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Dossiê Denúncia Projeto da Morte

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PROJETO DA 
MORTE 
 
Projeto de Irrigação Santa Cruz do Apodi/RN 
 
 
DOSSIÊ-DENÚNCIA 
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SUMARIO 
 
1. APRESENTAÇÃO ------------------------------------------------------------------------------ 03 
2. DOS PROBLEMAS AMBIENTAIS--------------------------------------------------------- 04 
3. DAS AMEAÇAS AO PATRIMÔNIO HISTORICO E CULTURAL ---------------- 10 
4. DAS AMEAÇAS AO PATRIMÔNIO PÚBLICO ---------------------------------------- 13 
5. DA EXPERIÊNCIA DO PERÍMETRO IRRIGADO JAGUARIBE-APODI ------ 23 
6. DOS IMPACTOS À PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA E CAMPONESA E 
FAMILIAR ------------------------------------------------------------------------------------------ 17 
7. DO REQUERIMENTO ------------------------------------------------------------------------ 23 
8. ANEXO I ------------------------------------------------------------------------------------------ 24 
9. ANEXO II ----------------------------------------------------------------------------------------- 34 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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1. APRESENTAÇÃO 
 
Aos vinte e oito dias do mês de agosto do corrente ano foi assinada a ordem de 
serviço (OS) do “Projeto de Irrigação Santa Cruz do Apodi” que, capitaneado pelo 
Departamento Nacional de Obras Contra a Seca – DNOCS, deverá ser instalado na 
região da Chapada do Apodi, entre os municípios de Apodi e Felipe Guerra, ambos no 
estado do Rio Grande do Norte. O referido projeto pretende desapropriar cerca de 
13.855 ha (treze mil oitocentos e cinquenta e cinco) hectares para a implementação de 
um programa de fruticultura irrigada. 
 Na localidade, compreendendo a área a ser desapropriada e a de influência 
indireta, hoje habitam cerca de 800 famílias divididas em cerca de 30 comunidades 
rurais. Tais grupos populacionais possuem aspectos culturais, históricos e sócio-
econômicos próprios, sendo referência nacional em produção agroecológica e familiar e 
que, devido ao modo como o projeto está sendo executado, estão na iminência de uma 
série de violações aos seus Direitos Humanos, culturais, históricos e patrimoniais. 
A região apresenta, também, características de relevo, fauna e flora peculiares, 
possuindo uma ampla lista de espécies endêmicas, bem como formações arqueológicas 
de grande importância para o patrimônio e histórico e cultural brasileiro que, da mesma 
forma, encontram-se em risco latente de degradação. 
Identificamos que, em seu atual contexto, a qualquer momento pode/deve o 
projeto ser embargado, uma vez que tecnicamente inviável e inexequível. Aceitar sua 
continuidade, nos moldes até agora propostos, é assumir o risco do dispêndio de 
milhões de reais dos cofres públicos sem nenhuma perspectiva de resultado econômico 
e social além de servir como propulsor de uma das maiores tragédias do sertão 
nordestino dos últimos cem anos. 
Este documento é uma coletânea das principais irregularidades que afloram no 
projeto do perímetro irrigado da chapada do Apodi/RN, mas não apenas isso, é, 
sobretudo, um grito de denúncia ecoado pelas centenas de famílias em iminência de 
serem expulsas de suas terras e ter sua história apagada. 
Subscrevem esse dossiê-denúncia as seguintes entidades: 
A Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares dos estados do Rio 
Grande do Norte e do Ceará – RENAP/RN-CE, Comissão Pastoral da Terra, Sindicato 
dos Trabalhadores Rurais de Apodi/RN, Via Campesina, O Grupo de Estudos em 
4 
 
Direito Crítico, Marxismo e América Latina – GEDIC, Projeto Ser-tão, Coopervida, 
FETARN, Centro Feminista 08 de março, Centro Terra Viva, Rede Pardal, ASA – 
Potiguar, Fórum da Agricultura Familiar de Apodi, Associação dos Pequenos 
Produtores da Agrovila Palmares, Escritório Popular, Centro de Referência em Direitos 
Humanos – UFRN, Pastoral Operária/RN, Mire, Grito dos excluídos/as, com endereço 
para recebimento de correspondências sobre este feito à Praça da Redenção, 268, 
Ed. Herculana Praxedes – Sala 303, Centro, Mossoró/RN, na pessoa do Dr. João 
Paulo do Vale de Medeiros, bem como com correio eletrônico 
emdefesadachapada1@hotmail.com, que requerem de Vossa Senhoria APURAÇÃO e 
RESPONSABILIZAÇÃO dos fatos, pelos motivos expostos: 
 
1. DOS PROBLEMAS AMBIENTAIS 
 
Os empreendimentos como os Perímetros Irrigados, segundo a legislação 
ambiental vigente, necessitam obrigatoriamente passar por um estudo aprofundado que 
possa dimensionar as agressões ao meio ambiente, bem como as violações humanas, 
históricas e sociais, não devendo ser tomado como mero protocolo ou formalidade 
administrativa no processo de licenciamento. 
Segundo o Relatório de Impactos Ambientais - RIMA, no que se refere à 
identificação e análise dos impactos ambientais, sejam eles diretos ou indiretos, devem 
haver “pesquisas com dados confiáveis que permitam a quantificar com precisão a 
magnitude do impacto causado em decorrência da irrigação” (fl. 76) prevista no projeto. 
No entanto, apesar do RIMA preconizar a análise exaustiva dos impactos, percebe-se 
clara inconsistência de dados no decorrer do estudo, pois não quantifica os impactos, 
tampouco oferece condições reais que possam dimensionar as agressões ao meio 
ambiente. As explicitações se reduzem às imprecisões no âmbito das possibilidades, não 
apresentando dados concretos que caracterizem as violações ao Meio Ambiente. 
 Nesse sentido, com base no próprio RIMA, bem como em nossa Carta Magna, 
os impactos deveriam ter sido avaliados exaustivamente, de modo a garantir a proteção 
do Meio Ambiente, assim prevê o Art. 225, § 1º, IV da Constituição Federal: 
 
Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente 
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia 
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o 
5 
 
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras 
gerações. 
§ 1º Para assegura a efetividade desse direito, incumbe ao Poder 
Público: 
[...] 
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade 
potencialmente causadora de significativa degradação do meio 
ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará 
publicidade; 
 
Entre os impactos apontados pelo RIMA, porém não aprofundados como 
deveria, podemos mencionar as agressões ao solo no momento da implantação do 
projeto, já que, segundo o relatório, haverá desmatamento de grande área e movimentos 
de terra (fl. 77). Outro ponto importante são as agressões que ocorrerão nas reservas 
hídricas, ocasionadas pelo escoamento de águas contaminadas por agrotóxico, 
defensivos agrícolas e fertilizantes utilizados pela produção da fruticultura irrigada. 
Além disso, verifica-se que com a implantação do projeto, principalmente em 
função do desmatamento e do manejo com o solo, seja de irrigação ou drenagem, 
poderão ocorrer problemas de erosão, assoreamento dos corpos de água e falta de 
controle no uso de fertilizantes e biocidas, além da salinização do solo decorrente do 
manejo incorreto da técnica e do sistema de drenagem. 
Tais problemas foram apontados no EIA-RIMA de maneira tão somente 
superficial, sem nenhuma análise quantitativa dos impactos. Entende-se que não se 
apresentaram claras as dimensões das agressões, os sujeitos afetados, nem tampouco 
houve a preocupação de apresentar alternativas a tais violações. 
O próprio RIMA (fl. 85) aponta a necessidade de que a descrição dos impactos 
seja feita através da discussão dos mesmos, um a um, associando-se cada ação do 
empreendimento a cada componente dos meios abiótico, biótico e antrópico. O 
relatório, apesar de trazer essa previsão, nãocontempla a análise detalhada e 
individualizada dos impactos. Foram apontados 58 (cinquenta e oito) impactos 
considerados negativos pelo RIMA, assim como consta na fl. 58, no entanto, não se 
cumpriu com a previsão de análise individualizada de nenhum destes. A descrição 
das agressões deveria ser expressa, contemplando todas as possibilidades de violações 
decorrentes da implantação do projeto. 
O próprio EIA-RIMA, em sua fl. 87, prevê que com a implantação desse Projeto 
pode ocorrer a contaminação das águas superficiais e subterrâneas, devido ao uso de 
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fertilizantes e agrotóxicos, bem como erosão e salinização dos solos, enfatizando que a 
agricultura irrigada representa um agente potencial desses impactos. 
Ora, os pequenos agricultores da região da chapada do Apodi possuem uma 
experiência de mais de 50 (cinquenta) anos na prática da pequena irrigação, como 
atividade econômica complementar as atividades de sequeiro. Fato este que os faz 
representar uma das cadeias produtivas mais fortes e organizadas do território potiguar. 
O município de Apodi figurou, ainda, na lista das cinco cidades que mais se destacaram 
na produção agrícola e pecuária do Rio Grande do Norte, conforme pesquisa do 
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre o Produto Interno Bruto 
(PIB) no território potiguar, sem a necessidade de recorrer a perímetros irrigados. 
Desse modo, nos resta a seguinte indagação: Por que o DNOCS, que tem a 
função de promover obras de combate à seca, planeja desenvolver um projeto que 
só vai gerar impactos ambientais, sociais e culturais negativos, em uma região que 
possui uma vasta experiência no âmbito da agricultura e da pecuária? 
Ainda dentro desse contexto, é importante lembrar que o RIMA prevê, também, 
o desmatamento da área onde o projeto será implantado, sugerindo três tipos de 
desmatamento a ser utilizado, a saber: desmatamento manual com destoca manual, 
desmatamento mecanizado e desmatamento manual sem destoca. O estudo enfatiza que: 
“O desmatamento trará prejuízos inevitáveis à fauna, mesmo tratando-se de uma área já 
modificada por ação antrópica, é preciso implantar medidas para o salvamento da 
fauna”, (fl. 94). Acrescentando, em sua fl. 95, que: “Com o desmatamento a população 
local ficará sujeita a acidentes com artrópodes, animais peçonhentos e mamíferos.” 
Percebe-se, nitidamente, que as medidas a serem adotadas para a implantação 
desse projeto acarretarão enormes prejuízos a fauna, a flora, bem como a população 
local. Posto que, além dos perigos citados acima, estarão expostos, direta e/ou 
indiretamente, aos agrotóxicos utilizados nas plantações. 
O referido relatório alerta para essa problemática, ao aduzir, na fl. 99, que: 
 
[...] o uso indiscriminado de agrotóxicos tem resultado em problemas 
ambientais graves, exigindo um controle rigoroso na sua aplicação. Os 
pesticidas, aplicados nas culturas, podem alcançar o solo, podendo aí 
permanecer por muito tempo, e serem carreados para os corpos d 
água. 
 
E continua asseverando que: 
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Entre as consequências negativas do uso indiscriminado de 
agrotóxicos, podem ser destacadas: danos à saúde humana; aumento 
do número de pragas resistentes, resultando na necessidade da 
utilização de outros pesticidas; destruição de plantas úteis; destruição 
de insetos úteis, como as abelhas e animais polinizadores; 
mortalidade de animais, como peixes, invertebrados aquáticos, aves e 
mamíferos silvestres; contaminação de alimentos de origem vegetal 
ou animal, acumulando-se na cadeia alimentar até alcançar o homem. 
 
 É importante ressaltar que o Brasil é o líder mundial no uso de agrotóxicos 
desde 2009. Os impactos ao meio ambiente e à saúde pública tem sido apontados 
por diversos estudos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA e pela 
Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO. Atualmente já estão em 
processo de reavaliação 17 princípios ativos de agrotóxicos, que já são proibidos no 
exterior. Além disso, consta também nos estudos do Núcleo Trabalho, Meio Ambiente e 
Saúde – TRAMAS/UFC, que os impactos à saúde e ao trabalhador estão intimamente 
ligados aos Perímetros Irrigados. 
Tal realidade é bastante preocupante em um território que há décadas se destaca 
na produção de mel e de poupas de frutas orgânicas, dentro da expressiva experiência de 
transição agroecológica da Chapada do Apodi. Assim, fica clara a incompatibilidade 
entre a matriz produtiva existente, baseada no não uso de defensivos agrícolas, com o 
modelo de produção de commodities em larga escala por meio da utilização de grande 
quantidade de venenos. Aproximadamente 30 comunidades organizadas 
cooperativamente e de produção agroecológica estão na iminência de serem atingidas 
pelo empreendimento, emergindo a necessidade de que os órgãos competentes realizem 
a defesa e incentivo às experiências sustentáveis supracitadas, assim como preconiza o 
Decreto nº 7794/12, que institui a Política Nacional de Agroecologia e Produção 
Orgânica. 
Figura como um retrocesso a implantação de um projeto que se baseia no uso 
intensivo de venenos e que vai de encontro a todas as recomendações dos órgãos de 
saúde pública, bem como dos diversos estudos realizados nas universidades brasileiras, 
além de desprivilegiar um modelo de produção sustentável e de respeito à vida e ao 
meio ambiente. 
É de suma importância, ainda, observar o que dispõe a Resolução nº1 - 
CONAMA, de 23 de janeiro de 1986, em seu Art. 11, §2º, que dispõe sobre critérios 
básicos e diretrizes gerais para a avaliação de impacto ambiental. 
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Art. 11. Respeitado o sigilo industrial, assim solicitando e 
demonstrando pelo interessado o RIMA será acessível ao público. 
Suas cópias permanecerão à disposição dos interessados, nos centros 
de documentação ou bibliotecas da SEMA e do órgão estadual de 
controle ambiental correspondente, inclusive durante o período de 
análise técnica. 
[...] 
§ 2º Ao determinar a execução do estudo de impacto ambiental e 
apresentação do RIMA, o órgão estadual competente ou a SEMA ou, 
quando couber o Município, determinará o prazo para recebimento dos 
comentários a serem feitos pelos órgãos públicos e demais 
interessados e, sempre que julgar necessário, promoverá a realização 
de audiência pública para informação sobre o projeto e seus 
impactos ambientais e discussão do RIMA. 
 
 Tal audiência, juntamente com o RIMA, serve de base para analise e parecer 
final do órgão ambiental licenciador, com relação à aprovação ou não do projeto a ser 
implantado. Desse modo, faz necessário que seja amplamente divulgada, bem como que 
demonstre todos os impactos que poderão ocorrer no local, e possibilite a participação 
das comunidades a serem afetadas, oportunizando, assim, àqueles que serão direta ou 
indiretamente atingidos o conhecimento sobre as agressões ambientais, sociais, 
econômicas e culturais a que serão expostos. 
 No caso do Projeto de Irrigação Santa Cruz do Apodi não se tem certeza de que 
tal audiência pública realmente ocorreu, posto que não houve a sua publicização. 
Portanto, se esta aconteceu foi realizada obscuramente, para assim encobrir os diversos 
impactos que atingirão a região da Chapada do Apodi se tal projeto se concretizar. 
Sendo assim, faz-se imprescindível a realização de uma nova audiência pública trazendo 
esclarecimentos sobre a implantação do referido projeto, e garantindo a efetiva 
participação daqueles que serão atingidos. 
Outro dispositivo de relevância para o processo de implantação do Projeto é a 
Resolução nº 237/97 - CONAMA, que trata da revisão e complementação dos 
procedimentos e critérios utilizados para o licenciamentoambiental. O referido 
dispositivo, em seu Art. 10, VI, §2º, menciona: 
 
Art. 10. O procedimento de licenciamento ambiental obedecerá às 
seguintes etapas: 
[...] 
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IV - Solicitação de esclarecimentos e complementações pelo órgão 
ambiental competente integrante do SISNAMA, uma única vez, em 
decorrência da análise dos documentos, projetos e estudos ambientais 
apresentados, quando couber, podendo haver a reiteração da mesma 
solicitação caso os esclarecimentos e complementações não tenham 
sido satisfatórios; 
V - Audiência pública, quando couber, de acordo com a 
regulamentação pertinente; 
VI - Solicitação de esclarecimentos e complementações pelo órgão 
ambiental competente, decorrentes de audiências públicas, quando 
couber, podendo haver reiteração da solicitação quando os 
esclarecimentos e complementações não tenham sido satisfatórios; 
VII - Emissão de parecer técnico conclusivo e, quando couber, parecer 
jurídico; 
[...] 
§ 2º No caso de empreendimentos e atividades sujeitos ao estudo de 
impacto ambiental - EIA, se verificada a necessidade de nova 
complementação em decorrência de esclarecimentos já prestados, 
conforme incisos IV e VI, o órgão ambiental competente, mediante 
decisão motivada e com a participação do empreendedor, poderá 
formular novo pedido de complementação. 
 
Assim, nos casos em que os esclarecimentos sobre o empreendimento se 
mostrem insatisfatórios, é possível ser provocada nova audiência pública, no intuito de 
tornar transparente o processo, bem como que se possa dimensionar os impactos às 
comunidades e ao meio ambiente, além de promover efetivo diálogo entre os órgãos 
competentes e a população. 
Nesse sentido, um dispositivo fundamental para isso é a já mencionada 
Resolução nº 237/97 - CONAMA, Art. 19: 
 
Art. 19. O órgão ambiental competente, mediante decisão 
motivada, poderá modificar os condicionantes e as medidas de 
controle e adequação, suspender ou cancelar uma licença 
expedida, quando ocorrer: 
I - violação ou inadequação de quaisquer condicionantes ou 
normas legais; 
II - omissão ou falsa descrição de informações relevantes que 
subsidiaram a expedição da licença; 
III - superveniência de graves riscos ambientais e de saúde. 
 
Por fim, quanto às violações à questão ambiental que se apresentam de maneira 
mais clara, é importante ser lembrada a concernente aos recursos hídricos. O RIMA 
apresenta severas inconsistências no tocante a essa temática asseverando, em sua fl. 34, 
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que: “as águas do açude somente podem atender a um terço da área a ser irrigada, 
ou seja, 3.000 ha”. E aduz, “O volume útil do seu reservatório permite atender às 
demandas a ele atribuídas somente até o ano 2020 respeitando as garantias 
estabelecidas, ou seja, haverá falhas após 2020 se novas fontes hídricas não forem 
contempladas”. 
Assim, como se pode perceber, o próprio estudo aponta que a água não será 
suficiente para atender as demandas do projeto. Cabe questionar se a função múltipla da 
água também será assegurada, pois é imprescindível a garantia de uma gestão hídrica 
responsável, com seu uso adequado. Percebemos que além de não haver viabilidade 
hídrica para o projeto, o uso da água do perímetro irrigado não atenderá às necessidades 
hídricas da pequena agricultura, estando voltada para a produção em grande escala, 
típica do agronegócio e com uso excessivo de venenos, que certamente irão provocar 
diversas contaminações das fontes hídricas. 
Portanto, ficam claras as violações a direitos humanos, ambientais e sociais 
decorrentes da implantação do Projeto Santa Cruz do Apodi, além de serem explícitas as 
omissões e inconsistências do Relatório de Impactos ao Meio Ambiente - RIMA, 
sugerindo que é necessário um estudo mais aprofundado, que leve em consideração o 
diálogo com as comunidades diretamente atingidas, bem como o real dimensionamento 
dos impactos. 
 
2. DAS AMEAÇAS AO PATRIMÔNIO HISTORICO E CULTURAL 
 
Segundo o Relatório de Impactos ao Meio Ambiente – RIMA, há na área de 
influência indireta do empreendimento grande associação fossilífera do período 
cretáceo, com a presença de fósseis de grupos vertebrados e invertebrados, cuja 
importância se ressalta em função de seu valor histórico, científico e cultural para o 
estado do Rio Grande do Norte. Nesse sentido, de acordo com o Decreto-Lei nº 
25/1937, que trata do tombamento de monumentos naturais de feição notável, os jazigos 
fossilíferos potiguares encontram amparo legal, objetivando sua proteção e conservação, 
assim como se observa no Art. 1º,§2º do Decreto citado: 
 
Art. 1º Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o 
conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja 
conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a 
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fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional 
valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico. 
[...] 
§ 2º Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e 
são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, 
bem como os sítios e paisagens que importe conservar e 
proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela 
natureza ou agenciados pelo indústria [sic] humana. 
 
Desse modo, por tratar-se de empreendimento potencialmente capaz de agressão 
ao patrimônio, faz-se necessária, para a garantia da conservação da supracitada 
associação fossilífera, a exaustiva descrição dos impactos que possam ocorrer com a 
instalação do projeto. Nesse sentido, observou-se clara omissão do EIA-RIMA em 
relação aos impactos diretos e indiretos às supracitadas associações de fósseis, sendo 
realizada apenas menção de sua existência, de modo que não foi possível visualizar as 
reais dimensões das agressões. 
Outro ponto importante é que o ‘Lajedo de Soledade’, um dos sítios 
arqueológicos mais importantes do Brasil, onde pode ser encontrados fósseis de animais 
pré-históricos, bem como pinturas rupestres datadas de 3 a 10 mil anos, está localizado 
na área de influência do Projeto de Irrigação. Com uma formação de rocha calcária do 
período paleolítico, com idade geológica estimada em 90 milhões de anos, o Lajedo de 
Soledade consiste em um dos mais importantes patrimônios hitóricos-culturais do país. 
Nesse sentido, a Lei 3.924/1964, que trata da proteção pelo Poder Público dos 
Monumentos Arqueológicos e Pré-históricos, conceitua em seu Art. 2, alínea “d” que: 
 
Art. 2 – Consideram-se monumentos arqueológicos ou pré-
históricos: 
[...] 
d) As inscrições rupestres ou locais como sulcos de polimentos 
de utensílios e outros vestígios de atividades de 
paleoameríndios; 
 
No entanto, os impactos ao ‘Lajedo de Soledade’ não foram contemplados no 
RIMA, percebendo-se sua supressão do relatório, assim como consta nas fls. 57-59, que 
tratam dos aspectos culturais, históricos e arqueológicos da área afetada pelo 
empreendimento e ferindo o que dispõe a Portaria 230/02 – IPHAN, art. 1º, que trata 
dos procedimentos sobre o Estudo de Impactos Ambientais, bem como do Relatório de 
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Impactos ao Meio Ambiente – EIA/RIMA na fase de licenciamento prévio de 
empreendimentos potencialmente capazes de afetar o patrimônio cultural arqueológico: 
 
Art. 1º – Nessa fase, dever-se-á proceder à contextualização 
arqueológica e etno-histórica da área de influência do 
empreendimento por meio de levantamento exaustivo de 
dados secundários e levantamento arqueológico de campo. 
(grifo nosso) 
 
Além disso, a omissão por parte do EIA-RIMA no que se refere ao ‘Lajedo de 
Soledade’, fere o que se dispõe no Art. 2º e no inciso I, da mesma Portaria 230/02 - 
IPHAN, em que se exigeque seja realizado o levantamento arqueológico, pelo menos, 
da área diretamente afetada: 
 
Art. 2 – No caso de projetos afetando áreas arqueologicamente 
desconhecidas, pouco ou mal conhecidas, que não permitam 
inferências sobre a área de intervenção do empreendimento, 
deverá ser providenciado levantamento arqueológico de campo 
pelo menos em sua área de influência direta. Este levantamento 
deverá contemplar todos os compartimentos ambientais 
significativos no contexto geral da área a ser implantada e 
deverá prever levantamento prospectivo de sub-superficie. 
I – O resultado final esperado é um relatório de caracterização e 
avaliação da situação atual do patrimônio arqueológico da área 
de estudo, sob a rubrica Diagnóstico. 
 
Foi possível avaliar que o EIA-RIMA não apresentou o levantamento exigido no 
supracitado artigo, além de que, após sua apresentação aos órgãos competentes e da 
expedição da Licença Prévia ao empreendimento, não foi elaborado o Programa de 
Prospecção e Resgate exigido na fase de licenciamento prévio, como consta no Art. 4º 
da citada Portaria 230/02: 
 
Art. 4 – A partir do diagnóstico e avaliação dos impactos, 
deverão ser elaborados os Programas de Prospecção e Resgate 
compatíveis com o cronograma de obras e com as fases de 
licenciamento ambiental do empreendimento, de forma a 
garantir a integridade do patrimônio cultural da área. 
 
13 
 
Ainda em relação ao ‘Lajedo de Soledade’, deve ser mencionado o Museu da 
Pedra, localizado na área de influência do projeto, cuja referência foi insuficiente no 
tocante ao dimensionamento dos impactos. 
Outro ponto no qual houve apenas menção, ficando clara a omissão dos 
impactos diretos e indiretos, foi o da existência das cavernas arqueológicas do 
município de Felipe Guerra (área de influência direta). Do mesmo modo que as 
Associações Fossilíferas mencionadas acima, as cavernas têm amparo legal e proteção 
do poder público, de acordo com a já citada Lei 025/1937, Art. 1º, §2º. 
Também, segundo o RIMA, o Vale do Apodi possui uma quantidade indefinida 
de cavernas, das quais, graças ao trabalho de grupos de pesquisa voluntários, já foi 
possível catalogar cerca de 20, que deveriam ter sido contempladas de maneira 
pormenorizada no estudo de impactos ambientais. Verificou-se a incompletude do 
relatório, já que permitiu passar por despercebido o estudo de tantos exemplares que 
compõem o patrimônio histórico e cultural da área de implantação do projeto. 
Outro ponto de suma importância se refere à menção do EIA-RIMA à existência 
da comunidade de Soledade, que, segundo o próprio relatório, se caracteriza como 
comunidade tradicional de remanescência quilombola. A proteção a esses grupos está 
prevista na Constituição Federal, ao tratar do patrimônio cultural brasileiro, sejam eles 
bens de natureza material e imaterial. Segundo o Art. 226 – CF, incisos I e II: 
 
Art. 216 - Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de 
natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em 
conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à 
memória dos diferentes grupos formadores da sociedade 
brasileira, nos quais se incluem: 
I - as formas de expressão; 
II - os modos de criar, fazer e viver; 
[...] 
 
 Assim, é imprescindível a defesa desses grupos e do seu modo de vida 
tradicional, sendo necessário que sejam especificados no RIMA, explicitamente, quais 
serão os impactos à comunidade, de modo que se garanta a proteção à cultura, história e 
memória desses grupos, buscando efetivar a defesa dos direitos culturais e dos modos 
de vida tradicionais, enquanto direitos humanos. 
 
3. DAS AMEAÇAS AO PATRIMÔNIO PÚBLICO 
14 
 
 
Segundo o Relatório de Impactos ao Meio Ambiente – RIMA o investimento 
para a instalação do empreendimento gira em torno de R$ 209.208.693,00 (duzentos e 
nove milhões, duzentos e oito mil, seis e noventa e três reais). Entretanto, no site
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Oficial do DNOCS o valor informado é da ordem de R$ 280.000.000,00 (duzentos e 
oitenta milhões), sendo R$ 240.000.000,00 (duzentos e quarenta milhões) destinados 
a obras de infraestrutura – valor bem acima do citado pelo relatório de impacto 
ambiental – e apenas R$ 40.000.000,00 (quarenta milhões) para ações 
complementares, como desapropriações, reassentamento, aquisição de área de 
preservação e ações ambientais. É possível detectar equívocos no que se refere aos 
valores de investimento, como foi supracitado, além de que percebemos uma 
desvalorização referente às propriedades, pois no processo de desapropriação de 
13.000ha estão previstos apenas 40 milhões em ações de indenização. 
O Relatório de Impactos Ambientais - RIMA, afirma que para a viabilidade do 
Projeto Santa Cruz do Apodi serão realizadas desapropriações nos municípios de Felipe 
Guerra e Apodi, sem, contudo, informar a área total a ser desapropriada, exigência 
constante na resolução 237/1997 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – 
CONAMA. 
 Apenas encontramos tal informação no decreto de desapropriação S/N, de 10 de 
junho de 2011, constando que serão desapropriadas cerca de 13.855 ha (treze mil, 
oitocentos e cinquenta e cinco hectares). 
O RIMA além de não apresentar a informação supra, entra em 
CONTRADIÇÕES no que se refere à superfície agrícola a ser utilizada, posto que em 
sua fl. 02 encontramos que a área agricultável útil será de 9.236 ha (nove mil, duzentos 
e trinta e seis hectares), enquanto que nas fls. 10 e 21, por exemplo, já seria de apenas 
5.200 ha (cinco mil e duzentas hectares), sendo a superfície agricultável bruta de 
8.197 ha (oito mil cento e noventa e sete hectares). 
Trabalhando com os imprecisos dados do relatório, temos que o referido projeto 
será executado em duas grandes etapas, a primeira com 3.000 ha (três mil hectares) e 
uma segunda incorporando 6.236 ha (seis mil duzentos e trinta e seis hectares). 
 
1
http://www.dnocs.gov.br/php/comunicacao/noticias.php?f_registro=2721&f_opcao=imprimir&p_view=short&f_hea
der=1& 
15 
 
No que se refere a questão hídrica encontramos mais um entrave. De início, na 
página 03 do RIMA, o estudo afirma que a viabilidade do projeto dependerá das águas 
oriundas da transposição do Rio São Francisco. Todavia, tal informação será 
contraditada no mesmo estudo, como na página 18, onde se afirma que as águas do Rio 
São Francisco não alimentarão o projeto: 
 
Diferentemente do primeiro estudo, o consórcio 
TECNOSOLO/HYDROS optou por considerar exclusivamente a 
disponibilidade hídrica da bacia hidrográfica do rio Apodi até a 
barragem Santa Cruz, sem reforços decorrentes da Transposição do 
Rio São Francisco, em virtude desta não representar uma infra-
estrutura hídrica disponível na atualidade. 
 
Mais a frente há um breve diagnóstico do panorama hídrico da região (fl. 34): 
 
Observa-se do balanço hídrico que na região de Apodi ocorre déficit 
hídrico mensal durante quase todo o ano. O período de maior 
deficiência hídrica, apresentando valores superiores a 150 mm, está 
compreendido entre os meses de outubro e dezembro, fato decorrente 
da elevada evapotranspiração potencial, alcançando valores da 
ordem de 180 mm, e das baixas precipitações pluviométricas. Mesmo 
durante os meses de março e abril, quando ocorrem precipitações 
mais intensas, a pluviometria não é suficiente para gerar excedente 
hídrico. (grifo nosso) 
 
Pelo que foi exposto até o momento, chegamos a duas conclusões: A primeira, 
de que o potencial hídrico do projeto se resumirá às águas da barragem de Santa Cruz. E 
a segunda, de que essa mesma barragem, por si só, não é capaz de dar segurançaa 
imensa demanda de um projeto de irrigação como esse, uma vez que além de sua vazão 
limitada, é já utilizada para diversos outros fins, como mencionado no RIMA. Assim 
conclui o relatório: As águas do açude somente podem atender a um terço da área a 
ser irrigada, ou seja, 3.000 ha. O volume útil do seu reservatório permite atender às 
demandas a ele atribuídas somente até o ano 2020 respeitando as garantias 
estabelecidas, ou seja, haverá falhas após 2020 se novas fontes hídricas não forem 
contempladas”. (pag. 34) 
 Mesmo diante dessas fragilidades, o Relatório de Impacto Ambiental aponta 
que o projeto de irrigação tem um HORIZONTE DE 50 ANOS, a contar do início das 
obras. Aritmética básica nos basta para mostrar que tal prazo é totalmente inexequível. 
16 
 
Temos que: o respectivo relatório é datado de setembro de 2009, porém a 
ORDEM DE SERVIÇO somente foi assinada 3 anos depois (em 28/08/2012). Nesse 
ínterim, as desapropriações, ações judiciais, instalação do canteiro de obras, contratação 
dos trabalhadores, entre outros, demandarão razoável quantidade de tempo. 
Supondo que as obras comecem em 2013, e sendo finalizadas em meados de 
2015, tomando por base experiências similares, estimamos que A PRIMEIRA ETAPA 
DO PERÍMETRO IRRIGADO SÓ FUNCIONARÁ POR 05 (CINCO) ANOS. 
Diga-se primeira a única etapa, já que, conforme anteriormente foi citado, o potencial de 
vazão da barragem Santa Cruz do Apodi para esta obra é até o ano de 2020. 
Sendo assim, uma vez que o projeto apenas será abastecido pelas águas da 
barragem Santa Cruz do Apodi, com reservas tão somente até 2020, e que não há 
nenhuma previsão de novas fontes hídricas, teremos um gasto de dinheiro público no 
porte de R$ 280.000.000,00 (duzentos e oitenta milhões), para um projeto que terá 
vida útil de uma média de cinco anos. 
 
4. DA EXPERIÊNCIA DO PERÍMETRO IRRIGADO JAGUARIBE-APODI 
 
Na porção cearense da Chapada do Apodi, é marcante, a partir dos anos 2000, a 
implementação de grandes empresas transnacionais e nacionais de fruticultura para 
exportação, incentivadas pelo governo estadual através da disponibilidade de água para 
irrigação dos cultivos, bem como das águas do Aquífero Jandaíra, que também perpassa 
o solo potiguar 
A expansão do agronegócio na região, por sua vez, caracteriza-se por 
transformações nas relações e condições de trabalho, no ambiente e na saúde das 
populações camponesas, bem como no modo vida das comunidades. É de ressaltar que a 
moradia e o acesso à terra, também, são relevantemente alterados nesse processo, posto 
que comunidades inteiras são extintas, muitas vezes, com violência, como aconteceu 
com a comunidade denominada de KM 69, em Limoeiro/CE, onde um dos artifícios 
empregados foi espalhar enxofre na direção dos ventos para as casas, obrigando as 
famílias a deixarem suas terras. 
Desse modo, em decorrência da pressão exercida pelos latifundiários e pela 
nuvem tóxica que chega em suas casas carreada pelo vento, sempre que pulverizam as 
grandes plantações, os pequenos agricultores são obrigados a migrar para a periferia das 
17 
 
cidades, e se transformam em empregados do agronegócio, uma vez que não veem outro 
caminho que não seja aceitar o emprego oferecido nelas, passando assim de pequenos 
produtores para assalariados do agronegócio, que geralmente contrata por safra ou 
produção, tornando o vínculo trabalhista sazonal. 
Com relação ao ambiente e à segurança alimentar, estudos identificaram a 
contaminação das águas subterrâneas na região. A Companhia de Gestão dos Recursos 
Hídricos (COGERH) analisou dez amostras de água de poços na Chapada do Apodi-CE, 
no intuito de verificar a presença de resíduos de agrotóxicos, e os encontrou em seis 
dessas amostras. Além disso, foram analisadas, também, 23 amostras de águas 
superficiais e para consumo humano, provenientes dos canais que abastecem as 
comunidades, ou seja, das caixas d’água e de poços profundos, tendo constatado a 
presença de princípios ativos em todas elas. Percebemos, então, que os agrotóxicos 
utilizados para que a cultura da fruta apresente resultados satisfatórios ao produtor são, 
em sua maioria, muito tóxicos, além de altamente persistentes no ambiente. 
No tocante a saúde pública, podemos citar a pesquisa realizada por Raquel 
Rigotto, professora da faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, sobre a 
intensa exposição ocupacional a agrotóxicos e fertilizantes. A referida pesquisa 
investigou 540 trabalhadores, dos quais 341 são do agronegócio, 156 agricultores 
familiares camponeses e 43 trabalhadores dos assentamentos e comunidades 
agroecológicas. Os estudos demonstraram um quadro de grave problema de saúde 
pública, haja vista que mais de 97% dos trabalhadores, dos dois primeiros grupos, estão 
expostos a agrotóxicos. 
Por fim, podemos dizer que o Perímetro Jaguaripe-Apodi traz implicações para 
o trabalho, o ambiente e a saúde, a saber: a concentração de terras e os deslocamentos 
compulsórios da população; a violência; o comprometimento da segurança alimentar; 
imposição de novos hábitos culturais; mudanças nas práticas sociais e nos laços de vida 
comunitária, bem como na dinâmica de cidades vizinhas, com a formação de “favelas” 
rurais; uso intensivo de novas tecnologias de mecanização e de insumos (fertilizantes e 
agrotóxicos); relações e condições de trabalho precarizadas com baixa remuneração, e, 
consequentemente, descumprimento da legislação trabalhista, intensificação do 
trabalho, exposição a situações de risco à saúde; redução da biodiversidade e dos 
serviços ambientais, degradação do solo pela monocultura e risco de desertificação; 
elevado consumo de água; contaminação do ar e de águas superficiais e subterrâneas 
18 
 
por fertilizantes e agrotóxicos; exposição das comunidades do entorno das fazendas à 
contaminação pelos agrotóxicos utilizados de forma intensiva. 
Todavia, ocultar todos esses problemas faz parte da estratégia de sustentação do 
desenvolvimento desse projeto de morte, que é o projeto de perímetro irrigado. 
 
5. DOS IMPACTOS À PRODUÇÃO AGROECOLÓGICA, CAMPONESA E 
FAMILIAR 
 
O município de Apodi – RN, historicamente, tem articulado sua economia na 
produção agrícola tradicional, de sequeiro, com fortes experiências agroecológicas e 
sustentáveis, bem como na pecuária de ovinos e caprinos. Outro elemento que se 
destaca na economia rural de Apodi é a produção de mel, sem utilização de agrotóxicos, 
que tem gerado renda e aumentado a qualidade de vida dos agricultores da região, os 
quais, em sua maioria, estão organizados em cooperativas. 
Apodi tem se destacado no campo da produção agrícola e pecuária do território 
potiguar, figurando na lista das cinco cidades que se sobressaem nessas atividades, 
segundo estudo realizado pelo IBGE em 2009. O Produto Interno Bruto (PIB) do Rio 
Grande do Norte apresentou aumento no campo da agropecuária, mostrando o potencial 
econômico relacionado com a produção agroecológica e sustentável no vale e na 
Chapada do Apodi. 
No Vale e Chapada do Apodi, está concentrada uma das mais fortes e 
organizadas cadeias produtivas do território potiguar; destacando-se a produção de 
arroz, frutas, hortaliças, mel de abelha, castanha de caju, criação de caprinos, ovinos e 
bovinos, projetos de piscicultura, criação de galinhas e várias outras atividades. 
Nesse sentido, a implantação do Projeto de Irrigação Santa Cruz do Apodi, 
direcionado aos grandes empreendimentos da fruticultura irrigada, poderá ser o fator de 
desarticulação da experiência agroecológica e de agricultura familiar no município nos 
seguintes aspectos: 
 Existe, primeiramente, um confronto de modelos econômicos e matrizesde 
produção entre o que tem se desenvolvido em Apodi acerca de 50 anos e o projeto que 
se pretende instalar. O primeiro traduz um modelo tradicional, policultor, que busca a 
convivência com o semiárido e a agroecologia, de modo a tornar sustentável a produção 
e reduzir os impactos ao meio ambiente. O segundo, prioriza a monocultura e a 
19 
 
exploração de grandes extensões de terra, com grande utilização de agrotóxicos, 
causando diversos problemas aos recursos naturais e à vida humana, assim como tem-se 
provado pelos estudos realizados em diversas universidades e por instituições como a 
ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária ( com a reavaliação de diversos 
princípios ativos de agrotóxicos, que já se encontram proibidos em outros países) e a 
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva (que já mostrou os impactos à 
saúde e ao meio ambiente por meio do Dossiê ABRASCO: um alerta sobre os impactos 
dos agrotóxicos à saúde). 
 Nesse sentido, percebe-se que há uma incompatibilidade de modelos de 
produção, onde se sobressaem a agroindústria e o agronegócio sobre a agricultura 
familiar e os modos de vida e produção tradicionais das comunidades. 
 A partir disso, fica clara a necessidade de defender e preservar as experiências 
agroecológicas no município de Apodi, em consonância com o que expressa no Decreto 
nº 7794/12, que institui a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica. 
 Outro aspecto se refere à produção de mel orgânico na Chapada do Apodi: o 
empreendimento levará ao desmatamento de grande área de maneira abrupta, o que 
causará grandes impactos à apicultura, pois esta depende da vegetação natural para ser 
realizada, como também a utilização de agrotóxicos poderá comprometer a qualidade do 
mel produzido, retirando seu status de orgânico, pois poderá ser contaminado pelos 
venenos, já que estes são muito voláteis e se dispersam pelo ar, água e solo, 
contaminando-os. 
 Além disso, muitas das comunidades que serão atingidas, direta ou 
indiretamente, pelo empreendimento são assentamentos rurais advindos do plano de 
reforma agrária brasileira. Os assentamentos conseguiram se organizar, produzir e ser 
hoje, referência na produção de poupas de fruta e de mel orgânico no estado, sendo 
imprescindível seu amparo. 
Em razão dessa problemática as comunidades camponesas bem como os 
movimentos sociais da região têm resistido fortemente à implantação desse projeto, 
dando origem assim a um conflito ambiental de caráter territorial e distributivo. Posto 
que estes sujeitos defendem um modelo de desenvolvimento rural baseado em 
alternativas agroecológicas, divergindo assim do que o projeto se propõe a fazer, que é a 
instalação da agroindústria na região, e por conseguinte disseminação do uso 
incriminado de agrotóxicos. 
20 
 
A negação a esse projeto baseia-se, principalmente, na experiência da Chapada do 
Apodi da parte que compreende o Ceará, a qual está sendo alvo de inúmeros problemas 
sociais e ambientais trazidos pelo agronegócio. Por esse motivo, torna-se inaceitável a 
implantação de um projeto de irrigação baseado numa ótica de desenvolvimento 
totalmente contraditória à realidade local. 
Portanto, a partir das observações supracitadas, é preocupante a implantação do 
Projeto Santa Cruz do Apodi, pois correm risco de desaparecer as ainda resistentes 
experiências de sustentabilidade no estado do Rio Grande do Norte, que merecem 
proteção e incentivo por parte desse Ministério. 
Sobre a legislação que diz respeito à política agrária brasileira foram 
encontrados diversos diplomas legais, que fundamentam nossa argumentação. Nos 
fazemos valer da Constituição Federal, lei maior do nosso estado, de decretos federais, 
das leis orgânicas dos municípios afetados e demais regulamentações correlatas, 
enumeradas subsequentemente. 
A Constituição Federal garante que a ordem social tem como base o primado do 
trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais. Além de assegurar o direito ao 
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à 
sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de 
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações ( CF/88, arts. 193 e 225), 
a Carta Magna indica que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio 
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e 
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados (CF/88, 
art. 225, § 3º). 
O decreto federal de nº 7.775/12, de 4 de julho de 2012, regulamenta a lei que 
institui o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA, dispõe, em seu artigo 2º, as 
finalidades do PAA, quais sejam: 
I - incentivar a agricultura familiar, promovendo a sua inclusão 
econômica e social, com fomento à produção com sustentabilidade, ao 
processamento, à industrialização de alimentos e à geração de renda; 
II - incentivar o consumo e a valorização dos alimentos produzidos 
pela agricultura familiar; 
III - promover o acesso à alimentação, em quantidade, qualidade e 
regularidade necessárias, às pessoas em situação de insegurança 
21 
 
alimentar e nutricional, sob a perspectiva do direito humano à 
alimentação adequada e saudável; 
IV - promover o abastecimento alimentar por meio de compras 
governamentais de alimentos, inclusive para prover a alimentação 
escolar nos âmbitos municipal, estadual, distrital e federal, e nas áreas 
abrangidas por consórcios públicos; 
V - constituir estoques públicos de alimentos produzidos por 
agricultores familiares; 
VI - apoiar a formação de estoques pelas cooperativas e demais 
organizações formais da agricultura familiar; 
VII - fortalecer circuitos locais e regionais e redes de comercialização; 
VIII - promover e valorizar a biodiversidade e a produção orgânica e 
agroecológica de alimentos, e incentivar hábitos alimentares saudáveis 
em nível local e regional; e 
IX - estimular o cooperativismo e o associativismo. 
 
As recomendações enumeradas serão comprometidas com a inserção do projeto 
nos municípios uma vez que a agricultura familiar será impossibilitada, devido as 
atividades desempenhadas pelo agronegócio. 
Já o decreto nº 7794/12, que institui a política nacional de agroecologia, tem por 
objetivo integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras da transição 
agroecológica e da produção orgânica e de base agroecológica, contribuindo para o 
desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida da população, por meio do uso 
sustentável dos recursos naturais e da oferta e consumo de alimentos saudáveis. 
Como supracitado, Apodi possui uma das maiores experiências agroecologógicas 
do País, mostrando concordância com a política nacional. O agronegócio, por sua vez, 
foge à perspectiva agroecológica, confrontando a política nacional. 
Concordam sobre os mesmos pontos a legislação dos municípios atingidos e a 
Constituição do Estado do Rio Grande do Norte, sobre as questões referentes a 
agricultura e ao meio ambiente. A Lei Orgânica do Município de Apodi atribui ao 
município a competência de zelar pelo meio ambiente e coibir a poluição, além de ao 
desenvolvimento da propriedade em todas as suas potencialidades, a partir da vocação e 
da capacidade de uso do solo, levada em conta a proteção ao meio ambiente; (art.6°, 
VIII; art. 100, VI; art. 144, I, II, III, IV, V, VI). Compete, ainda, ao Município, 
22 
 
concorrentemente com a União ou o Estado, ou supletivamente a eles estimular o 
melhor aproveitamento da terra, bem como as defesas contra as formas de exaustão do 
solo; promover a defesa sanitária vegetal e animal, a extinção de insetose animais 
daninhos (art.8°, III,V,VI). 
O regulamento é claro ao defender o bem-estar do homem como o fim essencial 
da produção e do desenvolvimento econômico, a valorização econômica e social do 
trabalho e do trabalhador, associada a uma política de expansão das oportunidade de 
emprego e de humanização do processo social de produção, com defesa dos interesses 
do povo. Protege a democratização do acesso à propriedade dos meios de produção e, ao 
mesmo tempo, condena os atos de exploração do homem pelo homem e exploração 
predatória da natureza, considerando-se juridicamente ilícito e moralmente indefensável 
qualquer ganho individual ou social auferido com base neles (art.100, II, III, VI, VII; 
arts. 132 e 133). 
Deve-se exigir, na forma da lei, para instalação de obras ou atividades 
potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente, realidade do 
Projeto de Irrigação Santa Cruz do Apodi, estudo prévio de impacto ambiental, a que se 
dará publicidade, na prerrogativa de proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, 
as práticas que coloquem em risco sua funções ecológica, provoquem a extinção de 
espécies ou submetam os animais a crueldade (art. 110, II, III). Estas disposições estão 
recepcionadas pela Constituição Estadual em seus arts. 150 e 152. 
O lajedo de Soledade, que sofrerá impactos advindos do projeto, é patrimônio 
comum de todos os apodienses, possuindo especial tutela do Município, dentro de 
condições que assegurem a preservação e o manejo racional dos ecossistemas (art. 110, 
§2°). Diante de tantas e reiterada garantias assumidas pelo Município, concorrentemente 
com a União ou o Estado, ou supletivamente a eles e em vista, acredita-se que a 
implementação por parte do DNOCS, do projeto de irrigação de Santa Cruz do Apodi 
ferirá todas essas garantias, uma vez que, baseando-se em experiências similares, os 
tópicos tão salvaguardados por esses diplomas jurídicos foram, e estão sendo, violados. 
 
6. DOS REQUERIMENTOS 
 
Pelo exposto, vem-se requerer de V. Exa. enquanto prefeito eleito que se apurem 
as denúncias relatadas acima, no sentido de que, em caso de confirmação das 
23 
 
irregularidades nos procedimentos para instalação do “Projeto Santa Cruz do Apodi”, 
sejam tomadas as devidas providências no intuito de efetivar a proteção ao patrimônio 
histórico e cultural, material e imaterial, ambiental e sócio econômico das centenas de 
pessoas afetadas. 
 
 
 Apodi-RN 31 de outubro de 2012. 
 
 
 
STTR– APODI CPT 
 
 
RENAP GEDIC 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
24 
 
 
 
 
 
 
 
ANEXO I 
Iniciativas de Resistência ao Projeto da Morte: 
 
 
 
Breve registro cronológico das iniciativas de 
resistência dos agricultores do Município de 
Apodi e Movimentos Sociais contra o Projeto 
Santa Cruz do Apodi. 
 
 
 
 
 
25 
 
 10 de junho de 2011 – é assinado o decreto de desapropriação da Chapada do 
Apodi: 
No dia 10 de junho de 2011, o Governo Federal assinou o decreto de 
desapropriação de uma área de mais de 13 mil hectares na Chapada do Apodi - RN, para 
a implantação do Projeto de irrigação na área. A obra é patrocinada pelo Ministério da 
Integração Nacional e está sob o comando do Departamento Nacional de Obras Contra 
as Secas, o DNOCS. Para a implementação do projeto está previsto um gasto que 
ultrapassa os 240 milhões de reais, para garantir a irrigação de até 10 mil hectares 
destinado à fruticultura para exportação. Mais de 150 famílias de pequenos agricultores 
terão que sair das terras onde tradicionalmente vivem há mais de 60 anos para dar lugar 
ao Projeto. Além de atingir diretamente as famílias dos pequenos agricultores, o projeto 
também vai impactar oito assentamentos que estão no entorno. 
Todo esse dinheiro ameaça por fim às experiências desenvolvidas por pequenos 
agricultores e agricultoras, que tornaram a região da Chapada do Apodi uma referência 
nacional e internacional de convivência com o Semi-árido e de produções 
agroecológicas. De acordo com Antônio Nilton, agente da Comissão Pastoral da Terra 
de Mossoró, é nesta região onde há uma das maiores produção agroecológica de mel do 
país, além da caprinocultura, manejo da caatinga e diversas formas de experiências 
desenvolvidas pelas agricultoras e agricultores da região. 
O Projeto de irrigação no Rio Grande do Norte é uma extensão do perímetro 
irrigado de Limoeiro e Russas no Ceará – que compreende também a Chapada do 
Apodi. Naquela região onde o Projeto já foi instalado, as comunidades de camponeses e 
camponesas praticamente desapareceram, apenas algumas famílias permanecem 
resistindo e sofrendo as consequências deste projeto. Um dos maiores problemas 
enfrentados pela população local é a intensa utilização dos agrotóxicos, que tem sido 
alvo de denuncias e pesquisas, a exemplo do estudo desenvolvido pelo Núcleo 
Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a Sustentabilidade (Tramas), da Universidade 
Federal do Ceará (UFC) que identificou os problemas ambientais e de saúde nas 
comunidades do Baixo Jaguaribe (inserida no projeto de irrigação) que estão expostas à 
contaminação ambiental e aos agrotóxicos. O resultado é assustador: foi identificado 
uma grande incidência de pessoas acometidas de câncer, com registros de várias mortes 
ligadas ao contato com os agrotóxicos, contaminação do lençol freático, contaminação 
do solo, alimentos, etc. 
26 
 
Em manifesto entregue ao DNOCS no último dia 16 de junho, os trabalhadores 
rurais, Sindicatos Rurais, organizações e movimentos sociais do campo destacaram que 
“Neste momento, nossa luta central é resistir, denunciar e exigir que o Governo Federal, 
REVOGUE o decreto que torna de utilidade pública 13.855,13 hectares na Chapada do 
Apodi para fins de desapropriação pelo DNOCS, e DIALOGUE com os movimentos 
sociais, outra proposta, que leve em consideração a longa e dura luta dos agricultores 
familiares camponeses da Chapada do Apodi na convivência com o Semi-árido Potiguar 
que serve de exemplo em todo Brasil. 
 
 16 de junho de 2011 – FOCAMPO ressurge aglutinando as diversas representações 
do campo potiguar, segue matéria: 
 
MANIFESTO DO FÓRUM DO CAMPO POTIGUAR 
 
No dia 16 de junho de 2011 o Fórum do Campo Potiguar – FOCAMPO, 
organismo criado no início da década de 90 que congrega movimentos de representação 
política dos agricultores e agricultoras familiares e entidades de assessoria que atuam no 
meio rural retomam suas ações no Rio Grande do Norte (RN), fortalecido pela unidade 
das Lutas no Campo, focado na construção cotidiana de uma proposta de convivência 
com o Semi-árido como um processo de aprendizagem social amplo, marcada pelo 
respeito à natureza, se contrapondo ao modelo agrícola baseado no agronegócio, no uso 
de agrotóxico e no monocultivo, concentrador de terra e renda e destruidor do meio 
ambiente e da Vida. 
Neste, fazemos um registro que no decorrer dos anos no RN os trabalhadores no 
Campo vivenciaram as experiências falidas e desastrosas dos Grandes Projetos de 
Irrigação, a exemplo dos Projetos localizados hoje nos Perímetros Irrigados implantados 
pelo DNOCS nos municípios de Pau dos Ferros, Caicó, Cruzeta e no Baixo Açú. É 
constatado por toda sociedade norte-rio-grandense que essas iniciativas provocaram 
sérios desastres ambientais, econômicos e sociais, acentuadamente com endividamentos 
dos agricultores familiares,tornando-os reféns dos agentes financeiros, forte 
contaminação ambiental do solo e da água, e da saúde da população atingida com 
notável elevação de casos de câncer nas famílias dos trabalhadores, expropriação dos 
imóveis de famílias que viveram culturalmente há anos, e por fim, casos de trabalho 
27 
 
escravo e condições precárias de trabalho. É esse o cenário nefasto que o DNOCS 
deseja instalar na Chapada do Apodi. 
Diante desses impactos já comprovados pela história, a Chapada do Apodi 
encontra-se AMEAÇADA com o projeto de irrigação da Barragem Santa Cruz em 
Apodi que vem na contramão dessa celebração da Vida, que acontece nas comunidades 
e nos assentamentos rurais do Sertão do Apodi há mais de 100 anos. 
Nessa região se concentram as principais experiências de Agroecologia e 
produção de alimentos da Agricultura Familiar voltada para a segurança alimentar das 
famílias camponesas e da população das cidades através da caprinocultura, produção de 
leite, apicultura, cultivos agroecológicos que incluem variedades encontradas somente 
em Apodi no caso do Arroz Vermelho, certificação orgânica da produção, organização 
das mulheres, o cooperativismo solidário responsável pelo beneficiamento e 
comercialização para o mercado institucional e na exportação do mel e da amêndoa da 
castanha de caju, o manejo da caatinga, a valorização do conhecimento popular e 
artesanato, a captação e gestão das águas com as cisternas de placas, barragens 
subterrâneas e o desenvolvimento de práticas que valorizam o sentimento de 
pertencimento e a integração da população ao semiárido. 
É salutar destacar que toda essa dinâmica são frutos da organização dessas 
famílias e dos investimentos de vários Ministérios do Governo Federal, especialmente 
pela Reforma Agrária executada pelo INCRA, o Programa Nacional de Fortalecimento 
da Agricultura Familiar – PRONAF, o Programa Nacional de Crédito Fundiário – 
PNCF, o Projeto Dom Helder Câmara - PDHC, Programa Territórios da Cidadania, 
entre outros. 
Neste momento, nossa luta central é resistir, denunciar e exigir que o Governo 
Federal, REVOGUE o decreto que torna de utilidade pública 13.855,13 hectares na 
Chapada do Apodi para fins de desapropriação pelo DNOCS, e DIALOGUE com os 
movimentos sociais, outra propositura, que leve em consideração a longa e dura luta dos 
agricultores familiares camponeses da Chapada do Apodi na convivência com o Semi-
árido Potiguar, que serve de exemplo, para todo Brasil. 
As grandes conquistas sempre foram e será obra do povo organizado. E, nós do 
Fórum do Campo Potiguar unidos aos demais movimentos sociais libertários deste 
estado, nos comprometemos a lutar, combater e resistir toda e qualquer ação que gere 
injustiça contra o povo trabalhador do campo e da cidade. 
28 
 
“Fora DNOCS e pela Vida em Apodi”!!! 
 
Assinam o Manifesto: 
ARTICULAÇÃO DO SEMI-ÁRIDO – ASA POTIGUAR | ASSEMBLÉIA POPULAR (RN) | COMISSÃO PASTORAL DA 
TERRA – CPT | FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES NA AGRICULTURA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – 
FETARN | FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS NA AGRICULTURA FAMILIAR – FETRAF | 
MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA – MST | MOVIMENTO DE LIBERTAÇÃO DOS SEM 
TERRA – MLST | REDE NACIONAL DE ADVOGADOS E ADVOGADAS POPULARES – RENAP | SINDICATO DOS 
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE APODI 
 
 19 de julho de 2011 – Ministro da Integração Nacional recebe membros do 
FOCAMPO na tentativa de abrir um dialogo com o Governo Federal, segue 
matéria: 
 
Ministro manda rever projeto da chapada 
 
Brasília/Apodi - Os pequenos agricultores da Chapada do Apodi conseguiram 
ontem uma vitória no Ministério da Integração Nacional na luta contra o Departamento 
Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), sobre como aproveitar a água da Barragem 
de Santa Cruz, em Apodi. O Dnocs propõe transpor as águas para uma região da 
chapada e os agricultores defendem que a água da barragem seja usada para fomentar a 
agricultura familiar. 
A reunião foi realizada no gabinete do ministro Fernando Bezerra, da Integração 
Nacional, ao meio-dia de ontem, com a presença da governadora Rosalba Ciarlini, do 
senador/ministro Garibaldi Alves, da deputada federal Fátima Bezerra, deputado 
estadual Fernando Mineiro, e uma comitiva de agricultores do município de Apodi e 
também da região do Vale do Jaguaribe. Também participou da audiência o presidente 
do Dnocs, o ex-deputado federal Elias Fernandes. 
Os primeiros debates foram vencidos pelos grandes produtores que fortalecem a 
ideia da agroindústria em território do Rio Grande do Norte e do Ceará. O Dnocs já 
estava trabalhando (realizando audiências públicas) para desapropriar uma área de 14 
mil hectares na chapada do Apodi e investir um valor aproximado a R$ 280 milhões na 
instalação de um sistema adutor e a instalação da estrutura de alvenaria na região da 
Chapada do Apodi para assentar 351 agricultores. 
29 
 
Entretanto, o projeto de criação do Distrito Irrigado da Chapada do Apodi não 
recebeu o aval dos produtores da região. Alegam vários motivos. O primeiro foi exposto 
pelo presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Apodi, Edilson Neto. "O 
Dnocs está querendo fazer o inverno da reforma agrária. É que esta área que está para 
ser desapropriada pertence a centenas de pequenos produtores rurais e depois seria para 
grandes produtores", explica Edilson Neto. 
O segundo problema foi exposto pela engenheira florestal, mestre em Meio 
Ambiente e doutora em Agricultura Tropical, Verlândia Morais. Segundo ela, esse tipo 
de distrito irrigado proposto pelo Dnocs para a Chapada do Apodi tem vários 
fracassados pelo Nordeste. Exemplos não faltam. Verlândia observa o alto custo de 
manutenção do sistema adutor (energia) e também da estrutura de distribuição de água 
dentro do distrito irrigado. 
De forma mais incisiva, a doutora Raquel Rigotto, professora e pesquisadora do 
Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade 
Federal do Ceará, declarou que a grande quantidade de agrotóxico usada pelo 
agronegócio está causando uma série de doenças crônicas na população rural, alem de 
prejuízos evidentes à economia das famílias. Assim como os demais, Rigotto orienta a 
necessidade de mais investimentos na agricultura familiar. 
Segundo Procópio Lucena, coordenador da Articulação do Semi Árido (ASA), o 
caminho correto para aproveitar o potencial hídrico da barragem de Santa Cruz, assim 
também como da Barragem de Umari, é investir na agricultura familiar. No caso de 
Apodi, o melhor é fazer o sistema adutor para irrigar a região de várzea nos períodos de 
estiagem por gravidade. Ao menos é isto que os pequenos produtores querem e estão 
dispostos a ir às ruas por isto. 
Todas as questões foram expostas ao ministro Fernando Bezerra ontem pelos 
representantes legais dos trabalhadores da região de Apodi e também do Vale do 
Jaguaribe. O presidente do Dnocs, Elias Fernandes, assistiu a tudo. Em alguns 
momentos ainda tentou sustentar a sua tese de que o melhor é investir no agronegócio 
na Chapada do Apodi, mas seus argumentos apresentaram-se fracos diante da 
quantidade e a qualidade técnica versado no sentido contrário. 
 
 
30 
 
 25 de julho de 2011 – 2.000 Agricultores/as vão as ruas de Apodi dizer NÃO ao 
Projeto da Morte, segue matéria: 
 
RN diz não ao Perímetro Irrigado da Chapada do Apodi. 
 
No dia do Trabalhador (a) Rural cerca de 2.000 Agricultores (as) lotaram as ruas 
de Apodi –RN. Uma grande caminhada pelas ruas da cidade marcou o dia. Os 
agricultores (as) aproveitaram o dia para protestar contra o Projeto de Irrigação da 
Chapada do Apodi e apresentaram suas alternativas. 12 de agosto de 2011 – Dialogam com o governo federal através do Ministério da 
Agricultura e Ministério da Integração Nacional, segue matéria : 
Movimento que se propõe rediscutir o Projeto de Irrigação da Chapada do Apodi 
avança nas Discussões 
Ontem (12) As Organizações que compõem o FOCAMPO (Fórum do Campo 
Potiguar) que representam os trabalhadores (as) que atuam no campo no Estado do Rio 
Grande do Norte juntamente com alguns Agricultores (as) de Assentamentos da 
Chapada do Apodi estiveram reunidos com o Secretário Nacional de Irrigação Ramon, 
representante do Ministério de Integração; e com Vital representante do Ministério do 
Desenvolvimento Agrário (MDA). 
As discussões foram bastante positivas diante das proposições apresentadas 
pelos movimentos e agricultores, onde o Secretário Nacional de irrigação o Senhor 
Ramon afirmou que “O Projeto precisa ser rediscutido e revisto de modo que este não 
venha a prejudicar os agricultores que moram na Chapada do Apodi”. 
Ainda estiveram presentes nessa reunião com a Deputada Federal do RN Fátima 
Bezerra, e o Deputado Estadual Fernando Mineiro. 
 
 18 de Novembro de 2011 – Camponesas de Apodi enviam cerca de duas Mil cartas 
a Presidência da Republica contra o Projeto da Morte, segue matéria : 
Agricultoras apodienses enviam 2.000 Cartas a Presidente da República. 
Na manhã da última sexta-feira (18), a Comissão de Mulheres do Sindicato de 
Trabalhadores e Trabalhadoras rurais do município de Apodi enviaram cerca de 500 
cartas, endereçadas à Presidência da República, pedindo a Presidenta Dilma Rousseff a 
revogação do Decreto Nº 0-001 de 10 de junho de 2011 para desapropriação de mais de 
31 
 
13 mil hectares de terra na região da Chapada do Apodi que expulsará de suas casas, 
terras e de sua história mais de 150 famílias. 
Quem coordena o projeto de desapropriação e, ao mesmo tempo, de expulsão 
dessas dezenas de famílias é o Departamento Nacional de Obras contra a Seca 
(DNOCS). “O DNOCS em tese deveria lutar juntamente com trabalhadores e 
trabalhadores do Nordeste para a convivência sustentável no Semiárido, no entanto o 
que a instituição está fazendo com esse projeto é se juntar com as empresas do agro e 
hidronegócio para nos expulsar de nossas casas, nossas terras e nossa história que temos 
construído ao longo de mais de 60 anos somente nessa região”, declara Francisca de 
Lima, mais conhecida como Kika, coordenadora da Comissão de Mulheres do STTR 
Apodi. 
“O envio destas cartas para a nossa presidenta, que é uma mulher de luta, é para 
mostrar que nós não queremos esse projeto aqui em Apodi, pois não vai trazer 
benefícios para nós pequenas agricultoras e apicultoras, ao contrário vai envenenar 
nossas abelhas, vai envenenar nossa comida e nossa água”, declara Francisca, 
trabalhadora rural do Assentamento Sítio do Góis. 
De acordo com Kika a iniciativa de escrever tantas cartas para a Presidenta 
Dilma surgiu em uma das reuniões da Comissão de Mulheres do STTR Apodi quando 
se discutia as alternativas de barrar esse projeto no município. “Foi um desafio muito 
grande para as mulheres escreverem essa carta, pois a maioria sabe escrever muito 
pouco e muitas vezes tínhamos que dizer letra por letra para que todas pudessem 
expressar em suas próprias palavras sua luta e indignação contra o projeto”, afirma 
Kika. 
Enviadas essa última remessa, de um total de 2.000 cartas, começa agora uma 
nova fase, o momento para outras pessoas que não são de Apodi enviarem cartas para o 
planalto se solidarizando com a luta da Chapada. 
Para o envio de cartas a presidência o endereço é: Presidência da República | 
Palácio do Planalto | Praça dos Três Poderes | Zona Física Administrativa | Cep.: 
70150.900 | Brasília/DF. 
Urgente! Mulheres da MMM do Brasil pedem solidariedade a Apodi 
Companheiras, 
A Marcha Mundial das Mulheres do Brasil solicita a solidariedade de 
companheiras e companheiros de todo o mundo em sua luta para revogar o Decreto Nº 
0-001 de 10 de Junho de 2011. Esse decreto irá desapropriar mais de 13 mil hectares de 
terra na região da Chapada do Apodi, na região Nordeste brasileira, expulsando mais de 
150 famílias, que correspondem a cerca de 500 pessoas. 
32 
 
A maioria dessas famílias e grupos é constituída de militantes da Marcha 
Mundial das Mulheres e de outros movimentos sociais brasileiros que serão expulsos de 
suas casas, de suas terras e de uma história de afirmação da agricultura camponesa, 
baseada na agroecologia e na soberania alimentar, que vem sendo construída por esses 
trabalhadores e trabalhadoras há mais de 60 anos. 
O objetivo desse projeto de desapropriação, coordenado pelo Departamento 
Nacional de Obras contra a Seca (DNOCS), um departamento do governo Brasileiro, é 
beneficiar 5 (cinco) grupos de empresários do hidro e agronegócio, desviando as águas 
da Barragem de Santa Cruz do Apodi para a irrigação. A ação dessas empresas em 
regiões próximas já mostrou seus efeitos perversos: contaminação da água da terra e do 
ar com veneno usado nas plantações e exploração do trabalho das mulheres no campo.. 
Solicitamos sua solidariedade urgente por meio do envio de manifestações 
contrárias á aprovação deste projeto, diretamente para a Secretaria-Geral da Presidência 
da República antes da data de 27 de novembro de 2011. Encaminhamos abaixo um 
modelo de mensagem. Por favor, podem copiar o conteúdo e enviar assinado por seu 
movimento ou entidade para o email: sg@planalto.gov.br com copia 
parainfo@marchemondiale.org 
Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres! 
Marcha Mundial das Mulheres – Brasil 
 
 21 de Dezembro de 2011 – Movimentos do Campo do RN e do Brasil vão a 
secretaria Geral da Presidencia da Republica denunciar o Projeto da Morte, segue 
a matéria : 
 
Ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República recebe hoje (21) 
lideranças do campo do RN. 
Hoje (21) o Ministro Gilberto Carvalho (Ministro-chefe da Secretaria-Geral da 
Presidência da República) estará recebendo pela manhã às 10h30min. várias lideranças 
que compõem o Fórum do Campo Potiguar, onde na oportunidade será pautado o 
Projeto de Irrigação da Chapada do Apodi. 
A audiência foi solicitada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), além 
das várias lideranças que estarão presentes a reunião contará com a presença do 
Professor João Abner que é doutor em Recursos Hídricos da Universidade Federal do 
Rio Grande do Norte (UFRN). 
33 
 
Edilson Neto também estará participando da reunião representando os 
agricultores (as) familiares do município de Apodi. 
Logo mais traremos maiores informações sobre a Audiência que acontece no 
Ministério da Sec. Geral da Presidência da República. 
 
 25 de Julho de 2012 – Cerca de 3.000 agricultores/as fazem caminhada em Apodi 
para dizer Não ao Projeto da Morte, segue a matéria : 
 
Mais de três mil agricultoras e agricultores, mulheres militantes da Marcha 
Mundial das Mulheres e demais movimentos sociais da região para protestar contra o 
Projeto do Perímetro Irrigado da Chapada do Apodi proposto pelo Departamento 
Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). 
Foi realizada uma caminhada de 5 km e a multidão tomou conta das ruas da 
cidade de Apodi com faixas, cartazes, carro de som e palavras de ordem para alertar a 
sociedade e barrar a execução desse projeto que irá desapropriar mais de 13 mil hectares 
de terra da Chapada do Apodi para entregar a 05 empresas do agronegócio expulsando 
centenas de famílias e interrompendo os processos de agroecologia e soberania 
alimentar que estão em curso na Região. 
Os agricultores e agricultoras propõe, além de outras reivindicações, que os 
recursos desse projetosejam para o fortalecimento da agricultura familiar e arranjos 
produtivos com base na agroecologia, e ainda assistência técnica para as famílias com a 
continuidade e ampliação do Projeto Dom Helder Câmara. 
 As mulheres da Chapada do Apodi estão firmes nesta luta juntamente com as 
organizações sociais por serem protagonistas de inúmeras experiências produtivas e de 
geração de renda nesta região refletindo a autonomia conquistada a partir dos processos 
de auto organização das mulheres desse município. 
 
A nossa Luta é Todo Dia! Nossa Chapada Não é Mercadoria! 
 
 
34 
 
 
 
 
ANEXO II 
Registro Fotográfico das Experiências de 
Resistência ao Projeto da Morte: 
 
 
 
Breve registro fotográfico das iniciativas de 
resistência dos agricultores do Município de 
Apodi e Movimentos Sociais contra o Projeto 
Santa Cruz do Apodi. 
 
 
35 
 
 
 Audiência do Ministro da Integração Nacional e membros do FOCAMPO – 
19/07/2011 
2.000 Agricultores vão às ruas de Apodi para dizer NÃO ao Projeto da Morte – 
25/072011 
36 
 
2.000 Agricultores vão às ruas de Apodi para dizer NÃO ao Projeto da Morte – 
25/072011 
2.000 Agricultores vão às ruas de Apodi para dizer NÃO ao Projeto da Morte – 
25/072011 
37 
 
Audiência com o Ministério da Agricultura e com o Ministério da Integração Nacional – 
12/08/2011 
 
3.000 Agricultores vão novamente às ruas de Apodi dizer NÃO ao Projeto da Morte – 
25/07/2012 
38 
 
 
Trabalhadora rural em Apodi, falando contra o Projeto da Morte – 25/07/2012 
 
39 
 
 
Trabalhador rural em Apodi, falando contra o Projeto da Morte – 25/07/2012

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