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texto - algumas considerações sobre adoção

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Algumas considerações sobre a adoção
Patrícia Glycerio Rodrigues Pinho�
	O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº8069 de julho de 1990, é o diploma legal que rege a adoção de crianças e adolescentes no Brasil. Segundo o artigo 19, “Toda criança e adolescente tem direito a ser criado no seio de sua família e excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes”. Há três modalidades de colocação em família substituta: guarda, tutela e adoção. 
	A adoção é medida irrevogável, que atribuí a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, do que os filhos biológicos, sendo estas diferenças marcantes em relação às medidas de guarda e tutela.
	O vínculo de adoção constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil, mediante mandado, consignando o nome dos adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes. No novo registro civil de nascimento não há nenhuma referência à realização da adoção.
	Salienta-se que “a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar” (art.23)
	O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) enfoca a adoção como um direito da criança, o que traz conseqüências importantes à compreensão do tema, especialmente porque a adoção comumente era encarada como um direito dos pais que não puderam gerar seus filhos. Assim, atualmente, o foco seria a procura de uma família para a criança e não mais a procura da criança para uma família. 
Para se adotar uma criança com a qual ainda não se estabeleceu convivência é preciso procurar a Vara da Infância e da Juventude e do Idoso e iniciar o procedimento de Habilitação para Adoção. Na comarca do Rio de Janeiro este é realizado de forma interdisciplinar pela Divisão de Psicologia e Divisão de Serviço Social e visa alimentar o cadastro dos interessados em adotar, bem como atender às determinações de realização de estudos através de cartas precatórias. Desde 1999, este procedimento se constitui de encontros em grupo, entrevistas com o psicólogo e a assistente social e realização de visita domiciliar. 
A existência de um procedimento de habilitação justifica-se ao consideramos a tarefa dos Juizados da Infância e Juventude de assegurar às crianças e adolescentes seu direito à convivência familiar e comunitária. O procedimento tem caráter reflexivo, embora seu aspecto avaliativo seja incontestável, já que o resultado final do procedimento é a inclusão, ou não, do requerente no cadastro dos interessados em adotar. Espera-se também que, como resultado desta intervenção, as crianças possam contar com pais mais seguros para acolhê-las. O procedimento de habilitação é sempre uma aposta, pois muito da nova configuração familiar só poderá ser entendida após a inserção da criança na família substituta.
Costuma causar impacto a constatação de que há muitos interessados em adotar e que não há, no momento, crianças de até quatro anos disponíveis para adoção na comarca do Rio de Janeiro. Esta informação contribui para outra importante mudança de paradigma em relação à adoção. Se há algum tempo atrás, associava-se necessariamente adoção à filantropia, atualmente podemos questionar a veracidade de tal premissa. Acreditamos que esta mudança de concepção interfere no modo de introdução da criança na dinâmica familiar, podendo facilitar sua inserção na posição de filho desejado, não precisando ser encarada objetivamente como “alguém que precisava de ajuda”. 
Nos últimos anos a procura pela adoção aumentou enormemente. Neste momento, na Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Capital existem cerca de 450 pessoas no cadastro de interessados em adotar aguardando o encontro com seu filho. Se, há pouco tempo, havia dificuldades em fazer a colocação de crianças maiores de dois anos, hoje, parte dos interessados dispõe-se a acolher crianças de até cinco anos, embora a maioria absoluta ainda deseje adotar um bebê, branco e do sexo feminino, o que é uma realidade em todo o Brasil. Ressaltamos que as equipes técnicas também precisam ter disponibilidade para acompanharem e indicarem as adoções tardias. Observamos que quando o profissional não acredita na possibilidade deste tipo de adoção, pode deixar de perceber nos requerentes interesse no tema, chegando até mesmo a desaconselhar tal tipo de adoção. 
Os grupos de apoio à adoção têm importante papel na construção da “nova cultura de adoção�”, justamente embasada nas necessidades da criança e trazendo para a discussão a questão das adoções necessárias. A nova cultura de adoção pretende que o tema saia da esfera do privado e venha para o âmbito público. Ao dar visibilidade à questão, os envolvidos contribuem para a desconstrução de mitos e preconceitos sobre o assunto. 
Entre os inúmeros mitos existentes sobre a adoção, destacaríamos o da hereditariedade (“sangue ruim”), onde se acredita que características negativas observadas da criança seriam herdadas geneticamente. Muitas vezes, embasadas em suposições dos pais adotivos sobre a família biológica da criança, delineiam-se relações automáticas de causa e efeito. Por exemplo, se a criança levou um objeto que não é seu para casa, imagina-se que isto seja conseqüência do fato do pai ter sido um ladrão, sem possibilitar outras interpretações sobre o ocorrido. Tal compreensão atribui qualquer dificuldade da criança as suas origens. Este entendimento impede os pais de perceberem a implicação de sua interação com a criança no comportamento apresentado por ela. Quando este modo de interação se cristaliza, observamos que, durante o período de guarda provisória, que antecede a promulgação da sentença da adoção, os requerentes à adoção optam por desistir do feito, entregando a criança ao Juizado. Outra situação que comumente aparece nas situações de desistência relaciona-se a uma expectativa dos requerentes de que a criança lhes deve gratidão eterna, especialmente no caso de adoções tardias. 
A revelação para a criança sobre suas origens parece ser a questão que mais mobiliza os pais adotivos. Atualmente, a maioria aceita que a criança deva ter acesso a sua história de vida, mas, ao efetivamente compartilharem com os filhos estas informações, podem sentir-se inseguros. Este tem sido um tema recorrente no grupo de apoio “café com adoção”, projeto da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Comarca da Capital,destinado aos pais pela via de adoção e àqueles que esperam o encontro com seu filho. O que a experiência nos tem mostrado é que quanto mais tranquilamente a família lida com o assunto, melhor ele será assimilado pela criança. Muitas crianças contam com orgulho suas histórias, ressaltando o fato de terem sido escolhidas por sua família e percebendo a adoção como algo positivo, uma palavra bonita que não precisa ser pronunciada aos sussurros. 
A importância de as crianças poderem se acostumar com a adoção e seu significado, relacionando-a a fatos positivos, levaram os grupos de apoio a buscar parcerias com as escolas, sugerindo-se a inclusão no calendário escolar da comemoração do Dia Nacional da Adoção (25 de maio). Outra iniciativa de grupos de apoio, este ano também do Café com Adoção, foi a organização de concursos nas escolas para premiar os melhores slogans sobre a adoção. 
Para se compreender a adoção há de se levar em conta a criança, a família biológica e a família adotiva. Pode-se pensar nos três vértices de um triângulo, atravessado pelo Judiciário, que tem o poder de oficializar tais relações. Não há como generalizar quando enfocamos a família biológica das crianças colocadas em adoção, pois cada situação guardará sempre sua especificidade. No entanto, podemos observar que a Justiça tem sido procurada pelas mães para intermediar a entrega de seus filhos em adoção, o que consideramos um fato social novo. A maioria alega falta de recursos materiais para cuidar de seusfilhos, ressaltando não contar com o apoio do pai da criança ou da família extensa. Algumas deixam seus filhos com as “cegonhas” a fim de que estas façam a entrega da criança a uma outra família. Com freqüência percebemos o fenômeno de circulação de crianças, onde a mãe deixa seu filho sob os cuidados de um conhecido e vai aos poucos, distanciando-se do mesmo. A situação parece resolvida até que o “cuidador” decide regularizar a situação, quando, geralmente, a mãe se pronuncia contrariamente à adoção, não porque queira retomar os cuidados com o filho, mas para assegurar que a criança permaneça “no seu nome”. É interessante ressaltar que muitas vezes a mãe que decide entregar um filho em adoção tem consigo outros filhos, dos quais não pensa em se separar. Percebemos ainda a importante pressão do meio social que mostra desaprovação em relação a mulheres que optam por entregar seu filho para adoção. 
A filiação adotiva guarda semelhanças e diferenças quando comparada à filiação biológica. Como semelhança, destacaríamos a construção de vínculos parentais e filiais e como diferença, o fato da adoção ser mediada pelo Poder Judiciário. Uma conseqüência desta mediação é ficar submetida à necessária duração do processo –“tempo jurídico”-, que quase nunca corresponde ao “tempo psíquico”. Assim, muitos se queixam da burocracia envolvendo a adoção, bem como de uma impessoalidade existente no Poder Judiciário. Por outro lado, também ouvimos muitas queixas encaminhadas aos médicos envolvidos nos tratamentos de fertilização assistida, já que ainda se observa na maioria dos interessados em adotar situações de infertilidade.
Entendemos que a adoção pode ser encarada como forma legítima de filiação e não apenas como tentativa de imitar a biologia. Quando nos aproximamos das famílias constituídas através da adoção, percebemos que, após a inclusão da criança, esta particularidade não as tornam diferentes em seu modo de funcionamento. São famílias cuidando de seus filhos.
A adoção tem se configurado como uma experiência positiva para todos os envolvidos. A rede social se mostra cada vez mais capaz de acolher as diferentes formas de filiação de modo respeitoso, o que contribui para que as famílias constituídas pela adoção possam se sentir legitimadas.
� Psicóloga da Divisão de Psicologia da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso do Rio de Janeiro
� termo cunhado por Fernando Freire, psicólogo que desempenha importante papel na organização os grupos de apoio à adoção no Brasil. Cf Os Desafios da Adoção no Brasil II- Freire, F. (org.) Curitiba: Terre des Homes, 1995

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