve. A artéria ilíaca externa é de calibre maior que a interna e dirige-se inferiormen- te pela borda interna do músculo psoas. Ao passar por baixo do ligamento inguinal (Poupart2), é então denominada artéria femoral comum. O pulso deste vaso pode ser palpado equidistante entre a espinha ilíaca ântero-superior e a sínfise púbica. A artéria poplítea se inicia onde termina a artéria femoral superficial quan- do esta passa pelo forâmen do músculo grande adutor (conhecido como canal de Hunter3). O pulso da poplítea pode ser palpado com o(a) paciente em 1Edgar Van Nuys Allen, 1900-1961. Clínico americano. 2François Poupart, 1661-1708. Anatomista francês. 3John Hunter, 1728-1793. Anatomista e cirurgião escocês. Moléstias Vasculares 13 O Exame dos Pulsos John Cook Lane decúbito dorsal, com o joelho um pouco fletido e os dedos das duas mãos, uma de cada lado, pressionando o centro do cavo poplíteo. Outra forma de palpar este mesmo pulso é colocando o(a) paciente em decú- bito ventral com o joelho fletido e a perna apoiada e relaxada sobre o ombro do(a) examinador(a). Não é exatamente fácil conseguir que o(a) paciente relaxe enquanto o(a) examinador(a) usa os segundo, terceiro e quarto dedos para comprimir o vaso contra o fêmur. O pulso poplíteo é um dos pulsos mais difíceis de palpar. Não é raro que o(a) examinador(a) sinta o seu próprio pulso nas pontas dos dedos. Quando na dúvida, um(a) segundo(a) examinador(a) deve palpar o pulso radial do(a) paciente enquanto o(a) primeiro(a) conta em voz alta: “um, dois, três...”. Se as dúvidas permanecerem, o(a) primeiro(a) examinador(a) deve exercitar-se, para fazer com que o seu próprio pulso acelere e se torne não coincidente com o pulso do(a) paciente. A artéria poplítea divide-se em tibial anterior e tronco tíbio-fibular, que após alguns centímetros se divide em artéria tibial posterior e fibular. A artéria tibial anterior pode ser palpada no terço distal da perna na loja tibial anterior. Quando chega ao dorso do pé, a tibial anterior passa a ser chamada de artéria pediosa e pode ser palpada lateralmente ao tendão do extensor longo do hálux. O pulso tibial posterior pode ser encontrado equidistante entre o maléolo interno e o tendão de Aquiles. Moléstias Vasculares 15 No laboratório vascular são realizados testes não invasivos essenciais para complementação propedêutica do exame clínico, possibilitando ao médico assis- tente a definição da doença, bem como a sua localização, extensão e gravidade. Os testes mais utilizados são os fisiológicos, que incluem a pletismografia, o Doppler contínuo e a ultrassonografia dúplex. Denomina-se pletismografia o procedimento destinado a registrar as varia- ções de volume de segmentos orgânicos, parâmetros que estão diretamente rela- cionados ao enchimento vascular produzido pelo ciclo cardíaco. Em linhas gerais, o pletismógrafo é constituído por uma unidade sensorial, a qual percebe a varia- ção do volume do órgão estudado, um transdutor capaz de transformar a variação de volume em energia elétrica e um registrador que, recebendo as ondas elétricas, mostra de forma gráfica as variações do volume. Há vários tipos de pletismógrafo que diferem entre si quanto ao mecanismo que caracteriza a unidade sensorial, a saber: pletismógrafo que utiliza bolsas de água ou de ar (pneumopletismógrafo), através do uso da reflexão da luz (fotopletismógrafo), através da resistência da corrente elétrica em um tubo elástico preenchido com mercúrio (pletismógrafo de impedância) e outros. Na prática clínica, os pletismógrafos são mais utilizados em pesquisa, para estudos hemodinâmicos da circulação arterial e venosa. Para a determinação do fluxo sanguíneo, utiliza-se o efeito Doppler4, cujo alvo é representado pelas hemácias. Um transdutor é aplicado sobre a pele e emite ondas sonoras com frequência conhecida. Quando esta onda bate em um obje- to em movimento, é refletida com uma variação no comprimento de onda (ou inverso da frequência). Se o fluxo segue em direção ao transdutor, a frequência refletida pelos eritrócitos é maior que a emitida, e quando segue em direção con- trária ao transdutor, a frequência é menor. A variação da frequência é diretamente proporcional à velocidade de fuga ou aproximação do eritrócito em relação ao transdutor. O Doppler contínuo utiliza dois tipos de cristais no transdutor, um dos quais emite continuamente feixes de ondas sonoras e o outro recebe as ondas refletidas Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira2 Capítulo 4Johann Christian Andreas Doppler, 1803-1853. Físico austríaco. Moléstias Vasculares16 Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira também de forma contínua, o que impossibilita a determinação da profundidade do vaso (Figura 1). O Doppler pulsado utiliza sinal elétrico intermitente e um tipo de cristal que ora emite, ora recebe ondas sonoras, o que permite identificar a profundidade do vaso através dotempo entre a emissão da onda sonora e o retorno da onda refletida. A ultrassonografia dúplex (também conhecida como Ecodoppler, mapeamento dúplex, ou ultrassono- grafia com Doppler colorido) associa a imagem bidimensional (modo B) às formas de ondas obtidas com o Doppler pulsado em tempo real. Nas últimas décadas este exame tem se mostrado um excelente recurso pro- pedêutico vascular (vide figuras e vídeos no CD-ROM). Os principais estudos realizados no laboratório vascular podem ser divididos segundo o território de aco- metimento das doenças: A) cérebro-vascular com ênfase nos segmentos extracraniano das carótidas, B) arterial periférico, C) aorta abdominal e seus ramos e D) venoso periférico. A - Estudo cérebro-vascular – carótidas extracranianas. Estudos multicêntricos têm demonstrado benefícios da endarterectomia de carótidas em pacientes sin- tomáticos e assintomáticos com estenoses críticas. Com o advento da ultrassonografia dúplex, foi possível quantificar o grau de estenose de forma não invasiva, sem contraste, tornando-a essencial para o estudo destes segmentos das artérias carótidas. Além disto, pode-se fazer o seguimento das estenoses, detectar obstruções, tortuosidades e acotovelamento (kinking), aneurismas, dissecção, displasia fibro-muscular e arterites. O grau de estenose é baseado, principalmente, no critério de velocidades obtidas com o Doppler pulsado no local da mesma. Nas estenoses sem significado hemodinâmico, menores que 50% em diâmetro, as velocidades sistólicas são menores que 125 cm/seg. B CA FHM Figura 1 - Representação esquemática do funcionamento do aparelho de Doppler de ondas contínuas. Em A, quando a onda incide sobre um objeto sem movimento (artéria ocluída), a resposta da onda é de igual frequência, resultando na ausência de som. Quando o objeto se movimenta contra o transdutor (B), a onda retorna com uma frequência maior e quando se movimenta afastando-se do transdutor (C), a frequência de retorno é menor. Moléstias Vasculares 17 Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira As estenoses hemodinamicamente significativas, de 50% a 70 % em diâme- tro, produzem aumento das velocidades sistólicas maior que 125 cm/seg, mas as velocidades diastólicas são menores que 100 cm/seg. Três parâmetros, baseados nos critérios de velocidades, definem as estenoses críticas, maiores que 80% em diâmetro: - pico de velocidade sistólica maior que 250 cm/seg - velocidade diastólica final maior que 100 cm/seg - razão entre as velocidades de pico sistólicas no local da estenose e na artéria carótida comum maior que quatro. Este estudo pode ser inconclusivo quando a placa é calcificada e produz sombra acústica, nas bifurcações altas, pescoço curto e quando o paciente não co- opera com o estudo. Nestes casos, a angioressonância é o exame mais indicado. Com a ultrassonografia dúplex também é possível realizar acompanhamen- to pós-endarterectomia ou colocação de stent, assim como estudar os segmentos iniciais das artérias subclávias e vertebrais. B - Estudo arterial periférico Os sinais e sintomas de insuficiência arterial periférica são decorrentes da diminuição de fluxo e pressão, que pode ocorrer em repouso ou com exercício. Existem várias modalidades de testes que se aplicam na avaliação da doença arte- rial, entretanto abordaremos aqueles que são mais utilizados na prática clínica. 1) Medida do índice tornozelo-braço Esta medida é bastante utilizada na avaliação fisiológica dos pacientes com insuficiência arterial periférica. A medida da pressão nos membros inferiores é realizada colocando-se um manguito pneumático em torno do terço distal das pernas e este deverá ser insuflado até a pressão supra sistólica. A pressão sistólica é determinada quando o fluxo aparecer nas artérias dorsal do pé e tibial posterior enquanto o manguito é desinsuflado, utilizando-se o Doppler contínuo como o detector do fluxo. O índice tornozelo-braço é a razão entre as medidas de pressão no tornozelo e a maior pressão entre os dois braços (Figura 2A). Este índice é nor- mal quando está entre 0,9 e 1,2. Índice menor do que 0,9 é anormal e abaixo de 0,4 está associado à isquemia grave. A principal limitação deste método é a calcifi- cação das artérias tibiais que ocorre nos pacientes diabéticos ou com insuficiência renal submetidos a diálise, elevando falsamente o índice para valores acima de 1,4; pois as artérias tornam-se mais rígidas, ou mesmo incompressíveis. O Dr. João Potério Filho5 desenvolveu, na Unicamp, método pletismográ- fico para a determinação da pressão arterial nestes pacientes, sem a necessidade de comprimir a artéria que supre o membro, o qual chamou de método pós-capilar. A medida de pressão pode ser realizada ainda em diferentes segmentos dos membros (tornozelo, perna proximal, coxa distal e proximal), auxiliando na identi- ficação do nível de obstrução arterial (local onde a pressão apresenta queda súbita). 5João Potério Filho, 1937-. Cirurgião vascular, Professor Adjunto da Disciplina de Molés- tias Vasculares da Faculdade de Ciências Médicas da Universi- dade Estadual de Campinas. Moléstias Vasculares18 Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira 120 260 200 120 110 120 120 110 110 100 80 70 1,0 0,66 Braço Coxa Alta Coxa Baixa Perna Alta Tornozelo ITB A B1 B3 B2 B4 FHM Figura 2 - Exemplo de exame de Doppler de ondas contínuas com registro gráfico. Em (A) observa-se a medida da pressão sistólica obtida nos diversos segmentos dos membros, de onde se obtém o ITB. Em (B1) e (B2) observa-se curvas trifásicas obtidas nos níveis femoral e tibial posterior do membro inferior direito. Em (B3) e (B4) observa-se curvas monofásicas obtidas nos níveis femoral e tibial posterior do membro inferior esquerdo, em um doente com obstrução da artéria ilíaca comum esquerda. 2) Estudo com o Doppler contínuo e obtenção do padrão de onda O padrão de onda normal nas artérias dos membros inferiores é trifásico, com a primeira onda, maior, em direção à periferia (pé), a segunda em direção ao coração e a terceira, novamente em direção ao pé. Na pre- sença de oclusões ou estenoses hemodinamicamente significativas, o padrão de onda nos segmentos distais das artérias acometidas passa a ser monofásico. O padrão de fluxo monofásico apresenta uma única onda de baixa amplitude e de duração prolongada em direção à periferia (Figura 2B). Assim como as medidas de pressão podem ser realizadas nos diferentes segmentos do membro, as curvas também podem ser obtidas das artérias femoral, poplítea, tibial posterior e pediosa. Moléstias Vasculares 19 Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira 3) Medida da pressão digital Esta medida é realizada utilizando-se um manguito especial alocado no hálux e um pneumopletismó- grafo. Esta técnica é recomendada nos casos onde as artérias tibiais são incompressíveis. O índice dedo/braço normal é igual a 0,7-0,8. 4) Teste da distância de marcha em esteira motorizada Para melhor avaliar os pacientes com claudicação intermitente, realiza-se o teste de marcha em esteira motorizada. Usualmente, a esteira é programada para a velocidade de 3,5 Km/h e com 12% de inclinação. Pode-se ainda realizar o teste com velocidades e inclinações progressivas. Após a determinação inicial do índice tornozelo-braço, o paciente é solicitado a andar sobre a esteira anotando-se a distância em que se iniciam os sintomas de dor e a distância máxima que o paciente suporta caminhar. Normalmente o teste é limitado a cinco minutos de caminhada. Neste momento, o paciente é colocado deitado e repete-se a medida de pressão nos braços e tornozelos a cada cinco minutos, de maneira a determinar a pressão mínima atingidae a curva de recuperação até a pressão inicial, anterior ao teste. Este estudo é muito útil para a avaliação sistemática do resultado de diferentes modalidades de tratamen- to. As maiores limitações deste estudo são os pacientes que apresentam problemas ortopédicos ou limitações neuro, cárdio e respiratórias para a realização da marcha. A tabela 1 apresenta a classificação da doença arterial obstrutiva periférica de acordo com os achados nos exames do Doppler e teste de esteira. Tabela 1: Classificação da doença arterial obstrutiva periférica de acordo com os valores usualmente encontrados no índice tornozelo-braço e teste de marcha em esteira. Apresentação Clínica Assintomáticos Claudicação para longas distâncias Claudicação moderada Claudicação para curtas distâncias Lesão trófica menor Lesão trófica maior ou dor em repouso Obstrução arterial aguda ITB 0,7 - 0,9 ~0,7 0,5 – 0,7 0,3 – 0,5 0,3 – 0,5 < 0,4 0 Teste de marcha Completa o teste Completa ou não o teste, queda do ITB < 50% do valor ini- cial. Recuperação da pressão em menos de cinco minutos Não completa, queda do ITB > 50% do valor inicial. Recuperação da pressão em menos de cinco minutos Não completa, pressão absoluta de tornozelo < 50 mmHg ao final do teste e não consegue recuperar a pressão em menos de cinco minutos Não se realiza o teste Não se realiza o teste Não se realiza o teste 5) Ultrassonografia dúplex É utilizada para mapear o sistema arterial de membros inferiores e pode fornecer informações a respeito do diâmetro das artérias, presença de estenoses e/ou obstruções, bem como as suas localizações e comprome- timento hemodinâmico. Moléstias Vasculares20 Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira O estudo se divide em dois segmentos, o aorto-ilíaco e o infrainguinal, que compreende as artérias fe- morais comum, superficial e profunda, poplítea, tronco tíbio-fibular, tibiais anteriores e posteriores, fibulares e dorsais do pé. Os critérios para definir estenoses hemodinamicamente significativas (> 60%) são baseados no aumento da velocidade sistólica no local da placa, que excede em 2,5 vezes a velocidade no segmento da artéria sem estenose e no padrão de fluxo nas artérias distais. Um ultrassonografista experiente também pode estimar o grau de estenose baseado no estudo bidimensional com Doppler colorido. A obstrução arterial é definida quando não há sinal Doppler no segmento em estudo e o padrão de fluxo nas artérias distais torna-se monofásico. O mapeamento arterial deve sempre ser complementado com o índice tornozelo-braço. O estudo ultrassonográfico arterial pode definir outras doenças além da aterosclerose, como: aneurismas, pseudoaneurismas, displasia fibromuscular, tumores ou malformações, aprisionamento e compressão, e doença cística da adventícia. Outra aplicação importante deste estudo é no seguimento dos enxertos e tratamentos endovasculares, uma vez que ele pode ser repetido muitas vezes, pois não necessita de contraste. C – Estudo da aorta abdominal e seus ramos A ultrassonografia é o estudo que inicia a investigação das doenças aorto-ilíacas. Os objetivos deste estu- do são: identificar estenose, obstrução, aneurisma e dissecção, e quantificar o grau de estenose. A quantificação do grau de estenose é baseada nas velocidades sistólicas e diastólicas obtidas no local da estenose e na razão entre a velocidade de pico sistólica na estenose e no segmento arterial normal. As maiores limitações deste estudo são: obesidade, excesso de gases intestinais, abdômen volumoso, cirurgia abdominal recente ou ferimento aberto. Artérias mesentéricas e tronco celíaco Oclusão e/ou estenose de artérias mesentéricas e tronco celíaco podem ser detectadas com a ultrasso- nografia dúplex. Velocidades de pico sistólica > 275 cm/seg e > 200 cm/seg sugerem estenoses maiores que 70% nas artérias mesentéricas e tronco celíaco, respectivamente. Entretanto, estes critérios isoladamente não definem isquemia mesentérica. O estudo da artéria mesentérica inferior é difícil e muitas vezes não é possível visualizá-la. Artérias renais A ultrassonografia dúplex está sendo utilizada com sucesso na avaliação dos pacientes com suspeita de estenose das artérias renais e na seleção de casos com indicação de arteriografia e revascularização renal. Os critérios ultrassonográficos para definição de estenose hemodinamicamente significativa (> 60%) são: velocidade de pico sistólica maior que 180 cm/seg e índice velocidade sistólica na artéria renal e na aorta maior que 3,5. Na oclusão da artéria renal, não se detecta sinal Doppler (velocidade ausente) na artéria e o tamanho renal é menor que 9 cm. Outras doenças como displasia fibromuscular e aneurismas também podem ser detectados pela ultrassonografia. As limitações deste exame são: obesidade, presença excessiva de gases intestinais, variações anatômicas da vascularização renal, insuficiências cardíacas e respiratórias graves. Moléstias Vasculares 21 Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira D - Estudo venoso periférico O estudo venoso periférico divide-se em duas principais avaliações, cujos objetivos são estudar trombose venosa profunda e insuficiência venosa crônica. Trombose venosa profunda A ultrassonografia dúplex é o melhor exame inicial para avaliação da trom- bose venosa profunda. Vários segmentos venosos podem ser estudados, como: veia cava inferior, veias ilíacas comuns e externas, femorais comuns, superficiais e pro- fundas, poplíteas, tibiais posteriores, fibulares e veias musculares da panturrilha. As veias dos membros superiores também podem ser estudadas. Com a ultrassonografia em modo B, as veias normais dos membros inferio- res são compressíveis com a pressão do transdutor. Veias que apresentam trombose recente apresentam diâmetro aumentado em relação ao segmento sem trombose e são incompressíveis (Vide CD-ROM). Com o estudo Doppler as veias normais acima da região poplítea apresen- tam três características (Figura 3A): - fluxo fásico com respiração (aumenta com a expiração e diminui na ins- piração, em virtude do aumento da pressão abdominal com a inspiração, que dificulta o retorno venoso para a veia cava inferior). - não apresenta fluxo retrógrado (refluxo) com manobra de Valsalva6. - fluxo aumenta com a compressão distal e descompressão proximal. Quando um segmento venoso está trombosado, não apresenta fluxo ao es- tudo com o Doppler. O segmento venoso distal à oclusão apresenta fluxo contí- nuo ou pouco responsivo com a respiração, e o proximal não apresenta aumento do fluxo ou é mínimo com a compressão distal (Figura 3B). O estudo com a ultrassonografia dúplex nas tromboses não oclusivas, mos- tra que a veia é parcialmente compressível com o transdutor. O estudo do fluxo em cores com o Doppler mostra fluxo parcial na veia. Em pacientes com dor e edema de membro inferior, outras alterações que mimetizam clinicamente trombose venosa profunda podem ser encontradas à ultrassonografia dúplex: hematoma intramuscular, seroma, cisto de Baker, aneuri- mas, linfedema e tumores comprimindo as veias entre outras. As tromboses venosas nas veias superficiais dos membros também podem ser estudadas e os objetivos são: avaliar se já existe comprometimento das veias do sistema profundo, a sua relação com as junções safeno-femoral e safeno- poplítea, e perfurantes. Insuficiência venosa crônica A ultrassonografia dúplex é o estudo atualmente mais utilizado na avaliação de pacientes com insuficiência venosa crônica. Existem dois tipos de estudos que tem objetivos diferentes: Síndrome pós-trombose e varizes. Na Síndrome pós-trombose, a ultrassonografia em modo B e com Doppler colorido pode detectar os segmentos venosos que estão obstruídose os parcial- mente ocluídos. Com Doppler pulsado detecta-se refluxo devido à insuficiência 6Antonio Maria Valsalva, 1666-1723. Anatomista italiano. Descreveu a manobra de Valsalva para a insuflação do ouvido médio. Moléstias Vasculares22 Laboratório Vascular Sandra Aparecida Ferreira Silveira valvular. O teste de refluxo deve ser sempre realizado com paciente em posição ortostática e com as manobras de Valsalva e compressão distal. Refluxo é considerado presente quando o fluxo reverso em direção ao pé tem duração > 1 seg para as veias do sistema profundo. O mapeamento pré-operatório de varizes com a ultrassonografia dúplex tem sido uma ferramenta prope- dêutica indispensável. O estudo deve ser realizado em posição ortostática. Os objetivos são: estudar o sistema pro- fundo para definir se as varizes são secundárias, medir os diâmetros transversos das veias safenas magnas e parvas em vários níveis, mapear os segmentos com refluxo, localizar as fontes de refluxo e as perfurantes insuficientes. O refluxo das veias safenas é obtido com o Doppler pulsado e é considerado presente quando o tempo do fluxo retógrado excede 0,5 seg. A fotopletismografia é outra técnica não invasiva que pode ser utilizada para caracterizar insuficiência ve- nosa. A luz é emitida por um diodo, quase sempre de luz infravermelha, e é captada por uma célula fotoelétrica. O transdutor é alocado na perna e mede a variação de volume de sangue nos capilares, pela reflexão da luz, numa pequena área de pele. O nível do refluxo é determinado com o uso de torniquetes em áreas específicas da perna. Figura 3 - Resposta normal (A) e alterada na trombose venosa profunda (B) ao estudo com o Doppler de ondas contínuas. Do lado esquerdo dos desenhos, a manobra realizada e, do lado direito, a curva de veloci- dade do sangue obtida com o estudo pelo Doppler (c = compressão e r = relaxamento). Em A1, durante o estudo da veia femoral comum, observa-se fluxo que oscila com os movimentos de inspiração e expiração pulmonar. Em A2 observa-se o aumento do fluxo na veia femoral comum ao se comprimir a panturrilha. Em A3 observa-se a interrupção do fluxo ao se comprimir a veia ilíaca externa e o aumento do fluxo ao se liberar a mesma. Em B1 observa-se ausência de fluxo ao se avaliar a veia femoral superficial (ou poplítea se esta também estiver obstruída). Em B2 observa-se som contínuo e de baixa intensidade ao se estudar a veia femoral comum e fluxo venoso contínuo e aumentado na veia safena interna, que é sinal desta estar sendo requisitada como via colateral para o retorno sanguíneo. Em B3 observa-se ausência do fluxo, ou aumento muito pequeno do mesmo, quando se estuda a veia femoral e realiza-se a compressão da panturrilha. 0 A1 0 c r A2 0 c rA3 FHM 0 B1 0 B2 0 c c r r B3 1 2 1 2 FHM A pneumopletismografia é uma técnica capaz de medir o refluxo venoso, a capacidade da bomba venosa da panturrilha e determinar se existe ou não obstrução venosa. Uma câmara tubular de ar envolve a perna do joelho até o tornozelo e está conectada a um transdutor de pressão. As medidas de volume na perna são feitas com o paciente deitado, em posição ortostática e após realizar movimentos de flexão com os pés. Além das técnicas abordadas anteriormente, com ênfase na ultrassonografia dúplex, é importante salientar que outras técnicas não invasivas estão se destacando na propedêutica vascular, como a ressonância magnética e a tomo- grafia computadorizada. Estas modalidades, no entanto, dão ênfase ao estudo da anatomia e não à função, sendo melhores descritas no capítulo referente à angiografias. Moléstias Vasculares 23 Introdução Apesar da história clínica e do exame físico bem feitos permanecerem como a chave para o diagnóstico na maioria das doenças vasculares, deve-se es- tar atento às suas limitações. Só para se ter uma ideia, aproximadamente metade dos pacientes com doença arterial obstrutiva periférica (DAOP) são assintomá- ticos, principalmente nos estágios iniciais da doença. Por isso, são necessários métodos objetivos, de preferência não invasivos, para o manejo correto das mo- léstias vasculares. Assim, os exames complementares são essenciais na avaliação do nível de obstrução, da gravidade do caso e também do prognóstico. Eles fornecem uma noção mais precisa das chances de sucesso com as diversas possibilidades de tra- tamento hoje existentes. Exames considerados minimamente invasivos, como a angiorressonância e a angiotomografia, têm diminuído significativamente a necessidade da angiografia, que ainda é considerada o padrão-ouro para grande parte dos diagnósticos em cirurgia vascular. Por outro lado, os conceitos endovasculares estão renovando o tratamento das doenças vasculares. Devido ao seu potencial de soluções mais simples e de baixa morbidade, os procedimentos endovasculares vêm sendo cada vez mais utilizados nos desafios clínicos, habitualmente complexos, que são próprios da especialidade. Ultrassonografia A ultrassonografia dúplex é um exame totalmente não invasivo, de gran- de valor no estudo hemodinâmico e das alterações anatômicas da circulação arterial e venosa. Com um examinador experiente, possui alta sensibilidade e alta especificidade na detecção de estenoses significativas e oclusões completas na maioria das artérias. Atualmente é empregado não só no diagnóstico, mas também pode ser usado durante os procedimentos endovasculares e, principal- mente, durante o seguimento (vide capítulo 2). Angiografias e Técnicas Endovasculares 3 Capítulo Charles Angotti Furtado de Medeiros Moléstias Vasculares24 Angiografias e Técnicas Endovasculares Charles Angotti Furtado de Medeiros A ultrassonografia intravascular (IVUS em inglês) é um método invasivo de avaliação da parede dos vasos sanguíneos. Exige a introdução de um trans- dutor com altíssima frequência posicionado na ponta de um cateter, através da punção normalmente realizada para as arteriografias e procedimentos endovas- culares. O exame de IVUS fornece informações muito precisas sobre a espessura e o tipo de placa de ateroma localizada na parede arterial, assim como do calibre do vaso, auxiliando no posicionamento e grau de expansão de balões e endopró- teses durante a angioplastia. Também é útil para a localização do local correto para a liberação de endopróteses na correção de aneurismas, assim como a loca- lização de vazamentos ao redor das mesmas. A limitação do exame atualmente é o alto custo do equipamento e dos catéteres que carregam os transdutores, estando disponível em poucos serviços no Brasil. Angiorressonância Atualmente, o estudo da circulação arterial e venosa pode ser realizado por meio da angiorressonância tridimensional. Durante o exame, é necessário o uso de contraste paramagnético para melhor definição do sistema vascular. O contraste mais utilizado é o gadolínio, que apresenta a grande vantagem de ser menos nefrotóxico7, ao contrário dos contrastes iodados utilizados normalmen- te nas tomografias e nas angiografias. No geral, a angiorressonância possui alta sensibilidade (90-95%) e boa especificidade (85-97%) que variam, principalmente, conforme a região ana- tômica a ser estudada. Nos pacientes com doença cérebro-vascular, este exame tem a vantagem de estudar com precisão a circulação intracraniana e ainda fazer cortes axiais do cérebro em uma mesma sessão. Deve-se ter cuidado na interpretação dos exames, pois a angiorressonân- cia pode superestimar as estenoses e muitas vezes é difícil distinguir entre uma estenose significativa e uma oclusão completa. Este fenômeno acontece devido ao efeito da defasagem do contraste nas imagens adquiridas. Outras limitações importantes são: a incapacidade de demonstrara calcificação da parede arterial, a presença de marcapasso e de clipes metálicos, pacientes que sofrem de claus- trofobia e o custo elevado. Angiotomografia Com o advento da tomografia computadorizada helicoidal e a elaboração de protocolos específicos para infusão de contraste, é possível realizar a aquisição de imagens axiais da aorta e das artérias das extremidades em menos de um minuto. Com o uso de processadores sofisticados, a reconstrução tridimensional das ima- gens gravadas é feita com altíssima fidelidade. Comparada com a ressonância, a angiotomografia tem a desvantagem da exposição à radiação e do uso de contraste nefrotóxico. Contudo, ela é muito mais rápida, não apresenta as mesmas limita- ções descritas anteriormente e possui acurácia diagnóstica muito semelhante. Angioscopia A angioscopia oferece a oportunidade de examinar diretamente a luz vas- cular. Por meio de um microendoscópio, é possível inspecionar a superfície in- terna da camada íntima e observar os detalhes intraluminais dos vasos. Exige, no entanto, que a circulação seja interrompida no segmento a ser estudado e a 7Nota do editor: volumes maiores do que 0,3 mmol/kg peso parecem ser nefrotóxicos para pacientes com prejuízo da função renal pré-existente, podendo levar a insuficiência renal aguda, principalmente em diabéticos. Moléstias Vasculares 25 Angiografias e Técnicas Endovasculares Charles Angotti Furtado de Medeiros luz vascular seja preenchida com líquido transparente, aumentando o aporte de fluido para o paciente. A angioscopia é particularmente sensível para detectar a formação de trombos e retalhos da camada íntima vascular, como no caso de controle das endarterectomias de carótida, e na preparação da veia safena inter- na in situ para as revascularizações distais. Pode também ser usada para avaliar os resultados das revascularizações de membros e das angioplastias. É um exame pouco utilizado, porque além das fibras ópticas serem caras e de curta durabili- dade, traz informações limitadas. A real significância das imagens é difícil de ser interpretada durante os procedimentos cirúrgicos e endovasculares. Angiografias Os fundamentos da angiografia foram desenvolvidos com a descoberta dos raios X por Röntgen8 em 1895. Entretanto, as técnicas rudimentares da arteriografia e da flebografia eram usadas raramente, até a introdução dos meios de contraste iodados e o desenvolvimento de técnicas mais modernas de catete- rização. Ainda assim, a verdadeira revolução no campo da angiografia apareceria somente após a aplicação do conceito da subtração digital computadorizada e da descrição por Seldinger9, em 1953, do método percutâneo para a colocação do cateter sobre fio guia metálico (Figura 1). Para um estudo apenas diagnóstico, as injeções de contraste nos tron- cos vasculares principais devem preceder o cateterismo seletivo. Quase todos os contrastes modernos são derivados de compostos iodados. Eles são utilizados pela capacidade que os átomos de iodo possuem na absorção de grandes quan- tidades de raios X. O dióxido de carbono (CO2) é outro contraste que pode ser utilizado e tem gerado interesse graças à sua baixa morbidade. O gadolíneo também pode ser utilizado como contraste para a realização de arteriografias di- gitais, mas para se obter imagens satisfatórias, grandes volumes são necessários, perdendo-se a vantagem da baixa nefrotoxicidade. As reações adversas associadas à administração dos contrastes podem ser fisiológicas, quimiotóxicas ou anafilactoides. As reações fisiológicas geralmente são brandas e incluem calor e dor no local da injeção, náuseas e vômitos. Os efeitos químicos dos contrastes são a cardiotoxicidade, a neurotoxicidade e a nefrotoxicidade, sendo esta última a mais relevante. Os contrastes iodados são excretados quase que exclusivamente por via renal e o mecanismo da nefropatia é a redução do fluxo sanguíneo renal associada a lesões glomerulares e tubulares diretas. As reações anafilactoides são imprevisíveis e potencialmente fatais, mas felizmente não ocorrem com grande frequência. Sua patogenia é de caráter imu- nológico e envolve liberação de histamina, ativação do complemento e reações do tipo antígeno-anticorpo. Os fios guias e os catéteres são a base da arteriografia seletiva e da cirurgia en- dovascular. O conhecimento deste material é extremamente importante, pois exis- tem variações no diâmetro, no comprimento, na flexibilidade e, principalmente, no formato que determina a sua função. Apesar destas inúmeras características, a maioria dos procedimentos pode ser realizada usando apenas alguns tipos. Assim, para se realizar uma angiografia, o primeiro ponto é a escolha do local de acesso e a punção. Após a passagem do fio guia, o próximo passo é a passagem do cateter sobre este fio guia até o local anatômico exato onde será efetuada a injeção do meio de contraste. 8Wilhelm Conrad Röntgen, 1845-1923. Físico alemão. 9Sven-Ivar Seldinger, 1921-1998. Radiologista sueco. Moléstias Vasculares26 Angiografias e Técnicas Endovasculares Charles Angotti Furtado de Medeiros Técnicas Endovasculares A Angioplastia Transluminal Percutânea (ATP) consiste no uso de balão para a dilatação de lesões este- nóticas (Figura 2). Um fio guia adequado é utilizado para atravessar a área de estenose. Em seguida, o balão é avançado delicadamente sobre o fio guia até o local exato antes de ser insuflado. O mecanismo envolve a insuflação de um balão com seringa manômetro, causando compactação e fraturas da placa naquele segmento, o que possibilita a distensão do vaso e aumento subsequente no diâmetro da luz. Ao final, o balão é esvaziado e retirado com cuidado. Uma angiografia de controle é realizada para ser ter ideia do resultado obtido. Geralmente é seguido o caminho mais curto entre o sítio de punção e a lesão alvo, eventualmente, a abordagem contralateral é preferida. E em alguns casos faz-se necessária dupla punção. Figura 1 - Técnica descrita por Seldinger para a colocação percutânea de um cateter plástico dentro da luz vas- cular. Esta técnica permite a utilização de uma agulha metálica fina (A) para realizar a punção, que desta forma se torna mais segura e com menor risco caso outras estruturas sejam inadvertidamente puncionadas. A seguir por esta agulha se introduz um fio guia metálico (B), a agulha é retirada (C e D) e, utlizando-se o fio metálico como guia, um cateter plástico de grosso calibre pode ser seguramente introduzido dentro da luz vascular (E e F). Por último retira-se o dilatador de dentro do cateter plástico de grosso calibre (G). O fio guia permanece dentro da luz para auxiliar na introdução de catéteres angiográficos diagnósticos ou terapêuticos (H). A B C D E F G H FHM Moléstias Vasculares 27 Angiografias e Técnicas Endovasculares Charles Angotti Furtado de Medeiros Figura 2 - Técnica de angioplastia com balão (coluna da esquerda). A angioplastia pode ser realizada com a liberação simultânea de um stent, sendo demonstrado neste caso um stent que é dilatado pelo próprio balão de angioplastia, já estando montado sobre o mesmo (coluna da direita). Em (A) é passado um fio guia através da lesão. A seguir um balão de angioplastia é avançado cuidadosamente até a região a ser tratada (B). O balão é insuflado com auxílio de uma seringa acoplada a um manômetro (geralmente a uma pressão acima de 10 atmosferas) (C) compactando a placa de ateroma. Por último retira-se o cateter balão de angioplastia (D). A B C D FHM O stent é um dispositivo cilíndrico que pode ser implantado na luz vascular por via percutânea, também conhecido como endoprótese não revestida. Ele é destinado a resistir às forças intrínsecas e extrínsecas que levam ao colapso dos vasos e, assim,preservar o fluxo sanguíneo. Basicamente existem dois tipos de stents intravasculares disponíveis: balão-expansível e autoexpansível. O stent balão-ex- pansível é feito de metal (aço inoxidável) e vem montado num balão de ATP. O stent autoexpansível é feito de liga metálica (nitinol) e vem montado dentro de um cateter retrátil (Figura 3). Ambos apre- sentam vantagens e desvantagens e a escolha entre um ou outro depende também da região anatômica a ser tratada (Tabela 1). Eles podem ser usados primariamente ou seletivamente conforme o resultado da angioplastia. As indicações clássicas da colocação de stents incluem: dissecção, estenose residual > 30%, gradiente de pressão intra-arterial entre a porção proximal e distal à área dilatada > 10 mmHg, no tratamento da oclusão comple- ta e quando ocorre o retorno elástico da placa para o calibre inicial do vaso (recoil). As indicações relativas seriam: a prevenção de embolização por placa ulcerada e estenoses muito longas. Os stents revestidos, também conhecidos como endopróteses, são usados principalmente na exclusão dos aneurismas verdadeiros da aorta torácica, abdominal e periféricos. Outra aplicação é no tratamento dos traumas vasculares, iatrogênicos ou não, como correção das perfurações, dos pseudoaneurismas e das fístulas arteriovenosas. Moléstias Vasculares28 Angiografias e Técnicas Endovasculares Charles Angotti Furtado de Medeiros Tabela 1 - Vantagens e desvantagens dos Stents. Tipo Mecanismo de liberação Encurtamento Precisão Flexibilidade Força Radial Melhores Indicações Balão-expansível Insuflação do balão Mínimo Alta Baixa Alta Lesões curtas Muita calcificação Lesões ostiais Autoexpansível Retirada da bainha Variável Baixa Alta Baixa Lesões longas Vasos tortuosos Acesso contralateral Figura 3 - Téncica de angioplastia com utilização de filtro de proteção e um stent autoexpansível, o qual é dilatado após a sua liberação no local doente da artéria. Aspecto inicial da lesão na bifurcação carotídea (A). Passagem do filtro de proteção embólica distal (B). Passagem do cateter de liberação do stent pela lesão (C). Liberação do stent pela retirada da bainha protetora do cateter de liberação (D). Uma vez o stent bem posicionado (E), é avançado o balão de angioplastia (F) e realizada a insuflação do mesmo para dilatar a estenose arterial (G). Para finalizar retira-se o cateter de angioplastia (H) e recolhe-se o filtro de proteção embólica (I). Aspecto final (J). A B C D E F G H I J FHM Moléstias Vasculares 29 Angiografias e Técnicas Endovasculares Charles Angotti Furtado de Medeiros Complicações Os procedimentos endovasculares, como qualquer outra modalidade terapêutica, não estão isentos de complicações. Assim, a abordagem percutânea para o tratamento da doença coronariana, da doença arterial periférica e da doença cérebro-vascular, resulta num aumento da incidência de complicações arteriais e venosas pós-cateterismo, o que torna crescente a proporção das lesões iatrogênicas na epide- miologia do trauma vascular. O risco e a gravidade das complicações variam enormemente de acordo com o local escolhido para pun- ção, o tamanho dos catéteres utilizados, a existência de doença concomitante e a experiência do serviço. Mas, no geral, são mais raras nos exames puramente diagnósticos em relação aos procedimentos terapêuticos, devido ao calibre do material utilizado e ao tempo em que o vaso permanece cateterizado. As complicações mais sérias correspondem a quase metade do total e ocorrem em aproximadamente 5% dos procedimentos terapêuticos. As complicações mais simples, como um pequeno hematoma ou uma leve infecção, são facilmente tra- tadas. Entretanto, algumas das complicações são difíceis de resolver, pois necessitam de correção em caráter de urgência e frequentemente acontecem em pacientes críticos, que não dispõem de avaliação pré-operatória adequada. Outra preocupação aqui presente é a distorção das estruturas anatômicas, que dificulta uma rápi- da exposição e aumenta o risco de lesões adicionais indesejadas, bem como a incidência de infecção. Complicações do local de acesso e embolização distal são as mais comuns enquanto que perfuração, dissecção com oclusão, fragmentação de catéteres e migração de stents são mais raras (Tabela 2). As compli- cações do local de acesso incluem: sangramento, pseudoaneurisma, fístula arteriovenosa (FAV), dissecção e infecção. O hematoma retroperitoneal é um tipo à parte de sangramento que ocorre em menos de 0,5% dos procedimentos. É uma complicação grave, em geral devido à punção inadvertida da artéria ilíaca externa. O pseudoaneurisma decorre do extravasamento de sangue através do orifício da punção na parede arterial para os tecidos adjacentes. É constituído de uma cápsula fibrosa que, devido à comunicação direta com a luz arterial, forma uma massa pulsátil junto ao local de acesso. Pseudoaneurismas pequenos resolvem espontaneamente e não requerem tratamento a não ser que sejam sintomáticos. A conduta inicial consiste em repouso e repetir o mapeamento dúplex em três semanas, enquanto que a compressão guiada por US é a primeira escolha no tratamento dos pseudoaneurismas maiores e/ou sintomáticos. A técnica envolve posicionar o transdutor imediatamente acima do orifício e comprimir até a interrupção do fluxo, man- tendo-o assim por dez a 30 minutos. A cirurgia está reservada para os casos de rotura, pacientes obesos, pseudoaneurismas grandes, na vigência de anticoagulação ou no insucesso da compressão guiada por US. Outras modalidades mais recentes de tratamento incluem: a injeção de trombina, a embolização com mola e a colocação de stent revestido. A FAV é o resultado da punção inadvertida da artéria e da veia adjacente durante o acesso. Há presença de frêmito no local de acesso e sopro contínuo com reforço sistólico durante a ausculta. O diagnóstico é facilmente comprovado pela ultrassonografia. Via de regra, a comunicação entre a artéria e a veia é de pe- quenas dimensões e, portanto, a maioria irá fechar espontaneamente dentro de seis semanas. A lesão da íntima, geralmente secundária a uma dissecção, favorece a formação da trombose arterial. O quadro clínico e o tratamento são semelhantes àqueles da oclusão arterial aguda. O prognóstico é extre- mamente variável, e depende dos mecanismos de compensação, tempo de isquemia, presença de circulação colateral e extensão da trombose. A embolização distal é desencadeada pela fragmentação de placas ateroscleróticas durante a passagem dos fios guias e dos catéteres utilizados. A microembolização ocorre frequentemente, mas só é detectada raramente. Entretanto, dependendo do órgão-alvo (cérebro, rim), pode ter consequências catastróficas. O mais importante é prevenir o seu acontecimento com treinamento adequado e manipulação delicada dos instrumentos. Nas angioplastias de carótida está indicado o uso de dispositivos de proteção cerebral (filtros e balões de oclusão) e o uso de antiagregantes plaquetários para diminuir tais complicações. A macroem- bolização também é comum. Várias manobras podem ser realizadas, dependendo de cada caso, e incluem: aspiração, trombectomia mecânica, angioplastia, trombólise e cirurgia. Moléstias Vasculares30 Angiografias e Técnicas Endovasculares Charles Angotti Furtado de Medeiros A trombose venosa profunda é caracterizada pela presença de trombo intravenoso junto ao sítio de pun- ção associada à lesão da parede venosa, mas que raramente obstrui totalmente a luz da veia. É pouco frequente e tem seu risco aumentado quando houver múltiplas punções ou com a utilização de catéteres mais calibrosos. A neuralgia femoral é determinada por trauma direto na punção ou distensão das fibras nervosas pelohematoma. Causa dor e/ou parestesia da região inguinal que irradia para a face medial da coxa e joelho. O diagnóstico é clínico e a evolução, extremamente variável. Nos casos muito sintomáticos, é recomendada a administração oral de estabilizadores de membrana neuronal, como por exemplo, a carbamazepina. As fístulas linfáticas são raras e resultam do trauma direto dos vasos linfáticos. Podem ocorrer a drena- gem contínua de secreção linfática ou a presença de abaulamento sem sinais flogísticos próximo ao local de acesso. O tratamento consiste em curativo compressivo e repouso. A infecção no local da punção é pouco frequente, mas potencialmente grave. Os organismos típicos são Staphyloccoccus aureus e Staphyloccoccus epidermidis. O tratamento consiste em antibioticoterapia e, se necessário, exploração cirúrgica e debridamento. Pode se sobrepor a um pseudoaneurisma e/ou a uma fístula linfática preexistentes. Tabela 2 - Frequência das Complicações Importantes. Mais comuns Pseudoaneurisma Trombose arterial Embolização distal Sangramento Fístula arteriovenosa Menos comuns Trombose venosa profunda Lesão neurológica Lesão linfática Corpo estranho Perfuração Moléstias Vasculares 31 Pontos Essenciais no Diagnóstico • Doença sistêmica (mecanismo de “envelhecimento” do sistema arterial) • Acomete territórios cerebral, coronariano, vascular periférico e renal • Forte associação com fatores de risco: tabagismo, diabetes melito, au- mento dos lípides e hipertensão arterial. Considerações Gerais Diversos trabalhos mais modernos têm demonstrado que a aterosclerose é uma doença inflamatória por natureza. As lesões da aterosclerose ocorrem nas artérias de grande e médio calibre e podem causar isquemia do coração, cérebro e extremidades. A aterosclerose está associada a diversos fatores de risco. O principal deles é o tabagismo. A nicotina é uma forte causadora de dependência física, produzindo sin- tomas de abstinência na sua retirada. Usuários de tabaco têm duas vezes mais risco de morte por doença cardíaca, duas a três vezes maior risco de acidente vascular ce- rebral e dez vezes mais risco de câncer de pulmão, sem levar em consideração o risco de câncer bucal, laringe, esôfago e bexiga. Aumenta a incidência de enfisema pul- monar, osteoporose e úlcera péptica. Em média os fumantes morrem entre cinco e oito anos mais cedo do que não fumantes. São descritos cinco atitudes para auxiliar os fumantes a parar de fumar: 1) sistematicamente perguntar pelo uso do cigarro em toda consulta. 2) recomendar veementemente em toda consulta que o paciente pare de fumar. 3) perguntar a cada paciente se ele quer parar de fumar naquele momento. 4) orientar estratégias para a cessação do tabagismo: o paciente deve escolher uma data e preparar os familiares e o ambiente para tal, removendo todo cigarro e revendo as tentativas antigas, para evitar o que causou o retorno ao hábito de fumar. Deve-se estimular o uso de nicotina em outras formas, como na forma de adesivos, cuja duração de uso não deve exceder oito semanas e as doses devem ser progressivamente reduzidas; de goma de mascar com nicotina, cuja dose deve ser 2 mg (máximo de 30 tabletes ao dia) para pacientes que fumam menos de um maço ao dia e 4 mg (máximo de 20 tabletes ao dia) para pacientes que fumam mais de um Aterosclerose e Dislipidemia 4 Capítulo John Cook Lane e Fábio Hüsemann Menezes Moléstias Vasculares32 Aterosclerose e Dislipidemia John Cook Lane e Fábio Hüsemann Menezes maço ao dia. A goma deve ser mantida na cavidade oral por 30 minutos para permitir a absorção da nicotina e a duração do uso da goma em geral é de alguns meses. Outro recurso é o uso de Bupropion (Zyban plus®) de libe- ração lenta, um antidepressivo atípico que parece atuar no sistema da Dopamina e cujo efeito é diminuir o desejo de fumar. É utilizado na dose de 150 mg ao dia por três dias e, após, 150 mg duas vezes ao dia. Deve-se parar de fumar após sete dias de uso da medicação, a qual deve ser mantida por 12 semanas. A abstinência deve ser total, outros membros da família não devem fumar e não se deve consumir bebidas alcoólicas. 5) Um retorno à consulta deve ser marcado brevemente e o paciente elogiado pelo sucesso e reiterando o esforço em manter o tratamento. Caso o paciente não consiga atingir o objetivo, pode-se procurar auxílio de clínicas especializadas. Das várias causas que podem produzir aterosclerose, o aumento do colesterol é um dos mais importantes. Esta gordura é encontrada no plasma sanguíneo e em todas as células do nosso organismo, fazendo parte das membranas celulares, dos hormônios esteroides, da bile e um dos principais componentes das placas de ateroma encontradas nas artérias coronárias, carótidas e periféricas. Os dois principais lípides do organismo são o colesterol e o triglicéride. Eles são carregados por lipoproteínas, que são partículas globulares que contém apoproteínas. As lipoproteínas são classificadas de acordo com a sua densidade, dependendo da quantidade de triglicérides (que as torna menos densas) e de apoproteínas (que as deixa mais pesadas). As menos densas de todas são chamadas de quilomícron e são percebidas no sangue após uma dieta rica em gorduras. Quando o soro é centrifugado, sepa- ram-se três outros tipos de lipoproteínas: uma de alta densidade (HDL – high density lipoprotein), que basicamente consiste em apoproteínas e colesterol. Uma de densidade baixa (LDL – low density lipoprotein), que carrega a maior parte do colesterol circulante. E uma de densidade muito baixa (VLDL – very low density lipoprotein), que carrega grande quantidade de triglicérides. Os quilomícrons são completamente metabolizados, transferindo a energia para músculos e células gordurosas. O VLDL é sintetizado pelo fígado a partir dos seus próprios estoques de gordura e carbohidratos, transferindo a seguir o triglicéride para os tecidos. Quando perdem suficiente quan- tidade de triglicérides, transformam-se em LDL que irá fornecer o colesterol para os tecidos. O excesso de LDL é captado pelo fígado e excretado como bile. O HDL é sintetizado pelo fígado e intestinos e funciona como um facilitador do transporte de apoproteínas entre as lipoproteínas. Elas também participam do transporte reverso do colesterol, retirando-o das outras lipoproteínas e entregando ao fígado. O colesterol vem de duas fontes. É produzido principalmente pelo fígado (endógeno) e em alimentos animais (exógeno), tais como carnes, aves e peixes, os quais têm geralmente menos colesterol do que outras carnes. Alimentos vindos das plantas tais como frutas, vegetais, grãos, nozes e sementes, não contém colesterol. Tabela 1. Interpretação dos níveis do colesterol e suas variantes, como também dos triglicérides, segundo a Clínica Mayo ( valores em mg/dl = miligrama por decilitro) Colesterol Total < 200 200-239 ≥ 240 LDL colesterol < 100 100-129 130-159 160-189 ≥ 190 HDL colesterol < 40 ≥ 60 Triglicérides < 150 150-199 200-499 ≥ 500 Níveis Desejável Limite desejável Alto Níveis Ótimo Quase ótimo Limite desejável Alto Muito alto Níveis Baixo Alto (recomendável) Níveis Desejável Aceitável Alto Muito alto Moléstias Vasculares 33 Aterosclerose e Dislipidemia John Cook Lane e Fábio Hüsemann Menezes Algumas pessoas parecem ter uma pré-disposição genética para níveis altos de colesterol ou tri- glicérides. Assim poderá ocorrer um infarto cardíaco em idade mais precoce e maior risco de acidentes vasculares cerebrais. O achado de níveis elevados de lipídes no plasma é um alerta e algumas medidas deverão ser tomadas para prevenir doenças cardiovasculares, embora em alguma fase da vida todas as pessoas terão a doença.Um nível elevado do LDL-c (colesterol associado a lipoproteína de baixo peso moelcular) não é dese- jável e torna-se um risco para nossa saúde. O uso da dosagem do colesterol total para o controle da doença pode ser enganoso, uma vez que o valor do LDL-c é calculado a partir da fórmula: LDL-c (mg/dl) = coles- terol total menos HDL-c, menos (triglicérides/5). Assim sendo, algumas pessoas podem apresentar um nível alto de colesterol total e também um nível alto de HDL-c, resultando em um LDL-c normal. Outra pessoa com o mesmo nível de colesterol total pode apresentar um baixo valor de HDL-c e triglicérides, resultando em alto valor de LDL-c. Os níveis expressos na Tabela 1.1 servem de guia, mas podem variar de acordo com a idade, sexo, história familiar e estado geral da saúde da pessoa. As medidas mais importantes para o controle dos níveis de colesterol são: controle através da dieta (alimentos ricos em colesterol são ovos, carnes gordurosas, lagosta, caranguejo, camarão e pele do frango; já o álcool em moderação tem sido apontado como fator que eleva o HDL) e o controle com uso de remédios, dentre os quais se destacam o ácido nicotínico (niacina), que atua reduzindo a produção do VLDL-c; as resinas de quelação da bile, que atuam forçando o fígado a aumentar a produção de bile e a excreção do colesterol; os inibidores da enzima HMG-CoA redutase (estatinas), que atuam diminuindo a produção de LDL-c pelo fígado; os fibratos, que atuam reduzindo a síntese e aumentando o consumo de VLDL-c e uma droga nova, ezetimibe, que inibe a absorção intestinal de colesterol por agir diretamente na parede do intestino. Existe um efeito protetor do hormônio estrógeno sobre os níveis de LDL, de maneira que as mulheres estão mais protegidas durante a idade fértil. Após a menopausa, o nível do hormônio estrógeno cai drasti- camente e as diferenças da doença entre os sexos se estreitam. O aumento do hábito do tabagismo entre as mulheres trouxe um aumento do risco de doenças cardiovasculares. A hipertensão arterial é reconhecida como uma das causas de aterosclerose em que o médico pode atuar positivamente. A redução dos níveis pressóricos têm alto impacto na incidência de acidente vascular cerebral e na mortalidade por infarto do miocárdio. As principais estratégias para o controle da hipertensão são a diminuição da ingestão de sódio (aumentando a ingestão de potássio, cálcio e magnésio), a redução do peso corporal, aumentar a atividade física e reduzir a ingestão de álcool e o tabagismo. Os medicamentos mais utilizados são da classe dos diuréticos, β-bloqueadores, inibidores da enzima conversora do angioten- sinogênio, bloqueadores de cálcio, antagonistas dos receptores α, drogas com ação simpatolítica central, dilatadores arteriolares e inibidores da atividade simpática periférica. A hiperhomocisteinemia também é reconhecida como fator de risco para a aterosclerose e pode ser evitada pela ingestão adequada de folatos e vitamina B6 e B12. O diabetes melito é outro fator de risco importantíssimo, principalmente para os pacientes com do- ença vascular periférica, visto que as alterações associadas da sensibilidade e a menor resistência a infecções resultam em um risco muito alto de gangrena e perda dos membros (veja capítulo 7). Por último o sedentarismo é um fator importante, sendo considerado apenas inferior ao tabagismo como fator de risco para a morte por causa cardiovascular. O exercício físico regular de intensidade mo- derada auxilia na manutenção do peso e redução da hipertensão arterial, hiperlipidemia, diabetes tipo 2, osteoporose e doenças cardiovasculares. Recomenda-se atividade física por pelo menos 30 minutos e com intensidade moderada, cinco vezes por semana; ou com maior intensidade, duas a três vezes por semana. Mecanismo da gênese da Aterosclerose Acreditava-se que a aterosclerose iniciava-se pela denudação do endotélio do vaso. Atualmente acredita- se que o processo da doença inicia-se por uma disfunção do endotélio da artéria. O endotélio é um órgão com Moléstias Vasculares34 Aterosclerose e Dislipidemia John Cook Lane e Fábio Hüsemann Menezes um sistema complexo que controla a homeostasia, isto é, o equilíbrio em relação às suas várias funções e à com- posição química dos fluidos e tecidos do organismo, integrando as forças entre a parede e a luz das artérias. Em condições normais, o endotélio controla o tônus vascular e a fluidez do sangue. Inúmeros fatores podem alterar sua função, sendo de natureza complexa e ainda carecem de elucidação. A Figura 1 mostra em esquema como se desenvolvem as lesões ateroscleróticas. Figura 1 - Esquema da disfunção endotelial responsável pelo desenvolvimento da aterosclerose. A artéria normal, quando submetida aos fatores de risco, desencadeia a adesão e migração de células inflamatórias para a parede vascular (A) resultando no depósito de lípides na camada íntima, conhecido como estrias gordurosas (B) e, levando à formação da placa de ateroma no seu estágio de placa fibrosa (C). A B C FHM A lesão endotelial (aumentada em decorrência do tabagismo, hipertensão, diabetes melito, etc.) de- sencadeia a adesão e a migração de leucócitos através do mesmo. Entram também células musculares lisas, monócitos e macrófagos. O endotélio lesado permite a passagem e acúmulo de LDL-c, o qual, passando por uma oxidação progressiva irá aumentar a lesão. Assim, inicia-se um processo inflamatório que, em si, estimula maior entrada de lipoproteínas e células inflamatórias, estabelecendo-se um ciclo vicioso. A Figura 2 ilustra o progresso da doença com depósito de lípides, migração de células musculares, linfócitos e a formação da placa complexa. A produção de radicais livres pelas células inflamatórias agride ainda mais o endotélio. O HDL-c funciona como um agente protetor, uma vez que penetra na parede arterial e remove o LDL-c ali depositado. Figura 2 - Nas fases mais avançadas da doença encontra-se a placa complexa, onde há grande celulari- dade, formação de vascularização pela camada adventicial e ocorre a calcificação da placa de ateroma. A obstrução aguda do vaso pode ocorrer quando a placa de ateroma se torna muito volumosa, ou quando ocorre a ruptura da superfície endotelial. FHM Moléstias Vasculares 35 Aterosclerose e Dislipidemia John Cook Lane e Fábio Hüsemann Menezes Uma placa de ateroma pode degradar-se e romper. Quando isto ocorre, há a formação de trombos e con- sequentemente de fonte embolígena ou obstrução arterial aguda. As placas mais ricas em gordura apresentam maior propensão a desencadear acidentes tromboembólicos agudos. As placas mais fibrosas são mais estáveis. Este mecanismo é considerado responsável por 50% das síndromes isquêmicas coronarianas agudas. O fluxo turbulento parece ser importante na gênese da placa, por isso as alterações das paredes das artérias são mais pronunciadas nas curvaturas e bifurcações das mesmas. As placas de ateroma, ao se desenvolverem, tendem a ocupar mais a parede posterior das artérias. À medida que a luz arterial vai se estreitando, a parede dilata-se, tentando compensar a queda de fluxo. Isto acontece em decorrência do aumento local de velocidade e, consequentemente, do atrito do fluxo (shear stress). Quando a obstrução alcança 70% ou mais da área (50% do diâmetro) do vaso, ocorre a diminuição do fluxo distal. A figura 3 ilustra as consequências clínicas da aterosclerose. Em resumo, aterosclerose é uma complexa doença inflamatória das artérias, que conhecemos em parte, necessitando maiores investigações para que um dia possa ser controlada. As medidas indicadas para diminuir o progresso da aterosclerose incluem em primeiro lugar a abstenção do fumo, o exercício físico regular (30 a 40 minutos no mínimo cinco vezes por semana), o controle da hipertensão
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