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Eysenck, McCrae e Costa - Teoria dos traços e dos fatores.

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vsenckJ' McCrae e
osta: Teoria dos
raços e dos Fatores
Visão Geral da Teoria elos Traços e dos
Fatores
, Biografia ele nans ]. Eysenc/c
/ O Trabalho pioneiro de Raymond B. Catte/l
,.. Funelamentos da Análise elos Fatores
;;- Teoria de Fatores de Eysenck
Critérios para Identificação dos Fatores
Hierarquia da Organização Comportamental
d- Dimensões ela Personalidade
Extroversâo
Neuroticisrno
Psicoticismo
"" Mensurando a Personaliclaele
@- As Bases Biológicas da Personalidade
~ Personalidade como Previsor
Personalidade e Comportamento
Personaiidade e Doença
<v Os Cinco Grandes Fatores: Taxonomia ou
Teoria?
<;;.- Biografias de RoiJert R. McCrae e Paul T.
costa)r.
<i:r Em Busca dos Cinco Grandes Fatores
Descoberta dos Cinco Fatores
Descrição dos Cinco Fatores
""' Evolução da Teoria elos Cinco Fatores
Unidades da Teoria dos Cinco Fatores
postulados Básicos
<0 PesC/uisv. Relacionada
Biologia e Personalidade
394
Capítulo 14 Eysenck, McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 395
14 Asorte e o acaso em geral desempenham um papel decisivo na vida das pessoas. Umevento fortuito dessa natureza ocorreu com um jovem alemão de 18 anos que havia
deixado sua terra natal como conseqüência da tirania nazista. Mais tarde, ele se estabe-
leceu na Inglaterra,' onde tentou matricular-se na Universidade de Londres. Era um leitor
ávido, interessado tanto em artes quanto em ciências, mas sua primeira escolhacurricular
foi a Física.
No entanto, um acontecimento alterou o fluxo de sua vida e, conseqüentemente, o
curso da história da psicologia. Com o objetivo de ser aceito na universidade, foi-lhe soli-
citado que realizasse um exame de admissão, o qual ele fez após ter estudado durante um
ano em lima faculdade de formação de técnicos. Após ter sido aprovado, matriculou-se
confiante, na Universidade de Londres, planejando obter sua graduação em Física. No en-
tanto, disseram-lhe que ele havia realizado o teste com as disciplinas erradas em seu exame
de admissão e, deste modo, não estava apto para prosseguir na área de Física. Em vez de
aguardar outro ano para realizar os testes corretos, ele perguntou se havia alguma outra
disciplina científica para a qual estivesse apto a cursar. Quando lhe disseram que poderia
cursar psicologia, ele perguntou: "Mas, afinal de contas, o que é psicologia?". Nunca havia
ouvido falar naquilo, embora tivesse uma vaga idéia sobre psicanálise. Poderia a psicologia
ser uma ciência? Contudo, ele não tinha muita escolha, exceto obter uma graduação em
psicologia, de forma que imediatamente entrou. na universidade para graduar-se em uma
área acerca da qual não conhecia praticamente nada. Anos mais tarde, o mundo da psicolo-
gia conheceria Hans J. Eysenck, talvez o mais produtivo escritor da história da psicologia.
Em sua autobiografia, Eysenck (1997b) simplesmente ressaltou que em virtude de eventos
fortuitos como esses, "a sorte de alguém é decidida pela estupidez burocrática" (p. 47).
Ao longo de sua vida, Eysenck lutou contra a estupidez burocrática e qualquer outro
tipo de estupidez contra a qual viesse a se deparar. Em sua autobiografia, descreveu a si
mesmo como "um moralista puritano (...) que não tolerava tolos (ou mesmo pessoas nor-
malmente brilhantes) com satisfação" (Eysenck, 1997b. p. 31).
Eysenck McCra.
Visão Geral da Teoria dos Traços
e dos Fatores
Como a personalidade pode ser melhor avaliada? Por meio de testes padronizados? Ob-
servações clínicas? Julgamentos de amigos e conhecidos? Os adeptos da teoria dos fatores
utilizaram todos estes métodos e mais alguns. Uma segunda questão é: quantos traços ou
disposições pessoais uma única pessoa apresenta? Dois ou trés? Meia dúzia? Algumas
centenas? Mais de mil? A.o longo dos últimos 25 a 45 anos, vários indivíduos (CatteJl,
1973, 1983; Eysenck, 1981, 1997a) e varias equipes de pesquisadores (Costa e McCrae,
1992; McCrae e Costa, 2003; Tupes e Christal, 1961) adotaram a análise dos fatores para
responder a estas questões. Atualmente, grande parte dos pesquisadores que estuda traços
de personalidade concorda que cinco, apenas cinco e não mais do que cinco traços domi-
I nantes continuam a emergir das técnicas da analise fatorial - procedimento matemático
o .!') n ~ i para Isolar traços de personalidade a par til de uma infinidade de dados de teste
~ J_. ~v ~ ; Enquanto muitos teóricos de personalidade contemporâneos acreditam que CI11COé
/V'-"V i um número magrco, os mais antigos, como Raymond B Cattell, descobriram rnuitos ou-
-ç: - O _ P~ ~ rros traços de personalidade, e Hans J Eysenck insisua em que apenas três grandes fatores
I~ ~ podem sei discernidos com uma abordagem de análise fatonal Alem d,SSO. vnnos que
a abordagem de senso comum de Gordon Allport (ver Capítulo 13) produziu de cinco a
dez fatores centrais na vida de cada indivíduo. Contudo, a grande contribuição de Allport
para a teoria de traços pode ter sido sua identificação de aproximadamente 18 mil nomes
Costa
Personalidade e Cultura
O Modelo dos Cinco Fatores nas Culturas
Estabilidade de Traços Durante a Vida
o Crítica à Teoria dos Traços e elos Fatores
<);o- Conceito de Humanidaele
<.Y Termos e Conceitos Essenciais
®
96 Parte IV TeoriasDisposicionais
de traços de personalidade em um dicionário de língua inglesa completo. Estes nomes
de traços foram a base para o trabalho original de Cattell, e continuam a proporcionar os
fundamentos para os estudos recentes da teoria da análise fatorial.
A técnica analítico-fatorial de Eysenck forneceu três fatores bipolares ou tipos
gerais - extroversão/introversão, neuroticismo/estabiiidade e psicoticisrno/superego. A
Teoria dos Cinco Fatores (freqüentemente chamada cinco grandes traçosjinclui neuro-
ticismo e extroversão; mas também compreende abertura a experiências, sociabilidade e
consciência da relevância .das tarefas. Estes termos apresentam ligeiras diferenças entre
as equipes de pesquisa, mas os traços subjacentes são bem similares.
Biografia deHans J. Eysenck
Hans Jurgen Eysenck nasceu em Berlim, em 4 de março de.-1916, filho único de urna
família ligada ao teatro: Sua mãe era Ruth Werner, uma estrela em ascensão quando ele
nasceu. Ruth Werner posteriormente tornou-se urna estrela do cinema mudo alemão sob
o nome de Helga Molander. O pai de Eysenck, Anton Eduard -Eysenck, era comediante,
cantor e ator. Eysenck (199Ib) recorda: "[Eu] Via muito pouco meus pais, que se divorcia-
ram quando eu tinba quatro anos, e que tinham muito pouco afeto em relação a mim, um
sentimento que eu retribuía" (p. 40).
, Após o divórcio dos pais, Eysenck foi viver com sua avó materna, a qual também
era ligada ao teatro. Sua carreira promissora na ópera, porém,' havia sido abreviada por
urna queda que a deixou incapacitada. Eysenck (l991b) descrevia sua avó corno "caridosa,
afetuosa, altruísta e realmente muito boa para este mundo" (p. AO). Embora a avó fosse
católica devota, seus pais não eram religiosos, e Eysenck cresceu em um ambiente livre
de qualquer compromisso religioso formal (Gibson, 1981).
Cresceu também com pouca disciplina imposta pelos pais e poucas restrições se-
veras sobre seu comportamento. Seus pais não pareciam interessados em cercear suas
ações, e sua avó mantinha uma atitude bastante tolerante em relação a ele. Essa negligên-
cia benéfica é exernplificada por dois incidentes. No primeiro, o pai havia-lhe comprado
uma bicicleta e prometido que o ensinaria a conduzi-Ia. "Ele me levou até o alto de uma
colina, disse-me que eu tinha de sentar no selim e pressionar os pedais para fazer com
que as rodas se movessem. Em seguida, afastou-se para soltar balões (...) deixando-me
para aprender a andar de bicicleta por minha conta" (Eysenck, 1997b, p. 12). No segundo
incidente, o adolescente Eysenck contou à avó que sairia para comprar cigarros, esperando
que ela fosse proibi-Io. No entanto, ela disse apenas: "Se você gosta disso, faça-o de uma
vez"(p. 14).De acordo com Eysenck, experiências ambientais como estas duas têm pouca
relação com o desenvolvimento da personalidade.Para'ele, os-fatores-genéticõlstêm-muito
mais impacto sobre o comportamento subseqüente do que as experiências da infância, '
'Desta forma, sua criação tolerante não o ajudou nem impediu de tornar-se um famoso'
.cientista com estilo próprio.'
Ainda estudante, Eysenck não tinha medo de assumir posições impopulares, com
freqüencia desafiando seus professores, especialmente aqueles com tendências militaris-
tas. Eysenck era cético acerca de grande parte daquilo que lhe ensinavam e quase nunca
hesitava em constrangê-los com seu conhecimento e intelecto superiores.
Eysenck sofreu as privações de grande parte dos alemães no período posterior à
Primeira Guerra Mundial, os quais enfrentavam urna inflação astronômica, desemprego
em massa e falta de alimentos. O futuro de Eysenck não parecia mais brilhante mesmo
Capítulo 14 Eysenck, McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 397
, após a ascensão de Hitler ao poder. Como condição para estudar física na Universidade de
Berlim,informaram-Ibe que ele teria de filiar-se à polícia secreta nazista, uma idéia que
julgou tão repugnante que decidiu deixar a Alemanha.
Esse encontro com a direita fascista e seus embates posteriores com a esquerda radi-
cal sugeriram a ele que o traço de rigidez de pensamento, ou autoritarismo, era igualmente
predominante em ambos os extremos do espectro político. Mais tarde, Eysenck encontrou
'apoio científico para esta hipótese em um estudo que demonstrava que, embora os comu-
nistas fossem radicais e os fascistas conservadores em uma dimensão da personalidade,
com relação à dimensão da rigidez de pensamento versus a dimensão da flexibilidade de
idéias, ambos os grupos eram igualmente autoritários, rígidos e pouco tolerantes com a
ambigüidade (pensamento rígido) (Eysenck, 1954; Eysenck e Coulter, 1972).
Como conseqüência da tirania nazista, Eysenck, aos 18 anos, deixou a Alemanha
e mais tarde estabeleceu-se na Inglaterra, onde tentou matricular-se na Universidade de.
Londres. Como vimos no texto de abertura do capítulo, ele voltou-se para a psicologia
de modo completamente acidental. Naquela ocasião, o Departamento de Psicologia 'da
Universidade de Londres era basicamente pró-Freudiano, mas também dava forte ênfase
à psicometria, tendo Charles Spearrnan recentemente saído e sendo na época presidido por
Cyril Burt. Eysenck recebeu grau de bacharel em 1938, quase na mesma ocasião em quese
casou com Margaret Davies, uma cidadã canadense graduada em Matemática. Em 1940,
conquistou seu doutorado na Universidade de Londres, mas, neste período, a Inglaterra e
grande parte das nações européias estavam em guerra.
Como cidadão alemão, ele foi considerado um inimigo estrangeiro e não foi aceito
na Royal Air Force (sua primeira escolha) ou em qualquer outro destacamento das forças
armadas. Em vez disso. sem nenhum preparo como psiquiatra ou psicólogo clínico, foi
trabalhar no Mill Hill Emergency Hospital, tratando pacientes que sofriam de vários
sintomas psicológicos, inclusive ansiedade, depressão e histeria. Eysenck, contudo, não
. se sentia à vontade com grande parte das categorias de diagnóstico clínico tradicionais.
Utilizando análise fatorial, ele descobriu que dois grandes fatores de personalidade
- neuroticismo/estabilidade emocional e extroversãolintroversão - poderiam responder
por todos os grupos de diagnóstico tradicionais. Estas idéias teóricas iniciais o levaram a
publicar seu primeiro livro, Dimensions 01Personality (Eysenck, J 947).
Após a guerra, tornou-se diretor do departamento de psicologia do Hospital
Maudsley, e, posteriormente, assumiu o cargo de professor de psicologia na Universidade
de Londres. Em 1949, viajou à América para examinar os programas de psicologia clínica
nos Estados Unidos e no Canadá, com a idéia de estabelecer-se profissionalmente como
psicólogo clínico na Grã-Bretanha. Conseguiu um cargo de professor visitante da Uni-
versidade da Pensilvânia entre 1949-1950, mas passou grande pane daquele ano viajando
pelos Estados Unidos e Canadá analisando programas de psicologia clinica, os quais jul-
gou serem totalmente inadequados e não-científicos (Eysenck, 1980, 1997b).
Eysenck e sua mulher distanciavam-se cada vez mais, e seu casamento não melhorou
nada com o fato de sua companheira de viagem ter sido Sybil Rostal, uma linda psicóloga
quantitativa. Ao retomar para a Inglaterra, Eysenck obteve o divórcio de sua primeira es-
posa e casou-se com Sybil. Haos e Sybil Eysenck foram co-autores de diversas publicações,
e de seu casamento nasceram três filhos e uma filha. O filho de Eysenck de seu primeiro
casamento, Michael, é um autor bastante conhecido de artigos e livros de psicologia.
Após retomar da América do Norte, Eysenck abriu um departamento de psicologia
clínica na Universidade de Londres e. em 1955, tornou-se professor de psicologia. Nos
I.
j.
i
f
),
I
"".
"
Parte IV Teorias Disposicionais
Estados Unidos, havia começado a escrever The Structure of Human Personality (1952b),
no qual defendia a eficácia da teoria da análise fatorial como o melhor método para repre-
sentar os fatos conhecidos da personalidade humana.
Eysenck talvez tenha sido o escritor mais prolífico da história da psicologia, tendo
publicado aproximadamente 800 artigos jornalisticos ou capítulos de livros e mais de 75
livros'. Várias destas obras apresentam títulos de apelo popular, tais como Uses and Abu-
ses of Psychology (1953); The Psychology of Politics (1954, 1999); Sense and Nonsense
in Psychology (1956); Know Your Own IQ (1962); Fact and Fiction in Psychology (1965):
Psychology 1s About People (l972bj; You and Neurosis (l977b); Sex, Violence and lhe
Media (com D. K. B. Nias, 1978); Smoking, Personality, and Stress (1991c); Genius. The
Natural History of Creativity (1995); e lntelligence: A New Look (l998a).
A abrangência de interesses de Eysenck era excessivamente ampla, e sua disposição
. para tomar parte em praticamente qualquer polêmica era lendária. Ele era uma pedra
no sapato em relação à consciência da psicologia desde que ingressou em suas fileiras.
Incomodava muitos psicanalistas e outros terapeutas do início dos anos 1950 com sua
alegação de que não havia evidência sugerindo que a psicoterapia fosse mais eficaz do
que a remissão espontânea. Em outras palavras, as pessoas que não recebiam nenhuma
terapia tinham tanta probabilidade de apresentar melhoras quanto as que se submetiam
a uma psicoterapia cara, dolorosa e prolongada com psicanalistas e psicólogos treinados
(Eysenck, 1952a). Eysenck manteve esta crença por toda sua vida. Em 1996, confidenciou
a um entrevistador que "as psicoterapias não são mais efetivas do que (...) tratamentos com
placebo " (Feltham, 1996, p. 424).
Eysenck não hesitava em assumir uma posição impopular, tal corno a testemunhada
em sua defesa de Arthur Jensen, cuja alegação sustentava que as pontuações de QJ não po-
diam ser incrementadas de forma significativa por meio de programas sociais bem-intencio-
nados porque eram determinadas principalmente pela genética. O livro de Eysenck, The IQ
Argument (1971) era tão polêmico que grupos nos Estados Unidos "ameaçaram incendiar as
livrarias que ousassem colocar o livro à venda; jornais "liberais" conhecidos se recusaram a
fazer resenhas; e o resultado foi que na terra da livre expressão era praticamente impossível
descobrir a existência do livro ou comprá-lo" (Eysenck, 1980, p. 175).
Em 1983,'Eysenck aposentou-se como professor de psicologia do Instituto de Psi-
quiatria da Universidade de Londres e como psiquiatra sênior dos hospitais Maudsley e
Bethlehem Royal. Durante dez anos ocupou a posição de professor emérito da Universi-
dade de Londres, até morrer, vítima do câncer, em 4 de setembro de 1997. Eysenck, que
freqüentemente afirmava que o fumo não era um fator de riscopara o câncer, foi um
fumante inveterado até a meia-idade, quando abandonou o hábito de fumar por acreditar
que ele afetava seu desempenho no jogo de tênis.
Durante seus últimos anos, sua pesquisa continuou a considerar vários tópicos,
incluindo criatividade (Eysenck, 1993, 1995; Frois e Eysenck, 1995), intervenções com-
portamentais em câncer e doenças cardíacas (Eysenck, 1991d, 1996; Eysenck e Grossarth-
Maticek, 1991) e inteligência (Eysenck, 1998a).
Eysenck recebeu diversos prêmios, inclusive o Distinguished Contributions Award
for the lnternational Society for the Study oflndividual Differences, do ano de 199i. A
Arnerican Psychological Association agraciou-o com o Distinguished Scientific Award
(1998), a Presidential Citation for Scientific Contribution (1993). o William Jarnes
Fellow Award (1994) e o Centennial Award for Distinguished Contributions to Clinical
Psycnology (1996).
Capítulo 14 Eyscnck. McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 399
o Trabalho Pioneiro de Raymond B. CatteLL
Uma figura importante nos primeiros anos da psicometria foi Raymond B. Cattell (1905-
1998), que nasceu na Inglaterra, mas passou grande parte de sua carreira nos Estados
Unidos. Cattell não tinha uma influência direta sobre Eysenck; pelo contrário, os dois
tinham abordagens muito distintas para a mensuração da estrutura da personalidade. {Çon-
si~@iliLque a familiaridade com a t~a.-de..~.Qs..Jie_Cª1t.e:lLa.ume.ntut...l:illIl.pr<;~elJ.São..
da teoria dos três fatores de Ev~enck, discutire~!:§Y_'llilffil:!<..!Urabªlho o:I§....ǪlL~llo
c.ompararemas30.Jrabalho,de.E ysen çk.
---Ei;;'p-;;;~Tro lugar, Cattell utiE~oL;.L1PLm.étodo indutivopara coleta de dados, ou
seja, começou sem nenhum -Vírs;;;econcebido acerca do número ou dos nomes de traços
ou de tipos. Por outro lado, Eysenck utilizou raciocínio dedutivo para identificar os três
fatores de 'personalídade. Ou seja, tinha algumas hipóteses preconcebidas em mente antes
de começar a reunir dados.
Em segnndo lugar, Cattcll serviu-se de trés meios distintos de observação para exa-
minar as pessoas a parti r do maior número possível de ángulos. As três fontes de dados
incluíam um registro da vida do indivíduo (dados L) derivado das observações feitas
por outras pessoas; auto-relatos (dag"iõ Q)-obtidos a partir de questionários e de outras
técnicas elaboradas para permitir que as pessoas realizassem descrições subjetívas de si
próprias; e testes objetivos (dados Il.JJue avaliam desempenho, tais como inteligência,
velocidade de resposta e outras variáveis similares elaboradas para desafiar ao máximo o
desempenho do indivíduo. Em contraste, cada um dos três fatores bipolares de Eysenck é
limitado às respostas dadas aos avaliadores. Estes auto-relatos limitamos procedimentos
de Eysenck a fatores de personalidade. _
Em terceiro lugar, Cattell dividiu os traços em traços comuns (compartilhados por
muitas pessoas) e traços únicos (singulares para cada indivíduo). Também distinguia os
traços constitucionais dos traços indicadores, ou traços de superficie. Cattell ainda clas-
sificou os traços em temperamento, motivação e habilidade. Os traços de temperamento
estão associados à forma pela qual urna pessoa se comporta; a motivação relaciona-se
às razões pelas quais alguém se comporta de uma determinada maneira e a habilidade
refere-se à extensão ou à rapidez segundo a qual um indivíduo pode desempenhar
suas atividades.
Em quarto lugar, a abordagem multifacetada forneceu 35 traços primários ou de
primeira ordem, que rnensuram essencialmente a dimensão do temperamento da perso-
nalidade. Entre esses fatores, 23 caracterizam a população normal e 12 mensuram a di-
mensão patológica. Os traços normais mais significativos e freqüenternente estudados são
os 16 fatores de personalidade encontrados no Questionário de Dezesseis Fatores (l6 PF)
de Cattell (1949). Em comparação, o Questionário de Personalidade Eysenck proporciona
avaliações apenas para três fatores de personalidade.
Em quinto lugar, enquanto Cattell avaliava um grande número de traços, Eysenck
concentrava-se em tipos, ou snperfatores, que compõem vários traços inter-relacionados.
Discutiremos os tipos e os traços em uma seção intitulada "Hierarquia da Organização
Cornportamental".
Fundamentos da Análise dos fatores
Não é necessário um conhecimento abrangente das operações matemáticas envolvidas na
análise fatorial para a compreensão das teorias da personalidade dos traços e dos fatores;
mas uma descrição geral desta técnica pode ser útil para este objetivo.
400 Parte IV Teorias Dísposicionais
\J-.Para utilizar análise fatorial, deve-se começar .pela elaboração de observações
específicas de 'vários indivíduos. Estas observações são, então, quantificadas de alguma
maneira; a altura é mensurada em metros e centímetros; o peso em quilos; a aptidão.em
pontos de um -teste; o desempenho profissional com escalas de avaliação; e assim por
diante. Considere que possuímos mil medidas como estas, obtidas em 5 mil pessoas.
Nosso próximo passo é determinar quais dessas variáveis (pontuação) estão relacionadas
a outras variáveis e.até que ponto. 'Para isso, calculamos o coeficiente de correlação entre
cada variável e cada uma das outras 999 pontuações. (Um coeficiente de correlação é um
procedimento matemático para expressar o grau de correspondência entre. dois cjlnjun-
tos de pontuações). Correlacionar mil variáveis com outras 999 pontuações envolveria
499.500 correlações individuais (mil multiplicado por 999 e dividido por 2). Os resultados
desses cálculos exigiriam uma tabela de intercorrelações, ou uma matriz, com mil linhas
e mil colunas. Algumas destas correlações seriam elevadas e positivas.algumas-próximas
de zero e outras, seriam negativas. Podemos observar, por exemplo;uma correlação alta-
mente positiva entre comprimento de perna e altura, porque uma é uma medida parcial da
outra. Também podemos encontrar uma correlação positiva entre a medição da habilidade
de liderança e as pontuações relacionadas à segurança em situações sociais. Esta relação
poderia existir porque cada um destes elementos faz parte de um traço subjacente mais
básico - a auto confiança.
Com rnil .variáveis definidas, nossa tabela de correlações seria extremamente
difícil de manusear. -Neste ponto, recorremos à análise [atorial; que pode analisar um
grande número de variáveis com um número muito menor de dimensões básicas. Estas
dimensões mais básicas podem ser chamadas traços, ou seja, fatores que representam um
agrupamento de variáveis intimamente relacionadas. Podemos encontrar, por exemplo,
intercorrelações altamente positivas entre resultados de testes em Álgebra, Geometria,
Trigonometria e Cálculo. Identificamos então um agrupamento de pontuação que po-
deríamos chamar Fator M, que representa a habilidade matemática. De modo similar,
podemos identificar inúmeros outros fatores, ou unidades de personalidade-derivados da
análise fatorial. O número de fatores, obviamente, será menor do que o número original
de observações.
Nosso próximo passo será determinar até que ponto cada resultado individual
contribui com os vários fatores. As correlações entre pontuações e fatores são chamadas
de cargas fatoriais. Se os resu ltados para Álgebra, Geometria, Trigonometria e Cálculo
contribuem significativamente com o fator M, mas não com outros fatores, eles terão car-
gas fatoriais elevadas em relação a M. As cargas fatoriais nos oferecem uma indicação da
pureza de vários fatores e nos capacitam a interpretar seus significados.
Os traços gerados pela análise fatorial podem ser tanto unipolares quanto bipolares.
Os traços unipolares são divididos em uma escala que vai de zero a uma quantidade
expressiva. Altura, peso e habilidade intelectual são exemplos de traços unipolares. Por
outro lado, os traços bipolares estendem-se de um pólo ao pólo oposto, no qual zero
representa um ponto intermediário. lntroversão versus extroversão,liberalismo versus
conservadorismo e ascenção social versus timidez são exemplos de traços bipolares.
Para que os fatores definidos matematicamente tenham significado psicológico, os
eixos sobre os quais assinalamos as pontuações normalmente são girados ou rotacionados
em uma relação matemática específica entre eles. Esta rotação pode ser tanto ortogona!
quanto oblíqua, mas Eysenck e os defensores da Teoria dos Cinco Grandes Fatores prefe-
rem a rotação ortogonaJ. A Figura J4.1 demonstra que os eixos rodados ortogonalmente
formam um ângulo reto entre si. À medida que as pontuações associadas à variável x
aumentam, os resultados sobre o eixo y podem ter qualquer valor, ou seja, eles são com-
pletamente dissociados das pontuações sobre o eixo x.
'~:_.
Capitulo 14 Eysenck, McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores
,
~---------------.-.- - - ~"....;...;..-,-~;.....:-::.....;;.....;...~.~
FIGUr..A 14.1 Eixos ortogonais.
o método oblíquo, defendido por Cattell, considera certa correlação positiva ou
negativa e refere-se a um ângulo menor ou maior que 90'. A Figura 14.2 descreve um
diagrama de dispersão das pontuações em que x e y estão correlacionados positivamente
entre si, ou seja', quando as pontuações relacionadas à variável x aumentam, os resultados
sobre o eixo y apresentam, também, uma tendéncia de aumento. Note que a correlação
não é perfeita; algumas pessoas podem obter uma pontuação alta na variável x e uma pon-
tuação baixa na variável y e vice-versa, Uma correlação perfeita (r =1,00) resultaria em x
e y ocupando a mesma linha. Em termos psicológicos, a rotação ortogonal normalmente
resulta em apenas alguns poucos traços significativos, enquanto os métodos oblíquos ge-
ralmente produzem um número maior.
)!.. ~, .. .. .• • • x
• e. e••••... .
-<'-' ,
I.
i, F1GURA 14.2 Eixos obliquos.
. - -
402 Parte TV Teorias Disposicionais
Teoria de Fatores de Eysenck
A teoria da personalidade de Hans Eysenck apresenta fortes componentes psicométricos e
biológicos. No entanto, Eysenck (i977a, 1997a) alegava que apenas a sofisticação psicorné-
trica não bastava para mensurar a estrutura da personalidade humana e que as di1ensões
da personalidade obtidas pelos métodos de análise fatorial são ineficazes e inócuas, a
menos que tenha sido demonstrado que eles têm uma existência biológica.
Critérios para Identificação dos Fatores
Com esses pressupostos em mente, Eysenck enumerou quatro critérios para identificar um
fator. Em primeiro lugar, deve ser estabelecida a evidência psicométrica para a existência
do fator. Uma conseqüência para este critério é que o fator deve ser confiável e reprodu-
zíveJ. Outros investigadores, de laboratórios diferentes, também devem ser capazes de
encontrar o fator, e esses investigadores identificam de forma coerente a extroversão, o
neuroticismo e o psicoticismo da teoria Eysenck.
Um segundo critério é que o fator também deve possuir hereditariedade e deve
encaixar-se em um modelo genético estabelecido. Este critério elimina características
aprendidas, como a habilidade para imitar vozes de pessoas famosas ou uma crença po-
lítica ou religiosa.
Em terceiro lugar, o fator deve fazer sentido sob o ponto de vista teórico. Eysenck
adotou o método de investigação dedutiva, iniciando com uma teoria e, em seguida, co-
letando dados logicamente consistentes com ela.
O critério final para a existência de um fator é que ele deve ter relevância social,
ou seja, deve ser demonstrado matematicamente que os fatores derivados possuem uma
relação (não necessariamente causal) com variáveis socialmente relevantes, como vício
em álcool, propensão a lesões acidentais, excelência no desempenho esportivo, comporta-
mento psicótico, crirninalidade e assim por diante.
Hierarquia da Organização Comportamental
Eysenck (1947, 1994c) adotou uma hierarquia da organização comportamental ou pensa-
mentos em quatro níveis. No nível mais baixo estão atos 011 cogniçôes específicos: com-
portamentos individuais que podem ou não ser característicos de uma pessoa. Um estu-
dante que finaliza uma tarefa de leitura seria um bom exemplo de resposta específica. No
segundo estão atos ou cognições habituais, ou seja, repostas que se repetem sob condições
similares. Caso um estudante se mantenha freqüentemente em uma tarefa até terminá-Ia,
este comportamento torna-se uma resposta habitual. Ao contrário das respostas específi-
cas, as respostas habituais devem ser suficientemente confiáveis ou consistentes.
Várias respostas habituais relacionadas formam um traço - o terceiro nivel de
comportamento. Eysenck (1981) definia os traços como "importantes tendências de perso-
nal idade aparentemente permanentes" (p. 3). Os estudantes teriam o traço da persistência
se, por exemplo, completassem habitualmente as tarefas da disciplina e se mantivessem
trabalhando em outros empreendimentos até que estivessem completos. Embora os traços
possam ser identificados de modo intuitivo, os teóricos dos traços e dos fatores utilizam
uma abordagem mais sistemática, isto é, a análise fatorial. Os comportamentos no nível
de traço são obtidos pela análise das respostas no nível dos hábitos, da mesma forma que
ij,:.
i I
Capitulo 14 Eysenck.McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores
Tipo:
Traços:
Hábitos:
Comportamentos
específicos:
FIGURA 14.3 A organização comporramentaí em ações específicas, respostas habituais, traços e tipos. Além
da persistência e da fobia social, outros traços como inferioridade, baixa atividade e seriedade de
pensament.o contribuem para a introversão.
as respostas habituais são matematicamente obtidas pela análise fatorial de respostas es-
pecíficas. Os traços, então, são "definidos em termos de correlações significativas entre
comportamentos habituais distintos" (Eysenck, 1990, p. 244). Grande parte dos 35 traços
originais primários normais e anormais de Cattell encontra-se neste terceiro nível de or-
ganização, o que explica o fato de ele ter identificado muito mais dimensões de personali-
dade do que as apontadas por Eysenck e os defensores da Teoria dos Cinco Fatores.
Eysenck concentrou-se no quarto nível, o dos tipos, ou superfatores. Um tipo é com-
posto vários traços inter-relacionados. A persistência, por exemplo, pode estar relacionada
a inferioridade, a um ajustamento emocional inadequado, à fobia social e a vários outros
traços, todo o agrupamento constituindo o tipo introvertido. Cada um dos quatro níveis
de organização comportamental é mostrado na Figura 14.3.
i
I
I
I
I
I
I
I
J
Dimensões da Personalidade
Vimos que Eysenck e Cattell chegaram a um número diferente de dimensões de perso-
nalidade porque trabalhavam em diferentes níveis de fatoração. Os 35 traços de CatteJl
encontram-se todos no terceiro nível da estrutura hierárquica, enquanto os superfatores
de Eysenck estão no quarto nível.
Quantos superfatores gerais existem? Muitos teóricos fatoriais atuais insistem em
que há ampla evidência de que cinco - nem mais, nem menos - fatores gerais emergirão
de praticamente todas as análises fatoriais de traços de personalidade. Eysenck, no en-
tanto, extraiu apenas três superfatores gerais. Suas três dimensões da personalidade são:
extroversão (E), neuroticismo (N) e psicoticismo (P), embora ele não excluísse "a pos-
sibilidade de que mais dimensões pudessem ser posteriormente adicionadas" (Eysenck,
1994c, p. 151). A Figura 14.4 demonstra a estrutura hierárquica de P, E e N de Eysenck.
403
Parte IV Teorias Disposicionais
FIGURA 14.4 A estrutura hierárquica de P (psicoticismo), E (extroversão/introversão) e
(neuroticismo)
Fome: Eysenck H. J. Biological dimensions of personalny, ln: PERVIN, L.A. Handbook of personaliIy:theory
and research. Nova York: Guilford Pren. 1990. p. 224-276.
o neuroticismo e o psicoticismo não são limitados a indivíduos patológicos, embora
as pessoas perturbadas tendam a obter pontuaçãomaior do que individuos normais nas
escalas que avaliam estes dois fatores. Eysenck referia-se a estes três fatores como parte
da estrutura de personalidade normal. Todos os três são bipolares, com a extroversão
ocupando um extremo do Fator E e a introvcrsâo ocupando seu pólo oposto. Do mesmo
:r;rªr;
·.t·
Capítulo 14 Eysenck ..McCrae c Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 405
modo, o fator N inclui o neuroticismo em um pólo e estabilidade em outro, e o fator P
tem o psicoticismo em um pólo e a função superego em outro.
A bipolaridade dos fatores de Eysenck não implica em que a maioria das pessoas
está em um ou em outro extremo dos três pólos principais. Cada fator é distribuído de
forma unimodal, e não em um formato bimodal. A extroversão, por exemplo, é normal-
mente distribuída de forma equilibrada, quase da mesma forma que a inteligência ou a
altura. Ou seja, grande parte das pessoas está próxima do centro, em uma distribuição em
curva normal da extroversão. Eysenck afirmava que cada um destes três fatores satisfaz
seus quatro critérios para a identificação de dimensões da personalidade.
Em primeiro lugar, existem fortes evidéncias psicométricas para cada um deles,
especialmente os fatores E e N. O Fator P (psicoricismo) emergiu mais tarde no trabalho
de Eysenck, mas não foi levado a sério por outros pesquisadores até meados dos anos
1990 (Eysenck, 1997b). A extroversão e o neuroticismo (ou ansiedade) são fatores bási-
cos em quase todos os estudos analítico-fatoriais da personalidade humana, inclusive as
várias versões da teoria dos cinco grandes traços (Costa e McCrae, 1999, 2002; John e
Srivastava, 1999).
Em segundo lugar. Eysenck (1994b, 1994c) afirmava existir uma forte base bioló-
gica para cada um de seus três superfatores. Ao mesmo tempo, alegava que traços como
sociabilidade e consciência da relevância das tarefas, os quais fazem parte da taxonomia
dos cinco fatores (John, 1990; W. T. Norman, 1963; Tupes e Christal, 1961), não têm um
fundamento biológico subjacente.
Em terceiro lugar, as três dimensões da personalidade de Eysenck teoricamente
fazem sentido. Carl Jung (ver Capítulo 4) e outros reconheceram o efeito poderoso da
introversão e da extroversão sobre o comportamento (Fator E), e Sigmund Freud (ver Ca-
pítulo 2) enfatizava a 'importância da ansiedade (Fator N) em modelar o comportamento.
Além disso, o psicoticismo (Fator P) está de acordo com os teóricos, como Abraham Mas-
low (ver Capirulo 10), que sugeriu que a saúde psicológica varia da auto-atualização (uma
pontuação P baixo) até esquizofrenia e psicose (uma pontuação P elevada).
Em quarto lugar, Eysenck demonstrou repetidas vezes que seus três fatores relacio-
navam-se com questões sociais. como uso de drogas (Eysenck, 1983), comportamentos
sexuais (Eysenck, 1976), criminalidade (Eysenck, 1964, 1998b; Eysenck e Gudjonsson,
(989), prevenção de câncer e de doenças cardíacas (Eysenck, 1991c, 1991d, Grossarth-
Maticek, Eysenck e Verter, 1988) e criatividade (Eysenck, 1993).
Extroversão
No Capítulo 4, explicamos que Jung conceituou dois tipos amplos de personalidade,
chamados de "extroversão" e de "introversão". Também notamos algumas diferenças
entre suas definições e a noção proeminente desses dois termos. Jung via as pessoas ex-
trovertidas como donas de uma visão objetiva e não-personalizada do mundo, enquanto
os introvertidos tinham, essencialmente, uma forma individualizada ou subjetiva de olhar
para as coisas. Os conceitos de Eysenck de extroversão e de introversão estão mais pró-
ximos do uso popular. Os indivíduos extrovertidos são caracterizados primordialmente
pela sociabilidade e impulsividade, mas também pela jocosidade, vivacidade, raciocínio
rápido, otimismo e outros traços indicativos de pessoas que são recompensadas por sua
associação com os outros (Eysenck e Eysenck, 1969).
Os individuos introvertidos são caracterizados por traços opostos àqueles dos indi-
viduos extrovertidos. Podem ser descritos como quietos, passivos, não-sociáveis, cuidado-
sos. reservados, pensativos, pessimistas, pacíficos. sóbrios e controlados. De acordo com
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406 Parte JV Teorias Disposicionais
Eysenck (1982), no entanto, as principais diferenças entre extroversão e introversão não
são comportamentais, mas sim de natureza biológica e genética.
Eysenck (1997a) acreditava que a causa primordial das diferenças entre indivíduos
extrovertidos e introvertidos estava associada ao nível de excitação coriical, uma condi-
ção fisiológica essencialmente herdada e não aprendida. Como os extrovertidos têm um
nível mais baixo de excitação cortical do que os introvertidos, eles apresentam patama-
res sensoriais mais elevados e, dessa forma, têm uma reação menos intensa à estirnulação
sensorial. Para manter um nível mais favorável de estimulação, os introvertidos, com seus
patamares sensoriais congênitos baixos, evitam situações que produzem muita empolga-
ção. Deste modo, os introvertidos evitam atividades como participar de grandes evento,
sociais, esquiar, saltar de pára-quedas, praticar esportes de competição, presidir uma
república de estudantes ou aplicar trotes.
Por outro lado, como os extrovertidos normalmente tem baixos níveis de excitação
cortical, necessitam de níveis mais elevados de estimulação sensorial para manter um
nível mais favorável de estirnulação. Desta forma, os extrovertidos participam com mais
freqüência de atividades empolgantes e estimulantes. Podem apreciar atividades como
escalada em montanhas, apostas em jogos, guiar carros esportivos, ingestão de álcool e
consumo de maconha. Além disso, Eysenck (1976) especulou que os extrovertidos, ao
contrário dos introvertidos, iniciarão suas atividades sexuais de modo mais precoce, mais
freqüentemente, com uma quantidade maior de parceiros, em um número ele posições
mais variado, com uma variedade mais dilatada de comportamentos sexuais e desfrutarão
de atividades preliminares pré-coito mais demoradas. Como os extrovertidos apresentam
um nivel mais baixo de excitação cortical, no entanto, eles se acostumarão mais rapi-
damente a estímulos mais fortes (sexuais ou de outra.natureza) e responderão cada vez
menos aos mesmos estímulos, enquanto os introvertidos têm uma propensão menor a
tornarem-se enfastiados ou desinteressados em relação às atividades rotineiras realizadas
com as mesmas pessoas.
Neuroticismo
O segundo superfator obtido por Eysenck é neuroticismo/estabilidade (N). De modo similar
à extroversão/introversão, o Fator N tem um forte componente hereditário. Eysenck (1967)
relatou vários estudos em que foram encontradas evidências de uma base genética para tra-
ços neuróticos, corno ansiedade, histeria e transtornos obsessivo-compulsivos. Além disso,
encontrou uma concordância maior entre gêmeos idênticos do que entre gêmeos fraternos
em relação a vários comportamentos anti-sociais e associais como crimes adultos, distúrbios
de comportamento infantil, homossexualidade e alcoolismo (Eysenck, 1964).
As pessoas que pontuaram alto em neuroticismo em geral tiveram uma tendência
para manifestar reações emocionais exageradas e demonstraram dificuldade para retomar
a um estado normal após um quadro de excitação emocional. Elas reclamavam continua-
mente de sintomas físicos, como dores de cabeça e nas costas, e de problemas psicológicos
vagos, como preocupações e ansiedades. O neuroticismo, contudo, não sugere necessaria-
mente uma neurose no sentido tradicional do termo. Aspessoas podem obter pontuações
elevadas em neuroticismo e estar livres de quaisquer sintomas psicológicos debilitantes.
Eysenck aceitava o modelo de estresse-díátese de doenças psiquiátricas, o qual
sugere que algumas pessoas são vulneráveis à doença por terem uma fraqueza genética
ou adquirida, que as predispõem à doença. Esta predisposição (diátese) pode interagir com
o estresse para produzir um distúrbio neurótico. Eysenck considerava que as pessoasna
extremidade saudável da escala N têm a capacidade de resistir a um distúrbio neurótico
Capítulo] 4 Eysenck, McCrae e COSta: Teoria dos Traças e dos Fatores 407
Neuroticismo
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FIGURA 14.5 Um esquema
bidimensional
descrevendo
vários pontos
extremos nas
escalas E e N
de Eysenck. Estabilidade
mesmo em períodos de extremo estresse. Os indivíduos com pontuações N elevadas, no
entanto, podem sofrer uma reação neurótica, como conseqüência de um nível minimo de
estresse. Em outras palavras, quanto maior for a pontuação de neuroticismo, menor será o
nível de estresse necessario para desencadear um transtorno neurótico.
Uma vez que o neuroticismo pode estar combinado a diferentes pontos na escala de
extroversão, uma única sindrorne não pode definir o comportamento neurótico. A técnica
de análise fatorial de Eysenck considera a independência dos fatores, o que significa que
a escala de neuroticismo está nos ângulos retos (significando correlação zero) em relação à
escala de extroversão. Assim. várias pessoas podem ter pontos elevados na escala N e
ainda assim demonstrar sintomas bem distintos, dependendo de seu grau de introversão
ou de extroversão. A Figura 14.5 mostra que o pólo extroversãolintrovesão tem correlação
zero com o pólo neuroticismo/estabilidade. Considere as pessoas A, B e C, todas com pon-
tuações igualmente altas na escala de neuroticismo, mas representando três pontos distin-
tos na escala de extroversão. A pessoa A, um introvertido neurótico, é caracterizada por
ansiedade, depressão, fobias e sintomas obsessivo-compulsivos; a pessoa B, com índices
elevados de neuroticismo e valores apenas medianos em extroversão, tem uma propensão
maior de ser caracterizada por histeria (um distúrbio neurótico associado a instabilidade
emocional), sugestionabilidade e sintomas somáticos; a pessoa C, um indivíduo neurótico
extrovertido, talvez manifestará características psicopatas, como tendências para crimi-
nalidade e delinqüência (Eysenck, 1967, 1997a). Considere, também, as pessoas A, D e E,
todas igualmente introvertidas, mas com três níveis diferentes de estabilidade emocional.
A pessoa A é o indivíduo neurótico introvertido que acabamos de descrever; a pessoa D é
igualmeme inrrovertida, mas não é nem muito neurótica nem emocionalmente estável; e a
pessoa E é tanto extremamente introvertida quanto psicologicamente estável.
A Figura 14.5 apresenta apenas cinco pessoas, as quais apresentam, todas elas,
pelo menos uma pontuação extrema. A. maior parte das pessoas, obviamente, pontuaria
próximo à média tanto em extroversão quanto em introversão. À medida que as pontua-
ções movem-se na direção dos limites externos do diagrama. tornam-se cada vez menos
freqüentes. da mesma forma que as pontuações das extremidades de uma curva normal
são menos freqüentes do que aquelas próximas ao ponto médio.
Parte IV TeoriasDisposicionàis
Psicoticismo
A teoria da personalidade original de Eysenck baseava-se apenas em duas dimensões da
personalidade -'extroversão e neuroticismo. Após vários anos de alusão ao psicoticismo
(P) como um fator de .personalidade independente, Eysenck finalmente elevou-o a uma
posição igual a de E e N (Eysenck e Eysenck, 1976). Assim.corno a extroversào e o neuro-
ticismo, P é um fator bipolar, com o psicoticismo em umpólo e o superego em outro. In-
divíduos com pontuações P elevadas são com freqüência egocêntricos, frios, desajustados,
impulsivos, hostis, agressivos, desconfiados, psicopatas e anti-sociais. Pessoas com índices
baixos de psicoticismo (na direção da função superego) tendem a ser altruístas, altamente
socializados, afetuosos, cooperativos, ajustados e convencionais (S. Eysenck, 1997).
Anteriormente, havíamos visto que Eysenck aceitou o modelo de diátese-estresse
para as pessoas com valores elevados na escala de neuroticismo, ou seja, o estresse e as
pontuaçõesN elevadas combinam-se para elevar a vulnerabilidade das pessoas a dis-
túrbios psicológicos. Este modelo também sugere que as pessoas que pontuam de forma
significativa em psicoticismo e que também estejam sofrendo altos níveis de estresse têm
uma chance maior de desenvolver um transtorno psicótico. Eysenck (1994) especulava
que indivíduos com níveis elevados de psicoticismo têm mais "predisposição para su-
cumbir ao estresse e para desenvolver doenças psicóticas" (p. 20). Este modelo de diátese-
estresse sugere que indivíduos com pontuação P alta são geneticamente mais vulneráveis
ao estresse do que os indivíduos com pontuações P baixas. Durante períodos de cstresse
reduzido, os detentores de pontuações P altas podem viver normalmente, mas quando
uma alta quantidade depsicoticisrno interage com níveis elevados de estresse, as pessoas
tornam-se vulneráveis a transtornos psicóticos, Ao contrário, indivíduos com pontuações
P baixas não são necessariamente vulneráveis a psicoses relacionadas ao estresse e pode-
rão resistir a um"surto psicótico até mesmo em períodos de extremo estresse. De acordo
com Eysenck (l994b, 1994c), quanto maior for a pontuação de psicoticismo, menor será o
nível de estresse necessário para precipitar urna reação psicótica.
O binômio psicoticismo/superego (P) é independente tanto de E quanto de N. A
Figura 14.6.mostra cada um dos três fatores em ângulos retos em relação aos outros dois.
Neuroticismo
Introversão
Superego
__ /::~:~:/ F
",:- ",'" I,'
,,,,,,
-:
Psicolicismo -.
Extroversão
FIGURA 14.6
Estabilidade
Esquema tridimensional descrevendo os escores de um indivíduo em cada
uma das grandes dimensões de personalidade de Eysenck.
«
Capítulo 14 Eysenck. McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 409
(Como o espaço tridimensional não pode ser fielmente reproduzido em um plano bidimen-
sional, solicitamos ao leitor que olhe para a Figura 14.6 corno se as linhas sólidas represen-
tassem o canto de um cómodo onde duas paredes encontram o piso. Cada linha pode ser
vista como se estivesse perpendicular em relação às outras duas.) A visão da personalidade
de Eysenck, portanto, perm ite que cada pessoa seja avaliada de acordo com três fatores in-
dependentes e que as pontuações resultantes sejam marcadas como se tivessem três coorde-
nadas no espaço. A pessoa F na Figura 14.6, por exemplo, tem uma pontuação muito alta na
escala de superego, moderadamente elevada em extroversão e próxima do ponto médio
na escala neuroticismoiestabilídade. De modo similar. os resultados de cada pessoa
podem ser assinalados no espaço tridimensional.
Mensurando a Personalidade
Eysenck desenvolveu quatro inventários de personalidade que mensuravam seus superfa-
tores, O primeiro, o Maudsley Personality lnventory, ou MPI (Eysenck, 1959), avaliava
apenas os fatores E c N e produzia certa correlação entre eles. Por isso, Eysenck criou um
outro teste. o Eysenck Personality lnventory, ou EPL O EPI contém um escala de mentira
(L) para detectar simulações, mas, mais importante, ela mensura a extroversão e a intro-
versão independentemente, com uma correlação quase zero entre E e N (H. 1. Eysenck e B.
G. Eysenck, 1964, 1968). O Eysenck Personalíty Inventory foi estendido a crianças entre 7
e 16 anos por Sybil B. G. Eysenck (1965), que desenvolveu o EPI Júnior.
O EPI ainda era um inventário de dois fatores; portanto, dessa forma, Hans Eysenck
e Sybil Eysenck (1975) publicaram um terceiro teste de personalidade, denominado o
Eysenck Personality Questionnaire (EPQ), que incluía a escala de psicoticismo (P). O
EPQ, o qual apresentava tanto urna versão adulta quanto infantil, é uma revisão do ainda
publicado EPl. Críticas posteriores levaram ainda à outra revisão, o Eysenck Personality
Questionnaire - Revised (H. 1. Eysenck e S. B. G. Eysenck, 1993).
As Bases Biológicas da Personalidade
I
1
I.
De acordo com Eysenck, os fatores de personalidade P, E e N têm, todos, determinantes
biológicos extraordinários.Ele estimava que cerca de três quartos da variação das três
dimensões de personalidades podem ser devidos à hereditariedade e um quarto a razões
ambientais.
Eysenck (1990) citou três linhas de evidência de um forte componente biológico na
personalidade. Inicialmente, os pesquisadores (McCrae e Allik, 2002) descobriram fato-
res praticamente idênticos entre pessoas de varias partes do mundo, não apenas na Europa
Ocidental e na América do Norte, mas também em Uganda, Nigéria, Japão, China, Rússia
e outros países africanos e europeus. Em segundo lugar, as evidências (McCrae e Costa,
2003) sugerem que os indivíduos tendem a manter sua posição ao longo do tempo em dife-
rentes dimensões de personalidade. E, em terceiro lugar, os estudos de gêmeos (Eysenck,
1990) mostraram uma concordância maior entre gêmeos idênticos do que entre gêmeos
fraternos do mesmo sexo criados juntos, sugerindo que os fatores genéticos desempenham
um papel dominante na determinação das diferenças individuais da personalidade.
Na teoria da personalidade de Eysenck, psicoticismo, extroversão e neuroticismo
apresentam tanto antecedentes quanto conseqüências. Os antecedentes são genéticos e
biológicos, enquanto as conseqüências incluem variáveis experimentais, corno experiên-
Condicionamento Sociabilidade
Sensitividade Criminalidad6
Excitação P Vigilância l-+ Criatividade
DNA 1-+ do Sistema 1--+ E f.- Percepção Psicopatologia
Umbico N Memória Comportamento
Reminiscência Sexual
Antecedentes
Distais
Determinantes
genéticos de
personalidade
FIGURA 14.7
Parte TV Teorias Disposicionais
Personalidade
l
Antecedentes
Proximais
Conseqüências
Proximais
Conseqüências
Distais
mtermediános
biológicos
Constelaçoes
de traços
psicométricos
Estudos
experimentais
Comportamento
social
Um modelo dos principais componentes da teoria da personalidade de Eysenck.
cias condicionantes, sensibilidade e memória, bem como comportamentos sociais. como,
por exemplo, criminalidade, criatividade, psicopatologia e comportamento sexual. A
Figura 14.7 nos mostra que P, E e N estão no meio de uma progressão de cinco etapas a
partir do DNA até o comportamento social, nela os intermediários biológicos e a evidên-
cia experimental baseiam-se nas três dimensões principais da personalidade. Em outras
palavras, a personalidade apresenta determinantes genéticos que modelam indiretamente
os intermediários biológicos e estes auxiliam a moldar P, E e N. Por outro lado, P, E e
N contribuem para urna ampla variedade de aprendizados controlados, bem como para
comportamentos sociais.
Personalidade como Previsor
o complexo modelo da personalidade de Eysenck apresentado na Figura 14.7 sugere que
os traços psicométricos de P, E e N podem combinar entre si e com determinantes gené-
ticos, intermediários biológicos e estudos experimentais para prever diversos comporta-
mentos sociais, incluindo aqueles que contribuem para as doenças.
Personalidade e Comportamento
As três dimensões gerais de personalidade de Eysenck conseguem prever comportamen-
tos? Segundo o modelo de Eysenck apresentado na Figura 14.7, psicoticismo, extroversão
e neuroticismo devem nrever os resultados de estudos experimentais bem corno os com-
portamentos sociais. Lembremo-nos que a teoria de Eyseuck afirma que " extroversão
é um produto de baixa excitação cortical. Desta forma, introvenidos, comparados aos
extrovertidos, deveriam ser mais sensíveis a uma variedade de estímulos e condições de
aprendizado. Eysenck (1997a) alegava que uma teoria da personalidade efetiva deveria ser
capaz de prever conseqüências tanto proximais quanto distais (ver Figura 14.7), e ele e seu
filho, Michael (H. 1. Eysenck e M. W. Eysenck, 1985) citaram estudos que demonstraram
uma demanda maior de extrovertidos por mudança e novidades tanto em estudos de labo-
ratório quanto em estudos de comportamento social.
Capítulo ]4 Eysenck, McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 411
Eysenck (1997a) ainda sustentou que muitos estudos psicológicos chegaram a
conclusões equivocadas porque ignoraram os fatores de personalidade. Os estudos refe-
rentes à educação, por exemplo, que comparavam a efetividade do aprendizado ativo ao
aprendizado tradicional passivo, freqüentem ente produziram ou diferenças confiitantes ou
nenhuma diferença. Eysenck acreditava que esses estudos não consideravam que as crian-
ças extrovertidas preferem um aprendizado ativo e se saem melhor com este, enquanto
as crianças introvertidas preferem um aprendizado de recepção passivo e se saem melhor
nele. Em outras palavras, há uma interação entre dimensões de personalidade e estilos de
aprendizado. Contudo, quando os investigadores ignoram esses fatores de personalidade,
podem não encomrar diferenças na eficácia destes dois estilos de aorendizado.
Eysenck (1995) também levanrou a hipótese de que o psicoticismo (P) se relaciona-
ria à genial idade e à criatividade. Novamente, a relação não é simples. Muitas crianças
apresentam habilidade criativa, não são ajustadas e têm idéias pouco ortodoxas; mas ao
crescerem tornam-se pessoas não-criativas. Eysenck encontrou evidências de que essas
pessoas não tinham a persistência dos indivíduos de pontuação elevada em P. As crianças
com o mesmo potencial criativo, mas que demonstram níveis elevados de psicoticismo
(P), são capazes de resistir ás críticas dos pais e dos professores e de monstrarem-se
adultos criativos.
Da mesma forma, Eysenck e S. B. G. Eysenck (1975) verificaram que indivíduos
com valores elevados de pontuação tanto P quanto E têm uma probabilidade maior de
serem problemáticos quando crianças. No entanto, pais e professores tendem a referir-se a
crianças extrovertidas como marotos simpáticos e a perdoar suas transgressões, enquanto
percebem os indivíduos com valores de P elevados corno mais maldosos, desordeiros e
desagradáveis. Assim, os encrenqueiros com pontuações elevadas tendem a continuar'
crescendo como adultos produtivos, ao passo que os problemáticos com pontuações P
altos tendem a manter seus problemas de aprendizado. a envolver-se mais freqüentem ente
com o crime e a apresentar dificuldades para fazer amigos (S. Eysenck, 1997). Mais uma
vez, Eysenck acreditava de modo enfático que os psicólogos poderiam ser levados a erro
caso não considerassem as várias combinações das dimensões da personalidade ao con-
duzir suas pesquisas.
I
I
\
I
I
I
J.
Personalidade e Doença
Os fatores de personalidade podem prever a mortalidade por câncer e por doenças cardio-
vasculares (DCV)? A partir do começo da década de 1960, Eysenck dedicou grande aten-
ção a esse tema. Ele e David Kissen (Kissen e Eysenck, 1962) descobriram que as pessoas
com baixas pontuações em neuroticismo (N) no Inventário de Personalidade Maudsley
(Maudsley Personality lnventory) tendiam a suprimir suas emoções e eram muito mais
propens~s do que os indivíduos com índices N elevados a receber um diagnóstico poste-
nor de cancer de pulmão.
Mais tarde, Eysenck juntou-se ao médico e psicólogo iugoslavo Ronald Grossartb-
Maticek (Eysenck e Grossarth-Maticek, 1991; Grossarth-Maticek e Eysenck (1989);
Grossarth-Maticek, Eysenck e Vetter, 1988) para investigar não apenas a relação entre
personalidade e doença, mas também a eficiência da terapia de comportamento no prolon-
gamento da vida de pacientes com câncer e DCV. Grossartb-Maticek havia utilizado um
questionário breve e uma longa entrevista pessoal para distribuir as pessoas ao longo de
quatro grupos ou tipos. O Tipo I incluía pacientes com uma reação não-emocional deses-
perançada/desalentada ao estresse: as pessoas do Tipo II reagiam tipicamente à frustracão
com raiva, agressividade e excitação emocional; as pessoas do Tipo III eram ambivalen~es,
alternando-se entre reações típicas de pessoas do Tipo 1, e reações de indivíduos do Tipo 11
e, novamente de volta para o primeiro; os indivíduos oo Tipo IV referiam-seà sua própria
Parte IV Teorias Disposicionais
. ma I'mportante condiçãopara o bem-estar e a felicidade pessoais. Nóautonomia como u . . . .'.
d .' 1 na'lu~osla'vI'a as pessoas do tipo J tinham uma probabilidade muito maiorestu o ongina , " ,
do que 'as demais para morrer de câncer e as pessoas, do tipo II dem?nstravam uma propen-
são mais significàtiva para morrer de doenças cardíacas. Os individuos dos tIpOS 1II e IV
apresentavam índices mais baixos de mortalidade causados por câncer e doenças card,~-
vasculares. Grossarth-Maticek, Eysenck e Vetter reproduziram este estudo em Heidelberg,
Alemanha, e encontraram resultados bastantes semelhantes. .
Segundo ressaltou Eysenck (1996), este e outros estudos sobre o relac!On~mento
entre personalidade e doença não provam que fatores psicológicos cO!:sam cancer e
doenças cardíacas. Em vez disso, tais doenças são causadas por I~teraçao d,e diversos
fatores. Para as doenças cardiovasculares, estes fatores Incluem histórico familiar, Idade,
gênero, origem étnica, hipertensão, níveis de colesterol elevados-da ,lipoproteína de alta
densidade (HDL), tabagismo, hábitos alimentares, sedentansmo e va~!Os,fatores d~ per-
sonalidade. Para o câncer, os fatores incluem tabagismo, ahmentaçao, álcool, praticas
sexuais, histórico familiar, origem étnica e fatores de personalidade (Brannon e Feist,
2004). Éysenck (1996) alegava que apenas o hábito de fumar não causava câncer ou DCV,
mas que quando combinados ao estresse e a fatores de personalidade, contribui para a
morte causada-pelas duas doenças. Eysenck et aI. (Marusic, Gudjonsson, Eysenck e Starc,
1999), por exemplo, desenvolveram um complexo modelo biopsicossocial para doenças
cardíacas que incluíam 11 fatores biológicos e sete fatores psicossociais. Sua pesquisa com
homens na Eslovênia confirmou a hipótese de que os fatores de personaltdade mteragem
com diversos fatores biológicos para contribuir para as doenças cardíacas. Um exemplo de
interação apresentado ocorre entre tabagismo, neuroticismo e reatividade emocional,. ou
seja, indivíduos com pontuações P elevadas que fumam e reagem ao estresse com rarva,
hostilidade e agressividade aumentam seus riscos de desenvolver doenças cardíacas.
Os Cinco Grandes Fatores: Taxonomia
ou Teoria?
No Capítulo 1, definimos taxonornia como uma classificação de coisas segundo suas re-
lações naturais. Também sugerimos que as taxonomias são um ponto de partida essencial
para o avanço da ciência, ainda que não sejam teorias. Enquanto as t~onas produzem
pesquisa, as taxonomias apenas proporcionam um sistema de classificação.
A abordagem dos três fatores de Eysenck é um bom exemplo da forma pel~ qual
uma teoria científica pode utilizar uma taxonomia para produzir centenas de hlpoteses.
Na discussão subseqüente do Modelo dos Cinco Grandes Fatores de McCrae e Costa
(FFM, sigla em inglês), veremos que seu trabalho iniciou como uma tentatlv,a de Identtfi
l
-
car traços básicos de personalidade do modo como foram revelados pela análise faton~ ..
Esse trabalho logo evoluiu para uma taxonomia e para o Modelo dos CInCOFatores. Apos
um intenso trabalho adicional, esse modelo tornou-se uma teona; uma teoria que pode-
ria, ao mesmo tempo, prever e explicar o comportamento.
Biografias de Robert R. McCrae e Paul
T. Costa Jr.
Robert Roser McCrae nasceu em 28 de abril de 1949, em Maryville, Missouri, uma cidade
de 13 mil habitantes localizada aproximadamente a 160 km ao norte da cidade de Kansas.
Maryville é a sede da Northwest Missouri State, o maior empregador da cidade. McCrae,
o mais jovem dos três filhos de Andrew McCrae e Eloise Elaine McCrae, cresceu com um
Capitulo]4 Eysenck, McCrdc e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 413
grande interesse em Ciências e Matemática. Na ocasião de seu ingresso na Universidade
Estadual de Michigan, havia decidido estudar filosofia. Bolsista da National Merit Scholar,
ele, apesar disso, não estava completamente feliz com a natureza aberta e não-ernpirica da
filosofia. Depois de formado, ingressou no programa de pós-graduação da Universidade de
Boston, na área de psicologia. Considerando-se sua inclinação e talento para a matemática
e as ciências, McCrae ficou intrigado com o trabalho psicométrico de Raymond Cattell.
Ficou particularmente curioso acerca da utilização da análise fatorial para encontrar um
método simples de identificação dos traços estruturais encontrados no dicionário. Na Uni-
versidade deBoston, o principal professor de McCrae era Henry Weinberg, um psicólogo
clínico com ·interesse apenas superficial em traços de personalidade. Desta forma, o inte-
resse de McCrae em traços tinha de ser alimentado mais interna do que externamente.
Durantes as décadas de 1960 e 1970, Walter Mischel (ver Capítulo 17) questionava
a noção de que os traços de personalidade eram consistentes, alegando que a situação é
mais importante do que qualquer traço de personalidade. Embora Mischel tenha, desde
então, revisado sua posição sobre a consistência da personalidade, suas perspectivas
foram aceitas por muitos psicólogos durante aquele período. Em um comunicado pessoal
datado de 4 de maio de 1999, McCrae escreveu: "Eu freqüentei a escola de pós-graduação
nos anos seguintes à critica de Mischel (1968) à psicologia dos traços. Muitos psicólogos
daquela época foram preparados para acreditar que os traços não eram nada mais do que
um conjunto de respostas, estereótipos ou funções cognitivas. Aquilo nunca fez sentido
para mim, e minhas primeiras pesquisas experimentais mostravam uma extraordinária
estabilidade em estudos longitudinais, o que encorajava a crença de que os traços eram
reais e duradouros". Apesar disso, o trabalho de pós-graduação McCrae sobre traços era
um empreendimento um tanto solitário conduzido de forma silenciosa e sem muito alarde.
Como se revelaria mais tarde, esta abordagem silenciosa era muito adequada à sua perso-
nalidade relativamente quieta e introvertida.
Em 1975, quatro anos após o inicio de seu programa de Ph.D_, o destino de McCrae
estava prestes a mudar. Foi enviado por seu orientador para trabalhar como pesquisa-
dor-assistente com James Fozard, um psicólogo do desenvolvimento para orientação de
adultos no estudo norrnativo do envelhecimento na Veterans Administration Outpatient
Clinic, em Boston. Foi Frozard quem indicou McCrae a outro psicólogo da personalidade,
Paul T. Costa Jr., que fazia parte do corpo docente da Universidade de Massachusetts,
em Boston.
Após McCrae completar seu Ph.D. em 1976, Costa contratou-o como diretor de pro-
jetos e co-investigador principal para sua pesquisa sobre tabagismo e personalidade. Me-
Crae e Costa trabalharam juntos nesse projeto por dois anos, até ambos serem contratados
pelo Nationallnstitute on Aging's Gerontology Research Center, uma divisão do National
lnstitutes for Health (NU-I), situado em Baltirnore. Costa foi contratado como chefe da
seção sobre estresse e tolerância, enquanto McCrae assumiu o cargo de pesquisador sênior
associado. Como a Gerontology Research Center já apresentava um amplo e bem esta-
belecido conjunto de banco de dados sobre adultos, tratava-se do local ideal para Costa
e McCrae investigarem a questão sobre como a personal idade está estruturada. Durante
a década de 1970, com a sombra da infiuência de Mischel pairando pesadamente sobre
o estudo da personal idade e com o conceito de traços sendo relegado quase à categoria
de tabu, Costa e McCrae conduziram trabalhos sobre os traços que lhes asseguraram um
papel de destaque na história de 40 anos da análise da estrutura da personalidade.
Paul T. Costa Jr. nasceu em 16 de setembro de 1942, em Franklin. New Hampshire,
filho de Paul T. Costa e Esther Vasil Costa. Formou-se na Clark University. em 1964, e
também obteve os títulos de mestre (1968) e de Ph.D. (1970) em desenvolvimento humano
na Universidade de Chicago. Seu interesse persistente pelas diferenças individuais e pela
14 ParteIV TeoriasDisposicionais
natureza da personalidade aumentou bastante no ambiente intelectualmente estimulante
da Universidade de Chicago. Enquanto esteve em Chicago, trabalhou com Salvatore R.
Maddi, com quem publicou um livro sobre a teoria humanista da personalidade (Maddi e
Costa, 1972). Após concluir seu Ph.D, lecionou por dois anos em Harvard e, então, entre
1973 e 1978, na Universidade de Massachusetts-Boston. Em 1978, começou a trabalhar no
National Institute of Aging's Gerontology Research Center, tornando-se o chefe da seçào
de Estresse e Enfrentamento e então, em 1985, chefe do Laboratório de Personalidade e
Cognição. Naquele mesmo ano tornou-se presidente da Divisão 20 (Adult Development
and Aging) da American Psychological Association. Em sua lista de realizações estão a
posição de associado da American Psychological Association, em 1977, e a de presidente
da International Society for the Study of Individual Differences, em 1995. Costa e sua
esposa, Karol Sandra Costa, têm três filhos, Nina, Lora e Nicholas.
A parceria de Costa e McCrae tem sido excepcionalmente produtiva, com a publica-
ção de mais de 200 artigos científicos e capítulos e de vários livros, incluindo Emerging
Lives, Enduring Dispositions (McCrae e Costa, 1984), Personality in Adulthood: A Five-
Factor Theory Perspective, 2. ed. (McCrae e Costa, 2003) e Revised NEO Personality
Inventory (Inventário de Personalidade NEO Revisado) (Costa e McCrae, 1992).
Em Busca dos Cinco Grandes Fatores
o estudo de traços foi iniciado originalmente por Allport e Odbert na década de 1930,
prosseguido por Cattell nos anos 1940 e levado adiante por Tupes, Christal e Norman na
década de 1960 (ver John e Srivastava, 1999, para um exame histórico do Modelo dos
Cinco Grandes Fatores ou dos Cinco Grandes).
No final dos anos 1970 e início dos anos 1980, Costa e McCrae, tal como o maioria
dos pesquisadores fatoriais, estavam construindo elaboradas taxonomias de traços de per-
sonalidade, mas eles não utilizavam essas classificações para produzir hipóteses testáveis.
Em vez disso, apenas empregavam técnicas analítico-fatoriais para examinar a estabili-
dade e a estrutura da personalidade. Durante esse tempo, Costa e McCrae concentraram-
se inicialmente nas duas grandes dimensões: neuroticismo e extroversão.
Quase logo após descobrirem N e E, Costa e McCrae encontraram um terceiro fator.
que chamaram de abertura a experiências. Grande parte do trabalho inicial de Costa e
McCrae permaneceu centrado em torno destas três dimensões (ver, por exemplo, Costa
e McCrae, 1976; Costa, Fozard e Bosse, 1976). Embora Lewis Goldberg tenha sido o
primeito a utilizar o termo "Cinco Grandes", em 1981, para descrever as descobertas con-
sistentes das análises fatoriais de traços de personalidade, Costa e McCrae continuaram
seu trabalho sobre os três fatores.
Descoberta dos Cinco Fatores
Até 1983, McCrae e Costa defendiam um modelo de personalidade de três fatores. So-
mente em 1985 começaram a relatar trabalhos a respeito de cinco fatores da personali-
dade. Esse trabalho culminou em um novo inventário de personalidade de cinco fatores:
o NEO-PI (acrônirno em inglês) (Costa e McCrae, 1985). O NEO-Pl era uma revisão
de um inventário de personalidade inédito que mensurava apenas as primeiras três di-
mensões: N, E, e O. No inventário de 1985, as duas últimas dimensões - sociabilidade
e consciência da relevância das tarefas - ainda eram as escalas menos desenvolvidas,
Capitulo 14 Eysenck. McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 415
sem nenhuma subescala associada a elas. Costa e McCrae (1992) passaram a desenvolver
completamente as escalas A e C quando o NEO-PI Revisado apareceu em 1992.
Ao longo dos anos 1980, Costa e McCrae (1985, 1989a) continuaram seu trabalho
de analisar fatorialmente a maior parte dos outros grandes inventários de personalidade,
inclusive o Myers-Briggs Type lndicator (Myers, 1962) e o Eysenck Personality inventor)'
(H. Eysenck e S. Eysenck, 1975, 1993). Em uma comparação direta entre o seu modelo
e o modele de Eysenck, por exemplo, Costa e McCrae verificaram que os primeiros dois
fatores de Eysenck (N e E) são totalmente consistentes com seus dois primeiros fatores.
A medida de psicoticismo de Eysenck explorou as extremidades da sociabilidade e COIlS-
ciência da relevância das Tarefas, mas não se estendeu até a abertura a novas experiências
(McCrae e Costa, 1985).
Naquela mesma ocasião, havia duas questões significativas e mencionadas em
pesquisas sobre personalidade. Em primeiro lugar, com dúzias de diferentes inventários
de personalidades e centenas de escalas variadas, como poderia surgir uma linguagem
comum? Todos tinham este ou aquele conjunto de variáveis de personalidade, de alguma
forma idiossincráticos, tornando difícil a comparação entre estudos e o progresso cumu-
lativo. De fato, segundo escreveu Eysenck (1991):
Onde temos Iit.eralmente centenas de inventários incorporando milhares de traços,
essencialmente sobrepostos, mas também contendo variações específicas, cada
descoberta empírica é, em termos obsoletos, relevante apenas para um traço específico.
Isto não é a forma de construir uma disciplina científica unificada. (p. 786)
Em segundo lugar, o que é a estrutura da personalidade? Cattell defendia a existên-
cia de 16 fatores, Eysenck, três, e muitos outros estavam começando a defender a existên-
cia de cinco. A grande realização do Modelo dos Cinco Fatores (FFM, sigla em inglês)
tem sido proporcionar respostas para ambas as questões.
Desde o final da década de 1980 e o inicio da década de 1990, a maioria dos psi-
cólogos da personalidade tem optado pelo Modelo dos Cinco Fatores (Digman, 1990;
John e Srivastava, 1999). Os cinco fatores têm sido encontrados em diversas culturas,
utilizando uma abundância de linguagens (McCrae e Allik, 2002). Além disso, os cinco
fatores apresentam certa permanência ao longo da idade, ou seja, os adultos - na ausên-
cia de doenças graves, como o mal de Alzheimer -, tendem a manter a mesma estrutura
de personalidade à medida que envelhecem (McCrae e Costa, 2003). Essas descobertas
levaram McCrae e Costa (1996) a escrever que "os fatos sobre a personalid.ade começam
a encaixar-se" (p. 78). Ou, como McCrae e Oiiver John (1992) insistiam, a existência dos
cinco fatores é "um fato empirico, tal como o fat.o de que há sete continentes Oll oito pre-
sidentes americanos vindos da Virgínia" (p, J 94). (A propósito, não é um fato empírico a
afirmação de que a Terra possui sete continentes: grande parte dos geógrafos considera a
existência de apenas seis.)
Descrição dos Cinco Fatores
i
I
I
I
I
J
McCrae e Costa concordaram com Eysenck em que os traços de personalidade são bipola-
res e seguem uma distribuição gráfica em forma de sino. Ou seja, grande parte das pessoas
obtém pontuações próximas do meio em cada traço, sendo que apenas algumas pessoas
pontuam nas extremidades. Como podem ser descritas as pessoas dos extremos?
Neuroticismo (N) e extroversão (E) são os dois traços de personalidade mais fortes
e presentes, e Costa e McCrae os conceituarn da mesma forma que Eysenck os definia. As
pessoas com pontuações elevadas em neuroticismo tendem a ser ansiosas, ternperarnentais.
416 Parte IV TeoriasDispcsicicnais
"-~'.
'TABELA 14..1 .
Extroversão
Modelo de Cinco Fatores de Personalidade de Costa e McCrae
Pontuações Elevadas
afetuoso
sociável
falador
gosta de se divertir
ativo
apaixonado
Neuroticismo ansioso
temperamemal
autopiedoso
autoconsciente
emotivo
vulnerável
Abertura a novas experiências imaginativo
criativo
original
prefere a variedade
curioso
liberal
Sociabilidade dócil
confiante
generoso
tolerante
flexível
Conscíentização da Relevância
das. Tarefas
bondoso
consciente
esforçado
organizado
pontual
ambicioso
perseverante
Pontuações Baixas
reservado
solitário
quieto
sóbrio
passivo
insensívelcalmo
equilibrado
autocontido
despreocupado
reservado
ousado
pragmático
não-criativo
convencional
prefere a rotina
discreto
conservador
cruel
desconfiado
avaro
antagonista
crítico
irascível
negligente
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atrasado
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autopiedosas, autoconscientes, emotivas e vulneráveis a distúrbios associados ao estresse.
Aquelas com Índices N baixos normalmente são calmas, equilibradas, autocontidas e não-
emotivas.
Os indivíduos com índices elevados em extroversão tendem a ser afetivos, joviais,
falantes sociáveis e gostam de se divertir. Em contraste, as pessoas com pontuações E
baixas têm uma propensão a serem reservadas, quietas, solitárias, passivas e incapazes de
expressar emoções fortes (ver Tabela 14.1).
Capitulo 14 Eysenck, McCrae e Costa: Teoria dos Traços e dos Fatores 417
A abertura a novas experiências distingue as pessoas que preferem a variedade
daquelas que têm uma necessidade de reclusão e que obtêm conforto associando-se a
coisas e pessoas familiares. Aquelas que buscam de forma coerente experiências diferen-
tes e variadas obtêm pontuações mais elevadas na abertura a experiências. Por exemplo,
experimentando novos itens do menu em um restaurante ou procurando restaurantes
noVOSe estimulantes. Em contraste, as pessoas que não estão abertas a novas experiências
permanecerão atreladas a um item familiar, um item qne sabem que agradará. As pessoas
com pontuações elevadas em abertura a novas experiências também tendem a questionar
os valores tradicionais, enquanto as com pontuçõesbaixas neste quesito tenderão a apoiar
os valores tradicionais e a preservar um estilo de vida fixo. Em resumo, as pessoas com
indices altos de abertura a experiências em geral são criativas, imaginativas, curiosas e
liberais, além de terem urna preferência pela variedade. Por outro lado, as que apresentam
pontuações baixas em abertura a novas experiéncias são geralmente convencionais, prag-
máticas, conservadoras e carentes de curiosidade.
A Escala de Sociabilidade distingue as pessoas generosas das cruéis. Aquelas que
pontuam com relação à sociabilidade tendem a ser confiantes nos outros, generosas, fle-
xíveis, tolerantes e controladas. Indivíduos que pontuam na outra direção geralmente são
desconfiados, avaros, não-amigáveis, irascíveis e críticos em relação às outras pessoas.
O quinto fator - conscientização da relevância das tarefas - descreve pessoas que
são ordeiras, controladas, organizadas, ambiciosas, voltadas para a realização e autodis-
ciplinadas. Em geral, os indivíduos que pontuam significativamente em C são dedicados,
conscientes, pontuais e perseverantes. Por outro lado, as pessoas que obtêm pontuações
baixas no tópico conscientização da relevância das tarefas tendem a ser desorganizaàas,
negligentes, preguiçosas, sem metas e inclinadas a abandonar um projeto quando este fica
difícil. Juntas. estas dimensões compõem os traços de personalidade do modelo dos cinco
fatores, freqüenternente conhecido como "Cinco Grandes Fatores" (Goldenberg, 1981).
EvoLução da Teoria dos Cinco Fatores
Originalmente, os cinco fatores nada mais eram do que urna taxonomia, uma classificação
de traços básicos de personalidade. No final da década de 1980, Costa e McCrae torna-
ram-se confiantes de que eles e outros pesquisadores haviam encontrado uma estrutura
estável de personalidade. Ou seja, haviam respondido a primeira questão central da perso-
nalidade: o que é a estrutura de personalidade? Este avanço foi um marco importante para
os traços de personalidade. O campo tinha agora uma linguagem comum e compartilhada
para descrever a personalidade, e ela apresentava-se em cinco dimensões. Descrever os
traços de personalidade, no entanto, não é o mesmo que explicá-Ios. Para explicar, os cien-
tistas necessitam de uma teoria: e aquele seria o próximo projeto de McCrae e Costa.
McCrae e Costa (1996) opunham-se às teorias anteriores sob a alegação de que elas
baseavam-se excessivamente em experiências clínicas e especulação teórica. Durante
os anos 1980, a polêmica entre as teorias clássicas e as teorias modernas embasadas em
pesquisas havia se tornado explícita. Era claro para eles que "as velhas teorias não podem
simplesmente ser abandonadas. Deveriam ser substituídas por urna nova geração de teo-
rias que decorrem do conhecimento conceitual do passado e das descobertas empíricas
cia pesquisa contemporânea" (p. 53). De fato, essa tensão entre o novo e o velho era uma
das forças propulsoras por trás do desenvolvimento de uma teoria alternativa de McCrae
e Costa, uma que ultrapassasse os limites da taxonomia dos cinco fatores.
Qual, entâo. é a alternativa? O que poderia haver em uma teoria moderna dos tra-
ços que estivesse faltando nas teorias clássicas? Segundo McCrae e Costa, em primeiro
lugar e acima de tudo, uma nova teoria deveria ser capaz de incorporar a mudança e o
us Parte IV TeoriasDisposicionais
crescimento do campo que havia ocorrido ao longo dos últimos 25 anos bem como estar
fundamentada em princípios empíricos atuais que haviam surgido das pesquisas.
Por 25 anos, Costa e McCrae estiveram na linha de frente da pesquisa contemporâ-
nea de personalidade, desenvolvendo e elaborando o Modelo dos Cinco Fatores. De acordo
com McCrae eCosta (J 999) "nem o modelo em si nem as descobertas do corpo de pes-
quisas aos quais ela está associada constituem uma teoria da personalidade. Uma teoria
org~niza as descobertas para contar uma história coerente, para enfatizar tais questões e
fenomenos que podem e devem ser explicados" (p. 139-140). Anteriormente, McCrae
e Costa (1996, p. 78) haviam declarado que "os fatos sobre a personalidade comecam a
encaixar-se. Agora é a ocasião para começar dar sentido a eia;". Em outras palavr~s, era
tempo de transformar o Modelo dos Cinco Fatores (taxonomia) em uma Teoria dos Cinco
Fatores (FFT, sigla em inglês).
Unidades da Teoria dos Cinco Fatores
Na teoria da personalidade de McCrae e Costa (1996, 1999 e 2003), o comportamento é
previsto por meio da compreensão de três componentes centrais ou essenciais e de três
componentes periféricos. Os três componentes centrais incluem: (I) tendências básicas.
(2) adaptações características e (3) autoconceito. .
Componentes Centrais da Personalidade
Na Figura 14.8, os componentes centrais ou essenciais são representados por retângu-
los, enquanto os periféricos são representados por elipses, As flechas representam o,
proc.essos dinâmicos e indicam a direção da influência causal. A biografi; objetiva (ex-
pertencias de VIda), por exemplo, é o resultado de adaptações características bem como
de influências externas. Além disso, as bases biológicas são a única causa das tendências
básicas (traços de personalidades). O sistema de personalidade pode ser interpretado tanto
de forma transversal (o modo pelo qual o sistema opera em qualquer ponto ao longo do
tempo) quanto de forma longitudinal (o modo pelo qual nos desenvolvemos ao 100"0 de
nossas vidas). Ademais, cada influência causal é dinâmica, o que significa que sofre'"alte-
ração no decorrer do tempo.
Tendências Básicas Segundo a definição de McCrae e Costa (J 996), as tendências bá-
sicas sã~ um dos componentes centrais da personalidade, juntamente com as adaptações
caractensncas, autoconceito, bases biológicas, biografia objetiva e influências externas.
McCrae e Costa definiram as tendências básicas como
a matéria-prima universal das capacidades e disposições da personalidade que
geralmente são deduzidas em vez de observadas. As tendéncias básicas podem
ser herdadas, Impressas por experiências iniciais ou modificadas por doenças ou
Intervenção psicológica, mas, em qualquer período da vida de uma pessoa, elas definem
o potencial e a direção do indivíduo. (p. 66, 68)
Nas primeiras versões de sua teoria, McCrae e Costa

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