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fevereiro 2006 • Revista RI • 1 umárioS Rua 15 de Novembro, 233 / 4º andar 01013-001 - São Paulo, SP Tel.: (11) 3106-1836 • Fax: (11) 3106-1127 Homepage: www.ibri.com.br • Email: ibri@ibri.com.br CONSELHO Presidente: João Pinheiro Nogueira Batista Vice-Presidente: Leonardo Dutra de Moraes Horta DIRETORIA EXECUTIVA Presidente: Geraldo Soares Vice-Presidente: Marco Geovanne Tobias da Silva Vice-Presidente - SP: Luiz Henrique Valverde Vice-Presidente - RJ: Elizabeth Piovezan Benamor Vice-Presidente - MG: Bruno Seno Fusaro Diretor Financeiro: Marco Antonio de Almeida Panza Diretor de Comunicação: Raul Adalberto de Campos Diretora de Desenvolvimento Profissional: Natasha Nakagawa Diretor Secretário: Henrique Gonçalves Bastos www.revistari.com.br Os artigos aqui publicados não pretendem induzir a nenhuma modalidade de investimento. Os dados e reportagens são apurados com todo rigor, porém não devem ser considerados perfeitos e acima de falhas involuntárias. Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores. É proibida a reprodução deste volume, ou parte do mesmo, sob quaisquer meios, sem autorização expressa da IMF Editora. Nº 96 • FEVEREIRO 2006 Uma publicação mensal da IMF Editora Ltda. Av. Erasmo Braga, 227 - Grupo 404 20020-000 - Rio de Janeiro, RJ Tel.: (21) 2240-4347 • Fax: (21) 2262-7570 Email: ri@imf.com.br Diretor Editorial Ronnie Nogueira • Editor Internacional William F. Mahoney • Projeto Gráfico Acorde Visual • Editor Responsável Ronaldo A. da Frota Nogueira • Associada ao OPINIÃO ESTRATÉGIA SUSTENTÁVEL POR FERNANDO TIBECHRANI SALGADO EM PAUTA EBITDA QUAL O REAL VALOR DESSA MÉTRICA? POR RUBENS MARÇAL SERÁ ESSE UM BOM INDICADOR PARA GESTÃO FINANCEIRA NAS EMPRESAS? POR OSCAR MALVESSI CÁLCULO DO EBITDA GERA POLÊMICA NO MERCADO POR ANA BORGES CELEUMAS CONTÁBEIS POR FERNANDO G. CARNEIRO SUSTENTABILIDADE É RECOMENDÁVEL UMA PADRONIZAÇÃO DE INDICADORES? POR ROBERTO GONZALEZ MELHORES PRÁTICAS NOVA RESPONSABILIDADE DO RI: ADMINISTRAÇÃO DE RISCOS POR WILLIAM F. MAHONEY TARGETING QUEM É O SEU ACIONISTA? POR EDUARDO WERNECK IBRI NOTÍCIAS FOCO NA ATUALIZAÇÃO E VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL IBRI: NOVO PLANO DE GESTÃO PERFIL ROBERTO TRACANELLA CONSULTOR DA GLOBAL RI POR MARION MONTEIRO ENFOQUE INFLUENCIANDO OS ANALISTAS POR WILLIAM F. MAHONEY MERCADO DE ADRS COTAÇÕES POR THE BANK OF NEW YORK DISCLOSURE NOTÍCIAS 2 22 26 28 32 6 11 13 16 19 20 5 31 14 4 • Revista RI • fevereiro 2006 ESTRATÉGIA SUSTENTÁVEL Em 1980, Michael Porter definiu, em seu livro “Estratégia Competitiva”, que a análise competitiva das empresas podia ser analisada através de cinco forças de mercado: o poder de barganha com os fornecedores e com os clientes, o nível de rivalidade da concorrência, os novos entrantes e os produtos substitutos. por Fernando Tibechrani Salgado* Foi uma forma muito bem estruturada de se fazer uma análise estratégica e que revolucionou para sempre as práticas de negócio. Depois de Porter, muitos modelos sur- giram, sempre mantendo, de alguma for- ma, uma linha mestra referente a ele. Nos anos 90, com o surgimento de novas prá- ticas de gestão, o modelo foi evoluindo e acompanhando estas mudanças. O “po- der de barganha com fornecedo- res e clientes” evoluiu para Supply Chain Management , buscando ganhos na cadeia des- de o fornecedor até o consumi- dor final. Consumidor este que precisou ser mais bem entendido, mesmo pelos produtores de ma- téria prima. A explosão dos programas de terceirização das empresas, vi- sando focar as atividades no Core Business, incorporou ao conceito o relacionamento e de- senvolvimento dos fornecedores de serviço, indo de “poder de barganha” para “parceria”. O avanço da tecnologia fez surgir vários entrantes, produtos e serviços. A concorrência con- tinuou se acirrando e muitos M&As aconteceram mudando a conduta do mercado. Porém os desafios que nos esperam no século XXI são ainda mais complexos do que estes. O cenário atual de negóci- os, para as empresas que têm objetivos de longo prazo, já apresenta a necessida- de de se tratar, de forma integrada a esta visão puramente econômica, os aspectos ambientais, sociais e humanos. A preocupação com o meio ambiente traz um foco na gestão de recursos que implica em restrições ao uso de produtos risco de ver o dinheiro poupado durante anos desaparecer de uma hora para outra. Este investidor, cada vez mais, se vê como parte integrante da sociedade e demanda práticas de gestão mais transparentes e éticas que refletem diretamente na avalia- ção das empresas no que chamamos de “ativos intangíveis”. A isso tudo se soma o aspecto huma- no. O entendimento das questões huma- nas é fundamental para que as empresas tenham capacidade de perceber as demandas: dos seus Funcionários por realização pes- soal, dos Clientes pela melhoria na sua qualidade de vida e saúde sem afetar o meio ambiente, do Mercado Financeiro por transpa- rência e das ONGs e Comunida- des por solução em impactos ambientais e sociais. Estratégia em Sustentabilidade é uma evolução natural do modelo estratégico aos novos cenários de negócio. Formular estratégias que avaliem os riscos do negócio e iden- tifiquem oportunidades na relação entre as empresas e os Stakehol- ders é não só uma questão de so- brevivência de longo prazo, como também uma vantagem competiti- va. Esta habilidade em se relacio- nar com estes “novos” atores, se bem desenvolvida, cria uma “barreira de en- trada” natural, já que relacionamentos não se constroem da noite para o dia e muitas empresas, assim como muitas pessoas, per- deram esta capacidade de se relacionar. (*) FERNANDO TIBECHRANI SALGADO é sócio da consultoria Atitude - Gerando Resultado Sustentável, formado em Engenharia de Produção na Escola Politécnica - USP. (E-mail: fernando.salgado@atitude.srv.br) e processos produtivos que impactem ne- gativamente o planeta, mas que podem, por outro lado, gerar excelentes oportuni- dades de negócio como: produtos orgâ- nicos, energia alternativa, green building, “design for recycle” e o entendimento dos ciclos naturais. A vitória do capitalismo, ao fim da guerra fria, explicitou uma tendência de fortalecimento do poder das empresas frente aos governos. A sociedade perce- beu então a necessidade de se organizar, gerando uma explosão no número de ONGs e nas cobranças por demandas so- ciais não atendidas pelo governo que po- dem pôr em risco a própria capacidade da empresa em operar. O mercado financeiro globalizado po- pularizou o investimento, aumentando a liquidez e atraindo pessoas físicas e fun- dos de pensão que não podem correr o fevereiro 2006 • Revista RI • 7 m pautaE ARTIGOS EBITDA: Qual o real valor dessa métrica? • por Rubens Marçal ............................................................ pág. 6 Será o EBITDA um bom indicador para a gestão financeira nas empresas? • por Oscar Malvessi .......... pág. 11 Cálculo do EBITDA gera polêmica no mercado • por Ana Borges ........................................................... pág. 13 Celeumas Contábeis • por Fernando G. Carneiro ................................................................................... pág. 14 EBITDA CELEUMA CONTÁBIL Qual o real valor dessa métrica? 8 • Revista RI • fevereiro 2006 EBITDA QUAL O REAL VALOR DESSA MÉTRICA? Indicador em moda desde meados da última década, embora muito mais antigo do que alguns imaginam, o EBITDA transformou-se na principal métrica usada por empresas, analistas e investidores para relatar ou avaliar a performance de qualquer negócio. por Rubens Marçal * Transformou-se também no principal múltiplo utilizadona seleção de portfólio, relacionando-se ao “Enterprise Value” ou “Firm Value”. E assim empresas e mercado têm-se guiado para tomar decisões relevantes sobre seus investimentos e, pensando igual, acabam - até certo ponto - condicionando o valor de mercado ao desem- penho do negócio em termos de EBITDA. Diante desse quadro, parece perigoso ou, no mínimo insensato, pensar diferente. Mas o que vamos fazer a seguir é exatamente isso: ousar um pouco, para trazer a questão para um plano pretensamente mais técnico. Conceito e Perspectiva Histórica EBITDA é sigla de “Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization” que, traduzida para o português, transforma-se em LAJIDA ou “Lucro Antes dos Juros, Impostos, Depreciação e Amortização”. Seu nome já enuncia sua forma de cálculo: LUCRO ANTES DO IMPOSTO DE RENDA E DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL (+) DESPESAS FINANCEIRAS LÍQUIDAS (+) DEPRECIAÇÕES (+) AMORTIZAÇÕES (=) EBITDA (LAJIDA) Sua aplicação deve ser feita em conjunto com outros indicadores. É um indicador útil em casos específicos, quando se não dispõe do fluxo de caixa ou quando utilizado como acessório na aná- lise ampla dos componentes do fluxo de caixa. O uso do EBITDA aplica-se à análise de empresas em situação de insolvência e/ou de em- presas formadas por ativos de longa vida útil (como algumas indústrias de capital intensivo), sendo inadequado na análise de empresas em si- tuação normal ou formadas por ativos de curta vida útil, como as indústrias “HI-TEC” cujos ati- vos se tornam obsoletos em poucos anos. Numa perspectiva histórica, o EBITDA deri- vou do EBIT, que foi útil décadas atrás quando se estudava operações de underwriting para substi- tuição de passivo oneroso por capital próprio. Como tais operações envolviam empresas defici- tárias, supostamente em razão do alto custo finan- ceiro provocado pelo excesso de endividamento, a primeira averiguação que se fazia era se tal suposi- ção estava correta, isto é, se a única causa do preju- ízo era o elevado endividamento. E o EBIT (“Earnings Before Interest and Taxes”), pela sua simplicidade e facilidade de cálculo, por utilizar apenas informações disponíveis nos Demonstrati- vos de Resultados, permitia deduzir de imediato se a empresa, uma vez capitalizada, seria rentável. Se o EBIT fosse negativo ou insuficiente para cobrir o custo de capital próprio, a operação era descartada. Durante a onda de fusões, aquisições e take- overs dos anos ’80, adaptou-se o EBIT para se justificar certas operações de leverage-buyout, transformando-o no EBITDA, o qual ganhou inadequadamente status de indicador de geração de caixa. Seu uso, porém, ficou restrito a métrica exclusiva desse tipo de operação, tendo sido ig- norado pelo mercado de ações e por companhias abertas em seus relatórios. Passada a referida onda, o indicador caiu temporariamente em de- suso. A esta altura, empresas abertas america- nas e européias já publicavam demonstrativos de fluxo de caixa, municiando o investidor com informações suficientes para o cálculo e o uso de métricas muito mais importantes, como o Free Cash Flow (Fluxo de Caixa Livre) ou a Geração Operacional de Caixa do próprio fluxo de caixa. Deve-se destacar que a introdução do EBITDA durante a leverage-buyout mania dos anos ’80 - quando muitas companhias pagavam mais do que o valor de mercado justo pelos ati- vos que adquiriam - foi feita pelos patrocinado- res das operações de leverage-buyout e seus financiadores. Analistas experientes viam o EBITDA, nessas circunstâncias, como uma farsa para enganar desavisados ou inocentes, não como ferramenta de análise capaz de expressar o poder de geração de caixa dos ativos de uma empresa. Com o passar do tempo, o EBITDA voltou a ser usado como ferramenta de medida de geração de caixa, aplicada de início somente a empresas em situação pré-falimentar e mais tarde a empre- sas com ativos de longa vida útil, tais como for- nos siderúrgicos, torres de rádio-transmissão, etc.. CELEUMA CONTÁBIL 8 • Revista RI • fevereiro 2006 fevereiro 2006 • Revista RI • 9 A evolução do EBITDA dessa posição de ferramenta válida para negócios no “fundo do poço”, com uso restrito à avaliação de créditos de baixa classificação, para uma nova posição como ferramenta analítica para empresas ainda em seus dias de glória, como ocorre na atualidade, é algo de difícil aceitação por um analista experiente que, sobretudo hoje, dispõe de métricas muito superi- ores e de comprovada eficiência. Por isso, é nor- mal que este analista experiente se pergunte “como” e “por qual razão” o mercado de ações e as grandes empresas aceitaram tão facilmente o EBITDA como um dos indicadores mais impor- tantes, passando a mostrá-lo em suas análises e seus relatórios e a utilizá-lo na construção de ín- dices como o “moderno” Firm Value / EBITDA. Não há uma explicação convincente para o uso generalizado do EBITDA, sal- vo talvez o desconhecimento ou o inte- resse em maquiar a empresa para que se mostre mais atraente do que na realidade é. Por trás de tal atitude, fica a dúvida sobre se há algum interesse dirigido por parte de quem o usa ou se apenas se en- trou na onda por inexperiência técnica. O forte ressurgimento do EBITDA nos tempos atuais coincidiu com o boom das empresas “PONTO COM” na Nasdaq, o qual foi alimentado, não pelo maior valor intrínseco dessas empresas ou pelo valor agregado dos serviços por elas prestados, mas pela teia construída por “investidores” de ganho fácil, interessados no IPO (venda, no mercado de ações, da posição detida nes- sas empresas). Como a farsa não poderia durar para sempre, um dia esta “corrente da felicidade” se rompeu, a bolha de prosperi- dade estourou e a Nasdaq desabou. Note-se que, neste caso, havia um interesse dirigido por trás da adoção do EBITDA como métri- ca para qualquer fim. Um argumento levantado a favor do uso do EBITDA, também dessa época, é o de ser ele um bom indicador para administra- dores de portfólios globais que investem recur- sos em ações de empresas de diferentes países emergentes. Como cada um desses países vive sua própria conjuntura econômica, há entre eles diferenças marcantes em suas políticas monetári- as e fiscais, vale dizer, em suas taxas de juros e suas alíquotas de impostos. Assim, nada mais lógico do que adotar um indicador como o EBITDA, que, desconsiderando os juros e os im- postos locais, pudesse colocar empresas de dife- rentes países em um mesmo padrão comparati- vo. E por que desconsiderar a realidade monetá- ria e fiscal de cada país? Porque, com a globalização, haveria uma tendência à unificação de políticas econômicas no longo prazo (uma fa- lácia que vingou temporariamente como “verda- de”, graças à união de interesses dirigidos de alguns com a “inocência” ou inexperiência de outros). Como se vê, o EBITDA nasceu sob a égide de interesses não muito corretos e sua consagra- ção, modernamente, é uma idéia que corre o risco de, a qualquer momento, ficar também refém des- tes mesmos interesses. Restrições Técnicas ao uso Generalizado do EBITDA O Moody’s Investors Services foi uma das muitas instituições que pesquisaram a valida- de do EBITDA como métrica. Suas conclu- sões estão reunidas no estudo “Putting EBITDA in Perspective - Ten Critical Failings of EBITDA as the Principal Determinant of Cash Flow”, publicado em 2000. A pesquisa é rica em estudos de casos que mostram Investidores mais sofisticados utilizam o Free Cash Flow (FCF) em substituição ao lu- cro tradicional, atribuindo àquele maior confiabilidade, porque representa o quanto efetivamente sobra de dinheiro no “caixa” da empresa, depois de se deduzir os investimen- tos em capital fixo e de giro necessários para manter o crescimento das vendas, mas antes de pagar seus financiadores: acionistas (divi- dendos) e bancos (juros). O FCF representa maisfielmente o quanto um determinado “ne- gócio” é capaz de gerar em termos de caixa, antes de distribuir a remuneração a seus financiadores. 2o. O EBITDA ignora as necessidades adicionais de capital de giro indicando um fluxo de caixa superior em períodos de crescimento destas. Vendas crescentes, na maioria dos ca- sos, implicam maiores necessidades de recursos de giro para financiar estoques e clientes. Por não considerar tais neces- sidades, o EBITDA superestima o fluxo de caixa que a empresa é capaz de gerar, comprometendo uma visão realista da situação de liquidez, da capacidade de pagamento e do retorno. 3o. O EBITDA não considera o montante de reinvestimento reque- rido, o que é especialmente grave no caso das empresas com ativos de vida útil curta. Para manter suas vendas e seu retor- no, atuando em um mercado competiti- vo, a empresa precisa reinvestir cons- tantemente recursos na atualização de seus ativos fixos. Quanto mais curta for a vida útil destes, maior a freqüência com que tais reinvestimentos devem ser fei- tos. Empresas de alta tecnologia, empre- sas de transportes e várias outras cujos ativos tornam-se obsoletos em curto es- paço de tempo correm o risco de perder espaço de mercado ou até desaparecer se não se atualizarem na mesma velocidade dos concorrentes. Empresas de capital inten- sivo formadas por ativos de longa vida útil, embora se modernizem em espaço de tempo muito maior, quando o fazem, investem so- mas vultosas, cuja disponibilidade não será problema se recursos equivalentes à deprecia- ção tiverem sido provisionados ao longo dos anos anteriores, formando um fundo de reser- va para investimento. O EBITDA, ao desconsiderar a depreciação como uma despe- sa, sem considerar também as saídas efetivas de caixa para aquisição de capital fixo (como é feito no caso do Free Cash Flow), cria a ilu- são de um fluxo de caixa melhor do que na realidade é, algumas vezes transformando a visão de uma realidade crítica de falta de caixa num cenário róseo de excesso de liquidez. EM PAUTA fevereiro 2006 • Revista RI • 9 claramente a falência do EBITDA quando usado fora das condições limitadas a que se aplica. Dentre as dez principais restrições menciona- das no título, o Moody’s destaca: 1o. O EBITDA é tão manipulável quanto o Lucro Econômico. A exemplo do Lucro Econômico, o EBITDA é um item manipulável, mesmo sem se desobedecer qualquer regra legal ou contábil. Mudanças de critérios de deprecia- ção e amortização, de avaliação de estoques, de remuneração da Administração, de apro- priação de variações patrimoniais de investi- mentos em controladas, entre outras, são exemplos de como se pode melhorar ou piorar o Lucro e o EBITDA da companhia, sem se quebrar qualquer regra ou lei estabelecida. 10 • Revista RI • fevereiro 2006 4o. O EBITDA pode ser uma enganosa medida de liquidez. A Geração Operacional de Caixa e o Free Cash Flow são medidas importantes para ava- liar a capacidade dos ativos da empresa de gerar recursos financeiros para pagar bancos (juros + pagamento do principal) e acionistas (dividendos) e ainda garantir recursos rema- nescentes que possam ser acessados a qual- quer momento, servindo também como medi- da de liquidez. Ao confundir-se o EBITDA com a Geração de Caixa e atribuir-se a ele o poder de medir liquidez comete-se um engano que pode distorcer gravemente a visão da rea- lidade financeira da empresa. 5o. O EBITDA não diz nada sobre a qua- lidade do lucro. O EBITDA, isoladamente, nada revela sobre a qualidade do lucro da companhia. Ao somar-se a depreciação e a amortização, um EBIT negativo pode transformar-se num EBITDA positivo se aqueles valores forem suficientemente grandes para cobrir o pre- juízo e deixar um saldo. Em geral, quanto maior a proporção do EBIT no EBITDA, maior é o fluxo de caixa. E, ainda, quanto maior a proporção da depreciação no EBITDA, maior a importância de a empre- sa gastar um montante igual ao valor da de- preciação para manter seus equipamentos atuais. Por outro lado, ainda que em geral a amortização possa ser trazida de volta no cálculo do fluxo de caixa, há casos em que há limites para isso. Amortização de des- pesas diferidas que são recorrentes, de cus- tos capitalizados que seriam mais apropri- adamente considerados como despesas ou de valores futuros incertos não deveria ser trazida de volta e, no entanto, é computada indiscriminadamente no EBITDA. 6o. O EBITDA é uma medida inade- quada para ser usada isoladamente no cálculo de múltiplos na aquisição de uma empresa. O EBITDA é comumente usado como me- dida para comparar preços pagos por compa- nhias, sendo utilizado como um múltiplo do fluxo de caixa corrente ou esperado da empre- sa adquirida. Ainda que isso possa servir como uma “conta de padeiro” (sem qualquer crítica à categoria), é bom lembrar que o EBITDA não corresponde ao fluxo de caixa. Usuários dessa “aproximação” deveriam saber que os múltiplos calculados com o EBITDA criam a ilusão de um preço de aquisição baixo e menor do que o real. Por exemplo, um múltiplo utili- zando o EBITDA de 5 vezes, para uma com- panhia cujo EBITDA seja composto por 50% de EBITA e 50% de Depreciação, equivale a um múltiplo substancialmente maior, de 10 vezes, utilizando o lucro operacional mais amortização. 7o. O EBITDA ignora distinções na qua- lidade do fluxo de caixa resultantes de di- ferentes critérios contábeis – nem todas as receitas são caixa. Diferentes critérios contábeis podem ter profundo efeito no EBITDA tornando-o uma ferramenta pobre na comparação de resulta- dos financeiros entre diferentes empresas. Políticas de reconhecimento de receitas que têm pouca correlação com entradas de caixa, como as adotadas por vários tipos de empre- sas que fazem apropriações pelo critério de porcentagem concluída da obra ou do serviço (empresas de Internet, construtoras, indústri- as de equipamentos sob encomenda de longo prazo etc.), podem levar a um distanciamento significativo entre EBITDA e fluxo de caixa. 8o. O EBITDA não é um denominador comum para critérios contábeis de diferen- tes países. O EBITDA de uma mesma companhia pode variar dependendo de onde ele é calcula- do. Cada país, independentemente das dife- renças conjunturais, tem seus próprios pa- drões de contabilidade e as práticas diferem em termos de reconhecimento de receitas, metodologias para capitalizar custos e despe- sas, reconhecimento de goodwill e deprecia- ção de ativos fixos. Mesmo diferenças modes- tas podem tornar-se significativas quando a despesa financeira líquida é pequena (com pouco peso na formação do EBITDA). 9o. O EBITDA oferece proteção limita- da quando usado em contratos de associa- ções, cartas de intenções e outros acordos que envolvam limites financeiros de ação. O EBITDA tem sido usado em vários ti- pos de contratos que restringem o nível per- mitido de endividamento da empresa envolvi- da, normalmente compondo índices de cober- tura ou de alavancagem (exemplo: “Dívida/ EBITDA” não superior a 6,0 vezes). Tais clá- usulas de garantia à outra parte baseiam-se na idéia errônea de que o EBITDA está integral- mente disponível para cobrir o custo financei- ro, o que, pelo exposto nos itens 2o. e 3o., não é verdadeiro. A experiência tem demonstrado que o cumprimento das cláusulas de teste- EBITDA não evitam necessariamente os pro- blemas que se queria evitar. 10o. O EBITDA não é apropriado para a análise de muitas indústrias porque igno- ra seus atributos únicos. O EBITDA é um indicador exclusivo para empresas de capital intensivo com ativos de longa vida útil. Sua generalização é algo não apropriado. O fato de em seu cálculo não se considerar os atributos específicos de cada atividade, avaliando-se todas elas da mesma forma, traz profundas distorções à análise, sendo exemplos críticos dessas distorçõesaquelas que se encontram em atividades que estão no extremo oposto da que o indicador melhor se aplica. Dentre esses setores, para os quais o uso do EBITDA é inadequado por não considerar suas particularidades, destacam-se TV a Cabo, Serviços de Paging, Construção Civil, Gás e Petróleo, Trans- portes, Restaurantes, Serviços de Locação, Internet, Construção de Redes de Fibras, Serviços Funerários e Cemitérios, Exibições Teatrais, Turismo Timeshare etc., apenas para ficar nos mais críticos. Mas não é só o Moody’s que faz críticas ao EBITDA. A Stock Diagnostics, empre- sa de pesquisa que desenvolveu um software proprietário, desenhado para estudar as re- lações lógicas entre as informações econô- mico-financeiras e a performance do preço da ação no mercado, considera o uso do EBITDA pelos analistas de Wall Street como um expediente para promover ações para um público desavisado. Em sua opinião, quando um analista ou CFO usa o EBITDA, o que ele está realmente dizendo é: “Isto é o que os lucros poderiam ter sido se não ti- véssemos que tomar empréstimos, se não tivéssemos que pagar impostos, se não ti- EM PAUTA 10 • Revista RI • fevereiro 2006 “O EBITDA é um indicador exclusivo para empresas de capital intensivo com ativos de longa vida útil. Sua generalização é algo não apropriado. O fato de em seu cálculo não se considerar os atributos específicos de cada atividade, avaliando-se todas elas da mesma forma, traz profundas distorções à análise, sendo exemplos críticos dessas distorções aquelas que se encontram em atividades que estão no extremo oposto da que o indicador melhor se aplica.” fevereiro 2006 • Revista RI • 11 véssemos que investir em nada e se não tivés- semos que amortizar recursos ativados”. E ainda mais: “Por ser um indicador baseado no lucro, o EBITDA nada tem a ver com o fluxo de caixa”, acrescenta. Casos Ilustrativos Um episódio abalou a credibilidade do EBITDA: o escândalo da gigante americana WorldCom, que, no ano de 2001 e no primeiro trimestre de 2002, ostentava EBITDAs capa- zes de convencer qualquer analista desavisado de estar navegando de “vento em popa” e, no entanto, a empresa estava literalmente insol- vente e amargando prejuízos monumentais. É verdade que houve uma gigantesca fraude, ca- racterizada pela transformação de US$ 3,8 bi- lhões de despesas operacionais acumuladas nesses cinco trimestres em despesas de capi- tal que foram ativadas (superestimando o EBITDA, o lucro, o valor dos ativos e o valor do patrimônio). No entanto, mesmo nessa si- tuação de fraude, o usuário do Free Cash Flow enxergava outra coisa muito diferente, pois no cálculo deste os US$ 3,8 bilhões de falso “in- cremento de capital fixo” são excluídos. Descoberta a fraude, o lucro líquido de US$ 1,4 bilhão de 2001 transformou-se num prejuízo de US$ 1.7 bilhão e o lucro de US$ 130 milhões do primeiro trimestre de 2002 virou um prejuízo de US$ 667 milhões. O Free Cash Flow de 2001, reportado pela empresa antes da fraude ser descoberta, foi de míseros US$ 108 milhões, o que já levaria qual- quer analista experiente à desconfiança de que algo deveria estar errado, valendo uma pes- quisa mais profunda. Para os investidores usu- ários do EBITDA, acreditar no indicador de forma isolada resultou num prejuízo pratica- mente total de seus investimentos na empre- sa, conforme mostra o gráfico abaixo. Enquan- to isso, alguns mais “espertos” que advogam o uso desse indicador encheram seus bolsos. Não é à toa que os Corporate Filings da SEC (Security and Exchange Commission) freqüentemente incluem uma clara advertên- cia de que EBITDA não significa Lucro, não mede a liquidez e não é parte dos Princípios de Contabilidade Normalmente Aceitos. O que aconteceu com a WorldCom acon- teceu também com várias outras grandes corporações americanas que entraram em moda na virada do século (Enron etc.) e, em todos os casos, usuários do EBITDA que não tiveram a preocupação de olhar outros indicadores melhores transformaram-se em perdedores ludibriados. Nem sempre a questão é de fraude e nem sempre é preciso ir longe para encontrar exemplos de mal uso do EBITDA. Pode- mos olhar o caso da nossa VARIG, ilustra- do a seguir. Os gráficos ao lado mostram que, de março/1999 a março/2002, as ações PN da VARIG tiveram uma valorização de 261% na BOVESPA (Bolsa de Valores de São Pau- lo) contra apenas 24% do índice de merca- do (Ibovespa). Observando o gráfico da ação em conjunto com os gráficos de EBITDA, Lucro e Patrimônio Líquido da empresa, so- mos forçados a deduzir que a lógica do EBITDA prevaleceu sobre a dos demais in- d icadores , f avorecendo um ganho injustificado com as ações da empresa. Qual- quer um que olhasse a sucessão de prejuí- zos exponenciais e as perdas patrimoniais que vinham ocorrendo desde 1998, culmi- nando com um passivo a descoberto supe- rior a meio bilhão de reais ao final de 2001, não teria acreditado na alta da ação nesse primeiro período. E, com a realidade vindo à baila através de conflitos entre a princi- pal instituição credora, a Fundação Ruben Berta, o Sindicato dos Aeroviários e o BNDES, chegando-se até a debates no Con- gresso, a situação mudou de figura: de mar- ço/2002 a maio/2003, as ações tiveram uma queda de 44% no mercado, contra uma pe- quena alta de 1% do Ibovespa. Certamente os muitos defensores inocentes do EBITDA perderam e os poucos defensores intencio- nais do EBITDA ganharam. No caso de VARIG, o erro foi não consi- derar o acúmulo de dívidas, o serviço da dívida, o lado negativo do impacto do câm- bio sobre essa dívida e a enorme crise de liquidez que tudo isso ge- rou. Neste caso, nem mes- mo o Free Cash Flow pode ser olhado isolada- mente, mas sim a relação deste com os ativos ope- rac iona i s da empresa (Free Cash Flow / Ativo Operacional Médio) a fim de se compará-la com o custo de capital (total, próprio e de terceiros). Se aquela for menor que este, haverá problemas. EM PAUTA VARIG PN x IBOVESPA (31/03/99=100) • Fech. mensal (Mar/99 a Mar/02) VARIG PN x IBOVESPA (31/03/02=100) • Fech. mensal (Mar/02 a Mar/03) Lucro Líquido (R$ milhões) Patrimônio Líquido (R$ milhões) fevereiro 2006 • Revista RI • 11 EBITDA (R$ milhões) Valorização da Ação em comparação com o IBOVESPA Período: 6/junho/2002 a 6/junho/2003 12 • Revista RI • fevereiro 2006 EM PAUTA Mas, além da Varig, há muitas outras empre- sas que registraram prejuízos e apresentaram Free Cash Flows negativos, mas mostraram EBITDAs positivos. Algumas delas tiveram prejuízos elevadíssimos, gerações próprias de caixa-livre negativas, mas ostentam EBITDAs elevados, sugerindo um negócio em franca prosperidade. Entretanto, a realidade não é bem assim. Os EBITDAs dessas empresas mascaram a realida- de de insuficiência de geração de caixa, por não estarem levando em conta que: (1o) a depreciação não é suficiente para cobrir os investimentos em capital fixo necessári- os para atingir as receitas esperadas (que muitas vezes não vêm); (2o) o serviço da dívida é, em geral, maior do que o EBITDA. O EBITDA na Construção de Indicadores de Seleção de Ações Quando se trata de selecionar ações em blo- co, isto é, quando se precisa selecionar as melho- res alternativas de um universo de trabalho que inclua todas as ações possíveis, os múltiplos são sem dúvida os indicadores mais poderosos e prá- ticos de que se dispõe. Poderosos porque produzem um resultado seletivo, concreto e superior à maioria dos outros indicadores de igual custo de construção. Práti- cos porque apresentam grande facilidade de se relacioná-los com outras variáveis fora do merca- do de ações e, sobretudo, porque exigem um “cus- to” de trabalho muito menor do que o de outros métodos que, ainda que superiores quanto ao poder de seleção, são extremamente mais traba- lhosos, praticamente inviabilizandoo seu uso extensivo para todas as ações do universo de tra- balho. É claro que, num processo de seleção, outros índices são também necessários. Assim como os múltiplos estarão avaliando o retorno relativo, esses outros índices estarão avaliando o risco re- lativo. Mas, ainda assim, há vários múltiplos que se pode utilizar no processo de seleção, desde o tradicional P/L até o moderno e inadequado FV/EBITDA. O objetivo aqui é explicar este novo múltiplo e avaliar o seu poder de seleção. Fórmula de cálculo: FV/EBITDA FV = Firm Value (Valor da Empresa) = Market Capitalization + Net Debt (Valor de Mercado + Dívida Líquida) Conceituação: O FV/EBITDA foi concebido como ferramen- ta de uso para analistas e administradores de portfólios globais, que necessitavam comparar múltiplos entre vários mercados emergentes, su- jeitos a diferentes conjunturas de taxas de juros das respectivas economias, diferentes alíquotas de impostos sobre o lucro e com diferentes crité- rios de depreciação e amortização. A maneira de resolver tais diferenças foi subs- tituir o Lucro (utilizado no múltiplo P/L) pelo EBITDA (utilizado no múltiplo FV/EBITDA), uma vez que este não leva em conta aquelas vari- áveis acima mencionadas. dividendos e aferindo os ganhos de capital). O que passou, na realidade, não interessa mais. Poder de seleção: É inegável que o indicador FV/EBITDA pode produzir bons resultados no processo de seleção de ações e que passou a ser superior ao P/L a partir de 2000, ano em que o uso do indicador se consagrou no mercado. Mas isso pode ser sinto- ma de “profecia auto-realizável”, ou seja, se to- dos no mercado pensam da mesma forma, ainda que pensem errado, as ações vistas como melho- res subirão mais do que as demais, mesmo que não sejam melhores. Não é por coincidência que esse período tenha se caracterizado por uma per- da de “tecnicismo” pelo mercado, pelo aumento da volatilidade e prevalência da especulação, até que a bolha da Nasdaq estourasse e isso deixa em dúvida a qualidade do EBITDA como indicador na construção de múltiplos. Conclusões O valor que pode ser atribuído ao EBITDA é como ferramenta acessória para ser utilizada em conjunto com outros indicadores e restrita a de- terminados tipos de empresas ou a empresas em determinadas situações. É preciso ter-se muito claramente que EBITDA não é Geração Operacional de Caixa e não a substitui no fluxo de caixa. Sua aplicação a empresas pré-falimentares faz sentido, porque nessa situação a empresa se vê forçada a suspen- der investimentos, podendo considerar a depre- ciação como um recurso disponível; caso contrá- rio, a depreciação é um valor necessário para co- brir investimentos na renovação necessária dos ativos da empresa. Para companhias formadas por ativos de longa vida útil, é possível lançar mão da depreciação, momentaneamente, num curto período de tempo, como se fosse recurso de caixa disponível para outra finalidade qual- quer; mesmo assim, tal atitude não pode perdu- rar e haverá necessidade de se repor no futuro os recursos assim utilizados. Há certo abuso no uso do EBITDA como indicador isolado, tanto por analistas quanto por companhias. Para se ter uma melhor avaliação da companhia, o Free Cash Flow é uma métrica su- perior ao EBITDA e deve ser preferido a este, embora também em conjunto com outros indica- dores complementares. (*) RUBENS MARÇAL é consultor da FIRB – Financial Investor Relations Brasil. (E-mail: rubens.marcal@firb.com) Mas, para poder utilizar o EBITDA no lugar do Lucro, era preciso acrescentar algo ao valor da empresa (preço da ação multiplicado pelo núme- ro de ações emitidas) a fim de que a lógica do múltiplo não se perdesse. E, assim, como o EBITDA desconsidera os juros dos empréstimos fornecidos por bancos, somou-se ao valor de mercado (capital próprio) o valor líquido da dívi- da com bancos (capital de terceiros). Deve-se notar que a palavra bancos, aqui, tem um signifi- cado mais amplo, envolvendo também aplicadores em títulos de dívida emitidos pela companhia, órgãos de fomento fornecedores de recursos e outros financiadores. O indicador (FV/EBITDA) opera com valo- res projetados, a exemplo do P/L e de todos os indicadores de seleção. Se quero comprar uma ação hoje, só me interessa o passado como base para projetar o futuro (período em que realmente estarei sendo sócio da empresa, recebendo seus “O valor que pode ser atribuído ao EBITDA é como ferramenta acessória para ser utilizada em conjunto com outros indicadores e restrita a determinados tipos de empresas ou a empresas em determinadas situações.” fevereiro 2006 • Revista RI • 13 EBITDA SERÁ ESSE UM BOM INDICADOR PARA A GESTÃO FINANCEIRA, E ÚTIL PARA A REMUNERAÇÃO VARIÁVEL NAS EMPRESAS? Nos últimos anos tornou-se usual, em análises e decisões, dar foco na geração bruta de caixa ou EBITDA, tanto no mercado financeiro quanto para a gestão das empresas. Entretanto, observa-se o inexpressivo número de empresas que apresentam e explicam em seus relatórios suas decisões sobre o CAPEX (investimentos em capital fixo e de giro) e/ou sobre o comportamento do valor do fluxo de caixa livre. por Oscar Malvessi* Devido à simplicidade e rapi- dez no cálculo desse indicador fi- nanceiro, as instituições financei- ras o utilizam para avaliar o risco financeiro de emprestar, verifican- do a capacidade da empresa para suportar níveis estabelecidos de endividamento versus a capaci- dade e risco de receber. Baseadas nele, as empresas demonstram para o mercado o comportamen- to do seu valor, e sua proporção em relação a receitas. Do lado do investidor, as em- presas de investimento de capital de risco, como as de venture capi- tal e equity funds usam o EBITDA como base de múltiplos para comparação en- tre empresas e nas que investem podem exigir metas de EBITDA a ser alcançado. Corretoras calculam o múltiplo FV/EBITDA (valor de mercado acrescido do endividamento líquido dividido pelo EBITDA), como um importan- te indicador financeiro em decisões de compra e/ou aplicações em ações. Outro pressuposto forte do uso do EBITDA como indicador de geração de caixa é o de que as empresas poderiam cortar ou manter seus inves- timentos para cumprir com os covenants e/ou múltiplos, mantendo assim a condição de pagar juros e amortizar o principal. O conceito e estrutura de análise que ado- tamos e propomos não têm a finalidade de avaliar qualquer desempenho de uma empresa em função do seu EBITDA, ao contrário, nos- sa análise sempre esteve focada no VEC 1 – Valor Econômico Criado. Assim, preocupados com a demasiada ên- fase que as empresas e o mercado têm dado ao EBITDA, direcionamos algumas informações do nosso banco de dados para apresentar a realidade subjacente aos indicado- res que cercam o EBITDA. A realidade e as evidências dessa base de dados foram obti- das da segunda atualização da nossa Tese de Doutorado, em que analisamos o comportamento das 45 empresas privadas não finan- ceiras de capital aberto, compa- rando os períodos 1995/2000 com o de 2000/2003, tendo como metodologia o foco no VEC. Estratificamos essa amostra e consideramos somente as 22 em- presas privadas de capital aberto que obtiveram EBITDA médio, no período, superior a R$ 300 mi- lhões. É importante salientar que utiliza- mos em nossas análises somente valores em moeda de poder aquisitivo constante, por- que, ao contrário, se utilizássemos os valo- res nominais como foram publicados, seria impossível comparar e avaliar tecnicamen- te valores de períodos diferentes, mas tra- tados como se iguais fossem. Como resultado prático da análise dessa amostra é possível destacar a constatação de três indicadores intimamente interligados que, praticamente, podem modificar o significado CELEUMA CONTÁBIL 1 A metodologia VEC é consistente com a modernateoria de finanças corporativa. Usa os princípios de moeda constante e enfatiza o uso integrado das demonstrações financeiras incluindo o fluxo de caixa e a capacidade em gerar valor do negócio. É esse conjunto de informações que deve avaliar a capacidade da empresa em gerar resultados operacionais após o I. R., além da geração de caixa operacional e livre, dos investimentos em capital de giro e fixo e, para concluir, comparando o capital empregado na atividade com o custo de capital, assim apurando a geração de valor ao acionista. 14 • Revista RI • fevereiro 2006 EM PAUTA e a aplicação generalizada do EBITDA pelas empresas e mercado, principalmente quando for utilizado no enfoque de gestão e/ou para projeção de fluxo de caixa e demonstrações financeiras; são eles: 1. Variação da relação média entre Investimentos em Imobilizados e a Depreciação: encontramos uma variação em torno de 120% nos dois períodos analisados. Essa relação demonstra a representatividade dos reinvestimentos feitos, ou seja, não dá para desprezar o montante dos investimentos quando comparados com o valor da depreciação, uma vez que é muito relevante e expressivo o valor de investido em imobilizado. Da amostra, são poucas as empresas que desinvestiram e/ou investiram índices inferiores a 50%; 2. A relação entre a Depreciação e o EBITDA: observamos que o índice médio foi de 41% no período 95/00 e de 28% no período 2000/2003, ou seja, como ficou demonstrado na relação anterior, na realidade as empresas investem em imobilizados proporcionalmente mais do que consomem ou registram, portanto, novamente a evidência encontrada demonstra a fragilidade do uso do EBITDA como fluxo de caixa bruto do negócio ou como indicador de melhoria de resultados; 3. A relação média dos Investimentos em Imobilizados comparados com o EBITDA: o comportamento do índice foi de 90% no período 95/00 e de 60% no período 2000/2003, ou seja, o saldo da geração bruta de caixa na realidade foi de somente 10% no primeiro período e de 40% no segundo. E se considerássemos nesse cálculo o impacto do Imposto de Renda Operacional desembolsado e a necessidade de capital de giro, será que a geração seria positiva?. Portanto, embora a empresa possa apresentar crescimento do EBITDA em termos absolutos ou comparativa- mente à receita, as relações ficam alteradas devido a necessidades de capital (fixo e de giro), sugerindo reflexão e muita cautela com o uso do indicador EBITDA. Dessa amostra somente 5 empresas investiram até a metade destas relações; 2 VEC = Valor Econômico Criado ou Criação de Valor ao Acionista. Denominação que utilizamos na TESE de Doutorado (EAESP-FGV-2001) e nos artigos publicados, para expressar o uso e a aplicabilidade do conceito do Lucro Econômico e a sua convergência aos princípios de governança corporativa aplicado as empresas no Brasil de forma ampla. A título de exemplo real, a tabela “A” abaixo apresenta o comportamento médio no período de 2000/2003 de seis empresas dessa amostra. O objetivo é demonstrar o comportamento dos valores e a variação dos indicadores acima comentados. Portanto, o pressuposto que o EBITDA é um bom indicador de geração de caixa se mostra muito frágil, uma vez que sua consistência conceitual e aplicabilidade na gestão de empresas não apresentam a esperada convergência. Essas evidências constatam que as empresas têm investido em imobilizado e consomem a “geração bruta de caixa” de maneira relevante, por um período amplo de análise. Além dessa variável importante não se concretizar, é importante mencionar que a remune- ração variável dos gestores vinculada ao EBITDA não contempla fatores fundamentais do desempenho econômico-financeiro do negócio, fatores abordados de maneira integrada na metodologia de Criação de Valor ou VEC2. Servem de exemplo, a vinculação do uso do capital empregado na atividade, o custo de oportunidade do acionista, o impacto do custo do capital no resultado obtido e a integração dos dirigentes e gestores aos princípios da meritocracia. Como resultado do uso generalizados do EBITDA na prática temos: levar as empresas que o adotam a distribuir resultados que não representam geração de valor mas lucro e que pode estar destru- indo a riqueza dos acionistas. Outros fatores importantes são que o EBITDA ignora o capital empregado na atividade, o seu custo, assim como despreza os gastos do imposto de renda. Desta forma, podemos afirmar que o valor do EBITDA e seus múltiplos utilizados para analisar a capacidade de geração de caixa como indicador de desempenho financeiro não é necessariamente uma boa ferramenta para a gestão, pois não representa a dimensão real do fluxo de caixa gerado. Na realidade, ele fala somente uma parte da estória, pois não considera o desempenho da empresa como um todo. E no caso brasileiro, a magnitude da análise fica ainda mais prejudicada quando se comparam dados históricos nominais, como são publicados os demonstrativos financeiros, desprezando-se o impacto da perda de valor da moeda no tempo. Concretamente, boas decisões necessitam de indicadores que integram informações econô- mico-financeiras, que não dediquem atenção somente a uma demonstração, que demonstrem consistência conceitual em finanças corporativas e que traduzam a complexidade das empresas para que se possa enxergar e avaliar com “microscópio” o que está por trás dos números e por que não dizer, da acirrada competitividade e globalização dos negócios. Portanto, defendemos o uso e a aplicabilidade da metodologia com foco na Criação de Valor ao Acionista ou VEC, porque ela desmistifica a noção de valor a todos os gestores, apresenta uma clara percepção de eficiência e eficácia dos recursos e traz consigo a aplicação do fluxo de caixa operacional e do fluxo de caixa livre. Em nossa opinião, para ter sucesso no mercado competitivo e globalizado a gestão da empresa deverá estar comprometida com o uso e aplicação da metodologia de geração de valor ao acionista - VEC, por que ele considera a meritocracia no sentido econômico, fator que exige e envolve os colaboradores ao atingimento de metas vinculadas a remuneração variável, trabalha de forma integrada com o conjunto das demonstrações financeiras. Contribui significativamente para a governança corporativa, transparência das informações aos gestores, mercado e investidores, resultando no aumento da confiabilidade, dos resultados econômicos e a melhor percepção do valor da empresa pelo mercado. (*) OSCAR MALVESSI é consultor de Estratégia Financeira, professor de Finanças e pesquisador sênior do GVcepe – Centro de Estudos em Private Equity e Venture Capital da EAESP-FGV. (E-mail: omalvessi@fgvsp.br) TABELA A: Comportamento do EBITDA e Indicadores período 2000/2003 - Em R$ MM Empresas EBITDA Depreciação Imobilizações Depr/Ebitda Imob/Depr. Imob/Ebitda A 2200 630 1120 29% 78% 51% B 1050 320 490 31% 51% 46% C 770 410 970 53% 136% 126% D 730 280 340 39% 20% 46% E 440 140 415 32% 197% 94% F 370 60 100 17% 67% 28% fevereiro 2006 • Revista RI • 15 CÁLCULO DO EBITDA GERA POLÊMICA NO MERCADO Um dos mais importantes indicadores de geração de caixa usado pelos analistas para medir o desempenho das companhias abertas, o EBITDA está sendo questionado no mercado financeiro. Por Ana Borges O EBITDA (ou LAJIDA) divulgado pe- las empresas não é calculado apenas de uma forma, o que dificulta a comparação dos re- sultados entre os balanços. Ao mesmo tem- po, não é visto como medida suficiente para dar a indicação de compra ou venda do papel. Preocupada com a forma que a medida vem sendo utilizada, a APIMEC - Associa- ção dos Analistas e Profissionais de Inves- timento do Mercado de Capitais enviou uma carta aos associados. O objetivo da pes- quisa é levantar quais seriam os itens a se- rem considerados no cálculo do EBITDA e de que forma as companhias deveriam apre- sentaro indicador. A idéia é que as opini- ões possam contribuir para a construção de padrões a serem seguidos pelas compa- nhias abertas na elaboração e divulgação do indicador, de forma a tornar a informação comparável e mais facilmente identificável e compreensível pelo leitor das demonstra- ções financeiras. “Em recente discussão na Comissão Con- sultiva de Normas Contábeis da CVM sobre a divulgação de medições não contábeis, apu- rou-se que a informação está sendo elaborada e divulgada de forma muito particular pelas companhias abertas e de forma divergente en- tre elas. Essa situação torna difícil compreen- der tanto a formação do número apresentado quanto a sua integração ou conciliação com os outros números da Demonstração de Resulta- do, além de não ser comparável”, alerta a carta da APIMEC, que está representada, por dois membros, na Comissão. Segundo a Comissão de Valores Mobili- ários (CVM), as empresas podem divulgar informações extras, que não estão previstas nas normas contábeis. “O investidor não pode ser confundido, pois cada um acaba divulgando o EBITDA de forma a ser favo- rec ido e a in fo rmação acaba sendo enviesada”, diz o inspetor da Superinten- dência de Normas Contábeis da CVM, Wagner de Aquino. O mais indicado nesse caso é explicar a maneira como o indicador foi obtido. “O ofício circular da CVM deste ano deve sair com a revisão deste assunto que ainda é difícil para as companhias bra- sileiras”, avisa. O diretor técnico da APIMEC, Reginaldo Alexandre, explica que a forma de calcular o EBITDA não deve ser engessada, mas tor- nar a fórmula como foi buscada mais clara. “A idéia é estabelecer parâmetros mínimos de cálculo”, afirma. Segundo Alexandre o EBITDA é uma informação essencial para os analistas, mas não deve ser considerado sozinho na análise. “É a primeira medida de geração de caixa bruta”, define. Com 20 anos trabalhando no mercado financeiro, o superintendente de Renda Va- riável do Banif Primus, Nami Neneas, de- fende o uso do EBITDA. “Fui um dos pri- meiros a usar no Brasil. É um bom indica- dor, mas não é possível analisar a empresa olhando só para isso, mas para a conjuntu- ra toda”, pondera. Os analistas do Banif costumam olhar o EBITDA para estabele- cer o preço alvo das ações das companhias negociadas na Bolsa. Do lado negativo, o professor do de- partamento de contabilidade finanças e con- trole da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e consultor da GV Consulte, Ricardo Dellape, lembra que o EBITDA é conside- rado um indicador de geração de caixa de curto prazo e não considera os impostos (IR), a necessidade de investimento em ca- pital de giro e nem a estrutura financeira. “Isoladamente o EBITDA não significa muito em termos de rentabilidade. O que importa é a geração de valor para o acionista”, ressalta. Um dos dados relevantes na análise é o que foi investido para que a companhia con- seguisse gerar o EBITDA. Dellape complementa que a análise deve abranger se a empresa está realmente dando retorno ou não. Isso só é possível se for com- parado o fluxo de caixa com a quantidade de investimentos. “As empresas mais capital in- tensivas precisam investir mais para gerar cai- xa”, lembra. Assim, apesar de duas empresas terem o mesmo EBITDA, uma pode ser mais interessante ao investidor que a outra. Isso porque o investimento da primeira foi maior do que a segunda para obter a mesma geração de caixa. “As companhias bem sucedidas são aque- las que conseguem obter retorno sobre o capi- tal investido. O EBITDA é uma parte e não fevereiro 2006 • Revista RI • 15 CELEUMA CONTÁBIL 16 • Revista RI • fevereiro 2006 vai dizer que a empresa está gerando valor, pois a companhia pode estar ganhando menos do que investe. Esse conceito está sendo aplicado em várias empresas”, ob- serva Dellape. Nos exemplos de empresas que estão adotando este conceito encon- tram-se o grupo Votorantim, a CPFL e a Companhia Vale do Rio Doce. Dentre os setores vistos como positivos na geração está o de minério e o financeiro. Este últi- mo é conhecido pela eficiência na aplica- ção do capital. Apesar das críticas, o EBITDA ainda de- verá continuar sendo utilizado como impor- tante referência no mercado. A padronização da forma de cálculo, entretanto, também é motivo de polêmica. Na avaliação do presi- dente do IBRI - Instituto Brasileiro de Rela- ções com Investidores e superintendente de RI do Itaú, Geraldo Soares, a padronização é sempre positiva para o mercado financeiro. “Isso contribui para a transparência, o que é bom. As empresas podem até divulgar junto outra forma, mas é preciso que haja comparabilidade”, destaca. O gerente de RI da ALL, Rodrigo Cam- pos, acredita que, com a padronização, per- de-se a especificidade do balanço da compa- nhia. “O EBITDA é um importante indica- dor, mas deve ficar claro o cálculo utilizado para dar transparência. Não é necessária a uniformização, pois assim as particularida- des do negócio serão perdidas”, explica. No mercado existem os mais variados índices para avaliação das companhias. José Marcos Treiger, da área de RI da Braskem, lembra que não são as empresas que devem escolher os indicadores e sim os analistas. “O EBITDA é interessante porque consis- te em uma leitura rápida das linhas de de- monstração de resultado. Mesmo que a em- presa não tenha fluxo de caixa aberto, esta é uma forma de obter a geração de caixa aproximada”, ressalta. Treiger é contra o engessamento do cálculo e também defen- de a transparência da forma como o EBITDA é obtido. “Pode haver um con- senso, uma recomendação e, se a empresa se desviar, explique as razões”, defende. Na definição do vice-presidente de finan- ças da Energias do Brasil - EDP, Antonio José Sellare, o EBITDA é uma referência imediata da situação da empresa. “Dá uma idéia ime- diata do valor da empresa, mas de forma simplificada. Não é definitivo”, ressalta. O ideal, entretanto, é a partir do EBITDA buscar uma análise mais detalhada. Na Cemig, o cálculo do indicador é feito de forma imediata. “Não fazemos ajustes para não ingressarmos na polêmica”, destaca o su- perintendente de Relações com Investido- res da estatal, Luiz Fernando Rolla. CELEUMAS CONTÁBEIS Na última sondagem realizada numa parceria entre a FGV e a prestigiada revista IR Magazine (Estudo de Percepção do Investidor, Brasil 2005), para selecionar as empresas vencedoras da edição 2005 do IR Magazine Brazil Awards, um dado é instigante. Quando perguntadas sobre qual o método mais utilizado para avaliar a atratividade de uma empresa - numa escala de freqüência relativa – 89% das empresas participantes responderam que era o fluxo de caixa descontado. E em segundo lugar veio a razão Valor da Empresa (FV) sobre o EBITDA (que trata-se de um fluxo de caixa descontado ma non troppo). O fluxo de caixa livre (variação sobre o tema) chegou em quarto lugar. por Fernando G. Carneiro* 16 • Revista RI • fevereiro 2006 CELEUMA CONTÁBIL Nada mais natural. Esse tipo de prática e mensuração é unanimidade mundial, e olhar para a receita líquida só na hora dos famosos earnings releases trimestrais para ver quanto sobrou por ação. Mas há pessoas que ainda acreditam que a reunião sem exceção de todos os cordeiros só ocorre na hora do abate ou da raspagem de lã. Há perigos exatamente na ampla margem do que vai ser descontado do fluxo de caixa ou não. A latitude para as empresas ainda é grande, e visando a minimização de riscos, temos que estar atentos a vários itens contábeis. Hoje em dia temos analistas com excepcional capacidade técnica que questionam o que certas empresas varrem para debaixo do tapete. Primeiro é necessário um pouco de histórico para ver como surgiu tal fenômeno. O porque dessa escolha. Nada mais natural do que ver o quanto a empresa tem em caixa. Realmente é um barômetro que aponta para um forte teor ou plausibilidadede atratividade da empresa. Mas as vezes o fluxo de caixa, por ignorar precisamente despesas com capital (Capex) pode ter o seu equivalente no cotidiano de uma pessoa física. Ou seja, seria o seu fluxo de caixa (saldo bancário) contando com o equivalente aos fundos de um cheque especial. Essa escolha pelo EBITDA nos remete aos anos oitenta quando os EUA viveram o advento da instalação da infra-estrutura de cabos para as TVs. Esse setor acreditava que esses novos ativos estariam na realidade mantendo um valor constante, e não deveriam ser contabilizados como todo ativo tangível que deprecia ao longo do tempo. Daí acharem que o EBITDA era uma medida apropriada para tais empresas, exclusive tocando na depre- ciação, um ponto crítico. O vírus contábil espalhou-se, outros setores abraçaram tal medi- da, tanto que EBITDA virou sinônimo de fluxo de caixa. Nascia o aleijão. O resto são favas contadas. A Worldcom por exemplo, categorizou U$ 7 bilhões de despesas operacionais como Capex. Então a receita líquida da empresa estava superfaturada pois despesas operacionais foram “depreciadas” em escala anual, em vez de serem contabilizadas quando ocorreram. Vale lembrar que o nome já diz tudo, EBITDA é o caixa antes da depreciação. fevereiro 2006 • Revista RI • 17 EM PAUTA O fluxo de caixa livre já passa a ser uma fonte mais confiável, mas ainda assim certas empresas excluem deprecia- ção e Capex sub-repticiamente de tal medida. Mas no fim das contas, como bem diz o ex-CEO da Viacom, gigante da mídia americana, o fluxo de caixa livre mostra “quanto dinheiro a empresa possui para amortizar dívidas, iniciar aquisições ou programas de recompra de ações.” Alguma criatividade foi tentada ainda há pouco. Em 2003, a empresa USA Interactive anunciou planos, de acordo com uma matéria do Wall Street Journal, de calcular uma “re- ceita líquida de caixa” e dar maior importância a tal mé- trica se comparada a EBITDA. Esse cálculo ex- cluiria a contabilização de planos de opção de compra de ações e amortização de não-tangíveis. Ainda que tal amortização tenha seus mé- ritos, a primeira proposta é o cúmulo da leviandade, um crime perpetrado pelo Vale do Silício. Como é que a ou- torga de uma opção que é precificada no mercado não é considerada uma despesa? Certamente o diferencial ge- rado na hora da realização da compra da opção não vai para o caixa da empresa e sim para o bolso do abonado que recebeu tal “stock option”. Em tempo: A USA Interactive faliu. Assim que o EBITDA tornou-se muito atraente para empresas com altas despesas de capital. E realmente tem uma certa valia e vantagem para analistas de corporate finance e de fusões e aquisições. Vale a pena examiná-lo em outra época, os anos noven- ta. Um exemplo claro é o da gigantesca Nextel na virada do decênio que se foi. Em 1999, a empresa teve um prejuízo total de U$ 1.5 bi- lhões e um EBITDA de U$ 698 milhões. Se olharmos para o mesmo número em 1998, observamos um EBITDA de U$ 99 milhões. Ou seja, qualquer investidor pode ver, como diz Richard McCaffery do Motley Fool, que a empresa estava aumentando suas vendas de forma agressiva e que estava gerando mais receita. Mas gerar bem não é necessa- riamente gerir bem. Sempre há o outro lado da moeda, lite- ralmente. Como podemos ver com o exem- plo de outra grande empresa, em outra época, a então portentosa AT&T. Em 1998, seu EBITDA foi de U$ 13.5 bilhões, só que o Capex ficou em U$ 12.5 bilhões. As- sim, quem olhou só para o EBITDA foi o equivalente ao voyeur que compra a re- vista Playboy para ver modelos vestidas de terno e gravata. O guru Warren Buffet sempre preco- nizou enfiar Capex no EBITDA – ou qual- quer medida de fluxo de caixa - para os que gostam desse tipo de mensuração. Que também não inclui necessariamente pagamento de dívidas, capital de giro e variações de métodos contábeis. E apon- ta para algo mais sério, chamar EBITDA de fluxo de caixa não cola pois certos itens do fluxo de caixa não passam pelo crivo de itens do balancete. O fluxo de caixa livre é mais interessante e ganha mais adeptos, mas não conta com amortizações de dívidas. Melhor ainda a boa e velha receita operacional de onde se tosquiam itens importantes. E para empresas com risco sistêmico de potenci- ais encrencas contábeis, o analista deve começar a olhar para outras razões como a dívida sobre patrimônio líquido. Tanto a K-Mart como a Enron esta- vam com a razão D/PM variando de 0.8 a 1.4 numa escala que vai até 1.0. Um maior escrutínio a priori já daria para soar o alarme. Ainda assim a lupa deve sempre estar próxima, mes- mo olhando para razões como dívida sobre receita ou a já mencionada. A Bethlehem Steel antes da concordata tinha em seu balancete U$ 853 milhões de dívidas de longo-prazo. Mas lá também tinha U$ 2.6 bilhões eufemisticamente batizados de “passivos adicionais”. Assim é de doer de rir. No fim das contas, literalmente, os americanos sempre usaram a expressão de que querem ver o bottom-line de uma empresa. E a expressão advém precisamen- te da última linha dos demonstrativos fi- nanceiros, ou seja o lucro líquido. O quan- to sobrou depois de toda a receita ser esquartejada. Claro que isso é num dado momento da empresa e é imprescindível ficar de olho no fluxo de caixa, ou EBITDA. Mas se guiar só por ele, ou dar esse valor todo, principalmente em em- presas de setores maduros, não é reco- mendável. Melhor se preocupar com o bom e velho bottom-line. (*) FERNANDO G. CARNEIRO é analista de governança, e ex-diretor de parcerias estratégicas da ISS – Institutional Shareholder Services. (E-mail: fernandocrnr@yahoo.com) fevereiro 2006 • Revista RI • 17 “No fim das contas, literalmente, os americanos sempre usaram a expressão de que querem ver o bottom- line de uma empresa. E a expressão advém precisamente da última linha dos demonstrativos financeiros, ou seja o lucro líquido. O quanto sobrou depois de toda a receita ser esquartejada.” 18 • Revista RI • fevereiro 2006 ustentabilidadeS É RECOMENDÁVEL UMA PADRONIZAÇÃO DOS INDICADORES DE RESPONSABILIDADE CORPORATIVA E SUSTENTABILIDADE? Hoje se discute muito que as empresas apresentam o EBITDA sem uma padronização, o que dificulta a comparabilidade. Se olharmos para indicadores relacionados mais à questão comunitária, trabalhista, cultural e ambiental, será que pode ocorrer a mesma coisa? por Roberto Gonzalez* Imaginemos que estamos compa- rando duas tabelas do modelo Ibase de Balanço Social – encontradas no site www.balancosocial.org.br – de duas empresas de alimentos. No item 2, “Indicadores Sociais Internos (ISI)”, uma delas colocou todos os cursos, inclusive os de formação aca- dêmica no subitem, que podemos cha- mar de conta “Capacitação e De- senvolvimento Profissional”; a outra Relatório Anual consta uma nota explicativa a respeito desse assunto, mas no Balanço Social a tabela é replicada e não consta nenhuma nota explicativa. Como são dois documen- tos separados, isto pode gerar enten- dimento equivocado do leitor que ti- ver acesso apenas ao Balanço Social. A recomendação do Ibase é não inse- rir os recursos das leis de incentivos. os inseriu no subitem “Educação”. Pela recomendação do Ibase, a se- gunda empresa está correta. Infeliz- mente, esse é um acontecimento co- mum, cuja inversão de informações irá gerar distorções. Uma empresa inseriu no item 3, “Indicadores Sociais Externos”, no subitem “Cultura”, os valores oriun- dos de leis de incentivos à cultura; no fevereiro 2006 • Revista RI • 19 SUSTENTABILIDADE Imaginemos que duas empresas realizaram em dias diferentes even- tos em suas comunidades para fa- lar sobre sua estratégia no tocante à responsabilidade social. Um mês depois, um analista pergunta aos profissionais de Relações com In- vestidores (RIs) das duasempresas: “A inserção da sustentabilidade na estratégia da empresa foi divulgada para os públicos estratégicos?” Um responde que sim, pois no pensa- mento dele o evento abordou res- ponsabilidade social. O outro diz que não, pois julga que o evento não foi sobre sustentabilidade e, além do mais, não pode garantir que atingiu todos os públicos estratégicos, pen- sando que, talvez, a companhia de- vesse ter isso por escrito. Sendo as- sim, qual empresa está correta? O analista também perguntou aos RIs se a empresa possui programas de gerenciamento e/ou minimização dos impactos ambientais pós-consumo de seus produtos Ambas realizam este ato, mas somente em 50% dos produ- tos. Um RI responde que sim; o ou- tro, que não. Quem está correto? Uma empresa utiliza uma metodologia européia para medir as emissões atmosféricas, e outra do mesmo setor, uma metodologia ame- ricana que utiliza grandezas diferen- tes das européias. Como comparar dados construídos com metodologias diferentes? Ainda no Demonstrativo Ibase, no item 6, no subitem “Número To- tal de Acidentes no Trabalho”, uma empresa considerou apenas os aci- dentes ocorridos dentro de sua sede; a outra considerou, além desses, também os de trajeto. A segunda empresa está correta, pois é o que consta na legislação. No item 2, “Indicadores Sociais In- ternos (ISI)”, pode-se desenvolver o Índice de Participação do Encargo So- cial (IPES). Se os subitens do item 2, “Alimentação”, “Previdência Priva- da”, “Saúde, Segurança e Medicina do Trabalho” e “Outros”, não forem pre- enchidos corretamente, este índice não refletirá a realidade. ano de 2004, quando apresentados no relatório do ano de 2005, não são iguais. Isto ocorreu com cerca de 70% dos balanços sociais inscritos na 3º edição do Prêmio Balanço Social. Por isso, a auditoria do Balanço Social tor- na-se importante para o mercado fi- nanceiro, já que valida a utilização de seus dados. As empresas de audito- ria, ao auditarem os indicadores de sustentabilidade, devem levar em con- sideração as recomendações das en- tidades que formularam os modelos, como, por exemplo, o Ibase. Com o crescimento do número de fundos de Investimento Socialmen- te Responsável (ISR), o gestor e o analista têm de comparar as empre- sas em indicadores além dos eco- nômico-financeiros, por isso, é re- comendável que todas elas utilizem a mesma metodologia para apresen- tar o EBITDA. Além disso, deveri- am fazer o mesmo para todo e qual- quer tipo de indicador que o merca- do financeiro anseia utilizar. Até mesmo para a evolução da utiliza- ção de critérios sociais ambientais, comunitários, etc. para a cessão de crédito torna-se importante uma pa- dronização para compararmos “alho com alho”. Acredito que, assim que tivermos padronização, credibilidade e con- sistência das informações do Balan- ço Social, a periodicidade desses in- dicadores logo passará a ser trimes- tral (atualmente já existem empre- sas que o publicam trimestralmen- te) ampliando sua utilização pelo mercado financeiro. (*) ROBERTO GONZALEZ é assessor para assuntos de sustentabilidade da Presidência da Apimec-Nacional, diretor de Estratégia Social da CorpGroup - Comunicação Corporativa, membro do Conselho Deliberativo do ISE (Índice de Sustentabilidade Empresarial) e do comitê técnico brasileiro do GRI (Global Reporting Initiative), e professor em cursos de pós-gradução e graduação. (E-mail: roberto@corpgroup.com.br) Uma empresa colocou todo o in- vest imento em conscient ização ambiental dos profissionais e fami- liares como sendo da Operação, e outra do mesmo setor o colocou como sendo Não-relacionado à Ope- ração. Nesse caso, se fôssemos com- parar o Índice de Investimento em Meio Ambiente Não-operacional (IMNO) em relação ao Operacional, a comparação não seria correta, pois a base de dados não segue o mesmo princípio nas duas empresas. Outro fato preocupante é a incon- sistência dos dados. Como poucas em- presas auditam o Balanço Social, os números, por exemplo, do ano de 2004, que são apresentados no relatório do “Com o crescimento do número de fundos de Investimento Socialmente Responsável (ISR), o gestor e o analista têm de comparar as empresas em indicadores além dos econômico-financeiros, por isso, é recomendável que todas elas utilizem a mesma metodologia para apresentar o EBITDA.” fevereiro 2006 • Revista RI • 21 elhores práticasM NOVA RESPONSABILIDADE DO RI: ADMINISTRAÇÃO DE RISCOS Graças à Regulation FD, e outras novas e importantes exigências de disclosure, os praticantes de relações com investidores estão acrescentando uma nova dimensão às suas responsabilidades: Administração de Riscos. por William F. Mahoney A administração do processo de comu- nicação orientada para a comunidade de in- vestimentos continua sendo uma responsa- bilidade fundamental e primordial, mas ago- ra o esforço deve ser implementado dentro de um contexto de assegurar que qualquer risco de disclosure seja evitado. “Agora, o básico (para uma empresa) é administrar a Regulation FD”, comentou David P. Smeltzer, vice-presidente sênior e CFO da Acqua America, Inc., da Filadélfia, num recente seminário do NIRI. Na verdade, Smeltzer vai ao ponto de sugerir que a Regulation FD “mudou o pa- pel da RI, de administração das comunica- ções para administração de riscos”. Programa pró-ativo de RI Smeltzer e a Acqua acreditam firmemen- te na condução de um agressivo programa de comunicação. De fato, ele repetiu a anti- ga sabedoria convencional da RI de que “Ações são vendidas. Você deve tornar sua empresa mais atrativa do que tudo, contar sua história e buscar pessoas para comprar suas ações”. A Acqua trabalha duro na apresentação de sua história, freqüentemente através de reuniões com analistas e investidores, conference calls cuidado- samente orquestradas, reuniões one-on-one, parti- cipação em conferências organizadas por corretoras, um “Dia Anual da Empresa”, entre outras. Agora, ao conduzir todos esses programas e estar em constante contato com o mundo dos investimentos através de e-mails e telefonemas, os RIs devem “administrar o risco associado com o FD (Fair Disclosure) para que possamos con- tinuar as nossas comunicações abertas, continuar contando a nossa história”, disse Smeltzer. A equipe de RI da Acqua deve estar satisfeita com o entendimento disposto pela alta adminis- Ele também aprecia que a equipe de RI acompanhe previamente os disclosures, vis- to por Smeltzer como um elemento chave pra assegurar que a empresa não se enrole com a Reg FD. “É um jogo de administração de risco, e por isso é tão importante saber o que nós dissemos, para quem nós dissemos, especialmente com o guidance. Isso nos tor- na mais preparados para administrar os da- dos que estão sendo divulgados”. A Acqua prepara os scripts das suas con- ferências telefônicas, tal como a maioria das empresas nos dias de hoje. Smeltzer acredita que planejar as conferências beneficia o CFO e o RI, possibilitando que eles antecipem perguntas e pensem previamente suas res- postas. “Isso faz parte da administração da informação que nós vamos fornecer”. Foco sobre Guidance de Longo Prazo Smeltzer disse que a Acqua não fornece guidance baseado em números específicos. Ao invés, a empresa enfoca sobre o plano de longo prazo e como ele deve ser atingido. Fica por con- ta dos analistas e investidores “concluírem o que isso significa em termos trimestrais e anuais”. Nós não apresentamos guidance na base de tri- mestre a trimestre”. Mesmo assim, ele reconhece a utilidade de um guidance específico, mas disse: “Ele causa muitas coisas para manter o rumo”. Smeltzer e a equipe da alta administração da Acqua entendem o papel das relações com inves- tidores. “Todos precisam de todas as informa- ções que possam receber para decidirem se que-rem ter suas ações na carteira. “Uma comunidade bem informada é o ideal. Nós precisamos fazer tudo que for possível para continuar a produzir aquelas informações, enquan- to administramos os riscos associados a elas”. tração da empresa sobre a importância de manter o seu pessoal de relações com investidores o tem- po todo no circuito. Um lugar na mesa “Os RIs devem estar envolvidos no plano qüinqüenal, no orçamento, entender a empre- sa de baixo para cima, de forma que possam ver a evolução das tendências, entender onde se encontra a empresa, para que possam administrar as expectativas dos acionistas”, disse Smeltzer. Smeltzer quer que uma pessoa de RI esteja presente nas sessões one-on-one com analistas e investidores. Parece correto que o RI diga “Aca- bou o tempo”. É bom saber que eles estão dis- postos a participarem. É importante contar com um segundo par de olhos, muito embora eu acho que sei o que eu posso e não posso dizer”. 22 • Revista RI • fevereiro 2006 QUEM É O SEU ACIONISTA? “Conhecer o seu acionista é tão importante quanto conhecer o seu cliente. As estratégias empresariais devem estar apoiadas em um ambiente de compreensão mútua de interesses das empresas e todos os públicos que contribuem, ou de alguma forma interferem, nos destinos da empresa”. por Eduardo Werneck* As empresas costumam olhar o mercado, entendendo-o como um lo- cal onde produtores e consumidores de bens e serviços se encontram, di- retamente ou através de intermediá- rios, para realizar transações do in- teresse de ambas as partes. Entretanto, sob uma ótica mais abrangente, existe uma enorme gama de interesses que vai muito além da relação empresa/consumidor. Falan- do de alguns desses públicos, cita- mos os fornecedores com relação a quem as empresas assumem o pa- pel de consumidora; o setor público para quem as empresas pagam im- postos e recebem em troca serviços públicos; com relação à comunida- de ela oferece emprego e apoio co- munitário; para os investidores ofe- recem participação acionária ou re- cursos de empréstimos para finan- ciar seus programas de investimen- tos. Na verdade verificamos que uma empresa é mais do que uma cadeia produtiva, é uma teia de relações com di- versos públicos e o meio ambiente de onde extraímos os recursos naturais. Dependendo do público, as empresas podem usar formas diferenciadas de re- lacionamento a partir do entendimento de suas características e necessidades. Mas nem todos os princípios devem ser vis- tos de forma diferenciada, particularmente aqueles princípios que representam as raízes da postura corporativa no relacio- namento com clientes, acionistas, Conhecer pressupõe identificar e consultar A partir da definição dos prin- c íp ios de re lac ionamento , a corporação pode identificar, tal qual faz com seus clientes, qual o perfil desejado para seus acio- nistas, qual a estratégia de rela- cionamento adequada para esses acionistas e qual o sistema de in- formações adequado para que in- vestidores, acionistas e profissi- onais de investimentos assumam ou recomendem decisões de in- vestimentos. Dentro dessa estratégia, as empresas precisam ter sempre presentes em suas práticas não apenas sua obrigação de divul- gar os relatórios da administra- ção, balanços patrimoniais, seus resultados econômico-financei- ros e o balanço social, mas tam- bém o interesse de perguntar ao pú- blico investidor em geral e profissio- nais de investimentos: • o que eles consideram importante saber sobre as empresas - é funda- mental que as empresas conheçam o que os investidores e acionistas consideram importante em termos de informação. Se por exemplo, para determinadas empresas, os investi- dores priorizam informações sobre estratégias de inserção na economia global, as empresas devem dar mais T argeting fornecedores, profissionais, membros da comunidade, etc. Se as empresas ado- tam estratégias que valorizam no rela- cionamento, compromissos de longo prazo ou a adoção de uma postura éti- ca mais rigorosa, esses princípios bá- sicos de conduta devem valer também para todos os públicos. Quando falamos em mercado de ca- pitais, se a empresa adota um padrão de relacionamento para seu mercado consu- midor, este mesmo padrão deve pautar o relacionamento com seus acionistas. 22 • Revista RI • fevereiro 2006 fevereiro 2006 • Revista RI • 23 atenção para atendimento dessas informações. • o que eles precisam saber sobre as empresas - os investidores devem ser conscientizados sobre questões emergentes que os acionistas não conhecem por desinformação ou por serem questões ainda não incorpora- das aos modelos de precificação. Um claro exemplo desse tipo de informação diz respeito às mudan- ças climáticas, que estão tornando os riscos ambientais crescentes, podendo assim gerar a necessidade de rediscutir os fatores de custos corporativos e os planos de investi- mentos, em especial, com questões à eficiência energética e à transição para processos de produção mais limpos. • qual a propensão a aceitar um relacionamento de médio e longo prazo - trata-se de uma questão importantíssima para a empresa, pois esta resposta permitirá ajustar as diretrizes econômicas e de relacionamento com investidores aos propósitos de desejados. • o que eles desejam receber em troca - qual o retorno esperado pelo acionista, seja por valori- zação patrimonial ou por remu- neração do capital (dividendos ou juros). • quais os canais de relacionamen- to que os acionistas julgam mais apropriados para os seus interes- ses - reuniões de divulgação de resultados, internet, sistemas de atendimento ao acionista, vídeo conferência, etc. Um monitoramento constante da estrutura de relacionamento permite também que se faça também um acompanhamento da satisfação do acionista. • que outras empresas poderiam ser alternativas de investimentos - quais as empresas que podem representar, na mente do investi- dor ou gestor de carteira, alternativas de investimentos à sua empresa , ou seja, quem são seus potenciais “concorrentes” no mercado de ações. Consultar pressupõe compreender a diversidade de interesses Quando consultamos, recebemos respostas de visões e interesses diver- sos com relação a todas as questões acima colocadas como referências para relacionamento com os acionistas. Por isso é desejável que criemos uma visão segmentada do público de acionistas para aprofundar as diferentes necessi- dades de informações desses “diferen- tes acionistas”. Um exemplo de visão segmentada do público de acionistas pode ser visto a partir do nível de compromisso desse acionista para com a empresa, isto é, qual a curva de “compromisso ou lealdade” dos acionistas para com a corporação. Conhecer o grau de lealdade dos acionis- tas pressupõe identificar o seu perfil e os interesse de relacionamento, compra de ações e investimentos na empresa no: TARGETING • curto prazo - pouco propensos a compromissos de médio ou longo prazo, sendo portanto pouco exigentes quanto a informações mais qualificadas. Suas referências estão contidas na movimentação dos preços e liquidez das ações. • médio prazo - menos fieis mas propensos à ativação de negócios por prazos razoáveis, sendo um público sensível ao desempenho econômico financeiro. • longo prazo - mais fieis e adeptos de compromissos de longo prazo. Demandam informações mais estratégicas quanto aos objetivos de longo prazo e de postura de governança corporativa. Entender investidores e acionistas pe- los seus objetivos de investimentos e de- manda de informações pode ser muito útil para apoiar estratégias de captações de recursos e de ampliação da liquidez no mercado de capitais. Essas estratégias po- dem ter diferentes respostas dependen- do da curva de “lealdade” do acionista para com a empresa.
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