Buscar

A Geopolítica das Sanções Econômicas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

A Geopolítica das Sanções Econômicas: 
 um estudo a partir do caso haitiano 
 
Alvaro Nunes Machiavelli1 
Pâmela Marconatto Marques2 
Cristine Koehler Zanella3 
 
Resumo 
Admitidas pela Carta das Nações unidas como mecanismos alternativos à 
intervenção armada, as sanções econômicas vêm sendo questionadas quanto a 
sua eficácia no cumprimento do propósito de restauração da paz e da segurança 
internacionais. Observadores sugerem que as sanções têm acarretado mais 
danos do que benesses às populações civis, agredindo Direitos Humanos 
preconizados pela mesma Carta que as autoriza. Nesse sentido, o presente 
trabalho analisará a questão abordando a sanção econômica aplicada ao Haiti, de 
1991 a 1994. Ao final, propõe-se ao leitor uma reavaliação deste instrumento 
como meio legitimo de pressão e coerção internacional, uma vez que em sua 
aplicação parecem estar sendo violados preceitos humanitários fundamentais, 
causando traumas estruturais que talvez sejam tão ou mais profundos que a 
situação que com ela se quis evitar. 
 
Introdução 
Tendo abolido o direito à guerra e estabelecido um rol de atribuições aos 
Estados em nome da paz e segurança internacionais, a carta das Nações Unidas, 
assinada em 1945, conferiu ao Conselho de Segurança a prerrogativa de agir 
sempre que uma delas - paz ou segurança - fosse ameaçada. 
Entre os mecanismos de ação previstos cita-se a interrupção completa ou 
parcial das relações econômicas, dos meios de comunicação ferroviários, 
marítimos, aéreos, postais, telegráficos, radioelétricos, ou de outra qualquer 
 
1
 Bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Santa Maria. 
2
 Mestranda em Integração Latino-americana pela Universidade Federal de Santa Maria, Bacharel em Direito 
e Ciências Sociais pela mesma instituição. 
3
 Professora da Faculdade de Direito de Santa Maria, Mestre em Integração Latino-americana pela 
Universidade Federal de Santa Maria, Bacharel em Direito pela mesma instituição. 
espécie, e o rompimento das relações diplomáticas, conforme previsto no art. 41 
do referido documento. Essas medidas têm por objetivo forçar o restabelecimento 
da paz, evitando, assim, o uso de medidas mais drásticas, tais como a intervenção 
militar e a guerra, associadas, estas sim, à morte e ao sofrimento de civis. 
Entre estas medidas preventivas, aquelas que suscitam maiores 
controvérsias são as de natureza econômica. Podendo assumir a forma de 
sanções comerciais – restrições nas importações e exportações do país-alvo de 
forma restrita ou abrangente - e financeira – centrada no congelamento de ativos e 
no impedimento de acesso ao capital internacional - e podendo ser empregadas 
pelos mais variados motivos, as sanções vêm sendo implementadas desde 1965 
pela ONU, essencialmente nos continentes asiático e africano, alcançando a 
América Latina a partir da sanção imposta ao Haiti, em 1991. 
Talvez em razão dessa sua geografia, restrita a cenários de convulsão 
social e instabilidade política, associada à miséria e à privação, ainda não se 
tenha feito uma análise mais aprofundada destes instrumentos de pressão nos 
foros especializados, relegando os drásticos efeitos de sua aplicação ao mesmo 
lugar de indiferença e marginalidade a que estes países são, habitualmente, 
condenados. Lançar as bases deste importante debate é a proposta do presente 
artigo, que inicialmente destina-se ao desenho de um panorama geral das 
sanções econômicas já aplicadas, seguido de análise da sanção imposta ao Haiti, 
em virtude das inúmeras peculiaridades que apresenta. Como fio condutor da 
análise está a sugestão da reavaliação deste instrumento como meio legitimo de 
 
 
pressão e coerção internacional, uma vez que em sua aplicação parecem estar 
sendo violados preceitos humanitários fundamentais, causando traumas 
estruturais que talvez sejam tão profundos quanto a situação que com ela se quis 
evitar. 
 
I. Teoria e prática das sanções – uma introdução 
 
A lógica que sustenta a defesa da aplicação das sanções econômicas é a 
de que a população, insatisfeita com a falta de determinados produtos e com a 
inacessibilidade a certos mercados, transformará essa insatisfação em 
reivindicações ao governo por mudanças. Parte-se do pressuposto que as 
pressões são transferíveis entre os atores, tal qual se dá em uma seqüência de 
dominós enfileirados que caem todos ao toque da primeira pedra: a comunidade 
internacional pressiona a população, e esta, pressiona o governo, que, por sua 
vez, realiza as mudanças que deram origem à sanção internacional. 
Marc Bossuyt, autor do relatório sobre conseqüências adversas das 
sanções econômicas para a realização dos direitos humanos, alerta, porém, que 
vem sendo comprovada reiteradamente a ineficácia de tais medidas. Por um 
lado, porque em regimes onde as decisões políticas são não-democráticas, não 
existe um canal que possa viabilizar que as pressões civis atinjam o governo, 
provocando as mudanças. E mais: o governo, especialmente quando tem 
controle sobre os meios de comunicação – o que não é difícil nestas 
circunstâncias – pode utilizá-los para convocar os cidadãos a se unirem contra os 
estados estrangeiros que sustentam a medida. Por outro lado, as sanções 
econômicas agravam a concentração de renda e acentuam as diferenças sociais: 
o governo e as elites buscarão controlar o mercado ilegal, enfraquecendo 
instituições e a classe média. Ao fim, o governo, seu discurso e suas políticas 
restam fortalecidos (BOSSUYT, 2000). 
As sanções econômicas impostas pelo Conselho de Segurança atingiram o 
Haiti (RES 841/93 e RES 917/94), Serra Leoa (RES 1132/97), Afeganistão (RES 
1267/99), Angola (RES 864/93 e RES 1173/98), Zimbábue (RES 232/66, quando 
ainda se chamava Rodésia do Sul), Antiga Iugoslávia (RES 575/92, RES 787/92, 
RES 942/94), Coréia do Norte (RES 1718/06); Irã (RES 1747/07); Iraque (RES 
661/90), Líbia (RES 748/92 e RES 883/93), Libéria (RES 1521/03) e Costa do 
Marfim (RES 1643/05)4. Como pode-se ver, as sanções econômicas foram 
impostas especialmente nos continentes asiático e africano. Mais interessante, 
entretanto, é notar que praticamente metade dos países que sofreram sanções 
econômicas figuram, hoje, na lista dos países menos avançados do mundo. Os 
gráficos que seguem ilustram visualmente esta triste sobreposição de situações: 
alvo de sanção econômica – baixíssimo desenvolvimento. 
 
4
 Em função da instabilidade econômica, mas especialmente política que assola o Zimbábue, decorrente das 
fraudes nas últimas eleições presidenciais que ocorreram neste ano, a comunidade internacional tem aventado 
a possibilidade de adoção de sanções econômicas ao país. 
 
 
 
Se é verdade que não se pode atribuir exclusivamente às sanções 
econômicas a responsabilidade pela situação de miséria e desarticulação das 
estruturas institucionais em que estes Estados estão envolvidos, parece difícil 
negar que elas contribuíram para que se acentuasse o envolvimento destes numa 
espiral de pobreza. 
De forma análoga ao ocorrido no Haiti, no Iraque, as sanções econômicas 
fizeram entre a população civil, suas principais vitimas. Durante a vigência das 
sanções econômicas, a população iraquiana ficou submetida a um maior número 
de mortes de recém-nascidos e crianças, fornecimento de água contaminada, 
falta de medicamentos e alimentos de qualidade, entre outros fatores que fizeram 
com que Hans Von Sponeck, Coordenador Humanitário da ONU no país, se 
exonerasse do cargo explicando que ele nãopoderia continuar com o nome 
associado com um programa que aumentava o sofrimento do povo e que não 
tinha as mínimas possibilidades de responder às necessidades básicas da 
população (BOSSUYT, 2000). 
Considerando que as sanções econômicas têm sido vistas pelos países 
embargantes como um recurso que: a) não envolve a utilização de militares 
nacionais em conflitos além-fronteira; b) pode ser aplicado com custos mais 
baixos se consideradas outras formas de atuação para a manutenção da paz 
(como o envio de tropas em uma missão de paz); e c) aparenta ser menos mortal 
para a população do país alvo da sanção, é de se esperar que cresça o recurso à 
sua implementação como forma de coerção internacional. Especialmente em um 
tempo em que a esfera econômica é percebida como a grande força capaz de 
orientar os rumos das sociedades, a tendência é que cresça a fé no poder destas 
sanções. Neste contexto, urge perguntar-se sobre a efetividade (elas são 
capazes de atingir os fins a que se propõem?), a legalidade (elas são executadas 
dentro dos limites das normas internacionalmente estabelecidas?), a legitimidade 
(o sofrimento infligido a grupos vulneráveis no país-alvo consiste num meio 
legítimo de exercer pressão sobre os líderes políticos?), mas sobretudo sobre as 
conseqüências de tais medidas para a sustentabilidade econômico-político-social 
dos países por elas atingidos. Não parece aceitável que em nome da conquista 
cega de um objetivo, a utilização das sanções econômicas acabe por agravar as 
situações já precárias em que vive a população. 
Considerando que estas sanções podem vir a desempenhar um papel cada 
vez mais importante na política internacional, o presente artigo propõe-se a 
avaliar o seu contexto de aplicação e as conseqüências da sua implementação 
ao único país do continente alvo desta espécie de medidas: o Haiti. 
 
II. O cenário haitiano pré-sanção 
Iniciada em 1991, a sanção imposta ao Haiti – a quinta sanção econômica 
imposta pelo conselho de segurança da ONU - constitui a exceção latino-
americana na geografia das sanções. No entanto, suas características 
econômicas, sociais e políticas aproximam-no dos demais países alvo: 
economicamente, o país caribenho detém o indigesto título de mais pobre das 
Américas, com 80% de sua população vivendo abaixo da linha da pobreza, 90% 
de suas terras esgotadas, taxa de desemprego superior a 50% do total de 
pessoas economicamente ativas e um índice de analfabetismo estimado em 75% 
de seus 7 milhões de habitantes – dados que lhe renderam um posto no ranking 
dos Países Menos Avançados (PMAs)5. Sua configuração étnica é quase 
exclusivamente negra (95% da população), contando com apenas 5% de 
mulatos. Politicamente, trata-se de um país convulsionado pela alternância de 
regimes ditatoriais, sem instituições ou tradições democráticas consolidadas. 
Curiosamente, no exato momento em que este país realiza suas primeiras 
eleições livres e inicia os debates acerca da necessidade de organização popular 
para debater problemas estruturais, e elege, como representante máximo, um 
grande difusor destas idéias – o então padre Jean-Bertrand Aristide – é que se 
desenrola o fato gerador da sanção econômica a ser imposta. 
Tendo seguido um período ditatorial que perdurou por mais de três 
décadas6 com o apoio de latifundiários, militares e inclusive de uma milícia 
 
5
 A definição da categoria dos PMA’s - da tradução livre para o português “Países Menos Avançados” - foi 
mencionada pela primeira vez em1964, na UNCTAD I. Porém, apenas na UNCTAD II, em 1968, é que a 
criação de uma categoria de países menos desenvolvidos foi concretamente avaliada. Foi acatada por 
consenso a idéia da criação da categoria, que atrairia uma série de medidas e estratégias especiais para 
promover o desenvolvimento nesses países. Pela resolução 2564 de 13 de dezembro de 1969 foi requisitada 
uma abrangente análise dos problemas dos países Menos Avançados bem como recomendações de medidas 
para superar-los. Então, na Assembléia Geral de novembro de 1971, a lista elaborada pelp CDP- Committee 
for Development Policy, foi aprovada pela ECOSOC. Desde que foi estabelecido o ranking dos PMA’s, 
ocorrem revisões trienais acerca dos países que seguem sob observação especial ou são promovidos. Segundo 
documento produzido pela ONU, temos a seguir os critérios de identificação dos Países Menos Avançados: I) 
a low-income criterion, based on a three-year average estimate of the gross national income (GNI) per capita 
(under $750 for inclusion, above $900 for graduation);II)a human resource weakness criterion, involving a 
composite Human Assets Index (HAI) based on indicators of: (a) nutrition; (b) health; (c) education; and (d) 
adult literacy; and III) an economic vulnerability criterion, involving a composite Economic Vulnerability 
Index (EVI) based on indicators of: (a) the instability of agricultural production; (b) the instability of exports 
of goods and services; (c) the economic importance of non-traditional activities (share of manufacturing and 
modern services in GDP); (d) merchandise export concentration; and (e) the handicap of economic smallness 
(as measured through the population in logarithm); and the percentage of population displaced by natural 
disasters. (E/2004/33). Para ser incorporado à lista, o país deve satisfazer todos os três critérios. Para ser 
promovido, o país deve atingir 2\3 das metas por duas revisões trienais consecutivas. 
6
 Estas três décadas correspondem ao período em que François Duvalier – ou Papa Doc - e seu filho, Jean-
Claude Duvalier - Baby Doc estiveram no poder. O mandato de Papa Doc se inicia em setembro 1957 com a 
promessa de “colocar seu Governo a serviço da afirmação dos valores e tradições da população negra” 
discurso que assegurou o apoio da população e lhe rendeu 70% dos votos validos. Eleito, passou a tomar 
atitudes para manutenção do seu poder tais como: desfigurar a constituição haitiana, perseguir inimigos, 
desmontar sindicatos, aumentar o poder de sua guarda pessoal e dissolver o congresso. Como um de seus 
particular7, o governo de Aristide, respaldado essencialmente pelas camadas 
populares haitianas, teve de submeter-se a inúmeras negociações com os 
apoiadores do antigo regime, a fim de evitar um golpe de Estado. Neste sentido, 
assinou um programa de ajuste estrutural elaborado pelo Banco Mundial 
comprometido com a liberalização da economia, atitude que desagradou seus 
eleitores, conquistados com seus antigos discursos acerca da necessidade de 
reforma agrária e distribuição de renda no país. 
Numa manobra que muito se assemelha aquelas adotadas pelos governos 
populistas consagrados na América Latina da primeira metade do século XX, 
Aristide volta-se, então, à população pobre, tentando alcançar um equilíbrio que 
desde o inicio mostrou-se demasiadamente tênue para ser obtido: a conciliação 
das reivindicações populares, de cunho radicalmente esquerdista, com as 
exigências da elite haitiana, alinhadas com a receita neoliberal preconizada pelo 
Consenso de Washington8. Chamado a tomar partido diante da radicalização dos 
dois setores, Aristide pronuncia-se ante vinte mil pessoas, convocando 
latifundiários e empresários a produzirem mais empregos para melhorar a 
 
últimos atos, forçou o Legislativo a aprovar a redução da idade mínima para eleição presidencial, 
possibilitando assim a perpetuação da família no poder. Então com 19 anos, Jean-Claude,o Baby doc, assume 
a presidência e dá seguimento ao terror nos moldes do governo de seu pai. Este período ditatorial fica 
marcado na Historia haitianapelo número de mortes que encerra, em torno de cem mil. Recentemente Baby 
Doc divulgou uma mensagem de rádio aos haitianos pedindo desculpas pelos “erros” cometidos durante seu 
regime, de 1971 a 1986. 
7
 O termo Tontons macoutes, designa a milícia de “voluntários da segurança nacional” criada por Papa Doc 
como forma de coibir manifestações contrarias a seus interesses. Foram ganhando poder progressivamente e 
em 1959 contabilizavam cerca de 25 mil homens. 
8
 Cunhada por John Willliamson, a expressão ‘Consenso de Washington’ se refere a uma agenda de políticas 
baseada em dez áreas de reformas com as quais, ele julgava que “Washington podia concordar que eram 
amplamente necessárias à América Latina a partir de 1989”. As recomendações do “Consenso” 
preconizavam, fundamentalmente, que os países deveriam dar prioridade à privatização, desregulamentação e 
abertura de suas economias. 
qualidade de vida do povo. Tal pronunciamento foi compreendido como uma 
opção pelos setores populares, suscitando um Golpe de Estado liderado por 
militares e pelas antigas milícias de Tontons Macoutes. 
Ameaçado de morte, o presidente deposto busca asilo na Venezuela, de 
onde parte, em um segundo momento, para os Estados Unidos da América, 
então presidido por George Bush, duramente criticado pela sanção recém 
imposta ao Iraque, a qual já vinha sendo reconhecida por suas violações a 
direitos humanos. Neste cenário, Aristide é acolhido pelo Partido Democrata9, 
que, alem de lhe organizar uma agenda – com instituições tais como o FMI e BM 
– deflagram uma verdadeira campanha contra o golpe que sofrera, sensibilizando 
a opinião publica e incitando a reivindicação de alguma atitude por parte do 
presidente americano. 
É neste contexto, de instabilidade e vulnerabilidade - características que 
parecem ser uma constante nos países alvos das sanções - e forte atuação 
americana, que teria vez a sanção econômica imposta ao Haiti. 
 
III. A sanção Econômica imposta ao Haiti 
Em 1991, a Organização dos Estados Americanos (OEA), conclamada 
como a defensora da democracia no continente, é chamada a debater o caso 
haitiano e agir para sua solução. A necessidade de agir em prol do 
 
9
 Alguns autores, como PESCHANSKI (2007, pg.643-647) chegam a utilizar a expressão garoto propaganda 
para designar o modo como o Partido Democrata “adotou” Aristide. Vale ressaltar que o golpe sofrido pelo 
mesmo e o suposto apoio do presidente republicano à elite golpista serviram à campanha presidencial 
democrata que, em 1993, elegeria Bill Clinton. 
restabelecimento do governo democraticamente eleito era reforçada neste 
momento, com aprovação, alguns meses antes, do Compromisso de Santiago 
com a Democracia e a Renovação do Sistema Interamericano, documento que 
vinculava os Estados americanos à defesa da Democracia no continente. 
Em suas primeiras reuniões, aprovou-se a resolução 1/9, por meio da qual 
a OEA “assumiu um posicionamento do qual não se afastaria durante todo o 
período de duração da crise no Haiti” (CAMARA, op.cit), o qual consistia, 
basicamente: a) no envio de uma missão integrada pelo Secretario Geral da OEA 
e dos ministros das relações exteriores dos países americanos ao país caribenho; 
e b) na suspensão de vínculos econômicos, financeiros e comerciais dos Estados 
Americanos com o Haiti, interrupção dos programas de ajuda e cooperação 
técnica, à exceção dos estritamente humanitários, suspensão de toda assistência 
dos estados americanos e de outros órgãos especializados do sistema 
interamericano e a abstenção de fornecimento de assistência militar, policial e de 
segurança, assim como da transferência de armamentos, munições e 
equipamentos congêneres para o país caribenho. 
Enquanto a primeira medida – envio de comissão com missão mediadora10 
– era comumente adotada pela OEA, a imposição de medidas coercitivas, tais 
 
10
 A referida comissão tinha como missão maior conduzir o chamado Protocolo de Washington à aprovação 
do governo golpista. Tal documento estabelecia, em seu artigo primeiro: As partes signatárias do presente 
reconhecem e admitem o principio da necessidade urgente de uma solução concertada e negociada para a 
crise política haitiana, desde a partida para o exílio do presidente Jean-Bertrand Aristide, em 30 de setembro 
de 1991, e a de que esta solução, para ser viável e durável, deve ser buscada no quadro do respeito à 
Constituição haitiana, à soberania nacional e conduzir à concórdia naciona,l instalação e consolidação das 
instituições democráticas, aplicação de medidas que garantam as liberdades civis, erradiquem a repressão e 
impeçam toda tentativa de vingança ou ajuste de contas. Ainda, sobre as exigências em torno do governo 
golpista, dispunha: as Partes reconhecem a necessidade de o Parlamento haitiano, como depositário da 
como as sanções econômicas, jamais se havia dado no âmbito da organização, 
uma vez que, como bem especifica a Carta das Nações Unidas, somente o 
Conselho de Segurança estaria habilitado para tanto. Neste sentido, o golpe de 
Estado verificado no Haiti inaugura a atuação da OEA sob os auspícios do 
Compromisso de Santiago, justificando a adoção de medidas coercitivas por sua 
responsabilidade na manutenção dos preceitos democráticos no continente. Tão 
logo promulgou-se a resolução, as medidas para efetivação da sanção econômica 
começaram a ser tomadas pelos Estados americanos. 
Diante do fracasso das tentativas de mediação por parte da Comissão, as 
sanções passaram a ser vistas como a medida de maior potencial entre as 
adotadas. De fato, como bem assegura CAMARA (op.cit): “Seu impacto sobre a 
frágil economia haitiana, estimava-se, produziria a rápida capitulação dos golpistas 
e a conseqüente e desejada conclusão da crise interna do país caribenho”. De 
fato, como nos apresenta a recém referida autora: 
Somente nos dois últimos meses de 1991, os efeitos da 
medida atingiram dramaticamente os setores 
econômicos do pais, provocando uma elevação de 
preços da ordem de 50 a 60% nos produtos de primeira 
necessidade, o aumento de 100% das tarifas dos 
transportes públicos e uma drástica diminuição dos 
estoques de combustível. 
 
Ainda assim, apurou-se o não cumprimento estrito do embargo comercial 
por algumas nações, o que incitou a reunião do Conselho Permanente da OEA, 
 
segurança nacional, reconduzir Jean Bertrand Aristide ao exercício de sua função de Presidente 
constitucional eleito da Republica do Haiti e colaborar com o governo de consenso nacional – a ser nomeado 
por Aristide e o presidente interino - para criar as condições de seu regresso ao Haiti. 
que se pronunciou através da Resolução Situação no Haiti- observância do 
embargo comercial, instituindo uma comissão especial encarregada da supervisão 
de seu cumprimento. 
Em seguida, os Estados Unidos romperia unilateralmente com a resolução 
1/9, adotando critérios seletivos para a imposição da sanção, com o alegado 
objetivo de evitar “que as camadas mais carentes da população haitiana fossem 
afetadas pela medida”. Nesta oportunidade, o embaixador americano apresentaria 
dados sobre os efeitos do embargo no setor industrial haitiano, revelando que “das 
44 fabricas de montagem que operavam no país antes do golpe, 37 haviam 
fechado suas portas temporariamente, 5 em caráter permanente e somente 2 
continuavam a manter suas atividades de produção.” Quanto ao setor de 
empregos, dispunha que “dos 252.000 trabalhadores do setor privado, 143.000 
haviam sido dispensados”. 
A atitude norte-americana não podeser vista com ingenuidade neste 
contexto. Uma vez que 38% das importações haitianas eram provenientes dos 
Estados Unidos à época, o embargo passava a representar perda à economia 
deste país. Ainda – e sobretudo - com o aprofundamento da crise, agravou-se 
também o problema da migração de refugiados haitianos, a maioria alimentando o 
sonho de ingressar nos Estados Unidos a partir de Miami. Estes fatores podem ter 
contribuído não apenas ao relaxamento do embargo pelos Estados Unidos, mas 
também à constante reivindicação deste país para que a ONU encabeçasse a 
ação, intervindo militarmente, se necessário. 
 Em consonância com estas aspirações americanas estava o presidente 
deposto, Jean Bertrand Aristide. Em carta em enviada ao Secretário Geral da 
ONU, Aristide solicita o engajamento da organização, a partir de seu Conselho de 
Segurança, em um esforço conjunto com a OEA, no sentido de garantir o 
cumprimento do embargo comercial. Em 10 de Novembro de 1992, por meio da 
Resolução 594 – Restabelecimento da Democracia no Haiti – a OEA ratificaria o 
pedido de auxilio feito por Aristide à ONU. 
Em 20 de novembro, a Assembléia Geral da ONU aprovou a Resolução 
A/47/L.23 que exigia a restauração do presidente Aristide no poder junto com o 
retorno à ordem constitucional e a observância do respeito dos direitos humanos, 
e pedia ao Secretário Geral que considerasse as “medidas necessárias” para a 
resolução da crise haitiana, em cooperação com a OEA. Em junho de 1993, o 
Conselho de Segurança, a pedido do representante permanente do Haiti nas 
Nações Unidas, aprovou a Resolução 84111, que proibiu a venda ou fornecimento 
por parte de qualquer Estado membro da ONU de hidrocarbonetos, armamentos, 
veículos e equipamentos militares ou afins ao Estado ou ao povo haitiano, 
universalizando a sanção no que dizia respeito ao comércio de petróleo e 
derivados, armas e munições. 
 
11
 O Conselho de Segurança afirmou, nesta ocasião, que a intervenção no Haiti “é uma situação única e 
excepcional, que justifica a tomada de medidas extraordinárias pelo Conselho de Segurança, em apoio dos 
esforços empreendidos no âmbito da Organização dos Estados Americanos”. Com base nestes argumentos, a 
resolução classifica a crise haitiana como uma ameaça à paz e à segurança da região e, sob a égide do cap. 
VII da Carta da ONU, justificaria sua adesão à sanção imposta em âmbito regional. Apesar de somente neste 
momento ter imposto a sanção econômica, desde o golpe de Estado sofrido por Aristide a ONU manifestou 
seu descontentamento com o ocorrido, recomendando o retorno ao Estado Constitucional. 
Eis aí outro aspecto peculiar da sanção econômica imposta ao Haiti: com a 
adesão da ONU, sobrepõem-se o organismo regional – OEA – e o universal – 
ONU – de ação. A ONU, fundando sua participação na defesa dos direitos 
humanos – essencialmente em decorrência da questão dos refugiados – e a OEA 
protagonizando a busca da democracia. 
A estas medidas seguir-se-íam inúmeras tentativas de negociar o retorno 
de Aristide com o presidente golpista e a elite militar12. Dado o malogro de tais 
iniciativas e o recrudescimento da violência entre grupos armados no país, o CS 
da ONU aprovaria uma série de resoluções, indo da reafirmação da sanção 
econômica (RES 873), passando pela autorização de um bloqueio naval (RES 
875) e culminando na declaração do embargo total de comércio ao país (RES 
917). 
A estas medidas, o governo de fato responderia com a nomeação do então 
Presidente da Suprema Corte, Émile Jonassaint, a presidente provisório do Haiti, e 
com a convocação de novas eleições em 90 dias. Jonassaint, fazendo uso de 
seus poderes, determinaria a expulsão da Missão da ONU no Haiti, classificada 
como “ameaça externa”. Diante disso, a intervenção armada - já defendida em 
 
12
 Cita-se o Acordo da Ilha dos Governadores, documento impresso em duas versões, uma a ser assinada por 
Aristide e a outra pelo presidente de fato, que se propunha firmar compromisso em torno de quatro objetivos 
prioritários: I) Instauração de uma trégua política e a formalização de um Pacto Social para garantir o 
processo de transição pacífica do Poder; II) Obtenção de um acordo para a normalização do Parlamento 
haitiano; III) Implantação de procedimentos parlamentares, com vistas à aprovação do nome do primeiro 
ministro a ser designado pelo Presidente; e IV) a aprovação das leis necessárias para garantir o processo de 
transição. Apesar de assinado, na oportunidade, o compromisso jamais seria cumprido. Seguiu-se a resolução 
867 do CS, pela qual se criou a Missão das Nações Unidas para o Haiti –MINUHA -, a qual teria o condão de 
colaborar nos projetos de treinamento da força policial e modernização do Exército caribenho. A missão 
sequer conseguiria desembarcar em solo haitiano, tamanha a hostilidade dos grupos armados que as 
situação anterior pelos EUA - passa a ser claramente buscada por Clinton, que 
propõe projeto de Resolução do CS nesse sentido. A RES 940 é aprovada por 
unanimidade, com as abstenções de Brasil e China e inaugura a utilização de uma 
“força multilateral” a qual, deveria ser substituída pela MINUHA quando um clima 
seguro e estável fosse estabelecido no Haiti13. 
A intervenção nestes moldes somente foi evitada devido a uma “manobra 
de última hora” feita por Bill Clinton, através do ex-presidente Jimmy Carter, 
quando se ofereceu à cúpula militar haitiana uma “aposentadoria antecipada e 
honrosa” para que aprovasse a lei de anistia geral e, ainda, a promessa da 
imediata suspensão das sanções econômicas com a convocação de novas 
eleições. Aceita a oferta americana, a entrada das tropas da ONU ganhou ares 
mais pacíficos, assim como foi facilitada a volta de Aristide, em 15 de outubro de 
1994, quando renuncia o presidente provisório e a sanção, teoricamente, chega a 
seu fim. 
 
IV. O cenário pós-sanção 
O termo final da sanção, obtido com o retorno de Aristide ao poder, não 
implica em dizer que ela obteve sucesso. A MINUAH, que inicialmente 
permaneceria seis meses em solo haitiano, perdurou até 1996, quando foi 
 
recepcionaram. Seguiram-se outras iniciativas, encabeçadas pelos Estados Unidos, por ministros haitianos e 
pela ONU, nenhuma delas logrando sucesso. 
13
 Segundo Irene Câmara (op.cit), “a resolução 940 abria precedentes graves no campo das relações 
internacionais” uma vez que autorizou os países a “utilizarem todos os meios necessários para regularizar 
uma situação que era, de fato, uma questão de natureza interna”. Acrescenta-se a isso que o conflito haitiano 
era estritamente interno, não se apresentando a configuração básica de conflito entre dois ou mais Estados, 
necessários para caracterizar ameaça ou ruptura da paz e segurança internacionais. Nestes casos, o corolário 
apresentado pelo Direito Internacional é o Princípio da Não-Intervenção, consagrado no Pós Guerra. 
substituída pela MINUSTAH, presente ainda hoje no país. Apesar de possuírem 
naturezas distintas das sanções econômicas, caracterizam, ambas, formas de 
intervenção no referido país, as quais talvez não houvessem sido necessárias 
caso a situação de pobreza e vulnerabilidade não tivessem aumentado com a 
imposição da sanção. 
Um dos grandes erros cometidos pela OEA, na defesa da democracia, 
talvez esteja em tê-la personificado em Aristide, condicionando o fim da sanção a 
seu retorno ao poder, sem atentar para o fato de que o caminho a ser percorrido 
neste sentido poderia acarretar danos ainda maiores do que a manutenção do 
status quo. A razoabilidadeda sanção haitiana pode ser contestada, nas palavras 
de Câmara (op.cit): 
Em primeiro lugar, porque as medidas, e em especial o 
embargo, não atingiram o alvo desejado, as lideranças 
militares e econômicas do Haiti. As elites delas se 
beneficiaram, recorrendo ao contrabando. A uma das 
grandes famílias haitianas, foram atribuídos altos lucros com 
a importação (embargada) de cimento. Aos líderes militares 
se responsabilizou pela comercialização, a preços 
extorsivos, de petróleo e outro produtos de consumo que 
continuaram a entrar no Haiti pela fronteira terrestre da 
República Dominicana praticamente até o fim da crise. (grifo 
nosso) 
 
Não obstante o favorecimento das elites, constatou-se, durante a sanção 
econômica ao Haiti, uma série de danos à população civil. Entre eles, os 
apontados por Elizabeth Gibbons e Richard Garfield (GIBBONS; GARFIELD, 
1999): a redução de 29.780 postos de trabalho nos setores eletrônico, desportivo, 
de brinquedos e vestuário; a perda de 200.000 empregos formais, afetando mais 
de um milhão de pessoas (dependentes), o que corresponde a 15% da população 
haitiana; o aumento do preço de alimentos básicos, tais como o arroz (em 137%) e 
o milho (em 184%), acarretando a diminuição de refeições diárias do haitiano (de 
duas, em 1990, para uma, em 1995); a diminuição da renda per capta em 30%; a 
elevação das taxas de inflação em 138%. 
 No que concerne à saúde pública, o corte do acesso a bens como a água e 
o petróleo também causaria prejuízos desproporcionais à população civil. Em 
1995, apenas 35% dos haitianos detinham acesso à água potável, enquanto em 
1990, este índice chegava a 53%. O embargo ao petróleo não apenas aumentou o 
preço de medicamentos, mas fez com que ambulâncias não pudessem conduzir 
doentes a postos de atendimento, resultando em mortes. Ainda, a diminuição do 
querosene provocaria o colapso do sistema de refrigeração de vacinas que, 
combinado com o fechamento de inúmeros postos de saúde pública, conduziu a 
uma considerável redução do alcance de cobertura da imunização de crianças 
(passando de 40%, em 1990, para menos de 12% em 1993). Esta queda, 
associada à vedação da entrada de um montante de vacinas em solo haitiano, 
contribuiria para uma epidemia de sarampo, na qual 15% dos casos revelaram-se 
fatais14. Acerca deste episódio, Elizabeth Gibbons, funcionária da UNICEF no Haiti 
durante a sanção, revelaria: 
UNICEF (which provided 90 percent of Haiti's vaccines against 
all childhood diseases except polio) accepted the collective 
decision against a measles campaign. But could the 
organization simply stop all support to partners combating the 
epidemic while the country waited for the "return to 
 
14
 Foi necessário mais de um mês para o Conselho de Segurança estabelecer diretrizes garantindo as exceções 
humanitárias ao embargo e mais um mês para finalizá-las. Neste meio tempo, suprimento tais como 2.400 
vacinas contra o sarampo foram atrasadas ou canceladas. (GIBBONS, 1999) 
democracy"? Morally, such a choice would not be coherent 
with respect for a child's right to life. On the other hand, 
providing large quantities of vaccines and other support to 
health institutions risked giving the impression that UNICEF 
supported the de facto government. We at UNICEF believed 
ourselves to be in an impossible political and moral situation 
and agonized over how we could answer to all masters. 
(GIBBONS, 1999) 
 
Soma-se a este depoimento, o parecer de Irene Câmara de que “os efeitos 
inibidores das medidas políticas e diplomáticas e a disposição demonstrada pela 
OEA de facilitar o diálogo entre os atores envolvidos demonstraram ser mais 
eficazes e oportunos do que as pressões econômicas” Neste sentido, cita-se 
também passagem de relatório produzido pela Comissão Internacional de 
Intervenção e Soberania de Estado (ICISS) ao International Development 
Research Center –IDRC-, onde se afirma: “sanctions are a “blunt instrument” that 
inflicts suffering on highly vulnerable groups. They also complicate the work of 
humanitarian agencies, cause long-term damage to the productive capacity of 
target nations, and generate severe effects on neighboring countries.” Tais 
pareceres, somados a inúmeros documentos produzidos em sede da ONU, 
parecem suficientes para que se esboce um quadro de questionamento e mesmo 
oposição às sanções como meios legítimos de pressão internacional. Entretanto, 
tais constatações não tem sido suficientes para mudar a atuação de governos e 
organizações. Como diria Ítalo Calvino, no mundo em que vivemos, não basta ter 
razão. 
 
Conclusão 
As sanções econômicas não se têm provado meio eticamente razoável e 
tampouco eficiente de pressão internacional pelas seguintes razões: a) não têm 
tido seu impacto devidamente mensurado pelas autoridades competentes; b) têm 
provocado danos de ordem social e humanitária às populações civis, não se 
restringindo a cúpula governante; c) no caso haitiano, agravaram o caos social 
pré-existente, suscitando a dúvida sobre se sua aplicação não teria sido ainda 
mais danosa do que a manutenção do status quo; d) ao atingir direitos humanos 
basilares, tais como o direito à vida e à saúde, mostram-se em desacordo com a 
Declaração dos Direitos Humanos, apoiada pela ONU; e) mostra-se uma medida 
dissonante no panorama internacional contemporâneo, onde se tem optado por 
ações de cunho humanitário, priorizando o bem estar das populações, como é o 
exemplo da MINUSTAH; 
 A análise destes elementos permite concluir que as sanções econômicas -
como instrumento de paz, alternativa a guerra- são de uso questionável na política 
internacional. Isto fica claro na observação do caso haitiano, onde 
comprovadamente restou violada uma série de direitos Humanos Fundamentais, 
entre eles o direito à vida. Ainda que objetivamente a sanção seja a tentativa de 
evitar danos civis dessa monta, o bloqueio das importações atinge a todos indireta 
e indiscriminadamente, causando maior dano às populações carentes. 
Assim, pode-se dizer que, se tecnicamente alcançou-se o objetivo almejado 
- já que por meio desse instrumento os golpistas foram retirados do poder - para 
atingir esse fim se submeteu uma população inteira às penúrias da intensificação 
da crise preexistente. 
Conclui-se também, de um ponto de vista mais geral, que a geografia das 
sanções econômicas tem praticamente ignorado o hemisfério norte, restringindo-
se, em sua maioria, aos chamados Países Menos Avançados (PMA`s), 
localizados, sobretudo, no continente Africano, onde parecem ter agravado a 
situação de escassez preexistente. Infelizmente, ainda não se pode afirmar com 
convicção esta relação, já que há um completo vazio estatístico sobre o tema. 
Contudo, é sintomático que este vazio não tenha sido remediado ou simplesmente 
causado incomodo às autoridades competentes até hoje, quase 50 anos depois da 
imposição da primeira sanção. 
Neste contexto, o caso haitiano – único pais latino-americano classificado 
entre os PMAs e alvo de sanções – parece ter fornecido ao Conselho de 
segurança da ONU, órgão responsável pela execução das sanções, um 
importante precedente no manejo da política internacional, ao inserir, por 
indicação da OEA, a busca pela democracia como meio de garantir paz e 
segurança, merecendo a atenção acadêmica e institucional que até hoje lhe foi 
negada. 
 
Referências 
DOCUMENTOS: 
 
A/46/7, A situação da democracia e dos direitos Humanos no Assembléia 
Geral das Nações Unidas Haiti, 46º. Período de sessões. 31º. Sessão plenária, 
11 de outubro de 1991, documentos originais suplemento numero 49 (A/46/49). 
 
E/2004/33, Report on the sixth session of the Committee for Development 
Policy,Economic and Social Council. Official Records, Supplement No. 13, 29 
March – 2 April, 2004. 
 
IS/RES/873, (1993) Conselho de Segurança das Nações Unidas, 13 de outubro de 
1993. 
 
MRE/RES. 3/92, Restauração da Democracia no Haiti, Reunião Ad Hoc dos 
Ministros da Relações Exteriores, quarta sessão, Nassau, OEA/Ser.F/ V.1, 17 de 
maio de 1992. 
 
Resolução 575 - Situação no Haiti- observância do embargo comercial - 
OEA/ser:G, CP/RES 575 (885/92), 22 de janeiro de 1992 
 
Resolução 594 – Restabelecimento da Democracia no Haiti – OEA/ser:G, CP/RES 
594(923/92), 10 de novembro de 1992. 
 
S/ RES/ 841(1993) Conselho de Segurança das Nações Unidas, 16 de junho de 
1993. 
 
S/RES/875, (1993) Conselho de Segurança das Nações Unidas, 16 de outubro de 
1993. 
 
S/RES/917, (1994) Conselho de Segurança das Nações Unidas, 6 de maio de 
1994. 
 
S/RES/940, (1993) Conselho de Segurança das Nações Unidas, 31 de Julho de 
1994. 
 
LIVROS & ARTIGOS: 
 
AZAMBUJA M. C. Os mecanismos de segurança coletiva. Estudos avançados. 
Vol.9 n. 25. (1995) PP 139-148 
 
BOSSUYT, Marc. The adverse consequences of economic sanctions on the 
enjoyment of human rights. Economic and Social Council 
E/CN.4/Sub.2/2000/33. Disponível em: 
http://www.globalpolicy.org/security/sanction/unreports/bossuyt.htm#annex1. 
Acesso em: 8 jul. 2008. 
 
ECONOMIC SANCTIONS AGAINST HAITI (1991-1994). Disponível em: 
HTTP://www.ndu.edu/inss/books/Books_1997/Imposing%20International%20Sanct
ions%20... Acesso em 4 jun. 2008. 
 
GIBBONS, E.D. Sanctions in Haiti: human rights and democracy under 
assault. Westport: Praeger, 1999. 
 
GIBBONS E, GARFIELD R. The impact of economic. sanctions on health and 
human rights in Haiti,. 1991–1994. American Journal of Public Health. Oct.1999. 
 
GUERREIRO R. S. ONU: um balanço possível. Estudos avançados. Vol9. n. 25. 
(1995) PP 129-138 
 
CAMARA, I.P. Em nome da democracia: a OEA e a crise haitiana -1991-1994. 
Brasília: Coleção Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, 1998. 
 
PATRIOTA, A.G O conselho de segurança após a guerra do golfo: a 
articulação de um Novo Paradigma de Segurança Coletiva Brasília: Coleção 
Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, 1998. 
 
PESCHANSKI, Latinoamericana: Enciclopédia Contemporânea da America 
Latina E Do Caribe. São Paulo: Ed. Boitempo, 2007. 
 
THE INTERNATIONAL DEVELOPMENT RESEARCH CENTER. Report of the 
Comission on Intervention and State Sovereignty. Disponível em: 
http://ewb.idrc.ca/en/ev-28493-201-1-DO_TOPIC.html

Continue navegando