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UM OLHAR SOBRE O DIREITO HUMANO À EDUCAÇÃO NO BRASIL: A CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA Alois Guilherme Pletsch Saldanha1 Carla Taís Basseto2 Enio Waldir da Silva3 RESUMO Este artigo tem por objetivo apresentar o desenvolvimento dos Direito Humanos no Brasil a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, com vistas à construção da cidadania. Aborda, também, a importância da educação para a garantia dos direitos individuais e sociais, independente de fatores econômicos, sociais ou culturais. Outro aspecto diz respeito à educação como um instrumento capaz de provocar transformações na sociedade e contribuir para minimizar as diferenças sociais, econômicas e políticas entre os cidadãos e possibilitar o exercício da cidadania. Palavras-chave: Direitos Humanos; Educação; Cidadania. 1 INTRODUÇÃO A temática sobre a educação voltada aos direitos humanos vem ocupando um espaço crescente no debate acadêmico, político e social, mas ainda não se encontra difundido na prática e nem no currículo da escola brasileira. Em razão da crise mundial e local sobre o crescente número de desempregados e a falta de políticas públicas para a inclusão social, “[...] torna-se imperativo que as temáticas da igualdade e da dignidade humana não estejam inscritas apenas de textos legais, mas que, igualmente, sejam internalizadas por todos que atuam tanto na educação formal quanto na educação não formal.” (FERNANDES; PALUDETO, 2010). Interessante referir que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, ratificada pela Declaração Universal de Direitos Humanos de Viena, em 1993, são marcos importantes para a compreensão do debate internacional sobre direitos humanos. É sabido que as discussões sobre as atrocidades ocorridas com o genocídio imposto pelo nazismo na Segunda Guerra Mundial contribuíram para o desenvolvimento de mecanismos protetivos dos direitos humanos (SARLET, 2012). 1 Acadêmico do curso de Direito da Unijuí. E-mail: aloispletsch@gmail.com. 2 Acadêmica do curso de Direito da Unijuí. E-mail: carla.basseto@outlook.com. 3 Professor doutor do curso de Direito da Unijuí. E-mail: eniowsil@unijui.edu.br. Esses mecanismos jurídicos de proteção dos direitos humanos apresentam-se como um “importante marco, também, nesta luta pelas liberdades humanas, sendo que foi a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, que anunciou o início de uma nova era em que se assumia a promoção dos direitos humanos como interesse da comunidade internacional.” (RAMOS, 2009). Inevitável, portanto, que essa Declaração estabelecesse algumas recomendações para a promoção dos direitos humanos, e que no plano nacional, os Estados dessem prioridade a novos temas, como crianças, mulheres, população, meio-ambiente, habitação, que parecem ser pautas da agenda internacional que se iniciou na década de 90 (PINHEIRO, 2001). Neste contexto, a criança e o adolescente têm direito à liberdade, que compreende: direito de ir e vir; de opinião e expressão; de crença e culto religioso; de brincar, praticar esportes e divertir-se; de participar da vida comunitária sem discriminação. É dever de todos velar pela dignidade de ambos, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano ou violento. Assegurar o direito à educação significa não só o acesso e permanência, mas a qualidade do ensino, estruturas escolares adequadas, condições básicas de trabalho aos profissionais da escola, enfim, fazer com que as leis deixem de ser meras folhas de papel e se voltem para o contexto. O que se almeja, portanto, é a formação de uma nova postura na sociedade, que busque o compromisso ético de todos para contribuir com as transformações necessárias à construção de uma sociedade mais justa e fraterna (BRASIL, 2010). Neste sentido, Maria Victória Benevides (2000) afirma que sem sombra de dúvida, “a Educação em Direitos Humanos é essencialmente a formação de uma cultura de respeito à dignidade humana, através da promoção e da vivência de atitudes, hábitos, comportamentos e valores como igualdade, solidariedade, cooperação, tolerância e paz.” Tais preceitos significam, antes de tudo, trabalhar com vistas ao desenvolvimento de uma sociedade mais justa, pautada por valores éticos e inclusivos. 2 DIREITOS HUMANOS NO DESENVOLVIMENTO DA CIDADANIA Os Direitos Humanos possuem uma ampla inter-relação com a cidadania. É por meio deles que surgem a liberdade individual, os direitos sociais e os direitos coletivos da humanidade. Observa-se que os partidos políticos têm marcado presença constante quando se trata do tema Direitos Humanos e se utilizam da fragilidade da sociedade excluída e, por meio de políticas públicas passam a controlá-los e distribuí-los como bem entendem. Evidentemente que se fala em Direitos Humanos quando há a necessidade de enfretamento das desigualdades sociais, tanto na educação como em qualquer meio social. Em especial, porém, quando se verifica, por exemplo, que o índice de desemprego cresce a cada ano no Brasil, sendo uma das suas causas a baixa escolaridade da população (IBGE, 2006). Nota-se, portanto, que os Direitos Humanos assumem um papel preponderante no processo de desenvolvimento da cidadania, bem como na preservação dos direitos sociais de cada membro da sociedade, em igual valor para todos, sem restrições. O Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos (BRASIL, 2007, p. 10) sustenta que: O Estado brasileiro tem como princípio a afirmação dos direitos humanos como universais, indivisíveis e interdependentes e, para sua efetivação, todas as políticas públicas devem considerá-los na perspectiva da construção de uma sociedade baseada na promoção da igualdade de oportunidades e da equidade, no respeito à diversidade e na consolidação de uma cultura democrática e cidadã. Cabe destacar, portanto, que da maneira como está posto no Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH), o governo brasileiro está comprometido com o desenvolvimento de uma educação voltada à cidadania, dignidade e, principalmente, uma educação de qualidade. Foi contemplado igualmente na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei Federal nº 9.394/1996), que o exercício da cidadania é uma das principais finalidades da educação ao estabelecer uma prática educativa “inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, com a finalidade do pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” (BRASIL, 2007, p. 11). A CF/88 assegura que todos são iguais perante a lei, mas muitas pessoas consideram essa igualdade apenas formal. Nesse sentido, Paola Cristine Marchioro Hanna, Maria de Lourdes do Prado Krüger D’Almeida e Ana Maria Eyng (2009, p. 3666) acentuam que “[...] numa perspectiva de ‘humanidade’ – em que todos são iguais porque são humanos, declarando que o respeito e tolerância de todos para com todos é fundamental – todos os seres humanos são diferentes e se formam a partir de experiências históricas, sociais, culturais, econômicas e políticas diferentes.” Na verdade, essa afirmação tem um significado muito contundente em uma sociedade que valoriza o ter e não o ser, sendo naturalmente seletiva e excludente. Por isso, a educação emerge como o meio privilegiado para a conquista dos direitos humanos e como a possibilidade de abrir novas perspectivas ao homem, dando-lhe condições de se transformar e certamente lhe “[...] proporcionar a politização, a conscientização e indicar caminhos para a libertação.” (FREIRE, 2001, p. 35). É, portanto, dever do Estado, da família e da sociedade, educar para a cidadania,transformar o indivíduo em um cidadão participativo e emancipado social e politicamente. O Brasil contemporâneo é um país marcado por contradições, pois ao mesmo tempo em que perante a lei todos são iguais, percebe-se que nas condições materiais existe desigualdade de direitos, e o exercício da cidadania se apresenta quase como uma utopia. Possibilitar o respeito e a efetividade dos direitos humanos universalmente consagrados e o direito à educação constitui-se num meio eficaz para assegurar que as diferenças sejam minimizadas e a exclusão social diminuída. Com base em documentos internacionais e nacionais que aludem à Década da Educação em Direitos Humanos (1995-2004), prevista no Programa Mundial de Educação em Direitos Humanos e seu Plano de Ação 4, o PNEDH (BRASIL, 2007) propõe que a educação seja direcionada para o fortalecimento do respeito dos direitos humanos e liberdades. 2.1 O direito fundamental à educação na esfera global Para entender o significado de a educação ser considerada um direito fundamental no sentido real do termo no campo jurídico, utilizam-se os ensinamentos de Norberto Bobbio (2004) que compreende como fundamental tudo aquilo que é necessário e essencial. Neste sentido, o direito fundamental representa o mínimo necessário à existência humana, de modo a garantir uma vida digna, de acordo com os princípios da dignidade da pessoa humana. Bobbio (2004) esclarece que “Os direitos fundamentais abarcam toda uma perspectiva histórica e social, e por isso se envolvem de uma imensa complexidade na busca por um fundamento absoluto que possa respaldá-los, garantindo o seu correto cumprimento de maneira universal.” Bobbio (2004) ensina que é preciso considerar que há uma mutabilidade temporal nos direitos fundamentais, já que as condições históricas e sociais determinam as necessidades e interesses da sociedade. Segundo ele, por serem direitos relativos, não adquirem a imputação de um fundamento absoluto. A busca, porém, pelo fundamento absoluto, presente na história dos direitos fundamentais, é uma tese intrínseca em sua defesa, servindo de respaldo na garantia de sua aplicabilidade. Desta forma, Enivaldo Carvalho da Rocha e Erivaldo Ferreira do Carmo (2016) enfatizam que são considerados fundamentais os direitos inerentes à pessoa humana e que trazem consigo as qualidades da disposição à universalidade, à irredutibilidade e à inalienabilidade. Neste sentido, certamente a educação merece destaque como direito fundamental, inclusive pelo seu caráter imprescindível à formação do indivíduo no exercício dos seus direitos. Isto porque além de ser um direito social, a educação é também uma condição para usufruto dos demais direitos, despontando como um elemento principal na garantia dos direitos de cidadania. Na verdade, esta afirmação vem ao encontro da Declaração Universal dos Direitos do Homem, proclamada pela Organização das Nações Unidas, que declara a educação como direito de todos. É inegável que muitas inovações foram introduzidas no âmbito internacional, após a referida Declaração, notadamente, no que tange às garantias de acesso ao ensino em suas mais diferentes modalidades. Interessante destacar que nas lições de Rocha e Carmo (2016), diversos países se tornaram signatários deste princípio, estabelecendo ou ampliando o direito à educação em suas legislações nacionais, apesar de ainda haver alguns outros Estados que continuam violando de maneira drástica os direitos individuais e coletivos, não reconhecendo a educação como um bem fundamental ao seu cidadão. O artigo 26 da referida Declaração afirma que toda pessoa tem direito à educação, e esta deve ser gratuita, ao menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. Pode-se inferir, então, que a garantia fundamental à educação é um mecanismo a serviço da democracia e da cidadania, conforme expõem os documentos internacionais. Por outro lado, a legislação nacional, ao garantir em seus textos o direito à educação como direito fundamental, adquire mais efetividade prática, ou seja, enquanto os direitos do homem são aqueles oriundos da própria natureza humana, os direitos fundamentais são os vigentes em uma ordem jurídica concreta (ROCHA; CARMO, 2016). Utilizando os ensinamentos de Fábio Comparato (2001) e analisando suas afirmações denota-se que a ordem jurídica não concebe apenas o direito formalmente constitucionalizado, proclamado por normas com valor constitucional formal, mas sim todo o aparato legal e normativo nacional, no qual se inclui o direito materialmente fundamental, presente nas leis aplicáveis do direito internacional, embora não positivadas constitucionalmente. Isso significa que a positivação na esfera nacional é tão ou mais importante que os documentos internacionais, pois de nada adianta ser signatário de uma Declaração, como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, se internamente não se concretiza o direito fundamental à educação. No Brasil, a educação está diretamente relacionada aos princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana, e isso já se percebe da leitura do art. 6º, caput, da CF/88, com sua consagração como direito social e fundamental, sendo “reconhecida como um instrumento necessário à construção de uma sociedade livre, justa e solidária.” 2.2 Educação na esfera nacional: evolução constitucional brasileira e legislativa É inegável que o direito à educação sempre esteve presente nos textos constitucionais, portanto, cumpre analisar como isto ocorreu no decorrer da evolução histórica brasileira. A Constituição Imperial brasileira, de 1824, e a Republicana, de 1891, consagraram o direito de todos à educação. E, conforme previsão no primeiro texto constitucional, observa- se que a Carta Imperial de 1824 (Imperial), previu entre os direitos civis e políticos a gratuidade da instrução primária para todos os cidadãos e a criação de colégios e universidades. O art. 179 da Constituição Imperial (BRASIL, 1824) assim expressa: Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte. XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos. XXXIII. Collegios, e Universidades, aonde serão ensinados os elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes (sic). Na verdade, a educação, nesse período, era excludente já que os escravos não podiam frequentar a escola, pois não eram considerados cidadãos (CARVALHO, 2002). Já a Constituição Republicana, de 1891, preocupou-se em repartir a competência relativa à educação, estabelecendo que a União deveria legislar sobre o ensino superior. Enquanto isso, aos Estados cabia legislar sobre o ensino secundário e primário, muito embora tanto a União quanto os Estados pudessem criar e manter instituições de ensino superior e secundário. A ideia da educação como direito, todavia, só ganhou visibilidade no cenário brasileiro a partir da promulgação da Constituição de 1934, que declarou, pela primeira vez, no seu art. 140: “a educação é direito de todos e deve ser ministrada pela família e pelos poderes públicos.” (DIAS, 2016). Pode-se afirmar que a questão do direito à educação, segundo Dias (2016, p. 445), “possui um vício de origem: não se aplicava a todas as crianças em idade escolar, mas apenas àquelas que tinham o ‘privilegio’ de ter acesso à escola.” Percebe-se, portanto, que o direito à educação proclamado pela Carta de 1934 carecia de efetividade, só sendo possível mediante a assunção, por parte do Estado, de sua oferta. Tal reconhecimento, contudo, pelo menos do ponto de vista legislativo, só veio acontecer mais de três décadas depois. A formulação do dever doEstado para com o direito à educação de todos surgiu, pela primeira vez, na Emenda Constitucional de 1969, em seu art. 176 (JOAQUIM, 2013). Neste sentido, Adelaide Alves Dias (2016, p. 446) assegura que desde a sua formulação inicial, na Carta de 1934, até os dias atuais, a ideia da educação como um direito ganha contornos e assume configurações diversas, matizadas por aspectos de ordem jurídico-constitucional que sofrem as pressões dos momentos históricos que permearam e, por vezes, definiram seus conteúdos e processos. Continua a referida autora informando que “os anos de 1950 e 1960, no bojo de um debate ideológico acerca da relação educação e desenvolvimento, testemunharam o nascimento de um grande movimento em defesa da escola pública.” (DIAS, 2016, p. 447). Sublinha-se que a Campanha em Defesa da Escola Pública foi um movimento liderado por educadores da velha geração, encontrando-se entre estes, Florestan Fernandes e os educadores Anísio Teixeira e Paulo Freire, que contribuíram para que a educação fosse vista como agente de transformação da sociedade (DIAS, 2016). Nota-se que desde a sua formulação inicial, na Carta de 1934, até os dias atuais, a ideia da educação como um direito, no entendimento de Dias (2016, p. 446), “ganha contornos e assume configurações diversas, matizadas por aspectos de ordem jurídico- constitucional que sofrem as pressões dos momentos históricos que permearam e, por vezes, definiram seus conteúdos e processos.” Na verdade, percebe-se que as demais Constituições Republicanas apresentavam em seu texto aspectos ligados à educação, sem, no entanto, apresentar novidades substanciais que pudessem dar uma guinada na agenda democrática relativa aos direitos sociais. Sem sombra de dúvida, a Constituição Federal de 1988 tornou-se um marco na história e garante a todos o direito à educação, tanto que este se encontra prescrito no art. 6º, como um direito social e fundamental, inerente ao ser humano. Destaca-se, ainda, que tanto a Carta Imperial, de 1824, quanto a Constituição Republicana, de 1891, não apresentaram em seus textos aspectos significativos para o desenvolvimento da educação ou do ensino primário e secundário. Pouca ou quase nenhuma efetividade apresentaram, pois mesmo com o estabelecimento da obrigatoriedade de criação de instituições de ensino secundário e superior nos Estados, o Congresso Nacional pouco fez nesse sentido. No decorrer da evolução constitucional, porém, a Constituição de 1934 e a de 1937, em que pese a primeira estar voltada ao social e a segunda com conotação ditatorial, dedicaram todo um capítulo à educação e à cultura. Estabeleceu-se, assim, a divisão de competências dos entes federativos, garantindo um percentual mínimo dos impostos a ser aplicado no sistema educativo e criando a obrigação de se manter Fundos de Educação. O mesmo ocorreu com a Constituição de 1946, que “semelhantemente, manteve o sistema adotado na Carta anterior, consagrando a educação como direito de todos e assegurando sua obrigatoriedade no ensino primário.” (ROCHA, CARMO, 2016). O mesmo ocorreu com a Constituição de 1946, que “semelhantemente, manteve o sistema adotado na Carta anterior, consagrando a educação como direito de todos e assegurando sua obrigatoriedade no ensino primário.” (ROCHA, CARMO, 2016). Um aspecto que merece destaque, segundo Rocha e Carmo (2016) é que sob a égide dessa Constituição foi promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei nº 4.024/61. Em 1967, a Constituição outorgada pelos militares não apresentou novidades referentes ao direito à educação, entretanto, comentam Rocha e Carmo (2016), que “a Emenda Constitucional nº 1/69, acrescentou a possibilidade da intervenção dos Estados nos municípios que não cumprissem a exigência de aplicação anual de 20% da receita tributária municipal no ensino fundamental.” É inconteste que com a promulgação da Constituição Federal de 1988 – também conhecida como Constituição Cidadã – que o direito à educação ganhasse destaque, pois já estava incluída no art. 6º como direito social, e passou a compor o art. 205: Art. 205. A educação é direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração de toda a sociedade para o desenvolvimento da pessoa, o preparo para o exercício da cidadania e a qualificação para o trabalho. É imprescindível que se diga que a CF/88 conferiu um tratamento especial à educação, ao assegurar o ensino obrigatório, deixando claro que, “[...] além de ser um dever do Estado, ainda está configurado com o porte de direito subjetivo da pessoa humana.” Não há, portanto, distinção de qualquer natureza e, ainda, faz parte do chamado núcleo dos direitos essenciais e do mínimo existencial, necessários para uma vida com dignidade, na qual a educação faz parte (SILVA, 2011, p. 101). Caminhando nessa direção, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei nº 8.069/90), repetiu os termos da Constituição e ampliou para as crianças e os adolescentes o rol de direitos previsto no texto constitucional. O ECA, em seu art. 2º, explicita que: Art. 2º. A criança e o adolescente gozem de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, assegurando-se todas as oportunidades e facilidades a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Com a mesma intenção, a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (Lei nº 9.394/96) fortaleceu a garantia de acesso ao Ensino Fundamental, acentuando que por ser um direito público subjetivo, o Poder Público não pode se negar a lhe dar efetividade. Em seu art. 1º, A LDBEN expressa que “A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.” (BRASIL, 1996). Com base nesses documentos legais, com destaque para a CF/88, pode-se afirmar, sem medo de incorrer em erro, e utilizando os ensinamentos de Westphal Fernanda Prince Sotero (2009, p. 9-10), que: O processo de construção da cidadania no Brasil perpassa o sistema educacional, tornando-se este, um fator primordial para a consolidação de sujeitos cidadãos portadores de direitos e deveres; que procurem superar carências sociais participando efetivamente da consagração de uma democracia que não trate desigualmente os desiguais. Significa, em uma última análise, que os direitos humanos estão intimamente relacionados com os princípios fundamentais da dignidade humana e da cidadania, assim como a educação está intimamente relacionada com a cidadania, qualificando o sujeito para participar da vida do Estado. 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Quando se fala em educação deve-se levar em conta a sua expressiva importância na construção da cidadania, configurando-se numa real possibilidade para o exercício de direitos e deveres. A educação é, ao mesmo tempo, um direito humano essencial e um direito público subjetivo e, portanto, o Estado tem o dever de dar a efetividade necessária para atingir a todos os cidadãos. Constata-se, também, que a garantia fundamental à educação é um mecanismo a serviço da democracia e da cidadania, conforme se verificou nos estudos de documentos internacionais e até mesmo da legislação brasileira. Por derradeiro, deve-se acentuar que as Constituições brasileiras, com exceção da Constituição Cidadã de 1988, pouco se preocuparam em conferir à educação um papel relevante para o efetivo exercício da cidadania e da democracia. A educação qualifica os cidadãos a participarem da vida do Estado e os habilita a reconhecer e a lutarpara a efetivação dos seus direitos. Por outro lado, a consolidação dos direitos fundamentais possibilita ao cidadão melhores condições de vida, bem como contribui para a concretização da democracia. Com efeito, conclui-se que no Brasil a educação está diretamente relacionada aos princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana e da cidadania, sendo reconhecida como um instrumento necessário à construção de uma sociedade livre, justa e solidária. REFERÊNCIAS BENEVIDES, Maria Victoria Palestra de abertura. Seminário de Educação em Direitos Humanos. São Paulo, 18/02/2000. Disponível em: <http://hottopos.com/convenit6/victoria. htm>. Acesso em: 21 mar. 2016. 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