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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO AULA 05 1. Interpretação das normas jurídicas – Interpretar um texto significa extrair de seus signos lingüísticos um dado significado. A norma jurídica positiva é um conjunto de sinais representativos de um significado semântico, que pode receber influências variadas conforme o momento histórico em que se encontre, ou o meio social em que se insira. A lei, - como estudado anteriormente -, é, como regra, atemporal. Vigora permanentemente até que seja substituída por outra, ou se torne incompatível com o texto constitucional. Assim, sua interpretação pode variar conforme o tempo, conforme a necessidade histórica de gerações posteriores à que a produziu. Esta é apenas uma das razões que levam o jurista a interpretar a lei. A interpretação pressupõe a existência de lei acerca de um dado assunto. Só se interpreta aquilo que existe. Quando, para uma dada situação controvertida não exista leia respeito, fala-se em integração, a ser estudada adiante. 1.1. Métodos de interpretação - A ciência do Direito fornece ao intérprete uma série de métodos interpretativos para uma análise das normas jurídicas existentes: a) Método literal/gramatical – Parte de uma análise do significado léxico das palavras e expressões contidas na regra. O método gramatical, ou literal, busca dar ao texto uma interpretação. A falha apontada pela doutrina quanto ao método gramatical/literal está em que nem sempre o texto legal traduz a extensão exata das intenções do legislador. Ex: art. 890, §1º, CPC. b) Método sistemático – A norma jurídica faz parte de um sistema maior, composto por outras regras, princípios, os quais necessitam de uma coerência interna e uma visão holística. O método de interpretação sistemático (ou sistêmico) busca extrair da análise do sistema no qual a regra se insere a coerência e extensão do significado da mesma. Assim, e.g., a regra do art. 14 do Estatuto do Estrangeiro (que dispensa o prazo de domicílio em nosso país para o cônjuge de diplomata brasileiro em atividade, casado há mais de cinco anos) deve ser interpretada à luz do sistema jurídico, para permitir abranger a união estável. Da mesma forma, a regra do Código Penal (art. 237) que tipifica como crime o casamento em violação a impedimento matrimonial (as normas penais em branco necessitam de interpretação sistemática sempre). A interpretação sistêmica costuma ser internalizada, ou seja, tomar em consideração as influências e interpenetrações dos próprios ramos do direito, somente. Tal fato levou alguns doutrinadores (Paulo Nader) a apresentarem o denominado método lógico, o qual poderia ser angularizado de uma perspectiva interna (hipótese em que se confundiria com o método sistemático) e uma perspectiva externa (baseada na lógica dos fatos da vida, independente da visão do jurista sobre estes). Não parece o melhor entendimento. Afirmar o direito como um sistema não pressupõe um hermetismo absoluto. O método sistemático toma em consideração o sistema jurídico e suas influências do meio externo, quer de outras ciências interdisciplinares, quer de fatos decorrentes da lógica social comum. c) Método histórico – Toma em consideração as variações de significado com a evolução histórica da sociedade e da lei. A lei positiva não pode cristalizar o significado de seus conceitos previstos, sob pena de gessar a sociedade. Assim, determinadas expressões contidas na lei deverão ser avaliadas de acordo com o contexto histórico do momento, de forma a precisar-lhes o alcance. Ex: o art. 187, ao definir abuso de direito, fala em ‘usos e costumes locais’, o que flutua de acordo com o momento histórico/espacial. O método histórico de interpretação da lei, além disso, ajuda a compreender as razões históricas que levaram o legislador a optar por determinada decisão. Como exemplo, a Lei do Divórcio (lei. 6.515/77) criou a figura da separação judicial diante da necessidade histórica daquele momento em viabilizar sua aprovação, diante da resistência do setor anti-divorcista do Congresso. Desta forma, através de uma compreensão do fenômeno histórico no qual redundou o direito positivo, chega-se à compreensão de seu significado pretérito e atual (ex2: a adoção surge juridicamente na Antiguidade Clássica, quando os gregos primitivos cultuavam à linha ancestral paterna –os deuses lares ou penates -, como uma alternativa quando o homem não conseguia gerar descendentes). d) Método teleológico – Este método interpretativo analisa a lei com base em suas metas, suas perspectivas finalísiticas. Dentro daquilo que se almeja atingir com a elaboração da lei, busca-se aclarar seu sentido. Assim, e.g., uma regra inserida no CDC (lei 8.078/90) deverá ser interpretada dentro da perspectiva de proteger ao máximo os interesses do consumidor; uma lei penal sobre cumprimento de pena (por exemplo, quanto ao tempo necessário à mudança do regime de cumprimento) deverá tomar em consideração sua finalidade ressocializante. e) Método comparativo – Busca aqui uma análise da regra jurídica conforme o direito comparado, buscando em outros sistemas jurídicos interpretações aceitáveis dentro do nosso contexto social. Ex: as doutrinas das ações afirmativas (afirmative actions), que buscam, através de discriminações positivas, reduzir desigualdades sociais. 2. Integração da lei – O processo de integração se dá diante de lacuna legal (neste ponto não se podendo confundir com interpretação, que pressupõe lei existente). A lacuna deve ser preenchida, com recurso aos costumes, aos princípios gerais do Direito e à analogia (método de integração por meio do qual aplica-se a um determinado fato para o qual inexiste previsão legal regra que incida sobre caso semelhante). 3. Conflitos de leis (antinomia) – O conflito entre duas regras de direito denomina-se antinomia, havendo o ordenamento criado alguns critérios para a sua solução. De lembrar-se que, em ocorrendo conflito entre princípios jurídicos, aplica-se a denominada técnica de ponderação, no caso concreto, sem que desta técnica decorra exclusão do princípio afastado do ordenamento. 3.1. Critério hierárquico – Significa que a lei hierarquicamente mais alta afasta a aplicação da hierarquicamente inferior. Ex: Lei que se torne incompatível com a Constituição será afastada do ordenamento. 3.2. Critério da especialidade – A lei especial afasta a incidência da lei geral, SEM ENTRETANTO REVOGÁ-LA. A lei geral será aplicada de forma subsidiária. Ex: o CDC, naquilo que for mais benéfico, aplica-se às relações contratuais de consumo, afastando, naquelas relações, o CC, o qual será aplicado normalmente em contratos que não envolvam relação de consumo. 3.3. Critério de anterioridade – A lei POSTERIOR será aplicada, se regular os fatos previstos pela anterior. Note-se que é necessário que a regra mais recente tutele, expressa ou implicitamente, todas as situações previstas no diploma mais antigo, caso em contrário, haverá aplicação, ao menos parcial, da lei antiga. 4. Diálogo das Fontes - Esta denominação foi criada pelo jurista Erik Jayme para definir a situação em que diversos diplomas legais coexistem entre si, harmonicamente, com campos de aplicação coerentes e coordenados, mas não iguais. Inocorre aqui, a aplicação das regras de conflito de leis, portanto, não ocorrerá afastamento de uma regra, mas harmonização de duas regras oriundas de diplomas diversos, de forma a propiciar uma otimização das mesmas. Por exemplo, no que tange às relações de consumo, aplicam-se o CDC e os demais diplomas (Código Civil, Lei do Inquilinato, Lei dos Planos de Saúde, et coetera), concomitantemente, naquilo em que forem mais benéficos ao consumidor.Complementando a visão de Erik Jayme, Cláudia Lima Marques propõe três espécies de diálogo: a) Diálogo de coerência – Ocorre quando uma determinada lei serve de base conceitual para outra. Tal diálogo se encontra mais fortemente presente nas relações entre leis gerais e especiais. Assim, e.g., pode-se usar conceitos aplicados no Código Civil (boa- fé, função social do contrato, etc.) para servir de base conceitual a leis que regulamentem relações contratuais específicas (CDC, Lei de Locações, etc). b) Diálogo de complementariedade – Aqui, aplica-se primordialmente uma norma para, subsidiariamente (secundariamente), aplicarmos outro diploma legal. Ex: Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01) e o Código Civil (lei 10.406/2002) aplicam-se de forma complementar no que se refere ao direito real de superfície, previsto em ambos os diplomas legais. c) Diálogo de coordenação – Ocorre quando as influências dentre os diplomas legais aparentemente conflitantes são recíprocas, de forma a se aproveitar, de cada um deles, aquilo que melhor atenda a sua finalidade comum. Exemplo ISOLADO na doutrina (Alexandre Freitas Câmara) está no chamado microssistema dos Juizados Especiais Cíveis (leis 9.099/95 e 10.259/2001), que permite, na visão do jurista, ampliar o limite máximo do valor da causa nos JECs estaduais (cujo teto é de 40 salários mínimos) em virtude do diálogo com a lei posterior que regulamenta os JECs federais (cujo teto, por sua vez, é de 60 salários).
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