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2015 Org. Prof. Roberto Samuel Sanches UNISO – Universidade de Sorocaba Curso de Letras APOSTILA 1 – 2s2015 Ilustr. Abaporu. Tarsila do Amaral. 1928 Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas – 1. Modernismo UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 2 Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas Apostila 1 – Modernismo - Curso de Letras. 2s2015 –. atualiz 12.8.2015 Organiz. Prof. Roberto Samuel Sanches O modernismo. Vanguardas: futurismo; cubismo; expressionismo; dadaísmo A Semana de Arte Moderna de São Paulo 1a. fase do Modernismo: verde-amarelismo e anta; antropofagia: Oswald de Andrade Mário de Andrade Manuel Bandeira Menotti del Picchia Guilherme de Almeida Raul Bopp Cassiano Ricardo Alcântara Machado 2ª.fase do Modernismo: o romance de 30 Rachel de Queiroz Graciliano Ramos José Lins do Rego 1.O modernismo. Vanguardas: Um pouco antes da Semana de Arte Moderna, que ocorreu no Brasil em 1922, temos várias correntes artísticas (ou “ismos”), chamadas correntes de vanguarda, que ocorrem na Europa e que influenciam os nossos artistas do início do século XX. 1.1 Futurismo (arte em movimento): tem seu início com a publicação do Manifesto Futurista, do italiano Marinetti (Filippo Tommasio Marinetti), publicado no jornal parisiense Le Figaro, em 1909, que define o perfil ideológico do movimento. É uma verdadeira revolução literária, propondo: destruição da sintaxe e a disposição das palavras em liberdade; emprego dos verbos no infinitivo, objetivando a substantivação da linguagem; abolição dos adjetivos e dos advérbios; uso de substantivo duplo, em lugar do substantivo acompanhado de adjetivo (por ex.: praça-funil, mulher-golfo); abolição da pontuação, que seria substituída por sinais da matemática (+, -, ., :, =, >,<) e pelos sinais musicais ; destruição do eu psicologizante. Nem todas essas propostas se firmaram na literatura, mas o verso livre foi uma das maiores contribuições do futurismo e do cubismo para as correntes contemporâneas. Esse movimento também encontrou ecos na pintura e na escultura. Nas pinturas futuristas é comum a presença de elementos que sugerem a velocidade e a mecanização da vida moderna. Na literatura, dentre outros, encontramos ecos do futurismo na produção do norte- americano Walt Whitman, no poeta português Fernando Pessoa e nos poetas brasileiros Mário de Andrade e Oswald de Andrade. Vejamos um exemplo em Fernando Pessoa, com um trecho do poema Ode Triunfal: À dolorosa luz das grandes lâmpadas elétricas da fábrica Tenho febre e escrevo. Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto, Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos. Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno! UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 3 Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria! Em fúria dentro e fora de mim, Por todos os meus nervos dissecados fora, Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto! Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos, De vos ouvir demasiadamente perto, E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso De expressão de todas as minhas sensações, Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas! (...) Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime! Ser completo como uma máquina! Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo! Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto, Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento A todos os perfumes de óleos e calores e carvões Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável! (...) Ó automóveis apinhados de pândegos e de putas, Ó multidões quotidianas nem alegres nem tristes das ruas, Rio multicolor anônimo e onde eu me posso banhar como quereria! Ah, que vidas complexas, que coisas lá pelas casas de tudo isto! Ah, saber-lhes as vidas a todos, as dificuldades de dinheiro, As dissensões domésticas, os deboches que não se suspeitam, Os pensamentos que cada um tem a sós consigo no seu quarto E os gestos que faz quando ninguém pode ver! Não saber tudo isto é ignorar tudo, ó raiva, Ó raiva que como uma febre e um cio e uma fome Me põe a magro o rosto e me agita às vezes as mãos Em crispações absurdas em pleno meio das turbas Nas ruas cheias de encontrões! Ah, e a gente ordinária e suja, que parece sempre a mesma, Que emprega palavrões como palavras usuais, Cujos filhos roubam às portas das mercearias (...) Eia! eia! eia! Eia eletricidade, nervos doentes em Matéria! Eia telegrafia-sem-fios, simpatia metálica do Inconsciente! Eia túneis, eia canais, Panamá, Kiel, Suez! Eia todo o passado dentro do presente! Eia todo o futuro dentro de nós! eia! Eia! eia! eia! Frutos de ferro e útil da árvore-fábrica cosmopolita! Eia! eia! eia!-hô-ô-ô! Nem sei que existo para dentro, Giro, rodeio, engenho-me. Engatam-me em todos os comboios. Içam-me em todos os cais. Giro dentro das hélices de todos os navios. Eia! eia-hô eia! Eia! sou o calor mecânico e a eletricidade! Eia! e os rails e as casas de máquinas e a Europa! Eia e hurrah por mim-tudo e tudo, máquinas a trabalhar, eia! UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 4 Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá! Hup-lá, hup-lá, hup-lá-hô, hup-lá! Hé-lá! He-hô Ho-o-o-o-o! Z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z! Ah não ser eu toda a gente e toda a parte! Londres -6-1914 (PESSOA, Fernando. Obra Poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986.pp. 306/307) Vocab.: passento: diz-se de qualquer substância que é facilmente embebida em líquido. pândega: brincadeira, folgança, folia. Pândego: amigo ou partidário de folgança, de folia. Algumas pinturas do período do Futurismo: Giacomo.Balla. Dia de um trabalhador. 1904.Futurismo Giacomo Balla. Poste de iluminação. 1909. Inspirado no manifesto futurista de Marinetti. Essa pintura sobrepõe a modernidade da luz elétrica (lâmpada) ao romantismo da lua. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 5 Umberto Boccioni.Fábricas em Porta Romana.1909.Futurismo Umberto.Boccioni A cidade se levanta.1910..Futur. Sobre os pintores futuristas: http://hatfuturismo.blogspot.com/2008/05/principais-pintores-futuristas-e.html 1.2 Cubismo: O movimento cubista valoriza as formas geométricas; teve início na França, em 1907, com o quadro Les demoiselles d’ Avignon, do pintor espanhol Pablo Picasso. Em torno de Picasso e do poeta francês Apollinaire formou-se um grupo de artistas que cultivava as técnicas cubistas até o término da primeira guerra mundial, em 1918. Os pintores cubistas opõem-se à objetividade e à linearidade da arte renascentista e realista. Buscando novasexperiências com a perspectiva, procuram decompor os objetos representando-os em diferentes planos geométricos e ângulos retos, em espaços múltiplos e descontínuos, que se interceptam e se sucedem, de tal forma que o espectador, com o seu olhar, possa remontá-los e ter uma visão do todo, de face e de perfil, como se tivesse dado uma volta em torno deles. Outra técnica introduzida pelos cubistas é a colagem, que consiste em montar a obra a partir de diferentes materiais, como figuras de revistas, jornais, madeira, etc. Na literatura, essas técnicas da pintura correspondem à fragmentação da realidade, à superposição e simultaneidade de planos, por exemplo, reunião de assuntos aparentemente sem nexo, mistura de assuntos, espaços e tempos diferentes. O poeta Apollinaire realizou, com base na disposição espacial e gráfica do poema, experiências que despertaram grande interesse. No Brasil, nas décadas de 1950-60, essa técnica influenciaria o surgimento do Concretismo. Na literatura vemos as características: ilogismo, humor, anti-intelectualismo, instantaneísmo, linguagem predominantemente nominal. Os principais pintores cubistas europeus foram: Picasso, Léger, Braque, Gris e Delaunay; os principais escritores cubistas europeus foram: Apollinaire e Blaise Cendrars. (CEREJA, 2009.pp.401,402) Picasso. Les demoiselles d’ Avignon. (1907) [as mulheres da esquerda identificam-se com a cultura ibérica e as da direita demonstram influência da arte negra, UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 6 que o pintor vinha pesquisando] Picasso. Busto de mulher com chapéu azul. (1944). Cubismo mesclado com o exagero expressionista Picasso.Guernica.1937.retrata as atrocidades da Guerra Civil Espanhola. Hitler bombardeia a cidade de Guernica.Espanha http://www.infoescola.com/pintura/guernica/ Vicente.do.Rego.Monteiro.Goleiro.s.d.Cubismo UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 7 Vicente do Rego Monteiro. Mulher sentada. sd Na literatura as influências cubistas são notadas, por exemplo, em poemas de Oswald de Andrade, quando vemos a presença de elementos como a fragmentação da realidade, o predomínio de substantivos e flashes cinematográficos. Hípica Saltos records Cavalos da Penha Correm jóqueis de Higienópolis Os magnatas As meninas E a orquestra toca Chá Na sala de cocktails. (ANDRADE, Oswald de. Poesias reunidas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p.129) Na poesia pau-brasil, de Oswald de Andrade, vemos o uso da técnica de recorte e colagem, dos poemas-piada e sua recusa de sentimentalismo piegas: PAU-BRASIL Escapulário No Pão de Açúcar De Cada Dia Dai-nos Senhor A Poesia De Cada Dia A transação O fazendeiro criara filhos Escravos escravas Nos terreiros de pitangas e jabuticabas Mas um dia trocou O ouro da carne preta e musculosa As gabirobas e os coqueiros Os monjolos e os bois UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 8 Por terras imaginárias Onde nasceria a lavoura verde do café Relicário No baile da Corte Foi o Conde d’Eu quem disse Pra Dona Benvinda Que farinha de Suruí Pinga de Parati Fumo de Baependi É comê bebê pitá e caí Ditirambo Meu amor me ensinou a ser simples Como um largo de igreja Onde não há nem um sino Nem um lápis Nem uma sensualidade Traituba O sobrado parecia uma igreja Currais E uma e outra árvore Para amarrar os bois O pomar de toda fruta E a passarinhada Juá na roça de milho Carros de fumo puxados por 12 bois Codorna tucano perdiz araponga Jacu nhambu juriti (Pau-Brasil, Au Sans Pareil, Paris,1925) (CANDIDO,Antonio. Presença da Lit.Brasileira – III.São Paulo:Difusão Europeia do Livro, 1968.pp.80,81) Vejamos a presença de flashes cinematográficos, a superposição e simultaneidade de planos neste poema de Blaise Cendrars: Rio de Janeiro Uma luz deslumbrante inunda a atmosfera Uma luz tão colorida e tão fluida que os objetos toca Os rochedos cor-de-rosa O farol branco que os domina As cores do semáforo parecem liquefeitas E eis que agora eu sei o nome das montanhas que rodeiam essa baía maravilhosa O Gigante deitado A Gávea O Bico de Papagaio O Corcovado O Pão de Açúcar que os companheiros de Jean de Léry chamavam de Pote de Manteiga E as estranhas agulhas da Serra dos Órgãos Bom dia Vocês (CENDRARS, Blaise. Etc...Etc... (Um livro 100% Brasileiro). São Paulo: Perspectiva, 1977) 1.3 Expressionismo: liberdade de expressão do mundo interior Advém de um grupo de pintores que eram chamados de expressionistas na Alemanha e fauvistas na França. O objetivo desse grupo era combater o impressionismo. Curiosamente, era a tendência da qual eles provinham. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 9 O expressionismo, portanto, era uma corrente da pintura que valorizava a expressão, isto é, era uma arte sensorial e subjetiva quanto ao modo de captação da realidade. Na relação entre o artista impressionista e a realidade, o movimento de criação vai do mundo exterior para o mundo interior. No expressionismo ocorre o oposto: o movimento de criação parte da subjetividade do artista, do seu mundo interior, em direção ao mundo exterior. Assim, a obra de arte é reflexo direto de seu mundo interior e toda a atenção é dada à expressão, isto é, ao modo como forma e conteúdo livremente se unem para dar vazão às sensações do artista no momento da criação. Edvard Munch (norueguês) Karl Johan ao anoitecer. 1892. expression. Edvard Munch.norueguês.O grito.1893.expressionismo Poema que se relaciona ao quadro O grito, de Edvard Munch O Grito Estava andando pela estrada com dois amigos O sol se pondo com um céu vermelho sangue Senti uma brisa de melancolia e parei Paralisado, morto de cansaço… … meus amigos continuaram andando - eu continuei parado tremendo de ansiedade, senti o tremendo Grito da natureza Edvard Munch Entre os principais fundamentos do Expressionismo, podemos encontrar: A arte não é imitação, mas criação subjetiva, livre. A arte é expressão dos sentimentos. A razão é objeto de descrédito. A realidade que circunda o artista é horrível e, por isso, ele a deforma ou a elimina, criando a arte abstrata. A arte é criada sem obstáculos convencionais, o que representa um repúdio à repressão social. A intimidade e a vivência da dor derivam do sentido trágico da vida e causam uma deformação significativa, torturada. A arte se desvincula do conceito de belo e feio e torna-se uma forma de contestação. Na literatura, o expressionismo apresenta as seguintes características: UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1- Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 10 Linguagem fragmentada, elíptica, constituída por frases nominais (basicamente aglomerados de substantivos e adjetivos) às vezes até sem sujeito; despreocupação quanto à organização do texto em estrofes, ao emprego de rimas ou à musicalidade; combate à fome, à inércia e aos valores do mundo burguês. Artistas ligados ao expressionismo: Na pintura, temos os principais artistas expressionistas: Kandinski, Paul Klee, Chagall, Munch. Na arquitetura: Erich Mendelsohn. Na literatura: August Stramm, Kasimir Edschmid e, mais tarde, Herman Hesse e Thomas Mann. No teatro, Kayser e Brecht (fase inicial). Na música: Shoemberg. No cinema, Wiene. Vejamos um fragmento do poema expressionista O meu tempo, do poeta alemão Wilheim Klem: Cantos e metrópoles, lavinas febris, Terras descoradas, polos sem glória, Miséria, heróis e mulheres da escória, Sobrolhos espectrais, tumulto de carris. Soam ventoinhas em nuvens perdidas. Os livros são bruxas. Povos desconexos. A alma reduz-se a mínimos complexos. A arte está morta. As horas reduzidas. (Carris: sulcos deixados pelas rodas dos carros. Obs.: no dicionário Aurélio, consta apenas Lavina- cidade americana do estado de Montana ) No Brasil, os principais pintores que tiveram influência significativa do expressionismo foram: Anita Malfatti, Lasar Segall, Osvaldo Goeldi, Cândido Portinari. ANITA MALFATTI – 1989-1964 (com 30 anos de idade) Anita Malfatti. O homem de sete cores.1915-1916. Carvão e pastel-express. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 11 Anita Malfatti. O farol. 1917.expr. Anita Malfatti. A ventania.1915-1917.expr Anita Malfatti. O homem amarelo.1915-16.expr. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 12 Anita Malfatti. A estudante russa.1915-16.expr. Anita Malfatti. Retrato de Mário de Andrade. 1921-22 LASAR SEGALL (nasc.Lituânia/est.Alemanha/Brasil): UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 13 CÂNDIDO PORTINARI: (1903-Brodósqui-MG-1962) – produziu mais de 5000 obras: Retirantes.1944. C.Portinari. (faz parte do acervo do MASP) Cândido Portinari. Mestiço. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 14 Cândido Portinari.Criança morta.1944 Cândido Portinari. O lavrador de café. Cândido Portinari. Painéis na ONU. Guerra e Paz.1956. 140m2 cada UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 15 Cândido Portinari.A neta Denise com carneiro branco.1961 1.4 Dadaísmo – a antiarte É considerado o movimento artístico mais contestador da época. Surgiu em 1916, em Zurique, de um grupo de artistas que se reunia no Cabaret Voltaire que decide comunicar ao mundo suas inquietações, seu descontentamento, sua repulsa às atrocidades da I Guerra Mundial. A forma como o nome do movimento é dado: Tristan Tzara coloca uma espátula no dicionário Petit Larousse fechado e lê a primeira palavra que lhe salta aos olhos: DADA. O que quer dizer dada? Não tem sentido claro. É uma palavra tão vaga e imprecisa que pode significar, ao mesmo tempo, rabo de vaca sagrada, ama de leite, cavalo de pau ou mesmo uma palavra que parece ter saído da boca de um bebê: mama, papa, baba, dada. Profundamente niilistas (negativistas) , os dadaístas se propunham a varrer, a limpar o horizonte dos convencionalismos estéticos. Tudo acompanhado de um humor delirante, diante do qual a lógica não se mantinha mais de pé. Uma rebelião absoluta contra todas as formas de organização social, a fim de se libertarem de todas as heranças históricas. No seu primeiro manifesto apresentado em 1916, dentre outros, apresentam os seguintes princípios: Denúncia do quadro europeu das fraquezas; recusa do universo racionalista burguês; desmistificação da arte: a arte não é séria; nós escarramos na humanidade. Nessa época André Breton e Louis Aragon fundam a revista Littérature, em 1918, em Paris. Salvador Dali pronunciava conferências na Sorbonne com o pé direito dentro de um balde cheio de leite de jumenta. Marcel Duchamp batalha para expor a sua Fountain: um urinol masculino semelhante ao que ainda hoje é utilizado em muitos banheiros públicos masculinos. Com isto ele inventa a técnica dos ready made, que consiste em retirar um objeto de uso corrente de seu ambiente normal, para criar máquinas impossíveis de utilização inconcebível. Duchamp expôs também uma reprodução da Mona Lisa, decorada com um bigode e um jogo obsceno de palavras. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 16 Na Literatura, o Dadaísmo caracteriza-se pela agressividade, pela improvisação, pela desordem, pela rejeição a todo tipo de racionalização e equilíbrio, pela livre associação de palavras (técnica da escrita automática que seria mais tarde aproveitada também pelo Surrealismo) e pela invenção de palavras com base na exploração apenas do seu significante. Um exemplo é o poema fonético Die Schlacht (A batalha), de Ludwig Kassak: Berr... bum,bumbum,bum... Ssi...bum, papapa bum, bumm Zazzau...Dum, bum, bumbumbum Prä, prä, prä... Ra, hä-hä,AA... Hahol... Dentre os escritores dadaístas temos Tristan Tzara e André Breton que se desentenderam. Tzara insistia em manter a linha original do movimento e Breton, rompendo com o Dadaísmo, abandonou o grupo e criou o movimento surrealista, uma das principais correntes artísticas do século XX. Roda de Bicicleta. 1913.Marcel Duchamp.Museu de Arte Moderna de Nova Iorque Fonte. Marcel Duchamp. 1917(urinol invertido) UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 17 Para fazer um poema dadaísta (Tristan Tzara) Pegue um jornal. Pegue a tesoura. Escolha no jornal um artigo do tamanho que você deseja dar a seu poema. Recorte o artigo. Recorte em seguida com atenção algumas palavras que formam esse artigo e meta-as num saco. Agite suavemente. Tire em seguida cada pedaço um após o outro. Copie conscienciosamente na ordem em que elas são tiradas do saco. O poema se parecerá com você. E ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda que incompreendido do público. (apud.CEREJA,2009.p.452) Dentre os artistas brasileiros, que tiveram trabalhos com influência dadaísta, encontramos: Mário de Andrade – desvairismo – corrente que apresentou no prefácio de Paulicéia Desvairada Artes plásticas: Ligia Clark– bichos, esculturas de ferro montadas com dobradiças que propiciam uma manipulação por parte do espectador Hélio Oiticica – Apocalipopoteose – o nome da exposição (em 1968- Rio de Janeiro) está impregnado de ressonância dadaísta. Vejamos um pequeno trecho do Prefácio Interessantíssimo de Mário de Andrade, para comprovar o dadaísmo presente ( a continuidade do texto veremos quando estudarmos Mário de Andrade): Está fundado o Desvairismo. Este prefácio, apesar de interessante, inútil. Alguns dados. Nem todos. Sem conclusões. Para quem me aceita são inúteis amos. Os curiosos terão prazer em descobrir minhas conclusões, confrontando obra e dados. Para quem me rejeita trabalho perdido explicar o que, antes de ler, já não aceitou. Quando sinto a impulsão lírica escrevo sem pensar tudo o que meu inconsciente me grita. Penso depois: não só para corrigir, como para justificar o que escrevi. Daí a razão deste Prefácio Interessantíssimo. (...) Vejamos algumas obras de Lígia Clark, para percebermos um pouco dessa teoria na prática: Lygia Clark Plano 5.Lygia Clark (1957) Lygia Clark Pintora, escultora, auto-intitulou-se não-artista. Nasceu em Belo Horizonte, 1920. Em 1947 inicia-se na arte no Rio de Janeiro, sob orientação de Burle Marx. Em 1952, viaja a Paris e lá estuda com Léger e outros. Expõe em Paris e no Ministério de Educação e UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 18 Saúde, no Rio de Janeiro. Em 1954 integra o Grupo Frente. De 1954 a 58 desenvolve uma pintura de extração construtivista, restrita ao uso do branco e preto em tinta industrial. No ano de 1957, participa da I Exposição Nacional de Arte Concreta, no Ministério de Educação e Cultura no Rio de Janeiro. Em 1959, assina o Manifesto Neoconcreto. Desdobra gradualmente o plano em articulações tridimensionais, Casulos e Trepantes, onde vai se insinuando a participação do espectador. Participa da Exposição Neoconcreta no MAM - Rio. Em 1960, cria os Bichos, estruturas móveis de placas de metal que convidam à manipulação e a Obra- mole, pedaços de borracha laminada entrelaçados. A partir de meados da década de 60, prefere a poética do corpo apresentando proposições sensoriais e enfatizando a efemeridade do ato como única realidade existencial . De 1970 a 75 reside em Paris. Como professora na Sorbonne propõe exercícios de sensibilização, buscando a expressão gestual de conteúdos reprimidos e a liberação da imaginação criativa. No período de 1978 a 85 usa Objetos Relacionais com fins terapêuticos. Falece no Rio de Janeiro, em 1988. Texto base: http://www.artbr.com.br/casa/biografias/clark/ Lygia Clark.Escada.1961 Objeto articulado da série Bichos. 1960 O Dentro é o Fora . Lygia Clark (1963) Hélio Oiticica. (Rio de Janeiro-RJ-1937/1980) Artista performático, pintor e escultor. Inicia, com o irmão César Oiticica, estudos de pintura e desenho com Ivan Serpa no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ, em 1954. Participa do Grupo Frente e, passa a integrar o Grupo Neoconcreto. Abandona os trabalhos bidimensionais e cria relevos espaciais, bólides, capas, estandartes, tendas e penetráveis. Participa de inúmeras manifestações. Em 1968, realiza no Aterro do Flamengo a manifestação coletiva Apocalipopótese, da qual fazem parte seus Parangolés e os Ovos, de Lygia Pape. Em 1969, realiza na Whitechapel Gallery, em Londres, o que chama de Whitechapel Experience, apresentando o projeto Éden. Vive em Nova York na maior parte da década de 1970, período no qual é bolsista da Fundação Guggenheim e participa da mostra Information, no Museum of Modern Art - MoMA. Retorna ao Brasil em 1978. Após seu falecimento, é criado, em 1981, no Rio de Janeiro o Projeto Hélio Oiticica, destinado a preservar sua obra. Em 2009 um incêndio na residência de César Oiticica, destrói parte do acervo de Hélio Oiticica. Helio tinha caráter experimental e inovador. Seus experimentos pressupõem ativa participação do público, acompanhados de elaborações teóricas, comumente com a utilização de textos, comentários e poemas. Com as Invenções, de 1959, o artista marca o início da transição da tela para o espaço ambiental, o que ocorre nesse ano com os Bilaterais - chapas monocromáticas pintadas com têmpera ou óleo e suspensas por fios de nylon - e os Relevos Espaciais, suas primeiras obras tridimensionais. Nessa época produz textos sobre seu trabalho, sobre a arte construtiva e as experiências de Lygia UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 19 Clark. Embora não tenha participado da 1ª Exposição Neoconcreta nem assinado o Manifesto Neoconcreto, em 1960 participa da 2ª Exposição Neoconcreta no Rio de Janeiro e pensa sua produção em relação à Teoria do Não-Objeto, de Ferreira Gullar. Em 1961 constrói uma maquete de seu primeiro labirinto, o Projeto Cães de Caça, onde se utiliza do Poema Enterrado, de Ferreira Gullar e o Teatro Integral, de Reynaldo Jardim. Posteriormente colabora com a Escola de Samba Mangueira, do Rio de Janeiro, montando o projeto Parangolés, em que utilizando-se de estandartes, tendas, capas de vestir e outras vestimentas, funde elementos de cor, dança, poesia e música. A partir disso, desenvolve outras manifestações ambientais, dentre elas as obras Tropicália, 1967; Apocalipopótese, 1968 e Éden, 1969. É depois dessa época que Caetano Veloso se utiliza do termo Tropicália para uma de suas músicas e que acaba motivando um movimento artístico. São inúmeras as suas proposições abertas para a participação de vivências individuais e coletivas em suas obras, em que a escultura, pintura, música, literatura, encontram-se no mesmo espaço, interligando-se. Em 1980, ano de sua morte, ainda continuava atuando com suas propostas artísticas. Texto base: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=artistas_biografia&cd_verbete=2020 Se quiser saber mais sobre o Poema Enterrado, de Ferreira Gullar, veja no endereço: http://ardotempo.blogs.sapo.pt/382107.html E se quiser ver o vídeo em que F.Gullar trata do assunto: http://bezerraguimaraes.blogspot.com.br/2010/10/o-poema-enterrado-valeu-uma-febre- de.html Hélio Oiticica. Penetráveis: http://www.youtube.com/watch?v=_vI7lk_0xPc Helio Oiticica. Parangolés: Helio Oiticica. Pintura sem tela. Intertextualidade: UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 20 O mundo de Lygia Clark: http://lygiaclarkterceirob.blogspot.com.br/ A obra de Lygia Clark e a de Oiticica contribuindo para a moda de vestuário: http://fashionnotebook.wordpress.com/2009/06/23/julia-valle/ Observe-se a intertextualidade: No que a literatura, a escultura e a dança podem ter em comum. Num seminário realizado pelo SESC, discute-se a modernidade/contemporaneidade de Helio Oiticica/ Lígia Clark e a dança butô. Mesmo tendo sido criada tão distante, no Japão, perto de 1960, poderiam ter traços comuns: A Revolta da Carne – Diálogos: Brasil/Japão: http://www.colheradacultural.com.br/print.news.php?register=20090801233336.000§ion=5&type=M Outras fontes e pesquisa: http://www.infoescola.com/biografias/lygia-clark/ 1.5 O surrealismo – o combate à razão O movimento surrealista teve início na França com a publicação do Manifesto Surrealista (1924) de André Breton, que tinha sido psicanalista eprocurava unir arte e psicanálise. Diversos pintores aderiram ao movimento surrealista que teve duas linhas de atuação no seu início: as experiências criadoras automáticas e o imaginário extraído do sonho. Freud, na psicanálise e Bergson, na Filosofia, já haviam destacado a importância do mundo interior do ser humano, as zonas desconhecidas ou pouco conhecidas da mente humana. Encaravam o inconsciente, o subconsciente e a intuição como fontes inesgotáveis e superiores de conhecimento do homem, pondo em segundo plano o pensamento sensível, racional e consciente. O automatismo artístico consiste em extravasar sem nenhum controle da razão ou do pensamento os impulsos criadores do subconsciente. O artista, ao proceder assim, põe na tela ou no papel seus desejos interiores profundos, sem se importar com coerência, significados, adequação, etc. Na literatura, esse procedimento recebeu o nome de escrita automática. (CEREJA, 2009,p.405) O sonho, como manifestação oculta da mente, entra no universo da arte. Os surrealistas buscam uma arte livre da razão, procurando trazer as imagens do inconsciente e do subconsciente para a tela, para a literatura, como se o artista estivesse sonhando acordado. Portanto, são frequentes o ilogismo, o devaneio, o sonho, a loucura, a hipnose, o humor negro, as imagens surpreendentes, o impacto do inusitado, a livre expressão dos impulsos, etc. Na literatura, podemos encontrar André Breton e Louis Aragon; no teatro Antonin Artaud; nas artes plásticas Salvador Dalí, Max Ernst, Joan Miró; no cinema o cineasta espanhol Luis Buñuel é a maior expressão. Ele criou, com Salvador Dalí, o roteiro dos primeiros filmes surrealistas, dentre eles O cão andaluz e Idade de Ouro, em 1929. O fato de o surrelismo rejeitar o mundo burguês, racional, mercantil e moralista facilitou para que vários de seus seguidores tivessem ligação com o comunismo. Eles acreditavam que para alcançar os objetivos do movimento: amor, liberdade e poesia, era necessária uma transformação radical da sociedade. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 21 Salvador Dali. No Brasil, vários escritores foram influenciados pelas ideias surrealistas, como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Murilo Mendes e Jorge de Lima. Por exemplo, algumas das características surrealistas, como o ilogismo, o absurdo, as imagens surpreendentes, a atmosfera onírica, podem ser observadas nestes poemas de Murilo Mendes: Pré-história Mamãe vestida de rendas Tocava piano no caos Uma noite abriu as asas Cansada de tanto som, Equilibrou-se no azul, De tonta não mais olhou UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 22 Para mim, para ninguém! Cai no álbum de retratos. Descanso 1 Brinco facilmente com as esfinges, Com o oráculo, a sibila e o turbilhão. Também as costureiras me comovem E o trabalhador que voltando da oficina Senta-se à soleira da porta Enquanto os filhos fazem uma roda e cantam: “Eu sou pobre, pobre, pobre...” 2 Vejo as horas numa camélia. Pintei um quadro no escuro. (CANDIDO,1968.pp.188 e192) Bibliografia Modernismo Vanguardas: CANDIDO, Antonio. Presença da Lit.Brasileira – III.São Paulo:Difusão Européia do Livro, 1968. RODRIGUES, A.Medina e outros. Antologia da Literatura Brasileira. O modernismo.v.II. São Paulo: Marco, 1979. http://www.infoescola.com/pintura/guernica/ Obs.: O filme Poucas Cinzas, de Paul Morrison, retrata um pouco da vida de Salvador Dali, Federico Garcia Lorca e Luis Buñuel. MODERNISMO BRASILEIRO A VANGUARDA BRASILEIRA Considera-se que o início oficial do Modernismo Brasileiro é em 1922, com a Semana de Arte Moderna . Porém, desde a década de 1910 já vinham ocorrendo manifestações artísticas de um grupo que formava a vanguarda modernista brasileira, entre eles estavam os escritores Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Ronald de Carvalho, Manuel Bandeira, Juó Bananere (pseudônimo de Alexandre Marcondes Machado) e dos pintores Anita Malfatti e Di Cavalcanti. Outros fatos precederam a Semana de Arte Moderna dentre eles: a criação da revista de artes O Pirralho, dirigida por Oswald de Andrade e Emílio de Menezes, em 1911; a exposição de obras do pintor russo Lasar Segall, em 1913; a participação do brasileiro Ronald de Carvalho, em 1915, na fundação da revista Orpheu (que deu início ao Modernismo em Portugal); a publicação, em 1917, de várias obras de poesia, entre elas, Há uma gota de sangue em cada poema, de Mário de Andrade ( que utilizou o pseudônimo de Mário Sobral), e A cinza das horas, de Manuel Bandeira. Nesse contexto, o fato considerado mais importante foi a exposição da pintora paulista Anita Malfatti, realizada em 1917, que provocou uma forte reação do escritor e crítico do jornal O Estado de S.Paulo, Monteiro Lobato, que após visitá-la escreveu violenta crítica intitulada Paranoia ou mistificação? Vejamos esse artigo: Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que veem normalmente as coisas e em consequência disso fazem arte pura, guardando os eternos ritmos da vida, e adotados para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres. Quem trilha por esta senda, se tem gênio, é Praxíteles na Grécia, é Rafael na Itália, é UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 23 Rembrandt na Holanda, é Rubens na Flandres, é Reynolds na Inglaterra, é Leubach na Alemanha, é Iorn na Suécia, é Rodin na França, é Zuloaga na Espanha. Se tem apenas talento, vai engrossar a plêiade de satélites que gravitam em torno daqueles sóis imorredouros. A outra espécie é formada pelos que veem anormalmente a natureza, e interpretam- na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência: são frutos de fins de estação, bichados ao nascedouro. Estrelas cadentes, brilham um instante, as mais das vezes com a luz do escândalo, e somem- se logo nas trevas do esquecimento. Embora eles se deem como novos precursores duma arte a vir, nada é mais velho do que a arte anormal ou teratológica: nasceu com a paranoia e com a mistificação. De há muito já que a estudam os psiquiatras em seus tratados, documentando-se nos inúmeros desenhos que ornam as paredes internas dos manicômios. A única diferença reside em que nos manicômios esta arte é sincera, produto ilógico de cérebros transtornados pelas mais estranhas psicoses; e fora deles, nas exposições públicas, zabumbadas pela imprensa e absorvidas por americanos malucos, não há sinceridade nenhuma, nem nenhuma lógica, sendo mistificação pura. Todas as artes são regidas por princípios imutáveis, leis fundamentais que não dependem do tempo nem da latitude. As medidas de proporção e equilíbrio, na forma ou na cor, decorrem do que chamamos sentir. Quando as sensações do mundo externo transformam-se em impressões cerebrais, nós "sentimos"; para que sintamos de maneira diversa, cúbica ou futurista, é forçoso ou que a harmonia do universo sofra completa alteração, ou que o nosso cérebro esteja em "pane" por virtude de alguma grave lesão. Enquanto a percepção sensorial se fizer normalmenteno homem, através da porta comum dos cinco sentidos, um artista diante de um gato não poderá "sentir" senão um gato, e é falsa a "interpretação" que do bichano fizer um "totó", um escaravelho, um amontoado de cubos transparentes. Estas considerações são provocadas pela exposição da Sra. Malfatti, onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia. Essa artista possui um talento vigoroso, fora do comum. Poucas vezes, através de uma obra torcida para má direção, se notam tantas e tão preciosas qualidades latentes. Percebe-se de qualquer daqueles quadrinhos como a sua autora é independente, como é original, como é inventiva, em que alto grau possui um sem-número de qualidades inatas e adquiridas das mais fecundas para construir uma sólida individualidade artística. Entretanto, seduzida pelas teorias do que ela chama arte moderna, penetrou nos domínios dum impressionismo discutibilíssimo, e põe todo o seu talento a serviço duma nova espécie de caricatura. Sejamos sinceros: futurismo, cubismo, impressionismo e tutti quanti não passam de outros tantos ramos da arte caricatural. É a extensão da caricatura a regiões onde não havia até agora penetrado. Caricatura da cor, caricatura da forma - caricatura que não visa, como a primitiva, ressaltar uma ideia cômica, mas sim desnortear, aparvalhar o espectador. A fisionomia de quem sai de uma dessas exposições é das mais sugestivas. Nenhuma impressão de prazer, ou de beleza, denunciam as caras; em todas, porém, se lê o desapontamento de quem está incerto, duvidoso de si próprio e dos outros, incapaz de raciocinar, e muito desconfiado de que o mistificam habilmente. Outros, certos críticos sobretudo, aproveitam a vaza para épater les bourgeois. Teorizam aquilo com grande dispêndio de palavrório técnico, descobrem nas telas intenções e subintenções inacessíveis ao vulgo, justificam-nas com a independência de interpretação do artista e concluem que o público é uma cavalgadura e eles, os entendidos, um pugilo genial de iniciados da Estética Oculta. No fundo, riem-se uns dos outros, o artista do crítico, o crítico do pintor, e o público de ambos. Há de ter essa artista ouvido numerosos elogios à sua nova atitude estética. Há de irritar-lhe os ouvidos, como descortês impertinência, esta voz sincera que vem quebrar a harmonia de um coro de lisonjas. Entretanto, se refletir um bocado, verá que a lisonja mata e a sinceridade salva. O verdadeiro amigo de um artista não é aquele que o entontece de louvores e sim o que lhe dá uma opinião sincera, embora dura, e lhe traduz chãmente, sem reservas, o que todos pensam dele por detrás. Os homens têm o vezo de não tomar a sério as mulheres. Essa é a razão de lhes darem sempre amabilidades quando pedem opiniões. Tal cavalheirismo é falso, e sobre falso, nocivo. Quantos talentos de primeira água se não transviaram arrastados por maus caminhos pelo elogio incondicional e mentiroso? Se víssemos na Sra. Malfatti apenas "uma moça que pinta", como há centenas por aí, sem denunciar centelha de talento, calar-nos-íamos, ou talvez lhe déssemos meia dúzia desses adjetivos "bombons", que a crítica açucarada tem sempre à mão em se tratando de moças. Julgamo-la, porém, merecedora da alta homenagem que é tomar a sério o seu talento dando a respeito da sua arte uma opinião sinceríssima, e valiosa pelo fato de ser o reflexo da opinião do público sensato, dos críticos, dos amadores, dos artistas seus colegas e... dos seus apologistas. Dos seus apologistas sim, porque também eles pensam deste modo... por trás. Paranoia ou mistificação? : http://www.artelivre.net/html/literatura/al_literatura_paranoia_ou_mistificacao.htm ÉPATER LES BOURGEOIS - Expressão francesa que pode ser traduzida de forma livre por “chocar os burgueses”, atitude literária que encontramos sobretudo a partir da segunda metade do século XIX, quando os poetas decadentistas declararam guerra às convenções da sociedade burguesa, no que foram seguidos pelo novo impulso do romance naturalista e realista, a partir de Flaubert e Zola. A expressão é geralmente atribuída a Baudelaire, que a tomou como um programa de vida e da própria literatura, que devia apontar a mira a todos os burgueses ricos, conservadores e acomodados. O modus vivendi que propunham em alternativa era a boêmia e o culto da arte sem os atavios burgueses. Os movimentos de UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 24 vanguarda do século XX —dada, futurismo e surrealismo, em especial — seguiram o mesmo programa, desafiando os gostos literários estabelecidos. In: http://www.edtl.com.pt/?option=com_mtree&task=viewlink&link_id=988&Itemid=2 tutti quanti: todo mundo Dentre os autores que estavam escrevendo no contexto de São Paulo, encontramos uma figura bastante interessante, o Juó Bananére: Juó Bananére Alexandre Marcondes Machado, que assinava com o pseudônimo Juó Bananère, foi um poeta paulista que escrevia no patois (forma de linguagem local) falado pela colônia italiana que morava em São Paulo, principalmente no Brás, Bela Vista, Bom Retiro e outros cantos da cidade, na década de 1920. Seus escritos no dialeto macarrônico (em mais de um sentido) foram publicados no periódico O Pirralho e depois reunidos no livro La divina increnca, onde aparecem muitas paródias de textos de autores brasileiros. Abaixo, alguns dos textos que retirei da edição de 1925. Na capa do seu livro La Divina Increnca, aparece: Juó Bananére. Candidato á Gademia Baolista de Letras. Círgolo Viziozo Prú Maxado di Assizi O Hermeze um di aparlô: - Se io éra aquilla rosa Che está pindurada Nu gabello da mia anamurada, Uh! Che brutta cavaco! I o gaxorigno pigô di dizê: - Se io fossi o Piedadô, Era molto maise bô! Ma o Garonello disse tambê Triste come um giaburú: - Che bô si io fosse o Dudú! (BANANERE. 1925, p.5) MIGNA TERRA Migna terra tê parmeras, Che canta inzima o sabiá. As aves che stó aqui, També tuttos sabi gorgeá. A abobora celestia tambê, Che tê lá na migna terra, Tê moltos millió di strella Che non tê na Ingraterra. Os rios lá sô maise grandi UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 25 Dus rio di tuttas naçó; I os matto si perdi di vista, Nu meio da imensidó. Na migna terra tê parmeras Dove ganta a galligna dangola; Na migna terra tê o Vap’relli, Chi só anda di gartolla. (BANANERE,1925,p.8) Amore co amore si paga Pra Migna Anamurada Xiguê, xigaste! Vigna afatigada i triste I triste i afatigada io vigna; Tu tigna a arma povolada di sogno, I a arma povolada di sogno io tigna. Ti ame, m’amasti! Bunitigno io era I tu tambê era bunitigna; Tu tigna uma garigna di fera E io di fera tigna uma garigna. Una veiz ti begiê a linda mó, I a migna tambê vucê begió. Vucê mi apisô nu pé, e io non pise no da signora. Moltos abbraccio mi deu vucê, Moltos abbraccio io tambê ti dê. U fora vucê mi deu, e io tambê ti dê u fóra. (BANANERE,1925,p.11) Os meus Otto annoO Chi sodades che io tegno D'aquillo gustoso tempigno, Ch'io stava o tempo intirigno Brincando c'oas mulecada. Che brutta insgugliambaçó, Che troça, che bringadêra, Imbaxo das bananêra, Na sombra dus bambuzá. Che sbornia, che pagodêra, Che pandiga che arrelía, a genti sempre afazia No largo d'Abaxo o Piques. Passava os dia i as notte Brincando di scondi-scondi, I atrepáno nus bondi, Bulino c'os conduttore. Deitava sempre di notte, i alivantava cidigno. Uguali d'un passarigno, Allegro i cuntento da vita. Bibia un caffè ligêro, Pigava a penna i o tintêro Iva curréno p'ra scuóla. Na scuóla io non ligava! nunga prestava tençó, Né nunga sapia a liçó. O professore, furioso, C'oa vadiação ch'io faceva, Mi dava discompostura; Ma io era garadura I non ligava p'ra elli. Inveiz di afazê a liçó, Passava a aula intirigna, Fazéno i giogáno boligna Ingoppa a gabeza dos ôtro. O professore gridava, Mi dava un puxó de oreglio, I mi butava di gioeglio Inzima d'un grão di milio. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 26 Di tardi xigava in gaza, Comia come un danato, Puxava u rabbo du gatto, Giudiava du gaxorigno, Bulia co'a guzignêra, Brigava c'oa migna ermã; I migna mái p'rá cabá, Mi dava una brutta sova. Na rua, na visinhança, Io era mesmo un castigo! Ninguê puteva commigo! Bulia con chi passava, Quebrava tuttas vidraça, I giunto co Bascualino Rubava nus botteghino, A aranxia pera du Rio. Vivia amuntado nus muro, Trepado nas larangiêra; I sempre ista bringadêra Cabava n'un brutto tombo. Mas io éra incorrigive, I logo nu otro dia, Ricominciava a relia, Gaía traveis di novo! A migna gaza vivia Xiigna di genti, assim!!... Che iva dá parti di mim. Sembrava c'un gabinetto Di quexa i regramaçó. Mei páio, pobre goitado, Vivia atrapagliado P'ra si livrá dos quexozo. I assi di relia in relia, Passê tutta infança migna, A migna infança intirigna. Che tempo mais gotuba, Che brutta insgugliambaçó, Che troça, che bringadêra, Imbaxo das bananêra, Na sombra dus bambuzá! (BANANERE, 1925.p.33-36) BANANERE, Juó. La Divina Increnca. São Paulo: Livraria do Globo. 1925 Se quiser ler o livro todo eis o endereço: http://bananere.art.br/increnca.html Escadaria na entrada interna do Teatro Municipal de São Paulo fotos Roberto Samuel A SEMANA DE ARTE MODERNA DE SÃO PAULO Idealizada por um grupo de artistas, a Semana de Arte pretendia colocar a cultura brasileira a par das correntes de vanguarda do pensamento europeu, ao mesmo tempo em que pregava a tomada de consciência da realidade brasileira. O Movimento não deve ser visto apenas do ponto de vista artístico, como recomendam os historiadores e críticos especializados em história da literatura brasileira, mas também como um movimento político e social. O país estava dividido entre o rural e o urbano. Mas o bloco urbano não era homogêneo. As principais cidades brasileiras, em particular São Paulo, conheciam uma rápida transformação como consequência do processo industrial. A primeira Guerra Mundial foi a responsável pelo primeiro surto de industrialização e consequente urbanização. O Brasil contava com 3.358 indústrias em 1907. Em 1920, esse número pulou para 13.336. Isso significou o surgimento de uma burguesia industrial cada dia mais forte, mas UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 27 marginalizada pela política econômica do governo federal, voltada para a produção e exportação do café. Ao lado disso, o número de imigrantes europeus crescia consideravelmente, especialmente os italianos, distribuindo-se entre as zonas produtoras de café e as zonas urbanas, onde estavam as indústrias. De 1903 a 1914, o Brasil recebeu nada menos que 1,5 milhão de imigrantes. Nos centros urbanos criou-se uma faixa considerável de população espremida pelos barões do café e pela alta burguesia, de um lado, e pelo operariado, de outro. Surge a pequena burguesia, formada por funcionários públicos, comerciantes, profissionais liberais e militares, entre outros, criando uma massa politicamente "barulhenta" e reivindicatória. A falta de homogeneidade no bloco urbano tem origem em alguns aspectos do comportamento do operariado. Os imigrantes de origem europeia trazem suas experiências de luta de classes. Em geral esses trabalhadores eram anarquistas e suas ações resultavam, quase sempre, em greves e tensões sociais de toda sorte, entre 1905 e 1917. Um ano depois, quando ocorreu a Revolução Russa, os artigos a esse respeito, na imprensa, tornaram-se cada vez mais comuns. O partido comunista foi fundado em 1922. Desde então, ocorreria o declínio da influência anarquista no movimento operário. Dessa forma, circulavam pelas ruas da cidade de São Paulo, num mesmo espaço, um barão do café, um operário anarquista, um padre, um burguês, um nordestino, um professor, um negro, um comerciante, um advogado, um militar, etc., formando aquela pauliceia desvairada tão comentada por Mário de Andrade, em sua obra. Esse contexto era o ideal para a realização de um evento que mostrasse uma arte inovadora para romper com as velhas estruturas literárias vigentes no país. Não se sabe bem ao certo de quem partiu a ideia da realização da Semana de Arte Moderna, contudo há registro de que Oswald de Andrade prometera para 1922 , que seria o ano do centenário da Independência, uma ação dos artistas novos que fizesse valer o Centenário. Em verdade, em 1921, o grupo modernista que realizaria a Semana estava organizado e amadurecido para o evento, quando chegou da Europa o consagrado escritor e membro da Academia Brasileira de Letras, Graça Aranha. Entusiasmado com as vanguardas artísticas que conhecera na Europa, Graça Aranha apoiou o grupo paulista, dando-lhes o impulso necessário. Cartaz da Semana de Arte Moderna Catálogo da Semana de Arte Moderna de São Paulo UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 28 Vitoria. Victor Brecheret.1919/21. Cartaz anunciando o último dia da Semana fez parte da Expo de Arte Moderna Verdadeiramente a Semana de Arte Moderna realizou-se em 3 apresentações no Teatro Municipal de São Paulo, nos dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, com a participação de artistas de São Paulo e Rio de Janeiro. Durante a semana toda, o saguão do Teatro Municipal esteve aberto para o público, para a exposição de artes plásticas com obras de Anita Malfatti, Vicente do Rego Monteiro, Zina Aita, Di Cavalcanti, Harberg, Brecheret, Ferrignac e Antonio Moya. Nas noites dos dias 13, 15 e 17 realizaram-se os saraus com apresentação de conferências, leitura de poemas, dança e música. 13 de fevereiro - A primeira noite foi aberta com a conferência de Graça Aranha, intitulada A emoção estética na arte moderna, na qual o escritor pré-modernista, em linguagem tradicional e acadêmica, manifestou seu apoio à arte moderna. Logo após a sua conferência foram apresentados poemas, por Guilherme de Almeida e Ronald de Carvalho, e execução de músicas de Ernâni Braga e Villa-Lobos. Também houve uma conferência de Ronald de Carvalhoque falou sobre A pintura e a escultura moderna no Brasil 15 de fevereiro - A segunda noite foi a mais importante e a mais tumultuada das três noites. Foi aberta por Menotti del Picchia com uma conferência em que negava a filiação do grupo modernista ao futurismo de Marinetti, mas defendia a integração da poesia com os tempos modernos, a liberdade de criação e, ao mesmo tempo, a criação de uma arte genuinamente brasileira. Quando se iniciou a leitura de poemas e fragmentos de prosa, a plateia teve reações ruidosas, ora vaiando, latindo, gritando, ora aplaudindo. Os autores presentes nessa noite foram: Guilherme de Almeida, Ronald de Carvalho, Elísio de Carvalho, Oswald de Andrade, Renato Almeida, Luís Aranha, Mário de Andrade, Agenor Barbosa, Moacir de Abreu, Rodrigues de Almeida e Sérgio Milliet. Manuel Bandeira e Ribeiro Couto, que moravam no Rio de janeiro, mandaram poemas para que fossem lidos. No intervalo entre uma e outra parte do programa, na escadaria do hall de entrada do teatro, Mário de Andrade fez, em meio a caçoadas e ofensas, uma pequena palestra sobre as artes plásticas ali expostas. Vinte anos depois, Mário de Andrade definiu esse episódio desta maneira: Como pude fazer uma conferência sobre artes plásticas, na escadaria do Teatro, cercado de anônimos que me caçoavam e ofendiam a valer?... Depois, na segunda parte do programa, um número de dança de Yvonne Daumerie e o concerto de Guiomar Novaes acalmaram os ânimos da plateia. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 29 17 de fevereiro - houve concerto de Villa Lobos, muito vaiado porque o compositor e maestro, com o pé machucado, entrou usando chinelos, o que foi interpretado por parte da plateia como manifestação futurista. Vejamos alguns trechos dos textos apresentados durante a Semana: Dia 13 de fevereiro de 1922, Graça Aranha - A Emoção Estética na Arte Moderna, trecho: "A remodelação estética no Brasil, iniciada na música de Villa-Lobos, na escultura de Brecheret, na pintura de Di Cavalcanti, Anita Malfatti, Vicente do Rego Monteiro, Zina Aita, e na jovem e ousada poesia, será a libertação da arte dos perigos que a ameaçam do inoportuno arcadismo, do academismo e do provincianismo. (...) Uma vibração íntima e intensa anima o artista neste mundo paradoxal que é o Universo brasileiro, e ela não se pode desenvolver nas formas rijas do arcadismo, que é o sarcófago do passado. Também o academismo é a morte pelo frio da arte e da literatura. Ignoro como justificar a função social da Academia. O que se pode afirmar para condená- la é que ela suscita o estilo acadêmico, constrange a livre inspiração, refreia o jovem e árdego talento que deixa de ser independente para se vasar no molde da Academia. É um grande mal na renovação estética do Brasil e nenhum benefício trará à língua esse espírito acadêmico, que mata ao nascer a originalidade profunda e tumultuária da nossa floresta de vocábulos, frases e ideias. Ah! se os nossos escritores não pensassem na Academia, se eles por sua vez a matassem em suas almas, que descortino imenso para o magnífico surto do gênio, enfim liberto de mais esse terror." (Obra Completa, Vol. II, p. 743). árdego: impetuoso, arrebatado, ardente http://www.pg.cefetpr.br/coeme/espacoarte/modernismo.htm Dia 15 de fevereiro de 1922: Discurso de Menotti del Picchia No longo discurso que pronunciou na noite de 15 de fevereiro, Menotti del Picchia dizia: "Queremos luz, ar, ventiladores, aeroplanos, reivindicações obreiras, idealismos, motores, chaminé de fábricas, sangue, velocidade, sonho, na nossa Arte! E que o rufo de um automóvel, nos trilhos de dois versos, espante da poesia o último deus homérico, que ficou, anacronicamente, a dormir e sonhar, na era do "jazz-band" e do cinema, com a flauta dos pastores da Arcádia e os seios divinos de Helena! " Há, nesse parágrafo, evidente influência do futurismo de Marinetti. A exaltação da máquina, da vida urbana moderna, da velocidade são elementos que conhecemos quando estudamos essa vanguarda. O repúdio ao passado também é típico do futurismo. Já o combate ao Parnasianismo, representado no trecho por imagens como "o último deus homérico", "a flauta dos pastores da Arcádia e os seios divinos de Helena" foi um dos elementos caracterizadores do Modernismo brasileiro nessa sua primeira fase, que vai de 1922 a 1930, e que costuma ser chamada de fase heroica ou de combate. FONTE: INFANTE, Ulisses. Textos: leitura e escritas: literatura, língua e redação, vol 1. SãoPaulo: Scipione, 2000. http://www.pg.cefetpr.br/coeme/espacoarte/modernismo.htm UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 30 Mario de Andrade e membros da Semana de 22 A importância da Semana A Semana de Arte Moderna de São Paulo, não teve muito destaque nos jornais da época. Os próprios membros participantes não tinham um projeto artístico comum, o que os unia era um sentimento de liberdade de criação e o desejo de romper com a cultura tradicional. Portanto foi um acontecimento bastante restrito aos meios artísticos principalmente de São Paulo. Aos poucos é que a Semana vai ganhando importância histórica. Primeiramente porque representou a confluência das várias tendências de renovação que, empenhadas em combater a arte tradicional, vinham ocorrendo na cultura brasileira antes de 1922. Mário de Andrade, 20 anos depois, afirma que O Modernismo no Brasil foi uma ruptura, foi um abandono de princípios e técnicas consequentes, foi uma revolta contra o que era a inteligência nacional. Aproximando artistas de diferentes áreas – escritores, poetas, pintores, escultores, arquitetos, músicos e bailarinos - , a Semana permitiu o intercâmbio de ideias e técnicas, ampliando os diversos ramos artísticos e os atualizando em relação ao que se fazia na Europa. A Semana contribuiu com reflexos que se fizeram sentir durante a década de 1920, perpassou a década de 1930 e têm relação com a arte que se faz até hoje. ************************************************************************************* Na 2ª. noite, entre outros números, Ronald de Carvalho declamou o poema Os Sapos, de Manuel Bandeira. Enquanto ele lia, o público gritava em uníssono: Foi! não foi! Os Sapos Enfunando os papos, Saem da penumbra, Aos pulos, os sapos. A luz os deslumbra. Em ronco que aterra, Berra o sapo-boi: - "Meu pai foi à guerra!" - "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!". O sapo-tanoeiro, Parnasiano aguado, Diz: - "Meu cancioneiro É bem martelado. Vede como primo Em comer os hiatos! Que arte! E nunca rimo Os termos cognatos. O meu verso é bom Frumento sem joio. Faço rimas com Consoantes de apoio. Vai por cinquenta anos Que lhes dei a norma: Reduzi sem danos A fôrmas a forma. Clame a saparia Em críticas céticas: Não há mais poesia, Mas há artes poéticas..." Urra o sapo-boi: - "Meu pai foi rei!"- "Foi!" - "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!". UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 31 Brada em um assomo O sapo-tanoeiro: - “A grande arte é como Lavor de joalheiro. Ou bem de estatuário.Tudo quanto é belo, Tudo quanto é vário, Canta no martelo". Outros, sapos-pipas (Um mal em si cabe), Falam pelas tripas, - "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!". Longe dessa grita, Lá onde mais densa A noite infinita Veste a sombra imensa; Lá, fugido ao mundo, Sem glória, sem fé, No perau profundo E solitário, é Que soluças tu, Transido de frio, Sapo-cururu Da beira do rio... ( Estrela da Vida Inteira. Rio de Janeiro: José Olympio, 1970.p.51-2) Voc.: Perau: declive rápido na lateral de um rio. Exercício: Levando em consideração o poema Os sapos, responder: 1. Se considerarmos que os poetas modernistas pretendiam utilizar-se de atitudes irônicas, onde elas se apresentam nesse poema? 2. Qual é o movimento literário que é satirizado no poema? 3. Por quê? 4. Quais são as principais características formais do poema apresentado? 5. Qual o estilo que ele representa? 6. Qual o sentido que representam os sapos no poema? [sapo-boi; sapo-tanoeiro (ou ferreiro); sapo-cururu; sapo-pipa] 7. Quais as principais características do movimento literário satirizado no poema? 8. Qual dos sapos apresenta, em sua fala, as principais características do movimento literário satirizado? 9. Podemos dizer que há uma crítica sobre o estilo de um autor em especial do movimento satirizado? Quem? 10. Se considerarmos que nesse poema os sapos são metáforas de tendências estéticas da literatura brasileira, o que o sapo-cururu poderia estar representando? Obs.: A minissérie da Globo, Um só coração, é bastante interessante, trazendo muitos referenciais sobre a Semana de Arte Moderna e os intelectuais modernistas. Alguns alunos fizeram um trabalho selecionando várias cenas que valem a pena: https://www.youtube.com/watch?v=2c2A49c92rw As fases do modernismo O movimento modernista teve duas fases: a primeira foi de 1922 a 1930, e a segunda, de 1930 a 1945. Modernismo – 1ª. Fase: Participaram desta geração: Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Alcântara Machado, Menotti del Picchia, Guilherme de Almeida, Ronald de Carvalho e Raul Bopp. A primeira fase do modernismo é também chamada de fase heroica, isto é, a fase da divulgação das ideias modernistas em todo o país e de aprofundamento das questões estéticas lançadas pela Semana. Esta fase caracterizou-se pelas tentativas de solidificação do movimento renovador e pela divulgação de obras e ideias modernistas. De um modo geral os escritores defendiam a reconstrução da cultura UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 32 brasileira sobre bases nacionais, revisão do nosso passado histórico, de nossas tradições culturais, eliminação do complexo de colonizados apegados a valores estrangeiros. Eram defensores de uma visão nacionalista, porém crítica, da realidade brasileira. Mário de Andrade chamou esse período de orgia intelectual. É um período rico em publicações de obras literárias, revistas e manifestos. Dentre as revistas destaca-se Klaxon (1922); Estética (1924); A Revista (1925); Terra Roxa e outras terras (1927); Revista de Antropofagia (1928), esta última, porta-voz do movimento Antropofagia, fundado por Oswald de Andrade. Simultaneamente à publicação dessas revistas, foram lançados vários manifestos e movimentos, dentre eles: Pau-Brasil; Verde-Amarelismo; Antropofagia e a Escola da Anta. Pau-Brasil: a poesia de exportação Oswald de Andrade lançou o Manifesto da Poesia Pau-Brasil, em 1924. Inspirado no nosso primeiro produto de exportação, o pau-brasil, defendia a criação de uma poesia brasileira de exportação. Demonstrando irreverência e revolta contra a cultura acadêmica e a dominação europeia em nosso país, o movimento propunha uma poesia primitivista, construída com base na revisão crítica do passado histórico e cultural do Brasil e na aceitação e valorização dos contrastes da realidade e da cultura brasileiras. Vejamos um trecho do manifesto comprovando isso: UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 33 Toda a história bandeirante e a história comercial do Brasil. O lado doutor, o lado citações, o lado autores conhecidos. Comovente. Rui Barbosa: uma cartola na Senegâmbia. Tudo revertendo em riqueza. A riqueza dos bailes e das frases feitas. Negras de jóquei. Odaliscas no Catumbi. Falar difícil. O manifesto de Oswald propunha a criação de uma língua brasileira ( A língua sem arcaísmo, sem erudição; A contribuição milionária de todos os erros ); a síntese, o equilíbrio, a surpresa. Verde-Amarelismo e Anta O Movimento Verde-Amarelismo surgiu em São Paulo com Menotti del Picchia, Plínio Salgado, Guilherme de Almeida e Cassiano Ricardo. Era uma reação contra o nacionalismo defendido no manifesto da Poesia Pau-Brasil. Defendiam um nacionalismo ufanista. O grupo alegava que o movimento Pau-Brasil era afrancesado. Em 1927, tomando por base a anta e o índio tupi como símbolos de nacionalidade primitiva, o grupo verde-amarelo transformou-se na Escola da Anta. Antropofagia – a deglutição cultural: Abaporu .Tarsila do Amaral.1928 (obs.: abaporu= antropófago – em tupi) Em 1928, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Raul Bopp, revidando com sarcasmo o primitivismo xenófobo da Anta, lançam o mais radical de todos os movimentos do período, a Antropofagia. O movimento foi inspirado no quadro nomeado Abaporu (antropófago, em tupi) que Tarsila pintou e ofereceu a Oswald como presente de aniversário. Partidários de um primitivismo crítico, propunham a devoração da cultura estrangeira. O grupo tinha como porta-voz dessas ideias a Revista de Antropofagia, da qual participavam também Antônio de Alcântara Machado, Geraldo Costa e outros. Contrariamente à xenofobia da Escola da Anta, os antropófagos não negavam a cultura estrangeira, mas também não copiavam nem imitavam. Assim como os índios devoravam seus inimigos, acreditando que dessa forma assimilariam suas qualidades, os artistas antropófagos propunham a devoração simbólica da cultura estrangeira, aproveitando suas inovações artísticas, porém sem a perda da nossa identidade cultural. É, portanto, um aprofundamento da ideia da digestão cultural proposta anteriormente no manifesto da Poesia Pau-Brasil. ( xenofobia: aversão a coisas e pessoas estrangeiras) UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 34 Abaixo, alguns trechos do Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade: Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. * Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz. * Tupy, or not tupy, that is the question. * Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos. * Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago. * Estamos fatigados de todos os maridos católicos suspeitos postos em drama, Freud acabou com o enigma mulher e com outros sustos da psicologia impressa. * (...) Contra o mundo reversível e as ideias objetivadas. Cadaverizadas. O stop do pensamento que é dinâmico. Oindivíduo vítima do sistema. Fonte das injustiças românticas. E o esquecimento das conquistas interiores. * Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. Roteiros. * (...) Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Carnaval. O índio vestido de Senador do Império. Fingindo de Pitt. Ou figurando nas óperas de Alencar cheio de bons sentimentos portugueses. * Já tínhamos o comunismo. Já tínhamos a língua surrealista. A idade de ouro. Catiti Catiti Imara Notiá Notiá Imara Ipeju (...) * Contra a realidade social, vestida e opressora, cadastrada por Freud – a realidade sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama. Oswald de Andrade Em Piratininga Ano 374 da Deglutição do Bispo Sardinha. (Apud Antonio Cândido e J.Aderaldo Castello. Presença da Lit. Brasileira III. São Paulo: Difusão Européia.1968) Veja mais algumas obras de Tarsila do Amaral: 1.A negra.(1923) . Tarsila do Amaral 2. A lua. (1928)Tarsila do Amaral 3 .O ovo.(Urutu) (1928) Tarsila do Amaral Veja mais sobre a Antropofagia: http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/index.cfm?fuseaction=termos_texto&cd_verbete=74 UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 35 Tarsila do Amaral. Operários. 1933 OSWALD DE ANDRADE ( São Paulo – 1890/1954) José Oswald de Sousa Andrade nasceu e morreu em São Paulo. Muito inquieto, desde criança, ligou-se à boêmia literária de sua época. Fez curso jurídico espaçado, formando-se em 1919. Em 1911 fundou um semanário combativo e humorístico, O Pirralho, onde publicou seus primeiros exercícios, tendo-se tornado um dos maiores polemistas da época. No período que antecede a Semana de Arte Moderna de São Paulo, foi uma espécie de preparador do Modernismo, sugerindo a ruptura com os velhos padrões, estimulando rebeldias estéticas, agitando o meio artístico no sentido de uma mudança, mesmo não sabendo exatamente quais os rumos, mas sentia indispensável uma mudança. Ele usou a técnica sincopada, a composição por pequenos blocos, o senso da elipse, o dom da anotação rápida e o poder metafórico. Lançou o movimento nativista Pau-Brasil, com um manifesto e um livro com o mesmo nome. Posteriormente lança o Movimento Antropófago e fundou a Revista de Antropofagia. Depois da revolução de 1930 assumiu uma posição de militante de esquerda, que conservará até quase o fim de sua vida. Como redator do jornal O Homem Livre, participou ativamente da luta operária e antifascista dos anos que precederam o golpe de Estado de 1937. Dentre outros aspectos, em sua obra, analisou a sociedade burguesa de São Paulo, escreveu memórias ligadas à teoria antropofágica, como a crise do patriarcalismo, o messianismo, a função das utopias. Em 1945 passa à livre- docência de Literatura Brasileira na Universidade de São Paulo. Ele foi um dos maiores ensaístas e panfletários da literatura brasileira com rara capacidade de tornar sugestiva a ideia, pela violência corrosiva das afirmações, o humorismo e o fulgor das palavras. Quebrou as barreiras entre poesia e prosa para atingir uma espécie de fonte comum da linguagem artística. Foi um elemento de grande importância enquanto agitador e renovador para a formação da literatura brasileira contemporânea. Dentre sua obra, encontramos: Romances: Os Condenados (1922); Memórias Sentimentais de João Miramar (1924); Estrela de Absinto (1927); Serafim Ponte Grande(1933); A Escada Vermelha (1934); Os Condenados (1941) (reunião, com o título geral do primeiro, dos três livros que formavam a Trilogia do Exílio); Marco Zero – I (1943) Marco Zero II (1946). Poesia: Pau Brasil (1925); Primeiro Caderno do Aluno Oswald de Andrade (1927); Poesias Reunidas (1945). Teatro: O Homem e o Cavalo (1934); Teatro (A morta, O Rei da Vela) (1937). Escreveu também ensaios e memórias. UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 36 Canto de Regresso à Pátria Minha terra tem palmares Onde gorjeia o mar Os passarinhos daqui Não cantam como os de lá Minha terra tem mais rosas E quase que mais amores Minha terra tem mais ouro Minha terra tem mais terra Ouro terra amor e rosas Eu quero tudo de lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte para lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte pra São Paulo Sem que veja a Rua 15 E o progresso de São Paulo. (Pau-Brasil, Au Sans Pareil, Paris, 1925) Primeiro Caderno Balada do Esplanada A Godofredo Ontem à noite Eu procurei Ver se aprendia Como é que se fazia Uma balada Antes d’ir Pro meu hotel É que este Coração Já se cansou De viver só E quer então Morar contigo No Esplanada Eu qu’iria Poder Encher Este papel De versos lindos É tão distinto Ser menestrel No futuro As gerações Que passariam Diriam É o hotel Do menestrel Pra m’inspirar Abro a janela Como um jornal Vou fazer A balada Do Esplanada E ficar sendo O menestrel De meu hotel Mas não há poesia Num hotel Mesmo sendo ‘Splanada Ou Grand-Hotel Há poesia Na dor Na flor No beija-flor No elevador Oferta Quem sabe Se algum dia Traria O elevador Até aqui O teu amor (Apud Antonio Cândido e J.Aderaldo Castello. Presença da Lit. Brasileira III. São Paulo: Difusão Européia.1968) UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 37 A descoberta Seguimos nosso caminho por este mar de longo Até a oitava da Páscoa Topamos aves E houvemos vista de terra os selvagens Mostraram-lhes uma galinha Quase haviam medo dela E não queriam por a mão E depois a tomaram como espantados primeiro chá Depois de dançarem Diogo Dias Fez o salto real as meninas da gare Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis Com cabelos mui pretos pelas espáduas E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas Que de nós as muito bem olharmos Não tínhamos nenhuma vergonha. (in Poesias Reunidas. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1971.) Pronominais Dê-me um cigarro Diz a gramática Do professor e do aluno E do mulato sabido Mas o bom negro e o bom branco Da Nação Brasileira Dizem todos os dias Deixa disso camarada Me dá um cigarro Vício na fala Para dizerem milho dizem mio Para melhor dizem mió Para pior pió Para telha dizem teia Para telhado dizem teiado E vão fazendo telhados UNISO – Letras – Literatura Brasileira: Modernismo e Tendências Contemporâneas. - Apostila 1 - Modernismo - Org. Prof. Roberto Samuel Sanches 38 O gramático Os negros discutiam Que o cavalo sipantou Mas o que mais sabia Disse que era Sipantarrou. MARIO DE ANDRADE (São Paulo - 1893/1945) Mário Raul de Morais Andrade, era de família rica e aristocrática de São Paulo. Formou-se no Conservatório
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