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1 MATERIAL DIDÁTICO FUNDAMENTOS DE BIOFÍSICA Impressão e Editoração U N I V E R S I DA D E CANDIDO MENDES CREDENCIADA JUNTO AO MEC PELA PORTARIA Nº 1.282 DO DIA 26/10/2010 0800 283 8380 www.ucamprominas.com.br 2 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3 UNIDADE 1 – BIOFÍSICA – EVOLUÇÃO, INTER-RELAÇÕES DA CONTEMPORANEIDADE E URGÊNCIA DO AVANÇO TECNOLÓGICO/CIENTÍFICO .................................................................................... 5 UNIDADE 2 – O QUE SE ENSINA E O PORQUÊ DA BIOFÍSICA .......................... 10 UNIDADE 3 – MEDIDAS, PADRÕES, GRANDEZAS, GRÁFICOS E ESCALAS .... 14 UNIDADE 4 – BIOMÊCANICA ................................................................................. 27 UNIDADE 5 – BIOELETRICIDADE .......................................................................... 31 UNIDADE 6 – BIOACÚSTICA .................................................................................. 36 UNIDADE 7 – BIOFÍSICA ÓPTICA .......................................................................... 43 UNIDADE 8 – BIOFÍSICA DAS RADIAÇÕES IONIZANTES ................................... 47 UNIDADE 9 – A ESSÊNCIA DA PRÁTICA EM BIOFÍSICA ..................................... 55 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 63 3 INTRODUÇÃO A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria Paulo Freire O ensino de ciências e o uso das novas tecnologias precisam caminhar juntos, não como um fim em si mesmo, mas para preparar os profissionais para os diversos desafios que irão encontrar ao longo de suas carreiras. No tocante à Biofísica, esta disciplina ou ainda “cadeira” como dizem em algumas universidades, é ministrada para vários cursos, principalmente os da área de Biologia e Saúde, sempre adaptando os seus conteúdos à realidade de cada curso, geralmente focando o estudo dos seres vivos em suas partes mais minúsculas, as moléculas. Da Biofísica surgiu a nanotecnologia que vem revolucionando as Ciências Médicas, novas oportunidades, métodos, terapias, diagnósticos de doenças com base no conhecimento das estruturas moleculares, passaram a ser desenvolvidos. A Biofísica também examina fenômenos em ecossistemas completos, para o que se tornam necessários conhecimentos da física do cotidiano e, claro, como aplicá-la na natureza e na biologia. Como intitula a apostila, veremos os fundamentos da Biofísica, entendendo por fundamentos as razões, os motivos, as justificativas, os argumentos, enfim, as bases dessa área de conhecimento, por isso, propomos inicialmente algumas reflexões acerca das inter-relações da biologia e da física, que na verdade agregam matemática e química e sua urgência em virtude dos avanços tecnológicos e científicos. Na sequência, daremos algumas pinceladas nas unidades, padrões, grandezas e escalas usuais por esse profissional. O que se ensina, e o porquê se ensina biofísica, faz parte da terceira unidade. 4 Para cada um dos conteúdos a seguir dedicamos uma unidade, de antemão, já avisamos que o assunto não se esgota: biomecânica, bioeletricidade, bioacústica, biofísica óptica, biofísica das radiações ionizantes. Teoria e prática são indissociáveis, portanto, dedicamos a última unidade justamente para mostrar, além dos objetivos, comportamentos, aparelhos e utensílios de uso mais frequente nos laboratórios e a preparação de soluções, algumas práticas que envolvem as relações da física com a biologia, e claro, a química permeia ambas, afinal de contas, a indissociabilidade deveria ser uma das características de qualquer disciplina. A prática nada mais é do experimentar o que foi visto na teoria e não há maneira mais clara, estimulante e eficiente de se proceder à aprendizagem e ao aprimoramento de conceitos, além de auxiliar o professor a mapear os conhecimentos e dificuldades de determinado grupo de alunos sobre igualmente, determinados temas estudados. Duas observações se fazem necessárias: Em primeiro lugar, sabemos que a escrita acadêmica tem como premissa ser científica, ou seja, baseada em normas e padrões da academia. Pedimos licença para fugir um pouco às regras com o objetivo de nos aproximarmos de vocês e para que os temas abordados cheguem de maneira clara e objetiva, mas não menos científicos. Em segundo lugar, deixamos claro que este módulo é uma compilação das ideias de vários autores, incluindo aqueles que consideramos clássicos, não se tratando, portanto, de uma redação original. Ao final do módulo, além da lista de referências básicas, encontram-se muitas outras que foram ora utilizadas, ora somente consultadas e que podem servir para sanar lacunas que por ventura surgirem ao longo dos estudos. 5 UNIDADE 1 – BIOFÍSICA – EVOLUÇÃO, INTER-RELAÇÕES DA CONTEMPORANEIDADE E URGÊNCIA DO AVANÇO TECNOLÓGICO/CIENTÍFICO Apontamentos de Roque (2014) dizem que o termo “biofísica” foi usado pela primeira vez na literatura científica pelo matemático e estatístico inglês Karl Pearson em seu livro ‘The Grammar of Science’, publicado em 1892. Segundo Pearson: “O leitor pode acreditar que nossa classificação [das ciências] está agora completa, mas há ainda um ramo da ciência ao qual é necessário nos referirmos.” Pearson explica que, aparentemente, não há nenhuma ligação entre as ciências físicas e biológicas e sugere que “um ramo da ciência, portanto, é necessário para lidar com a aplicação das leis dos fenômenos inorgânicos, ou física, ao desenvolvimento das formas orgânicas”. Ele propõe que esse novo ramo da ciência seja chamado de “bio-física”. Mesmo antes do aparecimento do termo “biofísica”, alguns cientistas já faziam algo que se poderia chamar de biofísica. Para Roque (2014), o surgimento da biofísica se dá a partir dos experimentos do físico italiano Luigi Galvani (1737-1789), com sapos, na década de 1780. Nesses experimentos, Galvani conectava os nervos que controlam os 6 membros inferiores de um sapo a fios condutores expostos a correntes elétricas (provocadas por raios, por exemplo). Galvani mostrou que a eletricidade produzida pelos raios podia provocar contrações nas pernas do sapo e esta foi a primeira evidência experimental de que um fenômeno observado apenas em seres vivos (movimento de membros) podia ser controlado por um fenômeno puramente físico (uma descarga elétrica). No século XIX, vários físicos e médicos se dedicaram à aplicação da física na explicação de fenômenos fisiológicos. Em particular, o físico e médico alemão Hermann von Helmholtz (1821-1894), destacou-se por seus estudos sobre percepção sensorial e neurofisiologia, sendo o primeiro a determinar a velocidade de propagação de um estímulo por uma fibra nervosa (ROQUE, 2014). Já no século XIX, os princípios da Física estabelecidos por Isaac Newton começaram a ser aplicados nas Ciências Biológicas, tendo a posteriori (década de 1940) nos alemães, os pioneiros que integraram Física e Biologia na Escola Alemã de Fisiologia, facilitando as pesquisas do neurofisiologista Emil DuBois-Reymond, que descreveu as descargas elétricas nos neurônios. Esse foi o início de novaspossibilidades para a ciência, especialmente utilizando a bioeletricidade (FIOCRUZ, 2014). Mas, é no século XX que a biofísica ganhou grande impulso após a publicação, em 1944, do livro escrito pelo físico austríaco e prêmio Nobel de física Erwin Schrödinger (1887-1961) “What Is Life? The Physical Aspects of the Living Cell” (edição brasileira: “O que É a Vida? O aspecto físico da célula viva”. Editora da UNESP, São Paulo, 1997). Outros eventos marcantes citados por Roque (2014) são: em 1946, o Conselho de Pesquisas Médicas do Reino Unido (Medical Research Council – MRC) cria a Unidade de Pesquisa em Biofísica (Biophysics Research Unit – BRU) do King’s College de Londres. Esta unidade foi a primeira a contratar físicos, biólogos e químicos para trabalhar em problemas de interesse biológico; o físico inglês Maurice Wilkins (1916-2004) e a química inglesa Rosalind Franklin (1920-1958) estavam entre os primeiros contratados da Unidade de 7 Biofísica do King’s College e lá eles começaram a usar difração de raios-X para analisar a estrutura da molécula de DNA; em 1953, o físico inglês Francis Crick (1916-2004) e o biólogo americano James Watson (1928-), que trabalhavam na época no Laboratório Cavendish da Universidade de Cambridge, usaram os dados experimentais de Franklin para propor seu famoso modelo para a estrutura em dupla hélice do DNA; em 1958, foi fundada a Biophysical Society, para “encorajar o desenvolvimento e a disseminação do conhecimento em biofísica” (http://www.biophysics.org). A partir daí, a biofísica cresceu e se diversificou enormemente. Novos campos surgiram, por exemplo, a neurociência (termo criado em meados da década de 1960), levando ao aparecimento de novas especialidades interdisciplinares, sociedades e revistas científicas (ROQUE, 2014). Aqui no Brasil, Carlos Chagas Filho se especializou em Física Biológica na Fundação Oswaldo Cruz e foi o primeiro a estudar as curiosas correntes elétricas do peixe-elétrico (Electrophorus eletricus) conhecido como Poraquê da Amazônia (FIOCRUZ, 2014). Quanto à inter-relação dessa disciplina, Guimarães (2010) na introdução de sua dissertação de Mestrado, explica sem muitas delongas, de maneira clara, objetiva e interessante, a importância das relações entre Física e Biologia e suas implicações para o mundo pós-moderno em que os avanços tecnológicos exigem cada vez mais conhecimentos e competências dos cientistas para, além de desvendarem os mistérios desse mundo ‘micro’, na realidade, ‘nano’, aplicarem esses conhecimentos em prol de toda humanidade, seja na área de saúde, seja para os negócios. Como ele explica, nossa sociedade atual, em constante avanço, exige criação de postos de trabalho com profissionais que dominem muito mais que os conhecimentos. Estes profissionais generalistas e ao mesmo tempo especialistas precisam, cada vez mais, trabalhar de maneira interdisciplinar. No que se refere à Biologia e à Física, a relação entre ambas torna-se cada vez mais presente e importante no cenário educacional. O avanço científico ocorre de várias maneiras, talvez a mais importante delas seja a comunicação entre as 8 diversas áreas do conhecimento gerando resultados que podem ser úteis em uma grande variedade de situações. A Biologia, constantemente, faz uso de conceitos e técnicas de outras áreas, incluindo a física, mesmo possuindo seus próprios métodos de pesquisa e coleta de dados. Esta conexão entre áreas ocorre também, por meio do intenso uso de aparelhos para exames de diagnóstico, na sua maioria baseados em princípios físicos (GUIMARÃES, 2010, p. 15). A verdade é que, como diz Corso (2009) tornou-se já senso comum afirmar que o século XX foi da física e o XXI será da biologia. Palavras com o prefixo bio são criadas a todo o momento: biotecnologia, bioinformática, biorremediaçaão, biomecânica, bioindicador, bioestatística. Envolta em manto de mistérios a partícula semântica bio fascina e encanta. Mas voltemos à Educação Básica, só por um momento, por favor... Que o processo de aprendizagem é sempre um desafio para os educadores não temos dúvida. Que é mais do que um desafio para certos educandos também temos como certo! Entretanto, no tocante à Biologia, ela pode ser uma das disciplinas mais relevantes e merecedoras de atenção dos alunos, dependendo, é claro, do que será ensinado e como. Se pensarmos no educando e na forma destes se relacionaram com os conteúdos, alguns deles se preocupam apenas com os resultados dos estudos traduzidos pela nota ou conceito; outros buscam aprofundar o estudo e analisar para atingir uma visão mais ampla. Krasilchik (2005, p. 12 apud ROSSASI e POLINARSKI, 2008, p. 3) descreve quatro níveis de alfabetização biológica: 1º nível: Nominal – quando o estudante reconhece os termos, mas não sabe seu significado biológico; 2º nível: Funcional – quando os termos memorizados são definidos corretamente, sem que os estudantes compreendam seu significado; 3º nível: Estrutural – quando os estudantes são capazes de explicar adequadamente, em suas próprias palavras e baseando-se em experiências pessoais, os conceitos biológicos; 9 4º nível: Multidimensional – quando os estudantes aplicam o conhecimento e habilidades adquiridas, relacionando-as com o conhecimento de outras áreas, para resolver problemas reais. Os alunos ao concluírem o Ensino Médio deveriam atingir o 4º nível de alfabetização biológica, conforme indicado na citação anterior. Assim, além de compreender os conceitos básicos da disciplina, eles devem estar capacitados a articular o seu pensamento de forma independente, aplicando seu conhecimento na vida e intervindo para resolver problemas. É isso que esperamos de você, educador, que comprometido com sua práxis se empenhe para que esses alunos possam atingir o esperado. Aprofundar os conteúdos, promover seminários, grupos de estudos, aulas em laboratório, utilizar outros recursos como a resolução de problemas, trabalhar por projetos, contextualizar/relacionar situações cotidianas são apenas algumas sugestões de métodos que podem fazer uso para motivá-los e instigá-los. 10 UNIDADE 2 – O QUE SE ENSINA E O PORQUÊ DA BIOFÍSICA Antes de analisarmos o que se ensina na Biofísica e o porquê dessa disciplina, vamos defini-la da maneira mais simples possível! A biofísica é a física da biologia, assim como a astrofísica é a física da astronomia e a física nuclear é a física dos núcleos atômicos. Uma vez que a física estuda a matéria e a energia, em se tratando da Biofísica, ela busca entender como as leis da matéria e energia funcionam nos sistemas vivos. De maneira geral, ela usa os princípios, teorias e métodos da física para entender a biologia, e como a biofísica é interdisciplinar, ela encontra espaço e “companheirismo” também na química e na matemática. Embora na prática atue e estude “eventos” a nível molecular, ela também inclui abordagens fisiológicas, anatômicas e ambientais das coisas vivas (ROQUE 2014). Como disciplina acadêmica, é verdade que a biofísica não possui a mesma definição clara de outros campos mais antigos e bem estabelecidos. Biofísica pode significar o estudo de assuntos tão diversos como a estrutura das membranas celulares, as interações entre as moléculas de DNA e as proteínas que controlam a expressão gênica, os mecanismos de propagação de sinais no sistema nervoso e a maneira como uma força é gerada pela contração de um músculo. Ela lida também com questões relacionadas à formação e à morfologia das organelas celulares e às forças que influenciam o crescimento dos tecidos biológicos.A biofísica tenta descobrir as variáveis físicas que determinam as estruturas estáticas e dinâmicas dos sistemas biológicos. A biofísica também tem a ver com sinalização e comunicação: por exemplo, a excitação nervosa e a transdução dos quanta de luz nos fotorreceptores visuais são fenômenos intrinsecamente físicos. O desenvolvimento da tensão muscular, a locomoção de amebas e as correntes de movimento no citoplasma também têm que ser explicadas em termos de quantidades físicas, neste caso energia e força. 11 De maneira similar, a fotossíntese e fenômenos bioenergéticos a ela relacionados envolvem mecanismos físicos tão básicos que o seu estudo pode ser chamado de “biofísica quântica”. Existem outras áreas da biologia e da medicina nas quais conceitos e metodologias da física desempenham um papel central. Vejamos: a biologia das radiações – a interação da radiação ionizante com os materiais biológicos – é um assunto que historicamente tem sido identificado como uma área da biofísica; a instrumentação para diagnóstico, como detectores ultrassônicos de fluxo sanguíneo, a tomografia computadorizada e o imageamento por ressonância magnética envolvem técnicas físicas; os novos usos da espectroscopia biológica também frequentemente requerem um conhecimento profundo de vários tópicos das ciências físicas (NOSSAL; LECAR, 1991 apud ROQUE, 2014). Corso (2009) também justifica conjuntamente o que e o porquê do ensino da Biofísica: um médico precisa conhecer a lei de Bernoulli e a transição do regime laminar para o turbulento para entender os sons pulmonares e cardíacos; também relacionado ao sistema circulatório, a velocidade do sangue na saída do coração pode ir a 30 cm/s e nos capilares não passa de 0,3 mm/s o que se explica pela conservação da vazão em sistemas em série e paralelo; para se entender a queda de pressão ao longo do sistema circulatório (e o motivo de possuirmos afinal um coração) é preciso saber o que são fluidos reais e o que é a viscosidade; no sistema auditivo ela também se faz presente no conceito de impedância acústica, pois o som com o qual nos comunicamos se propaga no ar, mas o corpo humano é constituído principalmente de água que possui uma impedância acústica muito maior do que o ar, devido a isto, a maior parte da energia da onda sonora vinda do meio exterior é refletida no ouvido ao invés de ser transmitida para dentro do crânio. Desta forma, o nosso sistema auditivo, ao longo de sua história evolutiva, teve que desenvolver 12 mecanismos de ganho extraordinários para compensar esta perda. Curiosamente, a audição nos organismos aquáticos não enfrenta este problema, sendo então muito mais simples do ponto de vista anatômico e fisiológico; também vêm da Biofísica os conceitos de pressão osmótica para entender o funcionamento do rim e da troca de fluidos através das membranas, refração da luz no olho, difusão e diferença de potencial na membrana celular, pressão parcial de gases e difusão no sistema respiratório, pressão em fluidos na descrição da medida da pressão cardíaca, ou alavancas na compreensão da biomecânica do sistema esquelético muscular; a intensidade da onda (ou radiação), que possibilita o entendimento de escala decibel em acústica, da sensibilidade visual em fisiologia da visão, e da radioproteção em radiobiologia vem da Biofísica. Vale ressaltar que os conhecimentos adquiridos pelas diversas disciplinas (física, biologia, matemática e química) precisam ser articulados, detectando-se o que é relevante e fundamental, o que é secundário de cada disciplina. Tanto Corso (2009) quanto Angotti (1993) citados por Guimarães (2010), destacam a importância dos conceitos como “construtos dialéticos por excelência”1 e exemplificam o que, no trabalho do professor, chama-se de interdisciplinaridade: um convite a ações comuns, articulação entre os conteúdos da Física e da Biologia. Deve-se levar também em consideração que a Física de Superfícies (capilaridade e tensão superficial) e a Física Nuclear (radioproteção) são importantes para alunos de Biologia e de Engenharia, embora as aplicações sejam, na sua maioria, bastante diversas. O mesmo pode ocorrer com o ensino de Estática e Eletromagnetismo, pois a Estática é importante para o fisioterapeuta entender os princípios da Biomecânica enquanto que o Eletromagnetismo tem relevância em exames e tratamentos fisioterápicos. Os exemplos acima citados têm o objetivo de 1 A construção dialética do conhecimento implica uma relação também dialética entre o professor e o aluno, a percepção do aluno dentro do processo de ensino e aprendizagem como um sujeito autônomo, alguém que seja capaz de construir uma relação significativa no processo de elaboração do conhecimento com o professor (GUIMARÃES, 2010, p. 24) 13 ressaltar quais tópicos da Física podem ser usados com enfoque em algumas áreas da Biologia. Já a Biologia Experimental faz uso intensivo de aparelhos e técnicas experimentais que têm como sua base de conhecimento a Física, a Engenharia e a Química. Para a ecologia, temos a Física do Meio Ambiente. Segundo documentário da Discovery – (EARTH 2100) – Wild Weather Ahead, de 2007, com o título em português de “A Terra em Cem Anos” (arquivo próprio), há um simulador denominado Simulador Terrestre que se encontra em Yokohama, no Japão. Esse supercomputador é um dos mais velozes do mundo, visto que consegue processar dados com velocidade de trinta e cinco trilhões de cálculos por segundo. São na verdade cinco mil computadores interligados prevendo padrões do clima terrestre nos próximos cem anos. Inclusive, segundo o documentário, foi previsto um desastre natural, em Santa Catarina, em agosto de 2004, onde ocorreria a passagem do primeiro furacão em nosso litoral. O documentário apresenta relato de meteorologistas de todo o mundo, inclusive do brasileiro Clóvis Correa. Essa tempestade, batizada de furacão Catarina, matou 11 pessoas, destruiu casas e danificou milhares de outras. Exemplos como estes indicam que o trabalho interligado de várias ciências como a Matemática, a Física, a Biologia e a Engenharia, além de produzir avanços no conhecimento, podem gerar bons frutos para toda a sociedade (GUIMARÃES, 2010). 14 UNIDADE 3 – MEDIDAS, PADRÕES, GRANDEZAS, GRÁFICOS E ESCALAS Se estamos falando em Física, nada mais coerente do que lembrarmos das unidades de medidas, os padrões, as grandezas, os gráficos e escalas tão usuais e essenciais aos físicos que são transportados para a Biofísica. Uma vez que estamos tratando dos fundamentos da Biofísica, eles não poderiam ficar à margem dessa apostila, mas atentamos para o seguinte: são noções básicas, certo? Vários são os métodos e princípios da física utilizados para se chegar a generalizações quantitativas de observações nas ciências biológicas, utilizando-se ferramentas matemáticas fundamentais e princípios de outras ciências quando necessário. Durán nos explica com muita propriedade! Vamos lá: Geralmente, a ciência procura estabelecer relações entre conjuntos de observações, com as quais tenta desenvolver generalizações e, a partir disso, elaborar conceitos teóricos para as interpretações. As observações e comparações quantitativas, geralmente nos levam a generalizações quantitativas, hipóteses e teorias quantitativas. A dificuldade para se fazer generalizações quantitativas está diretamente relacionada com as observações feitas, que muitas vezes são bastante complexas, mas é justamente isso que torna as ciências uma permanente fonte de conhecimentos.As leis do movimento de Newton, a teoria atômica de Dalton e a elaboração dos princípios da hereditariedade de Mendel são exemplos notáveis de que as generalizações, a partir de observações, deram origem a conhecimentos importantíssimos. Quando fazemos um conjunto de observações, ou seja, um experimento, dados similares poderão ser obtidos outras vezes se o experimento for repetido nas mesmas condições. A generalização sempre é consequência de uma série de experimentos similares. Na prática, é difícil garantir que dois experimentos sejam exatamente iguais em todas as variáveis, de modo que não podemos assegurar resultados exatamente iguais. Os dados numéricos deverão variar dentro de uma 15 faixa, o que é denominado erro experimental, e as generalizações deverão levar em conta este erro ou incerteza. A física e a química, ciências com grande tradição experimental, apresentam generalizações baseadas em resultados com um bom grau de reprodutibilidade, pois na maioria dos casos, a incerteza pode ser reduzida a proporções desprezíveis. Já na biologia, o problema da incerteza é bastante sério, pois a maioria das experiências é feita com organismos vivos, que são altamente complexos, o que gera resultados altamente variáveis, ou seja, como a incerteza é muito grande, é difícil a reprodução exata de uma experiência. Para minimizar o problema, reduzir essa incerteza, seria uma providência imediata, porém a tarefa de identificar e controlar todas as fontes de incerteza é algo impossível. Além disso, seria um risco muito grande supor que qualquer organismo- padrão possa representar toda uma espécie ou população. Ante essa realidade, devemos procurar meios para conduzir nossos experimentos, apresentando observações e analisando os resultados de maneira que possamos extrair conclusões com uma precisão conhecida. Técnicas experimentais e métodos teóricos típicos da física e da química são extremamente úteis para as generalizações quantitativas feitas na biologia. Procuramos sempre garantir que as incertezas tenham uma influência mínima em nossas observações, e, muitas vezes, só o fato de conseguirmos identificar as prováveis fontes da incerteza, permite que estas generalizações quantitativas constituam uma contribuição importante no entendimento da biologia. Nas ciências biológicas, as observações experimentais, que requerem justificativas bastante detalhadas, para se chegar a generalizações quantitativas, exigem um conhecimento muito claro dos fundamentos do cálculo vetorial, diferencial e integral, e também de vários princípios da física e da química. Vamos ao básico e que nos interessa no momento: a) Medidas A generalização de uma série de observações é consequência da repetição de experimentos similares. Isso exige certa habilidade para medir as grandezas que 16 são variáveis do experimento. Para que a quantidade resultante tenha algum significado, ao se fazer uma medida, sua magnitude deve estar acompanhada da respectiva unidade. Na biologia, à semelhança do que ocorre na física e na química, são bastante diversas as grandezas que medimos. As unidades do Sistema Internacional (SI), ou unidades métricas, são as mais utilizadas para expressar as medidas de uma grandeza. As unidades básicas do SI são: o metro (m), o quilograma (kg) e o segundo (s) para medir comprimento, massa e tempo, respectivamente. Muitas grandezas derivadas são expressas em termos destas unidades básicas; por exemplo, as medidas de energia têm como unidades o kg.m2.s-2, que é denominado joule (J). Algumas grandezas exigem outras unidades básicas, além daquelas já mencionadas. No SI estas são: o kelvin (K), o ampêre (A), a candela (cd) e o mole (moI) para medidas da temperatura termodinâmica, da corrente elétrica, da intensidade luminosa e de quantidades de substância, respectivamente. Elas se encontram na tabela abaixo. GRANDEZA UNIDADE SÍMBOLO Comprimento Metro m Massa Quilograma kg Tempo Segundo s Corrente elétrica Ampère A Temperatura termodinâmica Kelvin K Intensidade luminosa Candela cd Quantidade de substância Mole mol Algumas vezes, as medidas de uma grandeza são muito pequenas ou muito grandes quando comparadas com os padrões das unidades básicas do SI, como, por exemplo, 1 milissegundo (ms) = 10-3 s; 1 quilômetro (km) = 103 m ou 1 microampère (µA) = 10-6 A. Quando estes múltiplos dos padrões vão expressos em potências de 10, os prefixos das unidades básicas têm nomes específicos, como se vê na tabela abaixo, lembrando que esses prefixos também são aplicáveis a qualquer outro tipo de unidade. 17 PREFIXO SÍMBOLO POTÊNCIA DE 10 tera T 10 12 giga G 10 9 mega M 10 6 quilo k 10 3 centi c 10 -2 mili m 10 -3 micro µ 10 -6 nano n 10 -9 pico p 10 -12 femto f 10 -15 As medidas de grandezas também podem ser expressas em unidades não pertencentes ao SI, e em unidades derivadas, ou seja, unidades criadas a partir das unidades básicas do SI. b) Padrões Sempre que medimos uma grandeza estamos comparando-a com o respectivo padrão de referência. Este padrão é a unidade da grandeza. Quando o sistema métrico foi estabelecido, a unidade de comprimento metro foi definida como 10-7 vezes a distância do Equador ao Polo Norte, medido ao longo do meridiano que passa por Paris; posteriormente, em 1889, a Conferência Geral de Pesos e Medidas, considerando que todo padrão unitário deve ter durabilidade e reprodutividade, definiu o metro como a distância entre dois traços paralelos sobre uma determinada barra de platina iridiada. Durán (2003) explica que os inconvenientes deste padrão unitário eram ter de se fazer muitas réplicas do objeto, para disponibilizá-las a outros países, e de ser necessário comparar periodicamente estas réplicas com o padrão internacional. Assim, em 14 de outubro de 1969, a Conferência Geral alterou a definição deste padrão internacional, utilizando uma unidade natural de comprimento baseada na radiação atômica. É aceito agora, como padrão de medida de comprimento, o comprimento de onda da luz vermelho-alaranjada emitida pelos átomos excitados do isótopo criptônio 86. Foi definido que exatamente 1 650 763,73 comprimentos desta 18 onda constituem 1 metro. Este padrão pode ser reproduzido em muitos laboratórios do mundo inteiro, evitando assim a necessidade de deslocamento, para fazer comparações com um padrão. O padrão de massa, por sua vez, é um cilindro de platina iridiada, definido como um quilograma. Infelizmente, ainda não foi adotado um padrão atômico de massa, tal como se fez com o padrão internacional de medida de comprimento. Certamente, quando houver condições tecnológicas para se poder determinar com precisão a massa do quilograma-padrão, em termos de uma massa atômica-padrão, uma nova definição deverá surgir. O padrão de tempo é o segundo, que originalmente foi definido como o tempo igual a 1/86400 de um dia solar médio. Esta definição não era muito conveniente para trabalhos de alta precisão, por depender da velocidade de rotação da Terra. Em 1967, foi estabelecida uma unidade natural para o tempo, que, assim como a definição do padrão de comprimento, é um padrão atômico. Desta vez foram utilizadas as características vibracionais do elemento césio 133. Atualmente, um segundo é definido como o tempo necessário para que o césio realize 9.192.631.770 vibrações completas. Ressaltemos que as medidas nunca são feitas com precisão absoluta. Suponha que pretendemos medir a massa de uma tartaruga. Dispomos de uma balança graduada de 1 em1 g. Esta balança fornece com precisão o valor da medida em gramas, e qualquer fração dessa unidade deverá ser estimada. Assim, para expressar nossa medida, esta deverá conter todos os algarismos precisos mais o algarismo estimado. Os algarismos que compõem o resultado de uma medida são chamados de algarismos significativos. Deles fazem parte todos os algarismos precisos mais um e somente um algarismo estimado. É sobre este último que incide o desvio absoluto da medida. Observem: 1. Os zeros à esquerda do primeiro algarismo não nulo não são significativos, pois o número de algarismos significativos não depende da unidade adotada. 19 Assim, a medida (7,5 em = 0,075 m = 0,000075 km = 75x103 µm) tem só dois algarismos significativos nos quatro casos acima. 2. Os zeros à direita do último algarismo não nulo serão significativos se indicarem um valor realmente medido. Assim, a medida 0,0750 m tem três algarismos significativos e 7,5000 tem cinco algarismos significativos. Para medir uma grandeza, podemos fazer apenas uma ou várias medidas repetidas, dependendo das condições experimentais particulares ou ainda da postura adotada frente ao experimento. Em qualquer caso, deve-se extrair do processo de medida um valor que melhor represente a grandeza e ainda um limite de erro, dentro do qual deve estar compreendido o valor real. Teremos uma precisão maior quanto menor for o desvio absoluto. Sempre é desejável obter a maior precisão possível. Se, ao fazer a medida de uma grandeza, encontrarmos um desvio absoluto muito grande e o diminuirmos arbitrariamente, então essa redução arbitrária da faixa de desvio lança dúvidas sobre a certeza de que o valor da medida feita estará dentro da nova faixa de valores, pois esta se tornou mais estreita. Portanto, precisão e certeza estão relacionadas, e não podemos modificar arbitrariamente uma delas sem que a outra seja modificada. Vejamos, com um exemplo, como esta relação aparece quando lidamos com várias medidas de uma mesma grandeza: Para fazer medidas, sob condições de repouso, do potencial de Nernst devido aos íons Na+ no axônio de um nervo de lula, utilizamos um voltímetro graduado em décimos de milivolt (mV). Foram feitas dez medidas; veja abaixo os resultados em mV encontrados: Queremos encontrar o melhor valor para expressar este potencial de Nernst e saber qual é o desvio sobre este valor. - O melhor valor é certamente o valor médio ou valor mais provável: 20 - Vamos supor que, para ter boa precisão, consideramos um desvio pequeno, por exemplo: 0,01 mV. Neste caso, somente duas medidas, entre as dez feitas, estão no intervalo (54,20 ±0,01) mV, ou seja, 80% dos valores estão fora deste intervalo. Dizemos que este resultado nos dá muito pouca certeza, pois só duas em dez medidas têm o mesmo resultado. Se considerarmos o desvio como 0,02 mV, teremos três medidas dentro do intervalo (54,20 ±0,02) mV. Com um desvio de 0,03 mV, serão cinco medidas dentro do novo intervalo. Se considerarmos o desvio como 0,05 mV, teremos todas as medidas dentro do intervalo (54,20 ±0,05) mV. Neste último caso, teremos uma certeza total, mas a precisão diminui muito. - Como para conciliar certeza e precisão não adianta ter uma certeza muito grande e uma precisão pequena, ou vice-versa, então podemos expressar este potencial de Nernst de duas maneiras: (54,20 ±0,03) mV ou (54,20 ±0,04) mV. No primeiro caso, a precisão é boa, e a certeza é de 50% (cinco em dez medidas); no segundo, a certeza aumenta para 70%, mas a precisão diminui. c) Escala Vamos considerar o conceito de escala, partindo de objetos com formas geométricas regulares, certo? 21 a) Cubos com lados I’ e I e fator de escala L = I’/I = 2. b) Esferas com raios r’ e r e fator de escala L=r’/r = 3. Na Figura acima temos dois cubos, um com lado I, e outro com lado l' = 2I; e duas esferas, uma com raio r, e outra com raio r' = 3r. Neste caso, um cubo tem o lado duas vezes maior que o outro; este fator 2, ou L, em geral é denominado fator de escala. Ao comparar o tamanho de seus raios, o fator de escala L para as esferas será 3. Se compararmos as áreas das superfícies externas e os volumes destas figuras de formas semelhantes, veremos que: - a razão entre áreas superficiais dos cubos é 6I’2 : 6I2 = 4: 1, ou em função do fator de escala L2 : 1. Ao compararmos as superfícies das esferas, encontraremos o mesmo resultado com a diferença de que no segundo caso temos 9: 1, pois L = 3. Em geral, área superficial α (comprimento característico) 2; - a razão entre os volumes dos cubos é l’3 : 13= 8 : 1, ou em função do fator de escala L3 : 1. O mesmo resultado é encontrado ao compararmos os volumes das esferas, lembrando que neste caso L = 3. Em geral, volume α (comprimento característico) 3. Quando dois objetos têm densidade uniforme, formas geométricas semelhantes e um fator de escala L, a comparação entre suas massas satisfaz a razão L3 : 1.Em geral, massa α (comprimento característico) 3. Normalmente, para objetos com densidade uniforme, formas semelhantes e fator de escala L, é satisfeita a razão: 22 As relações entre comprimento característico de um objeto com sua área, volume ou massa podem ser igualmente aplicadas a partes do mesmo objeto, de modo que, ao compararmos estas partes com regiões similares de outro objeto de forma semelhante, as razões encontradas em função do fator de escala L sejam satisfeitas. Com muita cautela, também podemos utilizar estes procedimentos para comparar objetos irregulares, mas de formas similares. Porém, no caso de objetos irregulares – frequentemente encontrados –, a escolha do comprimento característico do objeto normalmente é algum comprimento predominante do objeto. Mesmo assim, esta escolha pode não ser a única (DURÁN, 2003). d) Gráficos Normalmente, um conjunto de valores teóricos ou mesmo as medidas feitas em trabalhos experimentais são colocados no papel (ou no computador) para compor gráficos. Dessa maneira, podemos ter uma ideia imediata do comportamento das grandezas observadas. Assim: o gráfico é um dos modos mais convenientes para visualizar e/ou interpretar uma relação entre duas ou mais grandezas; um gráfico pode evidenciar uma relação entre grandezas, que seria difícil de estabelecer só inspecionando uma tabela. Antes de levar os valores das grandezas para a folha de gráfico, é necessário definir dois ou mais eixos que servirão para representar os valores das grandezas. Para construirmos um gráfico, devemos estabelecer uma escala para cada eixo, de modo que os pares de valores possam ser colocados no gráfico, independente do intervalo de variação desses valores e dos comprimentos dos 23 eixos. As folhas para gráficos mais utilizadas apresentam dois tipos de escalas: a milimetrada e a logarítmica. A combinação dessas escalas dá origem a três tipos de folha para gráficos: milimetrado – a folha apresenta escalas lineares; mono-log – a folha apresenta uma escala logarítmica e outra linear; di-log – a folha apresenta escalas logarítmicas. Vejamos algumas regras úteis para construção de um gráfico: em uma mesma folha, é possível construir vários gráficos; basta usar símbolos diferentes (, ≠, $, , ... ) e uma legenda que identifique cada tipo de ponto; quando o valor das grandezas já tem seu desvio absoluto definido, o gráfico deve trazer esta informação. Por exemplo, se a grandeza representada no eixo y tem desvio ± Δy e a representada no eixo x tem desvio ± Δx, então a representaçãodesses desvios na folha para gráfico será: na medida do possível, convém representar os gráficos por uma reta. Muitas vezes, para isso, basta fazermos mudanças convenientes das grandezas que definem o gráfico. Vamos construir uma Escala Linear e uma Escala Logarítmica? Considere um eixo de comprimento L. Nesse eixo queremos colocar um conjunto de valores positivos e negativos de uma grandeza X. Se a diferença entre os valores máximo e mínimo da grandeza é L1, o passo da escala a ser utilizado é o seguinte: p = L/Δ. 24 Na medida do possível, convém arredondarmos o valor de L1, a fim de que p seja inteiro ou, pelo menos, semi-inteiro. Com o passo da escala definido, há condições para colocar todos os valores da grandeza X no eixo. Por exemplo, para uma escala linear o passo é p, como mostra a figura abaixo: Considere um conjunto de medidas de duas grandezas G e G', sendo u e u', respectivamente, as unidades dessas grandezas. Agora vamos levar os valores dessas grandezas para a folha de gráfico cujas escalas são lineares. Inicialmente definimos os passos Px e Py para os eixos horizontal e vertical, respectivamente. Colocamos os dados de G e G' na folha e finalmente traçamos o gráfico, conforme ilustrado a seguir: Para encontrarmos uma relação funcional entre G e G' a partir do gráfico destas grandezas, procedemos da seguinte maneira: a) Determinamos o declive (inclinação) da reta: b) Determinamos o valor de G' quando G = O: c) Como o gráfico das grandezas G e G' é uma reta, teremos: 25 Em geral, toda vez que o gráfico correspondente a duas grandezas G e G' for uma reta, a relação funcional entre essas grandezas será: G’ = b + mG onde b é o valor de G' quando G = O; e m é o declive ou inclinação da reta. Trabalhando agora com escala logarítmica: Se tivermos um conjunto de valores x1, x2, ... , xn, e quisermos colocar em um eixo os logaritmos na base decimal desses valores, então podemos calcular os logaritmos de cada um dos xn, valores e colocá-los em um eixo cuja escala é linear ou ainda colocar os xn valores diretamente em um eixo de escala logarítmica. Na figura a seguir mostramos um eixo horizontal de comprimento L, que será denominado ciclo da escala. Esse ciclo será dividido em intervalos proporcionais à diferença log (m + 1) - log m, sendo m = 1,2, ...,9. Dessa forma, teremos construído um eixo logarítmico. Em geral as folhas para gráfico com escalas logarítmicas têm vários ciclos nos eixos vertical e/ou horizontal. O comprimento L do ciclo é proporcional à diferença log 10 - log1 = 1; ou, em geral, L é proporcional à diferença log 10n+1 – log 10n, onde n: 0, ±1, ±2, ... Se x = log m e L= 10 cm, então dentro de cada ciclo a diferença entre os logaritmos de: - m = 2 e m = 1 será 0,301 e, portanto L12 = 3,01 cm; - m = 3 e m = 1 será 0,477 e, portanto L13 = 4,77 cm; - m = 9 e m = 1 será 0,954 e, portanto L19 = 9,54 cm. Quando a folha para gráfico tem vários ciclos, como se vê na ilustração abaixo, os extremos de cada ciclo tomam valores correspondentes a potências inteiras de 10. 26 Fonte: DURÁN (2003, p. 14). STHAL (1962 apud DURÁN, 2003) diz que os cientistas às vezes podem ser classificados como os que ajuntam ou separam fatos que ocorrem na natureza. Os que ajuntam, geralmente os físicos, descrevem leis que ligam fenômenos aparentemente diversos entre si. Os que separam, geralmente os das ciências da vida, relatam mais a diversidade. Mas há exceções, como é o caso do problema da escala biológica, em que ambas as tendências reunidas permitem melhorar a compreensão de fatos conhecidos. Como relacionar as mudanças de várias características de organismos vivos (duração da vida, frequência cardíaca, rapidez com que convertem energia, entre outras) com o tamanho de seus corpos? Eis uma aplicação da Escala! Ela é usada para relacionar a função biológica dos organismos com seu tamanho. Na biologia, o tamanho de um organismo está diretamente relacionado com suas características e funções. Assim, vários problemas da biologia podem ser analisados de maneira simples, relacionando a forma e/ou o tamanho e/ou o peso dos organismos com algumas de suas funções biológicas. Quando nos referimos a um organismo, este pode ser único ou constituído de organismos menores. As propriedades biológicas de um organismo são bastante dependentes de seu comprimento, área superficial, volume e massa. Tendo em vista um comprimento característico para um organismo complexo, interessa à biologia saber como suas diversas partes dependem desse comprimento. Por exemplo, ao considerarmos 1,80 m de altura como comprimento característico para um ser humano, suas diversas partes ou constituintes terão tamanho, volume ou massa associados ao valor desse comprimento característico. Eis uma simples, mas importante inter-relação da Física com a Biologia. 27 UNIDADE 4 – BIOMÊCANICA A Biomecânica é uma área de conhecimento fortemente envolvida na identificação de parâmetros mecânicos capazes de influenciar o rendimento esportivo e a melhora da qualidade de vida. Tem como objetivo central o estudo do movimento humano. Com dizem Amadio e Serrão (2011), ainda que esse seja um objetivo comum a muitas áreas que compõem o corpo de conhecimento da Educação Física e do Esporte, a Biomecânica procede sua análise a partir de um prisma particular: o das leis da Física. Mais do que simplesmente aplicar as leis da Física, a Biomecânica leva ainda em consideração as características do aparelho locomotor. Para tanto, além da Física e da Matemática, enquanto disciplinas que fundamentam e suportam a análise do movimento humano, a Biomecânica ainda utiliza-se dos conhecimentos da Anatomia e da Fisiologia, disciplinas que delimitam as características estruturais e funcionais do aparelho locomotor humano. Configura-se desta forma, uma disciplina com forte característica multidisciplinar, cuja meta central é a analise dos parâmetros físicos do movimento, em função das características anatômicas e fisiológicas do corpo humano, utilizando diferentes metodologias para tais análises 28 como a antropometria, cinemática, dinamometria, simulação computacional, modelamento muscular e eletrofisiologia. A biomecânica é a disciplina que usa os princípios da física para estudar, quantitativamente, como as forças interagem em um organismo vivo (BLANPIED; NAWOCZENSKI, 2011). Enquanto a Cinemática é o ramo da mecânica que descreve o movimento de um corpo, sem se preocupar com as forças ou torques que podem produzi-lo, na Biomecânica, o termo corpo é usado de forma bastante flexível na descrição de um corpo inteiro ou de qualquer uma de suas partes ou segmentos, como ossos e regiões. Quanto a sua forma de execução, os movimentos podem ser divididos em: lineares ou de translação, angulares ou de rotação, e combinados (mistos) ou gerais. O movimento linear ou de translação ocorre quando todos os pontos do corpo movem-se na mesma distância ou direção, ao mesmo tempo. A aplicação de uma força no centro de massa de um corpo de qualquer dimensão faz todos os pontos desse objeto se deslocarem na mesma direção e magnitude, constituindo o movimento de translação. Ele pode ser linear retilíneo (quando a direção não é modificada) ou curvilíneo (quando a direção muda constantemente). Durante a marcha, por exemplo, um ponto na cabeça se move de maneira curvilínea, conforme mostra a ilustração abaixo. 29 Um ponto no topo da cabeça é mostrado seguindo para cima e para baixo de modo curvilíneo durantea marcha. O eixo X do gráfico mostra a porcentagem de finalização de um ciclo inteiro de marcha (caminhada). A rotação, diferentemente da translação, descreve um movimento em que um corpo rígido se move de forma circular, ao redor de um ponto de pivô. Em decorrência disso, todos os pontos do corpo são simultaneamente rotacionados na mesma direção angular (por exemplo: horária ou anti-horária) pelo mesmo número de graus. O movimento do corpo humano, como um todo, é frequentemente descrito como a translação do centro de massa do corpo, geralmente localizado imediatamente anterior ao sacro. Embora o centro de massa de um indivíduo faça a translação pelo espaço, ele é fortalecido por músculos que rotacionam os membros. A rotação dos membros pode ser observada no movimento descrito por um punho enquanto o cotovelo é flexionado (vide abaixo). Com um flash estroboscópico, uma câmara é capaz de capturar a rotação do antebraço a partir do cotovelo. Se não fosse pelas restrições anatômicas do cotovelo, o antebraço poderia, em teoria, rotacionar 360º ao redor do eixo formado pela articulação (círculo aberto). O ponto de pivô para o movimento angular do corpo ou de partes do corpo é denominado eixo de rotação. O eixo é o ponto em que a movimentação do corpo em rotação é zero. Para a maioria dos movimentos dos membros e do tronco, o eixo de 30 rotação está localizado no interior da estrutura da articulação ou bastante próximo a ela. Na maioria das atividades humanas, os movimentos são realizados por meio de uma combinação das duas formas de movimento (de translação e de rotação), e podem ser tratados como movimentos gerais, ou combinados. 31 UNIDADE 5 – BIOELETRICIDADE Os seres vivos são verdadeiras usinas elétricas, pois a maioria dos fenômenos utiliza a eletricidade. As células apresentam diferença de potencial (ddp) dos dois lados da membrana. A origem dessa ddp é uma concentração heterogênea de íons, principalmente Na+, K+, Cl- e PO4. A Bioeletricidade ou Bioeletromagnetismo (algumas vezes também chamado de biomagnetismo) refere-se à voltagem estática de células biológicas e as correntes elétricas que fluem em tecidos vivos, tal como nervos e músculos, em consequência de potenciais de ação (SOUZA, 2012). A grande importância dada às análises dos aspectos celulares do estudo da Biologia, seja em seus aspectos estruturais químicos ou físicos, reside, claro, no fato de serem elas as constituintes das unidades morfofuncionais dos organismos vivos. Dentre os aspectos físicos ligados às funções celulares, destacam-se os potenciais de membrana, os quais se revelam como a diferença de potencial elétrico entre as faces da membrana plasmática, meio intracelular e meio extracelular. Para a real compreensão de como as células são capazes de manter ou mudar seu potencial de Membrana, e a devida importância deste potencial nas suas funções, faz-se necessário o entendimento de dois aspectos preliminares aos próprios potencias: conceitos iniciais de eletricidade, e o próprio movimento destes íons e da água, ou seja, a física está totalmente presente nesses processos! A Eletricidade (Eletrostática, eletrodinâmica, eletromagnetismo) estuda na Física os fenômenos que envolvem carga elétrica, uma propriedade inerente a determinadas partículas elementares, que propicia interação de natureza elétrica entre elas. Embora a Física moderna não seja capaz de dizer o que é carga elétrica, é capaz de descrever inúmeras de suas característica e propriedades, dentre as quais, podemos destacar o princípio da conservação da carga elétrica: “Em um sistema eletricamente isolado, a carga elétrica é constante, e o valor da carga elétrica de um corpo é nula ou igual a um múltiplo da carga elementar” CARGA ELEMENTAR (e) = 1,6 x 10-19 Coulomb (Ampère/segundo) 32 Existem dois tipos de carga elétrica, positiva e negativa, e o princípio básico da interação das cargas elétricas diz que cargas opostas se atraem, cargas iguais se repelem. Em um átomo, comumente, o número de elétrons (partícula com carga negativa de -1,6 X 10-19 C) é igual ao número de prótons (partícula com carga positiva de +1,6 X 10-19 C), logo o átomo é eletricamente neutro. Caso no átomo exista um número diferente entre elétrons e prótons, este terá carga e será denominado de íon. Assim, ao considerarmos a carga elementar (e): e = 1,6 x 10-19 C, temos que: 1 Coulomb = 6,25 x 1018; e, considerando um sistema eletricamente isolado, a soma algébrica das quantidades de carga é constante... O transporte através da membrana celular, seja diretamente, através de canais ou poros na membrana plasmática ou por meio das proteínas carreadoras, como a sódio/potássio ATPase, concorrem para manter uma distribuição assimétrica entre os meios intra e extracelular. A difusão (também chamada de transporte passivo) ocorre de uma região de maior concentração para outra de menor concentração; em outras palavras, de onde tem mais para onde tem menos, na procura do equilíbrio de concentração. A figura a seguir mostra o oxigênio se difundindo de uma região de maior concentração, o alvéolo pulmonar, para outra de menor concentração, o capilar alveolar. 33 Já o transporte ativo é realizado com gasto de energia, principalmente do ATP, produzindo o movimento contrário ao transporte passivo, ou seja, conduz a substâncias para o meio mais concentrado na tentativa de manter o desequilíbrio de concentração, como podemos ver na próxima ilustração, onde a bomba de próton mantém o desequilíbrio, criando um gradiente de concentração para o íon H+. Ainda podemos definir difusão como movimento aleatório de substâncias, molécula a molécula, seja pelos espaços intermoleculares da membrana, seja em combinação com uma proteína carreadora. A energia produtora da difusão é a energia do movimento cinético normal da matéria. A passagem de substâncias através da membrana celular e das paredes dos capilares depende fortemente da difusão, onde o deslocamento destas moléculas e íons depende de sua energia térmica que promove agitação térmica nas moléculas e íons, ou seja, energia cinética. A energia térmica em um sistema é revelada na agitação térmica de suas moléculas, quanto maior a temperatura mais rapidamente os íons e moléculas do sistema irão se difundir. 34 Porque a distância para o processo de difusão é muito importante? R = Quanto maior o percurso menor a difusão da partícula. Assim, moléculas e íons só podem se difundir até determinado limite; por exemplo, o oxigênio só se difunde através de cerca de 100 micrometros entre células, fator que limita a distância entre capilares sanguíneos. Quando consideramos o transporte ativo, ainda podemos dizer que este se revela no movimento, principalmente de íons, porém também pode ocorrer com átomos ou moléculas não carregadas, através da membrana, em combinação com proteínas carreadoras. Como o transporte ativo ocorre contra um gradiente de energia, isto é, de um estado de baixa concentração para um de alta concentração, é um processo que exige fonte adicional de energia, uma vez que a energia cinética atua movimentando as moléculas em sentido contrário ao movimento ativo. Por tudo isso e muito mais, o principal compartimento para a análise do deslocamento de substâncias é a célula, seja no deslocamento para o meio intracelular (influxo) ou para o meio extracelular (efluxo). Assim, é importante ressaltar que é através da membrana plasmática, ocorrendo influxo ou efluxo, a célula dispõe do movimento passivo, assim como também do movimento ativo, eventosconcomitantes que mantêm as concentrações intra e extracelulares. No meio intracelular a concentração de proteínas é infinitamente superior a sua presença no meio extracelular, uma vez que elas são muito grandes e não podem deixar a célula através da membrana celular. Assim, contidas na célula, as proteínas conferem modificação no movimento de água, é a pressão osmótica ou colidosmótica. Complexidade, praticidade, inteligência e beleza são alguns do adjetivos e qualidade que podemos transferir para o papel desempenhado pelas células. Caminhando para representações mais práticas, agora de escala macro, podemos justificar o suporte que a biofísica dá ao ensino de fisiologia, mais precisamente sua inserção nos cursos de medicina onde existem alguns conceitos cruciais para o entendimento do sistema circulatório e respiratório humano que 35 necessitam de conhecimentos de dinâmica de fluidos que não são sequer mencionados no ensino médio. Um médico precisa conhecer a lei de Bernoulli e a transição do regime laminar para o turbulento para entender os sons pulmonares e cardíacos. Também relacionado ao sistema circulatório, a velocidade do sangue na saída do coração pode ir a 30 cm/s e nos capilares não passa de 0,3 mm/s o que se explica pela conservação da vazão em sistemas em série e paralelo. Ademais, para se entender a queda de pressão ao longo do sistema circulatório (e o motivo de possuirmos afinal um coração) é preciso saber o que são fluidos reais e o que é a viscosidade (CORSO, 2009). Os conceitos da pressão osmótica também são importantes para entender o funcionamento do rim e da troca de fluidos através das membranas, refração da luz no olho, difusão e diferença de potencial na membrana celular, pressão parcial de gases e difusão no sistema respiratório, pressão em fluidos na descrição da medida da pressão cardíaca, ou alavancas na compreensão da biomecânica do sistema esquelético muscular (CORSO, 2009). Enfim, há uma gama de possibilidade da aplicação da física na biologia das células! 36 UNIDADE 6 – BIOACÚSTICA Acústica é a parte da Física que estuda o som. Som é a sensação percebida pelo cérebro que se relaciona com a chegada ao ouvido de ondas de vibração mecânica. Todo sistema que emite som é uma fonte sonora. Em geral, costuma-se confundir o conceito de som com o conceito de onda sonora. Por isso, pode-se dizer que o som se propaga nos ambientes materiais e elásticos através de ondas. As ondas sonoras são vibrações sincronizadas das moléculas que constituem o meio. Ao vibrarem em conjunto, elas criam em torno da fonte sonora regiões de alta e de baixa pressão. Essas variações de pressão se propagam no meio como uma onda mecânica longitudinal (GARCIA, 2002). As ondas mecânicas são perturbações ou distúrbios que se propagam através de meios materiais. Por exemplo, são ondas mecânicas: ondas em cordas (geradas por muitos instrumentos musicais); ondas na água; ondas sonoras (importantes na comunicação de seres vivos), entre outras. As ondas mecânicas são muito utilizadas na medicina, odontologia e biologia; são utilizadas também para tratamentos de saúde, observação interna de organismos e pesquisas em geral. Dentro de sua gama de comprimentos de onda, as ondas mecânicas são utilizadas como meio de comunicação por diversas espécies. Elas também são utilizadas para detectar a presença de seres vivos ou como elementos de orientação (DURÁN, 2003). Enfim, a importância desse tipo de onda para diversas espécies é muito grande. Diferentes das ondas eletromagnéticas, que somente são transversais, as ondas mecânicas podem ser: transversais – quando a perturbação é perpendicular à direção de propagação da onda (como é o caso das ondas produzidas pelas cordas); longitudinais – quando a perturbação é paralela à direção de propagação da onda (como é o caso das ondas sonoras). 37 Os pulsos ondulatórios são perturbações de extensão limitada, ou seja, eles têm um princípio e um fim. Por exemplo, o barulho de um tiro é um pulso ondulatório acústico; um relâmpago de luz é um pulso luminoso; uma onda de maré é um pulso ondulatório na água. Toda vez que um pulso se propaga: em qualquer instante, somente uma região limitada do espaço estará perturbada; em qualquer ponto, ele leva um tempo limitado para passar; em qualquer instante ou posição, o pulso estará transmitindo momento linear e energia. Se um pulso viaja uma distância Δx, em um tempo Δt, sua velocidade média de propagação será v = Δx/Δt. Em geral, a velocidade de um pulso depende das propriedades físicas do meio em que ele se propaga, e não da velocidade da fonte que gera o pulso em relação ao meio. Todo pulso ondulatório precisa de um meio material para se propagar. Se o pulso tem uma velocidade v em um certo meio e entra em outro meio onde: sua velocidade é menor do que a original, então o pulso refletido será invertido; sua velocidade é maior do que a original, então o pulso refletido não é invertido (DURÁN, 2003). As ondas mecânicas longitudinais são perturbações que se propagam em meios líquidos, sólidos ou gasosos. Sendo o som uma sensação produzida no ouvido humano por um trem de ondas que percorre um meio elástico e que satisfaz certas frequências e intensidade, podemos deduzir que ele não é produzido no vácuo, portanto, toda vez que experimentamos uma sensação sonora há: um movimento vibratório de um meio material, que pode ser sólido (corda), líquido (água) ou gasoso (ar); um meio material elástico entre o corpo vibrante e a orelha. 38 Os sons distinguem-se uns dos outros pelas seguintes qualidades fisiológicas: a altura, que está ligada unicamente à frequência de ondas sonoras; o timbre, que depende dos harmônicos associados ao som fundamental; a intensidade fisiológica de um som, que está ligada à amplitude das vibrações. A bioacústica estuda o funcionamento do sistema auditivo dos mamíferos e dos humanos, ou seja, é a análise e a percepção de sensações auditivas cuja origem são os estímulos sonoros. Esses estímulos, cuja origem física são as ondas mecânicas, ao chegarem ao sistema auditivo, terminam agindo sobre células ciliadas e seus nervos terminais, que codificarão o estímulo mecânico em potenciais de ação. De acordo com os estudos publicados até o presente, a ação de ouvir dos mamíferos é bastante similar a dos humanos. Logo, é comum comparar, discutir e estender os resultados de experiências acústicas com mamíferos para os humanos e para outras espécies animais (GRINNELL; SCHNITZLER, 1977; SIMMONS; SAILLANT; DEAR, 1993; GROTHE; NEUWEILER, 2000; MULLER; BRUNS, 1993 apud DURÁN, 2003). Grande parte das informações que o ser humano recebe é transmitida por ondas sonoras. Elas, normalmente, provêm do ambiente que nos cerca e são originadas em diversas fontes sonoras. O sistema auditivo dos animais permite a captação dessas ondas e o reconhecimento do conteúdo de informação que possuem. Além de participar da audição, o aparelho auditivo humano também está relacionado com o equilíbrio do corpo (GARCIA, 2002). O ouvido humano é um órgão extremamente sensível, que converte um fraco estímulo mecânico, produzido em um meio externo, em estímulos nervosos. Na região de sua máxima sensibilidade, a pressão acústica que ele pode perceber é de um milibar; o que equivale a uma amplitude de deslocamento molecular da ordem de 10-9 cm ou 0,1Ǻ. 39 Nosso ouvido é constituído de três partes: ouvido externo, médio e interno. O ouvido externo – capta e conduz o som. É a parte que estáem contato com o meio externo. É nessa parte que incide o estímulo produzido por uma fonte sonora. É formado pelo pavilhão auricular, ou orelha, e o canal auditivo, ou meato. O canal tem aproximadamente 0,7 cm de diâmetro e 2,5 cm de comprimento e termina na membrana timpânica. A estrutura é basicamente a mesma no homem e nos outros mamíferos, salvo as particularidades de cada espécie. Para Heneine (2005), alguns animais são até capazes de mover o pavilhão auditivo, e dessa forma, direcionar a captação, semelhante a uma antena de radar. No ouvido médio acontece a transformação da energia sonora em deslocamento mecânico. A membrana timpânica é o início do ouvido médio. Este se comunica com o exterior através da trompa de Eustáquio. É uma cavidade de ar com aproximadamente 2 cm3 de volume. A função desse canal é equalizar as pressões interna e externa, porque qualquer diferença de pressão entre o ouvido médio e o ambiente externo é intolerável. Nele está localizada a cadeia mecânica que transmite o som para as estruturas do ouvido interno. O tímpano vibra sob o impacto da pressão sonora, em amplitude proporcional a intensidade do som. A eficácia mecânica do tímpano, que é uma membrana de 65mm2, com apenas 0,1 mm de espessura, permite que os seus movimentos sejam transmitidos ao martelo, daí para a bigorna e desta para o estribo. 40 Através desse sistema de alavancas, a pressão exercida na janela oval pelo estribo pode ser 3 a 20 vezes maior que a pressão exercida pelo som no tímpano. Essa necessidade é interessante para os eventos seguintes da audição que ocorrem em meio líquido, a cóclea. No ouvido interno ocorre a transformação do movimento mecânico em hidráulico, e deste em pulso elétrico. Nesta parte do ouvido, a energia transportada pelo estímulo sonoro será convertida em um sinal elétrico, o qual será levado ao córtex auditivo. Sua estrutura contém a cóclea, que constitui o labirinto anterior. A cóclea tem 21/2 voltas, e está representada como um cone de 35 mm de comprimento. É separada em dois compartimentos principais, a rampa vestibular (em cima) e a rampa timpânica (embaixo) pela membrana basilar. A galeria superior da cóclea, ou rampa vestibular, comunica-se com o ouvido médio através da janela oval. A galeria média ou canal coclear contém o órgão de Corti. A galeria inferior ou rampa timpânica, comunica-se com o ouvido médio através da janela redonda. O pulso se propaga rapidamente, mas durante o trajeto, estabelece gradientes de pressão entre a rampa superior e a inferior. Esse gradiente de pressão comprime o órgão de Corti, que gera um impulso elétrico. Um fator biofísico importante nesse processo, segundo Heneine (2005, p. 330), é a diferença de potencial entre o órgão de Corti ( + 80 mv ) e a endolinfa ( - 70 mv ), o que torna as células extremamente sensíveis e excitáveis. Enfim, no mecanismo da audição, as partes que compõem os ouvidos médio e interno vibram na direção em que a onda se propaga desde os tímpanos até os cílios do ouvido interno. As propriedades elásticas e inerciais de cada uma dessas partes desempenham papel importante na propagação de energia sonora. Uma das aplicabilidades dos estudos que reúne a Física e a Biologia, nós encontramos no uso das ondas ultrassônicas, que são ondas mecânicas longitudinais, cujas frequências estão fora do campo de audibilidade dos humanos. Se a frequência de vibração da onda sonora for: menor do que 20 Hz, as ondas são denominadas infrassônicas; 41 maior do que 20 000 Hz = 20 kHz, as ondas são denominadas ultrassônicas. As propriedades físicas das ondas acústicas infrassônicas ou ultrassônicas são as mesmas que as das ondas acústicas audíveis pelo humano. Assim, a descrição das interações físicas das ondas com a matéria é feita sem que se tente distinguir o tipo de onda acústica. As ondas infrassônicas se manifestam pelas oscilações de pressão que elas provocam no meio em que estão se propagando. Já as ondas ultrassônicas se manifestam por produzirem alterações no meio em que estão se propagando. Muitos animais têm um campo de audição que inclui essas ondas acústicas, como, por exemplo: os cães podem ouvir frequências entre 15 Hz e 50 kHz; os gatos podem ouvir frequências entre 60 Hz e 65 kHz; os morcegos podem ouvir frequências entre 10 kHz e 120 kHz; os golfinhos podem ouvir frequências entre 10 kHz e 240 kHz; entre outros. Para a geração de ondas ultrassônicas, utilizamos transdutores, que são mecanismos que convertem energia elétrica em energia mecânica. A figura abaixo mostra um material piezelétrico, ao qual aplicamos uma diferença de potencial. Se o campo elétrico no material for de uma frequência apropriada, serão induzidas vibrações mecânicas no interior do material, as quais darão origem às ondas ultrassônicas. Fonte: Durán (2003, p. 235). 42 Quanto menor for a espessura d do transdutor, maior será a frequência de vibração das moléculas do material. O efeito piezelétrico permite que o transdutor simultaneamente possa receber um eco ultrassônico induzindo um sinal elétrico. Este sinal será processado e finalmente lido e interpretado. A intensidade de uma onda ultrassônica poderá ser: baixa, como é o caso das ondas utilizadas para obtermos informações de um meio; alta, como é o caso das ondas utilizadas em terapia médica ou para limpeza por cavitação. Essas ondas muito intensas caracterizam-se por produzir alterações no meio em que são aplicadas, como, por exemplo, a ruptura das células biológicas. 43 UNIDADE 7 – BIOFÍSICA ÓPTICA Embora já tenhamos falado, é comum encontrarmos em sala de aula, alunos com dificuldades em entender e relacionar os conceitos e leis da Física na sua vida cotidiana, portanto, mais uma vez frisamos: aguçar sua curiosidade, motivá-lo, torná- lo mais participativo e questionador é um dos caminhos para que o trabalho seja prazeroso e proveitoso. A visão dos espécimes vivos acontece por meio dos olhos que funciona respondendo à ação da luz visível nesse órgão. O termo luz pode ser utilizado para designar a radiação eletromagnética um pouco fora da faixa visível. A luz ultravioleta é a radiação eletromagnética com v > 4,3 x 1014 Hz, e a luz infravermelha é a radiação com v < 7,5 x 1014 Hz. Essas radiações também ocupam uma faixa de frequência no espectro eletromagnético. A luz propaga energia sem propagar massa, sendo importante para todo tipo de vida existente na Terra. Ela proporciona aos espécimes informações sobre seu meio ambiente vitais para a sua sobrevivência. A luz também é muito utilizada em aplicações médicas, científicas, tecnológicas, entre outras. Sua natureza pode ser: ondulatória, do tipo onda transversal; corpuscular, ou seja, consiste de quantum de energia. Se a frequência da luz for v, seu quantum de energia ΔE será definido como: 44 ΔE = h . v = hc/λ. H é a constante de Planck de valor 6,626 x 10-34 J.s. e c é a velocidade da luz no ar ou no vácuo de valor constante 3 x 108 m/s. Como a luz visível é policromática, sua energia total será determinada a partir da integração dos quanta de energia correspondentes a cada frequência constituinte de espectro visível. A velocidade v da luz em um meio que não seja o ar ou vácuo depende das características desse meio. O índice de refração n é um parâmetro que caracteriza um meio óptico e é definido; n = c/v. Como c ≥ v para qualquer meio óptico, então sempre teremos n≥1. Para o caso do ar ou vácuo, temos n = 1. Valores de n para outros meios, encontramos na tabela abaixo. SUBSTÂNCIA nAr (CNPT) 1,000 Água a 20ºC 1,333 Etanol a 20ºC 1,360 Cristal de quartzo 1,553 Flint glass 1,650 Cloreto de sódio 1,544 Lente do olho 1,424 Quanto ao sentido da visão, este é muito elaborado, pois, mais do que ver, o homem é capaz de observar! A bioengenharia do aparelho visual representa grande desafio para os cientistas. Muitos esforços têm sido feitos para conhecer os diversos tipos de adaptação que o olho possui e para entender como se processa a capacidade desse órgão para perceber o brilho e cor. Também têm sido investigadas as vias nervosas de comunicação do olho como cérebro, bem como a integração dos trajetos visuais com outros circuitos neuronais. Apesar do muito que sobre isso já se aprendeu, os mecanismos da visão tridimensional, o processamento e a memorização das imagens, ainda são pouco conhecidos. O avanço da eletrônica e da óptica, a invenção do microelétrodo, o desenvolvimento das teorias da informação e da cibernética, que ocorreram depois 45 dos anos 40, e, mais recentemente, a introdução da lógica dos fractais em biologia, têm fornecido ferramentas importantes para o estudo dos complexos fenômenos que estão associados à visão (GARCIA, 2002). Se comparados aos padrões da tecnologia atual, o olho humano é um instrumento óptico altamente complexo e sofisticado. Funciona semelhantemente a uma máquina fotográfica. Nessa analogia, a íris, funciona como o diafragma da máquina controlando a quantidade de luz; a retina é semelhante ao filme fotográfico no fundo da câmara; a córnea e o cristalino atuam como a lente. Da mesma maneira que a imagem formada pela lente numa máquina fotográfica, também a imagem formada na retina é invertida. A figura abaixo mostra os principais elementos do olho humano. Estrutura do globo ocular De uma forma simplificada, como podemos ver abaixo, a luz atravessa a córnea, segue através do cristalino (lente convergente) – fenômeno conhecido como refração – e atinge a retina que é rica em células fotorreceptoras (cones e bastonetes) local onde ocorrem as conversões químicas que sensibilizam a retina efetivando a fototransdução (SANTOS et al., 2006). 46 Na retina, mais de cem milhões de células fotorreceptoras transformam as ondas luminosas em impulsos eletroquímicos, que são decodificados pelo cérebro. Inspirado no funcionamento do olho o homem criou a máquina fotográfica. Portanto, em nossos olhos, a córnea funciona como a lente da câmera, permitindo a entrada de luz no olho e a formação da imagem na retina. Localizada na parte interna do olho, a retina seria o filme fotográfico, onde a imagem se reproduz. A pupila funciona como o diafragma da máquina, controlando a quantidade de luz que entre no olho. Ou seja, em ambientes com muita luz, a pupila se fecha, e em locais escuros, a pupila se dilata com o intuito de captar uma quantidade de luz suficiente para formar a imagem (CBO, 2010). Na retina, camada interna do olho, temos a mácula, que é o ponto central da visão, responsável pela melhor acuidade visual e pela nitidez das imagens. Quando as imagens não são apropriadamente focalizadas na retina, precisamos de lentes corretivas (óculos). É por meio da coordenação entre o sistema visual e o cérebro que percebemos e compreendemos o mundo que nos cerca. 47 UNIDADE 8 – BIOFÍSICA DAS RADIAÇÕES IONIZANTES Vimos até o momento, algumas das áreas de saúde onde encontramos aplicabilidade prática da Biofísica. Como diz Corso (2009), ensina-se biofísica, também, para que os profissionais da saúde possam operar instrumentos médicos sofisticados onde se destacam os aparelhos de imageamento. O século XX assistiu a um aumento exponencial no desenvolvimento das tecnologias médicas. A invasão da física e da tecnologia na medicina começou há pouco mais de 100 anos com a descoberta dos raios X que quase imediatamente gerou instrumentos de produção de imagens do interior do corpo humano. Quanto ao uso de radiações na medicina, vale destacar aquilo que no Brasil se chama física médica. Os físicos reivindicaram com sucesso para sua categoria as atividades profissionais envolvendo o uso de material radioativo e de radiações ionizantes em geral. Divide-se a física médica em três grandes áreas, a saber: a radioterapia, o radiodiagnóstico e a medicina nuclear. A primeira é exclusivamente terapêutica enquanto as outras duas estão na ponta das técnicas de imageamento. A radioterapia trabalha com o uso de radiações ionizantes na destruição de tecido canceroso, seu mote é: destruir com radiação o máximo de câncer minimizando o dano aos tecidos sadios do corpo. O radiodiagnóstico trata do estudo de imagens médicas usando raios X, a técnica básica é: radiação de uma fonte externa incide sobre o corpo projetando sombras (os ossos são mais rádio-opacos do que os tecidos moles) em uma película fotográfica radio-sensível. A medicina nuclear é um pouco mais sofisticada, aqui radioisótopos são introduzidos no paciente sendo seletivamente absorvidos por tecidos que passam a irradiar radiação gama. Então um sensor fora do corpo, tipicamente uma gama câmara, capta esta radiação e uma imagem é construída no computador. Tanto a medicina nuclear como o radiodiagnóstico são essencialmente técnicas de imageamento, mas na primeira, o paciente não entra em contato direto com radioisótopos. 48 Existem outras técnicas de imageamento que não usam radiações ionizantes, como a ultrassonografia e a ressonância nuclear magnética. Na compreensão destas tecnologias se utiliza uma linguagem física sofisticada, a ultrassonografia envolve ondas de ultrassom, reflexão de onda na passagem entre meios, absorção da onda acústica pelos tecidos, difração, entre outras, como já vimos anteriormente. A ressonância magnética é ainda mais sutil, pois para seu entendimento se necessitam usar ideias quânticas como spin de partículas nucleares e interação do spin com campos magnéticos oscilantes. Curioso que, do ponto de vista da classificação dos saberes, a ultrassonografia e a ressonância magnética são estudadas por engenheiros, ao que chamam de Bioengenharia (CORSO, 2009). Outra grande área da bioengenharia lida com potenciais elétricos evocados que são registrados em uma série temporal. Variando um pouco os eletrodos e o sistema de amplificação e filtragem do sinal se constroem vários instrumentos de medida de biopotencias importantes no diagnóstico médico. O mais famoso, e que corresponde ao mais intenso sinal elétrico no corpo, é o eletrocardiograma. Este instrumento registra o campo elétrico oscilante do coração, com auxílio do eletrocardiograma muitas disfunções cardíacas podem ser detectadas. Em ordem de fama no dizer de Corso (2009) e importância, segue o eletroencefalograma que registra os potenciais evocados sobre a superfície do couro cabeludo informando sobre o comportamento elétrico do cérebro. O número de eletrodos (e de canais de entrada) que podem ser usados neste equipamento, varia de 8 até mais de uma centena dependendo do tipo de exame. Existe também um instrumento que avalia o sinal da atividade elétrica dos músculos, o miograma. Este instrumento pode usar tanto eletrodos de superfície (como aqueles utilizados no eletrocardiograma) como sensores tipo agulha para avaliar a condição de músculos profundos (CORSO, 2009). Mas voltemos ao uso da radiação! A Radiação, por característica, é qualquer entidade capaz de transferir energia de um sistema a outro, independentemente de meio material. Tais entidades podem ser corpusculares ou eletromagnéticas. 49 Quando a radiação transfere
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