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30º Encontro Anual da ANPOCS, 24 a 28 de outubro de 2006; GT24 - Tecnologias de informação e comunicação: controle e descontrole título do trabalho; Inclusão digital do profissional professor: entendendo o conceito de tecnologia nome(s) do autor(es). Glaucia da Silva Brito Inclusão digital do profissional professor: entendendo o conceito de tecnologia Glaucia da Silva Brito1 Tratar da formação do educador acerca das questões de ordem tecnológica implica refletir que tipo de educação estamos nos referindo e para que tipo de sociedade. É evidenciar que educadores se formam na prática acadêmica, na vida em sociedade e no diálogo constante em sala de aula, é destacar que a prática docente define a visão de tecnologia que por sua vez define o envolvimento dos docentes com o questionamento da tecnologia como prática da construção de sua função na sociedade. Neste sentido, é que propomos refletir a respeito de um tema que se constrói na sociedade moderna, industrial, capitalista a partir do questionamento de sua própria essência, qual seja, para que, por que e para quem se busca o estudo da tecnologia no universo da formação docente? Pensando na integração entre Tecnologia e Comunicação, teremos que considerar o leque de opções de uso dos variados “sistemas de signos” (a linguagem oral, a escrita, o sistema de números, as linguagens de computação, a linguagem musical, a linguagem televisual, a linguagem cinematográfica, fotográfica, etc.) na sociedade atual. Com as novas tecnologias da comunicação e informação surgiram novos modos de transmitir, receber e conservar a informação. Surgiram novos vocábulos, como “telemática”, “teledocumentação”, “teleinformática” ou “novas tecnologias da informação”. Então não poderemos descartar que esse mundo em transformação influi notavelmente na cultura, ou seja: - No desenvolvimento das técnicas audiovisuais; - Na transformação das tradicionais bibliotecas em centros de documentação e telecomunicação; - Na possibilidade, para qualquer profissional, de obter informação de qualquer parte do mundo, sem necessidade de mover-se de sua casa; 1 glaucia@ufpr.br - Nas maiores ofertas de lazer no próprio lar; - Nas transformações do enfoque dado a determinadas disciplinas, em escolas e universidades; - No surgimento de novas carreiras e especializações profissionais, etc. O assunto “tecnologia e educação”, às vezes é tratado em seminários e/ou cursos organizados pelas secretárias de educação ou, programas de pós- graduação. Nestes seminários e cursos, podemos perceber que não há uma discussão aprofundada sobre o conceito de tecnologia, causando assim uma confusão. Às vezes, são discutidas as configurações das tecnologias da informação e da comunicação atual, a interação humano-máquina e as conseqüências disto tudo na formação do indivíduo de uma forma muito abrangente e, às vezes, esses seminários tratam da manipulação de softwares, dos mais simples aos mais sofisticados, não se chega a uma discussão efetiva destas tecnologias na educação. Podemos dizer que há uma grande distância entre o discurso e a prática dos resultados destes cursos de formação e que estes, na maioria das vezes, se referem somente ao uso do computador na escola. Ao refletir sobre a questão acima citada – cursos para os professores - encontramos em Moura (2002), uma análise que tipifica essa contradição entre o discurso e a prática. Nela, a autora aponta falha de três ordens nos cursos que pretendem preparar os professores para o uso do computador nas escolas: falha de propósito; falha de método; falha de significação. Como “falha de propósito”, a autora identifica o fato de que a tecnologia é apresentada como algo que simplesmente deve-se aprender, em vez de se compreendê-la dentro de um contexto que exponha o porquê de utilizá-la no ensino, razão essa que os professores precisam conhecer. Ou seja, estes necessitam refletir como os computadores podem auxiliá-los no fazer pedagógico. Como “falha de método”, Moura menciona a circunstância de que os cursos sobre tecnologias não deveriam se limitar apenas à aprendizagem progressiva da informática, mas incluir o estudo das capacidades cognitivas envolvidas na construção do conhecimento com auxílio do computador. Por fim, como “falha de significação”, a autora faz notar a ocorrência de que em muitos cursos promove-se apenas a capacitação para o uso, em lugar disso, dever-se-ia privilegiar a construção do sentido sobre esse uso e sobre suas aplicações nos processos educativos, conferindo, assim, uma experiência cultural e não só instrumental, o que conferiria clareza quanto aos objetivos cognitivos e pedagógicos da utilização dos computadores nos conteúdos escolares. Entendemos que a construção de sentido também se dará pela apropriação dos conceitos de tecnologia. Sem a apropriação deste conceito fica muito difícil discutir algumas implicações da relação entre exigências educacionais, novas tecnologias e ensino, do ponto de vista pedagógico, pois, como em outras épocas, neste momento, há uma expectativa grande de que as novas tecnologias nos trarão soluções rápidas para a melhoria da qualidade na educação. Se a educação dependesse somente de tecnologias já teríamos achado as soluções para essa melhoria há muito tempo. Com o objetivo de verificar qual o conceito de tecnologia que os professores atuantes no ensino fundamental, médio e superior possuem, realizamos uma pesquisa na qual coletamos dados por meio de entrevistas semi-estruturadas. Procuramos respeitar os principais estágios a serem considerados no uso da entrevista semi-estruturada. Primeiramente definimos o objetivo da entrevista: verificar a percepção dos professores em relação ao termo tecnologias; identificamos os entrevistados que seriam os professores atuantes no ensino fundamental, médio e superior. Após estas duas etapas passamos para o estágio de escrever e ordenar as perguntas temas. Para este artigo faremos a análise das respostas da pergunta tema: Concepção de Tecnologias: O que você entende por tecnologia? Professor X tecnologia ou professor + tecnologia? Brito e Purificação (2006), afirmam que alguns autores2 que falam sobre formação de professores destacam que: o professor não tem um domínio sólido dos conteúdos que transmite, se bem que isso seja o que melhor conheça; o professor não consegue relacionar os conhecimentos que transmite à experiência do aluno e à realidade social mais ampla; a remuneração do professor é baixa, o que o obriga a ter vários empregos, fato que traz graves conseqüências para o processo ensino-aprendizagem; o professor tem lidado com o aluno “ideal”, com o aluno “padrão”, como se todos fossem homogêneos, tivessem o mesmo ritmo de aprendizagem, e não com o aluno concreto; a divisão técnica do trabalho no interior da escola com a multiplicação das funções e especialidades têm feito com que o trabalho pedagógico se fragmente cada vez mais; os conhecimentos transmitidos pela escola, às vezes selecionados pelos professores, não são remetidos à sua historicidade; são trabalhados como se estivessem prontos e acabados, e não relacionados à vida dos alunos e à realidade histórico-social mais ampla; os alunos, em geral, não têm se apropriado sólida e duradouramente dos conhecimentos transmitidos pela escola. As explicações para a existência desses problemas são: ausência de uma política clara para a educação como um todo; falta de recursos financeiros; péssimas condições materiais das escolas; salários baixos para o profissionalprofessor; precária formação do professor em razão da estrutura tradicional dos cursos de licenciaturas, entre outras. Segundo Behrens (1995), “neste momento de globalização mundial, continuamos a tratar a formação do professor com discursos vazios de uma prática apropriada e significativa. Reverter este papel perante a sociedade é uma tarefa árdua”. Nesta aldeia global, o professor ainda se considera um ser superior 2 Tais como: PERRENOUD (2001); DEMO (1999); GIROUX (1997); LA TORRE e BARRIOS (2002); IMBERNÕN (1999). que ensina a ignorantes. Isso forma uma consciência “bancária”3 - o aluno recebe passivamente os conhecimentos, tornando-se um depósito do professor. Apontamos como caminho para o professor recuperar o seu lugar a formação continuada, entendida aqui como ações tanto na direção de busca de conhecimento formal quanto, principalmente, de tomada de consciência de seu próprio fazer pedagógico, pois não podemos mais admitir aquele professor que: ... arquiva conhecimentos porque não os concebe como busca e não busca, porque não é desafiado pelos seus alunos. O professor, como sujeito direcionador da práxis pedagógica escolar, tem que, no seu trabalho, estar atento a todos os elementos necessários para que o aluno efetivamente aprenda e se desenvolva. Para isso, o professor deverá ter presentes os resultados das ciências pedagógicas, da didática e das metodologias específicas de cada disciplina, ou seja, um profissional que estará sempre se atualizando. Freire (1994, p.29) Para alcançar essa atualização, o professor deverá também utilizar as tecnologias as quais poderão ajudá-lo na elaboração de materiais de apoio, bem como ser valiosos recursos para o ensino de diversas disciplinas do currículo, seja em sala de aula, num trabalho coletivo, seja na dinâmica do trabalho desenvolvido em ambientes informatizados. Os vínculos entre práticas educativas e tecnologias estreitam-se consideravelmente no mundo contemporâneo, ao menos, por duas fortes razões: os avanços tecnológicos na comunicação e informática e as mudanças no sistema produtivo envolvendo novas qualificações e, portanto, novas exigências educacionais. O impacto dessas novas realidades no ensino impõe ao menos três tipos de leitura: a pedagógica, a epistemológica e a psicognitiva. Nos interessa o ponto de vista pedagógico, pois a este ponto está diretamente ligado aquele que é o organizador da atividade escolar em qualquer nível: o professor. Nenhuma intervenção pedagógica, harmonizada com a modernidade e os processos de mudanças que estão implícitos será eficaz sem a colaboração consciente deste profissional da educação. Do livro, ao quadro de giz, ao retroprojetor, a TV e vídeo, ao laboratório de informática as instituições de ensino vem tentando dar saltos qualitativos, sofrendo transformações que levam junto um professorado, mais ou menos perplexo, que 3 Expressão usada por Paulo Freire. se sente muitas vezes despreparado e inseguro frente ao enorme desafio que representa a incorporação das tecnologias ao cotidiano da sala de aula. Isto não ocorre apenas nas pequenas cidades do interior do Brasil, mas também nas capitais onde os professores são muito mais pressionados a utilizar as tecnologias. A cada dia tomamos conhecimento de decisões e projetos, governamentais ou não, argumentando sobre a “importância” das tecnologias na educação. Estes projetos consideram que a inclusão digital dos professores pode ser feita apenas por meio de cursos de capacitação, que se desenvolvem na própria instituição de ensino, em universidades e centros de informática. São cursos importantes, mas não são suficientes para propiciar mudanças na ação do professor no ambiente escolar, pois não ocorre uma inclusão digital real deste profissional. A comunidade escolar depara-se com três caminhos, quais sejam: repelir as tecnologias e tentar ficar fora do processo; apropriar-se da técnica e transformar a vida em uma corrida atrás do novo; ou apropriar-se dos processos, desenvolvendo habilidades que permitam o acesso e o controle das tecnologias e seus efeitos. A terceira opção é a que apresenta melhores argumentos para uma formação intelectual, emocional e corporal do cidadão que cria, planeja e interfere na sociedade. Para que o professor possa se tornar um agente promotor da inclusão digital no ambiente educacional ele deverá realizar um trabalho pedagógico em que reflita sobre sua ação escolar e efetivamente elabore e operacionalize projetos educacionais com a inserção das Novas Tecnologias da Informação e da Comunicação – NTIC - no processo educacional. Buscando, integrá-las à ação pedagógica na comunidade intra e extra escolar e, sendo claramente explicitado na proposta pedagógica da instituição. Ampliando o conceito de tecnologia Procurando autores que especificam os fundamentos da tecnologia, percebemos que eles partem primeiramente do conceito de técnica para depois descrever os fundamentos da tecnologia. Em BUENO (1999, p. 81) percebe-se a técnica como integrante e precursora da tecnologia que temos hoje, a tecnologia moderna em suas várias facetas. VARGAS (1994, p. 171), afirma que o homem sem técnica seria abstração tão grande como técnica sem homem e “só é humano aquele ser que possui a capacidade de se comunicar pela linguagem e habilidade de fabricar utensílios pela técnica.” A autora destaca que “a técnica faz parte do cotidiano do ser humano, no agir, no pensar, pois este ao intervir na natureza está produzindo um trabalho que eventualmente, buscou para isso uma técnica que faz parte do ser humano e também, faz parte de seu conhecimento.” VARGAS (1994) diz que o termo tecnologia surgiu com os gregos e foi muito confundido com a techné: ... a “techné” não se limitava à pura contemplação da realidade. Era uma atividade cujo interesse estava em resolver problemas práticos, guiar os homens em suas questões vitais, curar doenças, construir instrumentos e edifícios, etc. As “techné” gregas, eram, em princípio, constituídas por conjuntos de conhecimentos e habilidades transmissíveis de geração a geração. ... O que, entretanto, designamos hoje, de forma geral, por técnica não é exatamente a “techné” grega. A técnica no sentido geral, é tão antiga quanto o homem; pois aparece com a fabricação de instrumentos... E essa fabricação já corresponderia um saber fazer: uma técnica. (p. 18) GAMA (1986, p. 205) descreve o que não seria tecnologia: - Não é um conjunto de técnicas ou de todas as técnicas, e nem é uma sofisticação da técnica. A passagem da técnica para a tecnologia (e esta não exclui a primeira) não é a questão da gradação ou desenvolvimento interno ao campo das técnicas: é a questão que se refere à formação sócio-econômica em que se realiza. - Não é a “maneira como os homens fazem as coisas” porque, em primeiro lugar, não se distingue desse modo técnica de tecnologia e, em segundo lugar, há muitas coisas que os homens fazem que não são técnicas. - Não é o conjunto de ferramentas, máquinas, aparelhos ou dispositivos quer mecânicos quer eletrônicos, quer manuais, quer automáticos. - Não é o conjunto de invenções ou qualquer uma delas individualmente. O avião não é uma tecnologia, como não é o rádios, o radar ou a televisão, muito embora seja esta a acepção mais difundida em marketing. As duas últimas afirmações, segundo BUENO (1999, p.85) convergem com o pensamento de VARGAS: ... o uso da palavra tecnologia referindo-se a máquinas, equipamentos, instrumentos e sua fabricação, ou a utilização ou manejo deles. É verdade que há umatecnologia embutida em qualquer instrumento e implícita em sua fabricação; mas isto não é razão para se considerar o saber embutido num objeto, ou implícito na sua produção, com o próprio objeto da industria. Um derivado desse mal uso é o emprego da palavra tecnologia para significar a organização, o gerenciamento e, mesmo, o comércio desses aparelhos. Por uma razão ou outra essa confusão apareceu na área da computação e da informática, onde a máquina é tão importante quanto o saber de onde ela se originou. Há, então, o perigo de se confundir toda a tecnologia, isto é, o conhecimento científico aplicado às técnicas a aos seus materiais e processos com uma particular indústria ou comércio. Desta forma BUENO conceitua tecnologia como sendo: ... um processo contínuo através do qual a humanidade molda, modifica e gera a sua qualidade de vida. Há uma constante necessidade do ser humano de criar, a sua capacidade de interagir com a natureza, produzindo instrumentos desde os mais primitivos até os mais modernos, utilizando-se de um conhecimento científico para aplicar a técnica e modificar, melhorar, aprimorar os produtos oriundos do processo de interação deste com a natureza e com os demais seres humanos. (1999, p.87) O termo tecnologia vai muito além de meros equipamentos. Ela permeia em toda a nossa vida, inclusive em questões não tangíveis. TAJRA (2001, p. 48) classifica as tecnologias em três grandes grupos: Tecnologias físicas: são as inovações de instrumentais físicos, tais como: caneta esferográfica, livro, telefone, aparelho celular, satélites, computadores. Estão relacionadas com a Física, Química, Biologia, etc. (equipamentos) Tecnologias organizadoras: são as formas de como nos relacionamos com o mundo; como os diversos sistemas produtivos estão organizados. As modernas técnicas de gestão pela Qualidade Total é um exemplo de tecnologia organizadora. (relações com o mundo) Tecnologias simbólicas: estão relacionadas com a forma de comunicação entre as pessoas, desde a iniciação dos idiomas escritos e falados à forma como as pessoas se comunicam. São os símbolos de comunicação. (interfaces de comunicação) Consideramos que estas tecnologias estão intimamente interligadas e são interdependentes. Ao escolhermos uma tecnologia, estamos intrinsecamente optando por um tipo de cultura, a qual está relacionada com o momento social, político e econômico no qual estamos inseridos. Analisaremos os conceitos explicitados pelos professores pesquisados considerando a classificação de TAJRA (2001). Educadores e suas concepções de tecnologia Optamos pela entrevista semi-estruturada para um maior grau de liberdade, onde tínhamos em mãos, um roteiro e sub-temas dos aspectos a serem explorados, sendo que desta forma, nós como entrevistadores poderíamos corrigir a entrevista para evitar fugas dos objetivos da mesma. A entrevista semi-estruturada representa [...] o meio termo, não sendo nem estruturada e nem não-estruturada. Geralmente um protocolo de entrevista semi-estruturada inclui um número de temas e tópicos a serem discutidos na entrevista, mas eles não são introduzidos da mesma maneira, na mesma ordem, nem se espera que os entrevistados sejam limitados nas suas respostas e nem que respondam tudo da mesma maneira. O entrevistador é livre para deixar os entrevistados desenvolverem as questões da maneira como eles quiserem. Ao usar este tipo de entrevista é possível exercer um certo tipo de controle sobre a conversação, enquanto se permite ao entrevistado alguma liberdade. Ela também oferece uma oportunidade de esclarecer qualquer tipo de resposta quando for necessário, é mais fácil de ser analisada do que a entrevista não estruturada mas não tão fácil assim quanto a entrevista estruturada. (MOREIRA, 1996, p. 24). Procuramos respeitar os principais estágios a serem considerados no uso da entrevista semi-estruturada. Primeiramente definimos o objetivo da entrevista: verificar a percepção dos professores em relação ao termo tecnologias; identificamos os entrevistados que seriam os professores dos Cursos de Comunicação Social. Após estas duas etapas passamos para o estágio de escrever e ordenar as perguntas temas. Para este artigo faremos a análise das respostas da pergunta tema: Concepção de Tecnologias: O que você entende por tecnologia? Para entendermos o pensamento e os conceitos de cada professor a respeito da questão tecnológica é preciso destacar que suas concepções têm como base suas histórias de vidas e experiências docentes, ou seja, o que vivenciaram sobre tecnologia constrói a apropriação de seus conceitos: ALVES (1982, p. 16), neste sentido já destacou: Eu diria que educadores são como velhas árvores. Possuem uma face, um nome, uma “estória” a ser contada. Habitam um mundo em que o que vale é a relação que os ligam aos alunos sendo que cada aluno é uma “entidade” “sui generis”, portador de um nome, também de uma “estória”, sofrendo tristezas e alimentando esperanças. Mas, os professores são habitantes de um mundo diferente, onde o “educador” pouco importa, pois o que interessa é um “crédito” cultural que o aluno adquire numa disciplina identificada por uma sigla, sendo que, para fins institucionais nenhuma diferença faz aquele que a ministra. Por isto mesmo professores são entidades “descartáveis”, coadores de café, copinhos plásticos de café, descartáveis. De educadores para professores realizamos um salto de pessoa para funções. Neste sentido, a visão abrangente sobre tecnologia depende da concepção que cada educador tem da sua própria prática. Aqui buscamos elencar alguns: I. Tecnologias físicas: quarenta e quatro entrevistados conceituam tecnologia como sendo os equipamentos, recursos, ou instrumentos. Como demonstram algumas das falas transcritas abaixo: - É toda e qualquer máquina criada pelo homem para facilitar e melhorar a vida do ser humano - É tudo o que está relacionado a informática, eletrônica e evolui constantemente, num ritmo acelerado. Contribui para pessoas, na comunicação rápida e tem que se tomar o cuidado para não ficar viciado; - É todo recurso usado para facilitar qualquer tarefa, ou até mesmo viabilizar a realização da mesma. Fazendo comparação com a história da escrita houve um dia em que o lápis e o papel eram instrumentos mais modernos em termos de tecnologia; - Meios de comunicação que renovam muito rápido, querendo cada vez mais a rapidez e o aprimoramento do serviço prestado; - É o uso de materiais diversificados, tv, rádio, computador, vídeo. - Produtos mecânicos e ou elétricos com capacidade de memorização ou repetição automatizado e exato que ajudam a melhorar a performance das atividades com menos esforço e espaço de tempo reduzido. - São coisas que servem para proporcionar comodidade, facilidade e bem-estar as nossas vidas. Percebemos aqui a forte influencia da difusão da propaganda que apresenta a tecnologia como instrumento. Este instrumento muitas vezes vinculado à área da informática. Para estes professores a tecnologia é entendida como produto e não como processo, isto pode levá-los a transformar a tecnologia física num fim e não num meio. II. Tecnologias Organizadoras: vinte quatro entrevistados apontam o conceito de tecnologia como um processo ligado aos sistemas produtivos e suas organizações. - Conjunto de conhecimentos, processos e métodos usados num determinado ramo de atividade (ex.: educação, medicina, engenharia, etc.) - Tecnologia é qualquer método ou instrumento descoberto por meio de pesquisa cujo resultado seja superior aos obtidos anteriormente. - Tecnologia lembra conhecimento, pesquisa, ação para prolongar, facilitar, ajudar o homem desde as tarefasmais simples as mais complicadas. Envolve desde conhecimentos (popular) aos científicos. Estes conceitos estão vinculados ao conceito geral de tecnologia apresentado por BUENO que explicitamos anteriormente. III. Tecnologias Simbólicas: são as interfaces de comunicação, ou seja, os símbolos de comunicação que estarão vinculados às tecnologias físicas ou organizadoras. Onze entrevistados fazem referências a comunicação facilitada pela Internet. - É uma nova era na comunicação e que modificou os hábitos e idéias na vida das pessoas, tanto na vida familiar ou profissional. - Facilitadora da comunicação e utensílios que o homem necessita para sua vida, trazendo assim interação entre os mesmos, por exemplo, a internet. - É o avanço na comunicação, como celulares, computadores, máquinas fotográficas. A partir deste avanço na tecnologia que o ser humano tem mais informações. - Recursos cada vez mais modernos que aproximam o mundo, os acontecimentos, as descobertas, o velho, o atual e o novo as pessoas. Aqui o destaque é dado, principalmente, a Rede Internet e não está vinculada a interface de comunicação que muitas vezes são confundidas com a interatividade que o recurso computador pode disponibilizar. IV. Tecnologias Educacionais: No momento da análise dos dados, percebemos que dezenove entrevistados não apontam para nenhum dos conceitos acima. Na verdade eles se referem às tecnologias educacionais. - Recursos que usamos com nossos alunos para proporcionar conhecimento, que vão desde a nossa exposição oral / dialogada ao uso do computador que está ligado ao mundo do conhecimento. - As tecnologias (livro, vídeo, computador, rádio...) propiciam novas formas de aprender, ensinar e produzir conhecimento e são utilizadas de acordo com os propósitos educacionais, bem como, as estratégias mais adequadas à aprendizagem. - É acompanhar a evolução do novo milênio, fazendo uso de diferentes recursos tecnológicos (TV, DVD, Som, retro projetor, microscópio, computador...) em sala de aula; - As salas informatizadas, por exemplo: além de serem mais uma opção metodológicas para os educadores representam uma oportunidade para muitos educando de terem acesso a principal ferramenta de trabalho do nosso atual período histórico, o computador. Estes professores atuam no Ensino Fundamental, portanto já participaram de cursos sobre a questão das tecnologias na educação. Talvez seja necessário trabalhar com estes professores os outros conceitos de tecnologia, pois para efetivar a construção de conhecimentos, a tecnologia é uma excelente aliada, porém, a visão que se pode ter dos recursos tecnológicos como eficazes por si só tem que ser alterada significativamente. Se por um lado, ilustram as aulas, por outro precisam que sua utilização seja adequada, para gerarem conhecimento, para oferecerem opções de crescimento, de mudança, de educação. Não se trata muito menos de depositar na tecnologia toda a responsabilidade da mudança uma vez que seu uso vai infinitamente além do fato de implantá-la. A tecnologia não mudará a educação, o que importa é a forma como ela será utilizada. A maioria dos estudos sobre tecnologia e educação, versa sobre o impacto que esta causa nos alunos, sendo urgente reverter esse quadro e incluir nesta discussão a atuação dos professores, pois é necessário que cada elemento presente no processo de educar seja revisto, analisado e em alguns casos reformulado. Ocupando posição de destaque nesta revisão está a formação dos professores, a tão necessária capacitação do profissional da educação para lidar com os diferentes paradigmas que se apresentam a cada dia. Quando falamos em tecnologias na educação, há uma tendência dos professores se referirem somente ao recurso computador e suas ferramentas. No entanto tecnologias na educação são todos artefatos que fazem parte da realidade de muitas escolas do nosso país e, que são utilizados no processo ensino e aprendizagem. Corroboram com essa idéia os autores THIAGARAJAN E PASIGNA (in LEITE, 1996) que dividem as tecnologias na escola em dois grandes grupos: independentes e dependentes. Esses consideram a dependência ou não dos elementos elétricos ou eletrônicos para a sua produção e/ou execução. Assim, no campo das tecnologias independentes temos: cartaz, álbum seriado, flanelógrafo, mural, quadro de giz, entre outros, e no campo das tecnologias dependentes retroprojetor, televisão, vídeo cassete, gravador, computador, rádio, etc. As tecnologias dependentes podem ser caracterizadas como mediáticas, são mais do que simples suportes. Por exemplo, a televisão, ela interfere em nosso modo de pensar, sentir, agir, relacionar-se socialmente e adquirir conhecimentos. Cria uma nova cultura e um novo modelo de sociedade. V. Tecnologia Social: Uma conceituação nos chamou atenção, por apontar para um conceito pouco divulgado no Brasil: - Conjunto de invenções, técnicas etc para transformar algo e que é desenvolvida na juntamente com a população e será utilizada por ela, pr exemplo uma Rádio Comunitária. A caminhada com a tecnologia social no Brasil é recente. Temos iniciativas de cunho regional em alguns estados brasileiros: São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro, Paraná. São inúmeras instituições que hoje fazem um trabalho ativo junto às camadas desfavorecidas da sociedade e que empregam tecnologias desde as mais simples as mais avançadas para tentar diminuir os índices de desigualdade social. Em 2003, o Instituto de Tecnologia Social, promoveu um encontro para que se propusesse uma base conceitual partindo de um “Conjunto de técnicas e metodologias transformadoras desenvolvidas na interação com a população e apropriadas por ela, que representam soluções para inclusão social e melhoria das condições de vida”. Partindo do princípio de que um conceito de Tecnologia Social deveria ser construído a partir dos significados existentes e contribuir, com a construção do conceito, para o desenvolvimento de melhores práticas nas intervenções sociais4, em 2004 um grupo – composto por vários representantes de projetos sociais no Brasil - reuniu-se para desenvolver uma Oficina, promovida pelo Centro de referência em Tecnologia Social e discutir com mais afinco estas questões. Algumas características foram levantadas nestas oficinas para se tornarem parâmetros no momento da identificação de tecnologias sociais. São elas: Em relação aos objetivos amplos: Visa a solução de uma demanda social concreta; Em relação aos processos de tomada de decisão: Formas democráticas de tomada de decisão. Há estratégias especialmente dirigidas à mobilização e à participação da população envolvida; 4 Agosto de 2004, Documento Síntese, Centro de Referência em Tecnologia Social. Papel da população no projeto. Como se cria vínculos da população. Há apropriação e aprendizagem pela população e outros atores envolvidos; Em relação ao planejamento: Planejamento e capacitação de longo prazo; Construção de novos conhecimentos: Há produção de novos conhecimentos a partir da prática; Em relação a sustentabilidade: Visa sustentabilidade econômica, social e ambiental; Em relação a reaplicação: Visa a possibilidade de reaplicação e utilização daquela Tecnologia Social em maior escala; Partindo desta construção, KENYON (2003) conceitua a tecnologia social como: o processo coletivo que visa questionar o que, como, por que e para quem a tecnologia se desenvolve, para que o cidadão se aproprie dos bens sociais e culturais numa ação conscientizadora de seu papel na sociedadedemocrática, que alia saber tácito das camadas populares ao saber científico gerado ao longo da história da ciência a fim de que esta contribua para a diminuição dos índices de desigualdade social entendendo a tecnologia como meio para a construção da sociedade democrática através de uma ação educativa que desmistifique a tecnologia às camadas populares para que busquem a humanização através de uma trabalho participativo na comunidade e representando soluções concretas para a inclusão social. Considerações Finais Podemos depreender desta primeira etapa da pesquisa que há uma grande necessidade de se desvincular o entendimento do termo tecnologia de objeto, de um simples instrumento tão difundido pela sociedade “capitalista que cultua a mercadoria como principal meio de ascensão social.” (BUENO, 1999, p.209). Embora os dados coletados e analisados sejam de professores que atuam em três níveis de ensino, apontam para a necessidade que os professores sejam preparados, desde a graduação, para um trabalho efetivo com as tecnologias. Não basta apenas instrumentalizá - los, é necessário que estes tenham bem claro o conceito de tecnologias, pois este vai muito além de meros equipamentos que geralmente é aliado ao conceito reducionista de “inclusão digital”. A expressão “Inclusão digital” é muitas vezes utilizada somente para se referir a capacidade da população se inserir no contexto das tecnologias de informação e comunicação como consumidoras de bens, serviços e informações, o que exigiria apenas a oferta de treino para a aquisição de competências básicas para manusear certos instrumentos e ferramentas. Ampliando o conceito de tecnologias estaremos ampliando o conceito de inclusão digital, numa perspectiva da participação ativa, da produção de cultura e conhecimento, o que implica vontade e ação política, um amplo programa de formação continuada dos professores, visto serem estes os agentes promotores de processos educativos capazes de dar à população a oportunidade de participação na dinâmica contemporânea como sujeitos críticos, criativos, éticos, autônomos e com poder de decisão e produção. Para ser considerado incluído, faz-se necessário que o professor compreenda que: - uma boa utilização das tecnologias na educação pode propiciar a criação de novas formas de relação pedagógica, de novas formas de pensar o currículo e, portanto, pode também conduzir a mudanças no ambiente escolar; - o uso das tecnologias na educação tem um potencial enorme, que, não está diretamente relacionado à presença da máquina, mas sim do profissional professor que firmou um compromisso com a pesquisa, com a elaboração própria, com o desenvolvimento da crítica e da criatividade, superando a cópia, o mero ensino e a mera aprendizagem. Neste sentido, é necessário que o professor entenda a tecnologia como um instrumento de intervenção na construção da sociedade democrática contrapondo-se a qualquer tendência que a direcione ao tecnicismo, a coisificação do saber e do ser humano. Junto com estes conceitos de tecnologia apresentados aqui neste artigo, encontramos também “expressões” de medo, sedução ou inovação por parte dos professores com relação ao “espectro” das novas tecnologias aplicadas a educação – mais especificamente em relação ao uso do computador. Estas constatações foram encontradas também por Purificação e Vermelho (2000), em pesquisa realizada sobre a percepção de professores quanto à introdução da informática nas escolas. As autoras explicitam que a grande maioria dos professores pesquisados apresentaram um discurso progressista para a informática na educação, mas este discurso não se efetiva na prática pedagógica. Nosso próximo passo será analisar estas expressões e ver a qual conceito de tecnologia estão aliados. Tudo isto vem confirmar a necessidade de pesquisas a respeito da formação de professores que atuam em qualquer nível de ensino, mediada pelas novas tecnologias da informação e da comunicação, para analisar onde nasce tal discrepância. 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Artigo elaborado para exposição na Mesa Redonda sobre Cultura Tecnológica e catadores (as) de lixo, promovido pela ONG-Aditepp (Associação Difusora de Treinamentos e Projetos Pedagógicos – www.aditepp.org.br) em setembro de 2003. LEITE, Lígia Silva (org.). Tecnologia Educacional: descubra suas possibilidades na sala de aula. Rio de Janeiro: Diadorim, 1996 MOREIRA, Herivelto. A coleta de dados através de questionários e entrevistas. Notas de aula proferida na PUC, Curitiba, 1996. MOURA, M. Z. da S. No discurso de professores, a formação para o trabalho com computadores no contexto escolar. ANPED, 25a reunião anual. Educação: manifestos, lutas e utopias. Caxambu – MG, 2002. PURIFICAÇÃO, I.; VERMELHO S. C. S.D. Informática na Educação: a percepção dos professores. Tuiuti Ciência e Cultura. Volume 16, março de 2000. TAJRA, Sanmya Feitosa. Informática na Educação: novas ferramentas. São Paulo: Érica, 2001. VARGAS, Milton. Para uma filosofia da tecnologia. 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