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CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 1 CURSO DE FINANÇAS PÚBLICAS TEORIA E EXERCÍCIOS APRESENTAÇÃO Iniciaremos nos próximos dias o nosso curso de Finanças Públicas direcionado para o concurso de Auditor da Receita Federal. O curso terá a duração de oito aulas, e contemplará a parte teórica da disciplina e a resolução comentada de exercícios de concursos anteriores realizados pela Esaf, principalmente dos concursos da Receita Federal (todos sabem que a antiga área de especialização de Política e Administração Tributária - PAT cobrava Finanças Públicas). Serão 5 (cinco) aulas de teoria e 3 (três) aulas de exercícios de concursos comentados, para revisarmos, nos comentários às questões, os tópicos mais cobrados nas provas. As dúvidas sobre a parte teórica ou sobre a resolução dos exercícios das provas de concursos poderão ser esclarecidas, no decorrer do curso, no fórum de dúvidas. O programa apresentado é o mesmo que vinha sendo cobrado nos concursos anteriores de AFRF, na área de Política e Administração Tributária – PAT. Se vocês prestarem atenção, verão que esse programa tem um enfoque muito grande na parte tributária, que mais interessa à Receita Federal, e por isso acreditamos que não haverá nenhuma mudança de conteúdo programático no próximo concurso. De qualquer forma, acertei com o Ponto dos Concursos que se eventualmente for acrescentado algum novo tópico a esse programa de Finanças Públicas, será ele ministrado em aulas complementares, sem nenhum custo adicional para o aluno. Sejam todos bem-vindos – e passemos à Aula Demonstrativa, para a nossa primeira conversa sobre Finanças Públicas! CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 2 AULA 0: PRINCÍPIOS TEÓRICOS DA TRIBUTAÇÃO 1. Introdução – Finanças Públicas: de que se trata? Certa vez eu entrei numa sala de aula de um cursinho preparatório para concurso público para dar minha primeira aula de Finanças Públicas e iniciei a aula dizendo que ia “começar pelo começo”, falando das funções e da evolução do papel do Estado, quando fui surpreendido com a seguinte pergunta de uma aluna que se sentava nas primeiras fileiras: “-Já que você diz que vai começar pelo começo, porque você não começa por definir o que é “Finanças Públicas”? “Eu não tenho a mínima idéia do que seja isso!” - acrescentou a aluna. Foi, então, que percebi que “Finanças Públicas” não é uma disciplina de conhecimento universal. Trata-se de uma disciplina bastante específica e que talvez só interessa àqueles que trabalham com as contas do governo e, claro, também àqueles que pretendem prestar algum concurso público. Se a ignorância da disciplina é, assim, tão ampla, nós vamos supor que você se inclui no grupo desses “ignorantes” que nada sabem de Finanças Públicas, mas que precisa saber, já que pretende prestar concurso para Auditor Fiscal, ou para Técnico do Banco Central ou para Analista do TCU. E se assim, comecemos realmente pelo começo! Finanças públicas é um ramo da ciência econômica que sempre despertou pouco interesse dos economistas e que, por isso mesmo, sempre foi dominada por profissionais de outras áreas, especialmente por alguns poucos servidores públicos que lidavam diretamente com as contas do setor público. Somente agora, nesses anos mais recentes, com a crise crônica por que vem passando a Administração Pública no Brasil desde os anos 80 do século passado, é que este ramo da economia vem merecendo maiores estudos e discussões dos profissionais economistas. Mas, afinal, de que tratam as Finanças Públicas? Basicamente, as finanças públicas tratam dos gastos do setor público e das formas de financiamento desses gastos. A partir daí, são desenvolvidos estudos, teorias e modelos que procuram explicar a evolução da participação setor público na economia, as formas de intervenção do Estado na atividade econômica, as fontes e origens das receitas públicas bem como a evolução crescente dessas receitas relativamente ao produto/renda nacional. Também são desenvolvidas CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 3 teorias sobre o nível “ótimo” dos gastos e das receitas públicas e sobre eventuais distorções causadas pela tributação na economia. Do ponto de vista da análise econômica, as finanças públicas se materializam na chamada política fiscal que se constitui, sem dúvida, num dos principais instrumentos de intervenção na atividade econômica de que dispõe o governo, consistindo, basicamente, de: i) aumentos ou cortes das despesas do governo, como, por exemplo, construção de escolas, de hospitais, de estradas, ou, ainda, gastos com o funcionamento da máquina administrativa e com o pagamento de funcionários; ii) aumentos ou reduções do nível de impostos. Estas duas medidas alteram a demanda agregada1, ainda que de forma diferente: enquanto os aumentos ou reduções dos gastos se refletem, na equação da demanda agregada, em um G maior ou menor, as variações no nível de impostos afetam a “renda pessoal disponível” dos indivíduos e, daí, o nível de consumo privado (Cp). É através da política fiscal – espelhada no seu orçamento – que o governo interfere na alocação de recursos, oferecendo bens e serviços que, deixados às forças de mercado, não seriam produzidos pelo setor privado. Este seria o caso dos chamados “bens públicos” (segurança nacional, corpo de bombeiros, polícia, etc.) e dos “bens semipúblicos” ou “bens meritórios” (educação e saúde, por exemplo). É ainda por meio da política fiscal que o governo procura melhorar a distribuição da renda no País, tributando mais os que ganham mais e realizando “transferências” para os grupos menos favorecidos da sociedade. Adicionalmente, a política orçamentária do governo contribui para a estabilização da atividade econômica. Esta função estabilizadora, exercida através de instrumentos macroeconômicos, objetiva a geração de um maior número de empregos na economia, a estabilização dos preços e o equilíbrio do balanço de pagamento do País. É de tudo isso que se trata quando falamos de Finanças Públicas. Feita esta introdução, vamos, então, falar um pouco sobre tributação – que, por ser um dos tópicos que sempre fazem parte de qualquer programa de finanças públicos nos concursos públicos – é o 1 O estudo das Finanças Públicas pressupõe que o aluno já tenha algum conhecimento básico de macroeconomia. Apenas para recordar, a Demanda agregada (DA) é composta do Consumo privado (C) mais as despesas de investimentos das empresas (I) mais os gastos de governo (G) mais as exportações (X). Ou seja, DA = C+I+G+X. CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 4 objeto desta nossa aula demonstrativa de nosso curso de finanças públicas. 2. Tributação Para financiar seus gastos com obras, com manutenção de suas escolas, de seus hospitais, com seus ministérios e secretarias e com seus funcionários, o governo dispõe de quatro alternativas: i) emissão de moeda; ii) empréstimos bancários; iii) venda de títulos públicos; iv) tributação. Cada uma dessas alternativas tem diferentes efeitos sobre a atividade econômica. No caso brasileiro, a primeira alternativa – a emissão monetária – por ser a mais simples e aparentemente a mais “barata” para o governo, sempre foi a mais utilizada, mas, agora, esta alternativa está proibida pela Constituição Federal. Da mesma forma, há inúmeras disposições legais impedindo que os órgãos governamentaisse endividem junto ao sistema bancário, contraindo empréstimos para financiar seus gastos. Sobram, assim, a venda de títulos públicos e a tributação – estes, sim, os mecanismos mais comumente utilizados no caso brasileiro. De toda forma, a experiência tem mostrado que a tributação tem sido e deve ser a principal fonte de financiamento dos gastos governamentais. Na prática, a venda de títulos públicos – Notas do Tesouro Nacional (NTN), Letras do Tesouro Nacional (LTN), Letras Financeiras do Tesouro (LFT), etc. – se constitui num instrumento complementar à tributação. De todo a forma, considerando que tanto a venda de títulos públicos como a emissão monetária e os empréstimos bancários são mecanismos estudados mais na disciplina Economia Financeira e Monetária, nosso estudo aqui estará concentrado nos efeitos e nas características da tributação. Nesta Aula, vamos avaliar a tributação não apenas do ponto de vista de um mecanismo de financiamento dos gastos do governo, mas principalmente os princípios que devem reger um sistema tributário para que este seja o mais justo e mais socialmente aceito. Adicionalmente, vamos verificar os efeitos e eventuais distorções que CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 5 a tributação pode causar sobre a produção, o consumo e alocação de recursos. Já que os impostos – assim como a morte – são inevitáveis – vamos tentar responder questões do seguinte tipo: - Qual o melhor sistema tributário para a sociedade? - Quais os efeitos de um determinado tipo de tributo sobre o indivíduo isoladamente e sobre a coletividade? - As alíquotas dos impostos devem ser as mesmas para todos os bens e serviços e para todos os indivíduos? - O grau de eqüidade do sistema é satisfatório? - Qual deve ser o equilíbrio entre a tributação indireta (sobre bens e serviços) e a direta (sobre a renda e o patrimônio)? Essas e outras perguntas do mesmo gênero não têm respostas fáceis. De todo modo, o que se espera é que o sistema tributário preencha as seguintes características básicas: i) que seja eficaz no sentido de gerar receitas suficientes para o financiamento dos serviços prestados pelo governo; ii) que cada indivíduo seja taxado de acordo com sua capacidade para pagar; iii) que os tributos sejam universais, no sentido de não distinguir indivíduos em situações similares; iv) que os tributos sejam escolhidos de forma a minimizar seus efeitos sobre a atividade econômica, evitando que esta se torne mais ineficiente. Dito isso, passemos aos princípios teóricos da tributação. 3. Princípios teóricos da tributação Quando se fala de tributação, é muito difícil chegar-se a um consenso sobre o que é justo ou injusto. Todos aqueles atingidos por um imposto se julgam, em princípio, injustiçados. Isso é próprio da natureza humana. No entanto, a montagem de um sistema de CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 6 tributação que se aproxime daquilo que possa ser considerado mais justo deve se basear em dois princípios fundamentais: Neutralidade e Eqüidade. Vejamos cada um desses princípios e seus desdobramentos: 3.1. Princípio da Neutralidade As decisões dos agentes econômicos – empresas, consumidores, investidores, poupadores, etc. – são geralmente tomadas, no dia-a- dia da economia, tendo como referência o sistema de preços vigente no mercado. O principio da Neutralidade refere-se, neste caso, à não- interferência dos tributos sobre aquelas decisões. Se as decisões de alocação de recursos são baseadas nos preços relativos definidos pelo mercado, a neutralidade tributária seria obtida quando a forma de arrecadação de impostos pelo governo não modificasse aqueles preços. Se a mudança na tributação provocar alterações nos preços relativos, tal fato contribuirá para tornar menos eficientes as decisões econômicas, acarretando uma redução no nível de bem-estar da coletividade. Em síntese, o princípio da neutralidade pode ser definido como a imposição de tributos de maneira tal que não altere o comportamento privado com respeito às decisões de consumo e produção. A rigorosa aplicação desse princípio conduz ao que se costuma chamar, em finanças públicas, de tributação eficiente ou tributação ótima, no sentido de Pareto2. Uma observação importante. A análise dos efeitos dos diversos tipos de impostos sobre a atividade econômica é feita, geralmente, por meio de gráficos. Trata-se, no entanto, de gráficos um tanto complexos e para cujo entendimento se exigiria que os alunos tivessem uma razoável familiaridade com a interpretação gráfica – o que, nem sempre, é o caso. Como esses gráficos são apresentados apenas para se provar alguma conclusão dos efeitos de cada tipo de imposto, julgamos desnecessário apresentá-los aqui, pois isso 2 Uma situação alocativa é dita como “ótima” no sentido de Pareto se a produção e a distribuição não podem ser re-organizadas ou re-arranjadas para aumentar o bem-estar de um ou mais indivíduos sem prejudicar ou piorar o bem-estar de outro indivíduo. Da mesma forma, uma alocação de recursos é um “não-ótimo” de Pareto se o bem estar de alguém pode ser melhorado sem prejudicar o bem-estar de qualquer outro indivíduo. CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 7 poderia muito mais complicar do que contribuir para seu entendimento. Assim dito, vejamos, objetivamente e de forma conclusiva, os efeitos dos diversos tipos de impostos sobre o sistema de preços, sobre o consumo e sobre a alocação de recursos: i) Primeiro, vamos considerar um imposto uniforme per capita (lump-sum tax), ou seja, um imposto cujo ônus fosse repartido igualmente pelo número de consumidores, independentemente de seu nível de renda. Do ponto de vista individual, este imposto representaria uma redução na renda, porém sem afetar a escala de preferências dos consumidores, apenas reduzindo sua linha de restrição orçamentária e, nesse sentido, este imposto é considerado “neutro”; ii) Segundo, um imposto geral e uniforme sobre o consumo ou sobre a renda – também teria, em princípio, os mesmos efeitos do imposto anteriormente descrito. A eficiência nas decisões sobre alocação de recursos para a produção e consumo de mercadorias e serviços não seria, assim, afetada por impostos desse tipo; iii) Terceiro, suponha que o governo institua um imposto seletivo sobre, digamos, o consumo do produto X, mas não sobre o consumo do bem Y. Esse imposto alteraria “perversamente” os preços relativos de X e de Y, forçando o consumidor a reduzir o consumo de X, já que este se tornou relativamente mais caro. É provável que o consumidor decida trocar parte do consumo de X por mais consumo de Y – ocorrendo o chamado efeito- substituição. Isso representa uma perda de bem-estar para os consumidores – o que caracteriza uma ineficiência desse tipo de imposto – sendo tal ineficiência medida pela redução do consumo de X – e que geralmente é chamada de “peso-morto” da tributação. A descrição acima sugere que os impostos gerais (sobre a renda ou sobre o consumo) seriam mais eficientes que os impostos parciais ou seletivos – já que aqueles operam somente com o efeito-renda, sem modificar os preços relativos. Mas, atente-se que essa afirmativa só é absolutamente verdade, para o imposto per capita. Nos demais casos, essa conclusão pode ou não ser verdadeira, dependendo de cada caso. Vamos clarear melhor este ponto: na microeconomia se analisa muito a questão sobre o que leva o indivíduo a optar ou por mais CURSOS ON-LINE – FINANÇASPÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 8 trabalho ou por mais lazer. Deve ficar claro que na tomada de decisões sobre a escolha entre trabalho e lazer, um imposto geral sobre a renda aumentaria o preço relativo do trabalho em termos do número de horas dedicadas ao lazer, afetando as opções dos indivíduos. Nessa mesma linha de raciocínio, o mesmo se poderia dizer sobre a escolha entre consumo presente e consumo futuro que seria afetada por um imposto geral sobre o consumo, que aumentaria o custo do consumo presente frente à opção de poupar uma parcela da renda para consumo futuro. Nesses dois exemplos, esses impostos produziriam o efeito- substituição e violariam o princípio da neutralidade. Temos, então, como conclusão final: apenas o imposto per capita (lump-sum tax) é um imposto neutro por excelência, uma vez que sua neutralidade se mantém para todas as situações, não provocando custo de eficiência (ou excesso de carga). Isso ocorre porque sua base de incidência não está associada a fatos econômicos, não provocando, assim, mudança nos preços relativos. Mas, como nem no mundo dos impostos nada é perfeito, este imposto per capita padece de um grave defeito: sua completa desconsideração para com o princípio da eqüidade, já que todos – pobre e ricos – pagam a mesma quantia de imposto. Daí o porque de sua pouca aceitação na vida real. 3.1. Princípio da eqüidade O segundo princípio da tributação é o da eqüidade. Por esse princípio, procura-se dar um mesmo tratamento, em termos de contribuição, aos indivíduos considerados iguais (eqüidade horizontal), assegurando, ao mesmo tempo, que os desiguais serão diferenciados segundo algum critério a ser estabelecido (eqüidade vertical). Para a aplicação do princípio da eqüidade, há necessidade de se estabelecer o critério a ser utilizado para classificar os indivíduos considerados iguais e, também, a definição de normas de diferenciação. Existem dois critérios (ou dois princípios) com essa finalidade: i) O Critério do Benefício – que propõe atribuir a cada indivíduo um ônus equivalente aos benefícios que ele usufrui dos programas do governo; CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 9 ii) O Critério da Capacidade de Contribuição – que propõe que a distribuição do ônus tributário seja feita de acordo com as capacidades individuais de contribuição. Vejamos cada um desses dois critérios. 3.1.1. Critério do benefício O critério (ou princípio) do benefício estabelece que cada indivíduo deve contribuir para a produção de serviços governamentais, de forma a igualar o preço unitário do serviço ao benefício marginal que ele recebe com sua produção. Em outras palavras, cada indivíduo na sociedade deverá pagar um tributo de acordo com o montante de benefícios que ele recebe do governo. Pelo princípio do benefício, os impostos são vistos, assim, como preços que os cidadãos devem pagar pelos serviços que recebem do governo. Alguns poderiam argumentar que esse princípio é mais justo porque evitaria a situação na qual um indivíduo pagaria indiretamente pelo benefício de outra pessoa. Já os economistas argumentam que este princípio – embora de difícil operacionalização – é mais eficiente porque ele atua como no sistema de livre mercado onde cada indivíduo paga de acordo com os benefícios que ele recebe ao adquirir os bens e serviços de que precisa. Por esses argumentos, conclui-se que, quanto maior o benefício, maior será o nível de consumo e, por conseguinte, maior será o preço a ser pago. Um dos problemas, porém, com esse princípio é justamente estabelecer o que é benefício e, também, quantificar o benefício recebido, principalmente quando se sabe que os indivíduos se mostram resistentes em revelar suas preferências. Ora, se os benefícios não são conhecidos, como pode o princípio do benefício ser aplicado? Se as pessoas não querem revelar suas preferências, como evitar o surgimento dos free riders – isto é, daqueles que se aproveitam da situação em que o serviço governamental não pode ser divisível ou individualizado – como no caso da defesa nacional – e usufruem do serviço sem querer pagar por ele? Como seria medido o benefício individual a fim de que se estabeleça um valor a ser pago proporcional a este beneficio? CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 10 Esta dificuldade de se apurarem os benefícios usufruídos por cada indivíduo mostra a impossibilidade de o sistema tributário ser baseado apenas no princípio do benefício. Outra questão relevante na aplicação deste princípio refere-se à situação dos indivíduos que, por não terem renda, estariam excluídos do consumo dos bens e serviços governamentais, já que não têm como pagar por ele. Neste caso, do ponto de vista redistributivo, a função do governo estaria sendo altamente ineficiente. De tudo isso se conclui que um sistema tributário baseado apenas no princípio do benefício seria totalmente ineficiente – o que mostra a necessidade de se buscar um outro mecanismo que, associado ao princípio do benefício, torne o sistema tributário mais eficiente e mais justo. Este mecanismo seria o princípio da capacidade de pagamento, que será visto a seguir. 3.1.2. O critério da capacidade de pagamento Este critério (ou princípio) procura distribuir o ônus da tributação entre os indivíduos na sociedade de acordo com a sua capacidade de pagamento, medida usualmente pelo nível de renda. De acordo com este princípio, todo indivíduo deve contribuir no custo total da oferta de bens públicos puros (exemplo, defesa e segurança nacional) conforme sua capacidade de pagamento. Em outras palavras, os indivíduos com capacidades iguais devem contribuir no mesmo montante, enquanto indivíduos com capacidades diferentes devem contribuir com montantes diferentes. Daí, surgem os conceitos de eqüidade horizontal e de eqüidade vertical. A eqüidade horizontal – um dos princípios ortodoxos da tributação – exige que se dê igual tratamento para iguais. Os contribuintes com a mesma capacidade de pagamento devem arcar com o mesmo ônus fiscal. Trata-se de um princípio de fácil aceitação nas sociedades democráticas modernas, partindo da idéia da igualdade de todos perante a lei e da conseqüente necessidade de prevenção contra atos arbitrários do poder público em relação a indivíduos particulares. A eqüidade vertical exige que seja dado desigual tratamento para desiguais. Em outras palavras, isso significa que os indivíduos com um nível de renda maior devem pagar mais impostos que os indivíduos de renda mais baixa. CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 11 Vale observar que a implementação da eqüidade horizontal é relativamente fácil à medida que pessoas com o mesmo nível de renda devem, em princípio, dar igual contribuição tributária. Entretanto, quando se trata de eqüidade vertical, sua implementação já é um pouco mais complicada na medida em que exige um padrão de tributação diferente entre pessoas de rendas diferentes. Na verdade, há três critérios para a implementação da eqüidade vertical: i) igual sacrifício absoluto; ii) igual sacrifício proporcional; iii) igual sacrifício marginal. A aplicação do critério de igual sacrifício absoluto exigiria que o tributo sobre o indivíduo de alta renda causasse a ele uma quantidade de sacrifício de utilidade igual àquela sofrida por um contribuinte de baixa renda – ou seja, o imposto deveria causar, por exemplo, 10 unidades de desutilidade para ambos os indivíduos. O critériode igual sacrifício proporcional sugere que o imposto deveria causar a cada indivíduo o mesmo percentual de desutilidade total para obter a eqüidade vertical. Assim, por exemplo, se o indivíduo A, com renda alta, tem 200 unidades de utilidade de consumo, enquanto o indivíduo B, com renda baixa tem 100 unidades de utilidade de consumo, então A deveria pagar, com o imposto, 20 unidades de utilidade e B pagaria 10 unidades para que tenham o mesmo sacrifício. O critério de igual sacrifício marginal propõe que cada indivíduo deve arcar com uma igual redução na utilidade de sua renda, depois do pagamento do imposto. Assim, se o imposto marginal de um Real pago pelo indivíduo A causa a ele 5 unidades de desutilidade, enquanto que o pago por B provoca 15 unidades de desutilidade, então A deveria pagar taxas mais altas de imposto e B taxas mais baixa, até que suas desutilidades marginais sejam iguais em, digamos, 10 unidades de desutilidade. Se for aceita a hipótese convencional de padrões idênticos de utilidade entre contribuintes, este critério torna as rendas iguais, após o imposto, tanto para A como para B e para o resto da sociedade. Isso implica taxas marginais progressivas altamente elevadas, com alíquotas de até 100% para os extratos mais altos de CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 12 renda. Trata-se, então, de um caso de extremo oposto ao da teoria da igualdade absoluta, visto que equaliza as rendas após o imposto, em vez de equalizar os pagamentos absolutos de imposto que desconsideram diferenças de rendas. Na realidade, um sistema de tributação progressiva da renda baseia-se em duas hipóteses: i) é possível comparar utilidades entre contribuintes; e ii) a utilidade marginal da renda é decrescente. Trata-se de duas hipóteses nada realistas. Primeiro, porque a utilidade não pode ser medida em termos cardinais, ou seja, não há como comparar a utilidade interpessoal entre contribuintes, devido o alto grau de subjetividade que envolve o tema. Segundo, o conceito de capacidade de pagamento, dadas aquelas hipóteses, implica que a capacidade para pagamento do imposto aumenta mais do que proporcionalmente relativamente ao crescimento da renda, porque a utilidade marginal da renda declina a uma taxa crescente à medida que a renda se torna maior3. Em resumo, na prática, o grau de progressividade da tributação tem repousado sobre um julgamento de valor da sociedade a respeito da utilidade agregada social, em vez de um empiricamente provável fato econômico. No Brasil, assim como em outros países, a progressividade tem se restringido a um intervalo entre as faixas de rendas baixas e médias, onde a tributação é crescente, tornando-se constante a alíquota marginal a partir de um determinado nível de renda considerado elevado, com tendência da alíquota média de praticamente se igualar à alíquota marginal. Isso significa que, a partir desse ponto, a legislação entenderia que a utilidade marginal da renda deixa de ser decrescente. 4. Algumas conclusões Pelo que foi discutido acima, fica evidente que o sistema tributário deve ser estruturado, tomando-se por base os princípios do 3 Um aumento salarial de R$1.000,00 para R$1.500,00 tem uma utilidade marginal maior para o indivíduo do que se o seu salário passar de R$10.000,00 para R$10.500,00, e mais ainda se o salário passar de R$100.000,00 para R$100.500,00! CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 13 benefício e da capacidade de pagamento. Existe uma série de serviços coletivos pelos quais o governo pode aplicar o princípio do benefício. Entretanto, uma outra parcela significativa da tributação seria proveniente da tributação feita com base na capacidade de pagamento. O sistema tributário de um país existe para financiar as atividades a serem desempenhadas pelo governo que, em última instância, deverão melhorar a qualidade de vida e o nível de bem-estar da sociedade. Na definição do sistema tributário, como foi visto, devem ser observados alguns princípios ditos universais. Em primeiro lugar, deve-se buscar um mecanismo tributário que seja o mais justo possível, aplicando-se, para tanto, o princípio básico da eqüidade, tratando igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. A observância desse princípio contribui para que o sistema seja mais justo e não penalize as classes de renda menos favorecidas, de menor nível de renda. Em segundo lugar, o sistema tributário deve contemplar, também, a neutralidade. Isso significa que sua estruturação deve ser feita de tal forma que não distorça os preços relativos dos bens e serviços, tornando o tributo um fator decisivo de competitividade no mercado. Nesse sentido, o tributo deve ser universal, atingindo da mesma forma os bens e serviços com características similares e competitivos entre si. Por fim, é necessário que a sociedade tenha uma percepção de que há uma perfeita relação de custo/benefício no que se refere aos gastos do governo e à tributação. * * * 5. Um resumo do que foi visto aqui Os principais pontos abordados nesta nossa Aula Zero, de Finanças Públicas, foram: i) A idéia da justiça fiscal é antiga e teve um maior desenvolvimento com os avanços das liberdades individuais, políticas e econômicas. ii) Este desenvolvimento gerou duas propostas básicas: a de que o cidadão deve contribuir para as despesas do Estado conforme os benefícios recebidos ou conforme sua própria capacidade de pagamento. CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 14 iii) Pelo princípio do benefício, os impostos são vistos como preços pagos pelos serviços públicos recebidos pelo indivíduo. Esse enfoque admite algumas interpretações: a) que os impostos devem equivaler aos benefícios totais usufruídos pelos indivíduos, a partir dos gastos públicos; b) que os impostos não precisam ser equivalentes aos benefícios totais recebidos, mas apenas proporcionais a eles; c) que os impostos devem ser distribuídos de acordo com os benefícios marginais recebidos. iv) Ainda que defensável, do ponto de vista lógico, não existem meios que permitam operacionalizar o critério do benefício, por não serem os serviços do governo sujeitos a lei do preço. v) A preferência das sociedades modernas e democráticas é pela aplicação do princípio da capacidade de pagamento. O sinal mais indicativo dessa capacidade é preferencialmente a renda. vi) Na aplicação do princípio da capacidade de pagamento, exige-se “igual tratamento para os iguais” (eqüidade horizontal) e “desigual tratamento para desiguais” (eqüidade vertical). vii) Nesta última hipótese, os modernos sistemas tributários consagram a progressividade na tributação, ou seja: o rico deve pagar proporcionalmente mais e o pobre proporcionalmente menos. Essa idéia baseia-se na hipótese de que a renda está sujeita à lei da utilidade marginal decrescente. ________________ Apêndice: Uma digressão sobre o princípio da utilidade marginal decrescente Em finanças públicas, comumente se utiliza o termo marginal, mais particularmente utilidade marginal. Este termo foi muito citado ao longo do texto desta Aula Demonstrativa, e o mesmo deve ocorrer nas próximas aulas. Para aqueles alunos não familiarizados com a terminologia da microeconomia, vale a pena esclarecer melhor o significado deste termo. CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 15 O termo marginal, em economia, significa sempre o acréscimo nototal de uma variável decorrente do acréscimo de uma unidade de outra variável correlata. Assim, por exemplo, temos o conceito de produto marginal – que pode ser definido como o acréscimo no produto total decorrente do emprego de mais um homem na fábrica ou na fazenda. Também temos o conceito de custo marginal – que seria o acréscimo no custo total decorrente, digamos, da produção de mais uma unidade do produto. Nesta linha de raciocínio, um dos conceitos mais importantes é o conceito de utilidade marginal – que pode ser definido como o acréscimo na satisfação total do consumidor quando ele consome mais uma unidade de um determinado produto. De uma forma geral, a utilidade marginal dos bens é decrescente: quanto mais você consome de um produto, menos satisfação você tem com o consumo da última unidade consumida. Em outras palavras, a satisfação trazida pelo terceiro copo d’água ingerido é menor do que aquela trazida pelo primeiro copo d’água! Ou, o primeiro bife é mais “saboroso” do que o segundo ou o terceiro bife! Com base nesse conceito de marginalidade, os economistas desenvolveram uma teoria do comportamento do consumidor fundamentada em três axiomas: i) os consumidores gastam sua renda de forma a maximizar sua satisfação (utilidades); ii) dentro de certos limites, quanto mais de um bem o consumidor adquire, maior é a utilidade total por ele recebida; iii) cada unidade adicional de um bem gera um menor incremento de utilidade, em relação às unidades consumidas anteriormente. Este último axioma – o princípio da utilidade marginal decrescente – assume implicitamente a possibilidade de medição dos incrementos de satisfação. Também pressupõe que este efeito declinante prevaleceria quando o consumo de todas as mercadorias e serviços expandisse simultaneamente. Como tal expansão só pode ocorrer caso a renda aumente, a conclusão final é a de que a renda está sujeita à lei da utilidade marginal decrescente. CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS–TEORIA E EXERCÍCIOS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 16 Mas, será que, efetivamente, a renda está sujeita à utilidade marginal decrescente? Na verdade, a conclusão de que aumentos na renda trazem incrementos decrescentes de satisfação não se fundamenta em critérios diretos de medição, mas deriva de uma lógica fruto da observação do comportamento econômico dos indivíduos. A questão que se coloca é a seguinte: pode-se afirmar que a perda de utilidade pela redução de R$ 1.000,00 da renda de um homem rico deverá sempre ser menor do que o ganho de um homem pobre, cuja renda tenha sido aumentada em R$ 1.000,00? A resposta aparentemente mais lógica seria sim. Mas, esta questão não é tão pacífica assim. Mesmo porque, contestam alguns economistas, dois indivíduos com a mesma renda derivam diferentes níveis de satisfação de um mesmo padrão de gastos. Como se vê, a questão é polêmica e está aberta ao debate. Com essas considerações, encerramos esta nossa Aula Zero – ou Aula Demonstrativa - de Finanças Públicas. Nossa próxima Aula – a de n° 1 – versará sobre “Tipos de Impostos: progressivos, regressivos, proporcionais, diretos e indiretos”. Até lá! Mozart Foschete ______________________ CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS – PROF. MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br AULA 1: IMPOSTOS, TARIFAS, CONTRIBUIÇÕES FISCAIS E PARAFISCAIS: DEFINIÇÕES. 1. Introdução De acordo com o art. 3° do Código Tributário Nacional (CTN), tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. Vamos entender bem esta definição legal do que seja tributo. Pelo que está dito acima, ao definir que se trata de uma prestação pecuniária, a lei objetiva garantir ao Estado os recursos financeiros necessários para financiar suas despesas. Ou seja, nos sistemas tributários modernos não há mais o tributo in natura, pago em espécie ou em bens e serviços. Paga-se tributo em dinheiro. Além de pecuniária, o tributo é também compulsório – ou seja, o pagamento do tributo independe da vontade do contribuinte, nascendo diretamente da lei. Ademais, o tributo é expresso em unidades monetárias, não podendo ser avaliado em termos de outros bens ou serviços. Não há, portanto, a figura do tributo in natura ou in labore. E o que seria um tributo in natura ou in labore? Um exemplo de tributo in natura: o governo fixa um imposto sobre a importação de carne bovina, determinando que, para cada tonelada importada, o importador deveria entregar ao Fisco, a título de tributo, 100 quilos. Da mesma forma, seria um imposto in natura caso a lei determinasse que, para cada quilo de ouro extraído, os produtores nacionais entregassem 100 gramas ao órgão representante da União. Já um tributo in labore ocorreria caso a lei determinasse que todo profissional liberal, para ser autorizado a trabalhar como tal, 2 deveria prestar um dia de serviço por mês a um órgão governamental. Se tais formas de pagamento de tributo já foram usadas no passado, num ou noutro país, isso já não ocorre modernamente. Nas sociedades democráticas modernas os tributos devem ser quitados em moeda, mediante a entrega de dinheiro ao órgão governamental arrecadador. Ainda com relação à definição do CTN, está lá a expressão “que não constitua sanção de ato ilícito”. Isso quer dizer simplesmente que a incidência do tributo é sempre um ato lícito – distinguindo-se, portanto, de penalidade exatamente porque esta tem como hipótese de incidência um ato ilícito. Ou seja, tributo não é penalidade! Não se pode, contudo, concluir daí que o tributo não pode incidir sobre uma atividade econômica ilícita. Do ponto de vista tributário, um fato gerador de tributo pode perfeitamente ocorrer em circunstâncias ilícitas. Exemplificando: suponha que um indivíduo percebe um rendimento decorrente da exploração de lenocínio, ou de casa de prostituição ou de jogo de azar – atividades estas tipicamente criminosas ou ilícitas. Nestas hipóteses, o imposto de renda é perfeitamente devido. E, neste caso, o tributo não está incidindo sobre a atividade ilícita, mas sim sobre a renda auferida pelo indivíduo. Do ponto de vista da lei tributária, a condição necessária e suficiente para o surgimento da obrigação tributária – isto é, da incidência do imposto de renda – é o recebimento da renda ou de proventos de qualquer natureza. E não importa como esse recebimento ocorreu1. Continuando com a interpretação da definição do CTN do que seja tributo, diz lá que deve o mesmo ser instituído em lei. Ou seja, só a lei pode criar um tributo. Isso decorre do princípio da legalidade, prevalente no Estado de Direito, princípio este ratificado no art. 150, inciso I, da Constituição Federal que diz que nenhum tributo será exigido sem que a lei o estabeleça. E, neste caso, trata-se, em princípio, de lei ordinária. 1 O art. 43 do CTN diz que, para que o imposto de renda seja devido é necessário que ocorra aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de proventos de qualquer natureza. Essa situação é suficiente para que se configure o fato gerador deste tributo. 3 Por fim, diz a definição do CTN sobre tributo que este deve ser cobrado mediante atividade administrativa plenamente vinculada. E o que vem a ser isso? De acordo com os tributaristas, isso quer significar que a autoridade administrativa não pode, a seu juízo e a seu belo alvitre, preencher eventuais lacunas da lei, dando a sua interpretação pessoal a um determinado caso. A lei tributária deve ser exaustiva, para evitarcasuísmos, descrevendo o fato gerador da obrigação tributária, a base de cálculo, a alíquota, o prazo para pagamento, e tudo o mais. Nada deve ficar a critério da autoridade administrativa. De tudo isso, o que deve ficar claro é que a cobrança de um tributo deve ser feita de forma oportuna e pelos meios estabelecidos na lei, sem caber à autoridade administrativa decidir se cobra do individuo A e deixa de cobrar do indivíduo B, por este ou por aquele motivo. Ou o tributo é devido, nos termos da lei, e nesse caso tem de ser cobrado, ou não é devido, também nos termos da lei, e neste caso não será cobrado. 2. Espécies de tributo Tributo pode ter como fator gerador tanto uma situação independente de qualquer atividade estatal específica relativa ao contribuinte, como uma atuação estatal específica relativa ao contribuinte. No primeiro caso, existem os chamados tributos não-vinculados (impostos) e, no segundo, tributos vinculados (taxas e contribuições de melhoria). A cobrança de impostos não está associada ou vinculada a qualquer atuação ou atividade do Estado. O imposto existe independentemente da prestação específica de um serviço ou de uma obra pelo governo. Já a cobrança de taxas e de contribuições de melhoria necessariamente está associada ou vinculada a uma atividade, ou a um serviço ou a uma obra realizada pelo governo. Tributo é gênero, tendo como espécies: os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria. Vamos descrever as características de cada um. 4 3. Imposto Conforme disposto no art. 16 do CTN, imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. A rigor, a única exigência para que surja a obrigação de pagar um imposto é que esteja previsto em lei. Esta é a condição necessária e suficiente para que o imposto seja devido. Em relação ao imposto, a situação prevista em lei não vincula a obrigação tributária a nenhuma atividade específica do Estado para com o contribuinte. Existem várias hipóteses de incidência do imposto e o exame de todas elas mostra que em nenhuma hipótese está presente a atuação do Estado. Ao contrário, em todas elas a condição prevista em lei como necessária e suficiente ao surgimento da obrigação tributária está sempre relacionada com o fato de o contribuinte possuir algo de valor econômico, ou agir economicamente ou ganhar uma renda, sem qualquer vinculação com o agir ou o atuar do Estado. Um exemplo típico do que estamos dizendo é o caso do imposto de renda cuja cobrança pelo Estado depende exclusivamente do fato de alguém auferir uma renda, nada mais. 3.1. Classificação dos Impostos Existem muitos critérios que podem ser utilizados para a classificação dos impostos, tudo dependendo do objetivo que se tem em mente. Neste ponto de nosso Curso, vamos nos limitar à classificação quanto à competência para a instituição do imposto. Mais adiante, introduziremos outros tipos de classificação. De uma forma geral, quanto à competência, os impostos podem ser classificados em: a) federais; b) estaduais; e, c) municipais. 5 3.1.1. Impostos Federais: São os seguintes os impostos da competência da União: i) Imposto de importação Há um entendimento universal de que os tributos aduaneiros não devem ser de atribuição dos Estados-membros ou dos Estados Federados. Por terem implicações externas (internacionais!), tal atribuição deve caber ao Estado-Central ou, no caso brasileiro, à União. Este é o caso do imposto de importação, também chamado de “tarifa aduaneira”, ou de “direitos aduaneiros” ou, ainda, de “tarifa de importação”. O fato gerador do imposto de importação, conforme diz o art. 19 do CTN, é a entrada do produto estrangeiro em território nacional. Já o seu contribuinte é o importador ou quem a ele se equiparar. Quando se tratar de produtos apreendidos ou abandonados, o contribuinte será o arrematante destes. Um outro aspecto importante a mencionar relativamente ao imposto de importação é o seu caráter ou função extra-fiscal. Em outras palavras, sua criação tem como objetivo principal a proteção à indústria nacional e não, necessariamente, a arrecadação de recursos financeiros para o Tesouro Nacional. ii) Imposto de exportação De acordo com o art. 153, inciso II, da Constituição Federal, compete à União instituir e cobrar o imposto sobre a exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados. O fato gerador deste imposto se caracteriza no momento da saída daqueles produtos do território nacional, coincidindo, no caso, com a expedição da guia de exportação ou documento 6 equivalente. O contribuinte deste imposto é o exportador ou quem a ele se equiparar. Atente-se, porém, que nem todos os produtos exportados estão sujeitos ao imposto de exportação, mas somente aqueles constantes da lista elaborada pelos órgãos competentes do Poder Executivo. Se o produto que sair do território nacional não constar da lista, trata-se, no caso, de não-incidência tributária. De outra parte, tal como no caso do imposto de importação, a função predominante do imposto de exportação é extra-fiscal, prestando-se muito mais como instrumento de política econômica do que como fonte de recursos financeiros para o Estado. Um aspecto importante quanto ao imposto de exportação é que, por se constituir num instrumento de política econômica, a ele não se aplica o princípio da anterioridade da lei em relação ao exercício financeiro de cobrança, havendo, inclusive, a possibilidade de alteração de alíquotas pelo Poder Executivo, a qualquer tempo. iii) Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza O imposto sobre e renda e proventos de qualquer natureza, ou simplesmente imposto de renda, como é geralmente conhecido, é mais um imposto da competência federal. A razão ou pretexto para isso é que se trata de um poderoso instrumento de redistribuição da renda – um objetivo que se insere muito mais no campo de um governo federal do que de um governo regional. O imposto de renda se constitui, hoje, na principal fonte de receita tributária da União, tendo, como tal, uma função essencialmente fiscal. Mas, também não deixa de ter uma função extra-fiscal pois freqüentemente é usado como instrumento de redistribuição da riqueza dos mais aquinhoados para os menos favorecidos, bem como para estimular o desenvolvimento regional e setorial. Tanto a Constituição Federal (art. 153, III) como o CTN (art. 43) definem como fato gerador do imposto de renda a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda, ou seja o 7 produto do capital, do trabalho ou de ambos, e a aquisição de proventos de qualquer natureza, aí compreendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no conceito de renda. Deve ficar claro que, pela legislação tributária vigente, a incidência do imposto independe da denominação da renda, da sua origem e da forma de percepção da renda. Ainda que o conceito de renda seja discutível e polêmico, o CTN deixa bem claro que renda é sempre um produto ou resultado do trabalho e/ou do capital, considerando como proventos os acréscimos de patrimônio que não se enquadrarem no conceito de renda. De outra parte, quando o CTN menciona “a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica” quer dizer que a renda ou os proventos se limitam àqueles que foram pagos ou simplesmente creditados. Com tal entendimento, não se pode enquadrar como renda – para efeitos de tributação sobre a pessoa física – o lucro não distribuído pela empresa a seus sócios. Nesse caso, a renda não está disponível para o sócio. Um outro aspecto a registrar é que, para efeitos de tributação, não existe rendapresumida. A existência da renda tem de ser real. Presumido ou arbitrado pode ser o montante da renda, mas não a sua a existência. No caso de pessoa física ou natural, a base de cálculo é, em regra, o rendimento bruto mensal por ela auferido. Diz-se “em regra” porque, na prática são permitidas algumas deduções, como pensões alimentícias e encargos por dependentes, despesas médicas e com educação, etc.. Já no caso de pessoa jurídica, a base de cálculo do imposto é o lucro que, conforme cada caso, pode ser real, presumido e arbitrado. Por lucro real deve-se entender o acréscimo real do patrimônio da empresa, durante certo período. O lucro presumido aplica-se às pequenas firmas e às pessoas jurídicas cuja receita bruta seja inferior a determinado montante e que, uma vez atendidas certas exigências legais, são dispensadas de fazer escrituração contábil. Nesse caso, o imposto de renda é calculado sobre o lucro presumido – sendo este o resultado da aplicação, sobre a receita bruta, de coeficientes estabelecidos pela lei. 8 Um ponto importante a considerar é que a aplicação do critério do lucro presumido é uma opção do contribuinte que atende as exigências legais para este fim, e não uma obrigatoriedade ou uma imposição do fisco. Já a tributação com base no lucro arbitrado é aplicada nas seguintes hipóteses: i) a empresa, sujeita à tributação com base no lucro real, não dispõe de contabilidade ou escrituração na forma da lei; ii) a empresa, sujeita à tributação com base no lucro presumido, deixa de cumprir as obrigações acessórias relativas à sua determinação; iii) recusa do contribuinte em apresentar à autoridade da Administração tributária os livros ou documentos de escrituração; iv) a escrituração do contribuinte contém vícios, erros ou deficiências que a tornam imprestáveis para a apuração do lucro; v) opção espontânea do contribuinte por essa forma de cálculo do imposto. Atente-se que o lucro arbitrado será um percentual da receita bruta; caso esta seja desconhecida, cabe ao Ministro da Fazenda fixar aquele percentual, conforme o tipo de atividade econômica do contribuinte. Mas, sempre restará ao contribuinte o direito de demonstrar que não auferiu realmente o lucro no valor arbitrado pela autoridade administrativa. De outra partem, o contribuinte do imposto de renda pode ser pessoa física ou pessoa jurídica. Pessoa física é a pessoa natural, o indivíduo. Pessoa jurídica é aquela criada pelo Direito – geralmente identificada como uma empresa, por menor que esta seja. Vale observar que as pessoas jurídicas dedicadas, apenas, à prestação de serviços profissionais são isentas do imposto de renda, sendo os seus sócios tributados pelos lucros respectivos. Este seria, por exemplo, o caso de um escritório de advocacia, devidamente registrado como tal e com três, quatro ou mais advogados sócios. 9 iv) Imposto sobre produtos industrializados O imposto sobre produtos industrializados – ou simplesmente IPI – é outra espécie de tributo da competência da União. Isso está estabelecido no inciso IV do art. 153, da CF, e repetido no art. 46 do CTN. Mas, embora a competência para a sua instituição e cobrança seja do Governo Federal, vale observar que uma significativa parcela da arrecadação do IPI é transferida aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios – conforme está disposto no art. 159, incisos I e II, da CF. Do ponto de vista constitucional, o IPI é um imposto seletivo em função da essencialidade do produto (art. 153, §2°, inc. IV, da CF) e, como tal, tem função extra-fiscal. No entanto, dado o volume expressivo de receita que acarreta para a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, não há como negar- lhe também o caráter fiscal. De acordo com o CTN, para efeitos do IPI, considera-se industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo. Já nos termos do art. 46 do CTN, constitui-se fato gerador do IPI: a) seu desembaraço aduaneiro, quando se tratar de produto importado; b) a saída do produto do estabelecimento do contribuinte; e, c) sua arrematação, quando apreendidos e levados a leilão. Justamente por se tratar de um imposto seletivo, as alíquotas do IPI são as mais diversas, variando, hoje, desde zero até 365,63%. Na prática, a maioria das alíquotas, porém, situa-se abaixo de 20%. A alíquota zero significa que o produto não sofre, temporariamente, o ônus do tributo, mas não está isento do imposto. A isenção só pode ser concedida por lei, mas, constitucionalmente, o Poder Executivo pode alterar a qualquer 10 tempo as alíquotas do IPI (mas, claro, dentro de certos limites fixados em lei). Assim, quando o governo quer “privilegiar”, por alguma razão, algum produto, utiliza o expediente de reduzir a zero sua alíquota, sem que isso se constitua numa isenção. A qualquer tempo, esta alíquota zero pode ser aumentada, independentemente de lei específica para isso. Um aspecto importante a mencionar é que, por força de dispositivo constitucional, o IPI é um imposto não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas (fases) anteriores (art. 153, §3°, inc. II, da CF). E quem são os contribuintes do IPI? –São contribuintes do IPI: a) o importador ou quem a ele a lei equiparar; b) o industrial ou quem a ele a lei equiparar; c) o comerciante de produtos sujeitos ao imposto, que os forneça aos industriais ou aos a estes equiparados; d) o arrematante de produtos apreendidos ou abandonados, levados a leilão. E mais: Pelo disposto no art. 51 e seu parágrafo único, do CTN, para os efeitos do IPI considera-se contribuinte autônomo qualquer estabelecimento de importador, industrial, comerciante ou arrematante. v) Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro e sobre operações relativas a títulos e valores mobiliários Como se trata de um imposto que se presta como instrumento de política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores, a competência para sua instituição deve mesmo ser da União e, por isso mesmo, todas as operações compreendidas no campo deste imposto são disciplinadas por lei federal. 11 O Imposto sobre operações de crédito, de câmbio e seguro ou relativas a títulos e valores mobiliários, ou, simplesmente, imposto sobre operações financeiras – IOF -, como é conhecido na prática, tem uma função predominantemente extra-fiscal. De fato, embora contribua com elevadas receitas para o Tesouro, o IOF é muito mais um instrumento de política “financeira” do governo, do que um simples meio de arrecadação de receitas. Conforme estabelece o art. 63 do CTN, são as seguintes as hipóteses de incidência desse imposto: a) a efetivação de uma operação de crédito; b) a efetivação de uma operação de câmbio; c) a efetivação de uma operação de seguro; e, d) a emissão, transmissão, pagamento ou resgate de títulos e valores mobiliários. Um ponto interessante a registrar é que, constitucionalmente, as alíquotas desse imposto podem ser alteradas por norma do Poder Executivo, atendidas as condições e os limites fixados em lei, não se sujeitando ao princípio da anterioridade, nem ao princípio da legalidade. De outra parte, conforme dispõe o art. 66 do CTN, o contribuinte deste imposto pode ser qualquer das partes na operação tributada, ficando a critério do legislador ordinário esse indicação. vi) Imposto sobre a propriedade territorial rural A atribuição constitucional do imposto sobre a propriedade territorial rural à União se explica simplesmente pelo propósito de utilizá-lo como instrumento de fins extra-fiscais, funcionandocomo meio auxiliar do disciplinamento estatal da propriedade rural, atentando-se que este imposto é considerado um importante instrumento no combate aos latifúndios improdutivos. Conforme reza o art. 29 do CTN, o fato gerador do ITR é a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel por natureza, como definido na lei civil, localizado fora da zona urbana do Município. 12 A alíquota do ITR varia de 0,3% a 20% em função da área do imóvel e do grau de sua utilização e o seu contribuinte é o proprietário do imóvel, o titular de seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título (art. 31 do CTN). vii) Imposto sobre grandes fortunas O art. 153, inc. VII, da Constituição Federal de 1988 atribui à União a competência para instituir imposto sobre grandes fortunas, nos termos da lei complementar. No entanto, até o presente momento, nem este imposto foi instituído, nem foi editada a lei complementar para definir o que se deve entender como grande fortuna. 3.1.2. Impostos Estaduais: São os seguintes os impostos da competência estadual: i) Imposto sobre heranças e doações; ii) Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e prestações de serviços – ICMS; iii) Imposto sobre a propriedade de veículos automotores. Por serem do âmbito estadual e, como tal, não interessarem à Receita Federal, deixamos de tecer comentários sobre os impostos acima. 3.1.3. Impostos Municipais: São os seguintes impostos da competência do Município: i) Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU; ii) Imposto sobre a transmissão “inter-vivos” de bens móveis e direitos a eles relativos; 13 iii) Imposto sobre serviços de qualquer natureza. Tal como no caso dos impostos estaduais, os impostos acima, por serem da competência do Município, não fazem parte do âmbito de atuação da Receita Federal, razão pela qual deixamos de fazer comentários e análises dos mesmos. 4. Contribuições sociais As contribuições sociais, ou paraestatais ou de previdência têm características ora de imposto, ora de taxa. Segundo o art. 149 da Constituição Federal, compete à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas. Do dispositivo constitucional acima pode-se conceituar a contribuição social como espécie de tributo com finalidade definida, a saber, intervenção no domínio econômico, interesse de categorias profissionais ou econômicas e seguridade social. Embora seja polêmica a definição da contribuição social como uma espécie de tributo, constitucionalmente a instituição das contribuições sociais deve observar as normas gerais de Direito Tributário, bem como os princípios da legalidade e da anterioridade, excetuando, quanto a este último, a seguridade social – que tem regras próprias, como se verá mais adiante. Espécies de contribuições sociais As contribuições sociais podem ser classificadas em três espécies, a saber: a) contribuições de intervenção no domínio econômico; b) contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas; e, 14 c) contribuições de seguridade social. Vejamos um pouco de cada uma: i) Contribuições de intervenção no domínio econômico O que caracteriza esta espécie de contribuição social como tributo de função tipicamente extra-fiscal é esta finalidade de intervenção no domínio econômico. De fato, esta contribuição social não se destina a suprir os cofres públicos de recursos financeiros para o custeio das atividades desenvolvidas pelo Estado. Ela é, simplesmente, um instrumento de intervenção no domínio econômico, e não um instrumento de arrecadação fiscal. ii) Contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas Esta contribuição social caracteriza-se como de interesse de categoria profissional ou econômica quando se destina a propiciar a organização dessa categoria, fornecendo recursos financeiros para a manutenção de entidade associativa. Observe-se que, pelo que reza o art. 8°, inciso IV, da CF, a entidade representativa da categoria profissional ou econômica é credora de duas contribuições: uma, a contribuição fixada pela assembléia geral da categoria – esta de natureza não tributária; a outra, a prevista em lei – com caráter nitidamente fiscal. iii) Contribuições de seguridade social O regime jurídico das contribuições de seguridade social tem bases bem definidas na Constituição, conforme se pode ver pelo art. 195, incisos I, II e III e seu § 6° e ainda pelos arts. 165, §n 5° e 194, inciso VII. 15 De acordo com a Emenda Constitucional n° 20, de 15/12/1998, a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta ou indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estado, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais; I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidente sobre; a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro; II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre a aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; III – sobre a receita de concursos de prognósticos; IV – do importador de bens ou serviços do exterior ou de quem a lei a ele equiparar. Um aspecto importante sobre as contribuições sociais deve ser ressaltado: Parece ponto pacífico que estas contribuições não têm a função de prover o Tesouro Nacional de recursos financeiros. O que parece certo, pelo que se disse acima, é que algumas contribuições têm função parafiscal e outras, extra-fiscal. As contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, bem como as contribuições de seguridade social, têm uma clara função para-fiscal. Isso porque estas contribuições destinam-se a prover de recursos financeiros entidades do Poder Público com atribuições específicas, desvinculadas do Tesouro Nacional, no sentido de que dispõem de orçamento próprio. Já as contribuições de intervenção no domínio econômico vinculam-se ao órgão do Poder Público incumbido de desenvolver ações intervencionistas, ou de administrar fundos decorrentes da intervenção estatal na economia. Como tal, têm função extra- fiscal. 16 Contribuição de iluminação pública Antes de encerrar este tópico sobre contribuições sociais, vale registrar que a Emenda Constitucional n° 39, de 19/12/2002, introduziu na C.F. o art. 149-A, atribuindo aos municípios e ao Distrito Federal competência para instituir contribuição destinada ao custeio da iluminação pública. Referido dispositivo constitucional facultou, inclusive, a cobrança daquela contribuição na fatura de energia elétrica. 5. Taxas Diferentemente do imposto – cujo fato gerador não está vinculado a nenhuma atividade estatal específica relativa ao contribuinte – a taxa, pelo contrário, tem como principal característica o fato de que sua incidência está vinculada a uma atividade estatal específica relativa ao contribuinte. Daí, dizer-se que a taxa é um tributo vinculado. Mas, observe- se que se tal vinculação a distingue do imposto, não é a mesma suficiente para sua identificação específica, pois também a contribuição de melhoria – como se verá adiante - tem seu fato gerador vinculado a uma atividade estatal específica. Assim,é importante salientar que a taxa é vinculada a um serviço público, ou ao exercício do poder de polícia. Resumindo, e pelo que se pode deduzir do disposto no art. 145, inciso II, da CF, e no art. 77 do CTN, taxa é espécie de tributo cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia, ou o serviço público, prestado ou posto à disposição do contribuinte. A definição de “poder de polícia” está contida no art. 78 do CTN: “-Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ao ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, 17 à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”. Como exemplos de taxas nas quais o fato gerador é o poder de polícia podem ser citados: a taxa de licença para construções ou edificações; a licença para a localização e funcionamento de atividade empresarial, cobrada pelos municípios; a taxa de licença cobrada para publicidade por meio de outdoors, e outras. Já em relação ao “serviço público”, o CTN não estabeleceu sua definição ou conceito. Os administrativistas entendem por serviço público toda e qualquer atividade prestacional realizada pelo Estado, ou por quem fizer suas vezes, para satisfazer, de modo concreto e de forma direta, necessidades coletivas. Ou seja, diferentemente do poder de polícia, o serviço público é sempre uma atividade prestacional de natureza material. Fato Gerador O art. 145, inc. II, da CF, estabeleceu que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição. Em síntese, para que o serviço público possa servir como fato gerador de taxa, deve preencher os seguintes requisitos: a) ser específico e divisível; b) ser prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição; e, c) ser utilizado, efetiva ou potencialmente, pelo contribuinte. Ressalte-se que o fato gerador da taxa é sempre uma atividade estatal específica relativa ao contribuinte, envolvendo sempre os conceitos de poder de polícia e de serviço público. 2.4. Preço público 18 É um tanto polêmica, em Finanças Públicas, a distinção entre taxa e preço público. Quando se trata de remuneração pelo uso ou pela aquisição da propriedade de bens do Estado, claramente a receita é um preço, e jamais uma taxa. Deve ficar claro que o preço público, ao contrário da taxa – que é uma das espécies de tributo – não possui natureza tributária e, como tal, não está sujeito aos princípios legais da tributação. A questão surge quando se trata de serviços, onde nem sempre fica claro se a remuneração é uma taxa ou um preço. Um dos critérios sugeridos para a distinção entre os dois seria a compulsoriedade – que está sempre presente quando se trata de taxa, mas ausente em relação ao preço, que seria facultativo. Isso, inclusive, já foi objeto de decisão do próprio Supremo Tribunal Federal – que bem definiu a facultatividade para o preço público e compulsoriedade para a taxa. O que se pode dizer é que o preço público seria uma remuneração correspondente a um serviço público não específica e necessariamente de natureza estatal, geralmente relacionada a uma atividade de natureza comercial ou industrial. Exemplos de serviços públicos de natureza privada seriam os serviços de telefonia, de energia elétrica, de saneamento básico, distribuição de gás e outros tantos. De uma forma geral, pode-se afirmar o seguinte: a) se a atividade estatal for típica, específica e própria das funções e atribuições do Estado, a receita é fruto de uma taxa; b) se a atividade, a despeito de exercida pelo Estado, for mais apropriada ao campo de atuação do setor privado, a receita origina-se de um preço; c) e se houver dúvida quanto à natureza da atividade desempenhada pelo Estado, cabe à lei definir a receita como taxa ou como preço. Um aspecto adicional que deve ser mencionado quanto ao fornecimento de serviços públicos que, mesmo tendo características de serviço privado, acabam sendo remunerados por 19 taxa e não por serviço público, é o seguinte: há um entendimento generalizado, fruto de decisões judiciais, de que os serviços de energia elétrica, de água e esgoto, de lixo e assemelhados, são remunerados, em princípio, por um preço ou tarifa pública. No entanto, se houver alguma lei dispondo que tais serviços são de fornecimento exclusivo estatal (do governo federal, ou do governo estadual ou do governo municipal), não podendo ser supridos por outros meios (entidades privadas), a remuneração é uma taxa. 6. Contribuição de Melhoria O Código Tributário Nacional não definiu o que é contribuição de melhoria. Mas, pelo disposto no art. 81 daquele Código, não é difícil chegar-se a uma definição. Como já vimos antes, pelo CTN, os tributos em geral podem ser vinculados – ou seja, aqueles cujo fato gerador está ligado a uma atividade estatal específica relativa ao contribuinte, como é o caso das taxas e da contribuição de melhoria – ou não vinculados – ou seja, aqueles cujo fato gerador não está ligado a nenhuma atividade estatal específica relativa ao contribuinte, como é o caso dos impostos. Definicionalmente, podemos dizer que a contribuição de melhoria é um tributo vinculado, cujo fato gerador é a valorização de imóvel do contribuinte, decorrente de obra pública. A esta definição pode-se acrescentar que a contribuição de melhoria tem por finalidade a justa distribuição dos encargos públicos, fazendo retornar ao Tesouro Público o valor despendido com a realização das obras públicas que provocaram a valorização do imóvel. Assim considerado, podemos afirmar que a contribuição de melhoria tem uma função fiscal, e também uma função redistributiva de eqüidade fiscal. 20 O fato gerador da contribuição de melhoria é a valorização do imóvel do qual o contribuinte é proprietário, ou enfiteuta2, atentando-se que tal valorização deve decorrer de obra pública. Ou seja, não basta a realização da obra para que seja devida a contribuição de melhoria. É necessário que haja valorização do imóvel e que esta seja conseqüência da obra pública. Distinção entre contribuição de melhoria e de taxa Tanto a contribuição de melhoria como a taxa são tributos vinculados a atividade estatal, mas isso não as faz sinônimas. A taxa – como já foi bastante enfatizado - tem seu fato gerador relacionado com o exercício regular do poder de polícia ou com uma prestação de serviços. Já a contribuição de melhoria tem seu fato gerador ligado necessariamente a uma obra pública. Também não se pode confundir uma obra com um serviço público. Na obra pública, a atividade estatal termina quando o bem público fica pronto; no serviço público, a atividade é permanente. Por exemplo, a pavimentação de uma avenida é uma obra pública; já a sua limpeza e conservação é um serviço público. * * * Com essas considerações, nós encerramos nossa Aula de n° 1 – que, na verdade, é nossa 2ª Aula, já que a primeira – a Aula Demonstrativa – teve o número zero! ______________________ Bibliografia consultada para a elaboração deste texto: 1. Machado, H. B, Curso de Direito Tributário, Malheiros Editores, 26ª Edição, S.Paulo, 2005. 2. Constituição Federal de 1988, especialmente o Título VI – Da Tributação e do Orçamento. 3. Código Tributário Nacional. 4. Foschete,M. – Os impostos no Brasil – Unipac-BD, 2002 – (Texto p/ discussão – mimeo). 2 Enfiteuse é a cessão do domínio útil, com reserva de domínio direto, de uma propriedade, pelo seu dono ao enfiteuta mediante o pagamento de pensão ou foro anual. 21 CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 1 AULA 2: TIPOS DE IMPOSTOS: PROPORCIONAL, PROGRESSIVO, RE- GRESSIVO, DIRETOS E INDIRETOS. A CARGA FISCAL. Observação: Esta Aula 2 cobre os tópicos 3 e 5 do programa de Finanças Públicas. 1. Introdução Dependendo da forma pela qual é imposta, a tributação afetará diferentemente os vários setores da economia, bem como os indivíduos e as empresas. De uma forma geral, os tributos são cobrados de acordo com a renda dos indivíduos, e/ou de acordo com as propriedades, com a riqueza, com os lucros das empresas e os bens e serviços. Embora o imposto de renda se constitua como a mais importante fonte de receitas fiscais na maioria dos países, sempre existe o problema quanto ao que se deve considerar como “renda”. As opiniões divergem quanto a isso, principalmente quando se trata de tributá-la. Mais complicada e controversa ainda é a definição do que seja “riqueza” para efeitos de tributação. Embora a tributação da riqueza possa se constituir numa excelente fonte de arrecadação tributária, a experiência de vários países mostra que isso não ocorre muito na prática, provavelmente devido às dificuldades de se apurar e definir de forma apropriada a riqueza para efeitos tributários. Um outro tipo de tributação é aquele incidente sobre os bens e serviços – denominada como tributação indireta, como se verá adiante – e que tem representado uma significativa fonte de arrecadação. De uma maneira geral, a estrutura de arrecadação fiscal da maioria dos países é baseada nas fontes mencionadas acima, dando origem a diversas classificações de tributos. Em primeiro lugar, esses tributos podem ser classificados em diretos e indiretos; os tributos diretos, por sua vez, podem ser classificados em CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 2 proporcionais, progressivos e regressivos. Vejamos um pouco de cada um deles: 2. Tributos diretos e indiretos A diferença básica entre esses dois tipos de tributos está na maneira como eles afetam os indivíduos na sociedade. Conceitualmente, o tributo direto é aquele que incide sobre a renda e o patrimônio do indivíduo e das empresas. Neste caso, costuma-se dizer que o agente que recolhe o tributo é o próprio contribuinte, isto é, aquele que, em última análise, arca com o ônus do tributo. Como exemplos de impostos diretos podemos mencionar o imposto sobre a renda e os impostos sobre o patrimônio – IPTU, IPVA, ITR, etc. Já o tributo indireto é aquele que é cobrado sobre os bens e serviços consumidos pelo indivíduo, sendo geralmente incorporados aos preços. Como exemplos de impostos indiretos podemos mencionar o IPI, o ICMS, o ISS, o imposto de importação, o IOF, etc. Costuma-se dizer que, como o tributo indireto está incorporado aos preços dos produtos, nem sempre aquele que arca com o ônus deste imposto é quem o recolhe ao fisco. O produtor/vendedor – responsável pelo recolhimento do imposto - tem, dependendo do tipo de produto, perfeitas condições de repassá-lo ao consumidor. O peso de cada um desses tipos de tributos na arrecadação tributária mostra a maneira pela qual os tributos atingem os indivíduos na sociedade. Ou seja, dependendo das participações relativas dos tributos diretos e indiretos no total da arrecadação fiscal, o sistema tributário estará penalizando mais ou menos determinada camada da população. Com regra geral pode-se afirmar que: - Se os impostos diretos tiverem maior participação relativa, significa que o sistema tributário estaria obtendo maior volume de receitas das camadas mais ricas da população. Se a maior parcela da arrecadação tributária tiver como fonte os tributos indiretos, o maior ônus do imposto estaria recaindo sobre as camadas mais pobres. 3. Sistemas de tributação CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 3 Dependendo do tratamento tributário dado às diversas camadas de renda na sociedade, os sistemas tributários podem ser classificados em proporcional, progressivo ou regressivo. Vejamos as características de cada um: 3.1. Sistema proporcional Um sistema é dito proporcional quando se aplica a mesma alíquota do tributo para os diferentes níveis de renda. A Tabela 1 mostra um exemplo desse sistema e seus efeitos sobre as diversas classes de renda. Esta Tabela divide hipoteticamente a população em quatro classes – A, B, C, D – com rendas brutas variando de 1.000 a 4.000. A coluna (C) mostra uma alíquota do imposto de renda de 10%, igual para todas as quatro classes – o que, no caso, representa um imposto proporcional. Tabela 1 Sistema de tributação proporcional (A) Classes de renda (B) Renda bruta (C) Alíquota (%) (D) Imposto pago (E) Renda líquida (=(B)–(D) (F) % da renda total antes do Imposto (G) % da renda total depois do imposto A B C D 1.000 2.000 3.000 4.000 10 20 30 40 100 200 300 400 900 1.800 2.700 3.600 10 20 30 40 10 20 30 40 10.000 1.000 9.000 100 100 As colunas (D) e (E) mostram, respectivamente, o imposto pago por cada classe e a renda líquida após deduzido o imposto. Já as colunas (F) e (G) mostram quanto a renda de cada classe representava, proporcionalmente, em relação ao total da renda das quatro classes, antes e depois do imposto. Verifica-se que, a aplicação de uma mesma alíquota a todas as classes de renda não altera aquela relação após deduzido o imposto. Em outras CURSOS ON-LINE – FINANÇAS PÚBLICAS PROFESSOR MOZART FOSCHETE www.pontodosconcursos.com.br 4 palavras, um sistema de tributação proporcional não tem impacto ou efeito nenhum sobre a distribuição da renda na sociedade. 3.2. Sistema progressivo Num sistema tributário dito progressivo, as alíquotas do imposto de renda crescem à medida que cresce a renda. A Tabela 2 mostra claramente os efeitos sobre a distribuição da renda quando se aplica este sistema. Aqui também a população foi dividida em quatro classes, de acordo com a renda de cada um: A, B, C e D. Na coluna (C), aparecem os percentuais dos impostos aplicados e que são crescentes para as classes de renda mais alta. Tabela 2 Sistema de tributação progressivo (A) Classes de renda (B) Renda bruta (C) Alíquota (%) (D) Imposto pago (E) Renda líquida (F) % da renda antes do Imposto (G) % da renda depois do imposto A B C D 1.000 2.000 3.000 4.000 10 20 30 40 100 400 900 1.600 900 1.600 2.100 2.400 10 20 30 40 12,8 22,8 30,0 34,4 10.000 3.000 7.000 100 100 Os efeitos da aplicação do sistema de tributação progressivo são sentidos quando se constata o novo perfil da renda líquida, comparado com o perfil da renda antes do imposto. As colunas (F) e (G) mostram a participação de cada grupo na renda total da população, antes e depois do imposto progressivo. Por ali se vê que houve uma redistribuição da renda após a aplicação do imposto. Observe-se que a magnitude das alterações na
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