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1 INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO – DIRLEY DA CUNHA JÚNIOR CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO – CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO – RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRA MANUAL DE DIREITO ADMINISTRATIVO – JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO A FAZENDA PÚBLICA EM JUÍZO – LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA I. Introdução; II. Limitações administrativas; III. Servidão administrativa ou pública; IV. Ocupação temporária; V. Requisição administrativa; VI. Tombamento; VII. Desapropriação; 1. Legislação; 2. Sujeitos ativo e passivo; 3. Objeto; 4. Procedimento; a) Fase declaratória; b) Fase executória. 5. Indenização e acessórios; 6. Desapropriação indireta; 7. Direito de retrocessão; 8. Desapropriação por zona. ______________________________________________________________________ 2 I. INTRODUÇÃO: Nos termos do art. 5º, XXII, XXIII, XXIV e XXV, CF/88: XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; Portanto, o Brasil, na linha dos demais Estados contemporâneos, garante o direito de propriedade em sua Constituição, condicionando-o, todavia, ao seu exercício conforme a função social. Assim, a função social da propriedade autoriza o Estado a intervir na propriedade privada sempre que seja necessário adequar o seu uso ao interesse público. Esse poder de intervenção se instrumentaliza por meio de limitações e servidões administrativas, requisição administrativa, tombamento e desapropriação. ______________________________________________________________________ II. LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS: São restrições gerais e abstratas emanadas do poder de polícia do Estado, que atingem o caráter absoluto da propriedade, tolhendo o poder de uso, gozo e disposição de um número indeterminado de propriedades particulares. As limitações administrativas encerram uma relação de direito pessoal, materializada em obrigações de conduta, sendo as obrigações negativas (ou de não fazer) mais comuns. Ex.: obrigação de não construir edifício até determinada altura. Por serem genéricas, as limitações administrativas, em regra, NÃO ensejam direito à indenização. ______________________________________________________________________ 3 ATENÇÃO: Direito à indenização por limitação administrativa: regra e exceção: Comentários: Dizer o Direito Conceito: Limitação administrativa é: ▪ uma determinação de caráter geral (é um ato normativo), ▪ por meio da qual o Poder Público impõe a proprietários indeterminados ▪ obrigações positivas (de fazer), negativas (não fazer) ▪ com o objetivo de fazer com que aquela propriedade atenda à sua função social. Exemplos: ▪ O plano diretor da cidade impõe que os prédios construídos em determinada área do município devem ter, no máximo, 8 andares. ▪ A criação de áreas especiais de proteção ambiental pode configurar limitação administrativa (STJ AgRg no AREsp 155302/RJ). Principais características: As limitações administrativas, em regra, são: ▪ Atos legislativos ou administrativos de caráter geral (leis, decretos, resoluções etc.); ▪ Definitivas (tendem a ser definitivas, podendo, no entanto, ser revogadas ou alteradas); ▪ Unilaterais (impõem obrigações apenas ao proprietário); ▪ Gratuitas (porque o Estado não precisa pagar indenização aos proprietários); ▪ Intervenções que restringem o caráter absoluto da propriedade. 4 O proprietário deve ser indenizado por conta das limitações administrativas que incidam sobre sua propriedade? Em regra, não. Na generalidade dos casos, a limitação administrativa é gratuita. No entanto, excepcionalmente, a jurisprudência reconhece o direito à indenização quando a limitação administrativa reduzir o valor econômico do bem. Essa é a jurisprudência do STJ: Sendo imposições de natureza genérica, as limitações administrativas não rendem ensejo a indenização, salvo comprovado prejuízo. (REsp 1233257/PR, rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, julgado em 16/10/2012, DJe 22/10/2012) Qual é o prazo prescricional para que o proprietário busque essa indenização? 5 anos, nos termos do Decreto-Lei nº 3.365/1941. Segundo decidiu o STJ, os danos eventualmente causados pela limitação administrativa devem ser objeto de ação de direito pessoal, cujo prazo prescricional é de cinco anos, e não de direito real, que seria o caso da desapropriação indireta. Em resumo: Em regra, o proprietário não tem direito à indenização por conta das limitações administrativas que incidam sobre sua propriedade (a limitação administrativa é gratuita). No entanto, excepcionalmente, a jurisprudência reconhece o direito à indenização quando a limitação administrativa reduzir o valor econômico do bem. O prazo prescricional para que o proprietário busque a indenização por conta das limitações administrativas é de 5 anos. STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 1.317.806-MG, rel. Min. Humberto Martins, julgado em 06/11/2012 5 Vale ressaltar, ainda, que o proprietário não terá direito à indenização se adquiriu o bem APÓS a limitação administrativa já ter sido imposta: É indevido o direito à indenização se o imóvel for adquirido APÓS o implemento da limitação administrativa, porque se supõe que as restrições de uso e gozo da propriedade já foram consideradas na fixação do preço. (REsp 920.170/PR, Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, julgado em 09/08/2011) ______________________________________________________________________ III. SERVIDÃO ADMINISTRATIVA OU PÚBLICA: As servidões administrativas são restrições estatais específicas que atingem parcial e concretamente o direito de propriedade, incidindo sobre o caráter exclusivo de propriedades determinadas. Tem natureza de direito real, pois, na servidão administrativa, estabelece-se uma relação entre coisas: a serviente e a dominante. Coisa serviente é a propriedade privada que possui o encargo real de suportar a servidão; a dominante, por sua vez, é o serviço público concreto ou um bem afetado a uma utilidade pública. A servidão consiste em uma obrigação de tolerar ou de deixar fazer, a qual, porque imposta a propriedades determinadas, pode gerar o dever de indenizar, desde que o ônus imposto tenha causado algum dano. Essa indenização, contudo, não pode elevar-se até o montante do valor da propriedade, pois que sobre esta não foi imposta supressão, mas mera restrição. Há que se ressaltar, por oportuno, que o valor da indenização deve compreender os juros moratórios e compensatórios, assim como a correção monetária, os honorários de advogado e as despesas judiciais, se for o caso. 6 Súmula 56 do STJ: Na desapropriação para instituir servidão administrativa são devidos os juros compensatórios pela limitação de uso da propriedade. Por fim, impõe-se aduzir que a servidão, a depender da origem, pode ser legal, convencional ou judicial. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Quadro comparativo entre limitação e servidão administrativa: LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA SERVIDÃO ADMINISTRATIVA Intervenção restritiva da propriedade; Intervenção restritiva da propriedade; Incide sobre o caráter absoluto da propriedade; Incide sobre o caráter exclusivo da propriedade; Natureza de direito pessoal; Natureza de direito real; Restrição genérica e abstrata; Restrição individual e concreta; Obrigação de fazer ou não fazer; Obrigação detolerar ou de deixar de fazer; Em regra, não gera o dever de indenizar. Em regra, gera o dever de indenizar. Obs. 1: A diferença entre a restrição sobre o caráter absoluto e exclusivo da propriedade está em que, na primeira, minoram-se os poderes de uso, gozo ou fruição 7 do proprietário sobre a sua propriedade; na segunda, ele é obrigado a suportar que outrem também usufrua de sua propriedade. Dica do Coach: o dever de indenizar, em um e outro caso, segue a linha de raciocínio construída pela teoria da responsabilidade civil do Estado por ato lícito. Ambos os institutos – limitação e servidão – são atos lícitos levados a cabo pelo Estado em prol de um interesse coletivo. Ainda como premissa, mencione-se, que a responsabilidade civil do Estado por ato lícito exige que o dano suportado pelo particular seja anormal e específico. Logo, em conclusão, apenas a servidão administrativa rende ensejo ao dever reparatório, pois a limitação administrativa é dirigida aos particulares genericamente considerados. ______________________________________________________________________ IV. OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA: É uma restrição estatal que atinge o caráter exclusivo da propriedade particular, fundada na necessidade pública normal de realização de obras ou exercício de atividades. É provisória e incide tão somente sobre bens imóveis, em razão, reitere-se, da necessidade que pode ter o Estado de utilizar, temporariamente, um imóvel particular para realização de obras públicas ou execução de serviços públicos. Diógenes Gasparini assenta que o imóvel, para ser objeto de ocupação temporária, deve estar desocupado ou ser improdutivo. De qualquer modo, se causar dano, rende ensejo à indenização posterior. ______________________________________________________________________ 8 V. REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA: Consoante dispõe o art. 5º, XXV, da CF/88, XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano; Requisição administrativa cuida, portanto, de restrição da propriedade particular decorrente de atividade estatal fundada na urgência. Por meio dela, o Estado utiliza bens móveis e imóveis ou, mesmo, serviços prestados por particulares, em face de situações de iminente perigo, como calamidades públicas, epidemias e etc. Não se confunde com a ocupação temporária, na medida em que, enquanto a requisição administrativa tem fundamento numa situação de perigo público iminente, na ocupação temporária a intervenção está assentada na necessidade pública normal de realização de obras ou exercício de atividades de interesse público. Nos termos do comando constitucional acima transcrito, a requisição gera o dever de indenizar, que é, contudo, condicionado à ocorrência de dano. ______________________________________________________________________ 9 ATENÇÃO: Quadro comparativo entre ocupação temporária e requisição administrativa: OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA Intervenção restritiva da propriedade; Intervenção restritiva da propriedade; Incide sobre o caráter exclusivo da propriedade; Incide sobre o caráter exclusivo da propriedade; Incide somente sobre bens imóveis desocupados ou improdutivos; Incide sobre bens móveis, imóveis ou serviços; Funda-se na necessidade normal de realização de obras ou exercício de atividades de interesse público; Funda-se em situação de perigo público iminente ou urgência; Gera o dever de indenizar, se houver dano. Gera o dever de indenizar, se houver dano. ______________________________________________________________________ VI. TOMBAMENTO: Trata-se de restrição estatal na propriedade privada, que se destina especificamente à proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, assim considerado o conjunto de bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público. Depende o tombamento de procedimento administrativo prévio, necessário para se aferir o valor histórico e artístico do bem, assegurado ao proprietário o direito de ampla defesa, para, caso queira, contestar o 10 valor referido. Ao final, não havendo contestação ou sendo ela improcedente, o bem será inscrito no livro chamado “Livro do Tombo”. O tombamento pode gerar direito à indenização, a depender da maneira que afete a propriedade. Se, por exemplo, gerar desvalorização do bem, ele enseja o direito à indenização. Impõe-se consignar, por fim, que é possível o destombamento, sendo esse entendido como ato de cancelamento do tombamento, motivado pelo desaparecimento dos motivos que levaram o bem à inscrição no Livro do Tombo. MODALIDADES DE TOMBAMENTO Quanto à constituição: 1. De ofício: incide sobre os bens públicos da União, Estados ou Municípios; 2. Voluntário: ocorre em duas hipóteses: (i) quando o proprietário solicitar e a coisa se revestir dos requisitos; ou (ii) quando o proprietário anuir, por escrito, à notificação que se lhe fizer, para inscrição da coisa em qualquer dos Livros do Tombo. 3. Compulsório: ocorre quando o proprietário se recusar a anuir à inscrição da coisa. Quanto à eficácia: 1. Provisório: curso do processo administrativo ainda em andamento; 2. Definitivo: depois de concluído o processo administrativo, o Poder Público procede à inscrição do bem como tombado. 11 Quanto aos destinatários: 1. Geral: incide sobre todos os bens situados em um bairro ou cidade; 2. Individual: atinge bem determinado. Obs. 1: A doutrina diverge sobre a possibilidade de tombamento de bens da União pelos Estados e Municípios, e dos Estados pelos Municípios. É pacífica apenas a possibilidade de tombamento de bens dos entes menores pelos maiores. O tema será retomado abaixo; Obs. 2: Para todos os efeitos, o tombamento provisório se equiparará ao definitivo. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Responsabilidade pela conservação do imóvel tombado: Comentários: Dizer o Direito Por meio do tombamento, são impostas algumas obrigações de fazer e de não fazer ao proprietário do bem tombado. Uma das obrigações de fazer (também chamadas de obrigações positivas) do proprietário do bem tombado é que ele terá que fazer todas as obras que forem necessárias para a conservação da coisa (art. 19 do Decreto-lei nº 25/37). Se o proprietário da coisa tombada não dispuser de recursos para proceder às obras de conservação e reparação necessárias, ele deverá comunicar essa circunstância ao órgão competente que decretou o tombamento para arcar com as despesas necessárias à sua conservação. Em outras palavras, a responsabilidade de reparar e conservar o imóvel tombado é, em princípio, do proprietário. Tal responsabilidade somente é elidida quando ficar demonstrado que o proprietário não dispõe de recurso para proceder à reparação. Em resumo: 12 A responsabilidade de reparar e conservar o imóvel tombado é do proprietário, salvo quando demonstrado que ele não dispõe de recurso para proceder à reparação. STJ. 2ª Turma. AgRg no AREsp 176.140-BA, rel. Min. Castro Meira, julgado em 18/10/2012. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Intervenções do Estado em propriedade pública: “hierarquia federativa” e (in) constitucionalidade do art. 2°, §2°, do Decreto-Lei 3.365/41:Respeitando-se as exigências constitucionais e legais, maiores dúvidas não surgem quanto à intervenção do Estado na propriedade privada. Ocorre que entes públicos também podem titularizar a propriedade de bens móveis e imóveis. Seria possível, então, algum ente político intervir na propriedade de outro? O Município pode tombar bens estaduais e federais? O Estado pode instituir servidão administrativa sobre bem federal? Ou apenas é possível o tombamento de bens públicos pertencentes aos entes menores pelos entes maiores? Conforme anunciado acima, nos termos do art. 5° do Decreto-lei 25/1937 (Organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional), é possível se tombar bens públicos: Art. 5º O tombamento dos bens pertencentes à União, aos Estados e aos Municípios se fará de ofício, por ordem do diretor do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, mas deverá ser notificado à entidade a quem pertencer, ou sob cuja guarda estiver a coisa tombada, afim de produzir os necessários efeitos Rafael Oliveira de Rezende apresenta a divergência doutrinária sobre a possibilidade de entes menores inscreverem bens de entes maiores no “Livro do Tombo”. 13 A primeira corrente, sustentada por José dos Santos Carvalho Filho, aduz que não seria possível o tombamento, por exemplo, de bens federais e estaduais por Municípios, eis que se aplicaria por analogia o disposto no art. 2°, §2°, do Decreto Lei 3.365/41 que impede essa via “de baixo para cima” em relação à desapropriação, baseando-se na lógica da supremacia de interesse: primeiro o nacional (União), depois o regional (Estados) e, só então, o local (Municípios). De forma contrária, uma segunda corrente afirma a possibilidade do tombamento entre entes federados indistintamente, seja de “baixo para cima” ou de “cima para baixo”. Para tanto, defende que a previsão constante no art. 2°, §2°, do Decreto-Lei 3.365/41 possui constitucionalidade duvidosa ao criar uma hierarquia entre os entes federados. Sustenta, ademais, que a norma é especificamente relacionada à desapropriação, devendo, por isso, ser interpretada restritivamente, e não ampliativamente. Aduz, ainda, que o exercício de uma ponderação de interesses entre as normas constitucionais em conflito (princípio federativo e proteção do patrimônio cultural) aponta que a permissão ao tombamento de “mão dupla” é a posição que melhor salvaguarda os valores constitucionalmente tutelados. No sentido da segunda corrente, já decidiu o STJ: ADMINISTRATIVO – TOMBAMENTO – COMPETÊNCIA MUNICIPAL. 1. A Constituição Federal de 88 outorga a todas as pessoas jurídicas de Direito Público a competência para o tombamento de bens de valor histórico e artístico nacional. 2. Tombar significa preservar, acautelar, preservar, sem que importe o ato em transferência da propriedade, como ocorre na desapropriação. 3. O Município, por competência constitucional comum – art. 23, III –, deve proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais 14 notáveis e os sítios arqueológicos. 4. Como o tombamento não implica em transferência da propriedade, inexiste a limitação constante no art. 1º, § 2º, do DL 3.365/1941, que proíbe o Município de desapropriar bem do Estado. 5. Recurso improvido. (RMS 18.952/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/04/2005, DJ 30/05/2005, p. 266) Em relação à servidão administrativa, José dos Santos Carvalho Filho defende o mesmo raciocínio empreendido quanto ao tombamento. Segundo o autor, à semelhança do que ocorre com a desapropriação, é de se aplicar as servidões administrativas o princípio da “hierarquia federativa”: não pode um município instituir servidão sobre imóveis estaduais ou federais, nem pode o Estado fazê-lo em relação aos bens da União. Segue aduzindo que a recíproca não é verdadeira, já que a União está habilitada a fazê-lo em relação aos bens estaduais e municipais, e o Estado, em relação aos bens do Município. Nesse caso, adverte o autor que é necessária autorização legislativa, conforme exige o art. 2, §2º, do Decreto-Lei n.º 3.365/41. Essa posição parece ser majoritária na doutrina, sendo adotada pelo CESPE: PGE/PI 2014: Se, em determinado município, nas obras de implantação de rede elétrica, em certo trecho, for necessário passar o cabeamento por baixo de um imóvel de propriedade do estado, o município poderá instituir servidão administrativa sobre esse imóvel, em razão do interesse público envolvido. INCORRETA 15 Em resumo: (i) A doutrina majoritária defende, com base no art. 2º, §2º, do Decreto-Lei n.º 3.365/41, o princípio da “hierarquia federativa”, sendo, por isso, vedado aos entes menores intervirem na propriedade dos entes maiores. Posição considerada pelo CESPE na PGE/PI 2014 e que deve ser seguida, via de regra; (ii) O STJ já entendeu, em 2005, que é possível a instituição de tombamento de bem estadual por Município. Essa posição somente deve ser adotada se a questão vier “blindada”, ou seja, se perquirir especificamente o posicionamento do STJ em relação ao tombamento de bens estaduais por municípios. ______________________________________________________________________ VII. DESAPROPRIAÇÃO: A desapropriação é a forma mais drástica de intervenção estatal na propriedade, que afeta o próprio caráter perpétuo e irrevogável do direito de propriedade. Por meio dela, o poder público toma o domínio da propriedade de seu titular para o fim de vinculá-la a algum interesse público, consistente em necessidade ou utilidade pública, bem ainda em interesse social. Nesse sentido, dispõe o art. 5º, XXIV, da CF/88: XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição; A ressalva constante do final do dispositivo deve-se à circunstância de que a própria Constituição Federal autoriza a desapropriação mediante o pagamento de indenização em títulos da dívida pública de 16 emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, no caso de área urbana não edificada, subutilizada ou não utilizada, como instrumento de política urbana (art. 182, §4º, III), de pagamento em títulos da dívida agrária, no caso de reforma agrária, por interesse social (art. 184). A Constituição, no art. 243, uma modalidade especial de desapropriação, denominada expropriação, que NÃO gera direito a qualquer indenização ao proprietário. Essa desapropriação recai sobre glebas de terras de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou, a partir da EC 81/2014, exploração de trabalho escravo. As terras expropriadas por esses motivos terão destinação específica: reforma agrária ou programas de habitação popular. 1. LEGISLAÇÃO: DL 3.365/41: Lei 4.132/62: LC 76/93: Lei 10.257/01 (Estatuto da Cidade): Lei 8.257/91: Desapropriação por necessidade ou utilidade pública. Desapropriação por interesse social. Desapropriação para fins de reforma agrária. Desapropriação como sanção ao proprietário de solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado. Desapropriação de glebas de terras onde forem cultivadas ilegalmente plantas psicotrópicas. Obs.: o DL 3.365/41 deve ser lido e revisado muitas vezes! Bem curto e bastante cobrado.Portanto, o custo-benefício dessa leitura é altíssimo. 17 2. SUJEITOS ATIVO E PASSIVO DA DESAPROPRIAÇÃO: Sobre o sujeito passivo, não há maiores questionamentos: é o expropriado, que pode ser pessoa natural ou jurídica, pública ou privada. Sujeito ativo é quem tem competência para desapropriar, expedindo o ato declaratório de utilidade pública ou interesse social do bem. Nos termos do art. 2º do DL 3.365/41, podem ser sujeitos ativos da desapropriação a União, os Estados-membros, o DF, os Municípios e os Territórios. Especificamente em relação à desapropriação por interesse social de que trata o art. 182 da CF/88, compete privativamente ao Município efetuá-la. Já em relação à desapropriação por interesse social positivada no art. 184 da CF/88, a competência privativa é da União. CF, Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. § 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. § 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. § 3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro. § 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I - parcelamento ou edificação compulsórios; 18 II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. ________________________________________________________ CF, Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. § 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em DINHEIRO. § 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação. § 3º Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação. § 4º O orçamento fixará anualmente o volume total de títulos da dívida agrária, assim como o montante de recursos para atender ao programa de reforma agrária no exercício. § 5º São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária. ATENÇÃO: Os Estados e Municípios podem desapropriar imóvel rural, desde que NÃO se destine à reforma agrária, pois, neste caso sim, a competência é privativa da União (STF). 19 ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Sujeito ativo da desapropriação e competência delegada para promover atos de execução: A doutrina esclareça que não se confunde com sujeito ativo a competência que têm, por delegação, as entidades da Administração Indireta e as concessionárias de serviços públicos para promover as medidas de execução (fase executória) da desapropriação, após o ato declaratório expedido pelo sujeito ativo. Assim, segundo adverte a doutrina, não se deve confundir sujeito ativo da desapropriação com competência para promovê-la ou executá- la. Sujeito ativo é só quem tem a competência legal para expedir o ato declaratório da desapropriação, sujeitando o bem à força expropriatória. Todavia, MUITO CUIDADO: a FCC não faz a leitura proposta pela doutrina. Em várias questões, interpretando de forma rasa o art. 3º do DL 3.365/41, a banca afirma que entes privados podem ser sujeitos ativos de desapropriação. Veja-se com a banca cobrou o tema, nesta ordem, no MPE/AL 2012 e no TRT da 3ª Região: “O direito brasileiro permite que um particular seja sujeito ativo na desapropriação judicial em face de outro particular, cujo imóvel seja objeto da expropriação” (CORRETO, segundo a FCC). “O titular do direito é o poder público ou seus delegados, isto é, pessoas jurídicas públicas ou privadas autorizadas por lei ou por contrato” (CORRETO, segundo a FCC). Portanto, muito CUIDADO com a forma que o tema pode ser cobrado. De todo modo, impõe-se registrar que o art. 3º do DL 3.365/41, exige, ainda, que os delegatários dos atos materiais de desapropriação estejam autorizados a fazê-lo por lei ou contrato: 20 Art. 3º Os concessionários de serviços públicos e os estabelecimentos de caráter público ou que exerçam funções delegadas de poder público poderão promover desapropriações mediante autorização expressa, constante de lei ou contrato. ______________________________________________________________________ 3. OBJETO: Todos os bens podem ser desapropriados, incluindo: a) Coisas corpóreas (móveis ou imóveis); b) Coisas incorpóreas, como direitos (menos os personalíssimos, que são inexpropriáveis), as ações, patentes, fundos de comércio, nome de empresa e etc.; c) Bens públicos ou privados. Quanto ao espaço aéreo e ao subsolo, a regra é a não desapropriação. Todavia, consoante a norma contida no §1º do art. 2º do DL 3.365/41, a desapropriação do espaço aéreo ou do subsolo é cabível excepcionalmente, quando de sua utilização resultar prejuízo patrimonial do proprietário do solo. Conforme anunciado em tópico antecedente, o art. 2, §2º, do DL 3.365/41 consagra a possibilidade de bens públicos serem desapropriados, desde que o ente expropriante esteja “acima” do ente expropriado em uma escala de “hierarquia federativa”. Assim, desde que haja autorização legislativa, a União pode desapropriar bens dos Estados e Municípios; e os Estados, os bens dos Municípios. O inverso, contudo, não é possível. CESPE, PGE/PI, 2014: Nos termos da lei, os bens da União não podem ser desapropriados. CERTO 21 Ressalte-se, contudo, que o §3º do art. 2º franqueia, em tom de exceção, a possibilidade de desapropriação bens incorpóreos, como ações, cotas e direitos representativos de capital de instituições controladas e fiscalizadas pelo Governo Federal, desde que haja prévia autorização, por decreto, do Presidente da República. Atenção: os bens não são federais, mas estão simplesmente sob a custódia e fiscalização do Governo Federal. § 3º É vedada a desapropriação, pelos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios de ações, cotas e direitos representativos do capital de instituições e empresas cujo funcionamento dependa de autorização do Governo Federal e se subordine à sua fiscalização, salvo mediante prévia autorização, por decreto do Presidente da República. 4. PROCEDIMENTO: A desapropriação é um procedimento que se realiza emduas fases: FASE DECLARATÓRIA FASE EXECUTÓRIA Consiste na indicação na indicação da necessidade ou utilidade pública, ou do interesse social do bem, assim como das próprias características do objeto da intervenção; Compreende a fixação do preço (justa indenização) e a efetiva transferência do bem para o domínio do expropriante. Pode se dar: i. Extrajudicialmente: quando o proprietário do bem aceita o preço ofertado; ou ii. Judicialmente: com a propositura da ação judicial de desapropriação, quando o proprietário do bem discordar da indenização oferecida e não aceitar o acordo proposto. 22 FASE DECLARATÓRIA: A fase declaratória dá início ao procedimento, sendo, por isso, pressuposto de uma regular desapropriação: sem a fase declaratória, não é possível passar para a fase executória. No decreto expropriatório, indicam-se os fundamentos, o sujeito passivo, o objeto e a destinação a ser dada ao bem. Importa pontuar que, com a simples expedição do decreto expropriatório, ainda não há transferência do bem, que permanece com o proprietário, com todos os poderes inerentes ao direito de propriedade. Sendo assim, não assiste direito de indenização ao proprietário pela mera declaração de necessidade ou utilidade pública do bem a ser desapropriado. Já se viu que a declaração de interesse do Estado em determinado bem não pode ser delegada a outras pessoas, ainda que da Administração Indireta, pois tal expediente é afeto apenas aos entes políticos. Isso não significa, todavia, que somente o Poder Executivo tenha competência para tanto, eis que a iniciativa da desapropriação pode partir do Poder Legislativo (art. 8º do DL 3.365/41). Nesse caso, cumpre ao Executivo praticar os atos necessários à sua execução ou efetivação. São efeitos da declaração: (i) Sujeição do imóvel à força expropriatória do Estado; (ii) Fixação do “estado do bem”. Isso significa que, após essa fase, as benfeitorias de mero deleite ou voluptuárias feitas no imóvel não serão indenizáveis. O proprietário as fez porque assim desejou. Contudo, as benfeitorias necessárias serão sempre indenizáveis, independe de autorização do Poder Público. Por outro, as úteis serão indenizáveis apenas se autorizadas pelo Estado (art. 26 do DL 3.365/41). Assim, em resumo, antes da fixação do estado do bem com a declaração, 23 todas as benfeitorias serão indenizáveis; se feitas depois, deve-se seguir as regras acima anotadas. Súmula 23 do STF: Verificados os pressupostos legais para o licenciamento da obra, NÃO o impede a declaração de utilidade pública para desapropriação do imóvel, mas o valor da obra NÃO se incluirá na indenização, quando a desapropriação for efetivada. (iii) Atribui ao Estado o direito de adentrar no imóvel declarado (art. 7º do DL 3.365/41). Porém, em face da garantia constitucional da inviolabilidade o domicílio (art. 5, XI, CF/88), esse efeito deve ser conciliado com a exigência de prévia autorização judicial. (iv) Fixação do termo inicial para o prazo de caducidade da declaração (prazo que o Poder Público possui para dar início à fase executória e efetivar a desapropriação. Esse prazo é de 5 anos quando o fundamento da desapropriação for utilidade ou necessidade pública; e de 2 anos quando o fundamento for interesse social, inclusive para fins de reforma agrária. Obs.: Na primeira hipótese, o decurso do prazo de 5 anos não é fatal, pois é possível a renovação do ato declaratório 1 ano após expirado o prazo de decadência (art. 10 do DL 3.365/41). a) FASE EXECUTÓRIA: A fase executória compreende atos pelos quais se efetiva a transferência do bem expropriando, com sua integração ao patrimônio Público. Podem executar a desapropriação tanto as entidades jurídicas competentes para a sua declaração, como as entidades que agem por delegação do Poder Público, compreendendo as autarquias, fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, empresas públicas e 24 sociedades de economia mista, bem como concessionárias e permissionárias de serviço público. Essa fase pode ser: (i) Administrativa ou extrajudicial: a transferência do bem ocorre de forma amigável, aceitando o proprietário a indenização oferecida pelo Poder Público. CESPE, PGE/PI, 2014: Com fundamento no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, não se admite que a desapropriação se dê por acordo realizado, na via administrativa, entre a administração pública e o proprietário do bem. ERRADO (ii) Judicial: não havendo acordo quanto ao valor da indenização, outra alternativa não resta ao poder público senão a via judicial. Em relação à efetivação da desapropriação por meio judicial, alguns pontos merecem relevo: ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Contestação limitada e direito de extensão: O mérito da contestação, em sede de desapropriação, é de cognição limitada, pois o expropriado pode erigir discussão apenas sobre o valor indenizatório, descabendo, por isso, o manejo de reconvenção no procedimento referido. CESPE, PGE/PI, 2014: O expropriado pode discutir, em sede de contestação, eventual desvio de finalidade na desapropriação. ERRADA 25 Todavia, excepciona tal regra a possibilidade de o contestante postular o chamado “direito de extensão”, entendido como o direito que assiste ao particular de, impugnando o valor ofertado pelo Poder Público, pleitear a extensão da desapropriação, para que esta alcance parte remanescente do bem que se tornaria inútil ou de difícil utilização, caso desapropriado apenas parcialmente. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Necessidade peremptória de perícia: O valor oferecido pela Fazenda Pública NÃO pode ser reputado inconteste, por ocasião da não apresentação de defesa, já que a realização de perícia é imprescindível, quando não há concordância expressa do expropriado. Ou seja, a revelia, no âmbito do processo expropriatório, NÃO induz presunção sobre o valor ofertado pelo Poder Público, pois vigora nesta seara o princípio constitucional da justa indenização. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Imissão provisória na posse: A imissão provisória é uma alternativa para que o Poder Público tenha a posse provisória do bem expropriando, antes de finalizada a ação de desapropriação. Para isso, o ente expropriante precisa alegar a urgência da imissão e, posteriormente, depositar o valor arbitrado na forma do art. 685 do CPC. Nesse sentido, preconiza o art. 15, §1º, do DL 3.365/41: Art. 15. Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de conformidade com o art. 685 do Código de Processo Civil, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens. 26 Declarada a urgência, que pode ser feita até na fase declaratória de utilidade pública ou interesse social, o Estado tem o prazo de 120 dias para requerer ao juízo a imissão provisória, sob pena de caducidade da referida declaração. Uma vez realizada a imissão provisória, por determinação judicial, o proprietário do bem tem o direito de levantar até 80% do valor constante no depósito, mesmo que não o entenda justo. Leonardo Carneiro da Cunha apresenta os entendimentos do STJ e STF sobre o que seria o preço justo para fins de imissão provisória na posse: (i) Para o STJ, a imissão provisória na posse somente é possível se efetuado o depósito prévio do valor apurado em avaliaçãojudicial provisória. Portanto, não serve para tal fim mero laudo particular. (ii) Para o STF, porém, não se exige que o depósito prévio para fins de imissão provisória na posse seja efetuado no “justo preço”, apurado em avaliação judicial. Isso porque a Constituição Federal (art. 5ºXXIV) exige que o justo preço seja pago apenas por ocasião da imissão definitiva na posse do bem expropriado, pois, apenas a partir desse momento, haverá a sua transferência para o patrimônio público. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Desistência da desapropriação: Uma vez iniciado o procedimento de expropriação, seria possível o Poder Público dele desistir? Para o STJ, que acompanha a doutrina de José dos Santos Carvalho Filho, a desistência seria possível até que fosse pago integralmente a indenização ao particular. Assim, mesmo que iniciado o pagamento, a desistência seria viável, se não concluído. 27 Leonardo Carneiro da Cunha aponta, ainda, outros requisitos para que a desistência seja possível: (i) O bem deve estar em iguais condições de uso, com suas características essenciais preservadas; (ii) Não se deve ter operado o trânsito em julgado da sentença de desapropriação e se encerrado o pagamento do preço, pois haveria, nesse caso, ofensa à coisa julgada. A desistência da desapropriação é instrumentalizada pela revogação do ato expropriatório, tendo, por isso, fundamento no poder de autotutela. 5. INDENIZAÇÃO E ACESSÓRIOS A Constituição Federal estabelece a forma como a indenização deve ser paga: Desapropriação ordinária (art. 5, XXIV, CF/88 e art. 182, §3º, CF/88): Desapropriação por descumprimento de função social de imóvel urbano (art. 182, §4º, CF/88): Desapropriação, para fins de reforma agrária, por descumprimento de função social de imóvel rural (art. 184 da CF/88): Justa e prévia indenização em dinheiro. Títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até DEZ anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. Prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até VINTE anos, a partir do segundo ano de sua emissão. 28 Obs. 1: No caso de desapropriação para fins de reforma agrária, dispõe o §1º do art. 184 da CF/88, que as benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro. ______________________________________________________________________ MUITA ATENÇÃO: Jurisprudência sobre os acessórios da indenização: Os acessórios que devem compor o valor da indenização são esclarecidos pelas seguintes súmulas do STF e STJ: CORREÇÃO MONETÁRIA: Súmula 561 do STF: Em desapropriação, é devida a correção monetária até a data do efetivo pagamento da indenização, devendo proceder-se à atualização do cálculo, ainda que por mais de uma vez. Súmula 67 do STJ: Na desapropriação, cabe a atualização monetária, ainda que por mais de uma vez, independente do decurso de prazo superior a um ano entre o cálculo e o efetivo pagamento da indenização. JUROS: Súmula 164 do STF: No processo de desapropriação, são devidos juros compensatórios desde a antecipada imissão de posse, ordenada pelo juiz, por motivo de urgência. Súmula 113 do STJ: Os juros compensatórios, na desapropriação direta, incidem a partir da imissão na posse, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente. 29 Súmula 114 do STJ: Os juros compensatórios, na desapropriação indireta, incidem a partir da ocupação, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente. Súmula 69 do STJ: Na desapropriação direta, os juros compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação do imóvel. Súmula 102 do STJ: A incidência dos juros moratórios sobre os compensatórios, nas ações expropriatórias, não constitui anatocismo vedado em lei. Súmula 12 do STJ: Em desapropriação, são cumuláveis juros compensatórios e moratórios. Súmula 618 do STF: Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano. Obs. 1: A súmula permanece válida, mas atenção para o período de 11/06/1997 até 13/09/2001. Nesse período vigorou a MP 1.577, que reduziu os juros para 6% ao ano. O STF, em cautelar, declarou a inconstitucionalidade dessa medida provisória. Obs. 2: NÃO CONFUNDIR! A taxa dos juros MORATÓRIOS é de 6% ao ano. A dos COMPENSATÓRIOS, conforme visto acima, é de 12% ano, obedecendo o período de vigência da MP sobredita. Súmula 416 do STF: Pela demora no pagamento do preço da desapropriação não cabe indenização complementar além dos juros. Súmula 56 do STJ: Na desapropriação para instituir servidão administrativa são devidos os juros compensatórios pela limitação de uso da propriedade. 30 Registre-se, por fim, que a Súmula 70 do STJ, segundo a qual “os juros moratórios, na desapropriação direta ou indireta, contam-se desde o trânsito em julgado da sentença”, restou superada com a promulgação do art. 100, §1º, da CF/88, que com a EC/62 passou a ser o §5º do mesmo artigo. Segundo a referida norma, os juros moratórios são devidos contra o Poder Público apenas a partir de 1º de janeiro seguinte ao exercício financeiro em que o pagamento deveria ter sido efetuado (e não a partir do trânsito em julgado, como preconizava a súmula). A Súmula Vinculante 17 ratifica esse entendimento: “Durante o período previsto no parágrafo 1º [5º] do artigo 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos”. O art. 15-B do DL regulamentou a matéria no plano infraconstitucional. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Súmula 378 do STF: Na indenização por desapropriação incluem-se honorários do advogado do expropriado. Súmula 617 do STF: A base de cálculo dos honorários de advogado em desapropriação é a diferença entre a oferta e a indenização, corrigidas ambas monetariamente. Súmula 141 do STJ: Os honorários de advogado em desapropriação direta são calculados sobre a diferença entre a indenização e a oferta, corrigidas monetariamente. Súmula 131 do STJ: Nas ações de desapropriação incluem-se no cálculo da verba advocatícia as parcelas relativas aos juros compensatórios e moratórios, devidamente corrigidas. 31 ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Quadro-resumo sobre juros compensatórios e moratórios na desapropriação: Critério Juros COMPENSATÓRIOS MORATÓRIOS Devidos a partir: Da efetiva ocupação do imóvel – Súmula 69 do STJ; A partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito – art. 15-B do DL 3.365/41; Base de incidência: - Na desapropriação direta, diferença eventualmente apurada entre 80% do preço ofertado em juízo e o valor do bem fixado na sentença (art. 15-A do DL 3.365/41). - Na desapropriação indireta, valor da indenização corrigido monetariamente (Súmula 114 do STJ); Valor da indenização corrigido monetariamente; Percentual: 12% ao ano, ressalvando-se o período de vigência da MP 1.577, em que vigorou a taxa de 6% ao ano. 6% ao ano – art. 15-B do DL 3.365/41. ______________________________________________________________________ 32ATENÇÃO: Qual é o momento básico em que se calcula o valor do bem expropriado? Comentários: Dizer o Direito O STJ entende que, nas ações de desapropriação, o valor da indenização será contemporâneo à data da perícia (avaliação judicial). Desse modo, não importa o valor do bem na data em que ocorreu a imissão na posse ou na data em que se deu a vistoria do expropriante. A posição do STJ é baseada no art. 26 do Decreto-Lei nº 3.365/1941: Art. 26. No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado. Essa é também a opinião da doutrina especializada: Nos precisos termos do art. 26 do Dec.-lei 3.365/41, o valor da indenização será contemporâneo à avaliação. Vale dizer: o perito e os assistentes técnicos, na busca do justo valor de mercado do bem expropriando, deverão levar em consideração o valor do momento em que é feita a avaliação e não, como dispunha o referido artigo em sua redação anterior, o que possuísse no instante da declaração de utilidade pública (SALLES, José Carlos de Moraes. A Desapropriação à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 4. ed. São Paulo: RT, 2000, p. 567). Em resumo: Nas ações de desapropriação o valor da indenização será contemporâneo à data da avaliação judicial, não sendo relevante a data em que ocorreu a imissão na posse, tampouco a data em que se deu a vistoria do expropriante. STJ. 2ª Turma. REsp 1.274.005-MA, rel. originário Min. Mauro Campbell Marques, red. para acórdão Min. Castro Meira, julgado em 27/03/2012. 33 6. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA: É a que se realiza sem o atendimento das formalidades legais. Não passa de um esbulho estatal e ocorre quando o Poder Público interfere na propriedade e lá pratica atos de domínio, sem prévia ação ou prévio título. Por se tratar de ato ilícito, suscita direito de defesa por meio de ações possessórias e até mesmo desforço incontinenti. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: O prazo prescricional da ação de desapropriação indireta é de 10 anos. Comentários: Dizer o Direito Desapropriação indireta A desapropriação indireta ocorre quando o Estado (Poder Público) se apropria do bem de um particular sem observar as formalidades previstas em lei para a desapropriação, dentre as quais a declaração indicativa de seu interesse e a indenização prévia. Trata-se de um verdadeiro esbulho possessório praticado pelo Poder Público. A desapropriação indireta é também chamada de apossamento administrativo. O que a pessoa que teve seu bem desapropriado indiretamente poderá fazer? • Se o bem expropriado ainda não está sendo utilizado em nenhuma finalidade pública: pode ser proposta uma ação possessória visando a manter ou retomar a posse do bem. • Se o bem expropriado já está afetado a uma finalidade pública: considera-se que houve fato consumado e somente restará ao particular 34 ajuizar uma “ação de desapropriação indireta” a fim de ser indenizado. Nesse sentido é o art. 35 do Decreto-Lei 3.365/41: Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. Ação de desapropriação indireta Consiste, portanto, na ação proposta pelo prejudicado em face do Poder Público, que se apossou do bem pertencente a particular sem observar as formalidades legais da desapropriação. Trata-se de uma ação condenatória, objetivando indenização por perdas e danos. Também é chamada de “ação expropriatória indireta” ou “ação de ressarcimento de danos causados por apossamento administrativo”. Qual é o prazo da ação de desapropriação indireta? • No CC-1916: era de 20 anos. • No CC-2002: é de 10 anos. Foi o que decidiu a 2ª Turma do STJ no REsp 1.300.442-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18/6/2013. Repetindo: atualmente, segundo este julgado do STJ, o prazo de desapropriação indireta é de 10 anos. Cuidado porque todos os livros de Direito Administrativo trazem informação diferente disso. No entanto, em concursos CESPE, deve-se adotar o entendimento do STJ. Qual é o fundamento jurídico para esse prazo? 35 Segundo o STJ, a ação de desapropriação indireta possui natureza real e pode ser proposta pelo particular prejudicado enquanto não tiver transcorrido o prazo para que o Poder Público adquira a propriedade do bem por meio da usucapião. Em outras palavras, como não há um prazo específico previsto na legislação, o STJ entendeu que deveria ser aplicado, por analogia, o prazo da usucapião extraordinária. Assim, enquanto não tiver passado o prazo para que o Estado adquira o imóvel por força de usucapião, o particular poderá buscar a indenização decorrente do ato ilícito de apossamento administrativo. Qual é o prazo de usucapião extraordinária? No CC-1916: era de 20 anos (art. 550). No CC-2002: 15 anos (art. 1.238). No entanto, este prazo passa a ser de 10 anos se o possuidor tiver realizado obras ou serviços de caráter produtivo no local (parágrafo único do art. 1.238). Como na desapropriação indireta pressupõe-se que o Poder Público tenha realizado obras no local ou tenha dado ao imóvel uma utilidade pública ou de interesse social, entende-se que a situação se enquadraria no parágrafo único do art. 1.238 do CC, de sorte que o prazo para a usucapião seria de 10 anos. Logo, atualmente, o prazo prescricional aplicável às expropriatórias indiretas passou a ser de 10 anos, com fundamento analógico no parágrafo único do art. 1.238 do CC. Súmula 119-STJ A Súmula 119 do STJ prevê o seguinte: “A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos”. Cuidado. A súmula 119 do STJ foi editada em 1994 e não está mais em vigor, considerando que utilizava como parâmetro o CC-1916. 36 Atualmente, a ação de desapropriação indireta prescreve em 10 anos. O que acontece se o prazo prescricional iniciou na vigência do CC- 1916 e se estendeu para o CC-2002? Nesse caso, deverá ser aplicada a regra de direito intertemporal prevista no art. 2.028 do CC-2002: Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada. Interpretando esse art. 2.028 do CC: Continua sendo o prazo do CC-1916: • quando ele foi reduzido pelo CC-2002, e • se, na data da entrada em vigor do CC-2002, já tinha transcorrido mais da metade do tempo estabelecido no CC-1916. Exemplo: A pretensão de indenização por desapropriação indireta prescrevia em 20 anos no CC-1916. No CC-2002 prescreve em 10 anos. Se uma pessoa sofreu o desapossamento administrativo em 1991, em 2003 (data em que entrou em vigor o CC), já havia se passado 12 anos. Logo, prevalece o prazo do CC-1916 e esta vítima só terá mais 8 anos para ajuizar a ação. Se a pessoa sofreu o desapossamento em 1994, em 2003 havia se passado apenas 9 anos. Logo, será aplicado o novo prazo do CC-2002 (de 37 10 anos). A partir de 11/01/2003 (data da entrada em vigor do CC-2002) iniciará o prazo de 10 anos para que a vítima ajuíze a ação. E se o CC-2002 aumentou o prazo? Nesse caso, aplica-se o do CC-2002. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Fixação do quantum indenizatório e princípio da congruência: O STJ, com base princípio constitucional dajusta indenização, entende que é possível ao juiz, acolhendo laudo pericial imparcial, fixar valor diverso daquele pretendido pelo autor em sua inicial, não importando tal expediente violação ao princípio da congruência: O valor da indenização pleiteado pelo autor da Ação de Indenização por Desapropriação Indireta é meramente estimativo, posto preponderar o cânone constitucional da justa indenização. Consectariamente, não incorre julgamento ultra petita nas hipóteses em que a decisão acolhe o laudo pericial imparcial e fixa a indenização em patamar superior ao formulado pelo autor na inicial. (...) Deveras, esta e. Corte, em atendimento ao princípio da justa indenização, firmou entendimento no sentido de não ocorrer julgamento extra petita quando a indenização é fixada em valor inferior ao ofertado pelo Poder Público, por isso que “ubi eadem ratio, ibi eadem dispositivo”. (REsp 87256/GO) ______________________________________________________________________ MUITA ATENÇÃO: Desapropriação indireta e limitação administrativa: 38 A desapropriação indireta pressupõe o efetivo desapossamento da propriedade pelo Poder Público. É, pois, intervenção supressiva do Estado na propriedade alheia. A limitação administrativa não se confunde com a desapropriação, pois nela somente há restrição ao uso da propriedade imposta genericamente a todos os proprietários, via de regra, sem qualquer indenização, diferentemente da desapropriação em que há transferência do domínio mediante pagamento de preço justo e prévio. Por essa razão, as restrições ao direito de propriedade impostas por normas ambientais, ainda que esvaziem o conteúdo econômico do bem, não constituem desapropriação indireta, mas sim limitações administrativas. Tal distinção reverbera na definição do prazo prescricional da pretensão indenizatória, pois, cuidando a hipótese de: (i) Desapropriação indireta: a ação reparatória terá natureza real e, por isso, a prescrição será decenal, nos termos do parágrafo único do art. 1.238 do CC/02; (ii) Limitação administrativa: a ação reparatória terá natureza pessoal e, por isso, a prescrição será quinquenal, nos termos do parágrafo único do art. 10 do DL 3.365/41, segundo o qual “extingue-se em cinco anos o direito de propor ação que vise a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público”. Especialmente em relação ao enquadramento das leis ambientais em uma ou outra espécie de intervenção, o STJ assentou recentemente: A edição de leis ambientais que restringem o uso da propriedade caracteriza uma limitação administrativa, cujos prejuízos causados devem ser indenizados por meio de uma ação de direito pessoal, e não de direito real, como é o caso da ação contra a 39 desapropriação indireta. Hipótese em que está caracterizada a prescrição quinquenal, nos termos do art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei n. 3.365/41. (AgRg no REsp 1.359.433/MG, 2013). No mesmo sentido: Não há desapropriação indireta sem que haja o efetivo apossamento da propriedade pelo Poder Público. Desse modo, as restrições ao direito de propriedade, impostas por normas ambientais, ainda que esvaziem o conteúdo econômico, não se constituem desapropriação indireta. O que ocorre com a edição de leis ambientais que restringem o uso da propriedade é a limitação administrativa, cujos prejuízos causados devem ser indenizados por meio de ação de direito pessoal, e não de direito real, como é o caso da ação em face de desapropriação indireta. Assim, ainda que tenha havido danos ao agravante, diante de eventual esvaziamento econômico de propriedade, deve ser indenizado pelo Estado, por meio de ação de direito pessoal, cujo prazo prescricional é de 5 anos, nos termos do art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei n. 3.365/41. Agravo regimental improvido. (AgRg nos EDcl no AREsp 382944 / MG, 2014) 40 Em resumo: DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA Supressão da propriedade; Restrição da propriedade; Ação indenizatória tem natureza real; Ação indenizatória tem natureza pessoal; Prescrição da pretensão reparatória: 10 anos. Prescrição da pretensão reparatória: 5 anos. Obs.: As normas ambientais que restrinjam o direito de propriedade caracterizam limitação administrativa. CESPE, PGE/PI, 2014: A incidência de limitações administrativas sobre áreas localizadas em Áreas de Preservação Permanentes enseja, via de regra, indenização por desapropriação indireta. ERRADA ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Legitimidade do compromissário comprador para propor ação de desapropriação indireta: Consoante jurisprudência do STF e do STJ, no âmbito de desapropriação indireta, têm direito à indenização não só o titular do domínio do bem expropriado, mas também o que tenha sobre ele direito real limitado, bem como direito de posse. O promissário comprador, desde o momento da celebração do contrato, detém a posse do bem, salvo estipulação contratual em sentido contrário. 41 Desta feita, tomando-se em conta as premissas acima, impõe-se concluir que o compromissário comprador tem legitimidade para pleitear, em face do Poder Público, indenização por desapropriação indireta. Questiona-se, ainda, se seria necessário o registro do contrato de compra e venda em cartório, para que a pretensão reparatória surgisse. Segundo o STJ, o registro não interfere na relação de direito obrigacional firmada entre as partes do negócio jurídico, mas apenas confere eficácia do negócio perante terceiros. A partir daí, concluiu: O promissário comprador do imóvel tem direito de receber a indenização no caso deste imóvel ter sofrido desapropriação indireta, ainda que esta promessa não esteja registrada no Cartório de Registro de Imóveis. STJ. 2ª Turma. REsp 1.204.923-RJ, rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/03/2012. ______________________________________________________________________ 7. DIREITO DE RETROCESSÃO: Na esteira de Celso Antônio Bandeira de Mello, o Poder Público, uma vez efetivada a desapropriação, deve aplicar o bem desapropriado à finalidade pública que suscitou o desencadeamento de sua força expropriatória. Não o fazendo, terá ocorrido o que se denomina de “tredestinação”, conceituada por José dos Santos Carvalho Filho como “destinação desconforme ao plano inicialmente previsto”. A “tredestinação” pode ser classificada em lícita e ilícita. A primeira ocorre quando, persistindo o interesse público, o expropriante dispensa ao bem desapropriado destino diverso do que planejara no início. A segunda, por sua vez, acontece quando o Poder Público transfere a terceiro o bem desapropriado ou pratica desvio de finalidade, permitindo que alguém se beneficie de sua utilização. 42 Nesse último caso, deixando o expropriante de atribuir uma finalidade pública ao em desapropriado, evidentemente a desapropriação terá se revelado sem razão de existir. Daí reconhecer-se ao expropriado o direito a uma satisfação jurídica pelo fato: direito de retrocessão. O direito de retrocessão é, pois, aquele que assiste ao proprietário do bem de exigi-lo de volta caso o mesmo não tenha o destino declarado na desapropriação. Surge, portanto, quando é dada ao bem destinação diversa e descompassada com o interesse público. Cumpre reiterar, desta feita, que só haverá retrocessão quando ocorrer tredestinação ilícita, entendida esta como traspasse do bem de finalidade pública,para finalidade não pública. Assim, se a tredestinação for lícita, passando o bem para finalidade diversa, mas ainda pública (ex.: bem desapropriado para construção de uma escola, mas se construiu um hospital), não haverá direito de retrocesso. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Natureza jurídica do direito de retrocessão: Dispõe o art. 35 do DL 3.365/41: Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. A partir do dispositivo referido, surgiram três correntes para explicar a natureza do direito de retrocessão: (i) Natureza real (Celso Antônio Bandeira de Mello, Seabra Fagundes, STF e STJ): a retrocessão é direito real, consistente no poder de o ex-proprietário reaver o bem pelo mesmo preço 43 pelo qual foi desapropriado. Possui fundamento no direito constitucional de propriedade, que só pode ser limitado por ato fundado no interesse público. Para essa corrente, o art. 35 do DL 3.365/41 somente é aplicável se a desapropriação atendeu aos requisitos constitucionais. Sendo real, a pretensão de retrocesso prescreveria em 10 anos, com base no art. 205 do CC/02; (ii) Natureza pessoal (José dos Santos Carvalho Filho e Hely Lopes Meirelles): a retrocessão não existe mais como direito real de reivindicar o bem de volta, mas tão somente como direito pessoal de pleitear perdas e danos. Para essa corrente, a pretensão de retrocesso funda-se no direito de preferência previsto no art. 519 do CC/02, segundo o qual “se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, não tiver o destino para que se desapropriou, ou não for utilizada em obras ou serviços públicos, caberá ao expropriado direito de preferência, pelo preço atual da coisa”. Assim, conclui essa corrente que a retrocessão é direito obrigacional/pessoal, pois assim o é o direito de preferência. Sendo pessoal, a pretensão de retrocesso prescrevia em 5 anos, com base no art. 1º do DL 20.910/32. (iii) Natureza mista (Maria Sylvia Zanella Di Pietro): a natureza do direito de retrocessão seria definida conforme a pretensão do ex- proprietário, que poderia reivindicar o bem de volta (natureza real; prescrição decenal), ou, caso preferisse, pleitear perdas e danos (natureza pessoal; prescrição quinquenal). 44 Em resumo: NATUREZA DO DIREITO DE RETROCESSÃO NATUREZA REAL: CABM, STF, STJ; NATUREZA PESSOAL: JSCF, HLM; NATUREZA MISTA: MSZP; Fundamento: Direito constitucional de propriedade – art. 5º, XXII, CF/88; Fundamento: Direito de preferência – art. 519 do CC/02; Fundamento: Ambos; Prazo prescricional: 10 anos. Prazo prescricional: 5 anos. Prazo prescricional: 5 ou 10 anos, a depender da pretensão. Para as provas de concurso público, recomenda-se levar em consideração a posição de Celso Antônio Bandeira de Mello, pois esta é abonada pelo STF e STJ: natureza real e prazo decenal de prescrição. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Tredestinação lícita e teoria dos motivos determinantes: A doutrina pontua que a tredestinação lícita é exceção à nulidade do ato administrativo, por desrespeito aos motivos determinantes. Isso porque, em relação aos atos administrativos em geral, há nulidade, caso seja desviada a finalidade, ainda que mantido o interesse público. No caso da tredestinação lícita, contudo, se houver desvio de finalidade, mas restar mantido o interesse público, a desapropriação não 45 será nula, não assistindo, por isso, direito de retrocessão ao ex- proprietário. CUIDADO! Em relação ao direito de retrocesso e tredestinação lícita, há uma especialidade no DL 3.365/41 que merece relevo: § 3º Ao imóvel desapropriado para implantação de parcelamento popular, destinado às classes de menor renda, NÃO se dará outra utilização nem haverá retrocessão. Nesse caso particular, portanto, não haverá discricionariedade do Administrador, para decidir como satisfazer o interesse público. ______________________________________________________________________ ATENÇÃO: Tredestinação, adestinação e desdestinação: Já se pontuou que a tredestinação ocorre quando o bem objeto da desapropriação é afetado à finalidade diversa daquela constante do ato expropriatório, podendo ser permanecer o interesse público (tredestinação lícita), ou não (tredestinação ilícita). Apenas nesse último caso será fraqueado o direito de retrocessão ao ex-proprietário. Todavia, e se não for dada destinação alguma ao bem? Teria o ex- proprietário o direito de exigi-lo de volta? A partir de quando restaria configurado o desinteresse do Poder Público no bem? A omissão ou inércia estatal, neste particular, recebe o nome de ADESTINAÇÃO. Rafael Rezende Oliveira apresenta a divergência doutrinária sobre os questionamentos suscitados: (i) Primeira posição (majoritária): a mera omissão do Estado não configura tredestinação e não gera direito à retrocessão. Em razão da ausência de prazo legal para destinação pública do bem desapropriado, apenas por meio de ato concreto e comissivo, que deixe clara a intenção de não utilizar o bem na 46 satisfação do interesse público, será possível falar em tredestinação. Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho, Celso Antônio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, José Carlos de Moraes Salles. Esse entendimento deve ser assinalado como correto em provas objetivas; (ii) Segunda posição: apesar de não haver prazo estipulado, em regra, na legislação para que o Poder Público conceda destinação pública ao bem desapropriado, seria possível a aplicação analógica do prazo de caducidade do decreto expropriatório. De acordo com esse raciocínio, na desapropriação por utilidade pública ou necessidade pública, o prazo seria de cinco anos (art. 10 do Decreto-lei 3.365/1941). Caso a omissão permaneça, ao final do prazo de cinco anos estaria configurada a tredestinação, nascendo o direito à retrocessão. Nesse sentido: Miguel Seabra Fagundes. O autor, Rafael Oliveira, adere a essa corrente. Celso Antônio Bandeira de Mello, por outro lado, aduz a seguinte questão: se o bem expropriado foi inicialmente aplicado a uma finalidade pública, mas, tempos depois, foi dela desligado, persiste ou não o direito de o ex-proprietário reivindicá-lo? A essa supressão da afetação do bem desapropriado dá-se o nome de DESDESTINAÇÃO. Na hipótese, o bem desapropriado é inicialmente afetado ao interesse público, mas, posteriormente, ocorre a desafetação (ex.: bem desapropriado é utilizado como escola pública que vem a ser desativada). Sustenta a doutrina majoritária que, em casos de desdestinação, NÃO assiste direito de retrocessão ao ex-proprietário, pois o bem chegou a ser utilizado na satisfação do interesse público. Bandeira de Mello ensina que o bem não precisa ficar perpetuamente vinculado à destinação constante da declaração do ato expropriatório. 47 8. DESAPROPRIAÇÃO POR ZONA: Segundo o art. 4º do DL 3.365/41, Art. 4º A desapropriação poderá abranger a área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que se destina, e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em consequência da realização do serviço. Em qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las,mencionando-se quais as indispensáveis à continuação da obra e as que se destinam à revenda. O dispositivo citado consagra, pois, a desapropriação por zona ou extensiva, que se caracteriza por abranger: (i) Área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que a desapropriação se destina. Nesse caso, a desapropriação por zona possibilita a continuidade ou complementação da obra pública já iniciada no local; (ii) As zonas que se valorizarem extraordinariamente, em consequência da realização do serviço. Nesse caso, a desapropriação por zona possibilita a venda das áreas ou zona excedentes que se valorizaram em consequência da realização da obra ou do serviço público. ______________________________________________________________________
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