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1 DIREITO PENAL 28º CPR 2 Sumário 1.a - Dogmática jurídico-penal: teorias contemporâneas. ................................................................................................................ 3 1.b – Aplicação da pena .................................................................................................................................................................. 6 1.c - Crimes de homicídio, de lesões corporais e de periclitação da vida e da saúde. .................................................................... 8 2.a. Criminologia: teorias contemporâneas. .................................................................................................................................. 11 2.b. Concurso de crimes. ............................................................................................................................................................... 13 2.c. Crimes contra a liberdade pessoal.......................................................................................................................................... 16 3.a. Política criminal e política de segurança pública: tendências contemporâneas. ..................................................................... 18 3.b. Efeitos da condenação no Código Penal e em leis especiais. ................................................................................................ 21 3.c. Crimes contra a honra. ........................................................................................................................................................... 23 4.a. Princípios básicos do Direito Penal. Parte Geral. ................................................................................................................... 26 4.b. Contrabando e descaminho.................................................................................................................................................... 28 4.c. Crimes contra a inviolabilidade do domicílio, de correspondência, dos segredos e de interceptação de comunicações. ....... 29 5.a. Lei penal no tempo. ................................................................................................................................................................ 32 5.b. Prescrição Penal. ................................................................................................................................................................... 33 5.c. Crimes contra o sistema financeiro e contra o mercado de capitais. ...................................................................................... 35 6.a. Aplicação da lei penal no espaço. .......................................................................................................................................... 39 6.b. Crimes Políticos e Crimes Militares ........................................................................................................................................ 40 6.c. Crimes contra o patrimônio: roubo, extorsão, extorsão mediante sequestro, esbulho possessório e dano ............................ 41 7.a Limites da aplicação da lei penal em relação às pessoas. ...................................................................................................... 44 7.b Sanções penais no direito brasileiro ........................................................................................................................................ 45 7.c Crimes contra o patrimônio: estelionato e outras fraudes de competência da Justiça Federal. ............................................... 47 8.a. Princípio de interpretação e aplicação da lei penal. Concurso aparente de normas. .............................................................. 51 8.b. Direito penal e os indígenas. .................................................................................................................................................. 53 8.c. Tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual. ............................................................................................. 56 9.a. Teoria do crime. ..................................................................................................................................................................... 59 9.b. Crimes contra o patrimônio: apropriação indébita e receptação e crimes contra a propriedade intelectual. ........................... 63 9.c. Crimes de competência federal praticados contra criança e adolescente. .............................................................................. 67 10.a. Teoria da conduta................................................................................................................................................................. 70 10.b Crimes contra a organização do trabalho e redução a condição análoga à de escravo. ....................................................... 71 10.c. Crimes contra a saúde pública e os relacionados à remoção e transplante de órgãos. ........................................................ 73 11.a. Causalidade e imputação objetiva. ....................................................................................................................................... 75 11.b. Crimes de responsabilidade de prefeitos .............................................................................................................................. 77 11.c. Crimes contra a administração da Justiça. ........................................................................................................................... 79 12. a. Teoria do tipo doloso. .......................................................................................................................................................... 82 12.b. Extinção da punibilidade. ...................................................................................................................................................... 84 12.c. Crimes contra a fé pública. ................................................................................................................................................... 87 13.a. Teoria do tipo culposo .......................................................................................................................................................... 92 13.b. Crimes previstos na Lei n. 10.826, de 22/12/03. ................................................................................................................... 94 13.c. Crimes contra a ordem tributária e previdência social. ......................................................................................................... 96 14.a. Teoria do tipo omissivo ......................................................................................................................................................... 99 14.b. Crimes de tráfico ilícito e uso indevido de drogas. .............................................................................................................. 101 14.c. Crimes previstos no Estatuto de Roma (ER): normas gerais. ............................................................................................. 104 15.a. Ilicitude penal. .................................................................................................................................................................... 106 15.b. Crimes contra o meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural. .................................................................................... 108 15.c. Crimes de Lavagem ou Ocultação de Bens, Direitos e Valores .......................................................................................... 111 16.a. Culpabilidade. .....................................................................................................................................................................113 16.b. Crimes contra a ordem econômica e contra as relações de consumo. ............................................................................... 115 16.c. Crimes contra a paz pública e organizações criminosas. ................................................................................................... 117 17.a. Teoria do Erro .................................................................................................................................................................... 119 17.b. Genocídio e Tortura ............................................................................................................................................................ 120 17.c. Crimes nas licitações públicas e crimes contra as finanças públicas .................................................................................. 122 18.a. Etapas da realização do crime. .......................................................................................................................................... 124 18.b. Corrupção. Associação Criminosa...................................................................................................................................... 125 18.c. Crimes de preconceito e de discriminação. ...................................................................................................................... 127 19. a. Concurso de pessoas ........................................................................................................................................................ 129 19.b. Crimes contra a administração pública praticados por funcionário público. ...................................................................... 130 19. c. Crimes contra a incolumidade pública: crimes de perigo comum e contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços públicos. ......................................................................................................................................... 132 20.a – Teoria da pena ................................................................................................................................................................. 134 20.b. Aspectos relativos à repressão penal contidas em convenções internacionais sobre corrupção, organizações criminosas, tráfico de pessoas, tráfico de armas, terrorismo e escravidão. .................................................................................................... 136 20.c. Crimes contra a administração pública praticados por particular. ....................................................................................... 143 3 1.a - Dogmática jurídico-penal: teorias contemporâneas. Nas palavras de Jesus-Maria Silva Sanchez, “a elaboração categorial e a integração dos diversos conceitos jurídico- penais em um sistema, características dos estudos dogmáticos, proporcionam – seja qual for o método ou concepção dogmática da qual se parta – uma segurança jurídica de outro modo inexistente”. Assim, a dogmática serve ao estabelecimento de limites e garantias, de modo a evitar improvisações, irracionalidades ou arbitrariedades na atividade estatal de punir. Segundo Luiz Flavio Gomes, dogmática jurídico-penal e a “ciência que estuda, sistematiza e busca aprimorar as disposições legais e a opinião cientifica no campo do Direito penal”. No âmbito da dogmática jurídico-penal, destacam-se as teorias do delito, que conceituam e estruturam o crime sob diversas perspectivas. Tratar-se-á neste resumo, portanto, das principais teorias que se propuseram a elaborar ou a aperfeiçoar uma visão dogmática do delito. São elas: a teoria causal-naturalista; a neokantista; a finalista; a funcionalista (sob diferentes critérios: teleológico-funcional de Roxin, funcionalista sistêmico de Jakobs, funcionalista do controle social de Hassemer, reducionista de Zaffaroni, etc.). Teoria Causal-Naturalista. Esta teoria parte de uma influencia positivista, formalista e como diz o nome, naturalista, decorrente do método científico das ciências naturais (dedutivo). Deste modo, tem uma maior preocupação com a causalidade existente entre a pratica de um ato e a produção de um resultado que representa a violação de um bem jurídico. O crime e assim visto como fato natural e a ação humana da qual decorre, um movimento corporal voluntario que causa modificação no mundo exterior. Não se fazia qualquer valoração da conduta, não havia o aporte de elementos normativos na conceituação analítica do delito. Alias, o termo conduta somente foi introduzido por Radbruch, para abarcar as omissões. A vontade compreendia duas partes: uma externa (objetiva), que corresponde ao processo causal; e outra interna (subjetiva), que corresponde ao conteúdo final da ação (dolo/culpa). Em consequência, pretendia-se uma divisão bipartida do delito: uma parte objetiva (tipicidade e antijuridicidade) e outra subjetiva (culpabilidade: imputabilidade e dolo/culpa). O dolo, aqui, era o “dolus malus”, compreendendo consciência do fato e consciência da ilicitude. A tipicidade era indicio da antijuridicidade: ratio cognoscendi. Essa teoria foi desenvolvida, basicamente, por Franz Von Liszt e Beling. Teoria Neokantista. O neokantismo, surgido principalmente com Mezger, se propôs a agregar elementos normativos a estruturação analítica anterior. Parte-se de um enfoque deontológico (e não ontológico), de modo que a definição dos conceitos depende muito mais do sujeito que interpreta o objeto, ou seja, dos valores que o sujeito atribui a um dado objeto, que do objeto em si mesmo. Utiliza-se de concepção filosófica fundada em três planos: o da realidade sensível, o dos valores e o das significações. A realidade sensível, neste enfoque, não tem qualquer valor intrínseco, absoluto, imutável ou universal (como proposto pelos naturalistas), os valores são dados pelo sujeito que realiza uma compreensão do fenômeno, atribuindo- lhe significação (valores condicionados subjetivamente, culturalmente). Deste modo, sugere-se um deslocamento do método explicativo (próprio das ciências naturais) para o método compreensivo (próprio das ciências humanas) – Silva Sanchez. Em consequência, a tipicidade passa a ser encarada como a valoração negativa de uma conduta por parte do legislador, contendo, inclusive, elementos normativos específicos, como “funcionário público”, “coisa alheia” – Luiz Flavio Gomes. Considera-se o bem jurídico como realização de um valor, e sua lesão como critério decisivo da interpretação dos tipos. A antijuridicidade passa a ficar atrelada ao conceito de danosidade social e de princípios materiais, donde se parte para fundamentar a existência de causas supralegais de justificação da conduta. Por fim, a culpabilidade passa a ser psicológico-normativa, uma vez introduzido o elemento “exigibilidade de conduta diversa” neste requisito. A teoria ficou marcada pelo excessivo subjetivismo epistemológico ou relativismo axiológico, embora tenha agregado fundamentos indispensáveis à evolução dogmática no sentido da interpretação valorativa e material dos requisitos do delito, além de ter agregado elementos novos, como a exigibilidade de conduta diversa. TEORIA DOS ELEMENTOS NEGATIVOS DO TIPO. Foi nesta época, em que a filosofia neokantiana estava em pleno vapor (meados do século XIX ate o inicio do século XX), que se desenvolveu a teoria dos elementos negativos do tipo, criada por Merkel e aperfeiçoada por Frank e Radbruch. De acordo com essa teoria, o tipo penal já contém a antijuridicidade, compondo-se de duas partes: uma positiva (realização dos elementos do tipo, no sentido tradicional) e uma negativa, que corresponde à ausência de causas de justificação. Assim, para que se possa dizer que um fato e típico, deve-se perquirir se e ilícito (tipo total de injusto); se não for ilícito, não será típico. A tipicidade e a própria essênciada antijuridicidade (ratio essendi). Teoria Finalista. Criação de Hans Welzel, esta teoria partiu de uma tentativa de frear o subjetivismo próprio da teoria neokantista, de modo a estabelecer um conceito prévio de ação, com base em estruturas logico-objetivas, apto a vincular o legislador. Assim, evita-se que o legislador/juiz exercite o poder de definir os conceitos a partir de valores escolhidos de forma absoluta ou ilimitada. Parte-se, pois, de um enfoque ontológico, em que se sustenta que a realidade já tem incorporada a dimensão de sentido. Deste modo, o sujeito que interpreta o fenômeno apenas identifica as estruturas logico-objetivas da realidade e a partir dai conclui qual e a regulação jurídica que se deve dar aos diferentes problemas penais – Silva-Sanchez. Neste sentido, conforme exemplo citado na obra de Silva-Sanchez, e possível conferir a uma cadeira o mesmo regramento jurídico dado a uma mesa, mas não se pode pretender conferir a cadeira a capacidade negocial dos homens, já que falta a cadeira capacidade ontológica para isso. Mais precisamente no que toca ao direito penal, as estruturas logico- objetivas serão: a estrutura final da ação e a estrutura da culpabilidade como poder atuar de outro modo. A estrutura final da ação, concebida como atividade dirigida a um fim (já que e o fim que diferencia o delito – de matar, no homicídio, de lesionar, na lesão), teve como consequência o deslocamento do elemento subjetivo (dolo/culpa) para a tipicidade. Sim, porque se finalidade pressupõe dolo, infere-se que o dolo pertence a ação. Ademais, se a conduta já possui um valor (ou desvalor) em si mesma, uma vez dirigida a um fim desvalioso que poderia ser evitado (estrutura final da ação+possibilidade de atuar de outro modo), o resultado no finalismo deixa de ter maior importância, o delito passa a ser conceituado como violação ético- social, e não como violação a bem jurídico (definição presente tanto no causalismo como no neokantismo). O finalismo pretende, pois, que os dois elementos logico-objetivos apontados sejam suficientes para evitar uma interpretação irracional do legislador, no sentido de erigir como crime conduta destituída de intenção dirigida a uma violação ético-social, ou ação justificável pela inexigibilidade de conduta diversa. Ainda como consequência da teoria: abandona-se o dolo normativo e adota-se o natural (somente consciência do fato); na antijuridicidade, o importante e analisar se o autor, na pratica da 4 conduta, afastou-se das normas éticas tuteladas pela norma; a culpabilidade passa a ser puramente normativa (imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e exigibilidade de conduta diversa); principio da adequação social e utilizado para excluir a tipicidade. Criticas: pouco explica os crimes omissivos e os culposos; centra-se no desvalor social da ação e não do resultado; como não transcendeu a realidade ontológica para aproximar-se da realidade concreta, pouco se preocupou com a solução justa para o caso concreto. Teoria social da ação. Desenvolvida por Johannes Wessels e Hans-Heinrich Jescheck, esta teoria acrescenta uma nova dimensão à sistematização em voga: a relevância ou transcendência social da ação. “A conduta, para a teoria social, e o comportamento humano voluntario psiquicamente dirigido a um fim socialmente reprovável”. Observa-se, assim, que a teoria teve o objetivo de conferir nova definição ao conceito de conduta, de modo a incorporar elemento negativo implícito no tipo. Melhor dizendo, em um exame concreto, se a conduta tem adequação social, deixa de ser típica. Padeceu de excessiva vagueza, ante a indefinição do que seja transcendência ou relevância social. Teorias Funcionalistas. Emprega-se o termo “teorias”, assim no plural, tendo em vista que, apesar de voltadas a um novo enfoque, de sistematização e interpretação dos conceitos de acordo com a função do Direito Penal, representam distintas vertentes de orientação dogmática, justamente pela multiplicidade de funções do Direito Penal a que se pode dar relevância. Como característica comum, há uma superação do método dedutivo-abstrato para uma espécie de sistema aberto, em que se combinam considerações tópicas (voltadas ao caso concreto) e abstratas (no campo da valoração). Assim, referido sistema aberto de interpretação/estruturação do crime, permite: a combinação necessária de elementos externos ao Direito Penal, como a Politica Criminal (Roxin), ou perspectivas de cunho sociológico, como a teoria luhmaniana dos sistemas (Jakobs); a construção de uma ciência evolutiva, atenta a evolução de conhecimento e comportamento; e a analise da realidade concreta, como reflexo de uma maior preocupação com a solução mais justa dos casos. Há um afastamento da compreensão ontológica, de forma radical (Jakobs) ou moderada (Roxin), para dar ênfase à atividade valorativa do sujeito, que estaria limitada não pelas categorias imanentes ao ser, mas por valores e princípios de politica-criminal, direitos humanos e Estado Social e Democrático de Direito (Roxin), ou por um fim de estabilização do sistema (Jakobs). Roxin, no entanto, mantem os limites do sentido ordinário de linguagem, elementos de ordem ontológica, mas sempre sob a orientação politico- criminal. Jakobs, de sua parte, absolutiza o funcionalismo. Nas palavras de Silva Sanchez e LFG, a referencia a valorações politico-criminais e a única forma de racionalizar o sistema penal (coibir relativismos e arbitrariedades do legislador/julgador; reduzir a intervenção penal e sua intensidade aos limites necessários), diante das inseguranças que os conceitos ontológicos produzem em uma sociedade plural e pluricultural. Um dos pontos mais relevantes do funcionalismo e, pois, a integração de uma tipicidade material ao modelo já conhecido (formal+subjetivo). Nesta categoria, há o aporte de princípios e teorias, a exemplo da teoria da imputação objetiva (Roxin e Jakobs) e da tipicidade conglobante (Zaffaroni). Passemos a exposição das principais correntes funcionalistas, isoladamente. ROXIN. CONCEITO TELEOLOGICO-FUNCIONAL, funcionalista-teleológico ou racionalfinal. Observa-se uma ênfase nos fins e princípios da Politica-Criminal (rompe-se a barreira entre Direito Penal e Politica-Criminal) e nas funções de prevenção geral e especial negativas. O crime e dividido em tipicidade, antijuridicidade e responsabilidade. Assim, no exame de uma conduta a luz do Direito Penal, verifica-se, primeiro, se e formalmente típica. Em seguida, se e materialmente típica, analisando-se se houve “ofensa desvaliosa a bem jurídico relevante” (conceito de crime para Roxin). Aqui incide uma serie de princípios de Politica-Criminal e direitos humanos, que funcionam como guia da atividade valorativa/interpretativa, como o principio da intervenção mínima, a função da norma sob interpretação (prevenção geral de lesões ao bem jurídico), além de uma teoria que exclui a imputação objetiva nos casos em que não houve criação de “risco proibido, concretizado no resultado produzido”. A teoria da imputação objetiva leva esse nome, tendo em vista que precede a analise do aspecto subjetivo da tipicidade (dolo/culpa). Assim, somente se a conduta se amoldar a redação legal e configurar ação/resultado relevantes para o Direito Penal, a luz dos princípios e teorias citados, e que se passara ao exame do elemento subjetivo do tipo. Presente o dolo ou a culpa, parte-se para a analise da antijuridicidade, também normativa, campo de ponderação dos bens jurídicos envolvidos. Por fim, a responsabilidade, que e formada pela culpabilidade, já conhecida, além de necessidade concreta da pena para fins de prevenção do delito, aspecto individualizante da resposta penal (fim de prevenção especial). JAKOBS. CONCEITO FUNCIONALISTA SISTÊMICO. Para Jakobs, delito e toda violação da norma, disfuncional as expectativas sociais de convivência. Delito e a frustraçãodas expectativas normativas. Pena e a confirmação da vigência da norma. O Direito Penal existiria, assim, para proteger a norma e por via indireta, os bens jurídicos; e um instrumento de estabilização do sistema. Verifica-se, pois, uma ênfase na função de prevenção geral positiva da pena, no simbolismo da intervenção penal para garantir um sentimento de preservação das normas e valores sociais. Parte da teoria luhmaniana dos sistemas, em que a presença dos riscos (da convivência em sociedade e do progresso) exige um mecanismo de estabilização, que seria o sentimento geral de eficácia das normas jurídicas regulatórias. Jakobs divide o crime em tipicidade (formal, material e subjetiva), antijuridicidade e culpabilidade. Na tipicidade material, utiliza-se da teoria da imputação objetiva com enfoque na representação de funções, de papeis na sociedade, e no principio da confiança, o que reflete sua preocupação com os sistemas e microssistemas. No campo da culpabilidade, propõe um exame da conduta de modo atrelado a finalidade preventiva geral: culpável e o agente que tenha alternativa de comportamento, mas não se motivou pelo respeito à norma. A principal critica que se faz a essa teoria e de que pode servir a um Estado totalitário, porque não se questiona o conteúdo das normas, os valores sociais a que se prestam. O sistema dogmático não conta com valores e princípios orientadores e limitadores. O que vale e a estabilização do sistema, e não a proteção da dignidade do ser humano, das garantias e direitos fundamentais do homem. Trata-se de um modelo mais sociológico que dogmático-jurídico. Referida critica foi agravada quando Jakobs passou a defender a existência de dois Direitos Penais, um para o cidadão, com garantias; outro para o inimigo, sem garantias. HASSEMER. CONCEITO FUNCIONALISTA DO CONTROLE SOCIAL. Direito Penal e meio formal de controle social, para manutenção de determinada ordem social. Delito e conduta desviada e pena e reação social formal, sob garantias de Estado Democrático de Direito. O Direito Penal existe para cumprir essas funções garantistas. ZAFFARONI. FUNCIONALISMO REDUCIONISTA OU CONTENCIONISTA. Função do Direito Penal e reduzir a violência do Estado de polícia, assim como sua seletividade inerente. Também tem a função de tornar o poder punitivo menos irracional. Agrega à tipicidade a teoria da tipicidade conglobante, de forma que a tipicidade penal seria formada pela 5 tipicidade legal (ou formal) + tipicidade conglobante (antinormatividade, violação da norma subjacente ao tipo). A antinormatividade exige uma interpretação sistematizada, de modo a excluir a tipicidade de condutas que, embora descritas num tipo penal, são fomentadas por outras normas jurídicas. Paulo Queiroz critica a coerência e necessidade de dita teoria, sob o argumento de que, em verdade, não há sequer tipicidade formal nos casos citados por Zaffaroni, seja porque mesmo num juízo de subsunção e preciso fazer uso de uma interpretação sistematizada e teleológica, seja porque há uma exclusão justificada pelo estrito cumprimento de dever legal, seja porque não há criação de um risco proibido. LUIZ FLAVIO GOMES. Para LFG, crime envolve tipicidade e antijuridicidade, sendo a culpabilidade um dos fundamentos da pena. Ademais, somente há efetividade na norma quando há exigência de ameaça de pena (punibilidade), que transforma o crime em fato punível. LFG da especial ênfase ao principio da ofensividade na analise da tipicidade material, já que comunga da definição de delito como ofensa a bem jurídico relevante. Propõe a exclusão da culpabilidade/punibilidade do conceito de crime para aperfeiçoar algumas questões praticas: na receptação, haveria de se falar em crime anterior mesmo quando o furto fora praticado por menor; quem auxilia filho a furtar o pai participaria de crime, só não estaria alcançado pela escusa absolutória; quem auxilia embaixador estrangeiro a matar pessoa do país acreditante pratica crime, só não estaria alcançado pela imunidade. Em outras palavras, a diferença e que para uns o crime não tera efetividade. PAULO QUEIROZ. CONCEITO MONISTA-FUNCIONAL. Para Paulo Queiroz, não há razão para a autonomia dos requisitos do crime (tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade), pois não passam de momentos, níveis ou graus de apuracao do carater criminoso do fato. Defende, então, não só um entrelacamento de tipicidade e antijuridicidade, como a teoria dos elementos negativos do tipo já o propõe, mas também da culpabilidade. Explica-se: a culpabilidade e expressão de exigibilidade de conduta diversa, tendo em vista os fins de prevenção geral e especial, já que nos casos de ausência de culpabilidade o que se tem e uma impossibilidade ou falta de razoabilidade de se exigir um comportamento conforme as normas. Assim, nos termos de Paulo Queiroz: “a exigibilidade de uma conduta diversa (conforme o direito) não e uma análise posterior, nem estranha a verificacao do injusto penal, nem e exclusividade da culpabilidade, visto que e contemporanea da própria intervenção jurídico-penal, por ser uma consequência logica da natureza instrumental (ou funcional ou preventiva) do direito penal. Mais ainda: e a exigibilidade, em face da normal motivabilidade, que determina, em ultima analise, a atipicidade do fato (mas não só ela, pois contam, também, critérios de conveniência politicocriminal) e a justificação de certos comportamentos (causas de exclusão de ilicitude)”. Noutros termos, “se função do direito penal e motivar comportamentos no sentido do comando normativo, segue-se que semelhante tarefa somente pode ser dirigida aquele que se ache em condições físicas, psíquicas, culturais, etc., de entender tais normas e de poder agir segundo a pretensão do legislador que as editou”. Dai o autor explica que diversas causas de exclusão de conduta, de atipicidade ou antijuridicidade se fundamentam na mesma questão: norma penal carece do poder de motivar no caso concreto (a exemplo da coação física irresistível, conduta sem dolo ou culpa, legitima defesa, etc.). Assim, a exigibilidade esta presente em todos os outros critérios, sendo o que se chama de culpabilidade mais um nome para designar casos em que o legislador considera desnecessária a pena. A transferência de uma causa de justificação de um requisito ao outro não tem qualquer repercussão pratica, mas somente sistemática, como ocorreu com o dolo e a culpa (transferidos para a tipicidade), como ocorre com o consentimento do ofendido que e, para alguns (Roxin), causa de exclusão da tipicidade e, para muitos outros, de antijuridicidade. Trata-se, pois, de interpretação que, por ser essencialmente subjetiva, gera divergências de toda espécie. Deste modo, propõe que a teoria dos elementos negativos do tipo seja revista “para compreender: a) a realização de todos os elementos do tipo; b) a ausência de causas de justificação; e c) a ausência de causas de exclusão de culpabilidade”. 6 1.b – Aplicação da pena 1. Aplicação da pena. Cuida-se de ato discricionário juridicamente vinculado. É regida pelo princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da CF/88). A orientação dada por tal princípio ocorre em três momentos distintos: (i) individualização legislativa: processo através do qual são selecionados os fatos puníveis e cominadas as sanções respectivas, estabelecendo os limites e os critérios de fixação da pena; (ii) individualização judicial: elaborada pelo juiz na sentença, é a atividade que concretiza a individualização legislativa que cominou abstratamente as sanções penais, consistindo na aplicação da pena; e (iii) individualização executória: é a que ocorre durante o cumprimento da pena. Adota-se, no Brasil, o critério trifásico de aplicação da pena (art. 68 do CP), de Nélson Hungria. Entretanto, para a pena de multa adotou-se o sistema bifásico (art. 49 do CP); fixa-se inicialmente o númerode dias multa e, após, calcula-se o valor de cada dia-multa. A aplicação da pena é feita em três fases distintas e sucessivas: 1ª) pena-base, a partir das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP; 2ª) pena-provisória, fase em que incidem as circunstâncias legais (atenuantes e agravantes); e 3ª) pena-definitiva, em que se consideram as causas de aumento e de diminuição. Em um primeiro momento são analisadas as elementares e as circunstâncias do crime, a fim de que se chegue à adequação típica. As elementares são componentes do tipo penal, enquanto as circunstâncias são moduladoras da aplicação da pena, e são acidentais, isto é, podem ou não existir na configuração da conduta típica. A forma mais segura para distinguir se determinado fator previsto em lei constitui-se em elementar ou circunstância se faz pelo critério da exclusão. Se a sua retirada resultar na atipicidade do fato ou na desclassificação para outro delito, trata- se de elementar. Mas se subsistir o mesmo crime, alterando-se somente a quantidade de pena, cuida-se de circunstância. As circunstâncias, que não constituem e nem qualificam o crime, são conhecidas na doutrina como circunstâncias judiciais, circunstâncias legais e causas de aumento e de diminuição da pena. Seguem algumas regras inerentes ao critério trifásico: a) na pena-base o juiz deve navegar dentro dos limites legais cominados à infração penal, isto é, não pode ultrapassar o patamar mínimo nem o patamar máximo correspondente ao crime; b) se estiverem presentes agravantes e atenuantes genéricas, a pena não pode ser elevada além do máximo abstratamente cominado nem reduzida aquém do mínimo legal; c) as causas de aumento e de diminuição são aplicáveis em relação à reprimenda resultante da segunda fase, e não sobre a pena-base. Havendo causas de aumento/diminuição, a pena pode ser definitivamente fixada acima ou abaixo dos limites máximos e mínimos fixados pelo legislador; d) na ausência de agravantes e/ou atenuantes genéricas e também de causas de aumento/diminuição, a pena-base resultará como definitiva. 2. Código Penal e leis especiais. 1ª Fase: Análise das circunstâncias judiciais. O art. 59 CP prevê 8 (oito) circunstâncias que devem ser levadas em conta pelo magistrado quando da fixação da pena-base: 1) culpabilidade: grau de reprovação da conduta. Não se confunde com a culpabilidade como “fundamento da pena”, ou seja, aquela que compõe a estrutura do crime (exigibilidade de conduta diversa, imputabilidade e potencial consciência da ilicitude). Deve ser examinada com base na maior ou menor censurabilidade do comportamento do agente. Quanto mais intenso for o dolo, maior será a censura; 2) antecedentes: fatos anteriores praticados pelo réu. A noção do que sejam antecedentes vem sendo construída pela jurisprudência, devendo ser entendido como tal aquelas condenações definitivas por fatos praticados antes daquele objeto da aplicação da pena. Ademais, os antecedentes assumem caráter subsidiário em relação à reincidência (agravante da segunda fase de aplicação da pena). O STJ editou a sumula 444 com o seguinte teor: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.” Segundo esse entendimento, somente será antecedente a condenação anterior que não servir para a reincidência (A questão não está pacificada no âmbito do STF, que, em uma guinada de entendimento, decidiu recentemente no sentido contrário); 3) personalidade: síntese das qualidades morais e sociais do agente. Perfil subjetivo do réu; 4) conduta social: comportamento do agente em seu meio social, na família, no emprego. Estilo de vida; 5) motivos determinantes: fonte propulsora da vontade criminosa. Podem ser imorais/antissociais ou morais/sociais. Só cabe quando a motivação não caracterizar qualificadora, causa de diminuição etc.; 6) circunstâncias do crime: forma e natureza da ação, meios utilizados, tempo, lugar e forma de execução; 7) consequências do crime: analisa- se a maior ou menor danosidade decorrente da ação delituosa. Exemplo: matar um arrimo de família; 8) comportamento da vítima: serve apenas para melhorar a situação do réu. Leva em conta estudos de vitimologia. É comum no estelionato. Analisa-se se a vítima, de algum modo, contribuiu para o crime. 2ª Fase: Circunstâncias legais: agravantes e atenuantes genéricas. Agravantes: art. 61 e 62 (rol taxativo). Atenuantes: art. 65 e 66 (rol exemplificativo). O CP não estabelece a quantidade de aumento ou diminuição das agravantes e atenuantes. Todavia, utiliza-se na prática forense a fração de 1/6 (um sexto). Ao final dessa fase, chega-se à pena provisória. Na segunda fase não é possível ultrapassar os limites da pena (mínima e máxima) previamente estabelecidos no tipo penal. Dentre as atenuantes inominadas (art. 66 do CP), encontra-se a co-culpabilidade, que é a situação em que o agente (em regra, pobre e marginalizado) deve ser punido de modo mais brando pelo motivo de a ele não terem sido conferidas, pela sociedade e pelo Estado todas as oportunidades para o seu desenvolvimento como ser humano. Quando houver duas qualificadoras, uma deverá ser valorada como tal e a outra deverá ser considerada como agravante genérica, desde que elencada tal circunstância, caso contrário deverá ser avaliada como circunstância judicial. 3ª Fase: Causas de aumento e de diminuição da pena. São também chamadas de majorantes e minorantes. São estabelecidas em quantidades fixas (metade, dobro, triplo) ou variáveis (ex. um a dois terços). Dividem-se em genéricas (parte geral do CP) e específicas (parte especial do CP e leis extravagantes). Em caso de concurso, v. art. 68, parágrafo único. Concluída a dosimetria da pena, a etapa seguinte consiste em determinar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade: fechado, semiaberto ou aberto. No caso de crime hediondo, o regime inicial será, necessariamente, o fechado. Após, o magistrado deve analisar eventual possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa. E se não for cabível a substituição, mas a pena for igual ou inferior a 2 (dois) anos, exige-se manifestação fundamentada acerca da pertinência ou não da suspensão condicional da pena (sursis), se presentes os requisitos legais. Leis especiais: nenhuma lei esparsa consagra um modo especial de dosimetria da pena, aplicando-se, por inteiro, as previsões do CP. Todavia, o art. 42 da Lei 11.343/2006 estabelece que o juiz considerará, com preponderância sobre o art. 59 do CP, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente. Há, ainda, agravantes e atenuantes previstas em outras leis. 7 3. Casuística. Súmulas STF: 718: e 719. Súmulas STJ: 231; 440; 443; e 444. Superando divergências entre suas turmas, a Terceira Seção do STJ, no julgamento do EREsp 1.154.752/RS, pacificou o entendimento no sentido de que a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea - que envolve a personalidade do agente - são igualmente preponderantes, razão pela qual devem ser compensadas (STJ. 6ª Turma. HC 301.693/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 04/12/2014). Já a 2ª Turma do STF diverge deste entendimento: “A teor do disposto no art. 67 do Código Penal, a circunstância agravante da reincidência, como preponderante, prevalece sobre a confissão.” (STF. 2ª Turma. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 18/03/2014). A atenuante da menoridade relativa prepondera sobre qualquer outra circunstância, inclusive sobre a reincidência (STJ, HC 162.216). Não configura bis in idem a utilização de condenações anteriores com trânsito em julgado, para caracterizar os maus antecedentes e a reincidência, desde que uma delas seja utilizada para exasperar a pena-base e a outra na segunda fase da dosimetria (STJ, HC 167.459). O critério de acréscimo/diminuição na segundafase é discricionário, cabendo ao juiz estabelecer um valor proporcional e razoável, observado o caso concreto; o patamar de 1/6, embora erigido pela jurisprudência e doutrina como fração média razoável e proporcional, não é necessariamente o máximo a ser acrescido (STJ, HC 179.964). O quantum de redução pela circunstância atenuante deve observar os princípios da proporcionalidade, razoabilidade, necessidade e suficiência à reprovação e prevenção ao crime (STJ, HC 141.273). A atenuante da confissão espontânea é inaplicável às hipóteses em que o agente é preso em flagrante (STF, HC 102.002). Se a confissão espontânea do acusado foi utilizada para corroborar o acervo provatório, embasando a condenação, é obrigatória a atenuação da pena, ainda que tenha havido retratação em juízo (STJ, HC 161.194). 8 1.c - Crimes de homicídio, de lesões corporais e de periclitação da vida e da saúde. Homicídio: classificação: crime comum; material; de forma livre; comissivo (em regra); instantâneo; de dano; unissubjetivo; plurissubsistente. Homicídio simples: matar alguém (caput): pena - reclusão, de seis a vinte anos. Caso de diminuição de pena: § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vitima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Homicídio qualificado: § 2° Se o homicídio e cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV - a traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: pena - reclusão, de doze a trinta anos. Feminicídio: Recentemente foi introduzida mais uma qualificadora ao homicídio pela Lei 13.104/2015, denominada de feminicídio. Não constitui crime específico, mas forma qualificada do crime de homicídio: VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino: PENA - reclusão, de doze a trinta anos. § 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: I - violência doméstica e familiar; II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Homicídio culposo: § 3º Se o homicídio e culposo: pena - detenção, de um a três anos. Aumento de pena: § 4o No homicídio culposo, a pena e aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou oficio, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro a vitima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena e aumentada de 1/3 (um terço) se o crime e praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. § 5o - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. § 6o A pena e aumentada de 1/3 (um terço) ate a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. (Incluído pela Lei no 12.720, de 2012). O homicídio privilegiado qualificado (homicídio hibrido) e admitido, diante de qualificadoras de índole objetiva (inc. III e IV), e não é hediondo, para a doutrina e a jurisprudência majoritária. Assim, pode haver crime com causa de diminuição de pena concorrente com qualificadoras de natureza objetiva, mas não com as subjetivas. Terá diminuição alguém que, sob violenta emoção apos injusta provocação, matar com fogo (qualificadora objetiva) ou explosivo o provocador. Respondera com diminuição da pena (Damásio E. de Jesus e Claudio H. Fragoso). A jurisprudência mais recente do STF tem afastado a possibilidade de homicídio qualificado com dolo eventual, sustentando que e manifesta a incompatibilidade entre o dolo eventual, que “implica numa mera aceitação de um resultado possível – e a qualificadora do recurso que impossibilita a defesa da vitima, a qual reclama um preordenamento do agente a conduta criminosa” (STF, HC 86.163). Sujeito passivo: pessoa que tenha rompido o saco amniótico (ser humano nascido). E indiferente que tenha respirado ou não (Cezar R. Bitencourt). André Estefam: a partir do nascimento, ou Grupo IV – PENAL 12 seja, das primeiras contrações expulsivas em que feto começa o procedimento de saída, ou com a primeira incisão medica, na cesariana. Sujeito passivo especial: se for vitima o Presidente da Republica, do Senado, Câmara ou STF, será crime contra a Segurança Publica (Lei 7.170/83), e não homicídio. Materialidade do homicídio: e crime que deixa vestígios; na ausência do cadáver, admitem-se outras provas, tais como o exame indireto (ex: pericia no local, nas roupas, carro) e testemunho, como no caso de Elisa Samudio e do ex-goleiro Bruno do Flamengo. Jurisprudência sobre embriaguez no trânsito e sobre morte em “racha” ou “pega” no transito: em morte no transito com embriaguez, só se aplica a teoria da actio libera in causa na embriaguez preordenada. Mas não se deve generalizar que qualquer homicídio na direção embriagada de veiculo seja doloso, salvo nos casos de embriaguez de preordenada. A diferença entre dolo eventual e culpa consciente esta no elemento volitivo do tipo penal. E isso se faz pela observação de todas as circunstancias objetivas do caso, sem adentrar na psique do agente. Já o racha e caso de dolo eventual se houver morte ou lesão. A prática de competição não autorizada no transito e crime autônomo, doloso e de perigo concreto no CTB. Se resultar lesão ou homicídio, e progressão criminosa pra 129 (se houver lesão) ou 121 (se houver morte) dolosos. HC 101698/RJ, rel. Min. Luiz Fux, 18.10.2011. (HC-101698). Gêmeo siamês ou xifópago (gêmeos ‘grudados’): haverá dois crimes de homicídio doloso, ainda que deseje só a morte de um, pois será o caso de dolo necessário de 2º grau (consequências necessárias): concurso material. Dolo abrange não só o objetivo perseguido, mas também os meios escolhidos e as consequências inerentes. E diferente do dolo eventual. E dolo direto de segundo grau. Dolo eventual e indireto. Explodir carro para matar politico e dolo direto de 1º grau para a morte dele; e há dolo direto de 2o grau para a morte do motorista e dolo eventual para o ciclista ou pedestre que passava pelo local. Só será crime hediondo (Lei 8.072/90) se cometido em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que por uma só agente. Extermínio e a matança ou chacina que visa a vitima pelo simples fato de pertencer a determinado grupo ou classe social ou racial. Relevante valor social ou moral. Relevante valor social: que tem motivação e interesse coletivos, de todos em geral. Ex.: homicídio por amor a pátria, amor paterno. Relevante valor moral: quando diz respeito a interesse particular. Ex: eutanásia. Há duas formas de eutanásia: ativa e passiva. Ativa pode ser direta e ativa indireta. Como diz André Estefam, todas exigem consentimento do doente, tácito ou real. Eutanásia ativa direta: há processo causal que o leva a morte. Ou seja, iria morrer, mas ainda estava bem. Médicos desenganaram, mas o processo que fatalmente o levaria a morte ainda não se iniciou. E crime. Mas, excepcionalmente, pode haver inexigibilidade de conduta diversa supralegal, se estiver sob dor constante e insuportável, já desenganada pelos médicos. Eutanásia ativa indireta (paliativa): estava morrendo e sua morte e abreviada. Ex.: drogas são ministradas para aliviar a dor insuportável. Neste caso, a morte não e desejada, mas e previsível. Pode ser invocado estado de necessidade. Dignidade da pessoa humana.Eutanásia passiva ou ortotanásia: interrupção do tratamento médico (desligar os aparelhos), processo causal mórbido já iniciado. Já estava praticamente morto. 9 Pode haver a morte licita se paciente, em plena consciência, solicitar sua morte. Emoção violenta: transitória perturbação da afetividade, ocasionada repentinamente, afetando o equilíbrio. Não se confunde com a atenuante genérica do art. 65, III, c do CP. No 121 §1o, deve haver domínio de violenta emoção e a conduta deve ser logo apos a provocação da vitima. Na atenuante genérica, deve estar sob influência de emoção, não se exigindo requisito temporal. Requisitos: 1o: emoção violenta; 2o: injusta provocação da vitima; 3o: sucessão imediata. Paixão: e a emoção em estado crônico, duradouro. Ex.: ódio, fanatismo, ciúme, ambição. Logo, a paixão vem da emoção. Para fins penais, se equiparam. A provocação da vitima deve ser injusta, mas não necessariamente ilegal. Se for uma agressão injusta contra o agente, pode haver legitima defesa. Deve haver imediatidade, em breve espaço de tempo. Se houver espaço de tempo para reflexão e preparo do crime, não há a privilegiadora. Ex: sofro a injusta provocação, vou para a casa e premedito minha vinganca privada – não tera o beneficio. A provocação pode ser contra terceiro ou ate animal. Concurso de pessoas: as circunstancias são incomunicáveis entre os concorrentes. Logo, se sou injustamente provocado pela vitima e, sob violenta emoção, mato o provocador, um amigo meu, que não tenha sido provocado nem sentido a intensa emoção, não se aproveitara da privilegiadora, que me beneficiara. A redução da pena, pelo STF, e obrigatória. Homicídio qualificado: a premeditação não constitui qualificadora. O homicídio qualificado e hediondo em qualquer de suas modalidades. a) Qualificado pela motivação (art. 121, § 2o, I e II): a.1) motivo torpe: e o moralmente reprovável, desprezível. Repugnante. Ciúme não e necessariamente torpe ou fútil. Dolo eventual e compatível com torpe e fútil. Cupidez e a ganancia. Um crime privilegiado não pode ser, ao mesmo tempo, torpe (STJ). Exemplos de torpeza: matar para obter droga, por haver uma proibição de relacionamento (ex: os irmãos Cravinhos e Suzane). Pode haver homicídio com dolo eventual que e qualificado pela torpeza; a.2) mediante paga ou promessa de recompensa. Será qualificado para ambos (mandante e autor), segundo STJ; e crime bilateral, em que o concurso de pessoas e necessário. Recompensas a posteriori não qualificam. Exige-se acordo prévio. Prevalece na doutrina que a recompensa ou paga devam ser de natureza econômica. a.3) Motivo fútil: e o motivo insignificante, banal. Vinganca não e motivo fútil, mas pode vir a ser torpe ou, dependendo, ate mesmo privilegiador. Vingança e ciúme podem ser privilegiado ou torpe ou fútil, a depender do caso concreto. Motivo não pode ser ao mesmo tempo torpe e fútil (STJ). O dolo eventual e compatível com o motivo fútil. Ausência de motivo não significa motivo fútil. Homicídio sem motivo e simples (posição de Cesar R. Bitencourt). Para F. Capez, e torpe. Ausência de motivos, para André Estefam, não caracteriza fútil (ou torpe). A rigor, não há crime algum que possa ser cometido por absoluta ausência de motivação. Código adotou teoria actio libera in causa, de modo que não se admite que embriaguez afaste, por si, a futilidade. André Estefam diz que o ato de beber reduz ou retira freios inibidores e, quando o agente voluntariamente ingere álcool, responde integralmente. Crime conexivo (V): crime para assegurar execução de outro e para garantir ocultação, impunidade ou vantagem. Pelo art. 108 do CP, nos crimes conexos, a extinção da punibilidade de um deles não impede, quanto aos outros, a agravação da pena resultante da conexão. Ex: no homicídio praticado para assegurar a execução de outro crime, a extinção da punibilidade com relação a este crime não impede o reconhecimento da qualificadora. b) qualificado pelos meios (III). Emprego de veneno: e indispensável que a vitima desconheça a circunstancia de estar sendo envenenada (meio insidioso = falso, hipócrita); substancia teoricamente inócua pode ser veneno, como o açúcar para o diabético. Veneno e substancia química, animal ou vegetal. Emprego de fogo ou explosivo: podem se constituir meio cruel ou de que pode resultar perigo comum. Emprego de asfixia: pode ser mecânica (ex: enforcamento, afogamento) ou toxica (uso de gás). Tortura: se o agente quer matar alguém através de dor intensa ou com sofrimento, e homicídio qualificado com tortura. Se o agente quer torturar e, por excesso nos meios a pessoa vem a morrer, ocorro crime de tortura com resultado morte (Lei 9.455/97). Se a pessoa quer torturar e, durante a conduta ou apos, quer matar e mata: ocorrem dois crimes em concurso material (tortura e homicídio) para alguns ou progressão criminosa para outros, se no mesmo contexto fático. Meio insidioso = dissimulado, hipócrita. Meio cruel: e o brutal, sem piedade, sofrimento desnecessário. Meio que pode resultar em perigo comum e aquele que pode atingir um numero indefinido ou indeterminado de pessoas. Isso e diferente dos crimes de perigo comum (Titulo VIII, Capitulo I do CP). Depende do elemento subjetivo, ou seja, da vontade do agente em matar ou em só causar perigo comum. Nada impede que haja concurso formal entre crime de perigo comum, desde que o meio escolhido, além de atingir a vitima, crie também perigo concreto para numero indeterminado de pessoas. Ex: incêndio (art. 250), explosão (art. 251). c) qualificado pelo modo de execução: são incompatíveis o dolo eventual e a qualificadora da traição, emboscada, dissimulação, etc. A traição: ataque sorrateiro, inesperado. Traição pode ser física ou moral (quebra de confiança). Surpresa e diferente de traição porque nesta há quebra da lealdade, confiança. Na surpresa, o ataque e inesperado. Há quem entenda que desentendimentos anteriores impedem surpresa. A superioridade de armas ou agentes não qualifica, por si só, mas e possível qualificar se há evidente desproporção no numero de pessoas que dificulta a defesa. júri pode redefinir a classificação dada pela pronuncia, mudando a qualificadora da traição pela surpresa. Emboscada: tocaia, a espreita, com ocultação premeditada. Se a vitima teve tempo de fugir, não incide a qualificadora. Mediante dissimulação: e a ocultação da intenção hostil. Absolvição de um por legitima defesa impõe a absolvição de coautor. Latrocínio e roubo em concurso com homicídio doloso (André Estefam): o elemento subjetivo será fundamental. Se houver a consumação do roubo e, apos, no mesmo contexto fático, tentar matar a vitima (‘animus necandi’), há roubo cumulado com tentativa de homicídio (STF). Se pretender roubar, consumando-se subtração e da violência resulta lesão grave, havendo intenção de matar, há três correntes: tentativa de latrocínio (André Estefam); roubo agravado por lesão grave; STF: roubo consumado com tentativa de homicídio, em concurso material. Logo, para o STF, se não houve morte como resultado da violência, mas apenas lesão grave em uma das vitimas, há homicídio tentado em concurso material com roubo, indo para júri (HC 91.585). Para TJDFT, 2008 09 1 013276-2 apr - 0006725-31.2008.807.0009 (res.65 - cnj) , consumado o roubo e tentada a morte, há latrocínio tentado. não há mero roubo qualificado (157, 2o, i) se provado animus necandi. Recurso que dificulta ou impossibilita a defesa: se relaciona as formas anteriores. Casos concretos: vitima dormindo, faca escondida, vitima concentrada noutra situação. Não há surpresa se vitima percebeu a aproximação e a intenção. d) Qualificadoras pelos fins (V): para assegurar execução, ocultação ou impunidade ou vantagem em relação a outro crime. 10 Homicídio Culposo (§ 3º). Homicídio culposo com causa de aumento de pena (§4o): tera causa de aumento de pena o homicídio se resultarde inobservância de regra técnica de profissão, arte ou oficio: e diferente da imperícia. Na imperícia, o profissional não tem a capacidade técnica que deveria ter. Na inobservância, o profissional tem a capacidade técnica que deveria ter, mas não a emprega ou a emprega mal. Se medico foi desidioso no curso de medicina e, depois de formado, em ato cirúrgico que poderia realizar por ter habilitação para tanto, erra e causa morte do paciente: caso de imperícia. Se pessoa que não e medica faz cirurgia e mata paciente: imprudência ou ate dolo eventual. Se médico não foi desidioso em sua formação e realmente detém conhecimento da técnica, mas não a observa, vindo o paciente a morrer: isso e inobservância regulamentar (§4o). Se médico capaz na sua formação, observando as normas técnicas, vem a causar a morte, isso e erro profissional que não enseja responsabilização penal, haja vista as limitações da ciência. Omissão de socorro: aplicável nos casos em que o agente, apos ferir culposamente a vitima, sem risco pessoal, não lhe presta assistência, vindo ela a falecer. Não respondera pela omissão de socorro do art. 135, mas por homicídio culposo qualificado pela omissão de socorro. Perdão Judicial (§ 5o): as consequências podem ser físicas ou morais. Aplicáveis só a crime culposo. Ex: caso da morte da esposa de Herbert Viana. Cabe o perdão judicial nos crimes do CTB (lesão e homicídio culposos), em que pese seja omisso. O art. 291 do CTB manda aplicar o CP subsidiariamente. Mas tem que demonstrar que sofrimento torna desnecessária a pena, não sendo o mero parentesco suficiente para tanto (TJDFT, novembro de 2011). LESÃO CORPORAL - Art. 129 - Ofender a integridade corporal (qualquer alteração anatômica prejudicial ao corpo humano) ou a saúde (perturbações fisiológicas). É crime comum, doloso (animus laedendi ou animus vulnerandi), culposo ou preterdoloso (nas suas diversas figuras), comissivo ou omissivo, material, instantâneo e de resultado. Há causa supralegal de exclusão da ilicitude por consentimento do ofendido, no caso de lesão corporal leve (ex.: tatuagem, piercing, artes marciais) (Masson, p. 90). Lesões em atividades desportivas e esterilização de sexo configuram exercício regular de direito (Masson, p. 91-103). A cirurgia de troca de sexo é caso de atipicidade material, em face da melhoria da qualidade de vida do paciente e do propósito terapêutico de adequar a genitália ao sexo psíquico (Resolução nº 1.652/CFM [Nucci, p. 673]). Os crimes afetos à Lei nº 11.340/2006 (lei Maria da Penha) são de ação penal pública incondicionada (STF, ADI nº 4424). DA PERICLITAÇÃO DA VIDA E DA SAÚDE – Reúne crimes de perigo individual, concreto ou abstrato. A estrutura de alguns destes ilícitos prevê resultado preterdoloso, no caso de lesão corporal grave/gravíssima ou de morte, seja como majorante (arts. 135 e 135-A), seja como qualificadora (arts. 133, 134 e 136); caso haja dolo de incorrer nos artigos 121 e 129, §§ 1º e 2º, estes dois tipos penais prevalecem, por força do princípio da consunção. Os crimes em questão são: PERIGO DE CONTÁGIO VENÉREO (Art. 130), PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE (Art. 131), PERIGO PARA A SAÚDE OU VIDA DE OUTREM (Art. 132), ABANDONO DE INCAPAZ (Art. 133), EXPOSIÇÃO OU ABANDONO DE RECÉM-NASCIDO (Art. 134), OMISSÃO DE SOCORRO (Art. 135) CONDICIONAMENTO DE ATENDIMENTO MÉDICO-HOSPITALAR EMERGENCIAL (Art. 135-A) e MAUS-TRATOS (Art. 136). 11 2.a. Criminologia: teorias contemporâneas. Numa concepção moderna, Criminologia é o conjunto de conhecimentos sobre o delito como fenômeno social, abrangendo os processos de elaborar as leis, infringi-las e de reagir à infração. Estuda o surgimento, a dinâmica e as variáveis do crime, contemplando-o como fenômeno individual e como problema social. Não mais se restringe ao estudo empírico do crime, mas também do criminoso, da vítima e dos mecanismos de reação social, por meio de investigações sociológicas, psicológicas e biológicas, no escopo da compreensão global da delinquência e das duas formas de prevenção ou neutralização. A Antropologia Criminal de Lombroso e, depois, a Sociologia Criminal de Ferri constituíam matrizes fundamentais da Criminologia etiológica, associada à tentativa de conferir-lhe cientificidade, segundo os pressupostos epistemológicos do positivismo. Nessa perspectiva, a Criminologia positivista é definida como uma ciência causal-explicativa da criminalidade; ou seja, que, tendo por objeto a criminalidade concebida como um fenômeno natural, causalmente determinado, assume a tarefa de explicar as suas causas segundo o método científico ou experimental e o auxílio das estatísticas criminais oficiais e de prever os remédios para combatê-la. Ela indaga, fundamentalmente, o que o criminoso faz e porque o faz. Estabelece- se desta forma uma divisão “científica” entre o (sub)mundo da criminalidade, marginalidade composta por uma “minoria” de sujeitos potencialmente perigosos e anormais (o “mal”) e o mundo, decente, da normalidade (o “bem”). A possibilidade de uma explicação “cientificamente” fundamentada das causas enseja, por extensão, uma luta científica contra a criminalidade erigindo o criminoso em destinatário de uma política criminal de base científica. A um passado de periculosidade confere-se um futuro: a recuperação. A introdução da ideia do “labeling approach” determinou, na Criminologia contemporânea, a formação de uma alternativa ao paradigma etiológico: o paradigma da “reação social” (“social reaction approach”) do “controle” ou da “definição”. O “labeling approach” é também denominado pela doutrina como interacionismo simbólico, etiquetamento, estigmatização, rotulação ou ainda por paradigma da “reação social” (social reaction approach), do “controle” ou da “definição”. “Labeling” parte dos conceitos de “conduta desviada” e “reação social”, como termos reciprocamente interdependentes, para formular sua tese central: a de que o desvio não é uma qualidade intrínseca da conduta ou uma entidade ontológica pré-constituída à reação social e penal, mas uma qualidade (etiqueta) atribuída a determinados sujeitos através de complexos processos de interação social; isto é, de processos formais e informais de definição e seleção. A Criminologia contemporânea desenvolvida na base deste paradigma, especialmente a Criminologia Crítica, tende a transformar-se, assim, de uma teoria da criminalidade para uma teoria crítica e sociológica do sistema penal. O sistema penal se dirige quase sempre mais contra certas pessoas do que contra certas ações legalmente definidas como crime. Pois os grupos poderosos na sociedade possuem a capacidade de impor ao sistema uma quase que total impunidade das próprias condutas criminosas. As diversas teorias criminológicas são comumente divididas em teorias do conflito e teorias do consenso. Na sociedade, existem diversos grupos sociais, cada um com seus interesses. As teorias do consenso entendem que o Estado funciona como mediador dos interesses contrapostos, e o Direito Penal representa um consenso social sobre a tutela desses interesses. As teorias do conflito veem o Estado como representante dos detentores do poder e o Direito como reflexo de seus interesses. Juarez Cirino dos Santos faz um contraponto entre a criminologia etiológica e a criminologia crítica, cuja política criminal alternativa propõe um “Direito Penal mínimo, orientado pela ideia de abolição do sistema penal, como objetivo estratégico final”. Teoria da Anomia: O delito é um fato normal na sociedade, pois sempre haverá alguém que não reconheça a autoridade da norma. O anormal é tanto a diminuição como o aumento brusco da criminalidade. Como o delito é um fator do funcionamento regular da vida social, a anomia é a expressão da quebra das regras até então vigentes em uma sociedade concreta. Quando se criam na sociedade espaços anômicos, ou seja, quando o indivíduoperde as referências normativas, então se enfraquece a solidariedade social. O indivíduo sente-se livre de vínculos sociais, tendo muitas vezes, um comportamento delituoso. Teoria Ecológica (Escola de Chicago): Vê a grande cidade como uma unidade ecológica responsável pela delinquência; paralelismo entre o crescimento da cidade e da criminalidade; funda-se na desorganização do desenvolvimento e na falta de controle social; deterioração da família, escola, perda das raízes, tentação pela riqueza vizinha e descontrole social. Teoria Espacial (Escola de Chicago): A análise da área social envolve o nível social, a urbanização e a segregação; busca prevenir o crime mediante nova arquitetura do espaço público. Propôs amplos programas comunitários para tratamento e prevenção da criminalidade, planejamento por áreas definidas, programas comunitários de recreação e lazer, reurbanização dos bairros pobres, alteração efetiva da situação socioeconômica das crianças. Teoria da Associação Criminal (ou diferencial): A conduta criminal, como qualquer outro comportamento, é consequência do aprendizado ao largo de um processo de “interação” com os demais. Para Sutherland: 1) o comportamento criminal aprende-se, não se herda nem se inventa; 2) aprende-se pelo contato social em um processo de comunicação; 3) o aprendizado dá-se, sobretudo, no interior de um grupo reduzido de relações pessoais; 4) compreende o ensinamento de técnicas de cometimento da infração, a orientação dos motivos, impulsos, razões e atitudes; 5) a orientação dos motivos está em função da interpretação favorável ou desfavorável das disposições legais; 6) um indivíduo se converte em criminoso quando as interpretações favoráveis à violação da lei preponderam sobre as favoráveis à obediência, o que constitui o princípio da associação diferencial; 7) a associação diferencial pode variar segundo a frequência, duração, prioridade e intensidade; 8) a formação criminal por associação é idêntica a qualquer outro processo de formação, ou seja, não se adquire pela simples imitação; 9) o comportamento criminoso é a expressão de um conjunto de necessidades e valores. Teoria da Subcultura Delinquente: O bando delinquente surge como resultado da estrutura de classes sociais. Cada grupo e subgrupo possui seu próprio código de valores, que nem sempre coincidem com os valores majoritários e sociais. A conduta delitiva não seria produto de desorganização ou ausência de valores sociais, mas o reflexo e a expressão de outros sistemas de normas e valores: crime é sinônimo de protesto e status no seu grupo; não utilitarismo da ação (muitos crimes não possuem motivação); a malícia da conduta (prazer em desconsertar e em prejudicar o outro); negativismo da conduta (polo oposto aos padrões da sociedade). 12 Teoria da Estigmatização (“labeling approach”): A estigmatização é o resultado negativo atribuído pelos grupos representantes do poder, que, ao se aperceberem de um perigo, fazem diferenças entre delinquentes e não delinquentes. A delinquência é consequência de processos de atribuição de papeis a uma pessoa, através de um processo dinâmico de interação entre o indivíduo e a sociedade, que origina naquele uma autoimagem correspondente à que os demais fazem dele, dando lugar normalmente a uma “desviação primária” (comportamento de defesa, ataque ou adaptação). A reação social posterior encaminha o processo de “desviação secundária” com a formação de modelos mais firmes de conduta desviada. A estigmatização pública como desviado ou criminoso implica a atribuição à pessoa correspondente de um rol (papel) desviado que finalmente adota e conforme o qual se comporta. Teoria Crítica (Radical ou Nova Criminologia): Aceita as premissas do “labeling approach”. Vincula delito e justiça social. Pretende defender o homem contra a sociedade de exploradores e não aceitar a defesa da sociedade contra o crime, pois o Direito Penal protege os interesses do grupo social dominante. Não é o criminoso que deve ser ressocializado, mas a própria sociedade que deve ser transformada. Entende ser o capitalismo a base da criminalidade, na medida em que promove o egoísmo, o qual leva os homens a delinquir. Estuda o delito em um contexto histórico, social e econômico. Teoria do Neorretribucionismo: Vertente surgida nos EUA, inspirada na Escola de Chicago, dando um caráter sagrado aos espaços públicos. Também denominada movimento de lei e ordem ou tolerância zero. Parte da premissa de que os pequenos delitos devem ser rechaçados, o que inibiria os mais graves, atuando como prevenção geral, pois afirma que existe uma relação de causalidade entre a desordem e a criminalidade (“broken windows”). QUESTÕES DE PROVA: conceitue criminologia. Fale do etiologismo. Correntes contemporâneas da criminologia. O que é vitimiologia. 28º CPR – SEGUNDA FASE: Discorrer sobre criminologia à luz dos paradigmas etiológico e da reação social. 13 2.b. Concurso de crimes. Princípios reguladores do concurso de crimes: 1) Princípio do cúmulo material: preconiza que as penas referentes aos vários delitos devem ser calculadas em separado e, em seguida, somadas. Cuida-se de uma operação meramente aritmética (quot delicta tot poenae) sendo justamente por isso criticada pela doutrina ante o seu excessivo rigor. A despeito do seu rigor, o sistema do cúmulo material foi adotado, entre nós, para regular o concurso material (art. 69, do CP), o concurso formal impróprio (art. 70, parte final, do CP), e o cumprimento da pena de multa (art. 72, do CP).2) Princípio do cúmulo jurídico: desenvolvido por Mittermayer, determina que o aumento de pena relativa aos vários delitos ocorra de maneira mais geométrica do que aritmética, ou seja, com a aplicação de sanção mais severa do que a prevista para cada infração isoladamente, mas sem chegar ao somatório global, de forma a abranger a gravidade dos fatos perpetrados. Esse sistema não é mais previsto na legislação brasileira, conquanto tenha sido adotado pelo CP/1890. 3) Princípio da absorção (que se assemelha ao princípio que, com a mesma denominação, regula o concurso aparente de norma): aplica-se a sanção de um só dos delitos, em regra a mais grave, que absorve as penas dos demais. O princípio da absorção foi, em parte, adotado pelo Código para regular o erro na execução e o resultado diverso do pretendido, consoante o disposto na primeira parte dos arts. 73 e 74, desprezando-se a punição pertinente à tentativa do delito pretendido pelo agente. 4) Princípio da exasperação: determina a aplicação da pena de um dos delitos, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada em certa quantidade, sendo que a intensidade do aumento varia em escala proporcional ao número dos delitos perpetrados pelo agente. A doutrina considera esse o melhor dos sistemas, pois permite ao magistrado quantificar a pena de forma mais adequada à quantidade dos fatos, mas sem atingir ou ultrapassar o rigor do cúmulo material. Cumpre registrar que o sistema da exasperação foi adotado para regular o concurso formal próprio (art. 70, 1ª parte, do CP), crime continuado (art. 71, do CP), e para o erro na execução e o resultado diverso do pretendido (arts. 73 e 74, parte final, do CP), quando também ocorrer o resultado que fora objetivado pelo agente. 5) Princípio do cumprimento unificado e progressivo da pena: importa na projeção do princípio da individualização da pena na sua fase executiva. Com efeito, mesmo que o agente possua diversas condenações, fato é que no momento em que iniciar a execução penal todas as penas devem ser unificadas perante o Juízo da Execução Penal. Essa é a mens do art. 1º, da LEP, secundado pelos arts. 75, § 1º, do CP, e 111, da LEP. OBS: Com relação ao postulado da vedação da pena de caráter perpétuo, de base constitucional(art. 5º, XLVII, “b”, da CF/1988), tem-se que, independentemente do sistema porventura adotado – cúmulo material, exasperação, absorção etc. –, o tempo de cumprimento efetivo de pena ou das penas unificadas, não poderá ultrapassar o teto máximo que, no Brasil, é de trinta anos (art. 75, caput). 1) Concurso material (art. 69, CP): Ocorre quando o agente, mediante 2 ou mais condutas, dolosas ou culposas, pratica 2 ou mais crimes, idênticos (concurso homogêneo) ou não (concurso heterogêneo). Requisitos: Pluralidade de Condutas e Pluralidade de Crimes. OBS: É possível, portanto, concurso material entre crimes distintos, v.g., comissivos e omissivos, dolosos e culposos, consumados e tentados etc. Se as penas forem de espécies diferentes – vale dizer, reclusão e detenção –, o art. 69, do CP, por influência do princípio do cumprimento progressivo, determina que se execute, primeiramente, a reclusão, por ser mais rigorosa do que a detenção. Critério de aplicação da pena: cúmulo material, ou seja, as penas são aplicadas cumulativamente. No caso de condenação a penas de reclusão e detenção, executa-se primeiro a reclusão. Se uma pena for privativa de liberdade + restritiva de direitos, a situação é diferente. Veja: conforme dispõe o art. 69, §1º, se o juiz não consegue suspender a pena privativa de liberdade para um dos crimes, não poderá aplicar a pena restritiva de direitos aos demais, que deverá ser convertida. Por fim, aplicadas duas penas restritivas de direitos, informa o §2º que o condenado as cumprirá simultaneamente, se compatíveis, e sucessivamente, se incompatíveis. Obs.: a) suspensão condicional do processo: A suspensão condicional do processo somente é admissível quando, no concurso material, a somatória das penas mínimas cominadas não suplanta 1 ano (STF). b) Na prescrição, cada crime prescreve isoladamente (art. 119 do CP), não se considerando o concurso de crimes. Até então, cuida-se da única situação em que as penas não são somadas. c) Quando os crimes são objeto de processos diversos, aplica-se o art. 69, III, a, da LEP, ou seja, essa norma dispõe que o juiz da execução tem a competência para somar ou unificar as penas. 2) Concurso formal ou ideal (art. 70, CP): Ocorre quando o agente, mediante 1 só conduta, pratica 2 ou mais crimes, idênticos (concurso homogêneo) ou não (concurso heterogêneo). Requisitos: Unidade de conduta e pluralidade de crimes. Classificação: a) Próprio (ou perfeito): quando os crimes forem resultantes de 1 único desígnio (pena aplicada pelo critério da exasperação, mas será aplicado o cúmulo material se mais benéfico ao acusado); b) Impróprio (ou imperfeito): se forem dolosos, provenientes de desígnios autônomos (pena aplicada pelo critério do cúmulo material). Crimes culposos: é possível o concurso formal, desde que se trate de concurso formal próprio. Teorias: a) Subjetiva: exige- se unidade de desígnios na conduta do agente para a configuração do concurso formal; b) Objetiva: bastam a unidade de conduta e a pluralidade de resultados. É a teoria acolhida pelo CP, já que o concurso formal imperfeito foi admitido como figura diversa. Critérios para aplicação da pena: A) Concurso formal próprio: i. Homogêneo: Escolhe-se qualquer uma das penas; ii. Heterogêneo: Escolhe-se a pena mais grave. Em ambos os casos, escolhida a pena, esta é aumentada, na terceira fase de aplicação da pena, de 1/6 a 1/2 (sistema da exasperação). Segundo o STF, leva-se em conta o número de infrações penais praticadas. Quanto mais infrações praticadas, mais próximo da metade; quanto menos infrações penais praticar, mais próximo de 1/6. Mas atente: em casos como estes, o concurso formal próprio/perfeito (que foi criado em benefício do réu) acaba sendo mais prejudicial que o concurso material. Resolvendo a situação, dispõe o parágrafo único do art. 70 que “não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código [concurso material]”. Aplica- se, então, o cúmulo de penas, mais justo (CÚMULO MATERIAL BENÉFICO). B) Concurso formal impróprio: no caso do concurso formal impróprio, afasta-se o sistema da exasperação, aplicando-se o sistema da cumulação de penas. OBS: Uma questão que suscita discussão quanto à existência ou não de desígnios autônomos é a do roubo praticado contra vítimas diversas. A jurisprudência preponderante é pelo reconhecimento do concurso formal impróprio. Isso se verifica tanto no STJ, como no STF. Efetivamente, ao planejar e empreender as elementares do delito de roubo em locais como transporte coletivo, condomínios residenciais, passeio público, dentre outros, o agente atua, dolosamente, querendo a produção de mais de um resultado. O desígnio, não é unitário, mas voltado, de forma independente, para a obtenção ilícita dos pertences de cada qual dos lesados. 3) Crime continuado (art. 71, CP): Ocorre quando o agente pratica 2 ou mais crimes da mesma espécie, 14 mediante 2 ou mais condutas, os quais, pelas condições de tempo, lugar, modo de execução e outras, podem ser tidos uns como continuação dos outros. [Conceito nas palavras de Gueiros: Ocorre quando o agente, mediante condutas múltiplas, pratica dois ou mais crimes, da mesma espécie, que devem ser considerados como se único fosse, haja vista a semelhança das circunstâncias objetivas de tempo, lugar e forma de execução. Por conta disso, a reprimenda penal há de ser aplicada não com penas cumuladas, mas, sim, com uma pena única exasperada.]. Pressupostos ou requisitos: (1) pluralidade de condutas; (2) pluralidade de delitos da mesma espécie; e (3) homogeneidade das circunstâncias. Elo de Continuidade: Requisitos para o elo de continuidade (CEZAR ROBERTO BITENCOURT): Condições de tempo (“uma certa periodicidade que permita observar-se um certo ritmo, uma certa uniformidade, entre ações sucessivas”), Condições de lugar, Maneira de execução (“A lei exige semelhança e não identidade).” Outras condições semelhantes: “a doutrina aponta a mesma oportunidade e a mesma situação propícias para a prática do crime”. Classificação: a) Comum (ou simples): quando presentes os requisitos (71, caput); b) Específico (ou qualificado): quando, além dos requisitos mencionados, tratar-se de crimes dolosos, praticados com violência ou grave ameaça à pessoa e contra vítimas diferentes (71, §u). No crime continuado qualificado, são seus requisitos: os mesmos do continuado genérico; crimes dolosos; praticados contra vítimas diferentes; cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa. Obs.: É possível continuidade delitiva nos crimes contra a vida, tendo o art. 71, parágrafo único, superado o teor da súmula 605 do STF. Critério de aplicação da pena: exasperação (no continuado comum aumenta-se a pena do crime mais grave de 1/6 a 1/3 e no continuado específico de 1/6 até o triplo). Natureza jurídica: a) Teoria da unidade real: os vários delitos consistem num único crime; b) Teoria da ficção jurídica: há vários delitos, mas a lei presume a existência de apenas 1, para efeito de aplicação da pena (adotada pelo CP, pois este trata do tema como “concurso de crimes”); c) Teoria mista: é um terceiro delito. Teorias sobre a unidade de desígnios: a) Puramente objetiva: o crime continuado fica caracterizado quando presentes as mesmas condições objetivas de tempo, lugar, modo de execução etc., independentemente de ser aferido o caráter unitário do dolo; b) Objetivo-subjetiva: para haver crime continuado, é necessário, além das condições objetivas, que o agente deseje praticar um crime como se fosse continuação de outro, como se existisse um autêntico dolo global [posição dominante na doutrina e jurisprudência. O STJ já teve a oportunidade de enfrentar a presente questão, mais especificamente com relação à possibilidade de haver crime continuado na chamada “criminalidade profissional”. Na ocasião, aquela Corte filiou-se à moderna doutrina de cunho objetivo- subjetiva, entendendo que,
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