Prévia do material em texto
1 AULA 01 INTRODUÇÃO À ZOOTECNIA 1. EVOLUÇÃO DA ZOOTECNIA COMO ARTE E COMO CIÊNCIA 1.1 Zootecnia como arte As evidências acumuladas durante os últimos anos indicam que a agricultura provavelmente teve suas origens no Oriente Médio, embora, ao contrário do que se supunha, não nos vales férteis da Mesopotâmia, que se tornariam centros importantes da primitiva civilização, mas sim nas regiões montanhosas e semi-áridas próximas. Datas determinadas para foices de sílex e moinhos de pedras lá descobertos indicam que antes de 8.000 anos a.C. o homem provavelmente começou a colher grãos naturais e há provas de que, cerca de mil anos depois, já cultivava esses grãos e possuía animais domésticos (Heiser Júnior, 1977). Segundo Domingues (1981), uma das primeiras realizações do homem primitivo foi criar animais, concomitante ao cultivo dos vegetais, quando deixou de ser nômade (caçador e pescador) e se tornou sedentário, passando a ser pastor e agricultor. Isto na idade da Pedra Polida, cerca de 7.000 anos a.C. Inicialmente, o homem criou animais para satisfazer seu totemismo (zoolatria), em seguida, com a indisponibilidade de alimentos espontâneos próximos às aldeias, passou a utilizá-los como alimento e, por último, com os rigores climáticos ou intempéries, para proteção. 1.2 Zootecnia como ciência A distinção formal entre o cultivo de vegetais e a criação de animais se deu em 1844, quando o Conde Adrien de Gasparin publicou o livro "Cours d'Agriculture", separando definitivamente o estudo dos vegetais cultivados do dos animais criados pelo homem. O estudo do cultivo dos vegetais já era conhecido com o nome de Agricultura. Para o estudo da criação dos animais domésticos, o autor propôs o termo “Zootechnie”, do grego: zoon = animal, e technê = arte. Em 1848, com a instalação do Instituto Agronômico de Versailles, em Paris, foi adotada a distinção proposta pelo Conde Adrien de Gasparin e para o ensino teórico da exploração dos animais domésticos foi estabelecida a Cátedra de Zootecnia. A Zootecnia como ciência surgiu em 1849, na França, com a aprovação de uma tese apresentada pelo naturalista Emile Baudement em concurso para a Cátedra de Zootecnia do Instituto Agronômico de Versailles, ao tornar-se o primeiro docente de Zootecnia. Nesta tese, foi estabelecido o princípio teórico que consiste em considerar o animal doméstico como uma máquina viva transformadora e valorizadora dos alimentos, constituindo-se no fundamento de todos os conhecimentos zootécnicos. Assim, constata-se que a arte de criar é remota, enquanto a ciência de criar surgiu há um pouco mais de um século e meio. No sentido de melhor conhecimento da Zootecnia, recomenda-se recorrer ao vasto volume de fontes bibliográficas, desde aquelas pioneiras, como os livros Introdução à Zootecnia e Elementos de Zootecnia Tropical, de autoria do professor Octávio Domingues, grande responsável pela consolidação da Zootecnia no Brasil, às mais atuais, que apresentam uma visão atualizada da evolução da Zootecnia no Brasil, incluindo-se Ferreira e Pinto (2000), Fonseca (2001) e Miranda (2001), sendo recomendado ainda o conhecimento da História da Sociedade Brasileira de Zootecnia, segundo Peixoto (2001). 2. CONCEITOS, OBJETIVOS, CLASSIFICAÇÃO, IMPORTÂNCIA E RELAÇÃO DA ZOOTECNIA COM OUTRAS CIÊNCIAS Em 1929, o Professor Octavio Domingues definiu Zootecnia como a ciência aplicada que estuda e aperfeiçoa os meios de promover a adaptação econômica do animal ao ambiente criatório e deste ambiente ao animal. A Zootecnia tem como objeto de estudo o animal doméstico e visa o perfeito conhecimento deste e dos demais fatores envolvidos no seu processo produtivo, sempre visando alto grau de especialização. Com relação ao alto grau de especialização, o animal mais produtivo não é o mais aperfeiçoado no sentido geral ou o mais especializado em determinada função produtiva. A "máquina viva" mais perfeita, capaz de oferecer maior retorno econômico, é aquela que está adaptada às condições de criação e exploração. Quando se busca alto grau de especialização em determinado animal, dois princípios devem ser considerados: • A especialização não deve acarretar desequilíbrio fisiológico no animal; • O animal adaptado às condições de criação e exploração não deve sofrer comprometimento das características adaptativas. 2 Para fins didáticos, a Zootecnia é subdividida em Zootecnia Geral e Zootecnia Especial. Em Zootecnia Geral, os animais domésticos são considerados como seres vivos que evoluíram e apresentam características de natureza étnica e zootécnica, influenciando-se por fatores ambientais de ordem natural ou artificial e que se reproduzem sujeitos às leis da hereditariedade, portanto, capazes de sofrer melhoramento genético. Em Zootecnia Especial, são estudados processos e regimes de criação, variáveis com a finalidade da exploração e o destino dos produtos, com a qualidade dos animais a multiplicar, e com as potencialidades do ambiente criatório. Assim, surge a Zootecnia de cada espécie doméstica, cada uma com sua denominação particular: bovinocultura, equideocultura, bubalinocultura, ovinocultura, caprinocultura, suinocultura, apicultura, sericicultura, piscicultura, avicultura, etc., ou mesmo, daquelas que, embora não ainda consideradas domésticas, sejam exploradas racionalmente, como por exemplo, a ranicultura, ou criação de rãs; a carcinicultura, ou criação de crustáceos; a minhocultura, ou criação de minhocas, etc. A Zootecnia como ciência investiga, por meio da observação e da experimentação, os fenômenos biológicos aos quais estão sujeitos os animais domésticos, em determinado ambiente natural ou artificial. Entretanto, não se trata de uma ciência pura, sendo dependente de outras ciências para desenvolver-se. Portanto, além do conhecimento individual, proporcionado pela Anatomia e Fisiologia Animal, a Zootecnia se fundamenta em ciências auxiliares quando da adaptação, alimentação, melhoramento e sanidade animal, gerenciamento da produção e tecnologia de alimentos, destacando-se: Na Adaptação: Climatologia (Zooclimatologia e Bioclimatologia), Etologia; Na Alimentação: Nutrição (Bromatologia), Forragicultura, Botânica, Bioquímica, Química e Edafologia; No Melhoramento Genético Animal: Genética, Estatística, Bioestatística, Matemática e Informática; Na Sanidade: Medicina Veterinária; No Gerenciamento da Produção: Economia e Administração; Na Tecnologia de Alimentos: Engenharia de Alimentos. Para o perfeito exercício das atividades na área de Zootecnia, exige-se identidade profissional, determinada pelo Núcleo de Conteúdos Profissionais Essenciais, integrando as subáreas de conhecimento que identificam atribuições, deveres e responsabilidades, segundo Fonseca (2001), assim constituído: Anatomia Descritiva dos Animais Domésticos; Bioclimatologia Zootécnica; Biotecnologia Animal; Bromatologia; Comunicação e Extensão Rural; Construções Rurais; Economia e Administração Agrária; Ética e Legislação; Ezoognósia e Julgamento Animal; Fisiologia Animal; Pastagens e Forragicultura; Genética e Melhoramento Animal; Gestão de Recursos Ambientais; Gestão Empresarial e Marketing; Industrialização de Produtos de Origem Animal; Instalações e Equipamentos Zootécnicos; Mecânica e Máquinas Agrícolas; Meteorologia e Climatologia Agrícola; Microbiologia Zootécnica; Nutrição, Alimentação e Formulação de Rações; Política e Desenvolvimento Agrário; Produção Animal; Profilaxia e Higiene Zootécnica; Reprodução Animal; Sociologia Rural; Solos e Nutrição de Plantas; Técnicas e Análises Experimentais. 3. A SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA (SBZ) E A CONSOLIDAÇÃO DA ZOOTECNIA NOBRASIL 3 A idéia da fundação da SBZ amadureceu durante a Exposição de Animais de Uberaba, em 1951, quando os zootecnistas presentes incubiram seus colegas de Piracicaba a promoverem a I Reunião Brasileira de Zootecnia, a ser realizada naquela cidade como homenagem ao qüinquagésimo aniversário da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ). O período escolhido foi de 26 a 28 de julho de 1951, coincidindo com a Exposição Nacional de Animais que, naquele ano, se realizaria em São Paulo (Peixoto, 2001). O professor Octavio Domingues, engenheiro agrônomo graduado pela ESALQ, foi o primeiro presidente da SBZ, tendo conduzido os destinos da Sociedade de 1951 a 1968. Além dessa laboriosa tarefa, segundo o professor Aristeu Mendes Peixoto (2001), coube ao Professor Octavio Domingues o mérito de uma doutrinação tenaz e persistente para imprimir novo sentido aos estudos zootécnicos no Brasil, defendendo a organização de cursos de Zootecnia equiparados aos de Engenharia Agronômica e de Medicina Veterinária, numa época em que a discussão do assunto constituía um verdadeiro tabu. Sob a égide da SBZ e a inspiração do professor Octavio Domingues, o primeiro currículo acadêmico para um curso de Zootecnia foi proposto em 1953, o qual veio a servir de orientação para os cursos de Zootecnia que surgiram no Brasil a partir de 1966, quando se instalou em Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, a primeira faculdade de Zootecnia. A Sociedade Brasileira de Zootecnia, no ano de 2000, contava com 1697 sócios, consistindo em uma Sociedade Científica com os seguintes objetivos: Promover intercâmbio entre os zootecnistas brasileiros e os estrangeiros, favorecendo as relações profissionais e de amizade; Promover reuniões anuais na sede da SBZ ou em outro local a critério da Diretoria; Promover reuniões extraordinárias, congressos, conferências ou convenções, nacionais ou internacionais, sobre qualquer assunto da zootecnia e a participação da Sociedade em reuniões promovidas por outras entidades congêneres; Levar ao conhecimento de todos os associados, por meio de publicação sistemática, os trabalhos realizados por seus membros, mesmo que na forma de resumo; Organizar Comissões especializadas, entre seus membros, para estudar assuntos técnicos de interesse da economia nacional; Envidar esforços para o aperfeiçoamento da pecuária no País, por meio do ensino, da pesquisa e da extensão. Constituem publicações periódicas da Sociedade Brasileira de Zootecnia: Anais das Reuniões Anuais da SBZ; Revista Brasileira de Zootecnia (disponível na Biblioteca Setorial do CCA/UFPI). Para conhecimento da Sociedade Brasileira de Zootecnia e de suas publicações, acesse o Site da SBZ: http://www.sbz.org.br A Sociedade Brasileira de Zootecnia realizará sua 45ª Reunião Anual, em Lavras-MG, no ano de 2008, em parceria com a Universidade Federal de Lavras – (UFLA), sob a Presidência do Prof. Dr. Kleber Tomás de Resende. A representação da Sociedade Brasileira de Zootecnia no Estado do Piauí, encontra-se no Departamento de Zootecnia do CCA/UFPI, tendo como Diretor Estadual o Professor Doutor João Batista Lopes (lopesjb@uol.com.br). ***CONHEÇA O ESTATUTO DA SBZ E SEJA MAIS UM SÓCIO*** ESTUDO DIRIGIDO 01 1. Relatar sobre a evolução e características da Zootecnia como arte, especificando fatos e local; 2. Relatar sobre a evolução e características da Zootecnia como ciência, especificando fatos, local e responsáveis pela estabilização da Zootecnia como ciência aplicada; 3. Apresentar uma discussão sobre o conceito de Zootecnia elaborado pelo professor Octavio Domingues, destacando seus pontos principais; 4. Identificar as limitações do estabelecimento do alto grau de especialização do animal doméstico; Apresentar a divisão didática da Zootecnia com respectivas definições; 4 Considerando a Zootecnia como uma ciência aplicada, apresentar um problema de interesse zootécnico e levantar hipóteses para elaboração de uma minuta de projeto para solução com base no Método Científico; 7. Identificar as grandes áreas de atuação na Zootecnia e apresentar ciências auxiliares à solução de problemas nestas áreas; À luz das atribuições profissionais do seu curso (Zootecnia), traçar um paralelo entre estas atribuições e as atividades do Zootecnista; 9. Identificar a importância e papel da Sociedade Brasileira de Zootecnia para a estabilização da Zootecnia no Brasil como atividade produtiva e como ciência; A partir de um artigo publicado na Revista Brasileira de Zootecnia, identificar à luz do Método Científico o problema de pesquisa, os objetivos, hipóteses, metodologia, principais resultados de impacto na produção animal e conclusões. O que pode ser sugerido como pesquisa na área em que foi conduzido o experimento, para as condições do Estado do Piauí. Tecer comentários acerca dos efetivos dos principais rebanhos brasileiros de expressão econômica em relação aos demais países e das regiões e Estados do Brasil, com ênfase para a Região e Estado onde pretende exercer atividades profissionais. TEXTO COMPLEMENTAR 01 RETROSPECTIVA E DESAFIOS DA PRODUÇÃO DE RUMINANTES NO BRASIL Kepler Euclides Filho. Eng.-Agr., PhD. Bolsista CNPQ EMBRAPA-CNPGC, Caixa Postal 154, CEP 79002-970, Campo Grande, MS. kepler@cnpgc.embrapa.br 1. INTRODUÇÃO O ser humano possui, dentre outras coisas, o dom de crer, de ter esperanças, de buscar respostas, de criar e de se inconformar. Essas características foram e são as principais responsáveis pelas grandes transformações vividas pela sociedade. São elas a mola propulsora do chamado progresso a que a humanidade vem sendo submetido constantemente. Progresso esse que se processava de forma lenta no passado, e que, no entanto, ocorre rapidamente no presente e promete intensificar a trajetória nos próximos anos. A conjunção destes atributos fez do homem um ser capaz de criar expectativas, até mesmo convicções, que se acham relacionadas ao início de novos tempos. Nesse contexto, dado o momento em que vivemos, início de um novo milênio, nada mais natural que se promover uma avaliação daquilo que se fez, e procurar vaticinar o que virá. É nesse ambiente, e impulsionado por esse desejo de compreender bem a importância do que se fez para, dessa forma, poder orientar de maneira eficaz a contribuição que se pode ter no futuro é que a Sociedade Brasileira de Zootecnia resolveu fazer esse balanço. A importância da zootecnia para o desenvolvimento do Brasil é indiscutível e foi bem enfatizada por EUCLIDES FILHO (1997), quando disse: “…a utilização de animais domésticos tem precedentes históricos que fazem destes, não só componentes primários indispensáveis ao desenvolvimento e prosperidade do homem, mas também os colocam como elementos pró-ativos do desenvolvimento tecnológico…”. Além disso, os estudos com essas espécies têm trazido grandes contribuições ao desenvolvimento científico e crescimento e melhoria da produção animal. Na verdade, ainda segundo esse autor, a história do Brasil também foi influenciada diretamente por estes animais. No primeiro momento, pelos bovinos, que tiveram grande participação durante o ciclo econômico do açúcar e mais tarde, pelos eqüinos, durante o ciclo do ouro. O bovino no início do Brasil colonial representava apoio fundamental à atividade açucareira, não só como animal de trabalho, mas também para fornecer a carne, a gordura, o leite e o couro. Ainda no século XVI, nos primórdios da colonização, a importância dos suínos e dos ovinos também já se fazia sentir. Enquanto os suínos se destacavam pela produção de carne, tanto verde quanto salgada, e pelo couro, os ovinos eram responsáveis pela produção da lã necessária à produção de agasalho.Nessa mesma época, as aves já integravam os bens das propriedades rurais. Datam também desse período, as primeiras introduções de caprinos provenientes de Portugal e Espanha. No entanto, a simples presença desses importantes componentes da economia brasileira não seria suficiente para garantir ao setor do agronegócio o lugar que ele vem assumindo no Brasil, e principalmente, não seria capaz de assegurar que o país ocupe a posição que lhe está reservada no agronegócio mundial. Para que isso ocorresse e principalmente que essa inserção no mercado mundial de animais e de seus produtos se consolide foi e será de vital importância o papel representado pelo segmento da comunidade científica brasileira envolvido com a zootecnia. Nesse contexto, papel preponderante foi exercido pela Sociedade Brasileira de Zootecnia. Essa, por congregar técnicos, extensionistas, pesquisadores e professores de diferentes instituições e 5 universidades, públicas e privadas, possibilitou não só a discussão e a troca de conhecimentos e informações, mas garantiu também a criação de uma massa crítica fundamental para os avanços científico e tecnológico. Ao se fazer uma retrospectiva do desenvolvimento científico e tecnológico e suas relações com o setor produtivo animal e suas contribuições para produção de ruminantes no Brasil é importante discutir-se um pouco a respeito dos modelos de pesquisa e da sua importância para o desenvolvimento social de uma nação. Nesse contexto, considerar-se-á o modelo de pesquisa como sendo a articulação entre as fases de desenvolvimento científico, desenvolvimento tecnológico e produção/comercialização. A ênfase na integração parcial ou total de cada uma dessas fases fica na dependência das condições sociais, culturais e principalmente, econômicas do país; e do setor ou segmento da economia em análise. Na ótica do agronegócio, de modo geral, mesmo nos países do primeiro mundo, vem-se procurando manter um equilíbrio entre essas diversas fases. Tal enfoque vem sendo cada vez mais enfatizado com a globalização da economia. Dessa forma, é natural que uma entidade como a SBZ destaque-se mais como uma sociedade que mesmo contribuindo para o desenvolvimento científico, o faça em um contexto orientado para o desenvolvimento tecnológico. Nesse contexto, a grande maioria dos trabalhos desenvolvidos pelos técnicos vinculados à pesquisa sobre produção de ruminantes relaciona-se à busca de soluções, novas e/ou alternativas, para problemas que influenciam diretamente a eficiência e produtividade dos sistemas de produção. Assim, esses devem ser desenvolvidos em uma perspectiva de sistema de produção, ou seja, dentro do chamado enfoque sistêmico. Esse enfoque, na verdade, constitui-se em uma ferramenta há muito defendida por pesquisadores, como pode ser confirmado pelas palavras do professor Cornevin em seu livro “Tratado sobre Zootecnia Geral”. A integração com a última fase, produção/comercialização, no entanto, deverá assumir papel mais importante, e consequentemente se intensificar, nos próximos anos. Para o futuro possivelmente seja reforçada a demanda por soluções que viabilizem uma produção competitiva (alta qualidade, baixo custo e saudável no aspecto alimentar) de alimentos de origem animal, conduzida em sistemas de produção sustentáveis e bem integrados aos demais segmentos da cadeia de produção. Isso todavia, não subtrai importância do desenvolvimento científico, pois esse é dependente da geração do conhecimento e de seu avanço, que por sua vez alavanca o desenvolvimento tecnológico, e por isso deve ser incentivado. Por outro lado, o desenvolvimento social só será realidade se o conhecimento puder ser colocado em prática e se transformar em benefício real. Assim, a ênfase na segunda fase do modelo de pesquisa deverá continuar, sem que isso signifique perda de eficiência. Haverá necessidade, no entanto, que os esforços sejam mais bem orientados, e para isso, torna-se de extrema importância que a Sociedade Brasileira de Zootecnia coordene ou incentive o desenvolvimento de um programa amplo que envolva governos e representantes dos diversos segmentos produtivos das diferentes cadeias de produção, de forma a articulá-los em benefício de um bem maior para a sociedade brasileira como um todo. 2. RETROSPECTIVA Se no Brasil, já há algum tempo, a competitividade vem sendo uma realidade para atividades relacionadas a algumas espécies de animais domésticos, e consequentemente, para suas respectivas cadeias produtivas hoje, o que se observa, e principalmente o que se pode prever para o futuro, é sua intensificação bem como sua ampliação abrangendo segmentos até então incólumes às transformações dela resultantes. Nesse contexto, algumas áreas e linhas de pesquisa, quer sejam relacionadas ao desenvolvimento científico ou ao desenvolvimento tecnológico, são imprescindíveis à manutenção dessas atividades como componentes importantes ao desenvolvimento social e à inserção e/ou fortalecimento do país no mercado internacional. Graças à capacidade de diversos técnicos e grupos de pesquisa, muito já se produziu nesse sentido e certamente muito mais se pode esperar. Assim, considerando-se a área de ruminantes e as diversas disciplinas a ela relacionadas, ou seja, Nutrição, Melhoramento Animal, Manejo, Forrageiras e Pastagens e Análise e Simulação de Sistemas, pode-se analisar os avanços e contribuições que as diversas linhas de pesquisa emprestaram e continuam emprestando aos desenvolvimentos científico e tecnológico da área de ruminantes como um todo, com conseqüentes incrementos em produção e produtividade. Tais avanços têm sido capazes de provocar mudanças em aspectos que contribuem para maior eficiência e eficácia das cadeias produtivas, e ao mesmo tempo atendem às demandas de sustentabilidade, respeito ao ambiente e saudabilidade alimentar. Nesse enfoque, podem-se ressaltar como dignos de nota os significativos progressos observados em diversas linhas de pesquisa das diferentes disciplinas. 2.1. Melhoramento animal 6 De importância histórica no Brasil e no mundo, o melhoramento genético animal vem assumindo, cada vez mais, papel preponderante na zootecnia moderna. O enfoque inicial e a preocupação básica de aumento de produção começa lentamente a dar espaço, em que pese a importância permanente da produção e produtividade, ao enfoque de adequação do recurso genético animal àqueles representados pelo ambiente (solo, clima, aspectos socioculturais e econômicos) e pelas plantas forrageiras, e suas inter-relações, tendo sempre em perspectiva uma produção sustentável que seja capaz de resultar em rentabilidade do empreendimento. O melhoramento genético animal já se constituía em preocupação dos órgãos de governo desde o fim do século passado. No início do século atual consolidou-se se a preocupação do meio científico brasileiro para com essa importante área da zootecnia. No entanto, o maior desenvolvimento científico tem sua trajetória pavimentada em um período onde a consciência científica nacional, especificamente a visão de futuro e a abnegação de alguns pesquisadores, possibilitaram a construção das bases estruturais de nossa pesquisa zootécnica. É nessa época também que surge a Sociedade Brasileira de Zootecnia. O período compreendido pelo final da década de 40 e início da de 50 foi de fundamental importância para a zootecnia brasileira. A partir de então, é que se observa o grande avanço do conhecimento científico e tecnológico no Brasil. É também nesse período que se iniciam mais intensamente os trabalhos de cruzamentos, tanto em gado de leite quanto no de corte, voltados à constituição de novos grupamentos genéticos objetivando produção de carne e leite, respectivamente. Várias foram as raças formadas no Brasil a partir dessa época, podendo-se citar, entre outras,as raças Indubrasil, Lavínia, Pitangueiras, Canchim, Ibagé, Santa Gabriela, Simbrasil e Girolando. A ênfase nas diversas linhas de pesquisa em melhoramento genético animal é, à semelhança do que acontece em outras áreas, dependente do avanço do conhecimento e das imposições e demandas do mercado. Assim, pode-se, de forma geral, acompanhando-se os trabalhos desenvolvidos pela comunidade científica brasileira, estabelecer certa cronologia dos trabalhos desenvolvidos mesmo que esses se sobreponham de uma forma ou de outra. Dessa forma, percebe-se claramente que durante os anos 50 e 60 a preocupação predominante estava centrada na avaliação de desempenho produtivo, principalmente, ponderal para as raças de corte e produção de leite para as leiteiras, e na determinação da importância dos diversos fatores de meio no desempenho. Paralelamente desenvolviam-se os trabalhos de seleção cujos objetivos centrais eram maiores pesos e ganhos de peso e maiores produções de leite. A década de 70 é marcada pelo grande impulso dado nas estimativas dos diversos parâmetros genéticos e que formariam a base para o grande desenvolvimento de programas amplos de melhoramento genético tanto de gado de leite quanto de corte experimentado a partir dos anos 80. Outro enfoque bastante avaliado na década de 70 foram os cruzamentos, no caso dos bovinos, apesar de esses virem sendo alvos de estudo, como mencionado anteriormente, desde os anos 40, quando foram objeto de grande esforço do meio científico. Quanto aos caprinos o maior esforço só vem ocorrer a partir da década de 70. A grande contribuição da pesquisa na área de caprinos tem sido a identificação de tipos de cruzamentos mais adequados a diferentes sistemas de produção e o estabelecimento de critérios de seleção de reprodutores e matrizes. Vale ressaltar também o redirecionamento do enfoque da seleção estabelecido por alguns resultados de pesquisa. Na região Nordeste, maior produtora nacional de caprinos, as pesquisas com esses animais eram primariamente voltadas para produção de carne, e secundariamente, para produção de pele. A divulgação dos resultados supracitados e consequentemente o realinhamento da demanda, que passou a priorizar a seleção de animais de duplo propósito, resultou em aumento da eficiência de produção de proteína nos sistemas produtivos. A importância do melhoramento genético de ovinos é reconhecida há dezenas de anos no Brasil e os progressos obtidos possivelmente não são maiores, pela indefinição e falta de estruturação dos mercados de lã e carne. Com respeito ao melhoramento genético de búfalos, verifica-se que apesar de esses animais serem criados no Brasil há muito tempo, não tem havido um programa mais intenso de melhoramento genético nesta espécie. Apesar das iniciativas isoladas ocorridas desde a década de 50, elas envolviam, até os anos 80, populações pequenas e eram voltadas principalmente para produção de carne. Após esta data intensificaram-se os trabalhos, principalmente aqueles voltados para a produção leiteira e iniciaram-se as seleções com base na capacidade mais provável de produção das búfalas. Tais avaliações, em alguns casos isolados, evoluíram para o uso de modelos mistos com estimativas de BLUP e mais recentemente, para o uso de Modelo Touro e Modelo Animal. 2.1.1. Caracterização biológica e causas de variação e estimativas de parâmetros genéticos Para se proceder a correta adequação ao sistema de produção e desenvolver programas de cruzamentos eficientes é fundamental que se conheçam as vantagens e potenciais, bem como as desvantagens e limitações dos diversos grupos genéticos. Assim, tendo esse objetivo ‘’ comum, alguns trabalhos procuraram esclarecer diversos aspectos ligados à biologia de 7 diferentes raças. Tais trabalhos envolveram desde o conhecimento da curva de crescimento e taxa de maturidade até produção de leite, passando por informações sobre resistência a doenças e/ou parasitos e determinação de parâmetros genéticos para tais características. A importância dos efeitos dos diversos fatores de ambiente sobre o desempenho dos animais é bastante conhecida, e a estimativa de seus reflexos na produção e, principalmente, a possibilidade de que seus efeitos sejam levados em consideração, são necessários para se desenhar e se desenvolver programas de melhoramento genético eficientes e eficazes. Além disso, para que esses objetivos sejam alcançados tornam-se indispensáveis as estimativas dos parâmetros genéticos para as características de importância econômica. 2.1.2. Avaliação de raças e cruzamentos 2.1.2.1. Conversão alimentar, exigências nutricionais, utilização dos alimentos, avaliação de carcaças e resistência a parasitas Apesar do importante papel representado pelas raças puras adaptadas trazidas no início do período colonial, a introdução de raças européias em áreas tropicais, mesmo por meio de cruzamentos, traz consigo a necessidade de grandes modificações no manejo geral do sistema de produção. À não observação desses ajustes, ao longo do tempo, podem ser creditados os vieses que os mesmos vêm sofrendo, especificamente no que diz respeito ao gado de corte. Durante a primeira metade da década de 80 os cruzamentos, gado de corte, sofreram uma grande retração resultante da diminuição do interesse por parte dos criadores. Isso deveu-se, possivelmente, a problemas oriundos da orientação dada então às pesquisa e principalmente a problemas relacionados à transferência de tecnologia. Já no final dos anos 80, no entanto, houve uma recuperação da demanda juntamente com uma reordenação e reorientação das linhas de pesquisa. Assim, a perspectiva é que eles venham a se constituir em componentes cada vez mais importantes nos sistemas produtivos. Diversos trabalhos de pesquisa nas diferentes espécies têm evidenciado a contribuição dos cruzamentos para o incremento de produtividade. Todavia, independente do grupo genético, a demanda por aumento de eficiência faz com que haja necessidade de se otimizar todos os componentes do sistema produtivo. A alimentação por ser um dos principais elementos nesse processo merece uma atenção especial. Assim, é importante conhecer as diferenças existentes entre grupos genéticos quanto à capacidade de converter alimento em produto, bem como entender as diferenças existentes entre os diversos genótipos e suas capacidades em digerí-los. O conhecimento das exigências nutricionais dos animais é de fundamental importância para se conduzir uma atividade de forma econômica e competitiva. Nesse contexto, papéis preponderantes são exercidos pelas necessidades de proteína e de energia. Além disso, essas informações são extremamente importantes pois viabilizam a geração de um banco de informações sobre composição de alimentos utilizados no Brasil e sobre exigências nutricionais dos animais com as quais torna-se possível a confecção de uma tabela brasileira de composição química e de exigências nutricionais dos animais. Assim, diversos estudos têm sido conduzidos com o intuito de se conhecer as exigências nutricionais das diferentes espécies e grupos genéticos, de se determinar suas composições de ganhos de peso e de se avaliar as características das carcaças por eles produzidas. Dessa forma, é possível estabelecer combinações adequadas entre os diferentes alimentos e grupos genéticos. Essas linhas de trabalho só mais recentemente vêm assumindo importância, mas alguns importantes resultados já se encontram disponíveis. Para as cadeias produtivas envolvidas com produção e distribuição de carne existem, entre outras coisas, dois aspectos extremamente importantes a serem observados. O primeiro diz respeito à qualidade do produto, e o segundo à produtividade e quantidade de carne. Assim, faz- se necessário que se tenham métodos adequados para se promovertais estimativas ao mesmo tempo que se estabelecem conhecimento e tecnologias capazes de atender a essas demandas. Mais recentemente, a pressão para aumento da rentabilidade tem resultado em necessidade de redução do ciclo da pecuária de corte. Isso, leva à busca de animais mais precoces tanto no tocante à reprodução quanto ao acabamento de carcaça. Nesse aspecto, apesar de muito pouco ter sido feito, essa será uma linha de pesquisa de grande avanço no médio prazo. A busca do equilíbrio entre ambiente e genótipo animal, para as condições tropicais, requer preocupação constante com o item adaptabilidade. Dentre as características mais importantes no tocante à adaptação às condições tropicais podem-se destacar a resistência a carrapatos, mosca-dos-chifres e helmintos e a tolerância ao calor. Embora grande parte do efeito desse estresse possa ser minimizado, seu controle está comumente associado a aumentos dos custos de produção. Além disso, certas medidas de controle dos parasitas internos e externos requerem uso, muitas vezes intensivo, de produtos químicos, os quais têm, cada vez mais, se constituído em uma grande preocupação da sociedade, tanto pelos problemas de possíveis resíduos no produto final quanto pela contaminação do meio ambiente. Como preocupação adicional pode-se 8 mencionar a capacidade de resistência apresentada por esses parasitas aos agentes químicos utilizados em seus controles. Assim, alguns trabalhos de melhoramento genético têm considerado o aspecto de resistência/tolerância a parasitos. 2.1.2.2. Produção de leite A produção de leite, mesmo para animais cuja exploração econômica principal é a carne, se constitui em um item de fundamental importância uma vez que ela está relacionada com outras características de grande importância econômica como habilidade materna e desenvolvimento da progênie até a desmama. Além disso, produções de leite em níveis adequados garantem boa uniformidade da progênie o que resulta em melhor valor de mercado e desenvolvimento pós- desmama mais eficiente. Assim, essa característica tem assumido importância crescente nos programas de melhoramento genético e vários trabalhos têm sido desenvolvidos com o intuito de avaliar os efeitos da produção leiteira sobre o desempenho do sistema de produção. 2.1.2.3. Efeito do tamanho do animal O tamanho do animal, também referido como “tipo” animal, tem repetidamente sido objeto de atenção dos técnicos e criadores de gado de corte. Durante a década de 40, até início dos anos 50 a orientação era o desenvolvimento de animais compactos de pernas curtas e precoces. No entanto, em meados dos anos 50, com o alastramento do gene “anão” que trouxe como conseqüências, sensíveis reduções na produção, a orientação segue tendência diversa. A partir de então, com o acúmulo de informações indicando que animais maiores ganham peso mais rapidamente e possuem maior eficiência alimentar, a busca desse tipo de animal se intensificou. Mais recentemente, no entanto, a questão tamanho vem sendo colocada na berlinda, agora sob a égide da eficiência de produção. É importante enfatizar que a procura pelo tipo ideal não é balizada unicamente pela estética, mas também, e principalmente, pela necessidade de se fazer da atividade um negócio rentável. Essa preocupação apesar de recorrente tem sido, mais recentemente, objeto de grandes discussões e de importantes linhas de pesquisa no Brasil. 2.1.3. Programas de avaliação genética A avaliação genética vem se constituindo, no Brasil, em uma demanda crescente. Essa é uma área que tem ultimamente recebido grandes contribuições metodológicas no sentido de viabilizar estimativas mais acuradas do valor genético dos animais. Ao mesmo tempo, essas metodologias tendem a ser mais simples, ou pelo menos mais fáceis de serem manuseadas, com menor demanda computacional e menor custo. Nesse sentido, o desenvolvimento ou adaptação e/ou avaliações e comparações de metodologias bem como sua utilização se constituem em ferramentas indispensáveis ao progresso genético dos diversos grupamentos genéticos das diversas espécies de ruminantes. Avaliações comparativas importantes foram conduzidas por TORRES JÚNIOR et al. (1997). Enquanto programas de simulação auxiliares em estudos de avaliação de métodos alternativos de seleção bem como de estimação de componentes de variância foram desenvolvidos por MARTINS et al. (1997). LOPES et al. (1995), por outro lado analisaram as dificuldades computacionais quando da utilização da metodologia de modelos mistos em modelos multivariados. Todos esses avanços e as conseqüentes reduções de necessidades computacionais têm contribuído naturalmente para o direcionamento de esforços concentrados de produtores, empresas e técnicos dispostos a promoverem o avanço genético dos diferentes grupos genéticos. Como resultado observa-se a formação de vários grupos ou programas voltados para avaliação e seleção de animais destinados, em última instância, à melhoria da produtividade. Os critérios de seleção utilizados nos diversos programas são definidos em função das metas e objetivos de cada um, sendo as regras gerais estabelecidas pelo Ministério da Agricultura. Dentre esses programas podem ser mencionados, para gado de corte, o Programa de Melhoramento Genético da Raça Nelore, sob a coordenação da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto; o Programa Nacional de Melhoramento Genético de Zebuínos, coordenado pela ABCZ; o Programa de Melhoramento Genético do Gado de Corte de São Paulo; o Programa de Melhoramento Genético da CFM; o Programa de Melhoramento Genético da Natura; o GENEPLUS, Programa Embrapa de Melhoramento; o Programa de Melhoramento Genético da Granja Rezende; o Programa de Melhoramento Genético coordenado pelo grupo GENSYS consultores, e outros que têm sido formados principalmente após o lançamento do Certificado Especial de Produção (CEIP). Esse certificado tem por objetivos não só a melhoria genética do rebanho de corte nacional, mas também possibilitar que criadores, isolados ou organizados em grupos, de animais sem registro genealógico, ou mestiços, possam, desde que devidamente orientados e com um projeto 9 aprovado pelo Ministério da Agricultura e Abastecimento (MAA), emitir um documento que garanta a qualidade genética de seus animais. Com respeito ao gado leiteiro, a partir da década de 70, com base na opinião generalizada entre os especialistas de que o gado mestiço de Europeu-Zebu continuaria predominando nos sistemas de produção de leite por muito tempo, estabeleceu-se o Programa do Mestiço Leiteiro Brasileiro. Mais tarde, em 1985, foi estabelecida uma parceria entre a EMBRAPA e ABCGIL que viabilizou o início do Programa do Gir Leiteiro. Estes dois programas, ainda em andamento, são coordenados pelo Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Leite (CNPGL) da EMBRAPA. Além desses, existem outros programas em andamento, podendo ser citados o teste de touros da raça Holandesa, que é desenvolvido pela central de inseminação Lagoa de Serra e algumas cooperativas do Paraná, o Programa de Melhoramento Genético do Guzerá, coordenado pela Universidade Federal de Belo Horizonte, e ainda, o teste de progênie de touros Girolando com a participação de vários criadores e a associação de criadores da raça. Para os caprinos, hoje, além dos programas conduzidos em cooperação com instituições de pesquisa e universidades existem alguns sendo desenvolvidos por cooperativas como é caso do programa de melhoramento de caprinos da Copercana que tem como objetivo principal a melhoria da produção leiteira. No tocante aos ovinos existe, em nível nacional, um programa coordenado e gerenciado pela Associação Brasileira de Criadores de Ovinos (ARCO) que é o Serviço de Registro e Análise de Dados de Desempenho para AvaliaçãoGenética de Reprodutores Ovinos Lanados (SAGRO). Este serviço desenvolve um programa de avaliação e seleção que envolve três etapas, quais sejam: i) Avaliação individual comparativa dentro de grupo contemporâneo a nível de estabelecimento, ii) teste centralizado de desempenho de cordeiros das raças para carne, e iii) avaliação de carneiros pelo desempenho das progênies em centrais de teste. No caso dos búfalos, apesar de não haver um programa nacional de avaliação e seleção existem diversos trabalhos importantes sendo conduzidos especialmente nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Pará. Os resultados que vêm sendo obtidos por esses grupos têm revelado o grande potencial que essa espécie tem para produção de leite e carne no país. 2.2. Nutrição A alimentação se constitui em um dos elementos mais importantes dos sistemas de produção uma vez que esse item representa de 50 a 60% dos custos de produção das diferentes espécies de ruminantes criadas com finalidade econômica. Dessa forma, principalmente quando se prioriza eficiência, o componente nutrição assume importância fundamental na cadeia produtiva e por isso tem sido alvo de intensas pesquisas. Procurando equacionar os problemas criados pela alimentação inadequada e pelo custo, muitas vezes, incompatível de uma alimentação adequada várias linhas de pesquisa têm se destacado no Brasil. 2.2.1. Alternativa alimentar A identificação de alimentos alternativos aos principais grãos, milho e soja, tem, ao longo do tempo, ocupado importante espaço nas preocupações dos pesquisadores e dos produtores de modo geral. As razões para tal, apesar de se alternarem, segundo a origem, em estritamente financeira e competição com alimentação humana e de outros animais mais eficientes em sua utilização são, em última instância, sempre de ordem econômica. Vários trabalhos desenvolvidos ao longo dos últimos anos no Brasil têm possibilitado o uso dessas fontes alternativas sempre que as condições de mercado ou do sistema produtivo exigem ou favorecem sua utilização. Esses trabalhos podem ser classificados em duas categorias, uma composta por aqueles voltados para avaliação nutricional dos alimentos e outra, cujo enfoque principal é avaliar diretamente o desempenho animal. Para o segundo grupo, considerando-se bovinos de corte e de leite, a busca por alternativas alimentares eficientes e econômicas também tem sido uma norteadora das atividades de diversos pesquisadores. Dentre as opções para alimentação dos ruminantes outra possibilidade se caracteriza pelo estudo de alternativas de gramíneas/leguminosas para silagem, feno ou mesmo para serem diferidas e utilizadas como feno-em-pé. 2.2.2. Cinética de rúmen, taxa de degradação, taxa de passagem, tempo de retenção, digestão parcial dos alimentos e modificação da população microbiana A importância da racionalidade no uso dos alimentos, bem como o conhecimento da combinação ótima entre eles, tem orientado e exigido melhor entendimento do processo de sua utilização. Essa melhor compreensão que, em última instância, tem a finalidade de possibilitar o estabelecimento de uma alimentação mais apropriada, tem levado muitos pesquisadores a 10 desenvolverem trabalhos básicos que possibilitem que tais processos sejam mais bem conhecidos tanto para volumosos quanto para concentrados. Como parte complementar desses trabalhos, outros estudos são de fundamental importância para se otimizar o desempenho animal. Nesse caso podem ser destacados o conhecimento da ação da população microbiana sobre os diversos alimentos e o estudo de parâmetros ruminais. Ao lado disso, mais recentemente, surge a possibilidade de se obter melhoria na eficiência de utilização dos nutrientes ingeridos pela possibilidade de se modificar a flora microbiana. Outra área que vem assumindo grande relevância na busca de melhoria de eficiência é aquela relacionada aos aditivos. A preocupação em tornar a exploração animal uma atividade mais produtiva aumentando-se a relação entre aquilo que é investido e seu retorno em termos de desempenho, tem exigido não só a melhoria do desempenho per se, mas também que se tenha maior controle sobre tais desempenhos. Nesse campo, os avanços têm sido obtidos pelos estudos sobre aplicação de aditivos como hormônios protéicos, anabolizantes, antibióticos e ionóforos e suas implicações no metabolismo e no desempenho animal. 2.2.3. Avaliação de alternativas de suplementação alimentar A manutenção de níveis razoáveis de produção, tanto de carne quanto de leite, em condições de pastagens requer, além de um manejo adequado, que se forneça, pelo menos em parte do ano, uma suplementação alimentar para que os animais possam ter suas necessidades nutricionais atendidas. O período seco tem sido, ao longo dos anos, um dos principais nós górdios da pecuária tropical. O desempenho dos animais nesse período tem se constituído em um desafio, principalmente pela necessidade de que ela seja econômica. As soluções sugeridas apesar de dependerem, em parte, da espécie e do tipo de animal, se baseiam fundamentalmente, em três pontos principais, i) manejo adequado das pastagens, ii) suplementação e iii) confinamento/estabulação. Para todos eles a pesquisa brasileira tem procurado criar alternativas bioeconomicamente viáveis. Dentro da linha de trabalhos que buscam alternativas de suplementação em pasto, tanto para produção de carne quanto de leite, os estudos se dividem basicamente em avaliações de alternativas de suplementações com volumosos e com concentrados, e mais recentemente com a utilização das chamadas misturas múltiplas. Assim, trabalhos que buscam alternativas de suplementação alimentar de bovinos de leite e de corte em condições de pastejo vêm sendo conduzidos há muitas décadas no Brasil, e ainda hoje, esse é um tema que tem merecido atenção especial de muitos pesquisadores. Dentre as estratégias de utilização de suplementação volumosa grande destaque foi dado às avaliações de capineiras, à ensilagem e à fenação de gramíneas e leguminosas. Fontes alternativas de alimentação em confinamento também vem sendo avaliadas por diversos pesquisadores. Para que se possam estabelecer dietas adequadas para animais em confinamento, suplementação alimentar eficaz para animais em pastejo e/ou se proceda a um manejo ótimo de uma pastagem é de fundamental importância que se tenha uma boa estimativa de consumo. Apesar disso, poucos são os trabalhos desenvolvidos com a finalidade de se estimar o consumo por animais em pastejo. Nesse sentido, tornam-se também relevantes os estudos sobre a eficácia dos diferentes indicadores. Assim, o desenvolvimento e/ou a validação dos indicadores disponíveis, sob diferentes situações, se constitui em uma atividade necessária. 2.2.4. Nutrição mineral A deficiência de alguns nutrientes importantes em grande parte dos solos brasileiros, principalmente naqueles destinados ao desenvolvimento de sistemas de produção de ruminantes, fazem da nutrição mineral um importante componente para produção e produtividade. Nesse contexto, vários estudos foram desenvolvidos no sentido de se determinar as deficiências mais relevantes nas pastagens brasileiras., de se buscar alternativas de fontes desses elementos, de se avaliar as inter-relações existentes entre os minerais no solo, planta e tecido animal, bem como de se buscar a forma mais eficiente de fornecimento, ou seja, usar fontes com maior disponibilidade do elemento mineral em avaliação. Vale ressaltar que o elemento mineral que mais limita a produção no Brasil é o fósforo, o que faz com que esse elemento receba grande atenção por parte dos pesquisadores. 2.3. Forrageiras As pastagens se constituem na fonte de alimento mais importante para a produção de ruminantesno Brasil. Assim, o conhecimento dos potenciais em termos de quantidade e de 11 qualidade das diversas espécies, o estabelecimento do manejo adequado das mesmas e a busca de novas alternativas, se constituem nos principais pilares desse segmento. O desenvolvimento de métodos de avaliação de pastagens rápidos, baratos e precisos é de fundamental importância para experimentos de pastejo, principalmente, para aqueles de grande escala. Por isso, a busca de métodos mais eficientes, econômicos e práticos, desde há muito, tem sido uma constante entre os pesquisadores. 2.3.1. Produção e qualidade A produção e qualidade de uma forrageira são influenciadas pelo gênero, espécie, cultivar, fertilidade do solo, condição climática, idade fisiológica e manejo a que ela é submetida. Em conseqüência desse grande número de fatores faz-se necessário conhecer a quantidade de forragem produzida e sua qualidade para que se possam tomar decisões objetivas de manejo de maneira a maximizar a produção animal. Nesse aspecto, as várias contribuições oferecidas pela comunidade científica brasileira até 1987 foram compiladas por ROSTON e ANDRADE (1992). Esses autores construíram, com base nesses resultados, uma tabela de valor nutritivo e estabeleceram um índice de valor nutritivo para as forrageiras tropicais. No entanto, dada a importância das forrageiras e aos novos lançamentos de cultivares outros trabalhos mais recentes continuam a ser desenvolvidos. A digestibilidade da forragem é uma importante estimativa na determinação de seu índice de valor nutritivo. Pela sua importância e pela dificuldade de se ter estimativas de valores nutritivos in vivo, vários pesquisadores desenvolveram e propuseram equações para predição de digestibilidade de forragem baseadas em determinações químicas, em fermentação in vitro e no uso da relação de indicadores. Dentro dessa linha vários trabalhos brasileiros foram desenvolvidos no sentido de se verificar, e mesmo de se ajustar essas diferentes metodologias às condições e forrageiras tropicais A busca por maior eficiência na determinação da composição química levou a se utilizar a técnica de espectrofotometria de reflectância no infravermelho proximal. 2.3.2. Fertilidade de solo e nutrição de plantas A necessidade de expansão de fronteira no final dos anos 60, início dos 70 criou um desafio monstruoso para a pecuária brasileira. Nesse período foram de extrema importância os trabalhos voltados à identificação de forrageiras adaptadas às condições de solos pobres, principalmente aos solos de cerrado. A baixa fertilidade quase generalizada dos solos destinados à produção pecuária no Brasil tem criado um impasse ao aumento e à sustentabilidade da produção forrageira, bem como ao estabelecimento e/ou introdução de leguminosas nas pastagens. A questão econômica e a falta de resultados de pesquisa em adubação de manutenção para as diversas espécies e sistemas de produção sob pastejo têm sido importantes barreiras à utilização de fertilizantes nas pastagens. Na região dos Cerrados, por exemplo, o processo de degradação das pastagens requer ação urgente no sentido de se aplicar fertilizantes dada a queda observada na fertilidade resultante da falta de reposição de nutrientes. No entanto, vários foram e têm sido os estudos sobre resposta das forrageiras à adubação, principalmente, ao fósforo e ao nitrogênio, e especialmente, para leguminosas. Mais recentemente, essa necessidade tem se estendido para gramíneas. Estudos sobre os efeitos da adubação, principalmente avaliando fósforo, nitrogênio e potássio, sobre a produção de gramíneas e leguminosas foram conduzidos por diversos autores.. Nos últimos anos, especialmente, nos últimos cinco a dez, o uso de fertilizantes em pastagens tem se constituído em prática integrante de muitos sistemas de produção, pois essa é uma das alternativas capazes de contribuir para torná-los mais competitivos e sustentáveis. 2.3.3. Comportamento de pastejo O estabelecimento de manejo animal mais eficaz para utilização das forrageiras requer o conhecimento do comportamento de tais animais sob condições de pastejo. Várias são as características importantes de serem entendidas e estimadas com esse propósito. Dentre essas podem-se ressaltar o tempo e o ciclo de pastejo e o tamanho da bocada. Esses estudos são relativamente recentes no Brasil mas têm assumido importância cada vez maior. 2.3.4. Desenvolvimento de novas cultivares de gramíneas e leguminosas Dentro da filosofia de melhorar as condições nutricionais dos animais em pastejo procurando sempre possibilitar a ingestão de forragens de melhor qualidade mantendo-se uma relação benefício/custo adequada, a busca por novas opções tanto de gramíneas quanto de leguminosas tem sido objeto de várias pesquisas. 12 Esse enfoque tem recebido cada vez mais ênfase, principalmente após a introdução da Brachiaria no Brasil, mais especificamente, da Brachiaria decumbens cv. Basilisk, no Brasil Central Pecuário nos fins dos anos 60, início dos 70. A introdução dessa forrageira, por ter revolucionado a pecuária em toda a região dos cerrados foi, sem dúvida, a principal razão do grande incentivo que vem sendo dado à melhoria genética dos materiais forrageiros. A busca de novas opções forrageiras tem sido uma atividade que, ao longo dos anos, vem sendo desenvolvida por diversas instituições de pesquisa do país, e os resultados desse esforço podem ser observados diretamente nos sistemas de produção pelos seus reflexos nos incrementos de produtividade do setor pecuário de modo geral. Podem ser mencionados como resultantes desses esforços o lançamento de diversas cultivares de gramíneas e leguminosas ocorridos nos últimos anos, e que hoje encontram-se, em maior ou menor proporção, incorporadas aos sistemas de produção de Norte a Sul do país. Assim, tem-se como exemplos de cultivares liberadas para o mercado, para os diversos gêneros, as seguintes: para o gênero Panicum: Tobiatã, Centenário e Centauro lançadas pelo Instituto Agronômico de Campinas; Aruana pelo Instituto de Zootecnia de São Paulo; e Vencedor, Tanzânia e Mombaça pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), respectivamente, por meio de duas de suas unidades: Centro de Pesquisa Agropecuária dos Cerrados (CPAC) e Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Corte (CNPGC). Com respeito ao gênero Brachiaria destacam-se a cultivar Marandu lançada pelo esforço conjunto do CNPGC e CPAC e a cultivar IAPAR 56 lançada pelo Instituto Agronômico do Paraná. Para o gênero Andropogon: as cultivares Planaltina, resultado do trabalho desenvolvido pelo CPAC e a cultivar Baeti, oriunda de outra Unidade da EMBRAPA, o Centro de Pesquisa Pecuária do Sudeste (CPPSE). Para o gênero Pennisetum pode-se mencionar a cultivar Pioneiro colocada no mercado também pela EMBRAPA, por meio do Centro Nacional de Pesquisa de Gado de Leite (CNPGL). Dentre as leguminosas podem-se exemplificar as novas opções citando-se, dentre as cultivares de Stylosanthes, a Pioneiro e a Bandeirantes oriundas do CPAC e a Mineirão resultante do trabalho conjunto entre CPAC e CNPGC. Para o gênero Desmodium pode-se citar a cultivar Itabela que foi um lançamento da Comissão Executiva de Pesquisa da Lavoura Cacaueira (CEPLAC). No que se refere a gramíneas e leguminosas temperadas e/ou espécies que apresentam desempenhos adequados sob às condições do Sul do país, podem ser mencionadas as cultivares de diversos gêneros como, Hemarthria, Lolium, Festuca, Bromus, Phalaris, Trifolium, Cajanus e Dactylis que dentre outros, foram colocadas à disposição dos sistemas de produção pelas estações experimentais dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Nas regiões norte e nordeste também existem exemplos de novas opções forrageiras de diferentes gênerosde gramíneas e leguminosas como: Leucaena, Cenchrus, Desmodium, Pueraria e outros. O critério de seleção e as características orientadoras dos cruzamentos são, em parte, dependentes do ecossistema, do gênero em foco e do objetivo-fim do programa de melhoramento genético. Assim, apesar de produção e produtividade serem essenciais, outros parâmetros são importantes nesse processo de desenvolvimento de novas cultivares. Além dos aspectos de qualidade nutricional, tem-se dado grande ênfase à características como boa distribuição estacional da produção, distribuição geográfica e resistência à doenças e a parasitas. Esse enfoque tem se constituído em preocupação recorrente daqueles envolvidos com avaliação forrageira e consta de diferentes programas de seleção e melhoramento genético dessas espécies no Brasil. 2.3.5. Manejo de pastagens O manejo adequado das pastagens se constitui em um dos elementos fundamentais para que se consiga incrementar os níveis de produção animal. Estudos sobre fisiologia da forrageira e suas relações com manejo são de importância fundamental para o entendimento dos níveis de produção das pastagens e consequentemente para o estabelecimento de sistemas de produção mais produtivos e eficazes. Nesse contexto, várias são as contribuições dos pesquisadores brasileiros. O estabelecimento de pastagens é um componente fundamental ao sucesso do empreendimento. Nesse sentido, vários trabalhos foram desenvolvidos procurando, para as diversas espécies e cultivares, estabelecer entre outros, aspectos importantes como: métodos de plantio, densidade e profundidade de semeadura. Ainda como importante componente do sistema formado pelas pastagens pode-se mencionar o manejo para produção de sementes. Várias são as alternativas de manejo disponíveis para incremento de produção e produtividade. Dentre essas as mais importantes são taxa de lotação, pressão de pastejo e período de ocupação. Por isso, vários trabalhos têm sido conduzidos avaliando essas variáveis e suas interações com níveis variados de fertilização. Outra forma de se solucionar o problema de deficiência alimentar no período seco tem sido o uso de forrageiras de inverno e/ou que são capazes de se desenvolverem durante o período seco. 13 Ainda como forma alternativa de se contornar o problema de baixa qualidade das gramíneas forrageiras tropicais tem sido, ao longo do tempo, desenvolvido vários estudos na tentativa de se estabelecer consorciações entre estas e leguminosas. Tais estudos buscam desde entender as relações entre essas duas espécies vegetais até a avaliação de desempenho animal, passando por estudos de manejo que procuram viabilizar essa combinação. A busca por adequação dos níveis de produção à capacidade de sustentação do ecossistema, dentro da filosofia de estabelecimento de sistemas de produção sustentáveis, tem contribuído para que ainda hoje e, certamente ainda por muito tempo, se estude formas economicamente viáveis de exploração das pastagens nativas, uma vez que grande parte da produção de ruminantes, nas mais diversas regiões do Brasil, é realizada sobre essas pastagens. Dada a importância dessa fonte de alimentação vários estudos foram e vêm sendo realizados com o intuito não só de caracterizar, mas também de procurar estabelecer manejos que possibilitem melhor aproveitamento dessas áreas. 2.4. Modelagem e simulação de sistemas A área de simulação de sistemas, quer seja o desenvolvimento de modelo quer seja sua utilização para orientação da pesquisa, ou mesmo para orientação na tomada de decisão em sistemas reais, tem recebido pouca contribuição no Brasil ao longo dos anos. Essa, todavia, é uma área que certamente sofrerá grande impulso nesse início de século, uma vez que crescem as necessidades de se reduzirem custos e de se dar maior objetividade às atividades de pesquisa e de produção. Além disso, estabelece-se a consciência da importância de se promover avaliações globais, que sejam mais representativas dos sistemas de produção reais, ou mesmo que envolvam mais segmentos da cadeia produtiva respectiva. 3. DESAFIOS IMPORTANTES A SEREM SUPLANTADOS Se a SBZ, ao ser constituída, teve como objetivo principal a criação de um fórum onde pudessem ser discutidas as questões científicas e os rumos da zootecnia no país, hoje ela tem um papel muito mais amplo. Ela deve ser capaz de viabilizar a criação de mecanismos que possibilitem o estabelecimento de diretrizes para que a zootecnia brasileira consiga se inserir de forma definitiva no mercado mundial dos diferentes produtos, ao mesmo tempo que garanta alimentação de qualidade a preços competitivos, no Brasil. Vale ressaltar que essa competitividade tem de ser alcançada em cadeias produtivas bioeconomicamente sustentáveis e socialmente justas. Isso quer dizer que não só os sistemas de produção, mas também os demais segmentos, devem estar preocupados com itens como saudabilidade dos alimentos produzidos, manutenção dos recursos não-renováveis, bem-estar social, aumento de participação no mercado externo e melhoria da equidade social. É nessa ótica, ou seja, sob a influência das diversas variáveis e forças externas é que as cadeias produtivas se estabelecerão. Dentre essas forças destacam-se, quatro grandes grupos. O primeiro é constituído pelas forças inerentes ao sistema de produção, e se refere à melhoria da eficiência produtiva; o segundo, compõe-se pelas variáveis de mercado e é capitaneado pela competitividade e pelo atendimento das demandas do consumidor; o terceiro, é formado pelas imposições relacionadas ao meio ambiente e diz respeito tanto ao sistema de produção, no sentido de produzir de forma sustentável, quanto às indústrias no tocante à não poluição e à produção de alimentos saudáveis; e o último que lentamente começa a se instalar e ganhar força, engloba o indivíduo no contexto global. Nesse caso, requer-se progresso com desenvolvimento social, crescimento com melhoria da distribuição dos ganhos e preocupação com o bem-estar individual e coletivo. A análise da conjuntura atual e do cenário que se descortina frente a esse movimento de globalização que se vê recrudescido nos últimos anos possibilita inferir-se que a produção agropecuária deverá ser conduzida com visão de agronegócio, até porque esse é o macro segmento da economia onde se consegue oferecer empregos a baixo custo e ao mesmo tempo que é capaz de fixar o homem no campo. Além disso, ele viabiliza a permanência de indivíduos nas regiões de origem. É importante ainda ressaltar que um emprego no campo corresponde a três outros ao longo da cadeia produtiva. Como pode ser claramente percebido a inserção definitiva da produção de ruminantes na economia brasileira no próximo milênio está ameaçada por forças que para serem suplantadas exigem a superação de desafios de diferentes ordens, sendo que os mais importantes podem ser classificados, segundo a origem, em de pesquisa (desenvolvimentos científico e tecnológico), políticos e mercadológicos. 3.1. Desafios para a pesquisa Para as pesquisas dentro do sistema de produção é importante ressaltar que além de se buscar eficiência no ambiente produtivo real, o enfoque sistêmico também se faz necessário pela imposição crescente de se diminuir gastos, uma vez que os recursos para pesquisa tornam-se 14 cada vez mais escassos. Assim, os trabalhos devem ser, sempre que possível, conduzidos de maneira interdisciplinar o que muitas vezes significa também dizer interinstitucional. Nesse aspecto, vale ressaltar a preocupação e sugestão fornecida por EUCLIDES FILHO (1998). Esse autor sugeriu que maiores eficiências tanto da pesquisa quanto dos sistemas de produção seriam alcançadas se houvesse um esforço integrado para o desenvolvimento de ações conjuntas envolvendo o melhoramentogenético. Ele sugere que tais esforços fossem feitos juntamente com outras áreas do conhecimento, especificamente, áreas como nutrição/alimentação, reprodução, fisiologia e biologia molecular, para o desenvolvimento de estudos, basicamente de seleção, que possibilitem promover: i) mudança da curva de crescimento, ii) mudança no nível de ingestão de alimentos, iii) incremento da taxa de maturidade, iv) redução de taxa metabólica ou na energia necessária para mantença, e v) mudança na capacidade de perdas calóricas. Ainda segundo esse autor, tais estudos deveriam ter seus efeitos e suas interações com outras características economicamente importantes avaliados, e serem auxiliados pelas novas biotécnicas, principalmente, no que diz respeito à identificação de marcadores genéticos associados a tais características. Outro aspecto importante é a necessidade premente de se promover modificações nos diversos segmentos das cadeias produtivas como forma de garantir a oferta de produtos de qualidade, ou que atendam às expectativas do consumidor. No curto prazo isso possivelmente seja equivalente a dizer que se faz necessário: i) a produção de alimentos com baixos teores de gordura, especialmente, alguns ácidos graxos saturados e colesterol; ii) a capitalização nos benefícios potenciais de outros como linoleico-2 (Trans 18:2), ou ácido linoleico conjugado (CLA); iii) o desenvolvimento de estudos mais profundos sobre esses ácidos para compreender melhor seus metabolismos; iv) o conhecimento das composições lipídicas dos diversos genótipos animais; v) o conhecimento dos efeitos do manejo alimentar sobre essas composições; e vi) a capitalização na possibilidade de se ter os produtos chamados nutracêuticos. Para a pecuária de corte, em particular, há necessidade de se intensificarem estudos integrados no sentido de se reduzir o ciclo de produção e aumentar a maciez da carne. Esse último quesito tem sido identificado como sendo a característica organoléptica de maior importância dentre aquelas relacionadas à qualidade da carne. Quanto à redução do ciclo, essa se constitui em uma das alternativas mais importantes no sentido de tornar a atividade de produção de carne bovina em um negócio rentável. A antecipação do início da vida reprodutiva e o abate de animais jovens são importantes não só pelo impacto positivo direto no resultado econômico do sistema de produção, mas também por se constituírem em molas propulsoras de um avanço muito mais amplo. A produção do chamado novilho precoce facilita e induz a reflexões profundas que envolvem não só os sistemas de produção, mas principalmente, todos os outros segmentos da cadeia produtiva da carne bovina, inclusive o consumidor final. Ainda que para qualquer das espécies de ruminantes de maior importância econômica hoje no Brasil os grandes entraves e demandas sejam semelhantes, nem sempre a forma de enfocá- los pode ser a mesma, ou mesmo, possuem a mesma escala de prioridades. Enquanto a caprinocultura tem, aparentemente, na produção leiteira sua alavanca no que diz respeito à possibilidade de desenvolvimento e expansão, a ovinocultura, deverá encontrar essa âncora na produção de carne. A bubalinocultura, por outro lado, à semelhança do que ocorre com a bovinocultura, deve se fortalecer pela utilização combinada e complementar da produção de leite e de carne. Essa complementaridade diz respeito não só pelo fato de as duas atividades serem importantes nessa espécie, mas também pelo fato de o búfalo ser um animal que complementa bastante bem o bovino no que se refere ao ambiente de criação, ou seja, ecorregião ou sistema de produção. Em síntese, a pesquisa com ruminantes no Brasil deverá ser conduzida com o foco em um cenário que possibilita vislumbrar o país com uma produção animal eficiente e competitiva que atenda às expectativas do consumidor brasileiro, nos aspectos de qualidade e preço, ao mesmo tempo que se insere de forma definitiva no mercado mundial. Isso apesar de exigir a continuidade dos esforços no desenvolvimento científico requer que haja um equilíbrio muito bem estabelecido dessas atividades com aquelas voltadas para o desenvolvimento tecnológico e para produção. Ademais, é importante buscar formas de garantir que grande parte do desenvolvimento seja conduzido com visão global, ou seja, ele deve estar sedimentado em um enfoque sistêmico. E sempre que possível os dados devem ser coletados de modo a possibilitar análise econômica e/ou a contribuírem para alimentação de modelos de simulação, pois a avaliação da eficiência de determinada tecnologia no contexto global passará a ser medida de importância vital. Para isso, grande ênfase deverá ser dada às ações interdisciplinares e interinstitucionais. 3.2. Desafios para decisões políticas Parece bastante claro que não será possível promover uma produção animal forte sem garantir a rentabilidade do negócio. Dessa forma, é importante que os pesquisadores, professores e técnicos, se não como profissionais isolados, como associações de classe e/ou científica, e aqui é de fundamental importância a Sociedade Brasileira de Zootecnia, se articulem 15 para que possam interferir e contribuir na formulação de políticas de governo, no estabelecimento e desenvolvimento adequados tanto dos sistemas de produção quanto dos demais segmentos das cadeias produtivas. Nesse aspecto, é vital o estabelecimento de uma política nacional de incentivo à recuperação de imensas áreas de pastagens que se encontram degradadas ou em processo de degradação no país. Sem uma atitude ampla nesse sentido, dificilmente o setor de produção de ruminantes poderá assumir a importância que lhe é devida no agronegócio brasileiro. Deve ser também preocupação desses profissionais que haja ampla divulgação e principalmente, que sejam exercitadas as recomendações existentes nos mapas de aptidão agrícola para as diversas regiões do país; devem também envidar esforços para que sejam concluídos os trabalhos de zoneamento agroecológico, de modo a subsidiar a exploração racional de acordo com os potenciais de produção. É importante ainda, a participação efetiva na promoção de fóruns, que tenham como objetivo o estabelecimento de prioridades adequadas às diferentes situações. À todos cabe ainda, a divulgação de informações científicas, técnicas e tecnológicas relevantes para estabelecimento de imagens positivas, para os diversos produtos, junto a sociedade em geral, com o intuito de se aumentar o consumo. Por último, é fundamental que se atue, junto ao consumidor, no sentido não só de identificar suas preferências e estabelecer o perfil do consumidor brasileiro enquanto consumidor de produtos de origem animal, mas também com o intuito de esclarecer sobre os benefícios de sua utilização em uma alimentação equilibrada e saudável. Outro grande desafio a ser enfrentado no campo político refere-se ao crescimento desenfreado da oferta de produtos clandestinos, especialmente, carne e leite bovinos. Esses dois últimos itens, além das ações políticas e fiscais necessárias à sua solução, podem ser utilizados como elementos importantes nas ações de marketing em ações focando a saúde da população. 3.3. Desafios para ações de marketing Apesar de “marketing” se caracterizar por uma amplitude imensa de ações que envolvem desde a identificação de problemas e de demandas, estudos de mercado até satisfação de clientes passando inclusive, por distribuição de produtos, procurar-se-á, no caso presente, enfocar somente os aspectos de prospecção e priorização de demandas junto à sociedade consumidora e demais componentes das cadeias produtivas, bem como nas atividades de venda de imagem dos diversos produtos. Assim, fica claro que as ações de “marketing” são responsáveis pelas conexões entre as diversas atividades de um modelo de pesquisaestabelecendo dessa forma, uma via de mão dupla entre as demandas/problemas e as soluções, cumprindo ainda o importante papel de garantir o sucesso da última fase do modelo de pesquisa qual seja produção/comercialização. Se para algumas cadeias produtivas como a da carne bovina e a do leite e derivados a situação é difícil, para aquelas representadas pelos ovinos, caprinos e búfalos o esforço dos diversos atores do processo produtivo tem sido ainda maior. Nesses casos, além dos problemas inerentes à política e à pesquisa, há necessidade de modificar uma cultura de baixo consumo de produtos oriundos dessas espécies. Como exemplo da importância do hábito alimentar e cultura gastronômica sobre o consumo pode ser mencionado o que ocorre com carne de búfalo. Vários trabalhos sugerem a existência de volumes razoáveis de comercialização, em diferentes regiões do país, de carne dessa espécie como sendo de carne bovina. Apesar disso, existe espaço para colocação de carne em alguns estabelecimentos nos grandes centros urbanos e em alguns restaurantes. Isso tem sido conseguido principalmente graças ao esforço combinado de produtores de búfalos em programas que garantem o fornecimento de produtos de boa qualidade e aparência agradável. O queijo tipo muzzarela tem também, por outro lado, se mostrado um importante elemento de divulgação dessa espécie. Esse produto vem ocupando espaço cada vez maior não só em lojas especializadas, mas também em supermercados. A caprinocultura também se constitui em bom exemplo da necessidade de se procurar criar espaço e encontrar o nicho adequado ao desenvolvimento da atividade. Esse setor só iniciou um processo de franco crescimento a partir do momento em que optou pela ênfase na produção leiteira. Nesse contexto, fica claro que um caminho interessante a se seguir pode ser a busca por produtos diferenciados. Essa apesar de ser uma linha que deve ser seguida por todas as espécies, pode, para essas últimas, representar a solução imediata. Além disso, faz-se necessário conhecer bem qual o papel cada uma pode representar no contexto geral da produção e qual é a melhor forma de se alcançar maior aceitação no mercado. O búfalo apesar de apresentar bons desempenhos em condições intensivas de produção se constitui em uma excelente alternativa de produção de alimento, carne e leite, à baixo custo. Isso se deve principalmente à sua grande capacidade de utilização de alimentos grosseiros com grande eficiência, o que faz dele uma opção também para áreas marginais incluindo aquelas passíveis de alagamento. O ovino, na região Sul, é componente natural de sistemas de produção de bovinos de corte onde participam otimizando a interação bovino-ovino. 16 Todavia, é importante salientar que esses progressos só são possíveis quando são respaldados por informações científicas e/ou tecnológicas e que as constantes modificações, especialmente as sociais e econômicas, exigem da pesquisa ajustes e desenvolvimentos contínuos. 4. SUPERANDO OS DESAFIOS O futuro das pesquisas voltadas para a produção de ruminantes é função direta da importância que esses animais tiverem para a economia do país, para sua inserção no mercado internacional e para o seu desenvolvimento social. É fácil perceber que os desafios são enormes e para enfrentá-los, e principalmente, vencê-los de forma eficiente faz-se necessário que se estabeleçam algumas diretrizes e estratégias. É importante portanto, que essas sejam definidas de modo a viabilizar cadeias produtivas que sejam competitivas. Para contribuir para essa discussão serão fornecidas algumas sugestões, que mesmo estando mais relacionadas à pecuária de corte podem servir de orientação e base para aprofundamento das discussões tanto da própria cadeia da carne bovina, quanto daquelas que envolvem as demais espécies e produtos. Além de estratégias gerais, tais sugestões são classificadas quanto à ênfase necessária para sua implementação em ações de desenvolvimento, políticas e de pesquisa. 4.1. Estratégias - Usar a experiência de alguns frigoríficos e laticínios, representantes do comércio varejista, de supermercados e de alianças mercadológicas, para auxiliar o engajamento maior e mais eficiente de maior número de atores nesse processo; - Transferir de forma ampla, orientada e coordenada, tecnologias que garantam maior produtividade do setor; - Estabelecer sistemas de produção pilotos, em áreas estratégicas, para servirem como pólos de difusão tecnológica; - Disponibilizar informações sobre o mercado dos diferentes produtos associados ao perfil dos consumidores com suas prefrências e demandas; e - Implementar ações setoriais dirigidas para o aumento da competitividade. 4.2. Diretrizes relacionadas a ações de desenvolvimento - Viabilizar a transferência efetiva dos conhecimentos e tecnologias disponíveis para os diversos sistemas de produção; com ênfase em: - Melhoramento genético - Nutrição - Manejo de pastagens - Saúde animal - Qualificar, por meio de treinamentos/cursos, mão-de-obra dos diversos segmentos das cadeias produtivas, envolvendo desde as atividades de lida com o animal, coleta de dados, manejo e tratos sanitários, e gerenciamento de propriedade rural; passando pela administração de frigoríficos e laticínios, manuseio e preparo dos produtos intermediário e final, até a estruturação do segmento de varejistas; - Garantir a erradicação/redução de doenças impeditivas de exportação de carne in natura, com ênfase prioritária no combate à aftosa; - Desenvolvimento de estratégias de controle integrado de parasitas e/ou doenças, de forma a garantir maior produtividade e maior qualidade do produto final; - Desenvolver uma campanha de esclarecimento e incentivo à melhoria tanto do produto final quanto de subprodutos como o couro; - Desenvolver uma campanha de esclarecimento sobre a qualidade nutricional dos produtos de origem animal e da importância de se ter uma alimentação saudável; - Viabilizar o entendimento entre os diversos segmentos das diversas cadeias produtivas; - Viabilizar a estruturação de frigoríficos e indústria de laticínios de pequeno/médio porte, com base em estudos de viabilidade econômica, para que os produtores possam agregar valor aos produtos; e - Criar mecanismos que possibilitem de forma ágil, o acesso a informações gerais sobre mercado, estatísticas, índices zootécnicos, preços, custos etc. 4.3. Diretrizes relacionadas à decisões políticas Treinar/retreinar os profissionais da assistência técnica para transferência de tecnologia e acompanhamento dos sistemas de produção; Fortalecer/implementar parcerias que garantam a transferência efetiva de tecnologias para os diferentes segmentos da cadeia da carne bovina; Estabelecer efetivamente o sistema de classificação e tipificação de carcaça; 17 Promover incentivos a programas e sistemas de produção que exercitam a integração lavoura e pecuária; Promover incentivos a programas e sistemas de produção que exercitam a integração entre as pecuárias de leite e corte; Adotar medidas capazes de coibir o grande volume de abates de animais e de e produção de leite clandestinos; Promover redução/eliminação das taxas de exportação; Promover revisão da carga tributária e das taxas de juros; Apoiar a implantação/adequação do parque industrial da carne e do leite; Implementar a aplicação da portaria 304/96; e Desenvolver programas para venda de imagem dos produtos de origem animal, dando ênfase, quando for o caso, aos mercados externos. 4.4. Diretrizes relacionadas à pesquisa Buscar alternativas tecnológicas capazes de garantir a produção carne, leite e derivados de qualidade de forma contínua e uniforme durante o ano todo; Desenvolver estudos para