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Direito e Relações Raciais

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1 INTRODUÇÃO
Baseado na dissertação Direito e Relações Raciais: Uma Introdução Crítica ao Racismo de Dora Lúcia de Lima Bertúlio, objetiva-se introduzir o debate racial no estudo e prática do Direito.
A discussão acerca da questão racial no Brasil tem sido tratada com negligência, devendo ser analisada desde o período escravista na História do Brasil. É necessário analisar os conflitos considerando as bases histórias, sociais e econômicas que refletem a ideologia racista, além da maneira que influencia o pensamento jurídico e o Estado frente às relações raciais.
Como ponto de partida, encara-se as Declarações de Direitos que tem como base ideológica um Direito Natural e inerente a todos os homens. Contudo, aspectos como a “liberdade”, “propriedade” e “segurança”, garantidos a todos em teoria, desconsideram certos indivíduos, mascarando uma realidade na qual não há igualdade material.
Ao analisarmos o cotidiano do Direito brasileiro face às relações raciais, fica evidente que o sistema jurídico buscou preservar os valores das classes dominantes, o que acaba refletindo posições claramente racistas e perpetuando a cultura de submissão do povo negro.
Referente às Constituições Brasileiras, percebe-se que, seja durante o período de escravidão ao após sua abolição, desconsideraram a existência de conflitos nas relações entre brancos e negros e invocam discursos de igualdade. Somente após muita pressão da população negra organizada é que o Estado edita dispositivos específicos e leis antirracistas. A sociedade brasileira alimenta o sistema de preconceito e discriminação racial, olvidando-se de discutir ou examinar seu racismo, negando-o. 
Bertúlio então propõe a intensificação do estudo e discussão crítica do racismo, analisando-o através do sistema jurídico brasileiro e identificando-o como um fenômeno institucionalizado em nosso país.
2 DIREITO E RELAÇÕES RACIAIS
A questão racial no Brasil tem sido tratada com negligência e descaso, assim como os demais problemas de todo o povo brasileiro, seja na esfera social, política, acadêmica ou mesmo jurídica.
O debate sobre a origem do racismo e preconceito com os negros é conturbado, remontando às razões econômicas e políticas de conquista e dominação dos povos. Ainda assim, atualmente verifica-se que a questão racial de discriminação do indivíduo negro e seus descendentes é autônoma, possuindo características e justificativas próprias e específicas.
O Brasil foi o país moderno que contemplou a escravidão por maior período na história moderna, assumindo este regime por quase quatro séculos. Durante todo este período, o regime escravista e as particularidades da condição de colônia portuguesa foram fundamento para que ocorressem diversas atrocidades. Ainda hoje, a população negra é discriminada em todo o mundo ocidental, sofrendo os mais diversos tipos de ataques e atitudes repulsivas, como a marginalização e, não raro, a morte.
Em 1888, através da Lei Áurea, a escravidão foi extinta no território brasileiro, iniciando um novo período de discriminação e desrespeito humano, no qual o papel preponderante é do Estado e do Direito. As categorias de livre e liberto deixaram de existir e todos adquiriram cidadania brasileira plena, declara a Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1891.
Vê-se, pois, necessária a compreensão do Direito nas sociedades capitalistas, nas quais as classes dominantes e o aparelho estatal são responsáveis diretos pelo ordenamento jurídico, social e econômico. O Direito reflete para estes o seu adequando papel de regulador social, cujas normas e regras jurídicas são autoritárias e impostas, legitimando seu poder.
É neste contexto que se infere a indispensável reflexão acerca das ideologias racistas na formação e aplicação do Direito. O racismo deve ser percebido além do simples preconceito, mas em sua natureza institucional, para que seja possível compreender o tratamento jurídico às questões raciais.
Contata-se o Direito como assegurador dos privilégios dos detentores do poder político e econômico e como mantenedor dos privilégios raciais do branco em nossa sociedade. Ainda que não sejam positivadas normas específicas contra a população negra ou favorecendo exclusivamente a branca, são evidentes as medidas institucionais e a invisibilidade da condição de vida do negro para as esferas públicas. A marginalização e discriminação da população negra são constatadas e evidenciadas através de dados estatísticos que provam a orientação racista de todo o sistema estatal brasileiro.
2.1 O PENSAMENTO JURÍDICO E SUA INFLUÊNCIA NO ESTADO E NO DIREITO FRENTE ÀS RELAÇÕES RACIAIS
A discussão do Direito, do Estado e da Sociedade permite o fortalecimento da ideologia racista, uma vez que não inclui em seu debate as relações raciais, um forte aspecto da sociedade brasileira. Com isso, utiliza-se o Direito para suprimir os interesses de indivíduos e da coletividade com base exclusiva na caracterização racial, promovendo a repressão destes grupos.
O desenvolvimento da teoria e prática do Direito e das ações estatais desrespeitam a realidade racial do Brasil. Os princípios doutrinários de juristas norte-americanos e europeus são base para nosso Direito Positivo, preterindo aspectos importantes como as relações raciais. Percebe-se que em relação à questão racial há uma maior resistência, devido ao fato de ser extremamente liga a fatores morais. 
2.1.1 As Declarações de Direitos junto às Relações Raciais
A Declaração de Direitos teve como base os movimentos políticos ideológicos do século XVIII. Sua primeira publicação deu-se na Virgínia, EUA, por ocasião da Independência das 13 Colônias Norte-Americanas, em 1776. Contudo, aquela realmente marcou a história da humanidade foi publicada em 1789, por ocasião da Revolução Francesa.
Nesta Declaração são impostos direitos inalienáveis e naturais do homem, como a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão, garantindo aos homens sua igualdade em direitos.
Entre os movimentos que viabilizam a Declaração e a era das Constituições escritas, que firmam igualmente o Estado Moderno, o jusnaturalismo foi o de maior influência. A doutrina do direito natural, para a qual Locke e Rousseau muito contribuíram, assume direitos cuja legitimidade, eficácia e validade independem da vontade humana, sendo imprescindíveis e inerentes ao homem. Essa teoria que permitiu a Declaração de Direitos do Homem, no século XVIII, é traduzida e faz parte da cultura jurídico-filosófico-política de toda a humanidade. 
As críticas dos teóricos marxistas sobre os Direitos Humanos não atingem a validade destes direitos, mas os reafirmam, denunciando o caráter idealista das Declarações Burguesas que, sob as bandeiras de liberdade, igualdade e soberania popular, fazem a manutenção de seu poder político e econômico sobre as camadas populares desprovidas da mínima condição de vida, iludindo-as.
O positivismo jurídico foi outra corrente filosófica que, junto ao jusnaturalismo, reforçou a compreensão dos Direitos do Homem. Segundo seus teóricos, estes Direitos não seriam superiores às decisões e concepções do homem, mas estabelecidos na sociedade pelo Estado, que seria a entidade competente para tal. 
Com o seu advento no século XIX, o direito positivo é garantia maior das conquistas burguesas em suas revoluções, não entrando em choque absoluto com o jusnaturalismo. Nesta perspectiva estão os Direitos Humanos, que são defendidos pelos positivistas não enquanto regras acima da lei, mas efetivas porque validam-se nos Códigos e Constituições de todos os povos. 
Assim, os juristas e doutrinadores discutem os Direitos Humanos e a Declaração de Direitos enquanto instituto constitucional, sob fundamento quer jusnaturalista quer juspositivista, sendo estes direitos, por si só, suficientes para estabelecer nos indivíduos de dada sociedade a sua condição de cidadão e de vida condizente com suas necessidades. 
Alguns autores, entretanto, não reconhecem que estas garantias e liberdade declaradasnos séculos XVIII e XIX sejam suficientes, uma vez que sua implementação ainda não foi obtida, apesar do geral reconhecimento de que só o respeito de todas estas normas poderá conduzir a um “mundo de paz e de justiça social”.
É possível verificar ainda que, dada a ineficácia das normas da Declaração de Direitos, os países e Organizações Internacionais tem procurado firmar pactos e convenções reconhecendo que tais fatos derivam da dignidade inerente à pessoa humana e que não se pode criar o ideal humano de ser livre se não criar condições que permitam a cada pessoa gozar de seus direitos civis tanto quanto dos direitos econômicos, sociais e culturais.
No que diz respeito à questão racial, a doutrina jurídica ou a teoria constitucional, política ou do direito, tudo ignorou. Muitos juristas e doutrinadores tem se sensibilizado pelas condições de exploração da camada proletarizada da população, porém verificam apenas o fator econômico, desconsiderando o caráter racial relacionado à pobreza. O racismo e o preconceito racial sequer estão catalogados ainda.
A outra perspectiva do estudo dos direitos humanos é a socialista. Por esta perspectiva, o Direto é instrumento do Estado em prol dos interesses dos grupos dominantes dentro de dada sociedade, tomando a forma do tipo de estrutura econômica de cada sociedade. Sob uma ótica marxista, verifica-se que cada modo de produção (infraestrutura) da vida social produziu o sistema jurídico e a ideologia jurídica (superestrutura) correspondente.
Desta maneira, são socialistas os autores que discutem o direito considerando a parte econômica e política como parte deste estudo. Analisando mais profundamente a Declaração de Direitos, denunciam o caráter falso da democracia, liberdade e igualdade que está no interior das Declarações Burguesas.
O questionamento, nesta análise do Direito e das relações raciais, é: o Direito Natural considerou os Africanos e negros seus descendentes no resto do mundo quando se refere a “igualdade” e “liberdade”? Estas questões não foram respondidas pelos juristas e doutrinadores estudiosos do direito socialista ou críticos do direito capitalista. Entretanto, ao ser abordada essa nova orientação de estudo, abre-se a oportunidade para os questionamentos raciais ao lado dos econômicos.
A doutrina socialista, embora aparentemente passe a ideia de ser em razão de si própria antirracista, não apenas desconsiderou a questão racial, como em determinados momentos utilizou-se de pressupostos racistas para estabelecer seus ensinamentos. 
Atualmente, de forma tímida, os socialistas e marxistas têm procurado discutir a questão racial, porém permanece separada da questão da luta de classes. Neste sentido, fica inviável a alternativa de que a luta de classes é a questão maior e prioritária e que envolve a questão racial. Assim como o machismo, a discrepância nas relações raciais deve ser combatida simultaneamente à exploração capitalista.
Insistimos, a discussão dessa corrente do pensamento jurídico tem em vista, quase ou exclusivamente o indivíduo oprimido pelo capital, pelas condições político-econômicas de determinado Estado.
2.1.2 A Formação do Pensamento Jurídico Brasileiro e as Relações Raciais
A formação do pensamento jurídico brasileiro, ainda que de forma iniciante, deu-se no século XIX, período de grandes discussões em torno da liberdade, igualdade, propriedade.
Na segunda metade do século XIX, após 1850, é que os intelectuais brasileiros voltaram-se para a nação brasileira e discutem, destacando-se nomes que influenciarão a doutrina jurídica no Brasil.
Em razão da importância do trabalho, interessam somente os juristas ou pensadores que influenciaram a doutrina jurídica brasileira na área do direito público, em especial a Teoria do Estado, Direito Constitucional e Teoria do Direito.
Cita-se Nelson Saldanha. Outro destaque na discussão da ordem jurídica nascente foi Zacarias Góes e Vasconcelos.
Tobias Barreto, professor negro da Faculdade de Direito do Recife, grande expoente na formação do pensamento jurídico brasileiro, foi ferrenho defensor do positivismo jurídico e seguidor do dawinismo social. 
Os estudos destes intelectuais evidenciam que a grande discussão jurídica no Brasil, em fins do século XIX, centrava-se no constitucionalismo e, entre as reivindicações desse movimento na fase da discussão da República, estava a democracia, por muitos identificada com o conceito em si de República. Este debate coincidiu com o abolicionismo, o qual também era nitidamente positivista.
O mesmo entendimento tem Skidmore, enfatizando que, ao lado da corrente positivista, o evolucionismo e o materialismo (quebra da ligação política/igreja), eram estudados intensamente. Tobias Barreto e Silvio Romero, no Recife, estavam à frente do movimento.
Destaca-se, ainda na década de 90 dos anos 1800, a figura de Rui Barbosa, o qual foi o autor doutrinário de nossa primeira Constituição Republicana embora tenha se desencantado no decorrer do tempo com as instituições, fazendo sérias críticas ao sistema.
José Afonso da Silva busca, entre outros autores, Oliveira Vianna, para fundamentar a sua discussão sobre evolução político-constitucional do Brasil. Com a Independência era necessário que houvesse uma unidade nacional, a qual só seria alcançada com a instituição de uma Constituição escrita, assegurada por uma declaração constitucional dos direitos do homem.
A luta dos liberais pela autonomia regional e descentralização do poder faz surgir o federalismo no âmago da Constituinte de 1823, que permanece em todo o Império, provocando rebeliões como a Balaiada, Cabanada, Sabinada, República do Piratini.
Fica evidente que muitas das revoltas do povo brasileiro contra o poder estatal eram rebeliões de negros e índios contra a escravidão, a miséria, os abusos das autoridades e a situação de marginalidade em que viviam. A omissão desse dado constitui racismo institucional e cultural por que, por desconsiderar a participação ativa e de liderança de negros e índios, induz a perpetuação do estereótipo de que estas populações são apáticas.
A luta pela abolição da escravatura, República e levantes democráticos eram igualmente relações de conflito racial. Os autores, entretanto, não evidenciam a realidade cor/raça no âmago desses conflitos.
O desenvolvimento posterior do pensamento jurídico nacional e o desenvolvimento da doutrina jurídica no Brasil, além da grande ênfase positivista, utilizou-se também das correntes jusnaturalistas. Estes impõem limites ao direito positivo que são aqueles do direito natural. Entretanto, como podemos definir o que é “natural” ou da “natureza humana”? 
Verificando-se este esboço de ideias, doutrinas e ideologias na formação do pensamento jurídico brasileiro no século XIX, fica clara sua ligação direta com a Europa e os Estados Unidos. Desta análise, evidencia-se a completa ausência de discussão racial do período, que segue para a atualidade. Ao mesmo tempo em que levantavam as bandeiras de liberdade, igualdade e fraternidade, estavam envolvidos diretamente com escravidão e abolicionismo. É justo dizer que a internalização da discriminação racial e sua institucionalização na esfera jurídica ocorre devido à total omissão.
De acordo com Dora Lucia de Lima Bertúlio (1989, p. 144):
A invisibilidade com que o negro, suas condições de vida, direitos, agressões, assassinatos sofridos na Brasil é visto por toda a sociedade, quer branca, quer negra, é o ponto nevrálgico das relações raciais neste país. O discurso do silêncio, da ignorância e da negação dos conflitos raciais internos é processado nas esferas públicas brasileiras com ênfase na organização das ações estatais e no Direito, em conformidade com o imaginário social racista de ser e pertencer a uma sociedade branca. 
Este imaginário social de ser branco é resultado da institucionalização da inferioridade do negro, corroborada pela absoluta ausência de história africana e desconhecimento geral da vida política, social e econômica dos diversos países do continente africano.Ainda hoje, como resultado as políticas de miscigenação, confirmadas pelos censos oficiais, há a divisão da população negra em mulatos (pardos) e negros, situação na qual os primeiros têm maiores chances de ascensão social, econômica e intelectual por estarem mais próximos do “padrão branco”.
Esta ilusão de “embraquecimento” camufla a realidade da diferença entre brancos e pardos, próxima que é a diferença entre brancos e negros.
2.2 O COTIDIANO DO DIREITO BRASILEIRO FACE ÀS RELAÇÕES RACIAIS
O sistema jurídico formado no Brasil, desde sua independência, buscou, como qualquer sistema jurídico burguês, preservar os valores das classes dominantes, utilizando-se de conceitos nobres e libertários da Europa e dos Estados Unidos da América.
A legislação imperial e posteriormente da República, no que se refere às relações entre brancos e negros, refletiram posições nitidamente racistas, seja por ação ou por omissão dentro de suas funções de instituição estatal.
Sobre este aspecto, considerando a utilização da legislação para perpetuação da cultura de submissão do povo negro, nos traz Nascimento (1984, p. 7 e 8, apud BERTÚLIO, 1989, p. 146):
[...] se julgar que somos iguais apenas porque assim define a Constituição das República; [...] Ele, (o racismo) é muito mais, ele é uma estrutura que tem o seu valor em si mesmo, uma estrutura de dominação e de exploração que está inserida em todo o tecido que forma isso que chamamos de cultura brasileira; é uma cultura racista, que tem ensinado às gerações de brasileiros a cultivar um supremacismo branco e a desprezar e humilhar aqueles que não pertençam à mesma origem racial. A criança negra, desde os seus primeiros dias, apreende em nossas escolas elementares a se auto-desprezar, a se auto-odiar, por causa da cor.
Numa breve análise da legislação imperial, é preciso compreender que o Estado brasileiro não passou por rompimentos fundamentais em sua estrutura política. A passagem do regime Monárquico para o Republicano deu-se sem que houvesse mudanças no bloco de poder, perpetuando a classe dominante na estrutura política e econômica. Da mesma maneira ocorre com a mudança do eixo econômico e produtivo escravista para o trabalho livre, no qual se conservou os espaços da burguesia agrária mesmo com o empoderamento da burguesia urbana, articulando-se a preservação do poder econômico e estatal que detinham.
Da mesma forma articula-se a estrutura jurídica no que diz respeito à população negra, dominada pela ideologia racista, para que seja possível criar efetivamente um país “próspero e branco”.
A omissão do Direito enquanto estruturador e ordenador das instituições do Estado brasileiro era compensado com legislação penal e postura de imigração no Império. Na República, o sistema repressivo do Direito cumpriu o papel de excluir os negros do convívio sócio-político e de definir a estrutura racista ao determinar-lhes espaços e direitos diferenciados da população branca.
O Estado e o Direito brasileiro agem para que as diferenças raciais hierarquizadas e segregadoras se perpetuem, beneficiando os brancos e marginalizando e explorando os negros.
Assim, o racismo brasileiro agiu de maneira “sutil”, porém de forma explicita, conforme afirma Carmichael (1987, p. 8, apud BERTÚLIO, 1989, p. 148):
Desde que estou no Brasil, têm me dito que o Brasil é verdadeiramente um país racista, mas seu racismo é sutil. Eu não vejo nenhum africano em posição política de poder; não vejo africanos em situação de poder econômico e vejo que eles não controlam nem vidas. Não vejo nenhuma sutileza nisto e sim um racismo, mais gritante do que nos Estados Unidos. Lá eles proclamam oficialmente que os africanos são 10% da população; no Brasil eles dizem que são 45% da população. Estamos falando em dados oficiais! Mas, qualquer um que saiba qualquer coisa sobre o capitalismo, sabe que ele não mente alguma parte do tempo: ele mente o tempo todo! Assim é possível para qualquer homem ou mulher pensante, compreender que uma população africano de 45% da população não faça parte das estruturas econômicas, políticas e sociais que ajudaram a construir. 
O racismo brasileiro aprisiona a quase totalidade da população negra brasileira em um submundo social, intelectual, político e econômico. Ainda que estampe o discurso jurídico que garante a todos igualdade, justiça e liberdade, é cumplice da discriminação racial individual e institucional. Sua estrutura reguladora, repressiva e judiciária, paradoxalmente cria formas de “proibir” atos de preconceito, mas implementa a impunidade dos agentes e destruição das vítimas (especialmente pela ação da polícia.
Ao negar a existência de conflitos raciais e segregação, a política jurídica, que define crimes e situações às quais os negros estão submetidos e a medida de punição para ações racistas, garante que os brancos (agentes) dificilmente sejam responsabilizados.
Os três poderes do Estado republicano editaram regras, e as editam ainda hoje, de forma a induzir a marginalização da população negra. Utilizam-se de princípios ideológicos de inferioridade racial do negro, e desta forma emanam o desejo de exclusão deste na formação da nação brasileira e de sua não participação ativa na vida da sociedade.
As políticas do Governo Federal pressupõe a igualdade de oportunidades e no tratamento dado a negros e brancos, perpetuando a má distribuição de riquezas e alimentando o desnível social e econômico entre os produtores e os proprietários, sendo uma maneira de implementar o poder do branco sobre o negro, inviabilizando neste o exercício pleno da cidadania. 
Um breve estudo das Constituições brasileiras é capaz de elucidar as relações entre brancos e negros no sistema jurídico brasileiro. É nas ações judiciárias que o racismo se instala com todas as pompas em nossa sociedade. Neste momento, as esperanças de convívio harmonioso caem por terra e surge a luta.
2.2.1 Constituições Brasileiras e Relações Raciais
Ao analisarmos os princípios iluminadores das Constituições brasileiras, contata-se que se baseiam principalmente naqueles elaborados e desenvolvidos por ocasião das Revoluções Francesa e Americana.
Relativamente à questão racial, as Constituições, tanto Imperial quanto as Republicanas, quer durante o escravismo ou após a abolição, foram adequadamente silenciosas no trato sobre as relações entre brancos e negros nas Américas pós-colonial e pós-escravista, assim como as Constituições inspiradoras das brasileiras, as quais não fazem referência algumas às relações raciais em seus respectivos países. 
A primeira Constituição Brasileira de 1824 do Império considerou cidadãos brasileiros os nascidos no Brasil, ainda que ingênuos ou libertos. É claro que o sistema escravista não admitiria a cidadania de um escravo.
Entretanto, no período, segundo decênio do século XIX, era grande o número de africanos que de alguma forma haviam deixado a condição de escravo e não foram contemplados com a cidadania constitucional e isto ocorreu em quase todo o período do Império, já que o tráfico foi efetivamente extinto apenas em 1850.
É importante ressaltar que a Constituição abriu para os portugueses a oportunidade de se tornar cidadãos brasileiros e ficou silenciosa quanto aos africanos. 
Quanto aos direitos políticos dos negros no Império, a Constituição estabeleceu o voto censitário para as eleições primárias, excluindo praticamente a totalidade dos “cidadãos” negros (incluindo mestiços) que, devido à realidade escravista não tinham renda para tal. A lei acrescentou ainda que, além de quem não possui renda suficiente, os libertos também não poderiam fazer seu voto. Fica determinado expressamente que não é somente a pobreza que exclui os negros de votar e ser votado para representante do Governo Imperial, mas o fato de ser negro.
A declaração de Direitos da Carta Imperial, entretanto, não fugiu à regra do discurso liberal, dando proteção absoluta a todo o cidadão brasileiro, abolindo todas as penas cruéis, inclusive as penas de açoite e torturas. Contudo, conformemencionado anteriormente, escravos não eram juridicamente considerados cidadãos. Desta forma, as penas cruéis não eram proibidas se aplicadas aos escravos.
Estas observações pretender explicitar o fato de que, ao lado das teorias racistas reproduzidas no Brasil no século XIX, o Estado Imperial através de sua legislação se encarregava de estabelecer os espaços permitidos aos negros. A vida política do Império não estava aberta, formalmente, àqueles que, embora fossem cidadãos não perderam a característica intrínseca de ser negro. Assim, escravidão, negritude e liberdade, estavam paradoxalmente ligadas. 
A primeira Constituição Republicana ocorre em 1891. Seguindo o exemplo das grandes nações, aboliu o trabalho escravo e incentivou o fluxo imigratório.
Extinto o trabalho escravo, estabeleceu-se a “igualdade de condição” entre os homens. Todos os nascidos no Brasil são cidadãos e, além destes, os estrangeiros aqui residentes foram compulsoriamente declarados cidadãos brasileiros – apenas não seriam se declarassem o desejo de permanecer com a nacionalidade de origem.
O texto constitucional traz de forma genérica o termo “estrangeiro”, não mencionando em momento algum os africanos. Neste sentido, verifica-se a generalização como forma de exclusão, pois, aliada à propaganda pró-imigração, à bandeira do branqueamento e o uso das teorias racistas pela intelectualidade, infere-se o termo “estrangeiro” como “europeu”.
Esta atitude de omissão do Estado brasileiro acerca das relações já conflituosas quanto ao negro contribuem para a fixação da imagem de a população negra ser desprovida de cidadania, importância e excluída das relações sócio-políticas.
Quanto os direitos políticos na Constituição de 1891, o voto é garantido aos maiores de 21 anos que se alistarem na forma da lei, excluídos os mendigos e os analfabetos. 
Dada a proximidade da abolição e considerando-se a forma como ocorreu a extinção do trabalho escravo, além do fato de que estes negros libertos foram substituídos pelos imigrantes, infere-se que a maior parte da população antes escravizada encontrava-se em situação de mendicância.
Além disso, é possível inferir que a situação de escravizado era, igualmente, de analfabeto. Apenas pouquíssimos libertos tiveram acesso ao ensino, e em menor número ainda os escravos. Fica claro que antes da abolição, o analfabetismo era quase total na população negra, como era extenso na população branca menos abastada. Novamente, a proibição foi mais contundente aos negros. Assim, camuflava-se o racismo, com discriminações ou diferenças atribuídas a outros fatores.
A Constituição de 1934 define de forma sucinta os detentores de cidadania brasileira, dentre eles os nascidos no Brasil, os filhos de brasileiros nascidos no exterior em missão diplomática e todos aqueles que adquiriram cidadania da forma da Constituição de 1891.
A Constituição de 1934 é inovadora ao incluir em seu texto que “não haverá privilégios, nem distinção por motivo de nascimento, sexo, raça, [...]". Trata-se da primeira constituição a incluir o termo raça de forma explicita.
A nova Constituição dos Estados Unidos do Brasil foi decretada em 1937. A aquisição da cidadania permanece nos moldes da constituição anterior. Quanto à igualdade jurídica, dispensa-se as referências explícitas a sexo, raça, crenças religiosas, ideias políticas, ficando somente o princípio básico de que “todos são iguais perante a lei”.
A Constituição de 1946 é vista pelos estudiosos como a constituição da redemocratização brasileira, representando a recuperação das instituições democráticas anuladas durante o período da ditadura Vargas.
Em relação aos direitos políticos, a proibição de votar e de ser votado permanece apenas aos analfabetos.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial o racismo contra os judeus, motivo principal da guerra, fora abominado internacionalmente, inserindo assim uma pauta sobre o racismo como uma discussão politica. 
Após algum tempo, já na década de 60, nos EUA e na África aconteceram movimentos para liberação dos povos negros, o primeiro em caráter civil assim atendendo medidas contra a discriminação racial. Nesse período acontecem grandes reformas nos três poderes, sendo eles o Executivo, Legislativo e Judiciário mantendo assim a imagem de país "próspero", "civilizado" e "democrático". 
A luta para libertação africana foi também uma luta racial entre brancos e negros, isso tudo interferindo aqui no Brasil fazendo com que os negros brasileiros se levantassem e começassem a questionar os seus direitos sociais e políticos.
Após o fechamento do partido Frente Negra Brasileira em 1937, o jornal Clarim da Alvorada (criador do partido Frente Negra Socialista) refez as suas atividades de contestação ao racismo juntamente com o Clube Negro de Cultura Social. No período de 1945 e 1948, que foi de muita atividade em prol da comunidade negra, o teatro experimental do negro funcionou nos anos 60 e 70, com grande expressão de lutas e movimentos sustentando a ideia de desarticulação e superação do racismo.
O grande golpe militar de 1964 repreendeu e imobilizou as lideranças, não só as negras, mas também todos os outros grupos que contestavam a situação que o país estava vivendo, fazendo com que esses grupos se tornassem parcial ou totalmente ilegais.
Este tipo de atividade era configurava “propaganda ou movimentos racistas e de classe” e que foram proibidas pelo Ato Institucional. Posteriormente, a Lei de Segurança Nacional tipificou com penas de reclusão de 10 a 20 anos o ato de “incitar ao ódio ou à discriminação racial”. Neste sentido, cabe sublinhar que qualquer manifestação negra que reivindicasse direitos, assim como outros movimentos sociais e dos sindicatos, eram ameaças à Segurança Nacional e tornaram-se ilegais.
Em 1988 foi o comemorado os cem anos da abolição da escravatura, mas os racistas não deixam de comemorar todos os anos em que os negros eram separados e diminuídos pelos brancos. Ainda hoje, os negros continuam sofrendo preconceitos nas Universidades, nas igrejas e na imprensa.
A Constituição de 1967 foi feita sob uma forma de governo autoritária e ilegítima, não foi inovadora quanto à obtenção de cidadania e dos direitos políticos repetindo a de 1946, esta na declaração dos direitos, a mesma ideia da constituição de 1931. “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicção políticas. O preconceito de raças será punido pela lei.”
Nos demais itens relativos à cidadania e direitos políticos, não houve alterações, continuando, pois, a proibição ao analfabeto para votar. Na Ordem Econômica e Social, uma inclusão da categoria “raça” na isonomia de direitos aos trabalhadores.
A Constituição de 1988, atualmente vigente, após muita pressão de toda comunidade negra organizada e da sociedade em geral, contemplou um dispositivo criminalizando a discriminação racial em seu Art. 5º, inciso XLII: “A prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”.
Outros dispositivos assegurados entre os Direitos Individuais e Coletivos, mesmo que de forma genérica, estão próximos de serem específicos para a população negra quando cita a liberdade e inviolabilidade de crença e de seus locais de culto e liturgia, além da prática da ação judiciária e policial, uma vez que os negros são vítimas preferenciais de seu descumprimento. Além disso, o mesmo se pode dizer sobre a criminalização da tortura e das garantias contra prisão arbitrárias.
3 ANÁLISE SOCIOLOGICA-JURÍDICA
Racismo consiste no preconceito e discriminação pautados em percepções sociais baseadas nas diferenças biológicas entre os povos, indicando classificações de superioridade ou inferioridade com base em características de determinada “raça”. 
Ao analisarmos o racismo e a discriminação através de um viés jurídico, é possível perceber que se trata de um conflito subjugado e esquecido durante muitos séculos. Apenas recentemente foram criados dispositivos constitucionais queobjetivassem a proteção dos negros em nossa sociedade, buscando garantir a igualdade a todos os cidadãos.
De acordo com Ehrlich (1922 apud Sabadell, 2010, p. 53), os trabalhos da sociologia jurídica partem do pressuposto de que o direito é um fato social (uma função da sociedade). Assim, a criação, evolução e aplicação do direito manifestam-se como parte da realidade observável, podendo ser explicados por meio da análise de fatores, interesses e das forças sociais.
A construção social brasileira, analisada através da História do Brasil e das influências externas à criação de nossa legislação, evidencia um caráter racista institucional e demonstra as diversas formas pelas quais se tenta afastar o negro das decisões e da participação efetiva na sociedade.
Neste sentido, para que seja possível compreender o aspecto jurídico brasileiro quanto às relações raciais, é necessário verificar os fatos sociais utilizando-se de ferramentas além do direito positivado. De acordo com Sabadell (2010, p. 61):
Campos de pesquisa jurídica diferentes da dogmática, como a filosofia, a história a psicologia e a sociologia jurídica, integram, sem dúvida, o direito e trazem importantes contribuições de outras áreas das ciências humanas. [...] Estas permitem analisar o elo entre o direito positivo e a realidade social. Como pode existir um direito sem fundamento, sem ideal de justiça, sem que se mantenha um vínculo real com a sociedade?
Conforme o observado por Hasenbalg (1979 apud Santos, 2005, p. 21), é evidente que a abolição da escravatura no Brasil não livrou os ex-escravos e afro-brasileiros da discriminação racial e suas consequências, como miséria e exclusão social. Esta opressão contra os negros tornou-se fator determinante do destino econômico, político, social e cultural dos afro-brasileiros.
Considerando as especificidades do Brasil, que é o segundo país do mundo com o maior contingente populacional de afro-descendentes (perdendo apenas para a Nigéria) e enfatizando que foi o último país do ocidente a abolir a escravidão, é de extrema importância e emergência a adoção de medidas capazes de romper com o legado de exclusão étnico-racial em nosso país (PIOVESAN, 2007).
Analisando o direito como um reflexo dos movimentos sociais e um fenômeno vivo, conforme teoria exposta por Ehrlich, deve-se buscar a compreensão dos fatos como um olhar atento além do código, sendo fonte de conhecimento a observação da vida, dos costumes, da moral e da conduta. O Direito Vivo acontece a cada momento, além das proposições jurídicas. Assim, a construção de um Direito que proteja e assegure à população negra direitos básicos e que, em teoria, são assegurados a todos os homens, é uma tarefa essencial e torna-se cada vez mais evidente para a construção da justiça em nossa sociedade.
O Movimento Negro segue buscando e pressionando os poderes governamentais com força legítima para exigir a estruturação de um sistema igualitário. Segundo Piovesan (2007, p. 43), é importante observar:
A implementação do direito à igualdade é tarefa fundamental a qualquer projeto democrático, já que em última análise a democracia significa a igualdade – a igualdade no exercício dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. A busca democrática requer fundamentalmente o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos elementares.
Pouco a pouco a pressão antirracista dos movimentos sociais negros traz o reconhecimento da necessidade de reformular determinadas normas que disseminavam preconceito e discriminação racial e adotar dispositivos concretos de combate à elevada desigualdade racial no país. Exemplifica-se o inciso XLII do artigo 5º da Constituição Federal, que foi incluso após muita luta do Movimento Negro, com força especial durante Assembleia Nacional Constituinte.
Após a promulgação da Constituição de 1988, outros dispositivos e leis foram criados para proteção e inclusão social da população negra, como a Lei 10.639 de 2003 e a Lei 11.645 de 2008 (estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”). Além delas, é possível citar a Lei de Cotas no Ensino Superior e o Estatuto da Igualdade Racial.
Resultado da luta empreendida pelo movimento negro, há décadas assiste-se a uma mudança de postura, em vários segmentos da sociedade brasileira, em relação ao tratamento conferido às questões da população negra no país (SILVÉRIO, 2002; HERINGUER, 2001 apud DOMINGUES, 2005, p. 1).
Com objetivo de reverter o quadro de injustiças e desigualdades raciais, sob o aspecto conjuntural, percebe-se necessário um amplo programa de ações afirmativas. De acordo com o Portal Étnico-Racial do Governo Federal, estas ações afirmativas tratam-se de um conjunto de medidas especiais voltadas a grupos discriminados e vitimados pela exclusão social ocorridos no passado ou no presente, objetivando eliminar as desigualdades e segregações, de forma que não se mantenham grupos elitizados e grupos marginalizados na sociedade. Assim, busca-se uma composição diversificada na qual não haja o predomínio de raças, etnias, religiões, gênero, entre outros.
No Brasil, foram implantadas diversas ações afirmativas. Podemos citar o aumento da participação dos grupos discriminados em determinadas áreas de acesso ao emprego, a concessão de bolsas de estudo, prioridade em empréstimos e contratos públicos, distribuição de terras e moradias, além das medidas de acesso à educação por meio das cotas, beneficiando a população negra e outros grupos sociais que por tanto tempo foram desprezados, como os indígenas.
Mesmo havendo uma relativa melhora e maior preocupação com os direitos da população afro-brasileira, ainda estamos distantes da verdadeira equidade no tratamento entre os cidadãos. Conforme Piovesan (2007, p. 43):
A implementação do direito à igualdade é tarefa fundamental à qualquer projeto democrático, já que em última análise a democracia significa a igualdade – a igualdade no exercício dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. A busca democrática requer fundamentalmente o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos elementares.
Desta maneira, a implementação de ações afirmativas em nossa sociedade é um passo inicial em direção à igualdade material dos indivíduos. Um longo processo de evolução é necessário e não se pode permitir que os conflitos raciais continuem sendo omitidos e negados. O Estado, como garantidor dos direitos inerentes à pessoa humana, tem a incumbência de realizar políticas públicas que possibilitem o acesso à educação, à saúde, à cultura e, finalmente, à dignidade a todos os brasileiros, independentemente da cor de sua pele.
 4 CONCLUSÃO
Ao longo do processo histórico, os negros foram vítimas de inúmeras atrocidades, com seus direitos mais básicos sendo negados. O processo de formação jurídica brasileira evidencia os aspectos de omissão e negação de tal realidade, uma vez que desconsidera em diversos aspectos o caráter dos conflitos raciais.
O racismo é um fenômeno institucionalizado no Brasil, discriminando e segregando determinados cidadãos em razão da cor de sua pele. Baseada na preconceituosa ideia de superioridade de certas “raças” justifica-se o fato de que certos indivíduos estão fadados à marginalização social, ignorando a segregação que está impregnada na sociedade brasileira e que surge nas mais diversas situações.
A proposta de intensificação da análise crítica do racismo tem como objetivo identificar este fenômeno na sociedade e buscar meios de desconstruí-lo. Os séculos de opressão contra negros e indígenas não podem ser apagados, mas é necessário buscar a melhora social e possibilitar àqueles que tanto sofreram um presente e um futuro melhores.
Atualmente, existem políticas públicas e ações afirmativas, como a política de cotas e a maior atenção ao cumprimento de normas que inibem e punem o racismo, que são uma forma de compensar as barbáriesque ocorreram no passado. Assim, cabe ao Estado o dever de respeitar, proteger e proporcionar condições básicas a todos os cidadãos, independentemente de sua cor ou raça, garantindo o exercício dos direitos fundamentais.
Por fim, observa-se que, para garantir a dignidade da pessoa humana, é preciso basear o sistema jurídico em princípios como a liberdade, igualdade material, solidariedade, sem esquecer a ligação intrínseca que existe entre estes e os Direitos Humanos.
REFERÊNCIAS
BENTO, Maria Aparecida Silva. Branquitude e Poder: A questão das cotas para negros. Ações Afirmativas e Combate ao Racismo nas Américas. Brasília, 2007. Disponível em: <http://etnicoracial.mec.gov.br/images/pdf/publicacoes/acoes_afirm_combate_racismo_americas.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2016.
BERTÚLIO, Dora Lúcia de Lima. Direito e Relações Raciais: Uma Introdução Crítica ao Racismo. Florianópolis, 1989. Disponível em: <http://docslide.com.br/documents/bertulio-dora-lucia-direito-e-relacoes-raciais-uma-introducao-critica.html >. Acesso em: 30 jun. 2016.
DOMINGUES, Petrônio. Ações afirmativas para negros no Brasil: o início de uma reparação histórica. São Paulo, 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n29/n29a13.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2016.
PIOVESAN, Flávia. Ações Afirmativas Sob a Perspectiva dos Direitos Humanos. Ações Afirmativas e Combate ao Racismo nas Américas. Brasília, 2007. Disponível em: <http://etnicoracial.mec.gov.br/images/pdf/publicacoes/acoes_afirm_combate_racismo_americas.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2016.
PORTAL ÉTNICO-RACIAL. Ações Afirmativas (Cotas/Prouni). Disponível em: <http://etnicoracial.mec.gov.br/acoes-afirmativas-cotas-prouni>. Acesso em: 30 jun. 2016.
SABADELL, Ana Lucia. Manual da Sociologia Jurídica: introdução a uma leitura externa do direito. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
SANTOS, Sales Augusto. A Lei nº 10.639/03 como Fruto da Luta Anti-Racista do Movimento Negro. Educação Anti-Racista: Caminhos Abertos pela Lei Federal nº 10.639/03. Brasília, 2005. Disponível em: <http://etnicoracial.mec.gov.br/images/pdf/publicacoes/educacao_antiracista.pdf>. Acesso em: 30 jun. 2016.

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