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AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 ABSORÇÃO DE GASES Os estômatos são pequenos poros localizados na epiderme das folhas, mas podem ser encontrados em frutos, flores e caules jovens de angiospermas, gimnospermas, pteridófitas e briófitas. Sua função está relacionada com o controle das trocas de vapor de água e de CO2 entre as plantas e a atmosfera. O mecanismo de abertura e fechamento dos estômatos está diretamente ligado aos processos de transpiração, fotossíntese e respiração, pois a intensidade desses processos depende, principalmente, do grau de abertura dos estômatos. Outro papel importante dos estômatos é o de termo-regulação, por causa do alto calor latente de vaporização. O alto calor latente de vaporização capacita à planta resfriar-se pela evaporação da água pelas folhas. Este poderoso efeito de resfriamento pode ser visto mesmo em temperatura mais baixas. Para cada grama de água evaporada a 15oC, a folha perde 2.462 J (energia calorífica). Muitos autores consideram que os estômatos apresentam um papel central na fisiologia das plantas, na sua evolução e ecologia. Morfologia, tamanho e distribuição A morfologia estomática, distribuição e comportamento respondem a um espectro de sinais, que vão desde o nível intracelular até mudanças climáticas. Estruturalmente os estômatos são constituídos por 2 células-guarda que delimitam o ostíolo, e abaixo destas ocorre a câmara subestomática. Células anexas ou subsidiárias podem ou não estar presentes.. Possuem cloroplastos, mas não possuem cutícula e nem plasmodesmata. A parede celular das células-guarda é espessada em pontos estratégicos. O tamanho dos estômatos varia de 10 a 80 µm e a densidade entre 5 e 1.000 por mm2 de epiderme. A densidade estomática está correlacionada com parâmetros ambientais tais como níveis de umidade, luz e concentrações de CO2. Há uma forte correlação entre tamanho e densidade, sendo que o tamanho do estômato e a sua densidade determinam a condutância máxima (gmax) nos sítios de evaporação da folha. Franks e Beerling (2009) demonstram que grandes AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 alterações no tamanho são necessariamente acompanhadas por alterações na densidade e nas concentrações de CO2 atmosférico, no tempo geológico (450-400 milhões de anos). Por exemplo, são encontradas no registro fóssil, altas densidades estomáticas de pequenos estômatos associadas com baixas concentrações atmosféricas, especialmente nas glaciações dos períodos Permiano, Carbonífero e Cenozóico. O padrão reverso tem sido encontrado em experimentos de enriquecimento da atmosfera com CO2. TIPOS Existem dois tipos principais de estômatos: o das gramíneas (e algumas palmeiras), que possuem as células-guarda em forma de halteres. Nestes as células subsidiárias estão sempre presentes. O segundo tipo é o das outras espécies, que possuem as células-guarda em forma de rim. Nestes as células subsidiárias freqüentemente estão ausentes. As folhas podem apresentar estômatos na face adaxial (epiestomáticas), somente na face abaxial (hipoestomáticas) ou em ambas as faces em igual densidade (anfiestomáticas) ou com densidade diferente (anisoestomática). A presença de estômatos e uma cutícula impermeável são consideradas características chave na evolução, especiação e avanço das plantas no ambiente terrestre, permitindo a elas habitar ambientes diversos e flutuantes, especialmente no suprimento hídrico. Os estômatos surgiram nas plantas terrestres há cerca de 400 milhões de anos atrás, na era Fanerozóica. Desde então têm mudado drasticamente em tamanho e densidade, acompanhando as alterações na concentração de CO2. Essas mudanças estão associadas também a emergência de novos grupos de plantas como samambaias, pteridospermas e angiospermas. Entre os exemplos, Hetherington e Woodward (2003) citam a especiação entre as Proteaceae na Austrália e o surgimento de estômatos em forma de halteres que apareceram nas Poaceae, durante a era Cenozóica, há 66 milhões de anos e resultaram das profundas mudanças climáticas globais. Nas Proteaceae podemos distinguir duas clades de espécies baseadas na distribuição dos estômatos. Nas Cryptostomata, os estômatos ocorrem em criptas AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 ou em pits, enquanto que nas Phanerostomata ocorrem na superfície, sendo esta a distribuição ancestral e está associada a climas mais úmidos, enquanto que a característica derivada (estômato em cripta) ocorre em climas mais secos e provavelmente divergiram da clade Phanerostomata há cerca de 55–35 m.a, quando o clima estava se tornando mais árido. Assim a localização dos estômatos permitiu a difusão e a sobrevivência das duas clades nos dois tipos de ambientes. Quando comparados com os estômatos de outras espécies, o das gramíneas apresentam maior eficiência, uma vez que pequenas alterações na turgescência das células-guarda e subsidiárias induzem a respostas mais rápidas de abertura e fechamento, além de um grau de abertura maior quando comparado com o outro tipo. Isto leva a um aumento na fotossíntese e na maior eficiência do uso de água, em relação às outras espécies. As gramíneas provavelmente originadas entre 55 e 70 milhões de anos nas florestas tropicais permaneceram relegadas, mas durante o processo de aumento de aridez global (entre 30-45 milhões de anos), elas experimentaram uma grande diversificação. Esta diversificação está estreitamente relacionada com a presença de estômatos em forma de alteres que permitiu a elas responder rapidamente a aumentos de luz nos ambientes abertos, mas com a capacidade de evitar o dessecamento. Esta difusão precedeu à diversificação dos animais pastadores e à origem da fotossíntese C4. Mecânica estomática: O controle mecânico da abertura estomática ocorre pela presença de microfibrilas de celulose, ou micelas, organizadas nas paredes celulares formando um arranjo radial a partir do centro do estômato. Este tipo de arranjo é denominado de miscelação radial. Quando as células-guarda absorvem água, elas incham e as paredes celulares do lado externo se expandem mais do que as internas, que ao serem “puxadas” neste movimento permitem a abertura do poro. AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 Controle da abertura estomática: O controle da abertura estomática por sinais ambientais depende de alterações coordenadas na turgescência das células-guarda (fluxo de íons e açúcares), organização do citoesqueleto, transporte via membrana e expressão gênica. O controle dos movimentos estomáticos é muito complexo e a melhor maneira de entende-lo é através de redes integradas em vários níveis. O primeiro nível é intracelular, que se interconecta com o nível ambiental, em uma escala local e temporal. Veremos a seguir como cada nó da rede funciona. Variação de turgescência: O aumento de turgescência é causado pela entrada de água em resposta a um gradiente de Ψa que se estabelece entre as células-guarda e as células adjacentes. A diminuição do Ψa dentro das células-guarda é causada pelo influxo de K+ nas células-guarda, além de Cl- ou outros ânions acompanhantes. Além disso, o aumento da concentração de sacarose também joga um papel importante nesse processo. Luz: A abertura estomática é controlada por vários fatores ambientais, sendo a luz um dos mais importantes. A resposta estomática à luz envolve dois aspectos centrais: os mecanismos osmoreguladores e o papel da H+ATPase ativada pela luz nos fluxos iônicos nas células-guarda. Há dois sistemas de fotorreceptores envolvidos nas respostas à luz. O primeiro componente é dependente da fotossíntese das células-guarda, cujo efeito é parcial e o outro é o componente não fotossintético, mediado pelaluz azul. AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 Luz azul: Um componente fundamental das respostas à luz azul é a extrusão de H+ para o apoplasto. A perda de prótons das células-guarda ocorre pela ativação das H+-ATPases, via cadeia redox na membrana plasmática, modulada pela luz azul (ver abaixo Via de Transdução do Sinal em resposta à luz azul). A perda de prótons contribui para hiperpolarização da membrana plasmática, que se torna mais negativa do lado interno. A hiperpolarização cria um gradiente elétrico que fornece a força motriz para entrada de K+, via ativação de canais seletivos de K+. O K+ entra em troca do H+ que sai da célula. Para haver troca iônica os H+ precisam estar disponíveis no citoplasma. Eles são fornecidos pelos ácidos orgânicos que são sintetizados nas células-guarda em resposta à redução de CO2 nos espaços intercelulares e câmara subestomática, quando a luz incide (fotossíntese). O amido é quebrado em PEP (fosfoenolpiruvato) em uma reação promovida pela luz azul. PEP + CO2 → OAA → MALH (Ácido málico) Os H+ do ácido málico deixam a célula e os K+ podem entrar. O MAL- é armazenado no vacúolo, juntamente com o K+ que está entrando. Neste processo há uma perda líquida de substâncias inativas (amido) e um aumento de substâncias osmoticamente ativas (ácidos orgânicos). 0 2 4 6 8 10 12 14 0 1 2 3 4 Tempo (h) Ab er tu ra es to m ét ica (m ) Seqüência1 Seqüência2 Luz vermelha Luz azul Taiz e Zeiger 2004 AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 O Cl- ou outros ânions podem entrar nas células-guarda como íons acompanhantes. As auxinas (importante classe de hormônios vegetais) estimulam a abertura de canais e transportadores de cloro, causando o seu influxo acompanhando o potássio. Via de Transdução do Sinal em Resposta à Luz Azul A zeaxantina (xantofila do grupo dos carotenóides, pertencentes aos terpenos) foi proposta por muitos autores como sendo o mediador da resposta estomática à luz azul (Taiz e Zeiger 2009). A luz azul é eficiente mesmo em baixa fluência de fótons, pois o espectro de ação para abertura estomática em folhas intactas e produção de malato em tiras de epiderme coincide com ao espectro de absorção da zeaxantina. O processo inicia-se com a transformação da violaxantina (inativa) em zeaxantina. A zeaxantina ao absorver luz azul sofre isomerização e uma mudança conformacional e desencadeia uma cascata de eventos que irão culminar na abertura estomáica. Entre os mensageiros secundários propostos nesta via podemos mencionar quinases, fosfatases, Ca+2, Calmodulina e IP3. Esta proposta é reforçada por vários experimentos que mostram que a sensibilidade dos estômatos à luz azul aumenta com o aumento do conteúdo de zeaxantina e a inibição da formação de zeaxantina inibe a abertura estomática, estimulada pela luz. Além disso, mutantes de Arabidopsis, npq1, para síntese de zeaxantina, não respondem a luz azul. A luz verde forte suprime a abertura estomática em Arabidopsis. AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 Como ainda não há completa confirmação da participação da zeaxantina, outros autores propõem a intermediação fototropinas, que são proteínas hidrofílicas associadas à membrana plasmática, com várias funções associadas a luz azul, entre elas a organização do citoesqueleto e abertura estomática. As fototropinas contêm dois cromóforos (LOV1 e LOV2), semelhantes a outras proteínas sinalizadoras que detectam a luz, oxigênio ou voltagem na região do N-terminal e um domínio clássico quinase serina/treonina na sua região C- terminal. Os cromóforos se ligam covalentemente à flavina mononucleotídeo (FMN). Essa mudança conformacional é ativada pela luz e ocorre na proximidade de uma cisteína e de um carbono (C4a) do FMN (Shimazaki et al. 2007). Taiz & Zeiger 2009 AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 O mecanismo para a ação das fototropinas ainda não está elucidado, apenas que elas mediam a abertura estomática através da ativação de uma H- ATPase da membrana plasmática por mecanismos desconhecidos. Em Vicia faba uma fosfatase tipo 1 (PP1) regula positivamente a sinalização entre a luz azul e a H-ATPase (Takemiya et al 2006). O espectro de absorção das fototropinas coincide com o espectro de ação da abertura estomática em folhas de trigo. Mas nos mutantes de Arabidopsis para as duas fototropinas, phot1 ou no mutante phot2, a folha continua transpirando em resposta à luz azul. Experimentos conduzidos com os mutantes para zeaxantina, npq1 e os mutantes para fototropina, phot1 e phot2 os estômatos abriram em resposta a luz azul mas quando o mutante duplo phot1 phot2 foi testado os estômatos não abriram em resposta à luz azul. Tiras de epiderme do mutante duplo não excluíram H+ em resposta à luz azul. Nesse mutante, as H-ATPases não sofreram alteração e a falha em abrir os estômatos deve-se a uma falha na cadeia de sinalização mediada pelas fototropinas. Além disso, o ABA inibe a fosforilação da membrana plasmática, suprimindo a abertura estomática. Luz vermelha: O papel da luz vermelha na abertura estomática correlaciona-se diretamente com a fotossíntese. Foi demonstrado que o inibidor da cadeia de transporte eletrônico da fotossíntese DCMU (diclorofenildimetilureia) causa uma inibição parcial na abertura estomática. A sacarose produzida nas células-guarda (além da sacarose vinda do mesofilo) torna-se um importante soluto osmoticamente ativo na abertura estomática especialmente no período vespertino. De acordo com Talbot & Zeiger (1998) este mecanismo deve estar associado com o acoplamento funcional da condutância estomática na epiderme a taxas de fotossíntese no mesofilo. Efeito de CO2 Os estômatos podem abrir no escuro, se for aplicado ar livre de CO2 permitindo sua difusão para os espaços intercelulares das folhas. Por outro lado, os estômatos fecham parcialmente se aumentarmos as concentrações de CO2, AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 tanto em luz como no escuro. Quando os estômatos estão completamente fechados, o que é raro, o ar livre de CO2 não tem nenhum efeito. Em suma os estômatos respondem aos níveis de CO2 intercelular, mas não às concentrações deste gás nas superfícies externas das folhas próximas ao ostíolo. Este mecanismo de controle é importante apenas para fluxos de luz muito baixos ou muito altos. Em condições normais a concentração de CO2 é pouco relevante. De fato o controle da abertura estomática também está envolvido com os teores de CO2, pois como já foi visto, os pigmentos receptores da luz azul a violaxantina só se converte em zeaxantina em concentrações baixas de CO2. Efeito da temperatura: Temperaturas altas (30o a 35oC) os estômatos fecham devido ao estresse de água ou ao aumento da respiração (↑CO2). Por outro lado algumas plantas abrem os estômatos nesta faixa de temperatura para remover o excesso de calor através do processo transpiratório. Efeito do ABA (ácido abscisíco): Quando a planta perde mais água por transpiração do que a sua capacidade de absorção via raízes, desenvolve-se um estresse hídrico. O ABA (importante hormônio vegetal) é produzido e transportado das raízes até as folhas e liberado nas células-guarda induz a saída de K+, aumentando o potencial osmótico das células-guarda e diminuindo o das subsidiárias ou de células epidérmicas adjacentes. Ocorre o fluxo de água para as células subsidiárias ou adjacentes, e como resultado os estômatos fecham. Aresposta ao ABA ocorre por duas vias: a) Dependente de Ca+2. Nesta via o ABA ativa canais do tonoplasto, que retiram Ca+2 do vacúolo, aumentando a sua concentração no citoplasma. Concentrações mais altas de Ca+2 no citoplasma inibem o funcionamento de canais de influxo de K+ e estimulam canais para o efluxo de K+. b) Independente de Ca+2. Nesta via a alcalinização (pH acima de 7,0) causa abertura de canais de efluxo de K+ do tonoplasto. Há extrusão de K+ para o citoplasma. Ao nível de membrana plasmática, os canais de efluxo de K+ causam AUTORA: Profª Dra Lourdes Isabel Velho do Amaral 2011 a sua retirada para o meio extracelular. Ao mesmo tempo, os canais de influxo de K+ são inibidos. LUZ BAIXO TEOR DE CO2 TEMPERATURA MODERADA ÁGUA SUFICIENTE ESTÔMATOS ESTÔMATOS FECHADOS ABERTOS ESCURO ALTO TEOR DE CO2 TEMPERATURA EXTREMA DEFICIÊNCIA DE ÁGUA pH 6-7: estômatos abertos pH 4-5: estômatos fechados Referências bibliográficas: Franks, P.J e Beerling, D.J. 2009. Maximum leaf conductance driven by CO2 effects on stomatal size and density over geologic time. PNAS, 106: 10343- 10347. Hetherington, A.M. e Woodward, F.I. 2003. The role of stomata in sensing and driving environmental change. Nature, 424: 901-908. Nobel, P.S. 2005. Physicochemical and environmental plant physiology. Academic Press, New York. Salisbury, F.B. e Ross, C. 1992. Plant physiology. 4a. ed. Wadsworth, Belmont. Shimazaki, K.; Doi, M.; Assmann, S.M. e Kinoshita, T. 2007. Light regulation of stomatal movement. Annu. Rev. Plant Biol. 2007. 58:219–47. Sutcliffe, J.F. 1980. As Plantas e a água. EPU/EDUSP, São Paulo. Taiz, L. e Zeiger, E. 2009. Fisiologia vegetal. 4ª ed. Artmed, Porto Alegre. Takemiya A.; Kinoshita, T.; Asanuma, M. e Shimazaki, K. 2006. Protein phosphatase 1 positively regulates stomatal opening in response to blue light in Vicia faba. PNAS, 103: 13549–13554. Talbott LD, Zeiger E (1998) The role of sucrose in guard cell osmoregulation. J Exp Bot 49: 329-337. Sutcliffe 1980
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