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Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, Recife, vol. 2, p.107-120, 2005. UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA NA PECUÁRIA LEITEIRA DO SEMI-ÁRIDO MÁRIO DE ANDRADE LIRA1,2 MÉRCIA VIRGINIA FERREIRA DOS SANTOS1 MÁRCIO VIEIRA DA CUNHA1 ALEXANDRE CARNEIRO LEÃO DE MELLO4 IDERVAL FARIAS2,3 DJALMA CORDEIRO DOS SANTOS3 1Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, Pernambuco. 2Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, Recife, Pernambuco. 3Empresa Pernambucana de Pesquisa Agropecuária, Recife, Pernambuco 4Universidade Federal de Alagoas, Rio Largo, Alagoas. _______________ RESUMO UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA NA PECUÁRIA LEITEIRA DO SEMI-ÁRIDO O objetivo deste trabalho é apresentar considerações sobre a utilização da palma forrageira (Opuntia e Nopalea) na pecuária do semi-árido nordestino, notadamente na bovinocultura leiteira. Estima-se existirem aproximadamente 500 mil ha cultivados com palma nesta região. Para a maior exploração do potencial de crescimento e da alta eficiência de uso d’água, faz-se necessário a utilização de variedades melhoradas e de práticas de manejo adequadas, merecendo destaque o controle do mato, o espaçamento e a fertilização. A palma apresenta composição química variável segundo a espécie, idade, época do ano e tratos culturais. Contudo, é sempre um alimento rico em carboidratos não fibrosos e pobres em proteínas e fibras caracterizando-a como um alimento energético. Assim, na alimentação de vacas leiteiras deve ser sempre fornecida associada a fontes de proteínas e de fibra. O cultivo da palma forrageira mostra tendências de evolução em área cultivada, adoção de melhores práticas agrícolas e utilização mais racional na alimentação animal, sendo grande parte desta evolução decorrente de um esforço concentrado de pesquisa do IPA e da UFRPE. Tal fato tem viabilizado o pequeno e médio produtor do semi-árido que se dedica à produção de leite. Termos para indexação: alimentação de bovinos, forragem. 108 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA... ABSTRACT FORAGE CACTUS UTILIZATION BY DAIRY CATTLE IN THE SEMIARID This paper aims to discuss forage cactus (Opuntia and Nopalea) utilization in the semi-arid Northeast, especially for dairy cattle. It is estimated that approximately 500 thousand ha are under forage cactus cultivation in the Northeast. It is necessary to utilize improved varieties and sound management practices such as weed control, spacing and fertilization to achieve growth potential and high water use efficiency. Forage cactus chemical composition varies with specie, age and cultivation practices. However, it has always high carbohydrates content, low fiber and low protein what is characteristic of an energetic feed. Taking into account chemical composition, it must be utilized always with a protein and a fiber source for the dairy cow feeding. Forage cactus cultivation is increasing in cultivated area, sound management practices and sound feeding practices due to IPA and UFRPE research. The fact is contributing to the viability of the small and medium size dairy farmer survival of the semiarid Northeast Index terms: cattle feed, forage. 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS O Nordeste brasileiro é a região semi-árida de maior densidade demográfica do mundo, onde vivem 20 milhões de pessoas (Virgínio Filho, 1996). A região Nordeste apresenta características bastante singulares em virtude de possuir mais de 50% de sua área territorial em região de clima semi-árido, condição que leva a ocorrência de secas periódicas. A seca, característica natural deste clima, compõe o principal elemento regional difundido nacionalmente através dos meios de comunicação. Ao longo da história, foram registradas grandes secas (Tabela 1) que assolaram as populações humana e animal nordestinas. Na seca entre 1875 e 1881, Dom Pedro Tabela 1. - Grandes secas ao longo da história do Nordeste Duração 1875 - 1881 1901 -1907 1915 1927 - 1933 1951 - 1958 109 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. M.A. LIRA et al. II comentou que venderia as pedras da coroa. Esta seca ocasionou a morte de 50% da população do Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco e da maior parte do rebanho bovino da região. Em épocas mais recentes, merece destaque a seca da década de 90 que assolou a maior parte do Nordeste, tendo atingido além do semi-árido, as áreas mais úmidas como a zona da mata e os brejos. Esta última seca foi tão severa como as demais, mas as conseqüências foram menos trágicas para os animais domésticos e para o homem, face a melhor infraestrutura disponível e, possivelmente, expressivas áreas cultivadas com a palma. Outro componente a ser levado em consideração seria a estrutura fundiária do semi-árido nordestino que é marcada pela predominância de propriedades de pequeno porte (Tabela 2), possivelmente pela alta densidade demográfica. Além disto, a pecuária do semi-árido possui outros entraves ao seu desenvolvimento, seja pela estacionalidade na produção de forragem, determinado pelo período seco do ano, seja pela falta de recursos do sertanejo. Araújo (1988) salienta que durante a época seca há visível deterioração da caatinga, que ao lado das deficientes práticas de manejo, quer das próprias pastagens, quer dos animais, concorre para baixos índices de natalidade, pequeno desenvolvimento dos animais em crescimento, baixa taxa de desfrute, bem como índices elevados de mortalidade. Tabela 2. - Sistema fundiário do Nordeste do Brasil Tamanho da propriedade (ha) % Entre 1-20 77,0 Menor que 100 94,3 De acordo com Lira et al. (1987), a pastagem nativa (caatinga) apresenta menor capacidade suporte do que as pastagens cultivadas no semi-árido. Sistemas alternativos de produção têm proporcionado aumento da lotação animal (Tabela 3). Tabela 3. - Sistemas alternativos de produção animal no semi-árido do Nordeste Sistema Lotação (ha/bovino) Pastagem nativa 10 - 20 Caatinga-Buffel-Leguminosa (CBL) 4 - 5 Pastagem nativa melhorada 1 - 2 Pastagem cultivada 1 - 2 Fonte: Adaptado de Lira et al. (2004). 110 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA... Considerando estes aspectos, a pequena propriedade tem que intensificar a produção para propiciar renda razoável ao produtor. No entanto, a intensificação na produção possui algumas limitações (Tabela 4). Tabela 4. - Limitações à intensificação produtiva no semi-árido do Nordeste Intensificação Limitação Irrigação Água, solo Cultivo de sequeiro Irregularidade de chuvas Pastagem melhorada Tamanho da propriedade, degradação, solo Fonte: Adaptado de Lira et al. (2004). Assim, o objetivo deste trabalho é apresentar considerações sobre a utilização da palma forrageira (Opuntia e Nopalea) na pecuária do semi-árido nordestino, notadamente na bovinocultura leiteira. 2. A PALMA E O AMBIENTE A fotossíntese é a propriedade das plantas de sintetizar matéria orgânica a partir da luz solar. Deste modo, quanto maior a fotossíntese, maior quantidade de alimento por unidade de área é produzido (Figura 1). Figura 1. — Fluxo de energia na produção animal. Quanto ao mecanismo fotossintético, as plantas podem ser classificadas como C3, C4, e CAM (Metabolismo Ácido das Crassuláceas). Plantas de mecanismos C3 e C4 abrem os estômatos para a absorção do CO2 durante o dia, enquanto que nas plantas CAM os estômatos são abertos à noite. Segundo Taiz & Zeiger (1998), as 111 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. M.A. LIRA et al. plantas CAM, ao abrirem os estômatos à noite reduzem a perda de água para o ambiente, ao mesmo tempo que permitem a entrada de CO2, que é armazenado temporariamente em ácido málico, e posteriormenteutilizado nas reações fotossintéticas do dia seguinte. A palma forrageira (Opuntia ficus-indica Mill e Nopalea cochellinifera Salm-Dyck) apresenta-se como uma alternativa para viabilizar a produção animal no semi-árido do Nordeste, devido a suas características morfofisiológicas, principalmente pelo mecanismo fotossintético CAM. Em decorrência, a palma apresenta eficiência de uso d’água até 11 vezes maior do que plantas de mecanismo C3 (Fisher & Turner, 1978), fazendo com que sua adaptação ao semi-árido seja superior a qualquer outra forrageira na região (Tabela 5). Segundo Flores Valdez & Gallegos Vasquez (1993), o Brasil possui a maior área cultivada de palma forrageira do mundo. Tabela 5. - Eficiência do uso d'água, conforme o mecanismo fotossintético Mecanismo fotossintético Eficiência de uso de água (kg água/kg de MS) C3 400 - 1000 C4 250 - 500 CAM 50 Fonte: Adaptado de Larcher (1986). Nos últimos anos a palma passou a ser cultivada em larga escala pelos criadores das bacias leiteiras do Nordeste, principalmente de Pernambuco e Alagoas. Estima- se existirem atualmente no Nordeste aproximadamente 500 mil ha cultivados, constituindo-se numa das principais forrageiras para o gado leiteiro na época seca. A palma apresenta composição química variável segundo a espécie, idade, época do ano e tratos culturais. De acordo com Ferreira (2004) é um alimento rico em carboidratos (81,12±5,9%), sobretudo carboidratos não-fibrosos (58,55±8,13%), caracterizando-a como alimento energético. Possui ainda baixo teor de matéria seca (11,69±2,56%), fibra em detergente neutro (26,79±5,07%) e proteína bruta (4,81±1,16%), sendo alto o teor de cinzas (12,04±4,7%). O melhoramento genético da palma forrageira associado à otimização no manejo da cultura pode promover um incremento considerável na produtividade dessa forrageira no Nordeste brasileiro. Pesquisas realizadas pelo Acordo IPA/UFRPE têm evidenciado este fato (Figura 2). Assim, em meados da década de 90, a palma apresentava produção média de 20 t de MS/ha/colheita (Santos et al., 1997), enquanto 112 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA... ao final desta mesma década, Santos et al. (2000) constataram produção de 40 t de MS/ha/colheita. Evidentemente, para a palma forrageira externar seu potencial de crescimento e alta eficiência de uso d’água têm que ser utilizadas práticas de manejo adequadas, merecendo destaque o controle do mato e a fertilização. Figura 2. — Evolução dos ganhos de produção de matéria verde de palma forrageira, nos trabalhos experimentais realizados pelo acordo. Na Tabela 6 simula-se a quantidade de água necessária para a produção de 20 t MS/ha/ano. Um dos princípios básicos é que o crescimento de uma planta é proporcional a evapotranspiração e a absorção de luz, sendo o último função da insolação disponível e do índice de área foliar (IAF) ou de cladódios, no caso da palma. Tabela 6. - Quantidade de chuvas necessária para atingir 20 t de MS/ha/ano, conforme os diferentes mecanismos fotossintéticos Mecanismo fotossintético Eficiência de uso de água (kg água/kg de MS) Quantidade de água requerida (t) Precipitação necessária (mm/ano) C3 600 12000 1200 C4 300 6000 600 CAM 50 1000 100 113 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. M.A. LIRA et al. A palma apresenta um baixo índice de área de cladódios (IAC) (Tabela 7), o que pode limitar o crescimento e favorecer a incidência de mato. Este baixo IAC pode ser parcialmente atenuado por uma maior densidade de plantas (Tabela 8) ou por colheitas menos freqüentes, com a conservação de maior número de cladódios (Farias et al., 2000). Tabela 7. - Índice de área de cladódios (IAC) de cultivares de palma e índice de área foliar (IAF) em espécies de gramíneas Forrageiras IAC1 IAF Palma Gigante 0,478 Palma Redonda 0,576 Palma Miúda 0,691 Palma clone IPA-20 0,730 Cynodon spp 3,8702 Brachiaria brizantha 6,1003 1Santos (1992); 2Fagundes (1999); 3Mello & Pedreira (2004). Tabela 8. - Influência da densidade de plantas no índice de área de cladódio na palma forrageira em municípios de Pernambuco Município Densidade de plantas (plantas/ha) Meses após o plantio 5.000 40.000 São Bento do Una 0,28 0,71 14 Serra Talhada 0,02 0,20 9 Sertânia 0,26 1,02 20 3. FUNDAMENTOS DE NUTRIÇÃO DE VACAS DE LEITE Conforme Cardoso (1988), apresenta-se os fundamentos (Tabelas 9 e 10) das exigências de energia e de proteína (N) da vaca de leite. Com base nessas informações, foram simuladas as exigências para vacas de 450 kg PV e três níveis de produtividade de leite (Tabelas 11, 12, 13 e 14). Exigência de Energia: Base do Sistema de Energia Metabolizável (EM) Energia de mantença = 8,3 + 0,091.PV (MJ/dia) Produção de leite = 5,31 kg de leite corrigido Ganho de peso = 34 MJ/kg 114 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA... Perda de peso = 28 MJ/kg Exigência para gestação (até 5o mês) = 5 MJ/dia Tabela 9. - Exigência energética da vaca de leite após cinco meses de gestação, em MJ/dia Peso vivo (kg) Mês de gestação 6 7 8 9 350 48 51 55 60 400 52 55 59 65 450 57 60 64 69 500 61 64 68 74 550 66 69 73 78 600 71 73 77 83 Consumo de matéria seca CMS = 0,025.PV + 0,1.Y, onde Y corresponde a produção de leite; Esta equação é válida para o período médio e final da lactação e rações com volumosos e concentrados, enquanto que nas primeiras seis semanas de lactação, o CMS é de dois a três quilos a menos. Exigência de proteína N degradável para microorganismos do rúmen (NDR), g/dia = 1,25.EM N suprido pelos microorganismos do rúmen (NMT), g/dia = 0,525.EM Tabela 10. - Quantidade de nitrogênio exigido pelos animais para perdas dermais e excreção, em g/dia Peso vivo (kg) NTm exigido1 350 9,2 400 10,3 500 11,1 600 11,9 1 Exigência de N dos tecidos para mantença. 115 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. M.A. LIRA et al. N exigido para produção de leite = 4,8.y Tabela 11. - Exigência de energia e consumo de matéria seca da vaca de leite (450 kg PV), conforme o nível de produção Item Nível de produção (kg de leite/dia) 51 102 153 Mantença (MJ) 49,25 49,25 49,25 Produção de leite (MJ) 26,55 53,10 79,65 Gestação (MJ) 10,00 5,00 0,00 Total (MJ) 85,80 107,35 128,90 Consumo (kg de MS/dia) 11,75 12,25 10,754 15kg - aos 7 meses de gestação; 210kg - 3 meses de gestação; 315kg - não prenhe; 4Início de lactação. Tabela 12. - Exigência de N degradável no rúmen da vaca de leite (450 kg PV), conforme o nível de produção, em g de N/dia Item Nível de produção (kg de leite/dia) 5 10 15 Degradação microorganismos (NDR) 107,25 134,19 161,12 Excreção e perdas (NTm) 11,00 11,00 11,00 Produção de leite 35,00 59,00 83,00 Total 153,25 204,19 255,12 Fornecido pelos microorganismos (NMT) 45,45 56,36 67,67 Requerimento 107,80 147,83 184,75 Tabela 13. - Exigência protéica diária da vaca de leite (g PDR/dia) e % de PDR da ração Item Nível de produção (kg de leite/dia) 5 10 15 Exigência 674 924 1155 % PDR na ração 5,8 7,54 10,7 Tabela 14. - Exigência de nutrientes diários, conforme a produção de leite Nutriente Nível de produção (kg de leite/dia) 5 10 15 Energia (MJ) 85,80 107,35 128,90 PDR (g) 674,00 924,00 1155,00 Consumo MS (kg) 11,75 12,75 10,75 116 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA... 4. PROPOSTA DE DIETA As composições estimadas da palma, palhada, farelo de soja e uréia (Cardoso, 1988; Santos et al., 1997; Ferreira, 2004) são apresentadas na Tabela 15. Levando em consideração osrequerimentos (Tabela 14) e a estimativa da composição dos alimentos (Tabela 15), foram elaboradas as Tabelas 16 e 17, que contêm a proposta Tabela 15. - Composição estimada dos alimentos Ingrediente % MS % na MS EM MJ/kg PDR %NDT PB Palma 10,00 64,00 5,00 11,00 1,801 Palhada 90,00 30,00 3,00 5,50 1,00 Farelo de soja 89,00 81,00 47,00 14,90 44,00 Uréia 100,00 - 275,00 - 275,00 1Admitindo degradação similar a do milho Tabela 16. - Ração para vacas de leite (450 kg PV) em três níveis de produção, em kg MS/dia Ingrediente Nível de produção (kg de leite/dia) 5 10 15 Palma 7,0 7,0 6,0 Palhada 4,5 4,5 4,0 Uréia 0,2 0,2 0,2 Farelo de soja - 0,5 1,0 Tabela 17. - Nutrientes da dieta Item Nível de produção (kg de leite/dia) 5 10 15 EM (MJ) PDR (g) EM (MJ) PDR (g) EM (MJ) PDR (g) Palma 82,6 126,0 82,6 126,0 708,0 108,0 Palhada 24,8 45,0 24,8 45,0 22,0 40,0 Uréia - 550,0 - 550,0 - 550,0 Farelo de soja - - 7,4 220,0 14,9 440,0 Total consumido 107,4 721,0 114,8 941,0 107,7 1138,0 Requerimento 85,8 674,0 107,3 924,0 128,9 1155,0 Ganho de peso (kg/vaca/dia) 0,675 0,234 -0,625 117 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. M.A. LIRA et al. de uma ração a base de palma e os nutrientes da mesma, respectivamente. Cumpre salientar que trabalhos em andamento conduzidos pelo Departamento de Zootecnia da UFRPE em parceria com o IPA, têm comprovado a proposta apresentada. Tem também se constatado que a palhada pode ser substituída por outra fonte de fibra, tais como bagaço de cana, feno de gramíneas, silagem de sorgo, sendo a utilização de cada um deles dependente do custo e disponibilidade. 5. ESTIMATIVAS DE CUSTOS E RECEITA Os custos dos ingredientes (junho/2005) são apresentados na Tabela 18, sendo o da palhada muito variável, conforme a origem e a distância da fonte. Em Pernambuco, por exemplo, o bagaço de cana custa em torno de R$ 30,00 por tonelada de MS na usina e R$ 90,00 por tonelada de MS no município de São Bento do Una (aproximadamente 200 km da região produtora). No custo da palma, a principal despesa é a mão de obra (Lira et al., 2004), sendo para seu cálculo admitido que os encargos sociais seriam pagos, o que nem sempre é verdade. Cumpre ressaltar ainda que as operações de colher, transportar, picar e fornecer a palma aos animais representam uma percentagem substancial da necessidade de mão de obra, podendo ser reduzida pela colheita a cada 16 dias (Santos et al., 1992), desde que os resultados do IPA/UFRPE evidenciam que a palma não modifica sua composição química quando armazenada a sombra durante este período, além de não afetar a produção de leite (Santos et al., 1998). Tabela 18. - Custo estimado dos ingredientes, em R$/kg de MS Ingredientes Custo Palma 0,20 Palhada 0,15 Uréia 2,00 Soja 0,80 O custo da ração apresentado na Tabela 19 foi elaborado levando em consideração as informações das Tabelas 16 e 18. Considerando que um sistema racional de produção de leite não pode comprometer mais de 70% da receita advinda da venda do leite com os custos de ração, a simulação realizada demonstra que a alimentação proposta só seria econômica para níveis de produção animal superior a 10 kg leite/ vaca/dia (Tabela 19). 118 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. UTILIZAÇÃO DA PALMA FORRAGEIRA... 6. PROPOSTA ALTERNATIVA Como visto no item anterior, as vacas de menor produção diária são anti- econômicas quando se utiliza uma ração a base de palma, enquanto que as de 15 ou mais kg de leite/dia perdem peso (Tabela 17). Assim, conforme o proposto na Tabela 20, a ração proposta se destinará a, aproximadamente, 36% do rebanho, sendo os demais animais alimentados com pasto, que tem um custo muito menor. Para isto, seria necessária a área de pastagem cultivada sugerida na Tabela 21, sendo ainda necessária uma área de reserva de palma para os períodos e anos de maior deficiência hídrica. Por outro lado, para as vacas de produção diária acima de 15 kg de leite, torna- se necessário a formulação de uma dieta alternativa com maiores níveis de concentrado, que não será apresentada, pois foge ao escopo do presente trabalho. Tabela 19. - Consolidação dos custos e receita da dieta Item Nível de produção (kg de leite/dia) 5 10 15 Ração (R$/vaca/dia) 2,48 2,83 3,00 Valor do leite1 (R$/vaca/dia) 2,00 4,00 6,00 % em ração 124 70,75 50 1Preço do leite admitido: R$0,40/kg. Tabela 20. - Distribuição do rebanho por categoria Categoria % Garrotas e novilhas 20 Vacas secas 24 Vacas em final de lactação1 20 Vacas meio/início de lactação2 36 15 kg leite/vaca/dia; 210-15 kg leite/vaca/dia Tabela 21. - Lotação animal em diferentes áreas para implantação de pastagens cultivadas e palma Áreas ha/animal Secas 1,50 Favoráveis não adubadas 1,00 Palma 0,25 119 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 2, p.107-120, 2005. M.A. LIRA et al. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS O cultivo da palma mostra tendência de evolução, em quantidade de área plantada, em adoção de melhores práticas agrícolas e na utilização racional na alimentação animal, sendo grande parte desta evolução decorrente de um esforço concentrado de pesquisa do IPA e da UFRPE, além de outras instituições de ensino e pesquisa. Tal fato tem viabilizado o pequeno e médio estabelecimento rural do semi-árido nordestino que se destina a produção de leite. 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAÚJO, A.B. 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