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FISIOPATOLOGIA DA DOR 1. Definições 1.1. Dor 1.2. Dor aguda e dor crônica 1.3. Dor nociceptiva e dor neuropática 2. Neuroanatomia 2.1. Sistema periférico: 2.1.1. Nociceptores 2.1.2. Tipos de nociceptores 2.2. Vias centrais da dor: 2.2.1. Aferências nociceptivas ao SNC (neurônio de primeira ordem) 2.2.2. Neurônios nociceptivos da medula espinhal (neurônio de segunda ordem) 2.2.3. Vias ascendentes (neurônio de segunda ordem) 2.2.4. Mecanismos tálamo-corticais (neurônio de terceira ordem) 3. Neurotransmissores e sistemas neuromoduladores da dor 3.1. Neurotransmissores 3.2 Ativação dos nociceptores 3.3. Transmissão e modulação da informação nociceptiva no SNC 3.3.1. Neurobiologia das aferências primárias no corno posterior da medula 3.3.2. Sistemas endógenos de controle da dor 4. Fisiopatologia da dor Bibliografia 1. DEFINIÇÃO 1.1 DOR A Associação Internacional para o estudo da Dor (IASP) define a dor como: "Uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a uma lesão real ou potencial, que se descreve como causada por uma lesão”. Segundo McCaffrey: “Dor é o que o paciente diz ser e existe quando ele diz existir”. A definição defendida pela IASP modificou o que se via anteriormente por introduzir novos conceitos tais como considerar como não sendo uma experiência unicamente nociceptiva, integrada por componentes emocionais e subjetivos; e também por produzir causa somática que a justifique. 1.2. DOR AGUDA E DOR CRÔNICA A diferença entre a dor aguda e a dor crônica ocorre devido ao fator tempo, baseado nos distintos mecanismos fisiopatológicos que os originam. A dor aguda é conseqüência imediata da ativação do sistema nociceptivo, geralmente por um dano tissular somático ou visceral, sendo limitado, desaparecendo com a lesão que o originou. Tem uma função de proteção biológica ao atuar como um sinal de alarme do tecido lesionado. Os sintomas psicológicos associados são escassos e, habitualmente, limitados a uma ansiedade leve. Trata-se de uma dor de natureza nociceptiva e que aparece por uma estimulação química, mecânica ou térmica de receptores específicos. A dor crônica, por sua vez, não possui uma função protetora, é em si mesma uma doença. Não é um processo auto-limitado, podendo persistir por tempo prolongado depois da lesão inicial, incluindo a ausência de lesão periférica. 1.3. DOR NOCICEPTIVA E DOR NEUROPÁTICA Podem ser definidos dois tipos de dor, a nociceptiva e a neuropática, que representam os dois extremos de sensações integradas no sistema nervoso central (SNC). A dor nociceptiva (dor dita “normal”) aparece em todas as pessoas e é produzida por uma lesão somática ou visceral. A dor somática se origina por uma lesão ao nível da pele, músculo, ligamentos, articulações e ossos; caracteriza-se pela localização precisa, ao redor da zona lesada, não sendo acompanhada por reações vegetativas. Essa dor afeta órgãos internos, mesmo que nem todas as vísceras sejam sensíveis a dor. Caracteriza-se por ser de localização inespecífica e por se estender além do órgão lesionado. Freqüentemente se localiza numa superfície do organismo distante da víscera que o origina, sendo denominada dor referida. Pode vir acompanhada de reações vegetativas. A dor neuropática (também chamada de “anormal” ou “patológica”) é resultado de uma doença do Sistema Nervoso Periférico Central. Isso acontece porque o sistema nociceptivo se comporta de forma anormal, não havendo relação causal entre a lesão tissular e a dor. Tem como característica a presença de alodínia (dor perante estímulos habitualmente não dolorosos). Como exemplo, as monoradiculopatias, a neuralgia do trigêmeo e a pós herpética, dor do membro fantasma, dentre outras. Um exemplo da dor neuropática está descrito na figura abaixo (figura 1). 2. NEUROANATOMIA 2.1. SISTEMA PERIFÉRICO 2.1.1. NOCICEPTORES Na maior parte dos órgãos e sistemas do corpo, existe um grupo especial de receptores sensoriais conhecidos como nociceptores. Sua característica principal é a capacidade de diferenciar estímulos comuns dos estímulos nocivos ao organismo. Isso ocorre em função da capacidade dos nociceptores de codificar a intensidade de um estímulo doloroso, respondendo de forma irregular aos estímulos de intensidade baixa. Devido à sua capacidade de responder aos estímulos dolorosos, os nociceptores foram chamados de “receptores da dor”. 2.1.2. TIPOS DE NOCICEPTORES Em função da sua localização e das suas características diversas, podem ser descritos três tipos de nociceptores: a) CUTÂNEOS; b) MUSCULARES E ARTICULARES; c) VISCERAIS a) NOCICEPTORES CUTANEOS Até o momento estes tem sido os mais estudados devido ao seu acesso. Estes apresentam três propriedades fundamentais: 1) Um alto umbral à estimulação cutânea; 2) Capacidade para codificar a intensidade dos estímulos aparentemente nocivos; 3) Falta de atividade espontânea na ausência de um estímulo nocivo prévio. Existem dois tipos fundamentais de nociceptores cutâneos em função da velocidade de condução de suas fibras aferentes: Nociceptores A-: São as terminações sensoriais de fibras mielínicas de pequeno diâmetro com velocidade de condução de 5 a 30 metros/segundo, e que respondem quase que exclusivamente a estímulos nocivos do tipo mecânico. Localizam-se nas camadas superficiais da derme apresentando ramificações que se estendem até a epiderme. Respondem a estímulos mecânicos com umbrais mais altos que os mecanorreceptores de baixo umbral, cuja ativação está relacionada com o sentido do tato. Os nociceptores A- respondem especialmente bem a furadas e beliscos aplicados na pele, ou a penetração de objetos punçantes. Nociceptores C: São as terminações nervosas de fibras aferentes amielínicas com velocidade de condução inferiores a 1,5 metro/segundo. Apresentam-se como terminações simples na pele e que respondem a estímulos nocivos mecânicos, térmicos ou químicos. Também são ativados por substâncias liberadas pelo dano tissular, como: bradicinina, histamina, acetilcolina e íons de potássio. Por sua capacidade de resposta a uma grande variedade de estímulos nocivos são denominados “nociceptores polimodais”. Há ainda os receptores silentes, que somente são ativados quando há inflamação ou lesão tissular, e uma vez ativados respondem a uma grande variedade de estímulos. b) NOCICEPTORES MUSCULARES E ARTICULARES Nos músculos os nociceptores são terminações de fibras A-fibras do grupo III) e de fibras C (fibras do grupo IV). As do grupo III respondem aos íons potássio, bradicinina, serotonina e a contrações mantidas do músculo. As fibras do grupo IV respondem a estímulos como pressão, calor e isquemia. As articulações são inervadas por nociceptores que respondem a movimentos articulares nocivos e são conhecidos como terminações de fibras aferentes amielínicas. São estimulados na presença de fatores liberados pelo dano tissular e podem ser sensibilizados pela inflamação local da articulação. c) NOCICEPTORES VISCERAIS São os receptores menos conhecidos. Existem no coração, pulmões, vias respiratórias, testículos, sistema biliar, ureter e útero. Outras vísceras, especialmente as do trato gastrintestinal estão inervadas por receptores sensoriais não específicos. Os nociceptores viscerais respondem a estímulos capazes de causar dor visceral. A maior parte dos nociceptores viscerais é de terminações livres de fibras aferentesamielínicas, que participam de sensações geradas pela isquemia cardíaca, irritação da árvore traqueobrônquica, congestão e embolia pulmonar, lesões nos testículos, cólicas renais e biliares e na dor do trabalho de parto. Estas terminações nervosas não somente têm uma função receptora, como também são capazes de liberar substâncias por “ativação antidrômica”, dentre elas a substância P (SP) e glutamato, e a proximidade destas terminações a pequenos vasos sanguíneos e aos mastócitos origina vasodilatação e extravasamento plasmático, que se é muito grande origina o edema. 2.2. VIAS CENTRAIS DA DOR 2.2.1. AFERENCIAS NOCICEPTIVAS AO SNC (neurônio de primeira classe) As fibras aferentes primárias que inervam os nociceptores periféricos têm seus corpos celulares nos gânglios raquídeos, alcançando seus ramos na medula espinhal através das raízes dorsais e terminando na substância cinzenta da raiz posterior. Portanto, o primeiro neurônio das vias de dor tem sua extremidade distal na periferia, no corpo e no gânglio raquídeo e no extremo proximal até a região da medula espinhal. 2.2.2. NEURONIOS NOCICEPTIVOS DA MEDULA ESPINHAL (neurônio de segunda classe) A maior parte dos neurônios nociceptivos da medula espinhal se encontram situadas na zona de terminação das fibras aferentes conectadas com nociceptores: lâminas I, II, IV e V. Existem dois grupos de neurônios nociceptivos, no que diz respeito às suas aferências cutâneas: a) De Segunda Classe: Neurônios ativados por estímulos de baixo umbral (não nociceptivos), assim como por aferências nociceptivas, também denominados multirreceptores. b) De Terceira Classe: neurônios ativados por aferências nociceptivas, denominados nocirreceptores (mecanorreceptores). NEURÔNIOS DE SEGUNDA CLASSE A maioria destes neurônios é encontrada em áreas profunda da lâmina posterior (IV, V e VI) e alguns nas áreas superficiais (I, II) do corno na medula. Recebem aferências excitatórias de diversos tipos de receptores sensoriais cutâneos, musculares e viscerais. São incapazes de distinguir entre estímulos nocivos danosos dentre os estímulos banais, além de não localizarem precisamente os estímulos periféricos. Por outro lado, são capazes de sensibilizarem-se perante estímulos repetidos, diferentemente dos neurônios sensoriais (primeira classe) que tendem a se dessensibilizar diante de uma estimulação repetida. NEURONIOS DE TERCEIRA CLASSE Estes são encontrados principalmente na lâmina I, e em menor número na lâmina V. São responsáveis pela ativação de aferências nociceptivas, no que tem um papel importante na sinalização do caráter nocivo de um estímulo. Possuem pequenas áreas receptoras por onde participam dos processos de localização fina dos estímulos periféricos nocivos ao organismo. 2.2.3. VIAS ASCENDENTES (neurônios de segunda classe) Grande parte dos neurônios nociceptivos medulares enviam seus axônios aos centros supraespinhais, talâmicos e bulbares (os mais importantes são o complexo medular reticular e o do mesencéfalo; a substância cinzenta e o núcleo ventro-póstero-lateral do tálamo). A maior parte da informação nociceptiva é transmitida por vias cruzadas ascendentes, situadas na região anterolateral da medula espinhal, sendo que existem fibras que ascendem de forma ipsilateral. Os fascículos melhores definidos anatomicamente são o espino-talâmico, o espino-reticular e o espino-mesencefálico. Os neurônios das lâminas profundas do corno posterior se projetam desde a área reticular do mesencéfalo e outras áreas relacionadas em respostas motoras e somato-sensoriais perante os estímulos nociceptivos. Outros fascículos se situam ao nível da substância branca, do funículo dorsolateral e das colunas dorsais especialmente relacionadas com a dor de origem visceral. 2.2.4. MECANISMOS TÁLAMO-CORTICAIS (neurônios de terceira classe) A sensação dolorosa compreende dois componentes diversos: o componente discriminativo-sensorial e o componente afetivo. Os primeiros estão mediados pelo complexo ventro-basal do tálamo, já o afetivo é mediado pelo núcleo talâmico medial e por zonas corticais prefrontal e supraorbital. Vias ascendentes e estruturas subcorticais e corticais implicadas na transmissão dolorosa. PAG (substancia cinzenta periacdutal). PB (núcleo parabraquial da protuberância).VMpo (parte ventromedial do complexo posterior). MDvc (parte ventrocaudal do núcleo mediodorsal).VPL (núcleo ventro- posterior lateral). ACC (córtex cingulado anterior). PCC (córtex cingulado posterior). HT (hipotálamo). S-1, S-2 (áreas somato-sensoriais corticais). PPC (complexo parietal posterior). SMA (área motora suplementar). AMYG (amídala). PF (córtex pré-frontal) 3. NEUROTRANSMISSORES E SISTEMAS NEUROMODULADORES DA DOR Durante a transmissão, o estímulo nociceptivo pode ser modulado por diversos mecanismos. Existem muitos mediadores químicos e substâncias transmissoras envolvidas na dor, tanto em nível periférico (local da lesão) como no SNC. A sensação de dor (final) dependerá da interação destas substâncias. A chave para a compreensão das interações é o conhecimento dos receptores, já que sua ativação é necessária para a ação dos transmissores e mediadores químicos. Alguns receptores são excitatórios enquanto outros são inibitórios, da mesma forma que uns produzem grandes mudanças na atividade neural, inversamente aos que produzem mudanças leves ou moderadas. A estimulação de receptores excitatórios produz uma ativação neuronal que aumenta a liberação de transmissores e a excitabilidade neuronal. Contrariamente, a estimulação de receptores inibitórios diminui a atividade neuronal, reduzindo a liberação de transmissores e fazendo com que os neurônios se tornem menos excitáveis. Os receptores excitatórios são peças-chave no sistema de dor e sua transmissão, enquanto que a analgesia pode ser produzida tanto por ativação de sistemas inibitórios como pelo bloqueio dos sistemas excitatórios. 3.1 NEUROTRANSMISSORES. A transmissão sináptica é mediada por neurotransmissores aminoácidos e aminas que agem em canais iônicos ativados por esses neurotransmissores, sendo que estes podem ter ações mais lentas, mais duradouras e mais diversificadas. As proteínas G (proteína ligante de guanosina trifosfato) podem exercer seus efeitos através da ativação direta de certas enzimas. Essa ativação tende a liberar reações bioquímicas, tais como cascatas, que terminam na ativação de outras enzimas situadas mais abaixo, que alteram a função neuronal. Entre a primeira e a última enzima existe vários segundos mensageiros. Uma vez liberados os neurotransmissores, eles devem interagir com os receptores pós sinapticos, e daí removidos da fenda sináptica para permitir um novo ciclo de transmissão sináptica. Isso ocorre através dos transportadores de neurotransmissores existentes nas membranas da glia que envolve a sinapse ou pela degradação enzimática da própria fenda sináptica. A acetilcolina (ACO) é um neurotransmissor na junção neuromuscular. A síntese desta necessita de uma enzima específica, a colina acetiltransferase. Trata-se de um tipo de neurônio colinérgico. Outro tipo de neurotransmissores diz respeito às catecolaminas. Nesse grupo, a tirosina é o precursor de três distintos neurotransmissores de estrutura química denominada catecol, sendo elas: dopamina, noradrenalina e adrenalina (também conhecida comonorepinefrina). Todos esses neurônios contém uma enzima denominada tirosina hidroxilase, um catalisador do primeiro passo da síntese de catecolaminas, na conversão de tirosina em dopa. Os neurônios serotoninérgicos possuem o neurotransmissor serotonina, derivado do ácido triptofano. A síntese da serotonina acontece em duas etapas: primeiramente o triptofano é onvertido em 5-HTP e logo depois é convertido em 5-HT pela enzima 5-HT descarboxilase. Síntese de catecolaminas a partir de tirosina. Os neurotransmissores catecolaminérgicos estão em negrito. Os neurônios amino-acidérgicos tem como componentes o Glutamato, e o àcido gama- aminobutírico (GABA). O precursor do GABA é o glutamato, e a enzima-chave na sua síntese é o glutamato descarboxilase (GAD). Este é um marcador de neurônios GABAérgicos. CASCATA 3.2. ATIVAÇÃO DOS NOCICEPTORES A lesão tissular libera substâncias químicas com capacidade algogênica ao redor das terminações periféricas dos nociceptores. Estas substâncias são mais precisamente: íons (H+ e K+), neurotransmissores (serotonina e noradrenalina), citosinas, eicosanoides (prostaglandinas, leucotrienos), aminas (histamina), cininas (bradicinina) e peptídeos (substancia P e peptídeo relacionado com o gene da calcitonina (CGRP)). Algumas delas excitam diretamente a membrana do nociceptor C (polimodal), enquanto que outros modulam sua sensibilidade nociceptiva. A ativação e inativação dos nociceptores é conseqüência dos fluxos iônicos através das membranas e implica em mudanças na condução do sódio, potássio e cálcio, mudanças derivadas da aberturas dos canais associados a receptores de membrana ou ao efeito sobre os mesmos, da ativação da cascata de segundos mensageiros. A aplicação de um estímulo (mecânico, térmico ou químico) a um subtipo determinado de nociceptor induz a despolarização da membrana do nociceptor e à geração de um potencial de ação até o corno dorsal e logo em seguida aos centros encefálicos. Se o estímulo tem uma intensidade suficiente para causar a dor, mas não é lesivo, ocorrerá uma percepção nervosa e o nociceptor se recuperará rapidamente à sua sensibilidade basal. Nos processos lesivos de maior duração, ocorrerá hiperalgesia periférica, que modifica o estado basal do nociceptor, alterando a resposta frente a um estímulo nociceptivo. Os mediadores mais conhecidos na ativação e sensibilização de nociceptores são: Hidrogênio e Potássio – Aparecem nos exsudatos inflamatórios causam sobre alguns neurônios sensoriais uma despolarização rápida, como conseqüência do aumento da condutância a Na e Ca. Em algumas ocasiões ativam os nociceptores silentes. Serotonina – A serotonina ou 5-hidroxitriptamina (5-HT) é um importante neurotransmissor. Ela intervém nos mecanismos de dor por diversas vias; em nível periférico, a lesão tissular produz a liberação de 5-HT, facilitando a ativação de nociceptores periféricos, sobretudo através da ativação de receptores 5-HT em fibras C. Os outros subtipos de receptores potencializam a ativação de outras fibras nervosas perante diversas substâncias químicas. Oxido Nítrico – Este é um radical livre que atua como mensageiro e está relacionado à transmissão dolorosa em nível periférico e central. Apesar de se comportar como segundo mensageiro, tem a característica de ser solúvel em meios lipídicos, e por isso se difunde rapidamente, de onde é produzido até as células ao seu redor. O NO se sintetiza na conversão do aa L-arginina a L-citrulina, processo que ocorre através da NO sintetase. Histamina – Liberada por diversos estímulos a partir dos mastócitos, determina a vasodilatação e extravasamento do plasma. Bradicinina (BC) - É um peptídeo produzido por proteases tissulares e plasmáticas tanto ao nível do plasma como dos tecidos periféricos. Os efeitos mais importantes estão determinados pela ativação de dois tipos diversos de receptores: B1 e B2. Prostaglandinas (PG) - São substâncias derivadas do metabolismo do acido araquidônico como produtos da atividade enzimática da ciclooxigenase (COX). Ativam diretamente os nociceptores, aumentam a liberação de peptídeos pelos aferentes primários e incrementam a condutância ao Ca nos terminais das fibras C. Leucotrienos – São derivados do metabolismo do ácido araquidônico através da via da lipooxigenase, e contribuem de forma indireta à sensibilização dos nociceptores, ao estimular a liberação por outras células de substâncias neuroativas. Citocinas – As interleucinas são citocinas, assim como o fator de necrose tumoral (TNF) sendo liberadas pelas células fagocitárias. Estimulam os nociceptores de forma indireta ao ativar a síntese e liberação de prostaglandinas. Fator de Crescimento Nervoso (NGF)– Sintetizado e liberado pelos tecidos inervados pelo nociceptor. Sua produção se eleva nos tecidos inflamados, estimulando a liberação de diversos peptídeos como a Substância P (SP) e o CGRP, sendo que estes são liberados pelos mastócitos e pela interleucina -1 podendo estimular a síntese da NGF. O aumento dos níveis de NGF podem conduzir a sensibilização central e hiperalgesia, pelo aumento de diversos neuropeptídeos (SP e CGRP) nas células dos gânglios da raiz dorsal e da facilitação da transmissão mediada pelos receptores NMDA, no corno posterior da medula espinhal. Substância P - A substância P (SP) pertence à família das taquikininas, que também inclui a neurokinina-A e a neurokinina-B. Estes peptídeos têm três tipos de receptor, sendo eles: neurokinina – 1 (NK1), neurokinina-2 (NK2) e neurokinina-3 (NK3), sendo a substância P a principal ativadora do receptor NK1. 3.3. TRANSMISSÃO E MODULAÇÃO DA INFORMAÇÃO NOCICEPTIVA NO SNC A informação nociceptiva sofre processamento através de sistemas de controle segmentares (espinhais) e descendentes (encéfalo-espinhais). Tão logo seja processada, ela ascende aos centros superiores, onde estimula respostas vegetativas, motores e emocionais, tornando-se consciente. 3.3.1. NEUROBIOLOGIA DAS AFERÊNCIAS PRIMÁRIAS NO CORNO POSTERIOR DA MEDULA. Os neurônios sensoriais primários transferem informação da periferia até o SNC, que ocorre mediante a liberação de neurotransmissores ao nível medular. São eles de três tipos: aminoácidos, adenosina trifosfato (ATP) e neuropeptídeos. Aminoácidos Excitatórios (AAE) Existem diversos aminoácidos que se comportam como neurotransmissores excitatórios: Glutamato, Aspartato, Àcido Cisteico, Àcido Homocisteico e N-acetilaspartilglutamato. O glutamato atua como agonista de todos os subtipos de receptores para aminoácidos excitatórios definidos na transmissão dolorosa, N-metil-D-aspartato (NMDA), AMPA (ácido alfa-amino-3-hidroxi-5-metil-isoxazole-propionico)/kainato e metabotrópicos. Estes receptores se encontram a nível pós sináptico nos neurônios do corno dorsal, especialmente ao nível da substância gelatinosa. O receptor NMDA desencadeia um aumento do Ca interacelular e na ativação de diversos sistemas enzimáticos. A ativação de receptores AMPA/Kainato é produzida pela estimulação de fibras de baixo umbral, enquanto que a ativação de receptores NMDA se origina pela estimulação de fibras nociceptivas Ae C. ATP Está presente em menor proporção nas aferências primarias. Neuropeptídeos Substância P Pertence à família das taquikininas, as quais ativam receptores específicos: NK-1, NK-2, NK-3,sendo as ações da SP mediadas pela ativação de receptores NK-1. CGRP Peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP). As terminações que o contém se concentram nas lâminas I, II e V. Somatostatina e Galanina Têm efeitos excitatórios e também inibitórios sobre a transmissão nociceptiva. 3.3.2. SISTEMAS ENDÓGENOS DE CONTROLE DA DOR São diversos os sistemas endógenos que modulam a informação aferente. As substâncias envolvidas na regulação supraespinhal são: Peptídeos Opióides, Serotonina, Noradrenalina, Acido g aminobutírico (GABA). Os mecanismos periféricos como a sensibilização dos nociceptores contribuem nas primeiras fases da dor patológica após a agressão quando a agressão tissular e a inflamação prevalecem. Quando há a manutenção da dor após a cura da lesão tissular, a causa pode ser atribuída a mudanças no SNC, o que se denomina neuroplasticidade. O aumento progressivo da resposta frente a estímulos repetidos ocorre nos níveis dos nociceptores e do corno posterior da medula (Wind Up) Modulação A modulação ao nível dos nociceptores se produz através da sensibilização por mediadores inflamatórios (PGE2, 5-HT, bradicinina, noradrenalina, adenosina) e fatores neurotróficos (NGF) liberados pela lesão tissular ou por células inflamatórias. A modulação é o resultado da ativação de kinases intracelulares, a protekinase A (PKA) e a protekinase C pela proteína G de membrana unida aos receptores. Essas kinases fosforilam canais de sódio específicos (SNS e VR1). É produzida também modulação no corno posterior (sensibilização central), por ativação de cascatas intracelulares que facilitam a transmissão sináptica excitatória e diminuem os fenômenos inibitórios. 4. FISIOPATOLOGIA DA DOR O primeiro passo na seqüência dos eventos que origina o fenômeno sensitivo-doloroso é a transformação dos estímulos ambientais em potenciais de ação que, das fibras nervosas periféricas, são transmitidas para o SNC. Os receptores nociceptivos são representados por terminações nervosas livres presentes nas fibras mielínicas finas A-delta e amielínicas C das estruturas superficiais e profundas do tegumento, parede das vísceras e dos vasos sangüíneos e nas fibras correspondentes III e IV do sistema músculo-esquelético. Os nociceptores relacionados com as fibras C respondem à estimulação mecânica, térmica e/ou química intensas e, os relacionados às fibras A-delta, à estimulação mecânica e/ou térmica intensas. Quando ocorre o estímulo doloroso, um mecanismo de transdução, decodifica os estímulos nocivos transformando-os em potenciais de ação do nervo sensitivo, que são captados perifericamente pelos receptores do tipo nociceptores (receptores para dor). No processo de transdução, no caso da sensação dolorosa, ocorre uma amplificação dos eventos pela libertação local de substâncias algogênicas. A atividade dos receptores nociceptivos é modulada pela ação de substâncias algogênicas, liberadas em elevada concentração no ambiente tecidual em decorrência de processos inflamatórios, traumáticos e/ou isquêmicos. São originadas de células lesadas, leucócitos, mastócitos, plaquetas e de moléculas livres presentes no interior dos vasos sangüíneos. Dentre as substâncias algogênicas, destacam-se: a acetilcolina, as prostaglandinas, a histamina, a serotonina, a bradicinina, o leucotrieno, a substância P, a tromboxana, o fator de ativação plaquetário, os radicais ácidos e os íons potássio. Algumas são de produção local, (serotonina, bradicinina, noradrenalina, histamina, citocinas, produtos derivados do ácido aracdônico, como as prostaglandinas e leucotrienos, pela ativação das vias ciclooxigenases e lipooxigenases), outras são produzidas antidromicamente (no sentido inverso da transmissão dos nervos sensitivos, isto é, da do corpo neuronal para a periferia), sendo a mais importante a Substância P. Esse processo de sensibilização local é fisiológico e denominado de hiperalgesia primária. Essa grande quantidade de mediadores químicos leva à redução do limiar de sensibilidade e aumento da sensibilidade das terminações nervosas vizinhas. Assim é criado um processo de hiperalgesia que se estende progressivamente às regiões não envolvidas pelo estímulo nociceptivo inicial. Os estímulos desencadearão dor generalizada, por um estímulo dos receptores de fibras aferentes, que se tornam sensíveis à estímulos de baixa intensidade, como por exemplo estímulos táteis, levando a uma dor “patológica”. Isso caracteriza a hiperalgesia secundária. Os nociceptores são terminações nervosas livres existentes em fibras mielínicas finas A- delta e nas fibras amielínicas C, presentes nas estruturas superficiais e profundas dos tegumentos, parede das vísceras e dos vasos sanguíneos e nos músculos. Os nociceptores ligados às fibras C respondem à estimulação mecânica, térmica/química intensa e os relacionados às fibras A-delta, à estimulação mecânica e térmica intensas. O processo de transmissão dessas mensagens da periferia até a medula espinhal é feito por fibras nervosas, originadas de neurônios situados nos gânglios espinhais da cadeia para vertebral, sendo as fibras A-delta e C, envolvidas primariamente na nocicepção e, também pelas fibras mielinizadas, de condução rápida A-beta, relacionadas à sensação do tato, envolvidas na modulação do sinal doloroso e em algumas situações, participando de forma absolutamente anormal no processo doloroso. Do gânglio espinhal, as fibras se dirigem para o corno posterior da medula espinhal, o qual apresenta uma organização laminar (Lâminas de Rexed), numerada de I á X, cada lâmina com características morfofuncionais e de recepção das fibras advindas da periferia, distintas. As fibras C terminam na Lâmina II, as A-delta nas lâminas I e V e, as A-beta nas lâminas II, IV e V. No ponto de contato das fibras aferentes sensitivas, com um segundo neurônio no corno posterior da medula espinhal, importantes eventos bioquímicos ocorrem na transmissão do sinal doloroso. Os estímulos nociceptivos intensos e prolongados, conduzidos pelas fibras A-delta e C, aferentes da periferia ao corno posterior da medula, acarretam a sensibilização central. Do neurônio do gânglio espinhal partem prolongamentos axônicos em direção às respectivas lâminas do corno posterior da medula. Mais de uma dezena de neuropeptídeos neurotransmissores foram identificados nos gânglios das raízes sensitivas e nos aferentes primários, incluindo-se entre eles a substância P, a substância K, octapeptídeo-colecisto-quinina, somatostatina, peptídeo relacionado com a calcitonina, peptídeo vasoativo intestinal, dinorfina, encefalinas, fator de liberação de corticotrofina, arginina-vasopressina, oxitocina, peptídeo liberador de gastrina, bombesina, angiotensina II e galanina, entre outros. O ácido-glutâmico e o ácido-aspártico estão envolvidos com a veiculação da informação nociceptiva aguda e, a substância P, com a veiculação da dor crônica. Estímulos dolorosos, procedentes da periferia, liberam na fenda sináptica, neurotransmissores, principalmente tipo glutamato e substância P, os quais ocupam receptores específicos tipo NMDA e NK1, entre outros, na região pós-sináptica do 2º neurônio sensitivo. Dessa interação, canais iônicos são abertos, com grande permeabilidade aos íons Cálcio. Também ocorre grande mobilização de cálcio de reservas intracelulares, ocasionando em última análise, grande atividade excitatória do neurônio. Essa atividade pode levar a lesões, chamadas excitotóxicas da população neuronal envolvida. Resultante da grande liberação de cálcio no citoplasmado 2º neurônio sensitivo, uma das conseqüências será a formação de um segundo mensageiro, que é o óxido nítrico, de características gasosas, podendo se espalhar independentemente de relações sinápticas, e estimular outros neurônios da vizinhança. Os receptores NMDA sofrem estimulações repetitivas e participam do fenômeno de sensibilização central dos neurônios do corno posterior da medula. A somatória dos potenciais irá produzir progressivamente a uma despolarização dos neurônios, os quais se tornarão sempre mais excitáveis, levando a um fenômeno conhecido como “Wind up”. Esse fenômeno levara á alterações de hiperexcitabilidade neuronal. Chegando na medula espinal, as fibras aferentes são principalmente organizadas nos feixes ascendentes, principalmente o neoespinotalâmico (sensibilidade tipo discriminativa, neurossensorial) e o palioespinotalâmico (dimensão afetiva). Essas vias terminam na córtex sensorial e límbica, respectivamente, após sinapses no tálamo. A dor pode ser gerada por excesso de estímulos nociceptivos ou por hipoatividade do sistema supressor. BIBLIOGRAFIA 1.- IASP Pain terms: a current list with definitions and notes on usage. Pain 1986; Suplemento 2.- Dray A, Urban L, Dickenson AH. Pharmacology of chronic pain. Trends Pharmacol Sci 1994; 15:190-197. 3. – Bear, Mark F., Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 2ª ed. – Porto Alegre: Artmed, 2002 4. – Machado, Ângelo B.M.,Neuroanatomia Funcional, 2ª ed. – São Paulo: Editora Atheneu, 2002; 5 – Carvalho, Margarida M.J. (org), Dor: um estudo multidisciplinar. São Paulo: Editora Summus, 1999.
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