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CASTRO, C. História da Biblioteconomia brasileira

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Prévia do material em texto

--------.~-~-~----------- ----·-----~---------------------'"~~ 
César Castro 
HISTÓRIA DA 
BIBLIOTECONOMIA 
BRASILEIRA 
Copyright © 2000 by - César Castro 
Foto da capa: Concludentes do Curso de Biblioteconomia da Escola Livre 
de Sociologia e Política- 1945 (No centro, Prof. Adelpha 
de Figueiredo) 
Foto: Arquivo particular da Bibliotecária Laura Russo 
Revisão: Autor 
Editoração eletrônica e capa: fesiel Sales Pontes 
ISBN: 85-7062-239-2 
C351Ú Castro, César 
História da biblioteconomia brasileira/ 
César Castro.- Brasília: Thesaurus, 2000. 
I. Biblioteconomia, Brasil I. Título 
CDU 02 (091) (81) 
CDD02 
Todos os direitos em língua portuguesa no Brasil, reservados de acordo com a lei. Nenhuma 
parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida de qualquer forma ou por <Iualquer 
meio, incluindo fotocópia, gravação ou informação computadorízada, sem permissão por 
escrito do autor. THESAURUS EDITORA. DE BRASÍLIA LTDA. SIG Quadra 08 
Lote 2356 CEP 70610-400- Brasília-DF-Brasil. - TeL (61) 344-3738 - Fax, (61) 344-
2353. 
Composto e impresso no Brasil 
Printed in Brarji 
AGRADECIMENTOS 
Elaborar um trabalho desta natureza exige esforço e contribuição 
de inúmeras pessoas que, direta e indiretamente, escreveram comigo 
este texto. 
Agradeço aos professores Edson Nery da Fonseca, Laura Russo, 
Maria Antônia Pinke Belfort de Mattos, Esmeralda Aragão, Maria 
Helena de Toledo Barros, pelas sugestões, criticas e empréstimo de 
documentos. 
Aos companheiros de jornada cotidiana que fazem o Curso de 
Biblioteconomia da UFMA. 
Agradeço, em especial, à Prof'. Dta. Denice Catani, minha 
orientadora, que acreditou sempre neste trabalho e aos professores 
doutores Ezequiel Teodoro da Silva, Elze Benetti V álio, Marta Carvalho 
e Hagar Espanha pela sugestão de transformar a tese em livro. 
Aos amigos: Doris Godoi, Sarnuel Velázquez, Solange Ribeiro, 
Rildecy Medeiros, Nelson Nunes e Aldinar Bottentuit pelo apoio 
constante. 
Às bibliotecárias Tuca, Rita, Sônia, Lina e Rosa pela recuperação 
dos difíceis documentos raros. 
Dedico esta obra a Janethe Castro, minha irmã, por tudo. 
Dedico este livro a Nelly Cassaro (in memoriam) em 
agradecimento a nossa amizade, que é eterna. 
Dedico este livro, ainda, às três mulheres da minha vida: Luzia, 
Teresa e Violeta. 
A todos os bibliotecários e bibliotecárias que fizeram e fazem a 
História da Biblioteconomia brasileira, em especial, a: 
Adelpha de Figueiredo, Laura Russo, Rubens Borba de Moraes, 
Lydia Sambaquy, Bemadette Sinay Neves, Edson Nery da Fonseca, 
Esmeralda Aragão, EtelvinaLima, Cordelia Robalino, Miriam Gusmão, 
Abner Vicentini, Zila Mamede, Antônio Miranda, Luzimar Silva 
Ferreira e tantos outros. 
SUMÁRIO 
PREFÁCIO .................................................................................... 11 
CAPITULO 1 
OS LIMITES DO NOSSO OLHAR ............................................. 17 
As dimensões educativas da Biblioteconomia no Brasil .... 21 
As fontes e os discursos ......................................................... 31 
CAPÍTULO 2 
_, 
O MOVIMENTO FUNDADOR DAS DIMENSÕES DUCA-
TIVAS DA BIBLIOTECONOMIA DO BRASIL ................... 43 
A trajetória do Ensino de Biblioteconomia no Brasil: 
o caso da Biblioteca Nacional .............................................. 53 
A trajetória do Ensino de Biblioteconomia no Brasil: 
o caso paulista ....................................................................... 62 
A trajetória do Ensino de Biblioteconomia: anos 40 ......... 78 
Cursos da Biblioteca Nacional: a reforma de 1962 ........... 97 
A trajetória escolar entre Rio de janeiro e São Paulo .... 101 
O Curso de Biblioteconomia da Praça da República ...... 106 
A expansão do Ensino de Biblioteconomia pelo Brasil .. 109 
CAPÍTULO 3 
BIBLIOTECÁRIO: DO GENERALISTA AO SERVO DA 
CIÊNCIA ............................................................................... 115 
Bibliotecário: "profissional ideal" a serviço da ciência .... 116 
Bibliotecário: "SERVUS SERVORUM SCIENTAE" ........ 135 
Bibliotecários em busca de identidade ................................... 142 
CAPÍTULO 4 
E O VERBO SE FEZ LEI: REGULAMENTAÇÃO DA 
PROFISSÃO BIBLIOTECÁRIA .......................................... 151 
A trajetória para concretização do verbo ......................... 154 
E o verbo fez-se lei .............................................................. 165 
A FEBAB e o verbo ............................................................. 1 78 
A burocratização do verbo ................................................. 185 
"Deontologia e ética profissional" do bibliotecário ......... 189 
~'Í< 
CAPÍTULO 
CAMINHOS E DESCAMINHOS DO ENSINO DE BIBLIO-
TECONOMIA: ANOS 50 E 60 ............................................ 197 
Bibliotecário: técnico ou humanista? ................................ 199 
A uniformidade dos saberes biblioteconômicos ······-······ 203 
Padronização do ensino e dos saberes biblioteconômicos ... 215 
Bibliotecários: em busca da especialização ....................... 241 
A trajetória do IBBD: fragmentos ..................................... 242 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................... 265 
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ...................................... : ....... 271 
PREl:<~CIO 
A presente obra de César Augusto Castro é definitiva 
tanto por reunir dados e informações (para muitos de nós, 
até então, nebulosos e fragmentados) sobre a evolução da 
Biblioteconomia no Brasil quanto por expor testemunhos e 
análises originais. Sem pretender ser exaustivo, tece a trajetória 
de nossa profissão segundo postulados científicos válidos. 
Uma profissão requer um conjunto de elementos míni-
mos para consolidar-se: 
•um espaço na sociedade para desenvolver as suas 
atividades e exercer a sua função social. 
A obra de Castro é a revelação da busca de nossa ideo-
logia profissional através das propostas e experiências de nos-
sos pioneiros (cariocas e paulistas, como também os das de-
mais regiões brasileiras, sem esquecer as contribuições dos 
estrangeiros no processo). 
As diversas fases, no espaço e no tempo, com as mu-
danças de "missão" e de paradigmas expressam o afinamento 
11 
constantes com as transformações tecnológicas e com os no-
vos valores de cada época. 
•um programa de pesquisa para ampliar os horizon-
tes teóricos e técnicos que garantam o aperfeiçoa-
mento profissional contínuo. 
Embora a questão ·da pesquisa só comece a 
institucionalizar-se a partir do advento dos programas de 
pós-graduação, o presente livro revela o esforço de nos-
sas lideranças pela discussão dos grandes temas teóricos 
e pela experimentação de modelos, técnicas e processos, 
muitos deles importados, ma~;adaptados ãs condições 
nacionais. Prova disso, o IBBD impôs-se à sociedade bra-
sileira de seu tempo justamente por estar sempre na van-
guarda e pelos conhecimentos que desenvolveu 
institucionalmente. Em certa medida, antecipou-se ã pró-
pria época, exercendo os postulados de Peter Senge (das 
"organizações que aprendem") ao constituir-se numa equi-
pe de especialistas geradora de saberes e metodologias de 
amplo reconhecimento. 
•uma literatura própria, orientadora de sua base teó-
rica e prática. 
Outra vez, a obra de Castro é reveladora do crescimen-
to de nossa literatura especializada, não só pela vastidão das 
fontes consultadas mas, também, pelo historiai do surgimento 
de nossas revistas especializadas e dos congressos e seminári-
os que incentivaram a referida produção técnico-científico. 
Sem esquecer a proliferação de dissertações, teses e livros dos 
anos mais recentes. 
12 
---- --·---- ·-····· 
•um sistema de ensino capaz de transmitir os conheci-
mentos necessários ao exercício profissional, em di-
ferentes níveis de capacitação.Aqui é onde o trabalho de Castro é mais elucidativo, ao 
recriar todo o processo de criação de nossos cursos de 
Biblioteconomia, seus programas e conteúdos, suas filosofias 
e orientações pedagógicas. Embora já tivéssemos anteceden-
tes notáveis de esforço no levantamento do ensino profissio-
nal - como os textos de Nice Figueiredo e Suzana Mueller, 
arrolados na bibliografia- as citações e comentários aqui in-
cluídos ampliam o nosso conhecimento sobre o fenômeno 
em questão. 
•uma legislação que garanta os direitos dos usuários 
e preserve as conquistas dos profissionais da área. 
A questão está devidamente registrada, em suas 
postulações legalistas, culminando na promulgação da lei de 
exercício profissional e na criação de nossos conselhos fede-
ral e estaduais, a exemplo de outras carreiras universitárias. 
Mais recentemente com a conquista de um código de ética 
que, em princípio, também incorpora os deveres profissio-
nais e os interesses dos usuários. Mas, também deixa perce-
ber que a questão social está ainda mais em nível retórico, 
com a classe bibliotecária pouco participativa nas lutas pela 
democracia nos períodos ditatoriais. Na pauta de nosso 
corporativismo aparecem mais as questões técnicas, as admi-
nistrativas, as legais, e raramente, o engajamento com os gran-
des movimentos sociais que lutaram pela universalização do 
ensino, contra a censura à imprensa e às artes em geral, pela 
defesa da cultura nacional e outras bandeiras que, todos nós 
13 
sabemos, afetam o nosso desempenho e comprometem os 
nosso objetivos profissionais. Sem deixar de reconhecer que, 
como indivíduos, muitos de nossos líderes foram combativos 
e esclarecidos, o fato é que o livro de Castro passa ao longo 
destas problemáticas. · 
E é sintomático reconhecer que a profissão do biblio-
tecário foi um dos espaços mais concretos para a ocupação 
das mulheres, em seu processo emancipatório, ao ponto de 
que, ainda hoje, algumas pessoas pensem ser uma profissão 
feminina. E as mulheres foram decisivas na evolução da 
profissão, a julgar pelas grandes lideranças femininas (ape-
sar de sempre termos contado com extraordinárias lideran-
ças masculinas como Rubens Borba de Moraes Antonio . , 
Caetano Dias e Edson Nery da FÓnseca, dentre outros). A 
própria história do IBBD é um espelho disso. Na fase 
evolucionária (nos 20 primeiros anos, a partir de sua funda-
ção em 1954), tivemos o concurso do talento de mulheres 
extraordinárias como Lydia de Queiroz Sambaquy, Célia 
Ribeiro Zaher e Hagar Espanha Gomes. Com a transfor-
mação em IBICT, em meados da década de 70, sucederam-
se os administradores do sexo masculino, recrutados dentre 
cientistas e assessores de outras áreas, sem maiores 
exponencialidades (exceção para Afrânio Aguiar, que tinha 
pós-graduação em Ciência da Informação). Depois tive-
mos uma terceira fase, que chega aos nossos dias, em que 
homens e mulheres, de reconhecida capacitação profissio-
nal na área, vem alternando-se no poder. 
As transformações do IBBD- que partiu da proposta de 
montar o controle bibliográfico nacional em C&T e de de-
senvolver a massa crítica e a infra-estrutura para facilitar a 
pesquisa, o ensino e a administração superior no Brasil-, pas-
sando pela fase do IBICT- que partiu para a montagem e a 
coordenação de sistemas e serviços de informação especializa-
14 
da no nosso país, é o reflexo da evolução da Biblioteconomia 
e da Ciência da Informação no Brasil e no Mundo. 
Por certo, foram as mentes mais iluminadas do "velho" 
(e tão vanguardista) IBBD que "importou" e introduziu a Ci-
ência da Informação no Brasil, e sem entrar em disputas 
bizantinas praticadas em outras latitudes. E deu início aos 
nossos cursos de pós-graduação, às revistas científicas da área, 
à operacionalização dos serviços cooperativos e descentrali-
zados, à visão interdisciplinar e sistêmica de que todos somos 
hoje beneficiários. 
Hoje o IBICT está outra vez em crise, não por culpa de 
seus dirigentes, mais pelas inquietações provocadas pelo ad-
vento massivo das novas tecnologias e pela globalização pró-
pria da indústria da informação transnacionalizada dos dias 
que vivemos. 
E estão em crise a Biblioteconomia e a Ciência da Infor-
mação, como um todo, por causa do impacto da telemática 
em nossos processos, como acontece em outras profissões. 
Os cursos de pós-graduação, quase todos, mudaram sua de-
nominação de Biblioteconomia para Ciência da Informação 
(seguindo o movimento criado pelo próprio IBBD), com a 
incorporação da C.I. nos currículos profissionais, com forte e 
crescente ênfase nos processos informatizados. Ao mesmo 
tempo em que se pretende abrir novos cursos, com novas e 
ousadas denominações, como já vem acontecendo. 
O IBICT certamente acabará assumindo de direito, por-
quanto já preparando-se e assumindo de fato, a liderança na 
instalação de nossa "Sociedade da Informação" ou do conhe-
cimento, como querem outros. 
E é bom verificar que, ao lado da proposta estruturante 
projetada pelos especialistas do Ministério da Ciência e 
Tecnologia (Carlos José Pereira de Lucena, Ivan Moura Cam-
pos e Silvio Lemos Meira), que refletem as tendências inter-
15 
nacionais do setor, que prioriza e privilegia os segmentos so-
ciais e produtivos nacionais, esta também é a reflexão de Anna 
da Soledade Vieira alertando para o fato de que não basta o 
canal da RNP ou da Internet II, que é preciso fortalecer e 
desenvolver os nossos conteúdos substantivos, direcionados 
para serviços mais contextualizados, mais eficientes e 
transcedentes. 
É fantástico, pois, perceber no livro de César Augusto 
Castro as sementes e a germinação de todo esse processo 
institucionalizante. 
O relato histórico interpretativo ganha força e relevo 
pela voz dos protagonistas, sem jamais perder-se em detalhes 
ou em maçantes descrições*. 
O texto flui com leveza decque nos exige Ítalo Calvino, 
sem perder outras condições essenciais como sejam a consis-
tência, a multiplicidade, a exatidão e a visibilidade. E, apesar 
da extensão da obra, a rapidez implícita na exposição dos fa-
tos e das conclusões. Apoiado em micro-biografias ilustrativas 
(em janelas autõnomas como no hiper-texto), em citações 
sempre oportunas e apropriadas, e em gráficos e quadros que 
sintetizam ou explicitam as visões e versões do fenõmeno. A 
História da Biblioteconomia Brasileira, à la Brecht, que per-
mite maior objetividade mas sem renunciar à emoção e à 
sutileza. 
Uma obra fundamental para entender o que somos e 
para prognosticar o nosso próprio destino. 
Antônio Miranda 
Universidade de Brasília 
Agosto /99 
"Não foi possível incluir, no volume presente, os Anexos da tese original que são vitais 
para quem desejar aprofundar-se no estudo 
16 
CAPITULO 1 
OS LIMITES DO NOSSO OLHAR 
O desenvolver de um trabalho de pesquisa, seja ele de 
qualquer natureza, não se dá no vazio, mas é atividade que 
parte, sem dúvida, de inquietações pessoais oriundas da nos-
sa vivência- caráter-prático da constituição do saber- e das leituras 
realizadas, individual ou coletivamente- caráter teórico da cons-
tituição do sáber. Essa inter-relação teoria-prática propicia cons-
tantes revisões que nos impulsionam a caminhar. Nessa ca-
minhada, encontramos espaços de sombras e luzes e, algu-
mas vezes, a trajetória se realiza na penumbra, no isolamen-
to, nas angústias do desvelar conhecimentos fragmentados 
que parecem um jogo, onde as regras do trabalho científico 
estabelecem a melhor forma de atuarmos diante das dificul-
dades, dos impasses, das dúvidas. Enfim, pesquisar é um jogo 
que envolve palavras, frases, nomes, buscas e caminhos, exi-
gindo um saber sobre o jogar e o entendimento das regras 
17 
que determinam a forma de atuar para atingirmos os objetivos 
propostos. As questões que surgem da relação teoria-prática 
(vice-versa)impulsionaram-me a escrever este livro sobre a 
História da Biblioteconomia no Brasil nos anos 50 aos 60, em 
especial, quanto ao seus aspectos educacionais. Livro este que 
é resultante da tese que defendemos, em 1998, na Faculdade 
de Educação da Universidade de São Paulo. 
Para tecer este texto, nos apropriamos de alguns traba-
lhos que evidenciam a educação bibliotecária no Brasil: 
Mueller (1982), Souza, F. (1995), Caberlon (1995), 
Figueiredo(1995), Dias (1964), Russo (1966), Fonseca (1957), 
Souza, S. (1987) e outros publicados em artigos de periódicos 
ou anais dos Congressos Brasil§,iros de Biblioteconomia e 
Documentação- CBBD. Todavia, sabíamos que: " ... o estudo do 
ensino de Biblioteconomia no país carrega uma certa dificuldade, 
notadamente em função da escassa literatura[. .. ]. E os existentes não 
contemplam os aspectos econômicos-históricos-sociais, privilegiando a 
cronologia dos fatos em detrimento da análise do conteúdo"( Souza, 
F., 1992, p.123). 
Nesta pesquisa, retomamos alguns destes trabalhos com 
a finalidade de verificar quais os aspectos tratados, 
metodologias e bibliografias utilizadas e, principalmente, para 
analisar as similaridades e diferenças históricas apresentadas. 
Portanto, estes estudos contribuíram para demarcarmos os 
limites do nosso olhar. 
Dois aspectos diferenciam esta pesquisa das demais: pri-
meiro, por sustentar-se na Imprensa Periódica da área. Enten-
demos os materiais da Imprensa Periódica como veículos de 
comunicação de um dado campo de saber e como mecanis-
mos de divulgação de suas atividades, possibilitando ao pesqui-
sador compreender sua trajetória, suas idéias dominantes, em 
determinado período, suas principais lideranças. Enfim, con-
18 
uibuindo sobremaneira para a (re) construção histórica de um 
dado campo, dentre outros aspectos possíveis, fuce à riqueza 
de contribuições discursivas advindas deste tipo de material. 
O segundo aspecto, por confrontar o texto-documento 
com o depoimento de personagens que contribuíram nos 
diversos momentos, e sob diversas formas, para a constitui-
ção do Campo de Biblioteconomia no Brasil. 
Em sendo assim, três questões nortearam esta investi-
gaçao: 
a) de que modo se constituíram os discursos explicitados 
na Imprensa Periódica, nos anos 50 e 60, em torno das di-
mensões do ensino de Biblioteconomia no Brasil?; 
b) quais as principais determinações sobre a profissão e 
o profissional bibliotecário nos anos 50 e 60?; 
c) quais os marcos históricos anteriores aos anos 50 e 60 
relativos ao ensino de Biblioteconomia no Brasil? 
Para respondê-las, elegemos como objetivo geral desta 
pesquisa: 
Compreender como se processaram os discursos em 
torno do ensino de Biblioteconomia no Brasil nos anos 50 e 
60, contidos na Imprensa Periódica da área, em especial os 
boletins publicados pelo Instituto Brasileiro de Bibliografia e Do-
cumentação-IBBD e pela Federação Brasileira de Associações de Bi-
bliotecários-FEBAB. E como complementares a este: 
a) Analisar os movimentos fundadores do ensino da 
Biblioteconomia no Brasil. 
Neste item nos interessou analisar os principais fatos 
que contribuíram para a constituição do campo do ensi-
no, anteriores ao anos 50. A princípio analisamos a 
trajetória da Biblioteca Nacional (BN) e das primeiras bi-
bliotecas do Estado de São Paulo, para situarmos o lugar 
19 
onde foram instalados os movimentos fundadores do ensi-
no na área. No caso da Biblioteca Nacional, recorremos 
aos relatórios da época, que se encontram publicados nos 
Anais da Biblioteca Nacional. Para a construção do caso 
paulista nos apropriamos de Ellis (1997) e de artigos en-
contrados no Boletim Bibliográfico da Biblioteca Mário de 
Andrade e, ainda, daqueles publicados na imprensa perió-
dica paulista do período. Quanto ao ensino, tomamos os 
trabalhos de Rubens Borba de Moraes (1942, 1943), 
Adelpha de Figueiredo (1945), Dorothy Gropp (1940), que 
são os principais representantes da constituição do ensino 
de Biblioteconomia nesse Estado. 
b) Analisar os conteúdos privilegiados que assumiram 
status de verdade diante da categoria profissional bibliotecária. 
Em sendo diversificados os conteúdos encontrados na 
Imprensa Periódica Biblioteconômica, e até porque esta pes~ 
quisa centrou-se nas questões de natureza educacional, 
selecionamos as seguintes categorias de análise: 
20 
• bnsino de Biblioteconomia- Entende-se como o proces-
so formal de ensino: escolas/ cursos, currículo e disci-
plinas escolares; 
• Formação Profissional- Compreende as estratégias para 
capacitar/aperfeiçoar o bibliotecário e para regula-
mentar a profissão; 
• Práticas Profissionais- Compreende o modus operandi 
do bibliotecário, as técnicas inerentes ao campo, o 
comportamento e o compromisso social e educacio-
nal deste profissional. 
• Papel/Função do Bibliotecário- Constitui-se nos discur-
sos em torno da profissão e do profissional. 
c) Analisar as maneiras pelas quais a constituição do 
campo científico brasileiro, nos anos 50, contribuiu para a 
determinação de novos paradigmas no ensino de 
Biblioteconomia. 
A constituição do campo científico resultou na criação 
do Instituto Brasileiro de Bibliografia e Documentação - IBBD 
(atualmente Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e 
Tecrtologia), órgão que tinha a finalidade de controlar e disse-
minar informações/pesquisas produzidas pelos cientistas na-
cionais, assim como aquelas produzidas em outros países de 
interesse da ciência brasileira. A sua criação abriu um novo 
debate na área: os limites profissionais do bibliotecário e do 
documentalista. No ensino, foram incorporados conhecimen-
tos deste "novo saber", sendo que algumas escolas passaram 
a adotar o termo Documentação. De igual modo, os Congres-
sos da área passaram a denominar-se Congresso Brasileiro de 
Biblioteconomia e Documentação - CBBD. 
Ressaltamos que as concepções relativas ao campo como 
espaço de lutas, em tomo de objetos legítimos tal como explicita 
Pierre Bourdieu (1983) foram úteis para a análise da constitui-
ção e do desenvolvimento do espaço educacional da 
Biblioteconomia no Brasil. Do mesmo modo, algumas argu-
mentações de Roger Chartier (1988) foram necessárias para 
relativizarmos a interpretação das fontes documentais qualifi-
cando-as de acordo com as suas condições de produção. 
As dimensões educativas da Biblioteconomia no Brasil 
As dimensões educativas da Biblioteconomia brasileira 
podem ser compreendidas sob várias perspectivas, sendo as 
principais a profissional, a técnica e a que diz respeito aos 
métodos de influência (ensino humanista e ensino pragmá-
21 
r 
I 
tico). A perspectiva profissional engloba desde a formação 
até os estudos de mercado de trabalho. A técnica, as formas 
de controle, processamento e armazenamento da informa-
ção e, também, o uso das novas tecnologias e linguagens 
documentárias. Os modelos de influência evidenciam o cur-
rículo e a inserção política, social, cultural e educacional do 
bibliotecário. 
Fonseca ( 196?) divide a história do ensino de 
Biblioteconomia em três fases: 
Fase I: 1879-1929 
Fase II: 1929-1962 
Fase III: 1962-
Liderança da Biblioteca Na-
cional, de influência francesa; 
Transferência da influência 
francesa, humanista, para a in-
fluência americana, pragmática, 
que teve seu início em São Pau-
lo, no Mackenzie College; 
Uniformidade dos conteúdos 
pedagógicos com a instalação 
do currículo mínimo. 
Mueller (1985, p.3) acrescenta ã divisão de Fonseca mais 
duas fases, posto que o trabalho deste autor fora publicado 
no início dos anos 60: "Desde então podemos acrescentar mais duas 
fases - a década de 70 pelo fortalecimento e proliferação dos cursos, 
pelo crescente descontentamento em relação ao conteúdo do currículo 
mínimo, pela influência da tecnologia e pelo aparecimentodos cursos 
de pós-graduação; e o período atual, a partir de 1982, data de apro-
vação do novo currículo mínimo e que será caracterizada, portanto, 
pela reformulação dos programas de ensino". 
Souza, S. (1987), ao estudar as tendências da 
Biblioteconomia brasileira, divide a sua história em três fases: 
Fase I: 1911-1930 Tendência humanista; 
22 
Fase II: 1930-1970 
Fase III: 1970-1987 
Caracterizada como tecnicista 
americana; 
Caracterização nacional da ca-
tegoria bibliotecária e do seu 
despertar para a realidade na-
cional. 
Para Población (1992), o ensino de Biblioteconomia 
divide-se em quatro fases: 
Fase I: 1915-1928 
Fase II: 1929-1969 
Fase III: 1970-1985 
Fase IV: 1986-
Formação de influência euro-
péia; 
Mudança da direção da influ-
ência europe1a para o 
pragmatismo americano; 
Ufanismo nacionalista caracte-
rizado pelo crescimento quali-
tativo das escolas; 
Estabilização do crescimento 
quantitativo das escolas e iní-
cio do período de reflexão, 
objetivando a avaliação quali-
tativa do ensino ministrado em 
nível de graduação. 
Para esta autora, na fase II se inicia o crescimento quan-
titativo das escolas de Biblioteconomia, notadamente nos anos 
40, a partir da criação do Curso da Escola Livre de Sociologia e 
Política. De 1911 até os anos 40, foram criados quarenta e dois 
cursos, dos quais doze desapareceram nos anos postériores, 
totalizando trinta cursos que se encontram atualmente em 
funcionamento, abrangendo todas as regiões do paísi. 
1 O mais recente Curso de Biblioteconomia foi criado em 1995, na Universidade Federal 
do Rio Grande do Norte. 
23 
Tabela 1: Biblioteconomia no Brasü: 1911-1992: quatro fases do ensino ck gradua-
ção. (Población, 1992). 
1989 - ADEBD cria módulos de Estudos Curriculares: 
- Região Norte/Nordeste 8 escolas (26,66%) 
- Região C.O/Sudeste 8 escolas (26,66%) 
- Região Sul 6 escolas (20,02%) 
-São Paulo 8 escolas (26,66%) 
TOTAL 30 escolas 
Na Fase III da classificação de Población, que 
corresponde à primeira de Mueller, são criados os cursos 
de pós-graduação em Biblioteconomia em nível de 
Mestrado. O primeiro, instalado no Instituto Brasileiro de Bi-
bliografia e Documentação-IBBD2• O IBBD, desde a década de 
50, vinha realizando alguns cursos de aperfeiçoamento para 
bibliotecários, daí constituir-se em ambiente propício para 
2 Outros cursos de pós-graduação em nível de mestrado foram criados na década de 
70: 1972, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo; 1976, na 
Universidade Federal de Minas Gerais; 1977, na Pontifícia Universidade Católica de 
Campinas; 1978, na Universidade de Brasília e na Universidade Federal da Paraíba. A 
partir de 1992, são criados os cursos de doutorado: lBICT/UFRJ, UNS, ECA/USP. 
24 
este empreendimento: "O curso de mestrado em ciência da in-
formação teve seu início em 1970, refletindo a preocupação euro-
péia e americana com a formação de recursos humanos para lidar 
com a excessiva produção de informação cientifica e tecnológica 
surgida na ambiência do pós-guerra. Foi o início da conscientização, 
no Brasil, para a necessidade de organizar e controlar a informa-
ção como uma ferramenta para o próprio desenvolvimento da ci-
ência e tecnologia"(Barreto, 1995, p. 7). 
Caberlon, ao tratar dos marcos históricos da 
Biblioteconomia no Brasil, os divide em duas perspectivas: da 
profissão e do ensino. 
Tabela2: Marcos históricos da Biblioteconomia no Brasil (Carbelon, 1995, p.23) 
1961 
profissão regulando seu exerdcio; institui o 
Federal de Biblioteconomia (CFB); 
1965 Regulafl!entaçãa da lei 4084/62 pelo Decreto 1982 
n° 56725/65, ratificando a Biblioteconomia como 
Criação da Pós-Graduação em Biblinteconornia. 
Aprovação do segundo Currículo Mínimo de 
Graduação em Biblioteconomia. 
(cf. Resalução 08182 do CFE) (em 
25 
------------ ------- -- ---
Podemos afirmar que há relativa uniformidade nas divi-
sões da história do ensino da Biblioteconomia no Brasil. Fon-
seca toma como marco inicial a realização do primeiro con-
curso para bibliotecário realizado por Ramiz Galvão na Bibli-
oteca Nacional. Para este autor, Mueller e Caberlon evidenci-
am a aprovação dos currículos mínimos como delimitadores 
históricos. Población, mesmo não expondo textualmente, 
deixa subentendida esta questão. Souza, S. retoma os princí-
pios adotados pelos demais autores. Contudo, em um aspec-
to, estes autores são totalmente acordados: quanto aos mo-
delos de influência, humanista francês e técnico americano, 
como demarcadores do campo do ensino de Biblioteconomia. 
Mueller apresenta uma outra influência, a tecnológica, que 
aparece a partir dos anos 70. c> 
Com base nestes autores e pelas leituras realizadas, nes-
ta pesquisa, dividiremos a história do ensino de graduação 
em Biblioteconomia em cinco fases. 
FASE I: 1879-1928 
1879 
1911 
1915 
26 
Movimento fundador da 
Biblioteconomia no Brasil de 
influência humanista francesa, 
sob a liderança da Biblioteca 
Nacional; 
Realização do primeiro concur-
so para bibliotecário durante a 
gestão de Ramiz Galvão; 
Criação na Biblioteca Nacional 
do primeiro Curso de 
Biblioteconomia no Brasil, du-
rante a gestão de Manoel 
Cícero Peregrino da Silva; 
Início das atividades do Curso 
da Biblioteca Nacional; 
1923 
FASE II: 1929--1939 
1929 
1931 
1935 
1936 
1939 
FASE III 1940--1961 
1940 
Paralização do curso da BN, 
quando é estabelecido, no 
Museu Histórico Nacional, o 
Curso Technico com a finalidade 
de formar bibliotecários, 
paleógrafos, arquivistas e ar-
queólogos. 
Predomínio do modelo prag-
mático americano em relação 
ao modelo humanista francês; 
Criação do curso do Instituto 
Mackenzie, marca do início da 
influência técnica americana; 
Retomada do curso da Biblio-
teca Nacional; 
Encerramento do curso do 
Mackenzie; 
Criação do curso do Departa-
mento de Cultura da Prefeitu-
ra Municipal da São Paulo, por 
Rubens Borba de Moraes; 
Fechamento do curso do De-
partamento de Cultura da 
Prefeitura Municipal da São 
Paulo. 
Consolidação e expansão do 
modelo pragmático americano; 
Transferência do Curso da Pre-
feitura Municipal de São Paulo 
para a Escola Livre de Sociolo-
gia e Política- ELSP; 
27 
1942 
1944 
1954 
1958 
1961 
FASE IV 1962-1969 
1962 
28 
Início da expansão do campo do 
ensino pelo país, sendo criados 
cursos: Bahia (1942), Escola de 
Filosofia Sedes Sapientae (SP) 
(1944), Pontifícia Universidade 
Católica de Campinas (1945), 
Porto Alegre (1947), Departa-
mento de Documentação e Cul-
tura da Prefeitura Municipal do 
Recife (1947) enaEscolaNossa 
Senhora do Sion (SP) (1948); 
Reforma do curso da BN du-
rante a gestão de Rodolfo 
Garcia ( 1933-1945); 
Criação do Instituto Brasileiro de 
Bibliografia e Documentação-
IBBD; 
Definição da Biblioteconomia 
como profissão liberal e de ní-
vel superior; 
Criação da Federação Brasilei-
ra de Associações de Bibliote-
cários (FEBAB). 
Uniformização dos conteúdos 
pedagógicos e regulamentação 
da profissão; 
Promulgação da Lei 4084. 
Aprovação do primeiro currí-
culo mínimo de Biblioteco-
nomia; 
1963 
1965 
FASE V: 1970-1995 
Primeiro Código de Ética do Bi-
bliotecário; 
Criação do Conselho Federal 
de Biblioteconomia. 
Paralisação do crescimento 
quantitativo das escolas de gra-
duação e crescimento quantita-
tivo dos cursos de pós-graduação; 
busca da maturidade teórica da 
área a partir de novas aborda-
gens tomadas de empréstimo de 
outros campos de saber. 
Tabela 3: Fases e marcos históricos da Biblioteconomia brasileira consideradas neste 
Estudo. 
1': 1879-1928 Início da Constituição do Campo do Ensino da Biblioteconomia sob a influência 
francesa- Biblioteca Nacional 
2a: 1929-1939 Predomínio do modelo americano sob ainfluência dos primeiros cursos criados em 
São Paulo- Mackenzie College e Cursos de Biblioteconomia da Prefeitura Municipal de 
São Paulo. 
3': 1940-1961 Consolidação do modelo americano eexpansão do número de Escolas/Cursos 
4': 1962-1969 Estabelecimento do primeiro Currículo Mínimo e Regulamentaçãodaprofi~ão -lei 4084/62 
5': 1970-1995 Paralisação da criação dos Cursos de Graduação e crescimento dos Cursos de Pós-
Nesta pesquisa, centralizamos a análise histórica do en-
sino de Biblioteconomia nas terceira e quarta fases acima 
descritas, que correspondem ãs duas últimas fases eleitas por 
29 
Fonseca e à segunda de Poblacióu e Souza, S. A análise con-
templa ainda aspectos referidos por Caberlon, encerrando-
se a análise na primeira fase de Mueller. 
A escolha deste período, anos 50 e 60, deu-se pelo 
Ülto de considerarmos essas décadas como as de maior re-
levância para a constituição do campo da Biblioteconomia 
brasileira em termos de conquistas profissionais, uniformi-
zação dos conteúdos escolares, criação e ampliação de es-
colas e cursos, estabelecimento dos debates científicos atra-
vés de eventos como os CBBD's3 e aparecimento de lide-
ranças nacionais, dentre outros. Do mesmo modo, as dé-
cadas atuais serão importantes para pesquisas futuras em 
termos de novas abordagens teóricas, uso de tecnologias 
modernas para armazenamento, recuperação e transferên-
cia de informações por meio de redes e sistemas nacionais 
e internacionais. 
Estes ciclos históricos, ricos em discursos, possibilitam 
demonstrar a dinâmica do campo da Biblioteconomia no 
Brasil. Evidentemente, ao estudarmos estes ciclos, estaremos 
considerando as determinações de tempo e lugar, na medida 
em que condicionam os modos de saber e fazer: "Certamente 
não existem considerações, por mais gerais que sejam, nem leituras, 
tanto quanto se possa entendê-las, capazes de suprimir as particulari-
dades do lugar de onde falo e do domínio em que realizo uma investi-
gação. Esta marca é indelével. No discurso onde enceno as questões 
globais, ela terá a forma do idiotismo: meu patoá representa minha 
relação com o lugar" ( Certeau, 1982). 
3 Os Congressos iniciaram-se em 1954, no Recife, com o nome de Congresso Brasilei-
ro de Biblioteconomia, a partir do segundo, 1959, em Salvador, passaram a ter a 
denominação acima. 
30 
As fontes e os discursos 
Esta pesquisa baseou-se na análise da Imprensa Perió-
dica Biblioteconômica, produzida por diversas e diferentes 
instâncias, no período abrangido pelo estudo. Em não ha-
vendo um repertório onde pudéssemos localizar a produção 
das Associações de Classe, Escolas e Cursos, centralizamos as 
buscas na Bibliografia Brasileira de Biblioteconomia, publicada por 
Oswaldo de Carvalho (1959) e na Bibliografia Brasileira de Do-
cumentação -1960/1970. Ainda, nas bibliografias inseridas na 
Revista do Livro, publicada pelo Instituto Nacional do Livro e 
nas referências bibliográficas dos artigos da época. A maior 
incidência dos trabalhos arrolados são livros, mas foi possível 
localizar através dos artigos o nome das fontes publicadas pela 
área ou aquelas utilizadas pelos bibliotecários para divulgá-la, 
a exemplo da Revista do Serviço Público, publicada pelo Depar-
tamento Administrativo do Serviço Público- DASP. 
Os materiais da Imprensa Periódica são fontes privile-
giadas para compreensão dos " ... movimentos ocorridos dentro de 
um campo de conhecimento, pois através dela pode-se estabelecer 
mapeamentos das diferentes atuações, detectar conflitos e disputas e, 
assim, clemonstrar; em parte, a estrutura e o funcionamento" (Vilhena 
e Catani, 1998, p.2) da Biblioteconomia brasileira, nos anos 
50 e 60. "A imprensa é, talvez, o melhor meio para se compreender as 
dificuldades de articulação entre a teoria e a prática: o senso comum 
que perpassa as páginas dos jornais e das revistas ilustra uma das 
qualidades principais de um discurso educativo [e biblioteconômico] 
que se constrói a partir dos diversos actores em presença (professores, 
alunos, pais, associações, instituições)" (Nóvoa, 1993, p.xvii). 
A imprensa periódica, na Biblioteconomia, provavelmen-
te se iniciou com a publicação da revista A Biblioteca (1944), 
publicada pelo DASP, com a finalidade de divulgar as atividades 
31 
da biblioteca do órgão. Outras publicações são editadas por 
Associações de Classe: BAMBIM (1959), pela Associação de 
Bibliotecários Municipais de São Paulo; Notícias daABB (1952) 
e Bibliotecas e Bibliotecários ( 1957), pela Associação de Biblio-
tecários Brasileiros; Boletim Informativo da FEBAB ( 1960), pela 
Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários; Boletim 
IBBD ( 1955), pelo Instituto Brasileiro de Bibliografia e Docu-
mentação- IBBD; Boletim ABDF (1966), pela Associação dos 
Bibliotecários do Distrito Federal. 
Ao se referir às publicações periódicas na Bibliote-
conomia, antes de 1970, Fonseca ( 1957, p. 95) afirma que: ''Há 
poucas revistas especializadas em Biblioteconomia, no Brasil. Impres-
sas, podemos citar apenas duas: o B.oletim Bibliográfico, da Bibliote-
ca Pública Municipal de São Paulo [ ... ] e o Boletim Informativo do 
Instituto Brasileiro de Bibliogra[za e Documentação. A primeira é anual 
e a segunda bimestral. A Biblioteca do Departamento Administrativo do 
Serviço Público - (DASP) edita, desde 1944, uma pequena revista im-
pressa em multilith, com periodicidade irregular: A Biblioteca" 
A denominação atribuída por este autor- Revistas- con-
trapõe-se à de Souza, F. (1994) e Miranda (1981), quando afir-
mam que estas se iniciaram na década de 70: Ciência da Infor-
mação, criada em 1972 pelo IBBD, com a finalidade de ser um 
veículo de "divulgação e desenvolvimento da Informação no Brasil, 
bem como de divulgação das principais atividades do setor de infor-
mação científica e tecnológica"(Editorial, 1972, p.1). Em 1973, a 
Associação de Bibliotecários do Distrito Federal (ABDF), com a cola-
boração do Curso de Biblioteconomia da UnB, lança a Revista de 
Biblioteconomia de Brasília, com a finalidade de ser "um veículo 
de comunicação de idéias, experiências e realizações da comunidade 
biblioteconômica brasileira" (Editorial, 1973, p.2). A Revista da 
Escola de Biblioteconomia da UFMG começou a circular nomes-
mo ano da Ciência dalriformação, em 1972, e "destinava-se à 
32 
publicação de trabalhos que venham contribuir para o desenvolvi-
mento da Biblioteconomia e Documentação no Brasil e que tratam de 
assuntos ligados a estes dois campos" (Editorial, 1972, p.2). 
A FEBAB, desde 1960, editava o Boletim Informativo; em 
1973, em substituição ao Boletim, publica trimestralmente a 
Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação. Em princí-
pio, o seu objetivo era documentar a legislação bibliote-
conômica ou correlata. A partir de 1978, inaugura uma nova 
fase, com periodicidade semestral, voltando a sua atenção "às 
matérias que tratem de temas técnicos, científicos e educacionais da 
Biblioteconomia e Documentação" (Editorial, 1978, p.1). As esco-
las de Biblioteconomia de Pernambuco e Bahia lançam, nos 
anos 80, os seus Cadernos de Biblioteconomia, ambos de vida 
efêmera. 
A proliferação da Imprensa Periódica Biblioteconômica, 
a partir dos anos 70, ocorreu face a duas situações. A primei-
ra, pelo crescimento dos Cursos de pós-graduação e a segun-
da, pelo alerta de Hipólito Escobar, quando esteve no Brasil 
em 1968, em missão da UNESCO, ao considerar a ausência 
de periódicos como um dos doze pontos negativos da 
Biblioteconomia brasileira. 
Inicialmente, estas revistas atendiam a determinados in-
teresses da profissão: " ... a R. Esc. Bibliotecon. UFMG veicula arti-
gos sobre Ensino de Biblioteconomia" (Miranda, 1981, p.31), tra-
zendo para este assunto contribuições significativas. Acredi-
tamos que algnns avanços ocorridos no ensino devam-se a 
esta publicação. A RevistaBiblioteconomia de Brasília sobre 
Sistemas de Informação e sobre SDI [Disseminação Seletiva 
de Informação], e a Ciência da Informação, sobre 
bibliometria como reflexo da experiência de grupos e de seu 
meio ambiente, grupos estes formados por professores ingle-
ses e norte-americanos, que estiveram ministrando cursos e 
33 
orientando os primeiros mestres em Ciência da Informação 
no Brasil. Enfim, estas revistas demostram, nesta fase, uma 
tendência dos cursos de pós-graduação de Minas Gerais, Rio 
de janeiro e Brasília. Inclusive, a Capital Federal_destacou~se 
alguns anos na área de administração e automa;,ao de biblio-
tecas, chegando a ser considerada a capital da 
Biblioteconomia". 
A centralização em determinadas temáticas da 
Biblioteconomia "em vez de constituir-se, portanto, em uma 'políti-
ca editorial' consciente, tratar-se-ia mais bem de uma tendência que 
podeounãotercontinuidade"(Miranda, 1981, p.31). Atual~ent~, 
observamos que as publicações citadas têm a mesma Identi-
dade e interesse, sendo praticamente impossível distinguir-
mos a linha editorial das mesmas. No entanto, supomos que 
seja gerenciamento e políticas de informa~ão científica. e 
tecnológica. Certamente esta questao merecena 
aprofundamento. . . 
Consideramos Transinformação, reVIsta publicada pelo 
curso de pós-graduação da PUCCA.LV!P, como a mais eclética, 
na medida em que, além de contemplar os assuntos acima, 
engloba: Leitura, Estudos de Usuários, Epistemologia da 
Biblioteconomia, dentre outras temáticas. 
Por sua vez, Biblioteca e Sociedade, editada pelo mestrado 
da Universidade Federal da Paraíba, procura firmar-se nesse 
oceano de indecisões editoriais, e retrata a instabilidade teó-
rica da Biblioteconomia brasileira; ou, ao contrário, será que 
0 campo está movimentando-se positivamente na teoria e na 
prática ou as revistas publicam assuntos da moda, como fo-
ram re-engenharia, qualidade total da informação, dentre 
outros? No momento, este periódico procura contornar as 
dificuldades financeiras que o impedem de circular com re-
gularidade. 
34 
Mas, em sendo o nosso interesse de pesquisa as duas 
décadas precedentes aos anos 70, selecionamos o Boletim In-
formativo da FEBAB e o Boletim Informativo do IBBD, IBBD: 
Notícias e IBBD: Notícias Diversas, sendo estes, prolongamen-
tos do primeiro. 
a) Boletim Informativo da Federação Brasileira de As-
sociações de Bibliotecários-FEBAB. 
Esta instituição, como seu nome indica, congrega todas 
as associações de bibliotecários. Logo, esta fonte, hipotetica-
mente, representa o pensamento da categoria, daí a sua in-
corporação nesta pesquisa, além de apresentar periodicidade 
regular. 
Este Boletim começa a circular em 1960, um ano após a 
criação da FEBAB, com a finalidade de: " ... contribuir para o 
progresso da Biblioteconomia no Brasil. I - mientando os bibliotecários 
para a apreciação de novas técnicas e processos; 2 - tornando conheci-
das, no meio da classe, as reivindicações profissionais; 3-publicando 
notícias das atividades das Escolas e Associações de Bibliotecários" 
(Boi. Inf. FEBAB, 1960, p.l). 
Sendo assim, a publicação procura ren·atar a importãn-
cia desta Federação, enquanto espaço legítimo da categoria, 
sustentando que, a partir dela e com ela, as reivindicações 
profissionais seriam atingidas, na medida em que todos unis-
sem suas "forças e necessidades" em torno de uma 
Biblioteconomia reconhecida, enquanto profissão liberal e de 
nível superior, dotada de um currículo único e incorporada 
ao espaço universitário. 
Na apresentação do v.5, n.1/2 de 1962, problemas rela-
cionados ao Ensino Superior assumem destaque, sendo pu-
blicados diversos dispositivos legais, com a proposta de man-
ter os professores e bibliotecários atualizados a respeito das 
35 
mudanças que se processavam neste campo. Mesmo com a 
aprovação do currículo mínimo e com o reconhecimento da 
profissão como de nível superior, matérias dessa natureza se-
rão editadas até 1968, demonstrando, assim, a luta pela con-
quista educacional da Biblioteconomia, em especial, da ne-
cessidade de sua expansão: "Formulado dentro de um plano siste-
mático nas suas linhas gerais e flexível nos aspectos particulares, êste 
boletim tem procurado oferecer uma visão imediata dos problemas 
de ensino das dificuldades com que se defrontam os profissio-
nais responsáveis pelo desenvolvimento da Biblioteconomia 
no Brasil". (Boi. Inf. FEBAB, 1962, p.2) (grifo nosso) 
Ainda neste sentido, pretendia: " ... oferecer facilidades de 
acesso a matéria de interesse das Eseolas de Biblioteconomia e de 
todos aqueles que se interessam pelos assuntos da Educação" 
(Bol.Inf. FEBAB, 1962, p.2) (grifo nosso). 
A divulgação das atividades científicas desenvolvidas no 
país e no estrangeiro no campo de Biblioteconomia e Docu-
mentação, os trabalhos das comissões nacionais (catalogação, 
classificação etc.) e notícias de interesse dos bibliotecários 
ocupam parte significativa da publicação, possibilitando a iden-
tificação dos movimentos ocorridos na década de 60. É evi-
dente que, dependendo das reivindicações profissionais, uma 
mesma temática estende-se por vários números ou vários anos. 
A partir de 1968 até 1970, a sua circulação é subvenci-
onada pelo Instituto Nacional do Livro, quando é substituí-
do, em 1970, pela Revista Brasileira de Biblioteconomia e Docu-
mentação. 
b) Boletim Informativo do Instituto Brasileiro de Biblio-
grafia e Documentação- IBBD 
Em sendo uma publicação do mais importante órgão 
de informação e documentação da época, foi criado para 
36 
L 
" ... promover o intercâmbio de informações entre as instituições de pes-
quisa, no Brasil e no estrangeiro, divulgando os trabalhos técnico-
científicos brasileiros"(L.Q.S., 1955, p.l). Dará destaque, então, 
às diversas facetas da ciência, podendo-se encontrar desde 
artigos sobre Física Nuclear até Geografia. Porém, os artigos 
sobre Biblioteconomia e Documentação ocupam maior es-
paço, e é onde se evidencia o papel do profissional bibliotecá-
rio e das bibliotecas diante do avanço das pesquisas no Brasil. 
O IBBD, para concretizar sua finalidade, publicará " ... bi-
bliografias especializadas correntes, guias das instituições de pesquisa 
brasileiras e de suas bibliotecas, o Boletim do Conselho Nacional de 
Pesquisa e êste Boletim, editados de preferência em português e inglês" 
(L.Q.S., 1955,p.l). 
Este Boletim pretendia " ... dar notícias atuais e de interesse 
para a pesquisa bibliográfica registrando o que se passa no mundo 
científico e tecnológico brasileiro, principalmente o que estiver relacio-
nado com os trabalhos do Conselho Nacional de Pesquisa e institui-
ções que lhe são relacionados"(L.Q.S., 1955, p.l). 
Estas informações contidas no artigo A Razão de Ser Deste 
Boletim, assinado por L.Q.S. (Lydia de Queiroz Sambaquy), 
alerta aos leitores que na sua fase inicial seria falho e incom-
pleto, mas, vencidas as primeiras dificuldades, poderia " ... ser-
vir como primeiro veículo para o contato permanente que cabe a este 
instituto criar e manter entre as instituições nacionais e estrangeiras " 
(L.Q.S., 1955, p.2). 
Em todos os artigos publicados, se manifesta a idéia se-
gundo a qual o bibliotecário seria aquele que atenderia aos 
anseios· da ciência. Logo, deveria conhecer as terminologias 
das áreas em que atuava. Desta forma, obteria "status" e res-
peito profissional junto à comunidade científica e à socieda-
de em geral, discurso que encontra ressonância nos cientis-
tas defensores da categoria, a exemplo de Paulo Sawaya. Daí 
37 
~--~--------- ·----. 
a insígnia encontrada em todos os trabalhos que tratam do 
bibliotecário: Servo dos Servos da Ciência. 
Para corresponder a esta "necessidade científica", são 
promovidos diversos cursos de especialização, ministrados por 
bibliotecários que tratavamdos conteúdos específicos e, por 
cientistas que introduziam conhecimentos das Ciências Físi-
cas e Naturais, Ciências Médicas e Tecnológicas. 
A partir de 1961, ao mudar de nome paraiBBD: Notícias 
Diversas, centra-se na Biblioteconomia e na Documentação. 
Nesta fase, a periodicidade é bastante irregular. Em 1967, ocor-
re uma nova mudança no título, agora IBBD: Notícias, mas a 
linha editorial permanece até 1975, quando cessa de circular. 
A Imprensa Periódica em si m€sma não se constituiu em 
material suficiente para caracterizar o movimento do campo da 
Biblioteconomia, tal como está presente nesta pesquisa. Sendo 
assim, recorremos a outras fontes publicadas no período abran-
gido pelo estudo ou àquelas que se reportam a ele, como teses, 
anais de congressos, artigos de jornais e revistas e livros. 
Esclarecemos, entretanto, que, para alguns estudiosos das 
fontes documentais, os materiais utilizados nesta pesquisa de-
nominam-se de documentos não-convencionais; para outros, 
de literatura cinza. Com a finalidade de evitarmos senões 
conceituais, optamos pelo termo Imprensa Periódica, por con-
templar todo o tipo de material impresso relativo a uma dada 
área: relatórios, boletins, folders, artigos de jornais e revistas. 
Isso se alia ao fato de que o uso deste termo vem sendo 
utilizado pela Educação, na França, por Pierre Caspard (1981), 
pioneiro neste tipo de investigação, em Portugal, por Antô-
nio Nóvoa (1993), na Itália, por Dario Ragazzini (1986) e, no 
Brasil, por Nunes e Carvalho (1994) e Vilhenae Catani (1998). 
Uma questão a ressaltar é que quando pretendemos 
construir a história de um campo de saber, de uma instituição 
38 
ou de uma personagem diz respeito à localização das fontes, 
na medida em que são elas o foco de sustentação dos objetivos 
pretendidos. Aí se estabelece um primeiro problema: o seu 
rastreamento, geralmente lacunar, parcelar e residual, para 
empregar expressões de Nunes e Carvalho (1994, p.23). No 
Brasil, este problema é comum e exige do pesquisador atitu-
des de "garimpeiro", muitas das vezes por caminhos difíceis e 
tortuosos. A dificuldade de obter o material desejado centra-
se, entre outras coisas, na carência de políticas públicas em 
todos os níveis para arquivos e bibliotecas, aliada, ainda, ao 
estereótipo difundido entre os brasileiros, que faz acreditar 
que documentos antigos, por serem velhos, são destituídos 
de valor: "São inúmeros os documentos que as traças, o mofo e a 
umidade destroem. Outras vezes, é o fogo que serve de arquivo, e o 
passado vira fumaça. É verdade que muitos abnegados vêm lutando 
para a preservação de importantes documentos e arquivos, embora 
nem sempre contêm com os recursos necessários a essa tarefa, situação 
que conspira contra a- tão necessária- soma de conhecimentos e expe-
riências. Aquilo que é apresentado como novo e original, muitas vezes 
já tem uma longa história, desconsiderada ao se pensarem ações futu-
ras" (Ribeiro, 1996, p.19). 
Com a finalidade de ampliarmos os discursos contidos 
nas fontes documentais e também como forma de confron-
tar o texto com o vivido, entendido como o conjunto de ex-
periências e atuações de personagens que contribuíram para 
a constituição do campo da Biblioteconomia brasileira, reali-
zamos algumas entrevistas, na medida em que " ... possibilitam 
recuperar aquilo que não encontramos em documentos de outra natu-
reza: determinados acontecimentos pouco esclarecidos ou nunca evo-
cados, experiências pessoais, impressões particulares etc" (Alberti, 1990, 
p.5). Possibilitam-nos, ainda, um outro olhar, que muitas das 
vezes a fonte não permite, posto que, ao mesmo tempo em 
39 
que ela revela o fato histórico, o esconde. Logo, o uso desta 
metodologia contribuiu para desvelar as práticas de " ... pessoas 
que participaram de, ou testemunharam, acontecimentos, conjuntu-
ras, visões de mundo ... "(Alberti, 1990, p.S), enfim, da trajetória 
histórica da Biblioteconomia brasileira. 
A seleção dos entrevistados foi realizada pela incidência 
de publicações na Imprensa Periódica da área e pela partici-
pação nos movimentos associativos e educacionais da 
Biblioteconomia nos anos 50 e 60. Deste modo, entrevista-
mos os seguintes bibliotecários: Edson Nery da Fonseca, Ma-
ria Antônia Pinke Belfort de Mattos, Maria Helena de Toledo 
Barros, Esmeralda Aragão, dentre outros. 
As entrevistas não obedeceram a um roteiro 
preestabelecido- com exceção do Prof. Edson N ery da Fonseca 
e da Profª. Esmeralda Aragão, que sugeriam que as perguntas 
lhes fossem enviadas -, na medida em que pretendíamos obter 
o maior número de informações; havendo necessidade, algu-
mas interferências foram realizadas, com a finalidade de escla-
recermos dúvidas e obtermos mais dados sobre os aspectos rela-
tados pelos entrevistados. Neste sentido, ensina-nos Thompson 
(1992, p.271): 'Vma entrevista não é um diálogo, ou uma conversa. 
Tudo o que interessa é Jazer o informante falar. Você deve manter-se o mais 
possível em segundo plano, apenas, fazendo algum gesto de apoio, mas 
não introduzindo seus próprios comentários ou hist&rias ". 
Os depoimentos foram gravados, transcritos e depois 
categorizados de acordo com os itens eleitos para a pesquisa: 
ensino de Biblioteconomia, formação profissional, práticas 
profissionais e regulamentação da profissão. 
HISTÓRIA DA BIBLIOTECONOMIA BRASILEIRA 
representa o modo como leio o mundo, sendo homem e ra-
cional, procurando em alguns momentos assumir atitudes 
dionisíacas e, em outros, atitudes apolíneas, cuja pretensão é 
40 
encontrar o equilíbrio entre umas e outras. Também, é a 
maneira como olho a Biblioteconomia como bibliotecário, 
usuário de biblioteca, professor e cidadão. 
Portanto, este trabalho- etapa de um processo de apren-
dizagem -foi elaborado não somente pelas fontes e os discur-
sos, mas, e principalmente, tentamos imbuí-lo de emoção; ao 
contrário, seria uma atividade para obtermos título acadêmi-
co, limitada aos rigores do fazer ciência. 
Daí, defendermos e explicitarmos idéias que certamen-
te serão compactuadas por alguns companheiros e rechaçadas 
por outros. Entretanto, entendemos que somente evoluímos 
como SER, quando colocamos o nosso saber e o nosso pen-
sar sobre a mesa dos "inquiridores". 
Deste modo, como em qualquer trabalho científico, é 
natural apresentá-lo em módulos, a fim de facilitar a sua 
fruição. Assim, estruturamos este estudo em seis capítulos, que 
se dividem em itens. Todavia, a divisão apresentada não se 
constitui em quadros estanques, mas em idéias que se enca-
deiam, se harmonizam, se fundem. 
No segundo capítulo, tratamos de discutir o movimen-
to fundador do campo educacional da Biblioteconomia, na 
Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro e em São Paulo. Algumas 
fontes documentais foram fundamentais para a sua elabora-
ção, como os Anais da Biblioteca Nacional, do mesmo modo 
alguns artigos publicados nos jornais paulistas dos anos 20 e 
30. Por último, abordamos a expansão a partir dos anos 40 do 
Ensino de Biblioteconomia no Brasil. 
No capítulo seguinte, fazendo uso da Imprensa Periódica 
Biblioteconômica, tratamos de evidenciar os discursos em torno 
do papel e da função do bibliotecário ideal, aquele que serviria 
como auxiliar dos cientistas. Daí os discursos centrarem-se na 
sua necessária e imprescindível especialização e atualização. 
41 
Para finalizá-lo, nos reportamos à concepção do bibliotecário 
como Servo dos Servos da Ciência e às críticas feitas por cientistas 
como Paulo Sawaya, às práticas bibliotecárias e às estratégias 
utilizadas para garantirem sua permanência no campo face à 
penetração de atores estranhos ao mesmo. 
As lutas para legitimar o campo, dando-lhe respaldo le-
gal, maneiras pelas quais os bibliotecários garantiriam o seu 
espaço profissional, são o foco central deste capítulo, o quar-
to. Portanto,analisamos as estratégias políticas dos bibliote-
cários para a aprovação da Lei 4.082/62. Para escrevê-lo, nos 
apropriamos dos relatórios das Comissões por onde tramitou 
o projeto encaminhado pela FEBAB, levado à discussão no 
Congresso Nacional pelo Deputado Rogê Ferreira. Com o 
estabelecimento desta lei, um corp;; de dispositivos burocráti-
cos é criado: Conselhos Federal e Regionais de Bibliotecono-
mia, Código de Ética Profissional. Em sendo, a FEBAB, a ins-
tituição que contribuiu para constituir, em termos legais e 
associativos, a Biblioteconomia, fez-se necessário incluir a sua 
trajetória, com o objetivo de situá-la no campo. 
No quinto capítulo, tratamos de evidenciar a constitui-
ção do campo da Biblioteconomia, nos anos 50 e 60. Para 
tanto, se fez necessário discorrermos sobre os movimentos 
para constituí-lo; os encontros e eventos que procuram justi-
ficar a sua importância no âmbito universitário, os modelos 
de formação, humanista e pragmático, a padronização das 
escolas e uniformização dos saberes escolares. Os discursos 
em torno da especialização do bibliotecário levaram-nos a 
abordar, preferencialmente, os cursos oferecidos pelo IBBD, 
que tinham esta finalidade,justificando-se, assim, a inclusão 
da trajetória deste órgão. Em seguida, as Considerações Fi-
nais, e as Fontes Bibliográficas referenciadas nesta pesquisa. 
42 
CAPÍTUL02 
O MOVIMENTO JiVNDADOR DAS 
DIMENSÕES EDUCATIVAS DA 
BIBliOTECONOMIA DO BRASIL 
A trajetória das bibliotecas no Brasil iniciou-se com as 
ordens religiosas dos Beneditinos, Franciscanos e Jesuítas. 
Entretanto, tomaremos como marco inicial, deste primeiro 
momento do trabalho, a criação da Bibilioteca Nacional-BN, 
gênese do movimento fundador do campo de ensino da 
Biblioteconomia no Brasil. Essa biblioteca é remanescente 
da Biblioteca Real da Ajuda, criada por D.João I, rei de Por-
tugal, depois do terremoto de l de novembro de 1755, que 
destruiu a antiga Biblioteca Real. 
Com a invasão das tropas francesas de Junot, a família real 
portuguesa, sentindo-se ameaçada, refugiou-se na colônia mais 
próspera, trazendo nos porões dos navios os instrumentais ne-
43 
cessários ao seu bem-estar social, cultural e artístico, dentre eles 
" ... a numerosa e rica livraria pacientemente amontoada pelo douto ahbade 
de Santo Adrião de Sevér, Diogo Barbosa Machado, que generosamente a 
offertara aD.Joséi"(Biblioteca Nacional, 1887, p.221). 
Assim chegaram ao Brasil, por força das pressões polí-
ticas, as primeiras obras, origem da Real Biblioteca, também 
denominada de Biblioteca do Rio de Janeiro, da Corte. Ratniz 
Galvão, ao descrever a coleção bibliográfica trazida por D. 
João VI em 1808 e por Luis Marrocos em 1811, sendo esta a 
segunda leva de livros e peças para a real Biblioteca, afirma 
que: "Não se sabe, o que mais se deva admirar, se a excellencia das 
edições raras, se a belleza dos exemplares preferidos pelo douto 
collecionador, se emjim a boa ordem e perJeição das colleções jacticiais, 
prodígio de perserverança e de cuidado. Estão nelles reunidas quasi 
todas as províncias do saber humano, representado pelas suas obras 
mais dignas de nota e estima"(Galvão, 1889, p.159). 
Segundo Rubens Borba de Moraes, a coleção de Diogo 
Barbosa Machado dividia-se em três grupos. O primeiro, de 
obras diversas, continha edições de clássicos portugueses e 
espanhóis, latinos e obras religiosas. A segunda, a coleção 
de folhetos, "organizada de modo bárbaro e estranho", isto 
é, quando os folhetos para serem encadernados eram gran-
des, ele os cortava e quando pequenos os emendava. Assim, 
Diogo Barbosa formou uma coleção de folhetos em 85 volu-
mes. A terceira, a coleção de retratos, era "formada de modo 
também excêntrico": os retratos recortados de outros impres-
sos depois colados em folhas em branco e para enfeitá-los 
recortava tarjas ou moldura de um outro livro. 
A princípio o acervo foi instalado nas salas do andar 
superior da Ordem Superior Terceira do Carmo, em 1810, 
ano considerado como de sua fundação. Contudo, não ten-
do o ambiente as condições necessárias para a devida conser-
44 
vação do material, passa a ocupar, também por determina-
ção do Príncipe Regente, as "catacumbas", que até então ha-
viam servido aos religiosos desta ordem. Pela relevância his-
tórica deste ato, o transcreveremos: 
"Havendo ordenado, por Decreto de 2 7 de Junho do presente anno, 
que nas casas do Hospital da Ordem Terceira do Carmo, situado à mi-
nha Real Cappela, se colosassem a minha Real biblioteca e gabinete dos 
instrumentos de phisica e mathematica, vindos ultimamente de Lisboa e 
constando-me pelas últimas averiguações a que mandei proceder, que o 
dito edifício não tem toda a luz necessária, nem offerece os commandos 
indispensáveis em hum estabelecimento desta natureza, e que no lagar 
que havia servido de catacumba aos Religiosos do Carmo se podia Jazer 
h uma mais própria e decente accomodação para a dita livraria, hei por 
bem, revogado o mencionado Real Decreto de 27 de Junho, determinar 
que nas ditas catacumbas se erija e accomode a minha Real Biblioteca e 
instrumentos de phisica e mathematica, jazendo-se à custa da Real Fa-
zenda toda despeza conducente ao arrajamento e manutenção do referi-
do estabelecimento[ ... ]-Palácio do Rio de Janeiro, em 20 de Outubro 
de 1810- Coma rubrica doPrincipeRegenteNossoSenhor"(Bibliote-
ca Nacional, 1889, p.223). 
No ano posterior a sua fundação, é franqueada ao pú-
blico, mas facultada apenas aos estudiosos, àqueles que obti-
nham consentimento régio. Em 1814, é suprimida esta exi-
gência, ficando totalmente aberta à população. Como as bi-
bliotecas brasileiras no tempo colonial, a Biblioteca Nacional<, 
nas suas primeiras décadas, foi gerenciada por religiosos, que 
vieram, alguns, com a família real. Os primeiros, Frei Gre-
gório José Viegas, da Ordem Terceira de São Francisco, Pe. 
4 Sobre as biblioteca brasileiras no tempo colonial. consultar as seguintes fontes: LESSA, 
Clado Ribeiro de. As Bibliotecas nos tempos colonias. Revista do IHGB, v.192, p.339-
345,abr./jun., 1946. MORAES, Rubem Borba de. Livros e Bibliotecas no Brasil 
Colonial. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1979.234p. 
45 
Joaquim Damaso, da 
Congregação do 
Oratório de Lisboa, 
Frei Antônio de 
Arróbida, também 
franciscano. Em se-
guida, Pe. Felisberto 
Pereira Delgado e 
Cônego Francisco 
Vieira Goulart. 
"Goulart dirigiu a Bibli-
oteca como ajudante de 
bibliothecario até 11 de 
janeiro de 1837 e como 
bibliothecario d 'ahi em 
diante até sua morte, 
ocorrido a 21 de agosto 
de 18 3 9, em Niteroy " 
(Biblioteca Nacional, 
1889, p.236). Com a 
sua morte, coube a direção ao cônego Antônio Fernandes da 
Silveira, até 5 de novembro de 1839, quando tomou posse o 
Cônego ]anuário da Cunha Barbosa. Após o seu falecimen-
to, em 1846, é nomeado o Dr. em Medicina José de Assis Bran-
co Muniz Barreto, o primeiro não religioso. Com sua prema-
tura morte é nomeado Jorge Estanislau Xavier Luis Camillo 
Cléau, Frei Camillo de Monserrate, a quem Ramiz Galvão ho-
menageia, publicando em 1887 a sua biografia, que constitui 
o volume XII dos Anais da Biblioteca Nacional. 
Ao comparar a administração deste com as anterio-
res, Ramiz Galvão (1889, p.122), afirma que aqueles se li-
mitavam às atividades de expediente, " ... ao mandar copiar 
46 
alguns velhos catálogos ou a Jazer novos índices incompletos, 
summarios e incorrectissimos". Entretanto, Camillo de 
Monserrate teve como primeira preocupação requerer do 
governo um novo prédio para comportar adequadamente 
o acervo sempre crescente, na medida em que o antigo, da 
Ordem Terceira do Carmo, não atendida mais às necessi-
dades. Desta forma, consegue a transferência da Bibliote-
ca para um prédio no Largo da Lapa, dedicando-se em se-
guida à organização dos velhos catálogos que, para osbi-
bliotecários, eram " ... o primeiro dever do officio, e nem se pode 
conceber bibliotheca, sem essa fonte de luz e sem esse fio directo, que 
o publico reclama com razão"(Galvão, 1889, p.121). 
Contudo, o grande problema enfrentado por este 
diretor era a falta de pessoal qualificado e em quantidade su-
ficiente para desenvolver todas as atividades requeridas e que 
COITespondessem aos seus planos de organização: "A verdade 
é que salvas as poucas excepções, eram todos destituídos de habilitações 
clássicas, e alguns d 'elles verdadeiros illetrados, que só por ironia da 
sorte se achavam empregados em tractar de livros. Os poucos hábeis e 
talvez competentes para trabalhos de certa ordem nada se demoravam 
na Bibliotheca, ou viviam no gôzo de quasi constantes licenças, e pro-
curavam a todo custo empregos bem remunerados em outras reparti-
ções, porque os da Bibliotheca não davam nem para garantir modesta 
subsistência" (Galvão, 1889, p.121). 
Este problema parece ter sido comum na Biblioteca 
Nacional. No relatório de 15 de janeiro de 1898, referente ao 
ano anterior, o então diretor, João Alexandre Teixeira de 
Mello, afirma que problemas com o pessoal comprometeram 
o desenvolvimento de várias atividades, pois muitos eram 
faltosos e licenciados por motivos de doença (Biblioteca Na-
cional, 1898, p.287). No relatório de 1900, do mesmo diretor, 
47 
esta questão reaparece, acrescida de mortes e moléstias (Bi-
blioteca Nacional, 1900, p.245). Manuel Peregrino da Silva, 
ao se reportar, no relatório de 1907, à carência de pessoal, con-
fere ao problema o caráter de centro do desprestígio da bibli-
oteca frente ao público (Biblioteca Nacional, 1907, p.293). 
Com a morte de Camilo de Monserrate, assume a direção da 
biblioteca Benjamin Franklin Ramiz Galvão, imprimindo 
novas formas organizacionais adquiridas em viagem que rea-
lizou à Europa5, por incumbência do governo brasileiro. 
Dentre as várias mudanças, destacamos o estabelecimen-
to de um regulamento, em 1879, no qual divide a biblioteca 
em três seções: impressos, cartas geográficas, manuscritos e 
estampas. O horário de atendiménto ao público é ampliado 
das 9 às 11 e das 18 às 21 horas e modificado o quadro de 
pessoal, que passou a ser composto de um bibliotecário, três 
chefes de seção, três oficiais, um secretário, oito auxiliares, 
um guarda e um porteiro. 
Uma grande marca de sua administração foi a realiza-
ção de concursos públicos para preenchimento de cargos, em 
especial de bibliotecários. Tais concursos requeriam conheci-
mentos de História Universal, Geografia, Filosofia, Bibliogra-
fia, Iconografia, Literatura, Catalogação de Manuscritos e tra-
duções do Latim, Francês e Inglês, sendo aprovado, no pri-
meiro concurso para bibliotecário, o historiador João 
Capistrano de Abreu (Fonseca, 1957, p.94). Dias (1955, p.6), 
considera este concurso o marco inicial da formação profissi-
onal em Biblioteconomia no Brasil. 
• 
5 Esta viagem resultou na obra em forma de relatório Bibliotecas Públicas na Europa 
(1875), onde descreve a organização das mesmas e como havia de serem adotados 
no Brasil esses procedimentos. 
48 
Além de CaJf>is-
trano de Abreu, 
obteve o primeiro 
gar, concorreram 
vaga de oficial: '-'"'u"1-
rel Misael Pe 
Pena, Alexandre 
dido da Mota e ru•cv-
Morais, sendo a 
ca examinadora 
mada pelos chefes da 
seções do BN: João Saldanha da Gama, Alexandre Teixeira 
de Melo e José Zeferino de Menezes Brum, como presidente 
Ramiz Galvão, e secretário Alfredo do Vale Cabral. Os pontos 
das provas foram: Os Grandes Navegadores do século XV e seus 
Descobrimentos, em História Universal; Produtos naturais, indús-
tria, comércio e navegação no Brasil, em Geografia; Os épicos por-
tugueses e Moral individual e religiosa, em Literatura e Filosofia, 
respectivamente. 
Cada prova disser-
tativa, durava em tor-
no de 4 horas. No dia 
seguinte, 2 de julho 
de 1879, foram reali-
zadas as provas de 
Línguas, Bibliografia, 
Iconografia e Classifi-
cação de Manuscri-
tos. Nos anos poste-
riores, realizaram-se 
49 
----------·--
outros concursos, cujas disciplinas eram as mesmas. 
"Pela [sua] enumeração [ ... ] é fácil avaliar o grau de cultura 
humanística exigido aos candidatos às vagas ocorridas nos qua-
dros da Biblioteca Nacional" (Dias, 1954, p.4). Este conteúdo 
demonstra-nos que Ramiz Galvão concebia que o bibliote-
cário deveria ser ao mesmo tempo um erudito e um técni-
co. Interessa destacar que estes concursos seguiam os mo-
delos da École de Chartes de Paris, que foi a primeira esco-
la criada no mundo para formação de pessoal para as bi-
bliotecas. 
Cabe ressaltar que o termo bibliotecário passou a ser 
utilizado, na Biblioteca Nacional, a partir de 1824, quando 
da aprovação do segundo dispos·itivo legal- Artigos Regula-
mentares para o Regimento da Bibliotheca Imperial e Pública -
elaborado pelo frei Antonio de Arróbida. Nesse documen-
to, após a Independência do Brasil, troca-se a denomina-
ção Biblioteca Real por Biblioteca Imperial e o administra-
dor geral, até então chamado Prefeito ou Zelador, passou a 
chamar-se Bibliotecário. 
Segundo Carvalho (1994, p.47), o que houve foram 
apenas mudanças de nomes, mas as atribuições perma-
neceram as mesmas com preocupação acentuada na am-
pliação do acervo em detrimento de sua organização e 
conservação. 
Com a Proclamação da República, a única modificação 
digna de nota foi a mudança do nome de Bibliotecário para 
diretor e de Biblioteca Imperial para Biblioteca Nacional. 
Em 1897, assume a direção o Dr. Manoel Cícero Pere-
grino da Silva, que marcaria uma nova fase na biblioteca e 
para o campo da Biblioteconomia no Brasil. Na adminis-
tração de Peregrino da Silva é estabelecido um novo regu-
50 
lamento para a Bi-
blioteca Nacional, 
aprovado pelo De-
creto 8.835 de 11 de 
junho de 1911 (Bra-
sil, 1911, p.243). O 
primeiro capítulo 
trata da estruturação 
da BN, ficando a 
mesma dividida em 
quatro seções: 
a)Impressos -
Seção que abrangia 
livros, folhetos, pu-
blicações periódicas, 
músicas impressas e impressos avulso; 
b)Manuscritos -Abrangia manuscritos, obras de 
paleografia e diplomática; 
c) Estampas- Seção onde estavam armazenados de-
senhos, chapas gravadas, fotografias, cartas e coleções ge-
ográficas, planos e obras de iconografia; 
d)Moedas e Medalhas- abrangia cédulas, vales, con-
decorações, títulos representativos de valor, distintivos, 
jetons e obras de numismática, sigilografia e filatelia. 
As primeiras seções eram dirigidas por bibliotecários e 
a última por um sub-bibliotecário diretor. Os sub-bibliotecári-
os não-diretores tinham como atribuição executar os serviços 
solicitados pelos bibliotecários, além de fiscalizar os trabalhos 
dos demais empregados, distribuindo, conservando e colo-
cando os objetos da seção e substituindo os bibliotecários 
quando impedidos por motivos de férias e licenças. 
51 
r 
i 
------------:;_----------------- ------------------------------, 
No artigo 10, do referido decreto, que descreve as atri-
buições do sub-bibliotecário, observamos que não há dife-
renças significativas entre as sua funções e do bibliotecário 
a não ser que não poderia participar das decisões do Con-
selho Consultivo, quando o mesmo deliberasse sobre pre-
enchimento de cargos de bibliotecário. 
A partir deste regulamento, o quadro de pessoal ficou 
distribuído entre os não nomeados e os nomeados, sendo 
este formado pelo: diretor geral, 3 bibliotecários diretores de 
seção, 5 sub-bibliotecários, um dos quais será o diretor da 4. ª 
seção, 5 oficiais, 14 amanuenses, 16 auxiliares, I porteiro, 2 
ajudantes de porteiro, 1 mecânico-eletricista, 1 inspetor téc-
nico das oficinas gráficas e de enéadernação. Os não nomea-
dos eram constituídos por: 12 guardas; 28 serventes; 4 aju-
dantes de mecânico-eletricista;4 ascensoristas; pessoal das 
oficinas gráficas e de encadernação. 
Os artigos 34 a 45 e o artigo 137 deste decreto são da 
maior relevância para o estudo da Biblioteconomia brasi-
leira, sendo que o segundo trata dos Serviços de Permutas 
Internacionais de Bibliografia e Documentação, e os primeiros, 
do Curso de Biblioteconomia. A criação do serviço de Bi-
bliografia demonstra o quão eram avançadas as idéias de 
Peregrino da Silva: " ... a organização, segundo o systema de clas-
sificação decimal e por meio de fichas, do repertório bibliographico 
brazileiro como contribuição para o repertório bibliographico uni-
versal, de modo a comprehender as obras de autores nacionais ou 
estrangeiros impresso ou editados no paiz, as de autores nacionaes 
impressas no estrangeiro ou inéditas e as de autores estrangeiros 
que se occuparam especialmente do Brazil, incluídos os artigos 
insertos em publicações e os escriptos de qualquer natereza" (Bra-
sil, 1911, p.352). 
52 
A trajetória do Ensino de Biblioteconomia no Brasil: o caso da Bi-
blioteca Nacional 
O Curso de Biblioteconomia, criado na BN6, tinha 
como objetivo sanar as dificuldades existentes na bibliote-
ca, há gerações, quanto à qualificação de pessoal. Daí a cons-
tituição de quatro disciplinas, que se desdobravam em cinco 
matérias: 
• Administração de Bibliotecas • Cartografia • Sigilografia 
• Catalogação • Filatelia 
Por diversos motivos, o curso criado em 1911 somente 
iniciaria suas atividades em 1915, "fato que teve grande reper-
cussão nos meios educacionais do Distrito Federal" (Dias, 
1955, p.4). Em 1912, o curso da Biblioteca Nacional não pôde 
funcionar por desistência dos inscritos, na maioria funcioná-
rios da própria instituição. Provavelmente, com as mudanças 
realizadas pelo novo regulamento, o processo de adaptação 
dos empregados reduziu a disponibilidade de tempo para eles 
participarem de uma outra atividade, no caso o recém-criado 
curso. Ainda, pela transferência do diretor da primeira seção, 
impressos, para a segunda, manuscritos, uma vez que o mes-
mo " ... não se julgou devidamente preparado para a inauguração 
immediata do curso, encargo que só poderia tomar para si no anno 
6 Vários autores, alguns citados neste trabalho, que tratam da História da Biblioteconomia 
afirmam que este foi o primeiro Curso criado na América Latina; no entanto, no docuM 
menta Análises de los Informes sobre el Estado Actual de la Profesión 
Bibliotecaria, constamos queo primeiro Curso foi fundado em Buenos Aires, pelo 
Conselho de Mulheres da Argentina, em 1903, sendo o segundo o do Brasl!, Biblioteca 
Nacional. 
53 
seguinte, e o director da seção de impressos, por ocupar o cargo interi-
namente, declarou que não fizera os estudos necessários para assumir 
as responsabilidades da aula de bibliographia" (Biblioteca Nacio-
nal, 1939, p.439). Peregrino da Silva, justifica que a falta de 
professores poderia ser um problema facilmente soluciona-
do com a contratação de substitutos, se os funcionários, na-
quele ano, não tivessem desistido das inscrições. 
Ao se reportar ao Curso de Biblioteconomia, no relató-
rio de 1915, referente a 1914, Peregrino daSilvaafirmaque o 
mesmo não havia funcionado por falta de candidatos: "É para 
sentir que não tenha sido possível até agora colher os resultados benéfi-
cos que do funcionamento do curso se devem esperar não só em relação 
ao estabelecimento, em cujo proveito reiultarão os conhecimentos técni-
cos que foram ministrados aos que nelle trabalharam ou pretendem ser 
admitidos, como também em relação a estes, pois o certificado de 
approvação nas matérias do curso constituirá uma razão de preferên-
cia para as nomeações, uma circumstância digna de nota nas promo-
ções e uma condição indispensável para a elevação ao cargo de 
bibliothecario devendo valer além d 'isto por um título de recomenda-
ção para os que se propuzerem exercer funções nas demais bibliothecas 
dopaiz" (Biblioteca Naciona1,)915, p.684-685). 
Em 1915, abertas as inscrições de 15 a 31 de março, vin-
te e um cadidatos foram aceitos por atenderem às condições 
determinadas pelo regulamento de 1910, no seu Art. 36, as 
quais constavam de exame de admissão, que se compunha 
de prova escrita de português e provas orais de Geografia, Li-
teratura, História Universal e de Línguas: francês, inglês e la-
tim. Contudo, estavam dispensados os candidatos admitidos 
anteriormente em escolas superiores ou aqueles aprovados 
para a carreira de bibliotecário. Vê-se, portanto, que não há 
diferença entre os critérios de ingresso adotados por este dis-
54 
positivo para o curso e os exigidos no concurso para bibliote-
cário, instituído por Ramiz Galvão, no qual foi aprovado 
Capristano de Abreu. Em resumo, era condição, para ser bi-
bliotecário, possuir cultura geral o que incluía, além de co-
nhecimento da língua materna, demonstrado em prova es-
crita, saberes universais nos diversos campos, aliados aos do-
mínios dos idiomas falados nas Artes, Ciências e Letras. 
Esta primeira turma, composta inicialmente de vinte e 
um alunos, é acrescida de mais seis por determinação do então 
Ministro da Justiça e Negócios Interiores, Dr. Carlos Maximiliano 
Pereira dos Santos. Não fica evidenciado, no relatório de 1916, 
se estes últimos atendiam aos critérios exigidos para ingresso 
no curso, podendo tal dado configurar o fisologismo no ensi-
no da Biblioteconomia Brasileira no seu início. 
As aulas se iniciaram em 12 de abril, mas dois dias antes 
Dr. Constantino Antonio Alves, diretor da seção de Bibliogra-
fia da BN, proferiu a aula inaugural que evidenciava A Funcção 
do Bibliothecario. Esse diretor seria responsável pela disciplina 
que tinha o mesmo nome da seção que coordenava. As de-
mais disciplinas, Paleografia e Diplomática, seriam ministra-
das por José Carlos de Carvalho; Aurélio Lopes de Souza fica-
ria com a cadeira de Iconografia e João Gomes do Rego, com 
a Numismática. 
Estas disciplinas eram subdivididas em uma parte teóri-
ca e outra prática, com duração de uma hora/ aula por sema-
na para cada uma delas, podendo ser ampliada, na medida 
em que houvesse necessidade de aprofundar as práticas: ''De 
Bibliographia foram dados os 30 pontos do programma, com a parte 
practica, em 31 lições; de paleografia e diplomática também 30, com 0 
esgotamento do programa e nas mesmas condições, em 47 aulas; de 
iconografia os 29 nelle inscriptos, em 32 aulas, incluída igualmente a 
55 
practica da matéria; de numismática, finalmente, houve 31 aulas, 
em que se leram os 24 pontos do programa com a parte practica" 
(Biblioteca Nacional, 1916, p.366). 
Os programas destas disciplinas eram bastante extensos 
e abrangiam diversos conteúdos. A disciplina Bibliografia, que 
compunha o currículo dos anos 40, por exemplo, constava de: 
"1 )Bibliografia. Noções preliminares; 2) Tipografia. Composição e im-
pressão; 3) O livro. Ornamentação. flustração. Ex-Libris. Formato; 4) 
Encadernação; 5) O papel. História e fabricação; 6) Conservação e res-
tauração de Livros; 7) Invenção da imprensa. Transição do livro ma-
nuscrito para o impresso. Primeiros impressores; 8) Características do 
livro antigo e moderno. Incunábulos e cimélios. Livros raros e preciosos. 
Falsificação bibliográfica; 9) O jornal. A revista. O folheto. Publicações 
periódicas; 10) Classificações. Sistemas principais; 11) Classificações 
decimal, suas codificações; 12) Catalogação. Arrumação dos livros e 
preparo para a catalogação. O bilhete sistemático. A ficha; 13) O catálo-
go. Fontes de informação. Repertórios; 14) A imprensa no Brasil. Livros 
e jornais. Impressores e editores. Bibliografia Nacional. Fontes de Infor-
mação; 15) Bibliotecas; História. Construção. Iluminação. Mobiliário; 
16) A Biblioteca Nacional do Rio de janeiro. Fundação e fases do seu 
desenvolvimento. Bibliotecas no Brasil; 17) Organização e Administra-

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