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--------.~-~-~----------- ----·-----~---------------------'"~~ César Castro HISTÓRIA DA BIBLIOTECONOMIA BRASILEIRA Copyright © 2000 by - César Castro Foto da capa: Concludentes do Curso de Biblioteconomia da Escola Livre de Sociologia e Política- 1945 (No centro, Prof. Adelpha de Figueiredo) Foto: Arquivo particular da Bibliotecária Laura Russo Revisão: Autor Editoração eletrônica e capa: fesiel Sales Pontes ISBN: 85-7062-239-2 C351Ú Castro, César História da biblioteconomia brasileira/ César Castro.- Brasília: Thesaurus, 2000. I. Biblioteconomia, Brasil I. Título CDU 02 (091) (81) CDD02 Todos os direitos em língua portuguesa no Brasil, reservados de acordo com a lei. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida de qualquer forma ou por <Iualquer meio, incluindo fotocópia, gravação ou informação computadorízada, sem permissão por escrito do autor. THESAURUS EDITORA. DE BRASÍLIA LTDA. SIG Quadra 08 Lote 2356 CEP 70610-400- Brasília-DF-Brasil. - TeL (61) 344-3738 - Fax, (61) 344- 2353. Composto e impresso no Brasil Printed in Brarji AGRADECIMENTOS Elaborar um trabalho desta natureza exige esforço e contribuição de inúmeras pessoas que, direta e indiretamente, escreveram comigo este texto. Agradeço aos professores Edson Nery da Fonseca, Laura Russo, Maria Antônia Pinke Belfort de Mattos, Esmeralda Aragão, Maria Helena de Toledo Barros, pelas sugestões, criticas e empréstimo de documentos. Aos companheiros de jornada cotidiana que fazem o Curso de Biblioteconomia da UFMA. Agradeço, em especial, à Prof'. Dta. Denice Catani, minha orientadora, que acreditou sempre neste trabalho e aos professores doutores Ezequiel Teodoro da Silva, Elze Benetti V álio, Marta Carvalho e Hagar Espanha pela sugestão de transformar a tese em livro. Aos amigos: Doris Godoi, Sarnuel Velázquez, Solange Ribeiro, Rildecy Medeiros, Nelson Nunes e Aldinar Bottentuit pelo apoio constante. Às bibliotecárias Tuca, Rita, Sônia, Lina e Rosa pela recuperação dos difíceis documentos raros. Dedico esta obra a Janethe Castro, minha irmã, por tudo. Dedico este livro a Nelly Cassaro (in memoriam) em agradecimento a nossa amizade, que é eterna. Dedico este livro, ainda, às três mulheres da minha vida: Luzia, Teresa e Violeta. A todos os bibliotecários e bibliotecárias que fizeram e fazem a História da Biblioteconomia brasileira, em especial, a: Adelpha de Figueiredo, Laura Russo, Rubens Borba de Moraes, Lydia Sambaquy, Bemadette Sinay Neves, Edson Nery da Fonseca, Esmeralda Aragão, EtelvinaLima, Cordelia Robalino, Miriam Gusmão, Abner Vicentini, Zila Mamede, Antônio Miranda, Luzimar Silva Ferreira e tantos outros. SUMÁRIO PREFÁCIO .................................................................................... 11 CAPITULO 1 OS LIMITES DO NOSSO OLHAR ............................................. 17 As dimensões educativas da Biblioteconomia no Brasil .... 21 As fontes e os discursos ......................................................... 31 CAPÍTULO 2 _, O MOVIMENTO FUNDADOR DAS DIMENSÕES DUCA- TIVAS DA BIBLIOTECONOMIA DO BRASIL ................... 43 A trajetória do Ensino de Biblioteconomia no Brasil: o caso da Biblioteca Nacional .............................................. 53 A trajetória do Ensino de Biblioteconomia no Brasil: o caso paulista ....................................................................... 62 A trajetória do Ensino de Biblioteconomia: anos 40 ......... 78 Cursos da Biblioteca Nacional: a reforma de 1962 ........... 97 A trajetória escolar entre Rio de janeiro e São Paulo .... 101 O Curso de Biblioteconomia da Praça da República ...... 106 A expansão do Ensino de Biblioteconomia pelo Brasil .. 109 CAPÍTULO 3 BIBLIOTECÁRIO: DO GENERALISTA AO SERVO DA CIÊNCIA ............................................................................... 115 Bibliotecário: "profissional ideal" a serviço da ciência .... 116 Bibliotecário: "SERVUS SERVORUM SCIENTAE" ........ 135 Bibliotecários em busca de identidade ................................... 142 CAPÍTULO 4 E O VERBO SE FEZ LEI: REGULAMENTAÇÃO DA PROFISSÃO BIBLIOTECÁRIA .......................................... 151 A trajetória para concretização do verbo ......................... 154 E o verbo fez-se lei .............................................................. 165 A FEBAB e o verbo ............................................................. 1 78 A burocratização do verbo ................................................. 185 "Deontologia e ética profissional" do bibliotecário ......... 189 ~'Í< CAPÍTULO CAMINHOS E DESCAMINHOS DO ENSINO DE BIBLIO- TECONOMIA: ANOS 50 E 60 ............................................ 197 Bibliotecário: técnico ou humanista? ................................ 199 A uniformidade dos saberes biblioteconômicos ······-······ 203 Padronização do ensino e dos saberes biblioteconômicos ... 215 Bibliotecários: em busca da especialização ....................... 241 A trajetória do IBBD: fragmentos ..................................... 242 CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................... 265 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ...................................... : ....... 271 PREl:<~CIO A presente obra de César Augusto Castro é definitiva tanto por reunir dados e informações (para muitos de nós, até então, nebulosos e fragmentados) sobre a evolução da Biblioteconomia no Brasil quanto por expor testemunhos e análises originais. Sem pretender ser exaustivo, tece a trajetória de nossa profissão segundo postulados científicos válidos. Uma profissão requer um conjunto de elementos míni- mos para consolidar-se: •um espaço na sociedade para desenvolver as suas atividades e exercer a sua função social. A obra de Castro é a revelação da busca de nossa ideo- logia profissional através das propostas e experiências de nos- sos pioneiros (cariocas e paulistas, como também os das de- mais regiões brasileiras, sem esquecer as contribuições dos estrangeiros no processo). As diversas fases, no espaço e no tempo, com as mu- danças de "missão" e de paradigmas expressam o afinamento 11 constantes com as transformações tecnológicas e com os no- vos valores de cada época. •um programa de pesquisa para ampliar os horizon- tes teóricos e técnicos que garantam o aperfeiçoa- mento profissional contínuo. Embora a questão ·da pesquisa só comece a institucionalizar-se a partir do advento dos programas de pós-graduação, o presente livro revela o esforço de nos- sas lideranças pela discussão dos grandes temas teóricos e pela experimentação de modelos, técnicas e processos, muitos deles importados, ma~;adaptados ãs condições nacionais. Prova disso, o IBBD impôs-se à sociedade bra- sileira de seu tempo justamente por estar sempre na van- guarda e pelos conhecimentos que desenvolveu institucionalmente. Em certa medida, antecipou-se ã pró- pria época, exercendo os postulados de Peter Senge (das "organizações que aprendem") ao constituir-se numa equi- pe de especialistas geradora de saberes e metodologias de amplo reconhecimento. •uma literatura própria, orientadora de sua base teó- rica e prática. Outra vez, a obra de Castro é reveladora do crescimen- to de nossa literatura especializada, não só pela vastidão das fontes consultadas mas, também, pelo historiai do surgimento de nossas revistas especializadas e dos congressos e seminári- os que incentivaram a referida produção técnico-científico. Sem esquecer a proliferação de dissertações, teses e livros dos anos mais recentes. 12 ---- --·---- ·-····· •um sistema de ensino capaz de transmitir os conheci- mentos necessários ao exercício profissional, em di- ferentes níveis de capacitação.Aqui é onde o trabalho de Castro é mais elucidativo, ao recriar todo o processo de criação de nossos cursos de Biblioteconomia, seus programas e conteúdos, suas filosofias e orientações pedagógicas. Embora já tivéssemos anteceden- tes notáveis de esforço no levantamento do ensino profissio- nal - como os textos de Nice Figueiredo e Suzana Mueller, arrolados na bibliografia- as citações e comentários aqui in- cluídos ampliam o nosso conhecimento sobre o fenômeno em questão. •uma legislação que garanta os direitos dos usuários e preserve as conquistas dos profissionais da área. A questão está devidamente registrada, em suas postulações legalistas, culminando na promulgação da lei de exercício profissional e na criação de nossos conselhos fede- ral e estaduais, a exemplo de outras carreiras universitárias. Mais recentemente com a conquista de um código de ética que, em princípio, também incorpora os deveres profissio- nais e os interesses dos usuários. Mas, também deixa perce- ber que a questão social está ainda mais em nível retórico, com a classe bibliotecária pouco participativa nas lutas pela democracia nos períodos ditatoriais. Na pauta de nosso corporativismo aparecem mais as questões técnicas, as admi- nistrativas, as legais, e raramente, o engajamento com os gran- des movimentos sociais que lutaram pela universalização do ensino, contra a censura à imprensa e às artes em geral, pela defesa da cultura nacional e outras bandeiras que, todos nós 13 sabemos, afetam o nosso desempenho e comprometem os nosso objetivos profissionais. Sem deixar de reconhecer que, como indivíduos, muitos de nossos líderes foram combativos e esclarecidos, o fato é que o livro de Castro passa ao longo destas problemáticas. · E é sintomático reconhecer que a profissão do biblio- tecário foi um dos espaços mais concretos para a ocupação das mulheres, em seu processo emancipatório, ao ponto de que, ainda hoje, algumas pessoas pensem ser uma profissão feminina. E as mulheres foram decisivas na evolução da profissão, a julgar pelas grandes lideranças femininas (ape- sar de sempre termos contado com extraordinárias lideran- ças masculinas como Rubens Borba de Moraes Antonio . , Caetano Dias e Edson Nery da FÓnseca, dentre outros). A própria história do IBBD é um espelho disso. Na fase evolucionária (nos 20 primeiros anos, a partir de sua funda- ção em 1954), tivemos o concurso do talento de mulheres extraordinárias como Lydia de Queiroz Sambaquy, Célia Ribeiro Zaher e Hagar Espanha Gomes. Com a transfor- mação em IBICT, em meados da década de 70, sucederam- se os administradores do sexo masculino, recrutados dentre cientistas e assessores de outras áreas, sem maiores exponencialidades (exceção para Afrânio Aguiar, que tinha pós-graduação em Ciência da Informação). Depois tive- mos uma terceira fase, que chega aos nossos dias, em que homens e mulheres, de reconhecida capacitação profissio- nal na área, vem alternando-se no poder. As transformações do IBBD- que partiu da proposta de montar o controle bibliográfico nacional em C&T e de de- senvolver a massa crítica e a infra-estrutura para facilitar a pesquisa, o ensino e a administração superior no Brasil-, pas- sando pela fase do IBICT- que partiu para a montagem e a coordenação de sistemas e serviços de informação especializa- 14 da no nosso país, é o reflexo da evolução da Biblioteconomia e da Ciência da Informação no Brasil e no Mundo. Por certo, foram as mentes mais iluminadas do "velho" (e tão vanguardista) IBBD que "importou" e introduziu a Ci- ência da Informação no Brasil, e sem entrar em disputas bizantinas praticadas em outras latitudes. E deu início aos nossos cursos de pós-graduação, às revistas científicas da área, à operacionalização dos serviços cooperativos e descentrali- zados, à visão interdisciplinar e sistêmica de que todos somos hoje beneficiários. Hoje o IBICT está outra vez em crise, não por culpa de seus dirigentes, mais pelas inquietações provocadas pelo ad- vento massivo das novas tecnologias e pela globalização pró- pria da indústria da informação transnacionalizada dos dias que vivemos. E estão em crise a Biblioteconomia e a Ciência da Infor- mação, como um todo, por causa do impacto da telemática em nossos processos, como acontece em outras profissões. Os cursos de pós-graduação, quase todos, mudaram sua de- nominação de Biblioteconomia para Ciência da Informação (seguindo o movimento criado pelo próprio IBBD), com a incorporação da C.I. nos currículos profissionais, com forte e crescente ênfase nos processos informatizados. Ao mesmo tempo em que se pretende abrir novos cursos, com novas e ousadas denominações, como já vem acontecendo. O IBICT certamente acabará assumindo de direito, por- quanto já preparando-se e assumindo de fato, a liderança na instalação de nossa "Sociedade da Informação" ou do conhe- cimento, como querem outros. E é bom verificar que, ao lado da proposta estruturante projetada pelos especialistas do Ministério da Ciência e Tecnologia (Carlos José Pereira de Lucena, Ivan Moura Cam- pos e Silvio Lemos Meira), que refletem as tendências inter- 15 nacionais do setor, que prioriza e privilegia os segmentos so- ciais e produtivos nacionais, esta também é a reflexão de Anna da Soledade Vieira alertando para o fato de que não basta o canal da RNP ou da Internet II, que é preciso fortalecer e desenvolver os nossos conteúdos substantivos, direcionados para serviços mais contextualizados, mais eficientes e transcedentes. É fantástico, pois, perceber no livro de César Augusto Castro as sementes e a germinação de todo esse processo institucionalizante. O relato histórico interpretativo ganha força e relevo pela voz dos protagonistas, sem jamais perder-se em detalhes ou em maçantes descrições*. O texto flui com leveza decque nos exige Ítalo Calvino, sem perder outras condições essenciais como sejam a consis- tência, a multiplicidade, a exatidão e a visibilidade. E, apesar da extensão da obra, a rapidez implícita na exposição dos fa- tos e das conclusões. Apoiado em micro-biografias ilustrativas (em janelas autõnomas como no hiper-texto), em citações sempre oportunas e apropriadas, e em gráficos e quadros que sintetizam ou explicitam as visões e versões do fenõmeno. A História da Biblioteconomia Brasileira, à la Brecht, que per- mite maior objetividade mas sem renunciar à emoção e à sutileza. Uma obra fundamental para entender o que somos e para prognosticar o nosso próprio destino. Antônio Miranda Universidade de Brasília Agosto /99 "Não foi possível incluir, no volume presente, os Anexos da tese original que são vitais para quem desejar aprofundar-se no estudo 16 CAPITULO 1 OS LIMITES DO NOSSO OLHAR O desenvolver de um trabalho de pesquisa, seja ele de qualquer natureza, não se dá no vazio, mas é atividade que parte, sem dúvida, de inquietações pessoais oriundas da nos- sa vivência- caráter-prático da constituição do saber- e das leituras realizadas, individual ou coletivamente- caráter teórico da cons- tituição do sáber. Essa inter-relação teoria-prática propicia cons- tantes revisões que nos impulsionam a caminhar. Nessa ca- minhada, encontramos espaços de sombras e luzes e, algu- mas vezes, a trajetória se realiza na penumbra, no isolamen- to, nas angústias do desvelar conhecimentos fragmentados que parecem um jogo, onde as regras do trabalho científico estabelecem a melhor forma de atuarmos diante das dificul- dades, dos impasses, das dúvidas. Enfim, pesquisar é um jogo que envolve palavras, frases, nomes, buscas e caminhos, exi- gindo um saber sobre o jogar e o entendimento das regras 17 que determinam a forma de atuar para atingirmos os objetivos propostos. As questões que surgem da relação teoria-prática (vice-versa)impulsionaram-me a escrever este livro sobre a História da Biblioteconomia no Brasil nos anos 50 aos 60, em especial, quanto ao seus aspectos educacionais. Livro este que é resultante da tese que defendemos, em 1998, na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Para tecer este texto, nos apropriamos de alguns traba- lhos que evidenciam a educação bibliotecária no Brasil: Mueller (1982), Souza, F. (1995), Caberlon (1995), Figueiredo(1995), Dias (1964), Russo (1966), Fonseca (1957), Souza, S. (1987) e outros publicados em artigos de periódicos ou anais dos Congressos Brasil§,iros de Biblioteconomia e Documentação- CBBD. Todavia, sabíamos que: " ... o estudo do ensino de Biblioteconomia no país carrega uma certa dificuldade, notadamente em função da escassa literatura[. .. ]. E os existentes não contemplam os aspectos econômicos-históricos-sociais, privilegiando a cronologia dos fatos em detrimento da análise do conteúdo"( Souza, F., 1992, p.123). Nesta pesquisa, retomamos alguns destes trabalhos com a finalidade de verificar quais os aspectos tratados, metodologias e bibliografias utilizadas e, principalmente, para analisar as similaridades e diferenças históricas apresentadas. Portanto, estes estudos contribuíram para demarcarmos os limites do nosso olhar. Dois aspectos diferenciam esta pesquisa das demais: pri- meiro, por sustentar-se na Imprensa Periódica da área. Enten- demos os materiais da Imprensa Periódica como veículos de comunicação de um dado campo de saber e como mecanis- mos de divulgação de suas atividades, possibilitando ao pesqui- sador compreender sua trajetória, suas idéias dominantes, em determinado período, suas principais lideranças. Enfim, con- 18 uibuindo sobremaneira para a (re) construção histórica de um dado campo, dentre outros aspectos possíveis, fuce à riqueza de contribuições discursivas advindas deste tipo de material. O segundo aspecto, por confrontar o texto-documento com o depoimento de personagens que contribuíram nos diversos momentos, e sob diversas formas, para a constitui- ção do Campo de Biblioteconomia no Brasil. Em sendo assim, três questões nortearam esta investi- gaçao: a) de que modo se constituíram os discursos explicitados na Imprensa Periódica, nos anos 50 e 60, em torno das di- mensões do ensino de Biblioteconomia no Brasil?; b) quais as principais determinações sobre a profissão e o profissional bibliotecário nos anos 50 e 60?; c) quais os marcos históricos anteriores aos anos 50 e 60 relativos ao ensino de Biblioteconomia no Brasil? Para respondê-las, elegemos como objetivo geral desta pesquisa: Compreender como se processaram os discursos em torno do ensino de Biblioteconomia no Brasil nos anos 50 e 60, contidos na Imprensa Periódica da área, em especial os boletins publicados pelo Instituto Brasileiro de Bibliografia e Do- cumentação-IBBD e pela Federação Brasileira de Associações de Bi- bliotecários-FEBAB. E como complementares a este: a) Analisar os movimentos fundadores do ensino da Biblioteconomia no Brasil. Neste item nos interessou analisar os principais fatos que contribuíram para a constituição do campo do ensi- no, anteriores ao anos 50. A princípio analisamos a trajetória da Biblioteca Nacional (BN) e das primeiras bi- bliotecas do Estado de São Paulo, para situarmos o lugar 19 onde foram instalados os movimentos fundadores do ensi- no na área. No caso da Biblioteca Nacional, recorremos aos relatórios da época, que se encontram publicados nos Anais da Biblioteca Nacional. Para a construção do caso paulista nos apropriamos de Ellis (1997) e de artigos en- contrados no Boletim Bibliográfico da Biblioteca Mário de Andrade e, ainda, daqueles publicados na imprensa perió- dica paulista do período. Quanto ao ensino, tomamos os trabalhos de Rubens Borba de Moraes (1942, 1943), Adelpha de Figueiredo (1945), Dorothy Gropp (1940), que são os principais representantes da constituição do ensino de Biblioteconomia nesse Estado. b) Analisar os conteúdos privilegiados que assumiram status de verdade diante da categoria profissional bibliotecária. Em sendo diversificados os conteúdos encontrados na Imprensa Periódica Biblioteconômica, e até porque esta pes~ quisa centrou-se nas questões de natureza educacional, selecionamos as seguintes categorias de análise: 20 • bnsino de Biblioteconomia- Entende-se como o proces- so formal de ensino: escolas/ cursos, currículo e disci- plinas escolares; • Formação Profissional- Compreende as estratégias para capacitar/aperfeiçoar o bibliotecário e para regula- mentar a profissão; • Práticas Profissionais- Compreende o modus operandi do bibliotecário, as técnicas inerentes ao campo, o comportamento e o compromisso social e educacio- nal deste profissional. • Papel/Função do Bibliotecário- Constitui-se nos discur- sos em torno da profissão e do profissional. c) Analisar as maneiras pelas quais a constituição do campo científico brasileiro, nos anos 50, contribuiu para a determinação de novos paradigmas no ensino de Biblioteconomia. A constituição do campo científico resultou na criação do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação - IBBD (atualmente Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecrtologia), órgão que tinha a finalidade de controlar e disse- minar informações/pesquisas produzidas pelos cientistas na- cionais, assim como aquelas produzidas em outros países de interesse da ciência brasileira. A sua criação abriu um novo debate na área: os limites profissionais do bibliotecário e do documentalista. No ensino, foram incorporados conhecimen- tos deste "novo saber", sendo que algumas escolas passaram a adotar o termo Documentação. De igual modo, os Congres- sos da área passaram a denominar-se Congresso Brasileiro de Biblioteconomia e Documentação - CBBD. Ressaltamos que as concepções relativas ao campo como espaço de lutas, em tomo de objetos legítimos tal como explicita Pierre Bourdieu (1983) foram úteis para a análise da constitui- ção e do desenvolvimento do espaço educacional da Biblioteconomia no Brasil. Do mesmo modo, algumas argu- mentações de Roger Chartier (1988) foram necessárias para relativizarmos a interpretação das fontes documentais qualifi- cando-as de acordo com as suas condições de produção. As dimensões educativas da Biblioteconomia no Brasil As dimensões educativas da Biblioteconomia brasileira podem ser compreendidas sob várias perspectivas, sendo as principais a profissional, a técnica e a que diz respeito aos métodos de influência (ensino humanista e ensino pragmá- 21 r I tico). A perspectiva profissional engloba desde a formação até os estudos de mercado de trabalho. A técnica, as formas de controle, processamento e armazenamento da informa- ção e, também, o uso das novas tecnologias e linguagens documentárias. Os modelos de influência evidenciam o cur- rículo e a inserção política, social, cultural e educacional do bibliotecário. Fonseca ( 196?) divide a história do ensino de Biblioteconomia em três fases: Fase I: 1879-1929 Fase II: 1929-1962 Fase III: 1962- Liderança da Biblioteca Na- cional, de influência francesa; Transferência da influência francesa, humanista, para a in- fluência americana, pragmática, que teve seu início em São Pau- lo, no Mackenzie College; Uniformidade dos conteúdos pedagógicos com a instalação do currículo mínimo. Mueller (1985, p.3) acrescenta ã divisão de Fonseca mais duas fases, posto que o trabalho deste autor fora publicado no início dos anos 60: "Desde então podemos acrescentar mais duas fases - a década de 70 pelo fortalecimento e proliferação dos cursos, pelo crescente descontentamento em relação ao conteúdo do currículo mínimo, pela influência da tecnologia e pelo aparecimentodos cursos de pós-graduação; e o período atual, a partir de 1982, data de apro- vação do novo currículo mínimo e que será caracterizada, portanto, pela reformulação dos programas de ensino". Souza, S. (1987), ao estudar as tendências da Biblioteconomia brasileira, divide a sua história em três fases: Fase I: 1911-1930 Tendência humanista; 22 Fase II: 1930-1970 Fase III: 1970-1987 Caracterizada como tecnicista americana; Caracterização nacional da ca- tegoria bibliotecária e do seu despertar para a realidade na- cional. Para Población (1992), o ensino de Biblioteconomia divide-se em quatro fases: Fase I: 1915-1928 Fase II: 1929-1969 Fase III: 1970-1985 Fase IV: 1986- Formação de influência euro- péia; Mudança da direção da influ- ência europe1a para o pragmatismo americano; Ufanismo nacionalista caracte- rizado pelo crescimento quali- tativo das escolas; Estabilização do crescimento quantitativo das escolas e iní- cio do período de reflexão, objetivando a avaliação quali- tativa do ensino ministrado em nível de graduação. Para esta autora, na fase II se inicia o crescimento quan- titativo das escolas de Biblioteconomia, notadamente nos anos 40, a partir da criação do Curso da Escola Livre de Sociologia e Política. De 1911 até os anos 40, foram criados quarenta e dois cursos, dos quais doze desapareceram nos anos postériores, totalizando trinta cursos que se encontram atualmente em funcionamento, abrangendo todas as regiões do paísi. 1 O mais recente Curso de Biblioteconomia foi criado em 1995, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 23 Tabela 1: Biblioteconomia no Brasü: 1911-1992: quatro fases do ensino ck gradua- ção. (Población, 1992). 1989 - ADEBD cria módulos de Estudos Curriculares: - Região Norte/Nordeste 8 escolas (26,66%) - Região C.O/Sudeste 8 escolas (26,66%) - Região Sul 6 escolas (20,02%) -São Paulo 8 escolas (26,66%) TOTAL 30 escolas Na Fase III da classificação de Población, que corresponde à primeira de Mueller, são criados os cursos de pós-graduação em Biblioteconomia em nível de Mestrado. O primeiro, instalado no Instituto Brasileiro de Bi- bliografia e Documentação-IBBD2• O IBBD, desde a década de 50, vinha realizando alguns cursos de aperfeiçoamento para bibliotecários, daí constituir-se em ambiente propício para 2 Outros cursos de pós-graduação em nível de mestrado foram criados na década de 70: 1972, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo; 1976, na Universidade Federal de Minas Gerais; 1977, na Pontifícia Universidade Católica de Campinas; 1978, na Universidade de Brasília e na Universidade Federal da Paraíba. A partir de 1992, são criados os cursos de doutorado: lBICT/UFRJ, UNS, ECA/USP. 24 este empreendimento: "O curso de mestrado em ciência da in- formação teve seu início em 1970, refletindo a preocupação euro- péia e americana com a formação de recursos humanos para lidar com a excessiva produção de informação cientifica e tecnológica surgida na ambiência do pós-guerra. Foi o início da conscientização, no Brasil, para a necessidade de organizar e controlar a informa- ção como uma ferramenta para o próprio desenvolvimento da ci- ência e tecnologia"(Barreto, 1995, p. 7). Caberlon, ao tratar dos marcos históricos da Biblioteconomia no Brasil, os divide em duas perspectivas: da profissão e do ensino. Tabela2: Marcos históricos da Biblioteconomia no Brasil (Carbelon, 1995, p.23) 1961 profissão regulando seu exerdcio; institui o Federal de Biblioteconomia (CFB); 1965 Regulafl!entaçãa da lei 4084/62 pelo Decreto 1982 n° 56725/65, ratificando a Biblioteconomia como Criação da Pós-Graduação em Biblinteconornia. Aprovação do segundo Currículo Mínimo de Graduação em Biblioteconomia. (cf. Resalução 08182 do CFE) (em 25 ------------ ------- -- --- Podemos afirmar que há relativa uniformidade nas divi- sões da história do ensino da Biblioteconomia no Brasil. Fon- seca toma como marco inicial a realização do primeiro con- curso para bibliotecário realizado por Ramiz Galvão na Bibli- oteca Nacional. Para este autor, Mueller e Caberlon evidenci- am a aprovação dos currículos mínimos como delimitadores históricos. Población, mesmo não expondo textualmente, deixa subentendida esta questão. Souza, S. retoma os princí- pios adotados pelos demais autores. Contudo, em um aspec- to, estes autores são totalmente acordados: quanto aos mo- delos de influência, humanista francês e técnico americano, como demarcadores do campo do ensino de Biblioteconomia. Mueller apresenta uma outra influência, a tecnológica, que aparece a partir dos anos 70. c> Com base nestes autores e pelas leituras realizadas, nes- ta pesquisa, dividiremos a história do ensino de graduação em Biblioteconomia em cinco fases. FASE I: 1879-1928 1879 1911 1915 26 Movimento fundador da Biblioteconomia no Brasil de influência humanista francesa, sob a liderança da Biblioteca Nacional; Realização do primeiro concur- so para bibliotecário durante a gestão de Ramiz Galvão; Criação na Biblioteca Nacional do primeiro Curso de Biblioteconomia no Brasil, du- rante a gestão de Manoel Cícero Peregrino da Silva; Início das atividades do Curso da Biblioteca Nacional; 1923 FASE II: 1929--1939 1929 1931 1935 1936 1939 FASE III 1940--1961 1940 Paralização do curso da BN, quando é estabelecido, no Museu Histórico Nacional, o Curso Technico com a finalidade de formar bibliotecários, paleógrafos, arquivistas e ar- queólogos. Predomínio do modelo prag- mático americano em relação ao modelo humanista francês; Criação do curso do Instituto Mackenzie, marca do início da influência técnica americana; Retomada do curso da Biblio- teca Nacional; Encerramento do curso do Mackenzie; Criação do curso do Departa- mento de Cultura da Prefeitu- ra Municipal da São Paulo, por Rubens Borba de Moraes; Fechamento do curso do De- partamento de Cultura da Prefeitura Municipal da São Paulo. Consolidação e expansão do modelo pragmático americano; Transferência do Curso da Pre- feitura Municipal de São Paulo para a Escola Livre de Sociolo- gia e Política- ELSP; 27 1942 1944 1954 1958 1961 FASE IV 1962-1969 1962 28 Início da expansão do campo do ensino pelo país, sendo criados cursos: Bahia (1942), Escola de Filosofia Sedes Sapientae (SP) (1944), Pontifícia Universidade Católica de Campinas (1945), Porto Alegre (1947), Departa- mento de Documentação e Cul- tura da Prefeitura Municipal do Recife (1947) enaEscolaNossa Senhora do Sion (SP) (1948); Reforma do curso da BN du- rante a gestão de Rodolfo Garcia ( 1933-1945); Criação do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação- IBBD; Definição da Biblioteconomia como profissão liberal e de ní- vel superior; Criação da Federação Brasilei- ra de Associações de Bibliote- cários (FEBAB). Uniformização dos conteúdos pedagógicos e regulamentação da profissão; Promulgação da Lei 4084. Aprovação do primeiro currí- culo mínimo de Biblioteco- nomia; 1963 1965 FASE V: 1970-1995 Primeiro Código de Ética do Bi- bliotecário; Criação do Conselho Federal de Biblioteconomia. Paralisação do crescimento quantitativo das escolas de gra- duação e crescimento quantita- tivo dos cursos de pós-graduação; busca da maturidade teórica da área a partir de novas aborda- gens tomadas de empréstimo de outros campos de saber. Tabela 3: Fases e marcos históricos da Biblioteconomia brasileira consideradas neste Estudo. 1': 1879-1928 Início da Constituição do Campo do Ensino da Biblioteconomia sob a influência francesa- Biblioteca Nacional 2a: 1929-1939 Predomínio do modelo americano sob ainfluência dos primeiros cursos criados em São Paulo- Mackenzie College e Cursos de Biblioteconomia da Prefeitura Municipal de São Paulo. 3': 1940-1961 Consolidação do modelo americano eexpansão do número de Escolas/Cursos 4': 1962-1969 Estabelecimento do primeiro Currículo Mínimo e Regulamentaçãodaprofi~ão -lei 4084/62 5': 1970-1995 Paralisação da criação dos Cursos de Graduação e crescimento dos Cursos de Pós- Nesta pesquisa, centralizamos a análise histórica do en- sino de Biblioteconomia nas terceira e quarta fases acima descritas, que correspondem ãs duas últimas fases eleitas por 29 Fonseca e à segunda de Poblacióu e Souza, S. A análise con- templa ainda aspectos referidos por Caberlon, encerrando- se a análise na primeira fase de Mueller. A escolha deste período, anos 50 e 60, deu-se pelo Ülto de considerarmos essas décadas como as de maior re- levância para a constituição do campo da Biblioteconomia brasileira em termos de conquistas profissionais, uniformi- zação dos conteúdos escolares, criação e ampliação de es- colas e cursos, estabelecimento dos debates científicos atra- vés de eventos como os CBBD's3 e aparecimento de lide- ranças nacionais, dentre outros. Do mesmo modo, as dé- cadas atuais serão importantes para pesquisas futuras em termos de novas abordagens teóricas, uso de tecnologias modernas para armazenamento, recuperação e transferên- cia de informações por meio de redes e sistemas nacionais e internacionais. Estes ciclos históricos, ricos em discursos, possibilitam demonstrar a dinâmica do campo da Biblioteconomia no Brasil. Evidentemente, ao estudarmos estes ciclos, estaremos considerando as determinações de tempo e lugar, na medida em que condicionam os modos de saber e fazer: "Certamente não existem considerações, por mais gerais que sejam, nem leituras, tanto quanto se possa entendê-las, capazes de suprimir as particulari- dades do lugar de onde falo e do domínio em que realizo uma investi- gação. Esta marca é indelével. No discurso onde enceno as questões globais, ela terá a forma do idiotismo: meu patoá representa minha relação com o lugar" ( Certeau, 1982). 3 Os Congressos iniciaram-se em 1954, no Recife, com o nome de Congresso Brasilei- ro de Biblioteconomia, a partir do segundo, 1959, em Salvador, passaram a ter a denominação acima. 30 As fontes e os discursos Esta pesquisa baseou-se na análise da Imprensa Perió- dica Biblioteconômica, produzida por diversas e diferentes instâncias, no período abrangido pelo estudo. Em não ha- vendo um repertório onde pudéssemos localizar a produção das Associações de Classe, Escolas e Cursos, centralizamos as buscas na Bibliografia Brasileira de Biblioteconomia, publicada por Oswaldo de Carvalho (1959) e na Bibliografia Brasileira de Do- cumentação -1960/1970. Ainda, nas bibliografias inseridas na Revista do Livro, publicada pelo Instituto Nacional do Livro e nas referências bibliográficas dos artigos da época. A maior incidência dos trabalhos arrolados são livros, mas foi possível localizar através dos artigos o nome das fontes publicadas pela área ou aquelas utilizadas pelos bibliotecários para divulgá-la, a exemplo da Revista do Serviço Público, publicada pelo Depar- tamento Administrativo do Serviço Público- DASP. Os materiais da Imprensa Periódica são fontes privile- giadas para compreensão dos " ... movimentos ocorridos dentro de um campo de conhecimento, pois através dela pode-se estabelecer mapeamentos das diferentes atuações, detectar conflitos e disputas e, assim, clemonstrar; em parte, a estrutura e o funcionamento" (Vilhena e Catani, 1998, p.2) da Biblioteconomia brasileira, nos anos 50 e 60. "A imprensa é, talvez, o melhor meio para se compreender as dificuldades de articulação entre a teoria e a prática: o senso comum que perpassa as páginas dos jornais e das revistas ilustra uma das qualidades principais de um discurso educativo [e biblioteconômico] que se constrói a partir dos diversos actores em presença (professores, alunos, pais, associações, instituições)" (Nóvoa, 1993, p.xvii). A imprensa periódica, na Biblioteconomia, provavelmen- te se iniciou com a publicação da revista A Biblioteca (1944), publicada pelo DASP, com a finalidade de divulgar as atividades 31 da biblioteca do órgão. Outras publicações são editadas por Associações de Classe: BAMBIM (1959), pela Associação de Bibliotecários Municipais de São Paulo; Notícias daABB (1952) e Bibliotecas e Bibliotecários ( 1957), pela Associação de Biblio- tecários Brasileiros; Boletim Informativo da FEBAB ( 1960), pela Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários; Boletim IBBD ( 1955), pelo Instituto Brasileiro de Bibliografia e Docu- mentação- IBBD; Boletim ABDF (1966), pela Associação dos Bibliotecários do Distrito Federal. Ao se referir às publicações periódicas na Bibliote- conomia, antes de 1970, Fonseca ( 1957, p. 95) afirma que: ''Há poucas revistas especializadas em Biblioteconomia, no Brasil. Impres- sas, podemos citar apenas duas: o B.oletim Bibliográfico, da Bibliote- ca Pública Municipal de São Paulo [ ... ] e o Boletim Informativo do Instituto Brasileiro de Bibliogra[za e Documentação. A primeira é anual e a segunda bimestral. A Biblioteca do Departamento Administrativo do Serviço Público - (DASP) edita, desde 1944, uma pequena revista im- pressa em multilith, com periodicidade irregular: A Biblioteca" A denominação atribuída por este autor- Revistas- con- trapõe-se à de Souza, F. (1994) e Miranda (1981), quando afir- mam que estas se iniciaram na década de 70: Ciência da Infor- mação, criada em 1972 pelo IBBD, com a finalidade de ser um veículo de "divulgação e desenvolvimento da Informação no Brasil, bem como de divulgação das principais atividades do setor de infor- mação científica e tecnológica"(Editorial, 1972, p.1). Em 1973, a Associação de Bibliotecários do Distrito Federal (ABDF), com a cola- boração do Curso de Biblioteconomia da UnB, lança a Revista de Biblioteconomia de Brasília, com a finalidade de ser "um veículo de comunicação de idéias, experiências e realizações da comunidade biblioteconômica brasileira" (Editorial, 1973, p.2). A Revista da Escola de Biblioteconomia da UFMG começou a circular nomes- mo ano da Ciência dalriformação, em 1972, e "destinava-se à 32 publicação de trabalhos que venham contribuir para o desenvolvi- mento da Biblioteconomia e Documentação no Brasil e que tratam de assuntos ligados a estes dois campos" (Editorial, 1972, p.2). A FEBAB, desde 1960, editava o Boletim Informativo; em 1973, em substituição ao Boletim, publica trimestralmente a Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação. Em princí- pio, o seu objetivo era documentar a legislação bibliote- conômica ou correlata. A partir de 1978, inaugura uma nova fase, com periodicidade semestral, voltando a sua atenção "às matérias que tratem de temas técnicos, científicos e educacionais da Biblioteconomia e Documentação" (Editorial, 1978, p.1). As esco- las de Biblioteconomia de Pernambuco e Bahia lançam, nos anos 80, os seus Cadernos de Biblioteconomia, ambos de vida efêmera. A proliferação da Imprensa Periódica Biblioteconômica, a partir dos anos 70, ocorreu face a duas situações. A primei- ra, pelo crescimento dos Cursos de pós-graduação e a segun- da, pelo alerta de Hipólito Escobar, quando esteve no Brasil em 1968, em missão da UNESCO, ao considerar a ausência de periódicos como um dos doze pontos negativos da Biblioteconomia brasileira. Inicialmente, estas revistas atendiam a determinados in- teresses da profissão: " ... a R. Esc. Bibliotecon. UFMG veicula arti- gos sobre Ensino de Biblioteconomia" (Miranda, 1981, p.31), tra- zendo para este assunto contribuições significativas. Acredi- tamos que algnns avanços ocorridos no ensino devam-se a esta publicação. A RevistaBiblioteconomia de Brasília sobre Sistemas de Informação e sobre SDI [Disseminação Seletiva de Informação], e a Ciência da Informação, sobre bibliometria como reflexo da experiência de grupos e de seu meio ambiente, grupos estes formados por professores ingle- ses e norte-americanos, que estiveram ministrando cursos e 33 orientando os primeiros mestres em Ciência da Informação no Brasil. Enfim, estas revistas demostram, nesta fase, uma tendência dos cursos de pós-graduação de Minas Gerais, Rio de janeiro e Brasília. Inclusive, a Capital Federal_destacou~se alguns anos na área de administração e automa;,ao de biblio- tecas, chegando a ser considerada a capital da Biblioteconomia". A centralização em determinadas temáticas da Biblioteconomia "em vez de constituir-se, portanto, em uma 'políti- ca editorial' consciente, tratar-se-ia mais bem de uma tendência que podeounãotercontinuidade"(Miranda, 1981, p.31). Atual~ent~, observamos que as publicações citadas têm a mesma Identi- dade e interesse, sendo praticamente impossível distinguir- mos a linha editorial das mesmas. No entanto, supomos que seja gerenciamento e políticas de informa~ão científica. e tecnológica. Certamente esta questao merecena aprofundamento. . . Consideramos Transinformação, reVIsta publicada pelo curso de pós-graduação da PUCCA.LV!P, como a mais eclética, na medida em que, além de contemplar os assuntos acima, engloba: Leitura, Estudos de Usuários, Epistemologia da Biblioteconomia, dentre outras temáticas. Por sua vez, Biblioteca e Sociedade, editada pelo mestrado da Universidade Federal da Paraíba, procura firmar-se nesse oceano de indecisões editoriais, e retrata a instabilidade teó- rica da Biblioteconomia brasileira; ou, ao contrário, será que 0 campo está movimentando-se positivamente na teoria e na prática ou as revistas publicam assuntos da moda, como fo- ram re-engenharia, qualidade total da informação, dentre outros? No momento, este periódico procura contornar as dificuldades financeiras que o impedem de circular com re- gularidade. 34 Mas, em sendo o nosso interesse de pesquisa as duas décadas precedentes aos anos 70, selecionamos o Boletim In- formativo da FEBAB e o Boletim Informativo do IBBD, IBBD: Notícias e IBBD: Notícias Diversas, sendo estes, prolongamen- tos do primeiro. a) Boletim Informativo da Federação Brasileira de As- sociações de Bibliotecários-FEBAB. Esta instituição, como seu nome indica, congrega todas as associações de bibliotecários. Logo, esta fonte, hipotetica- mente, representa o pensamento da categoria, daí a sua in- corporação nesta pesquisa, além de apresentar periodicidade regular. Este Boletim começa a circular em 1960, um ano após a criação da FEBAB, com a finalidade de: " ... contribuir para o progresso da Biblioteconomia no Brasil. I - mientando os bibliotecários para a apreciação de novas técnicas e processos; 2 - tornando conheci- das, no meio da classe, as reivindicações profissionais; 3-publicando notícias das atividades das Escolas e Associações de Bibliotecários" (Boi. Inf. FEBAB, 1960, p.l). Sendo assim, a publicação procura ren·atar a importãn- cia desta Federação, enquanto espaço legítimo da categoria, sustentando que, a partir dela e com ela, as reivindicações profissionais seriam atingidas, na medida em que todos unis- sem suas "forças e necessidades" em torno de uma Biblioteconomia reconhecida, enquanto profissão liberal e de nível superior, dotada de um currículo único e incorporada ao espaço universitário. Na apresentação do v.5, n.1/2 de 1962, problemas rela- cionados ao Ensino Superior assumem destaque, sendo pu- blicados diversos dispositivos legais, com a proposta de man- ter os professores e bibliotecários atualizados a respeito das 35 mudanças que se processavam neste campo. Mesmo com a aprovação do currículo mínimo e com o reconhecimento da profissão como de nível superior, matérias dessa natureza se- rão editadas até 1968, demonstrando, assim, a luta pela con- quista educacional da Biblioteconomia, em especial, da ne- cessidade de sua expansão: "Formulado dentro de um plano siste- mático nas suas linhas gerais e flexível nos aspectos particulares, êste boletim tem procurado oferecer uma visão imediata dos problemas de ensino das dificuldades com que se defrontam os profissio- nais responsáveis pelo desenvolvimento da Biblioteconomia no Brasil". (Boi. Inf. FEBAB, 1962, p.2) (grifo nosso) Ainda neste sentido, pretendia: " ... oferecer facilidades de acesso a matéria de interesse das Eseolas de Biblioteconomia e de todos aqueles que se interessam pelos assuntos da Educação" (Bol.Inf. FEBAB, 1962, p.2) (grifo nosso). A divulgação das atividades científicas desenvolvidas no país e no estrangeiro no campo de Biblioteconomia e Docu- mentação, os trabalhos das comissões nacionais (catalogação, classificação etc.) e notícias de interesse dos bibliotecários ocupam parte significativa da publicação, possibilitando a iden- tificação dos movimentos ocorridos na década de 60. É evi- dente que, dependendo das reivindicações profissionais, uma mesma temática estende-se por vários números ou vários anos. A partir de 1968 até 1970, a sua circulação é subvenci- onada pelo Instituto Nacional do Livro, quando é substituí- do, em 1970, pela Revista Brasileira de Biblioteconomia e Docu- mentação. b) Boletim Informativo do Instituto Brasileiro de Biblio- grafia e Documentação- IBBD Em sendo uma publicação do mais importante órgão de informação e documentação da época, foi criado para 36 L " ... promover o intercâmbio de informações entre as instituições de pes- quisa, no Brasil e no estrangeiro, divulgando os trabalhos técnico- científicos brasileiros"(L.Q.S., 1955, p.l). Dará destaque, então, às diversas facetas da ciência, podendo-se encontrar desde artigos sobre Física Nuclear até Geografia. Porém, os artigos sobre Biblioteconomia e Documentação ocupam maior es- paço, e é onde se evidencia o papel do profissional bibliotecá- rio e das bibliotecas diante do avanço das pesquisas no Brasil. O IBBD, para concretizar sua finalidade, publicará " ... bi- bliografias especializadas correntes, guias das instituições de pesquisa brasileiras e de suas bibliotecas, o Boletim do Conselho Nacional de Pesquisa e êste Boletim, editados de preferência em português e inglês" (L.Q.S., 1955,p.l). Este Boletim pretendia " ... dar notícias atuais e de interesse para a pesquisa bibliográfica registrando o que se passa no mundo científico e tecnológico brasileiro, principalmente o que estiver relacio- nado com os trabalhos do Conselho Nacional de Pesquisa e institui- ções que lhe são relacionados"(L.Q.S., 1955, p.l). Estas informações contidas no artigo A Razão de Ser Deste Boletim, assinado por L.Q.S. (Lydia de Queiroz Sambaquy), alerta aos leitores que na sua fase inicial seria falho e incom- pleto, mas, vencidas as primeiras dificuldades, poderia " ... ser- vir como primeiro veículo para o contato permanente que cabe a este instituto criar e manter entre as instituições nacionais e estrangeiras " (L.Q.S., 1955, p.2). Em todos os artigos publicados, se manifesta a idéia se- gundo a qual o bibliotecário seria aquele que atenderia aos anseios· da ciência. Logo, deveria conhecer as terminologias das áreas em que atuava. Desta forma, obteria "status" e res- peito profissional junto à comunidade científica e à socieda- de em geral, discurso que encontra ressonância nos cientis- tas defensores da categoria, a exemplo de Paulo Sawaya. Daí 37 ~--~--------- ·----. a insígnia encontrada em todos os trabalhos que tratam do bibliotecário: Servo dos Servos da Ciência. Para corresponder a esta "necessidade científica", são promovidos diversos cursos de especialização, ministrados por bibliotecários que tratavamdos conteúdos específicos e, por cientistas que introduziam conhecimentos das Ciências Físi- cas e Naturais, Ciências Médicas e Tecnológicas. A partir de 1961, ao mudar de nome paraiBBD: Notícias Diversas, centra-se na Biblioteconomia e na Documentação. Nesta fase, a periodicidade é bastante irregular. Em 1967, ocor- re uma nova mudança no título, agora IBBD: Notícias, mas a linha editorial permanece até 1975, quando cessa de circular. A Imprensa Periódica em si m€sma não se constituiu em material suficiente para caracterizar o movimento do campo da Biblioteconomia, tal como está presente nesta pesquisa. Sendo assim, recorremos a outras fontes publicadas no período abran- gido pelo estudo ou àquelas que se reportam a ele, como teses, anais de congressos, artigos de jornais e revistas e livros. Esclarecemos, entretanto, que, para alguns estudiosos das fontes documentais, os materiais utilizados nesta pesquisa de- nominam-se de documentos não-convencionais; para outros, de literatura cinza. Com a finalidade de evitarmos senões conceituais, optamos pelo termo Imprensa Periódica, por con- templar todo o tipo de material impresso relativo a uma dada área: relatórios, boletins, folders, artigos de jornais e revistas. Isso se alia ao fato de que o uso deste termo vem sendo utilizado pela Educação, na França, por Pierre Caspard (1981), pioneiro neste tipo de investigação, em Portugal, por Antô- nio Nóvoa (1993), na Itália, por Dario Ragazzini (1986) e, no Brasil, por Nunes e Carvalho (1994) e Vilhenae Catani (1998). Uma questão a ressaltar é que quando pretendemos construir a história de um campo de saber, de uma instituição 38 ou de uma personagem diz respeito à localização das fontes, na medida em que são elas o foco de sustentação dos objetivos pretendidos. Aí se estabelece um primeiro problema: o seu rastreamento, geralmente lacunar, parcelar e residual, para empregar expressões de Nunes e Carvalho (1994, p.23). No Brasil, este problema é comum e exige do pesquisador atitu- des de "garimpeiro", muitas das vezes por caminhos difíceis e tortuosos. A dificuldade de obter o material desejado centra- se, entre outras coisas, na carência de políticas públicas em todos os níveis para arquivos e bibliotecas, aliada, ainda, ao estereótipo difundido entre os brasileiros, que faz acreditar que documentos antigos, por serem velhos, são destituídos de valor: "São inúmeros os documentos que as traças, o mofo e a umidade destroem. Outras vezes, é o fogo que serve de arquivo, e o passado vira fumaça. É verdade que muitos abnegados vêm lutando para a preservação de importantes documentos e arquivos, embora nem sempre contêm com os recursos necessários a essa tarefa, situação que conspira contra a- tão necessária- soma de conhecimentos e expe- riências. Aquilo que é apresentado como novo e original, muitas vezes já tem uma longa história, desconsiderada ao se pensarem ações futu- ras" (Ribeiro, 1996, p.19). Com a finalidade de ampliarmos os discursos contidos nas fontes documentais e também como forma de confron- tar o texto com o vivido, entendido como o conjunto de ex- periências e atuações de personagens que contribuíram para a constituição do campo da Biblioteconomia brasileira, reali- zamos algumas entrevistas, na medida em que " ... possibilitam recuperar aquilo que não encontramos em documentos de outra natu- reza: determinados acontecimentos pouco esclarecidos ou nunca evo- cados, experiências pessoais, impressões particulares etc" (Alberti, 1990, p.5). Possibilitam-nos, ainda, um outro olhar, que muitas das vezes a fonte não permite, posto que, ao mesmo tempo em 39 que ela revela o fato histórico, o esconde. Logo, o uso desta metodologia contribuiu para desvelar as práticas de " ... pessoas que participaram de, ou testemunharam, acontecimentos, conjuntu- ras, visões de mundo ... "(Alberti, 1990, p.S), enfim, da trajetória histórica da Biblioteconomia brasileira. A seleção dos entrevistados foi realizada pela incidência de publicações na Imprensa Periódica da área e pela partici- pação nos movimentos associativos e educacionais da Biblioteconomia nos anos 50 e 60. Deste modo, entrevista- mos os seguintes bibliotecários: Edson Nery da Fonseca, Ma- ria Antônia Pinke Belfort de Mattos, Maria Helena de Toledo Barros, Esmeralda Aragão, dentre outros. As entrevistas não obedeceram a um roteiro preestabelecido- com exceção do Prof. Edson N ery da Fonseca e da Profª. Esmeralda Aragão, que sugeriam que as perguntas lhes fossem enviadas -, na medida em que pretendíamos obter o maior número de informações; havendo necessidade, algu- mas interferências foram realizadas, com a finalidade de escla- recermos dúvidas e obtermos mais dados sobre os aspectos rela- tados pelos entrevistados. Neste sentido, ensina-nos Thompson (1992, p.271): 'Vma entrevista não é um diálogo, ou uma conversa. Tudo o que interessa é Jazer o informante falar. Você deve manter-se o mais possível em segundo plano, apenas, fazendo algum gesto de apoio, mas não introduzindo seus próprios comentários ou hist&rias ". Os depoimentos foram gravados, transcritos e depois categorizados de acordo com os itens eleitos para a pesquisa: ensino de Biblioteconomia, formação profissional, práticas profissionais e regulamentação da profissão. HISTÓRIA DA BIBLIOTECONOMIA BRASILEIRA representa o modo como leio o mundo, sendo homem e ra- cional, procurando em alguns momentos assumir atitudes dionisíacas e, em outros, atitudes apolíneas, cuja pretensão é 40 encontrar o equilíbrio entre umas e outras. Também, é a maneira como olho a Biblioteconomia como bibliotecário, usuário de biblioteca, professor e cidadão. Portanto, este trabalho- etapa de um processo de apren- dizagem -foi elaborado não somente pelas fontes e os discur- sos, mas, e principalmente, tentamos imbuí-lo de emoção; ao contrário, seria uma atividade para obtermos título acadêmi- co, limitada aos rigores do fazer ciência. Daí, defendermos e explicitarmos idéias que certamen- te serão compactuadas por alguns companheiros e rechaçadas por outros. Entretanto, entendemos que somente evoluímos como SER, quando colocamos o nosso saber e o nosso pen- sar sobre a mesa dos "inquiridores". Deste modo, como em qualquer trabalho científico, é natural apresentá-lo em módulos, a fim de facilitar a sua fruição. Assim, estruturamos este estudo em seis capítulos, que se dividem em itens. Todavia, a divisão apresentada não se constitui em quadros estanques, mas em idéias que se enca- deiam, se harmonizam, se fundem. No segundo capítulo, tratamos de discutir o movimen- to fundador do campo educacional da Biblioteconomia, na Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro e em São Paulo. Algumas fontes documentais foram fundamentais para a sua elabora- ção, como os Anais da Biblioteca Nacional, do mesmo modo alguns artigos publicados nos jornais paulistas dos anos 20 e 30. Por último, abordamos a expansão a partir dos anos 40 do Ensino de Biblioteconomia no Brasil. No capítulo seguinte, fazendo uso da Imprensa Periódica Biblioteconômica, tratamos de evidenciar os discursos em torno do papel e da função do bibliotecário ideal, aquele que serviria como auxiliar dos cientistas. Daí os discursos centrarem-se na sua necessária e imprescindível especialização e atualização. 41 Para finalizá-lo, nos reportamos à concepção do bibliotecário como Servo dos Servos da Ciência e às críticas feitas por cientistas como Paulo Sawaya, às práticas bibliotecárias e às estratégias utilizadas para garantirem sua permanência no campo face à penetração de atores estranhos ao mesmo. As lutas para legitimar o campo, dando-lhe respaldo le- gal, maneiras pelas quais os bibliotecários garantiriam o seu espaço profissional, são o foco central deste capítulo, o quar- to. Portanto,analisamos as estratégias políticas dos bibliote- cários para a aprovação da Lei 4.082/62. Para escrevê-lo, nos apropriamos dos relatórios das Comissões por onde tramitou o projeto encaminhado pela FEBAB, levado à discussão no Congresso Nacional pelo Deputado Rogê Ferreira. Com o estabelecimento desta lei, um corp;; de dispositivos burocráti- cos é criado: Conselhos Federal e Regionais de Bibliotecono- mia, Código de Ética Profissional. Em sendo, a FEBAB, a ins- tituição que contribuiu para constituir, em termos legais e associativos, a Biblioteconomia, fez-se necessário incluir a sua trajetória, com o objetivo de situá-la no campo. No quinto capítulo, tratamos de evidenciar a constitui- ção do campo da Biblioteconomia, nos anos 50 e 60. Para tanto, se fez necessário discorrermos sobre os movimentos para constituí-lo; os encontros e eventos que procuram justi- ficar a sua importância no âmbito universitário, os modelos de formação, humanista e pragmático, a padronização das escolas e uniformização dos saberes escolares. Os discursos em torno da especialização do bibliotecário levaram-nos a abordar, preferencialmente, os cursos oferecidos pelo IBBD, que tinham esta finalidade,justificando-se, assim, a inclusão da trajetória deste órgão. Em seguida, as Considerações Fi- nais, e as Fontes Bibliográficas referenciadas nesta pesquisa. 42 CAPÍTUL02 O MOVIMENTO JiVNDADOR DAS DIMENSÕES EDUCATIVAS DA BIBliOTECONOMIA DO BRASIL A trajetória das bibliotecas no Brasil iniciou-se com as ordens religiosas dos Beneditinos, Franciscanos e Jesuítas. Entretanto, tomaremos como marco inicial, deste primeiro momento do trabalho, a criação da Bibilioteca Nacional-BN, gênese do movimento fundador do campo de ensino da Biblioteconomia no Brasil. Essa biblioteca é remanescente da Biblioteca Real da Ajuda, criada por D.João I, rei de Por- tugal, depois do terremoto de l de novembro de 1755, que destruiu a antiga Biblioteca Real. Com a invasão das tropas francesas de Junot, a família real portuguesa, sentindo-se ameaçada, refugiou-se na colônia mais próspera, trazendo nos porões dos navios os instrumentais ne- 43 cessários ao seu bem-estar social, cultural e artístico, dentre eles " ... a numerosa e rica livraria pacientemente amontoada pelo douto ahbade de Santo Adrião de Sevér, Diogo Barbosa Machado, que generosamente a offertara aD.Joséi"(Biblioteca Nacional, 1887, p.221). Assim chegaram ao Brasil, por força das pressões polí- ticas, as primeiras obras, origem da Real Biblioteca, também denominada de Biblioteca do Rio de Janeiro, da Corte. Ratniz Galvão, ao descrever a coleção bibliográfica trazida por D. João VI em 1808 e por Luis Marrocos em 1811, sendo esta a segunda leva de livros e peças para a real Biblioteca, afirma que: "Não se sabe, o que mais se deva admirar, se a excellencia das edições raras, se a belleza dos exemplares preferidos pelo douto collecionador, se emjim a boa ordem e perJeição das colleções jacticiais, prodígio de perserverança e de cuidado. Estão nelles reunidas quasi todas as províncias do saber humano, representado pelas suas obras mais dignas de nota e estima"(Galvão, 1889, p.159). Segundo Rubens Borba de Moraes, a coleção de Diogo Barbosa Machado dividia-se em três grupos. O primeiro, de obras diversas, continha edições de clássicos portugueses e espanhóis, latinos e obras religiosas. A segunda, a coleção de folhetos, "organizada de modo bárbaro e estranho", isto é, quando os folhetos para serem encadernados eram gran- des, ele os cortava e quando pequenos os emendava. Assim, Diogo Barbosa formou uma coleção de folhetos em 85 volu- mes. A terceira, a coleção de retratos, era "formada de modo também excêntrico": os retratos recortados de outros impres- sos depois colados em folhas em branco e para enfeitá-los recortava tarjas ou moldura de um outro livro. A princípio o acervo foi instalado nas salas do andar superior da Ordem Superior Terceira do Carmo, em 1810, ano considerado como de sua fundação. Contudo, não ten- do o ambiente as condições necessárias para a devida conser- 44 vação do material, passa a ocupar, também por determina- ção do Príncipe Regente, as "catacumbas", que até então ha- viam servido aos religiosos desta ordem. Pela relevância his- tórica deste ato, o transcreveremos: "Havendo ordenado, por Decreto de 2 7 de Junho do presente anno, que nas casas do Hospital da Ordem Terceira do Carmo, situado à mi- nha Real Cappela, se colosassem a minha Real biblioteca e gabinete dos instrumentos de phisica e mathematica, vindos ultimamente de Lisboa e constando-me pelas últimas averiguações a que mandei proceder, que o dito edifício não tem toda a luz necessária, nem offerece os commandos indispensáveis em hum estabelecimento desta natureza, e que no lagar que havia servido de catacumba aos Religiosos do Carmo se podia Jazer h uma mais própria e decente accomodação para a dita livraria, hei por bem, revogado o mencionado Real Decreto de 27 de Junho, determinar que nas ditas catacumbas se erija e accomode a minha Real Biblioteca e instrumentos de phisica e mathematica, jazendo-se à custa da Real Fa- zenda toda despeza conducente ao arrajamento e manutenção do referi- do estabelecimento[ ... ]-Palácio do Rio de Janeiro, em 20 de Outubro de 1810- Coma rubrica doPrincipeRegenteNossoSenhor"(Bibliote- ca Nacional, 1889, p.223). No ano posterior a sua fundação, é franqueada ao pú- blico, mas facultada apenas aos estudiosos, àqueles que obti- nham consentimento régio. Em 1814, é suprimida esta exi- gência, ficando totalmente aberta à população. Como as bi- bliotecas brasileiras no tempo colonial, a Biblioteca Nacional<, nas suas primeiras décadas, foi gerenciada por religiosos, que vieram, alguns, com a família real. Os primeiros, Frei Gre- gório José Viegas, da Ordem Terceira de São Francisco, Pe. 4 Sobre as biblioteca brasileiras no tempo colonial. consultar as seguintes fontes: LESSA, Clado Ribeiro de. As Bibliotecas nos tempos colonias. Revista do IHGB, v.192, p.339- 345,abr./jun., 1946. MORAES, Rubem Borba de. Livros e Bibliotecas no Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1979.234p. 45 Joaquim Damaso, da Congregação do Oratório de Lisboa, Frei Antônio de Arróbida, também franciscano. Em se- guida, Pe. Felisberto Pereira Delgado e Cônego Francisco Vieira Goulart. "Goulart dirigiu a Bibli- oteca como ajudante de bibliothecario até 11 de janeiro de 1837 e como bibliothecario d 'ahi em diante até sua morte, ocorrido a 21 de agosto de 18 3 9, em Niteroy " (Biblioteca Nacional, 1889, p.236). Com a sua morte, coube a direção ao cônego Antônio Fernandes da Silveira, até 5 de novembro de 1839, quando tomou posse o Cônego ]anuário da Cunha Barbosa. Após o seu falecimen- to, em 1846, é nomeado o Dr. em Medicina José de Assis Bran- co Muniz Barreto, o primeiro não religioso. Com sua prema- tura morte é nomeado Jorge Estanislau Xavier Luis Camillo Cléau, Frei Camillo de Monserrate, a quem Ramiz Galvão ho- menageia, publicando em 1887 a sua biografia, que constitui o volume XII dos Anais da Biblioteca Nacional. Ao comparar a administração deste com as anterio- res, Ramiz Galvão (1889, p.122), afirma que aqueles se li- mitavam às atividades de expediente, " ... ao mandar copiar 46 alguns velhos catálogos ou a Jazer novos índices incompletos, summarios e incorrectissimos". Entretanto, Camillo de Monserrate teve como primeira preocupação requerer do governo um novo prédio para comportar adequadamente o acervo sempre crescente, na medida em que o antigo, da Ordem Terceira do Carmo, não atendida mais às necessi- dades. Desta forma, consegue a transferência da Bibliote- ca para um prédio no Largo da Lapa, dedicando-se em se- guida à organização dos velhos catálogos que, para osbi- bliotecários, eram " ... o primeiro dever do officio, e nem se pode conceber bibliotheca, sem essa fonte de luz e sem esse fio directo, que o publico reclama com razão"(Galvão, 1889, p.121). Contudo, o grande problema enfrentado por este diretor era a falta de pessoal qualificado e em quantidade su- ficiente para desenvolver todas as atividades requeridas e que COITespondessem aos seus planos de organização: "A verdade é que salvas as poucas excepções, eram todos destituídos de habilitações clássicas, e alguns d 'elles verdadeiros illetrados, que só por ironia da sorte se achavam empregados em tractar de livros. Os poucos hábeis e talvez competentes para trabalhos de certa ordem nada se demoravam na Bibliotheca, ou viviam no gôzo de quasi constantes licenças, e pro- curavam a todo custo empregos bem remunerados em outras reparti- ções, porque os da Bibliotheca não davam nem para garantir modesta subsistência" (Galvão, 1889, p.121). Este problema parece ter sido comum na Biblioteca Nacional. No relatório de 15 de janeiro de 1898, referente ao ano anterior, o então diretor, João Alexandre Teixeira de Mello, afirma que problemas com o pessoal comprometeram o desenvolvimento de várias atividades, pois muitos eram faltosos e licenciados por motivos de doença (Biblioteca Na- cional, 1898, p.287). No relatório de 1900, do mesmo diretor, 47 esta questão reaparece, acrescida de mortes e moléstias (Bi- blioteca Nacional, 1900, p.245). Manuel Peregrino da Silva, ao se reportar, no relatório de 1907, à carência de pessoal, con- fere ao problema o caráter de centro do desprestígio da bibli- oteca frente ao público (Biblioteca Nacional, 1907, p.293). Com a morte de Camilo de Monserrate, assume a direção da biblioteca Benjamin Franklin Ramiz Galvão, imprimindo novas formas organizacionais adquiridas em viagem que rea- lizou à Europa5, por incumbência do governo brasileiro. Dentre as várias mudanças, destacamos o estabelecimen- to de um regulamento, em 1879, no qual divide a biblioteca em três seções: impressos, cartas geográficas, manuscritos e estampas. O horário de atendiménto ao público é ampliado das 9 às 11 e das 18 às 21 horas e modificado o quadro de pessoal, que passou a ser composto de um bibliotecário, três chefes de seção, três oficiais, um secretário, oito auxiliares, um guarda e um porteiro. Uma grande marca de sua administração foi a realiza- ção de concursos públicos para preenchimento de cargos, em especial de bibliotecários. Tais concursos requeriam conheci- mentos de História Universal, Geografia, Filosofia, Bibliogra- fia, Iconografia, Literatura, Catalogação de Manuscritos e tra- duções do Latim, Francês e Inglês, sendo aprovado, no pri- meiro concurso para bibliotecário, o historiador João Capistrano de Abreu (Fonseca, 1957, p.94). Dias (1955, p.6), considera este concurso o marco inicial da formação profissi- onal em Biblioteconomia no Brasil. • 5 Esta viagem resultou na obra em forma de relatório Bibliotecas Públicas na Europa (1875), onde descreve a organização das mesmas e como havia de serem adotados no Brasil esses procedimentos. 48 Além de CaJf>is- trano de Abreu, obteve o primeiro gar, concorreram vaga de oficial: '-'"'u"1- rel Misael Pe Pena, Alexandre dido da Mota e ru•cv- Morais, sendo a ca examinadora mada pelos chefes da seções do BN: João Saldanha da Gama, Alexandre Teixeira de Melo e José Zeferino de Menezes Brum, como presidente Ramiz Galvão, e secretário Alfredo do Vale Cabral. Os pontos das provas foram: Os Grandes Navegadores do século XV e seus Descobrimentos, em História Universal; Produtos naturais, indús- tria, comércio e navegação no Brasil, em Geografia; Os épicos por- tugueses e Moral individual e religiosa, em Literatura e Filosofia, respectivamente. Cada prova disser- tativa, durava em tor- no de 4 horas. No dia seguinte, 2 de julho de 1879, foram reali- zadas as provas de Línguas, Bibliografia, Iconografia e Classifi- cação de Manuscri- tos. Nos anos poste- riores, realizaram-se 49 ----------·-- outros concursos, cujas disciplinas eram as mesmas. "Pela [sua] enumeração [ ... ] é fácil avaliar o grau de cultura humanística exigido aos candidatos às vagas ocorridas nos qua- dros da Biblioteca Nacional" (Dias, 1954, p.4). Este conteúdo demonstra-nos que Ramiz Galvão concebia que o bibliote- cário deveria ser ao mesmo tempo um erudito e um técni- co. Interessa destacar que estes concursos seguiam os mo- delos da École de Chartes de Paris, que foi a primeira esco- la criada no mundo para formação de pessoal para as bi- bliotecas. Cabe ressaltar que o termo bibliotecário passou a ser utilizado, na Biblioteca Nacional, a partir de 1824, quando da aprovação do segundo dispos·itivo legal- Artigos Regula- mentares para o Regimento da Bibliotheca Imperial e Pública - elaborado pelo frei Antonio de Arróbida. Nesse documen- to, após a Independência do Brasil, troca-se a denomina- ção Biblioteca Real por Biblioteca Imperial e o administra- dor geral, até então chamado Prefeito ou Zelador, passou a chamar-se Bibliotecário. Segundo Carvalho (1994, p.47), o que houve foram apenas mudanças de nomes, mas as atribuições perma- neceram as mesmas com preocupação acentuada na am- pliação do acervo em detrimento de sua organização e conservação. Com a Proclamação da República, a única modificação digna de nota foi a mudança do nome de Bibliotecário para diretor e de Biblioteca Imperial para Biblioteca Nacional. Em 1897, assume a direção o Dr. Manoel Cícero Pere- grino da Silva, que marcaria uma nova fase na biblioteca e para o campo da Biblioteconomia no Brasil. Na adminis- tração de Peregrino da Silva é estabelecido um novo regu- 50 lamento para a Bi- blioteca Nacional, aprovado pelo De- creto 8.835 de 11 de junho de 1911 (Bra- sil, 1911, p.243). O primeiro capítulo trata da estruturação da BN, ficando a mesma dividida em quatro seções: a)Impressos - Seção que abrangia livros, folhetos, pu- blicações periódicas, músicas impressas e impressos avulso; b)Manuscritos -Abrangia manuscritos, obras de paleografia e diplomática; c) Estampas- Seção onde estavam armazenados de- senhos, chapas gravadas, fotografias, cartas e coleções ge- ográficas, planos e obras de iconografia; d)Moedas e Medalhas- abrangia cédulas, vales, con- decorações, títulos representativos de valor, distintivos, jetons e obras de numismática, sigilografia e filatelia. As primeiras seções eram dirigidas por bibliotecários e a última por um sub-bibliotecário diretor. Os sub-bibliotecári- os não-diretores tinham como atribuição executar os serviços solicitados pelos bibliotecários, além de fiscalizar os trabalhos dos demais empregados, distribuindo, conservando e colo- cando os objetos da seção e substituindo os bibliotecários quando impedidos por motivos de férias e licenças. 51 r i ------------:;_----------------- ------------------------------, No artigo 10, do referido decreto, que descreve as atri- buições do sub-bibliotecário, observamos que não há dife- renças significativas entre as sua funções e do bibliotecário a não ser que não poderia participar das decisões do Con- selho Consultivo, quando o mesmo deliberasse sobre pre- enchimento de cargos de bibliotecário. A partir deste regulamento, o quadro de pessoal ficou distribuído entre os não nomeados e os nomeados, sendo este formado pelo: diretor geral, 3 bibliotecários diretores de seção, 5 sub-bibliotecários, um dos quais será o diretor da 4. ª seção, 5 oficiais, 14 amanuenses, 16 auxiliares, I porteiro, 2 ajudantes de porteiro, 1 mecânico-eletricista, 1 inspetor téc- nico das oficinas gráficas e de enéadernação. Os não nomea- dos eram constituídos por: 12 guardas; 28 serventes; 4 aju- dantes de mecânico-eletricista;4 ascensoristas; pessoal das oficinas gráficas e de encadernação. Os artigos 34 a 45 e o artigo 137 deste decreto são da maior relevância para o estudo da Biblioteconomia brasi- leira, sendo que o segundo trata dos Serviços de Permutas Internacionais de Bibliografia e Documentação, e os primeiros, do Curso de Biblioteconomia. A criação do serviço de Bi- bliografia demonstra o quão eram avançadas as idéias de Peregrino da Silva: " ... a organização, segundo o systema de clas- sificação decimal e por meio de fichas, do repertório bibliographico brazileiro como contribuição para o repertório bibliographico uni- versal, de modo a comprehender as obras de autores nacionais ou estrangeiros impresso ou editados no paiz, as de autores nacionaes impressas no estrangeiro ou inéditas e as de autores estrangeiros que se occuparam especialmente do Brazil, incluídos os artigos insertos em publicações e os escriptos de qualquer natereza" (Bra- sil, 1911, p.352). 52 A trajetória do Ensino de Biblioteconomia no Brasil: o caso da Bi- blioteca Nacional O Curso de Biblioteconomia, criado na BN6, tinha como objetivo sanar as dificuldades existentes na bibliote- ca, há gerações, quanto à qualificação de pessoal. Daí a cons- tituição de quatro disciplinas, que se desdobravam em cinco matérias: • Administração de Bibliotecas • Cartografia • Sigilografia • Catalogação • Filatelia Por diversos motivos, o curso criado em 1911 somente iniciaria suas atividades em 1915, "fato que teve grande reper- cussão nos meios educacionais do Distrito Federal" (Dias, 1955, p.4). Em 1912, o curso da Biblioteca Nacional não pôde funcionar por desistência dos inscritos, na maioria funcioná- rios da própria instituição. Provavelmente, com as mudanças realizadas pelo novo regulamento, o processo de adaptação dos empregados reduziu a disponibilidade de tempo para eles participarem de uma outra atividade, no caso o recém-criado curso. Ainda, pela transferência do diretor da primeira seção, impressos, para a segunda, manuscritos, uma vez que o mes- mo " ... não se julgou devidamente preparado para a inauguração immediata do curso, encargo que só poderia tomar para si no anno 6 Vários autores, alguns citados neste trabalho, que tratam da História da Biblioteconomia afirmam que este foi o primeiro Curso criado na América Latina; no entanto, no docuM menta Análises de los Informes sobre el Estado Actual de la Profesión Bibliotecaria, constamos queo primeiro Curso foi fundado em Buenos Aires, pelo Conselho de Mulheres da Argentina, em 1903, sendo o segundo o do Brasl!, Biblioteca Nacional. 53 seguinte, e o director da seção de impressos, por ocupar o cargo interi- namente, declarou que não fizera os estudos necessários para assumir as responsabilidades da aula de bibliographia" (Biblioteca Nacio- nal, 1939, p.439). Peregrino da Silva, justifica que a falta de professores poderia ser um problema facilmente soluciona- do com a contratação de substitutos, se os funcionários, na- quele ano, não tivessem desistido das inscrições. Ao se reportar ao Curso de Biblioteconomia, no relató- rio de 1915, referente a 1914, Peregrino daSilvaafirmaque o mesmo não havia funcionado por falta de candidatos: "É para sentir que não tenha sido possível até agora colher os resultados benéfi- cos que do funcionamento do curso se devem esperar não só em relação ao estabelecimento, em cujo proveito reiultarão os conhecimentos técni- cos que foram ministrados aos que nelle trabalharam ou pretendem ser admitidos, como também em relação a estes, pois o certificado de approvação nas matérias do curso constituirá uma razão de preferên- cia para as nomeações, uma circumstância digna de nota nas promo- ções e uma condição indispensável para a elevação ao cargo de bibliothecario devendo valer além d 'isto por um título de recomenda- ção para os que se propuzerem exercer funções nas demais bibliothecas dopaiz" (Biblioteca Naciona1,)915, p.684-685). Em 1915, abertas as inscrições de 15 a 31 de março, vin- te e um cadidatos foram aceitos por atenderem às condições determinadas pelo regulamento de 1910, no seu Art. 36, as quais constavam de exame de admissão, que se compunha de prova escrita de português e provas orais de Geografia, Li- teratura, História Universal e de Línguas: francês, inglês e la- tim. Contudo, estavam dispensados os candidatos admitidos anteriormente em escolas superiores ou aqueles aprovados para a carreira de bibliotecário. Vê-se, portanto, que não há diferença entre os critérios de ingresso adotados por este dis- 54 positivo para o curso e os exigidos no concurso para bibliote- cário, instituído por Ramiz Galvão, no qual foi aprovado Capristano de Abreu. Em resumo, era condição, para ser bi- bliotecário, possuir cultura geral o que incluía, além de co- nhecimento da língua materna, demonstrado em prova es- crita, saberes universais nos diversos campos, aliados aos do- mínios dos idiomas falados nas Artes, Ciências e Letras. Esta primeira turma, composta inicialmente de vinte e um alunos, é acrescida de mais seis por determinação do então Ministro da Justiça e Negócios Interiores, Dr. Carlos Maximiliano Pereira dos Santos. Não fica evidenciado, no relatório de 1916, se estes últimos atendiam aos critérios exigidos para ingresso no curso, podendo tal dado configurar o fisologismo no ensi- no da Biblioteconomia Brasileira no seu início. As aulas se iniciaram em 12 de abril, mas dois dias antes Dr. Constantino Antonio Alves, diretor da seção de Bibliogra- fia da BN, proferiu a aula inaugural que evidenciava A Funcção do Bibliothecario. Esse diretor seria responsável pela disciplina que tinha o mesmo nome da seção que coordenava. As de- mais disciplinas, Paleografia e Diplomática, seriam ministra- das por José Carlos de Carvalho; Aurélio Lopes de Souza fica- ria com a cadeira de Iconografia e João Gomes do Rego, com a Numismática. Estas disciplinas eram subdivididas em uma parte teóri- ca e outra prática, com duração de uma hora/ aula por sema- na para cada uma delas, podendo ser ampliada, na medida em que houvesse necessidade de aprofundar as práticas: ''De Bibliographia foram dados os 30 pontos do programma, com a parte practica, em 31 lições; de paleografia e diplomática também 30, com 0 esgotamento do programa e nas mesmas condições, em 47 aulas; de iconografia os 29 nelle inscriptos, em 32 aulas, incluída igualmente a 55 practica da matéria; de numismática, finalmente, houve 31 aulas, em que se leram os 24 pontos do programa com a parte practica" (Biblioteca Nacional, 1916, p.366). Os programas destas disciplinas eram bastante extensos e abrangiam diversos conteúdos. A disciplina Bibliografia, que compunha o currículo dos anos 40, por exemplo, constava de: "1 )Bibliografia. Noções preliminares; 2) Tipografia. Composição e im- pressão; 3) O livro. Ornamentação. flustração. Ex-Libris. Formato; 4) Encadernação; 5) O papel. História e fabricação; 6) Conservação e res- tauração de Livros; 7) Invenção da imprensa. Transição do livro ma- nuscrito para o impresso. Primeiros impressores; 8) Características do livro antigo e moderno. Incunábulos e cimélios. Livros raros e preciosos. Falsificação bibliográfica; 9) O jornal. A revista. O folheto. Publicações periódicas; 10) Classificações. Sistemas principais; 11) Classificações decimal, suas codificações; 12) Catalogação. Arrumação dos livros e preparo para a catalogação. O bilhete sistemático. A ficha; 13) O catálo- go. Fontes de informação. Repertórios; 14) A imprensa no Brasil. Livros e jornais. Impressores e editores. Bibliografia Nacional. Fontes de Infor- mação; 15) Bibliotecas; História. Construção. Iluminação. Mobiliário; 16) A Biblioteca Nacional do Rio de janeiro. Fundação e fases do seu desenvolvimento. Bibliotecas no Brasil; 17) Organização e Administra-
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