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CLONAGEM E A ÉTICA Fernanda Ferrarini G. C. Cecconello Ética é o resultado de uma reflexão filosófica racional, possibilitando ao homem se posicionar em relação a si próprio, permitindo-se apreender a sociedade na qual se insere. Na visão de Jean Bernard, “ética é a ciência que considera e pesquisa a garantia da harmonia resultante da boa conduta e de todo ato, ou seja, é o acordo entre a alma e o meio ambiente” (La Bioéthique, Paris, Flammarion, 1994, p. 26). A bioética procura estudar dilemas éticos associados à pesquisa biológica e seu emprego na medicina, assim como a clonagem, com repercussões no Direito. A ciência sempre estará mais avançada que as discussões éticas a seu respeito. Todos tivemos ciência da clonagem da ovelha “Dolly”, em 1997, feita por Ian Wilmut e sua equipe, e após seis meses da ovelha “Polly”, criada com genes humanos. Clonagem é a reprodução idêntica de um sistema ou estrutura, através de cópias de moléculas de DNA. É um caminho perigoso, por poder originar uma outra espécie na raça humana. Na tentativa de aumentar as possibilidades de fertilização “in vitro”, os cientistas clonaram embriões humanos em 1993, nos EUA. Pesquisadores sustentam ser possível reproduzir um indivíduo geneticamente idêntico ao seu doador. Mas ele teria características diferentes, pois não só o genótipo (carga genética herdada), mas também o fenótipo (interação dos genes da pessoa com o ambiente em que vive) influenciam na sua identidade. É bem verdade que os gêmeos univitelíneos são considerados clones pelos cientistas, visto serem formados exatamente a partir da mesma célula, originando duas células embrionárias idênticas. O problema reside não só na clonagem, mas na sua conjugação com a engenharia genética, ao modificar a identidade cromossômica de um ser. Dessa forma, poderiam ser criadas cópias de indivíduos e, conseqüentemente, raças em detrimento de outras. Esbarra-se no Direito, vez que contraria o princípio jurídico e ético da dignidade humana. O indivíduo deve ser pensado como um fim e não como um meio, como no caso da vida humana ser criada apenas para armazenar material terapêutico. Harold Varmus, diretor dos Institutos Nacionais de Saúde afirmou que a clonagem humana é má ciência e má ética. Para o ministro francês da Agricultura, Philippe Vasseur, a técnica escocesa pode criar monstros. O ministro alemão da pesquisa e ciência, Jürgen Rütgers, declarou que essa experiência deve ser proibida, pois “o homem é uma criação única que não pode ser manipulada”. Em 1997, o presidente da Argentina, Carlos Menem, coibiu, por decreto, clonagens em seres humanos. Na mesma data o governo do Japão anunciou que não irá subvencionar pesquisas científicas sobre clonagem humana. É fato que a clonagem também poderá trazer bons resultados, ao propor curas para determinadas moléstias. Por exemplo: clonar neurônios novos poderá colaborar na recuperação mental dos portadores do mal de Alzheimer; copiar células sadias da pele auxiliará quem sofre com queimaduras; ao copiar parte da medula espinhal, órgão que fabrica o sangue, a réplica da medula introduzida no paciente poderá purificar a circulação, exterminando o câncer. Os teólogos, em geral, não concordam. A Igreja Católica pediu, em 1997, que essa prática fosse proibida, tal como no Brasil. Aqui, a Lei nº 8974 de 05.01.1995 e o Decreto nº 2577 de 30.04.1998 consideram crime, tendo uma pena variável de três meses até um ano de prisão, qualquer manipulação genética de células germinais humanas, qualquer intervenção em material genético humano “in vivo”, exceto para tratamento de defeitos genéticos, conforme os princípios éticos. Entretanto, a clonagem humana é um fato inevitável. Foi anunciado o primeiro clone, nascido em 26.12.2002, embora sem comprovação científica, até agora. Espera-se um teste de DNA para provar se a filha é cópia da mãe. Ele foi gerado pela ‘Clonaid’, uma empresa surgida em 1997, a partir da seita religiosa dos raelianos, dos EUA, que acreditam no surgimento da vida humana como obra de Ets. O processo foi idêntico ao da ovelha Dolly: produziu-se uma réplica a partir de uma célula materna. Parece lembrar os nazistas, que buscavam criar uma raça soberana e pura. Haverão muitos riscos, pois pode-se clonar os genes de alguém, mas não sua história de vida, seus princípios éticos, sua moral e dignidade. A pessoa humana não pode ser reduzida a um instrumento ou a um objeto. Tudo deve ser analisado à luz do Direito, da ética compatível com a dignidade humana. A pesquisa científica deve ser incentivada, mas é preciso adotar limites, coibir determinados abusos. Deve-se buscar o equilíbrio, ponderando-se o progresso científico com os malefícios prováveis.
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