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A INCIDÊNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS

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A INCIDÊNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS
CONSTITUIÇÃO E CÓDIGO CIVIL: A INCOMUNICABILIDADE E SUA ULTRAPASSAGEM
Constituição e Código Civil andavam paralelos, como mundos que não se tocavam senão sob o aspecto formal, em razão do princípio da hierarquia das leis e dos cânones que guiavam a vigência da lei no tempo e no espaço (...) Os dois principais estatutos normativos da vida na cives pouco se relacionavam; configuravam campos diversos, um o estatuto do Estado e do homem político; outro o estatuto da sociedade civil e do cidadão proprietário. Seus objetivos eram diversos como diversas eram as matéria que continham; conformavam dois mundos apartados, e apartados eram também valorativamente, à Constituição cabendo tratar do interesse do Estado, ao Código Civil, cuidar dos interesses do indivíduo (COSTA, 2010, p.80)
-Os direitos fundamentais eram tidos como institutos específicos das relações entre o indivíduo e o Estado; sua dimensão ou finalidade limitava-se à salvaguarda da liberdade individual; e seu direcionamento passivo era contra o Estado, o poder a ser cerceado
CONSTITUIÇÃO E CÓDIGO CIVIL: A INCOMUNICABILIDADE E SUA ULTRAPASSAGEM
Agonia do Código Civil: passagem do monossistema para o polissistema
Constitucionalização do Direito Civil: Centralidade da pessoa humana no ordenamento
Mudança no panorama: Revolução industrial; ampliação das atividades e funções estatais; incremento da participação ativa da sociedade no exercício do poder  ameaças advindas da esfera privada
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CONSTITUIÇÃO E CÓDIGO CIVIL: A INCOMUNICABILIDADE E SUA ULTRAPASSAGEM
Nas democracias contemporâneas, a Constituição deixou de ser vista como um simples estatuto do poder público para converter-se na “ordem jurídica fundamental da comunidade”, de acordo com a conhecida fórmula de Hesse. Este enfoque unitário, que tende a superar o tradicional isolamento da Constituição do resto do ordenamento, tem uma grande transcendência na medida em que impede que o Direito constitucional e o Direito privado possam conceber-se como compartimentos estanques governados por logicas radicalmente diferentes (UBILLOS, 2008, p. 223, tradução livre)
Equiparação do particular ao Estado?
A hipertrofia da eficácia horizontal dos direitos fundamentais pode, em nome da utopia da realização destes direitos em todos os espaços sociais, converter-se numa verdadeira distopia, ao restringir em excesso a autonomia privada, ainda que com propósitos “politicamente corretos”. Teríamos aqui o paradoxo de um “fundamentalismo de direitos fundamentais (SARMENTO, 2011, p.62)
ASPECTOS TERMINOLÓGICOS
Eficácia privada
Eficácia em relação a terceiros 
Eficácia horizontal 
Eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre particulares
Até que ponto o particular pode (independentemente da dimensão processual do problema) recorrer aos direitos fundamentais nas relações com outros particulares, i.e, se, quando e de que modo poderá opor direito fundamental do qual é titular relativamente a outro particular que, neste caso, exerce o papel de destinatário (obrigado), mas que, por sua vez, também é titular dos direitos fundamentais?
Apesar de atualmente já se registrar amplo consenso no que diz com o reconhecimento, pela doutrina, de uma vinculação dos particulares aos direitos fundamentais (i.e, ao “se” desta vinculação), isto não significa que tal aspecto não mereça alguma consideração. 
 
A NEGAÇÃO DA EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS E A DOUTRINA DA “STATE ACTION”
Principais objeções
(a) esta vinculação direta compromete em demasia a autonomia privada; 
(b) ela é antidemocrática, pois importa em atribuição de poderes excessivos ao juiz, em detrimento do legislador, que é quem deve ponderar os direitos e interesses constitucionais em jogo nos litígios privados;
(c) ela gera insegurança jurídica, na medida em que enseja que os conflitos privados sejam solucionados com base em princípios constitucionais vagos e abstratos, cuja aplicação é muitas vezes imprevisível; e 
(d) ela põe em risco a autonomia e identidade do Direito Privado, permitindo a sua “colonização” pelo Direito Constitucional.
 
A NEGAÇÃO DA EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS E A DOUTRINA DA “STATE ACTION”
*Doutrina da State Action: cenário norte-americano; direitos fundamentais impõem limitações apenas para os Poderes Públicos e não atribuem aos particulares direitos frente a outros particulares com exceção apenas da 13ª Emenda, que proibiu a escravidão. 
-Respeito ao Federalismo: Competência para disciplinar as relações entre particulares é exclusiva do legislador estadual [atualmente, reconhece-se a competência da União para legislar sobre direitos humanos mesmo quando nenhum ator estatal esteja envolvido - Civil Rights Act de 1964]
-Public function theory (década de 40): quando particulares agirem no exercício de atividades de natureza tipicamente estatal, estarão também sujeitos às limitações constitucionais. Existem certas atividades que, independentemente de delegação, são de natureza essencialmente estatal, e, portanto, quando os particulares as exercitam, devem submeter-se integralmente aos direitos fundamentais.
 
A NEGAÇÃO DA EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS E A DOUTRINA DA “STATE ACTION”
Marsh v. Alabama (1946): Empresa Privada e Testemunhas de jeová. Cidade privada?
Shelley v. Kraemer: Convenção privada que os proibia proprietários de vários imóveis de uma região de aliená-los a pessoas integrantes de minorais raciais
Direitos fundamentais serão aplicados nas relações entre particulares quando: a) particular ou entidade privada exerce função estatal típica; b) quando existem pontos de contato e aspectos comuns suficientes para que se possa imputar ao Estado a responsabilidade pela conduta oriunda do particular
Criticas: *equiparar sem maiores reflexões a atuação dos particulares à ação ou omissão estatal; *não foi capaz de construir standards minimamente seguros e confiáveis na jurisdição constitucional norte-americana. 
O PROBLEMA DO “COMO”: EFICÁCIA DIRETA OU INDIRETA?
Ao contrário da Constituição Portuguesa de 1976 que, em seu art.18/1, consagrou expressamente uma vinculação das entidades privadas aos direitos fundamentais, a Constituição de 1988 sequer previu, a despeito de consagrar o princípio da aplicabilidade imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais (art.5º, §1º).
Contudo, a norma contida no art.18/1 não revela a amplitude, a forma e a intensidade desta vinculação.
A vinculação das entidades privadas se refere a todos os particulares, pessoas física e jurídicas, ou se engloba apenas determinadas pessoas privadas detentoras de poder social?
Qual alcance e a forma desta vinculação?
TEORIA DA EFICÁCIA MEDIATA (INDIRETA)
-Desenvolvida na doutrina alemã por Günter Dürig, em obra publicada em 1956
-Concepção dominante no direito germânico 
-Construção intermediária  
-Para Durig, o reconhecimento de uma eficácia direta acabaria por gerar uma estatização do Direito Privado e um virtual esvaziamento da autonomia privada. - a proteção constitucional da autonomia privada pressupõe a possibilidade de os indivíduos renunciarem a direitos fundamentais no âmbito das relações privadas
-Direitos fundamentais não ingressam no cenário privado como direitos subjetivos, que possam ser invocados a partir da Constituição, antes, requer-se concretamente a intervenção do legislador ou a recepção através do juiz no momento de interpretar a norma aplicável ao caso. 
-São protegidos no campo privado não através dos instrumentos do Direito Constitucional, e sim por meio de mecanismos típicos do próprio Direito Privado.
-Conceitos jurídicos indeterminados; cláusulas gerais  “portas de entrada” dos direitos fundamentais no Direito Privado.
TEORIA DA EFICÁCIA MEDIATA (INDIRETA)
-Constituição: ordem de valores objetiva 
-Eficácia irradiante: grau acentuado de indeterminação
quanto ao seu conceito e significado.
-Excepcionalmente, admite a vinculação direta quando há uma desigualdade na relação jurídica e um dos sujeitos assume papel semelhante ao do Estado. 
-Adotada, ainda que não expressamente, pelo Tribunal Federal Constitucional, a partir do famoso Caso Luth: discussão relativa à legitimidade de um boicote contra um filme dirigido pela cineasta Veit Harlan, que fora colaborador do regime nazista, organizado em 1950 pelo Presidente do Clube de Imprensa de Hamburgo, Erich Lüth. 
Críticas: a) um direito cujo reconhecimento dependa do legislador não é um direito fundamental, pois este se define pela indisponibilidade do seu conteúdo; b) não proporciona uma tutela integral dos direitos fundamentais no plano privado, que fica dependente das decisões adotadas pelo legislador ordinário; c) não há diferença pratica entre esta teoria e o princípio geral de interpretação de todas as normas do ordenamento conforme a constituição. 
TEORIA DOS DEVERES DE PROTEÇÃO
-Konrad Hesse e Claus-Wilhelm Canaris. 
-O Estado, tanto ao editar normas como ao prestar a jurisdição, está obrigado não apenas a abster-se de violar os direitos fundamentais, como também a protegê-los diante das lesões e ameaças provenientes dos particulares. Para designar estas duas funções distintas dos direitos fundamentais – defensiva e protetiva – Canaris emprega as denominações “proibição de intervenção” e “imperativo de tutela” (ou “imperativo de proteção”).
Crítica: Só faz sentido obrigar o Estado a impedir uma lesão a um direito fundamental causada por um particular se se aceitar também que ao particular em questão não é lícito causar aquela lesão – vale dizer, que ele também está vinculado ao respeito do direito fundamental.
TEORIA DA EFICÁCIA IMEDIATA (DIRETA)
-Hans Carl Nipperdey (década de 50): Embora alguns direitos fundamentais previstos na Constituição alemã vinculem apenas o Estado, outros, pela sua natureza, podem ser invocados diretamente nas relações privadas, independentemente de qualquer mediação por parte do legislador, revestindo-se de oponibilidade erga omnes. 
-Constatação de que os perigos que ameaçam os direitos fundamentais no mundo contemporâneo não provêm apenas do Estado, mas também dos poderes sociais e de terceiros em geral. A opção constitucional pelo Estado Social importaria no reconhecimento desta realidade, tendo como consequência a extensão dos direitos fundamentais às relações entre particulares. 
-Embora minoritária no cenário germânico, a tese da eficácia horizontal imediata tem ampla penetração na doutrina de outros Estados europeus, como Espanha, Portugal e Itália.
TEORIA DA EFICÁCIA IMEDIATA (DIRETA)
*Especificidades na incidência 
*Ponderação - Direito fundamental x Direito Fundamental (autonomia)
*Diante da existência de lei disciplinando a questão subjacente ao conflito privado, deve o Judiciário aplicar a norma vigente
*Ingo Wolfgang Sarlet, Luís Roberto Barroso, Gustavo Tepedino, Daniel Sarmento, Jane Reis Gonçalves Pereira, dentre tantos outros.
*Admite a possibilidade de vigência imediata dos direitos fundamentais nas relações interprivadas sem negar o efeito de irradiação desses direitos através da lei. Ambas as modalidades são perfeitamente compatíveis: o normal é que seja o legislador a concretizar o alcance dos diferentes direitos nas relações de Direito privado, mas quando essa mediação não existe, na ausência da lei, as normas constitucionais podem aplicar-se diretamente.
TEORIA DA EFICÁCIA IMEDIATA (DIRETA)
Ao afirmar uma eficácia direta prima facie, não se está a sustentar uma eficácia necessariamente forte ou mesmo absoluta, mas uma eficácia de vinculação flexível e gradual. Neste contexto, convém aduzir que o próprio dever de conferir máxima eficácia e efetividade às normas de direito fundamentais há de ser compreendido no sentido de um mandado de otimização, uma vez que a eficácia e a efetividade dos direitos fundamentais de um modo geral não se encontra sujeita a uma lógica do tipo tudo ou nada (SARLET, 2010, p.28)
O fato de que, em se tratando dos direitos sociais a prestações, seja recomendável maior cautela e uma postura mais comedida, não constitui óbice ao reconhecimento da eficácia direta desses direitos, pois o art.5º, parágrafo 1º, da Constituição determina a aplicabilidade direta e a maximização da eficácia e efetividade de todas as normas de direitos fundamentais (SARLET, 2010, p.33) 
TEORIA DA EFICÁCIA IMEDIATA (DIRETA)
O problema, em verdade, não está em se advogar a tese da vinculação direta dos particulares aos direitos fundamentais, mas sim em avaliar qual a intensidade desta vinculação e quais as consequências práticas a serem extraídas no caso concreto, especialmente em face do reconhecimento da peculiaridade destas relações, decorrentes da circunstancia de se cuidar, em regra, de uma relação entre titulares de direitos fundamentais. Pelo fato de as normas de direitos fundamentais não serem homogêneas, tendo diversos graus de eficácia e gerando efeitos peculiares (...) importa reconhecer uma eficácia direta prima facie, em outras palavras, a impossibilidade de uma eficácia direta de feições absolutas (SARLET, 2000, p.156-157)
-Inviável advogar a existência de soluções uniformes, já que o adequado manejo da eficácia direta nas relações entre particulares e a intensidade da vinculação destes direitos fundamentais deve ser pautada de acordo com as circunstancias do caso concreto. 
VINCULAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS E A EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF
Recurso Extraordinário nº 63.279 (1968): Alinhamento à premissa tradicional, de limitação dos direitos à esfera das relações públicas, em que há a presença estatal. Discutiu-se a validade de cláusulas dos Estatutos Sociais do “Santos Football Club”, impugnadas por um associado, por suposta ofensa ao princípio da igualdade. 
Relator, Ministro Amaral Santos: O princípio da isonomia é de aplicação nas relações de direito público, ou naquelas em que o direito público interfere. Assim, nas relações de direito privado, como são as que se estabelecem entre os sócios de uma associação esportiva e esta mesma associação, a primeira coisa a verificar-se, para se cogitar da aplicabilidade ou não do princípio, é se alguma norma de direito público a impõe. Inexistente esta norma, os estatutos da associação dessa natureza poderão livremente estabelecer aquelas relações conforme for do interesse associativo.
- RExt 85.439, Rel. Min. Xavier de Albuquerque; e RExt 100.094, Rel. Min. Rafael Mayer: A partir de 1977, o STF reconheceu que certas emanações do direito à privacidade também vinculam os particulares. 
RExt 85.439, Rel. Min. Xavier de Albuquerque; e RExt 100.094, Rel. Min. Rafael Mayer  Em outros julgamentos proferidos a partir de 1977, o STF reconheceu que certas emanações do direito à privacidade também vinculam os particulares, em casos em que se analisou a validade do emprego, como meio de prova em litígios entre particulares, de gravação telefônica feita por um interlocutor, sem o conhecimento do outro.
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VINCULAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS E A EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF
Recurso Extraordinário nº 160.222 (1995): De Millus S.A., fabricante de roupas íntimas, submetia as suas empregadas à prática de revista íntima, visando a impedir o furto de suas mercadorias.  A Corte acabou não apreciando a questão de fundo da causa, que tocava à vinculação da empresa a respeito dos direitos à privacidade e à dignidade humana de suas empregadas
Recurso Extraordinário nº 158.215-4/RS (1996): Discutiu a validade do ato de cooperativa que punira associado, excluindo-o do seu quadro, sem oportunizar- lhe o prévio exercício do direito de defesa. O STF afirmou, já na ementa do julgado, que “na hipótese de exclusão de associado decorrente de conduta contrária aos estatutos, impõe-se a observância
do devido processo legal, viabilizando o exercício da ampla defesa”.
Recurso Extraordinário nº 161.243-6/DF (1996): Cuidava-se de hipótese em que trabalhador brasileiro, empregado pela empresa aérea Air France, pretendia o reconhecimento de direitos trabalhistas assegurados no estatuto do pessoal da empresa, que a princípio só beneficiariam os empregados de nacionalidade francesa. No acórdão foram tecidas considerações doutrinárias sobre o princípio da igualdade, mas imperou, mais uma vez, o silêncio sobre o tema da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais
RExt 85.439, Rel. Min. Xavier de Albuquerque; e RExt 100.094, Rel. Min. Rafael Mayer  Em outros julgamentos proferidos a partir de 1977, o STF reconheceu que certas emanações do direito à privacidade também vinculam os particulares, em casos em que se analisou a validade do emprego, como meio de prova em litígios entre particulares, de gravação telefônica feita por um interlocutor, sem o conhecimento do outro.
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VINCULAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS E A EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF
Recurso Extraordinário nº 201.819-8 (2005): O caso envolvia a União Brasileira de Compositores (UBC), que punira com a exclusão um associado, sem assegurar-lhe a prévia oportunidade de defesa. *Ministra Ellen Gracie  considerou que o princípio da ampla defesa não incidia na hipótese, mas apenas o estatuto social da UBC, que não teria sido violado. *Ministro Gilmar Ferreira Mendes  expôs as principais correntes no debate sobre a vinculação dos particulares aos direitos fundamentais; afirmou a aplicabilidade direta do direito à ampla defesa ao caso, mas não quis se comprometer com qualquer posição mais geral a propósito da controvérsia sobre a natureza mediata ou imediata da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
RExt 85.439, Rel. Min. Xavier de Albuquerque; e RExt 100.094, Rel. Min. Rafael Mayer  Em outros julgamentos proferidos a partir de 1977, o STF reconheceu que certas emanações do direito à privacidade também vinculam os particulares, em casos em que se analisou a validade do emprego, como meio de prova em litígios entre particulares, de gravação telefônica feita por um interlocutor, sem o conhecimento do outro.
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REFUTANDO AS OBJEÇÕES À INCIDENCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS
Só existe efetivamente autonomia privada quando o agente desfruta de mínimas condições materiais de liberdade. Isto não acontece em grande parte dos casos nos quais a manifesta desigualdade entre as partes obsta, de fato, o exercício da autonomia. Pensar a autonomia privada, num sentido pleno, é considerar também os constrangimentos que lhe são impostos por agentes não estatais, no contexto de uma sociedade profundamente assimétrica e excludente. 
Não se questiona o fato de que existe um espaço legítimo para que o legislador pondere a autonomia privada com os direitos fundamentais, estabelecendo a partir daí as normas de regência das relações privadas. A prioridade na ponderação entre os direitos fundamentais é do legislador. Todavia, isto não obsta a aplicação direta da Constituição aos casos concretos, quando inexistir regra ordinária específica tratando da matéria. 
É da estrutura dos direitos fundamentais a possibilidade de colisão cuja solução constitucionalmente adequada será extraída com exame, em concreto, da ponderação de cada norma fundamental
-O paradigma hermenêutico pós-positivista hoje vigente, que reconhece a plena juridicidade dos princípios, aplica-se também ao Direito privado. 
RExt 85.439, Rel. Min. Xavier de Albuquerque; e RExt 100.094, Rel. Min. Rafael Mayer  Em outros julgamentos proferidos a partir de 1977, o STF reconheceu que certas emanações do direito à privacidade também vinculam os particulares, em casos em que se analisou a validade do emprego, como meio de prova em litígios entre particulares, de gravação telefônica feita por um interlocutor, sem o conhecimento do outro.
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REFUTANDO AS OBJEÇÕES À INCIDENCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS
Se princípios constitucionais abrangentes vinculam diretamente o poder público, não há razão para que no âmbito das relações entre particulares, a abertura e indeterminação dos direitos fundamentais seja vista como motivo para negar o reconhecimento dos direitos fundamentais como direitos subjetivos oponíveis entre os particulares
Necessário estabelecer standards para aplicação de cada direito fundamental nas relações privadas, com a identificação dos casos em que sua incidência deve prevalecer sobre a autonomia privada dos particulares, bem como aqueles onde deve ocorrer o contrário. São as chamadas relações de “precedência condicionada entre princípios. 
-No Brasil, a constitucionalização do Direito Privado não é sequer uma escolha do intérprete. A opção já foi feita pelo próprio constituinte, que se dedicou a disciplinar em linhas gerais inúmeros institutos do Direito Privado.
RExt 85.439, Rel. Min. Xavier de Albuquerque; e RExt 100.094, Rel. Min. Rafael Mayer  Em outros julgamentos proferidos a partir de 1977, o STF reconheceu que certas emanações do direito à privacidade também vinculam os particulares, em casos em que se analisou a validade do emprego, como meio de prova em litígios entre particulares, de gravação telefônica feita por um interlocutor, sem o conhecimento do outro.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nenhum ramo do Direito, público ou privado, sobrevive hoje às margens da normatividade constitucional. Pelo contrário, a supremacia hierárquica formal e material da Constituição, bem como o reconhecimento da força normativa de toda a Lei Maior, faz irradiar para todos os ramos do direito os valores, princípios e diretrizes hospedados em sede constitucional. 
A discussão em torno da afirmação ou negação da eficácia direta, para além dos argumentos de cunho jurídico, inevitavelmente revela também um viés político e ideológico. *A opção por uma eficácia direta traduz uma decisão política em prol de um constitucionalismo da igualdade, objetivando a efetividade do sistema de direitos e garantias fundamentais no âmbito do Estado social de Direito. *A concepção defensora de uma eficácia apenas indireta encontra-se atrelada ao constitucionalismo de inspiração liberal-burguesa. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O pleito em prol de uma eficácia direta prima facie dos direitos fundamentais nas relações privadas não se justifica apenas por razões de ordem dogmática, mas também em função da necessidade evidente de limitação do poder social e como resposta às persistentes desigualdades sociais, culturais e econômicas, ainda mais acentuadas em sociedades periféricas como a do Brasil
Entre os possíveis extremos de uma “civilização do direito constitucional e uma constitucionalização do direito civil”, seja possível trilhar um caminho intermediário, pautado pela proporcionalidade e razoabilidade, evitando-se aqui os efeitos nefastos de uma leitura fundamentalista da Constituição, mas especialmente dos princípios e direitos fundamentais. 
REFERÊNCIAS
CANARIS, Claus-Whlhelm. A influência dos direitos fundamentais sobre o direito privado na Alemanha. In: SARLET, Ingo Wolfganf (org). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p.205-220
COSTA, Judith Martins. Os direitos fundamentais e a opção culturalista do novo Código Civil. In: SARLET, Ingo Wolfganf (org). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p.77-98
SARLET, Ingo Wolfganf. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.
REFERÊNCIAS
________. Direitos fundamentais e direito privado: algumas considerações em torno da vinculação dos particulares aos direitos fundamentais. In: SARLET, Ingo Wolfganf (org). A Constituição concretizada: construindo pontes com o publico e o privado
________. Neoconstitucionalismo e influência dos direitos fundamentais no direito privado: algumas notas sobre a evolução brasileira. In: SARLET, Ingo Wolfganf (org). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p.9-12.
SARMENTO, Daniel. A normatividade da Constituição e a Constitucionalização do Direito Privado. Revista da EMERJ, v. 6, n. 23, 2003, p.272-297.
UBILLOS, Juan Maria Bilbao. La eficacia horizontal de los derechos fundamentales: las teorias y la practica. In: TEPEDINO, Gustavo (org.) Direito civil contemporâneo: Novos problemas à luz da legalidade constitucional, São Paulo: Atlas, 2008, p. 219-237.
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