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APLICACAO DE PRECEDENTES E DISTINGUISHIN (2)

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CUNHA, Leonardo Carneiro da; MACÊDO, Lucas Buril de; ATAÍDE JR, 
Jaldemiro Rodrigues de (org.). Precedentes judiciais no NCPC. Coleção 
Novo CPC e novos temas. Salvador: Juspodivm, 2015 
 
 
 
APLICAÇÃO DE PRECEDENTES E DISTINGUISHING NO CPC/2015: 
Uma breve introdução 
 
 
Dierle Nunes 
Doutor em direito processual (PUC-MG/Università degli Studi di Roma “La 
Sapienza”). Mestre em direito processual (PUC-MG). Professor permanente do PPGD 
da PUC-MG. Professor adjunto na PUC-MG e na UFMG. Secretário-Geral Adjunto 
do IBDP, Membro fundador do ABDPC, associado do IAMG. Advogado. Membro da 
Comissão de Juristas que assessorou no Novo Código de Processo Civil na Câmara 
dos Deputados. Advogado. 
 
André Frederico Horta 
Mestrando em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG. Advogado. 
 
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
 
 O Código de Processo Civil de 2015 promove a estruturação de um novo modelo 
dogmático para o dimensionamento do direito jurisprudencial no Brasil em face do 
quadro de alta instabilidade decisória que acabou tornando inviável a promoção do uso 
adequado dos precedentes no Brasil, considerando a superficialidade da fundamentação 
dos julgados e a ausência de análise panorâmica dos fundamentos, entre outros déficits 
de aplicação. 
 No entanto, um dos acréscimos mais relevantes, defendido pelo primeiro autor 
desde antes da tramitação legislativa do CPC em questão, foi o dimensionamento de 
uma técnica essencial no sistema de precedentes: a distinção (distinguishing), que 
possibilita à parte demonstrar que seu caso se diferencia dos precedentes ou dos padrões 
decisórios que gravitam em torno da matéria nele tratada. 
 Perceba que, neste aspecto, o CPC/2015 expressamente estrutura a aplicação e 
utilização da técnica da distinção na parte dos recursos repetitivos (art. 1037, §§ 9º et 
seq., com aplicação subsidiária em todo o microssistema de litigiosidade repetitiva), 
indica sua necessidade na parte da fundamentação estruturada (art. 489, §1º, VI),1 além 
de estabelecer pressupostos normativos contra-fáticos para a correção de uma infinidade 
de vícios nos quais a prática judicial atual incorre e alimenta. 
 O presente ensaio busca ofertar ao leitor uma visão panorâmica do sistema de 
precedentes dimensionado no CPC/2015, com destaque para a técnica de distinguishing, 
de forma a permitir a compreensão dos fundamentos e do modo que dogmaticamente se 
deverá implantar uma prática precedencialista brasileira embasada nas normas 
fundamentais do processo constitucional e da nova legislação. 
 
 
2. O CASO BRASILEIRO: ENTRE O CIVIL LAW E O COMMON LAW. O 
NOVO SOB O OLHAR DO VELHO, OU O VELHO SOB O OLHAR DO NOVO? 
 
No específico contexto brasileiro, não é novidade que o ordenamento jurídico 
pátrio encontra-se permeável à utilização do direito jurisprudencial como fonte 
normativa. Em minuciosa pesquisa histórica da época Colonial e Imperial, Marcus 
Seixas Souza2 descreve quais eram os tipos de decisões judiciais existentes à época, a 
importância de cada uma e de que modo influenciavam a prática jurídica de então, 
sendo perceptível a influência de alguns deles, como os assentos portugueses, até os 
dias de hoje como no caso dos enunciados de súmula da jurisprudência dominante dos 
tribunais superiores, que possuem características aproximadas às dos assentos. 
Nas últimas duas décadas, foram implementadas inúmeras reformas processuais 
de valorização do direito jurisprudencial, desde a criação dos referidos enunciados de 
súmulas (inicialmente, apenas nos regimentos internos dos tribunais e, posteriormente, 
 
1 “Art. 489. São elementos essenciais da sentença: § 1º Não se considera fundamentada qualquer 
decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: [....] VI – deixar de seguir 
enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a 
existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.” 
2 SOUZA, Marcus Seixas. Os precedentes na história do Direito processual civil brasileiro: Colônia e 
Império. Salvador, Dissertação de mestrado, Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, 
2014, p. 87-88. 
na legislação, por meio da Lei nº 8.756/98, que deu nova redação ao art. 557 do 
CPC/73, e da Lei nº 11.276/06, que acrescentou o § 1º ao art. 518 do mesmo diploma), 
da Súmula Vinculante (art. 103-A do CPC, criado pela Emenda Constitucional nº 
45/04), passando pelo julgamento liminar de demandas repetitivas (art. 285-A do 
CPC/73, introduzido pela Lei nº 11.277/06), e, por fim, introdução das técnicas de 
julgamento de recursos excepcionais repetitivos por amostragem (art. 102, § 3º, da CR, 
introduzido pela EC nº 45/04, e arts. 543-A a 543-C do CPC/73, criados pelas Leis nº 
11.418/06 e 11.672/08). 
O novo Código de Processo Civil mantém essas reformas, vai além e evidencia o 
importante papel que o direito jurisprudencial exerce no ordenamento jurídico brasileiro 
com o delineamento de um microssistema de litigiosidade repetitiva que encampa, entre 
seus preceitos, novo regramento dos precedentes no Brasil. 
A título exemplificativo, o art. 926 do CPC/2015 estabelece que os tribunais 
devem zelar para que sua jurisprudência mantenha-se uniforme, íntegra e coerente; o 
art. 988 abre a possibilidade de manifestação da reclamação perante o STF e o STJ, em 
caso de desrespeito a precedente estabelecido em sede de julgamento de casos 
representativos da controvérsia; os arts. 976 e ss. inauguram o incidente de resolução de 
demandadas repetitivas (IRDR); o art. 311 cria a denominada tutela da evidência e 
estabelece que uma das hipóteses de sua concessão (a do inc. II)3 depende da existência 
de tese favorável firmada pelos tribunais superiores em julgamento de casos repetitivos 
ou de súmula vinculante; a improcedência liminar dos pedidos é autorizada desde que, 
além de ser dispensável a fase instrutória, a pretensão autoral contrarie enunciado de 
súmula do STF ou do STJ, acórdão proferido por esses tribunais em julgamento de 
recursos repetitivos ou em incidente de resolução de demandas repetitivas, ou enunciado 
de súmula de tribunal de justiça sobre direito local, tudo nos termos do art. 332; e a 
remessa necessária não se efetivará se a sentença estiver fundada em súmulas ou 
acórdãos proferidos em sede de resolução de demandas repetitivas ou em julgamento de 
recursos repetitivos, a teor do § 3º do art. 496. 
Verifica-se, portanto, a relevância cada vez maior conferida ao direito 
jurisprudencial e ao próprio Poder Judiciário, que balizados pelo processo constitucional 
e pelas novas premissas do CPC/2015 (com destaque a teoria normativa da 
 
3 Cf. NUNES, Dierle; PIRES, Michel Hernane Noronha; GODINHO, Luana Veloso Gonçalves. 
Executividade imediata da sentença: evolução no CPC projetado e técnica decisória de ressalva de 
entendimento. In: FUX, Luiz et al (org.). Novas tendências de processo civil, v. 4, Salvador: Juspodivm, 
2014. 
comparticipação)4, promovem o dimensionamento das mais diversas espécies de 
litigiosidade. 
Nesse contexto, começou a ser sustentada uma aproximação do ordenamento 
jurídico brasileiro à tradição de common law. Embora se possa objetar que não se 
encontra no Direito inglês e norte-americano qualquer mecanismo semelhante aos 
enunciados sumulares5 (que tanto prestígio receberam em solo pátrio), ou que o 
julgamento de recursos por amostragem e o incidente de demandas repetitivas 
constituem técnicas embasadas no procedimento-modelo alemão,6 é inegável a 
 
4 Cf. THEODORO JR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre; PEDRON, Flávio. NovoCódigo 
de Processo Civil: Fundamentos e sistematização. Rio de Janeiro: GEN Forense, 2015. NUNES, Dierle. 
Processo jurisdicional democrático. Curitiba: juruá, 2008. 
5 O modo como as Súmulas são aplicadas no Brasil, além de não se aproximar do método de common law 
de aplicação de precedentes, em certa medida dialoga com uma variante do positivismo jurídico alemão, 
qual seja, a jurisprudência dos conceitos, que sustentava a capacidade de os Tribunais criarem conceitos 
universais, em “um sistema fechado que parte do geral para o singular e que chega a ‘esse’ geral com a 
negligência às singularidades”. NUNES, Dierle, BAHIA, Alexandre. Falta aos Tribunais formulação 
robusta sobre precedentes. Artigo publicado em jan/2014 e disponível no link 
<http://www.conjur.com.br/2014-jan-07/falta-aos-tribunais-formulacao-robusta-precedentes>. Acesso em 
26 de julho de 2014. E pior; ao se recorrer ao uso dos enunciados sumulares como se lei fossem – o que 
constitui outro equívoco –, o entendimento neles consubstanciado é utilizado de forma desvinculada dos 
julgados que lhes deram origem, isto é, sem a análise das circunstâncias fáticas e jurídicas que 
justificaram a sua edição. Embora hoje se tenha amplo acesso aos julgados dos quais os enunciados 
foram extraídos, os tribunais costumam aplicá-los descontextualizados da moldura jurídica e fática que os 
embasam, como se o enunciado constituísse um texto normativo independente. Isto é agravado quando os 
tribunais, ao “fundamentarem” as suas decisões, apenas indicam a existência de determinado enunciado 
que, em tese, constituiria fundamentação idônea e suficiente para a decisão proferida. No novo CPC, isso 
é vedado, por força do § 1º do art. 489. A nova lei passa a tornar obrigatória a perquirição dos casos e do 
contexto em que o enunciado foi elaborado, a fim de seja conferida motivação de sua adequação ao caso 
concreto em exame. O novo comando atende ao que a melhor doutrina sempre reclamou: “as decisões 
judiciais devem estar justificadas, e tal justificação deve ser feita a partir da invocação de razões e 
oferecendo argumentos de caráter jurídico, assinala Ordónez Solís. O limite mais importante das decisões 
judiciais reside precisamente na necessidade da motivação/justificação do que foi dito. O juiz, por 
exemplo, deve expor as razões que lhe conduziram a eleger uma solução determinada em sua tarefa de 
dirimir conflitos. A motivação/justificação está vinculada ao direito à efetiva intervenção do juiz, ao 
direito dos cidadãos a obter uma tutela judicial (...). Sendo assim, o juiz não pode considerar que é a 
súmula que resolve um litígio – até porque as palavras não refletem as essências das coisas, assim como 
as palavras não são as coisas, mas, sim, que é ele mesmo juiz, o intérprete, que faz uma fusão de 
horizontes para dirimir o conflito”. STRECK, Lenio Luiz; ABBOUD, Georges. Op. cit., p. 128-129. Cf., 
também, o enunciado nº 166, elaborado pelo Fórum Permanente de Processualistas Civis: “A aplicação 
dos enunciados das súmulas deve ser realizada a partir dos precedentes que os formaram e dos que os 
aplicaram posteriormente”. 
6 “Trata-se de uma técnica conhecida em diversos países, que a denominam de ‘caso-piloto, ‘caso-teste’ 
ou ‘processo-mestre’. Consiste o mecanismo em permitir que, entre várias demandas idênticas, seja 
escolhida uma só, a ser decidida pelo tribunal, aplicando-se a sentença aos demais processos, que haviam 
ficado suspensos. Esse método é utilizado pela Alemanha, Áustria, Dinamarca, Noruega e Espanha 
(nesta, só para o contencioso administrativo)’.”GRINOVER, Ada Pellegrini; JAYME, Fernando 
Gonzaga; FARIA, Juliana Cordeiro de; LAUAR, Maira Terra (coord). O tratamento dos processos 
repetitivos. In Processo civil: novas tendências: estudos em homenagem ao professor Humberto 
Theodoro Junior. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 5. Para maiores detalhes, conferir: NUNES, Dierle 
José Coelho; PATRUS, Rafael Dilly. Uma breve notícia sobre o procedimento-modelo alemão e sobre as 
tendências brasileiras de padronização decisória: um contributo para o estudo do incidente de resolução 
de demandas repetitivas brasileiro. In Novas Tendências do Processo Civil: Estudos sobre o Projeto do 
Novo Código de Processo Civil. Editora Jus Podivm: Salvador, 2013. 
utilização cada vez mais frequente de decisões jurisprudenciais como fonte do direito, 
mesmo em se tratando de aplicação de súmulas e das teses firmadas a partir daquelas 
duas últimas técnicas, que, embora não possam ser qualificadas como precedentes 
propriamente ditos, colocam em evidência pronunciamentos jurisdicionais com aptidão 
para resolver casos concretos. 
Antes de se prosseguir, cumpre enfrentar uma questão que servirá de ponto de 
apoio para o desenvolvimento do tema central do presente ensaio. Ao contrário do que 
se passa no common law, a utilização, no Brasil, dos precedentes e, em maior medida, 
do direito jurisprudencial na aplicação do direito é fruto de um discurso de matiz 
neoliberal, que privilegiava a sumarização da cognição, a padronização decisória 
superficial e uma justiça de números (eficiência tão somente quantitativa), configurando 
um quadro de aplicação equivocada (fora do paradigma constitucional) desse mesmo 
direito jurisprudencial que dá origem ao que se pode chamar de hiperintegração do 
direito7. 
A expressão denota o tratamento igualitário a casos substancialmente distintos, 
como se fossem (mas não são) objetos subsumíveis à mesma regra geral. Na precisa 
lição de Ramires, “de um lado, uma decisão judicial deve ser coerente com o todo da 
prática jurídica, porque o direito rejeita os casuísmos típicos da política. Mas, de outro, 
as distinções e particularidades dos casos exigem respostas individualizadas”8. Mais 
adiante, o autor explicita que há hiperintegração “na interpretação quando os fatos de 
um caso com alguma especificidade e restrição acabam se tornando um parâmetro geral 
para casos subsequentes que não guardam suficientes padrões de identificação com 
ele”9. 
Uma cadeia de eventos descritos em outra sede10 criou o espaço ideal para o 
surgimento de reformas processuais (já mencionadas) que visam, sob a justificativa da 
razoável duração do processo, à padronização decisória em prol da celeridade 
processual, da sumarização da cognição e do reforço da jurisdição, com a instauração de 
“uma visão neoliberal de alta produtividade de decisões e de uniformização superficial 
 
7 A expressão contrapõe-se ao que se pode chamar de desintegração do direito, gerada pela especificação 
exacerbada de um caso, cujas distinções com outro caso não justificariam o tratamento diferenciado, 
justamente porque as partes (os dois casos) estão conectadas a uma totalidade. Como se vê, a 
desintegração e a hiperintegração constituem vícios da prática judiciária que se localizam nos extremos, e, 
tal quais as virtudes aristotélicas, possuem um justo meio termo: a integridade do direito. 
8 RAMIRES, Maurício. Crítica à aplicação de precedentes no direito brasileiro. Livraria do Advogado: 
Porto Alegre, 2010, p. 105. 
9 RAMIRES, Maurício. Op. cit., p. 109. 
10 NUNES, Dierle. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá, 2008. 
dos entendimentos pelos tribunais”, ainda que isso “ocorra antes de um exaustivo debate 
em torno dos casos, com a finalidade de aumentar a estatística de casos ‘resolvidos’”.11 
Ao se perceber este quadro adulterado é que surge o CPC/2015, com uma 
função contra-fática12 na tentativa de promover um aprimoramento qualitativo do 
sistema de precedentes de modo a ofertar um diálogo genuíno na formação dos 
julgados que leve a sério todos os argumentos relevantes para o deslinde da 
situação em julgamento. 
O novo CPC busca se alinhar ao modelo democrático e constitucional de 
processo13, com oreforço de seu aspecto principiológico logo em seu capítulo 
introdutório, que menciona expressamente o princípio de boa-fé objetiva (art. 5º), 
da cooperação entre os sujeitos processuais (art. 6º – teoria normativa da 
comparticipação), e do contraditório como paridade de armas (art. 7º), de 
bilateralidade de audiência (art. 9º), e, mais importante, como garantia de 
influência e não-surpresa (art. 10º), de modo a impedir a potencial manutenção do 
sentido das reformas processuais gestadas sob o denunciado discurso neoliberal. 
 Caso a nova lei não seja interpretada em sua unidade e em conformidade 
com a teoria normativa da comparticipação, corre-se o risco de manter-se o 
“velho” modo de julgamento empreendido pelos magistrados, que, de modo 
unipessoal (solipsista), aplicam teses e padrões sem a promoção de juízos de 
 
11 THEODORO JR., Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Breves considerações da 
politização do judiciário e do panorama de aplicação no direito brasileiro: Análise da convergência 
entre o civil law e o common law e dos problemas da padronização decisória. In Revista de Processo, Ano 
35, nº 189, Revista dos Tribunais: São Paulo, nov/2010, p. 21-23. 
12 Como explicado em outra sede: Ao se perceber uma série de vícios e descumprimentos à normatização 
(inclusive constitucional) a nova legislação tenta, contra-faticamente, implementar comportamentos mais 
consentâneos com as finalidades de implementação de efetividade e garantia de nosso modelo processual 
constitucional. Este é um de seus grandes pressupostos ao se buscar corrigir problemas sistêmicos. Adota-
se, assim, uma série de “registros de avanço” normativos para uma plêiade de comportamentos não 
cooperativos habitualmente adotados pelos sujeitos processuais.” NUNES, Dierle. A função contra-fática 
do direito e o Novo CPC. Revista da AASP. Abril/2015. 
13 Cf. THEODORO JR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre; PEDRON, Flávio. Novo Código 
de Processo Civil: Fundamentos e sistematização. Rio de Janeiro: GEN Forense, 2015. O processo, na 
perspectiva de um modelo constitucional, “inaugura uma visão garantística” dos direitos fundamentais, 
limitando a atuação daqueles que dele (do processo) participam de forma equivocada e inaugurando uma 
hermenêutica processual condicionada à Constituição e à ideia de Estado Democrático de Direito, à luz da 
comparticipação e do policentrismo. NUNES, Dierle José Coelho. Teoria do Processo Contemporâneo, 
op. cit., p. 14. Na precisa lição de Aroldo Plínio Gonçalves, o processo, no paradigma do Estado 
Democrático de Direito, deve ser concebido como “um procedimento de que participam aqueles que são 
interessados no ato final”, o que se dará em contraditório e deve cumprir a finalidade de permitir “que as 
partes recebam uma sentença, não construída unilateralmente pela clarividência do juiz, não dependente 
dos princípios ideológicos do juiz, não condicionada pela magnanimidade de um fenômeno Magnaud, 
mas gerada na liberdade de sua participação recíproca, e pelo recíproco controle dos atos do processo”. 
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica Processual e teoria do processo. AIDE Editora: Rio de Janeiro, 
2001, p. 68 e 188. 
adequação e aplicabilidade ao caso concreto, citando ementas e súmulas de forma 
descontextualizada, e não se preocupando em instaurar um efetivo diálogo 
processual com os advogados e as partes, especialmente se a doutrina não 
reassumir a função e a postura crítica que dela se espera, ao contrário de se 
conformar em repetir o ementário e os enunciados sumulares de uma prática 
jurisprudencial que se vale, em um círculo vicioso, dos mesmos enunciados e 
ementas. 
É no contexto de reanálise de técnicas de padronização decisória e com a 
finalidade de, a partir das premissas principiológicas do novo CPC e do modelo 
democrático de processo, fornecer subsídios para a reversão do quadro de 
hiperintegração do direito gerado pela aplicação das aludidas técnicas e para a correta 
aplicação do direito jurisprudencial como fonte normativa que se irá desenvolver o tema 
central do presente texto: a criação e dimensionamento de técnicas de distinção (o 
conhecido distinguishing do common law) no momento de aplicação do direito 
jurisprudencial ao caso concreto. 
O CPC/2015 supre a carência normativa hoje vivenciada de inexistência de 
previsão de técnicas de distinção, deixando evidente, em diversos dispositivos, a 
necessidade de sua observância, fornecendo fértil substrato normativo para que o tema 
seja desenvolvido. 
É o que se passa no importante § 1º do art. 489 (a ser comentado mais adiante), 
que estabelece algumas balizas normativas a serem seguidas pelo magistrado ao proferir 
sua decisão (seja sentença, decisão interlocutória ou voto integrante de acórdão), a fim 
de que ela seja considerada fundamentada e atenda ao inc. IX do art. 93 da Constituição 
da República, sob pena de nulidade. Para ilustrar, nos termos do inc. VI do citado 
dispositivo, a decisão que deixa de seguir determinado enunciado de súmula, 
jurisprudência ou precedente apenas será considerada fundamentada caso sejam 
demonstrados padrões de distinção entre as razões de fato e/ou de direito nele 
consubstanciadas e o caso em exame. 14 
 
14 Como vimos sustentando, no marco do constitucionalismo, o pressuposto é o de se perceber o processo 
como garantia, com a formação e a aplicação do direito jurisprudencial observando-se essa garantia. Em 
outra sede, um dos autores do presente artigo já havia delineado as diretrizes básicas de aplicação, no 
Brasil, do direito jurisprudencial, as quais são tomadas como balizas no desenvolvimento do tema 
proposto: “Nesse aspecto, o processualismo constitucional democrático por nós defendido tenta discutir a 
aplicação de uma igualdade efetiva e valoriza, de modo policêntrico e comparticipativo, uma renovada 
defesa de convergência entre o civil law e common law, ao buscar uma aplicação legítima e eficiente 
(efetiva) do direito para todas as litigiosidades (sem se aplicar padrões decisórios que pauperizam a 
 
 
3. TRABALHANDO COM PRECEDENTES: INDIVIDUALIZAÇÃO DO 
DIREITO À LUZ DA INTEGRIDADE E DA COERÊNCIA. 
 
 
análise e a reconstrução interpretativa do direito), e defendendo o delineamento de uma teoria dos 
precedentes para o Brasil que suplante a utilização mecânica dos julgados isolados e súmulas em nosso 
país. Nesses termos, seria essencial para a aplicação de precedentes seguir algumas premissas essenciais: 
1.º – Esgotamento prévio da temática antes de sua utilização como um padrão decisório (precedente): ao 
se proceder à análise de aplicação dos precedentes no common law se percebe ser muito difícil a formação 
de um precedente (padrão decisório a ser repetido) a partir de um único julgado, salvo se em sua análise 
for procedido um esgotamento discursivo de todos os aspectos relevantes suscitados pelos interessados. 
Nestes termos, mostra-se estranha a formação de um “precedente” a partir de um julgamento superficial 
de um (ou poucos) recursos (especiais e/ou extraordinários) pinçados pelos Tribunais (de 
Justiça/regionais ou Superiores). Ou seja, precedente (padrão decisório) dificilmente se forma a partir de 
um único julgado. 2.º – Integridade da reconstrução da história institucional de aplicação da tese ou 
instituto pelo tribunal: ao formar o precedente o Tribunal Superior deverá levar em consideração todo o 
histórico de aplicação da tese, sendo inviável que o magistrado decida desconsiderando o passado de 
decisões acerca da temática. E mesmo que seja uma hipótese de superação do precedente (overruling) o 
magistradodeverá indicar a reconstrução e as razões (fundamentação idônea) para a quebra do 
posicionamento acerca da temática. 3.º – Estabilidade decisória dentro do Tribunal (stare decisis 
horizontal): o Tribunal é vinculado às suas próprias decisões: como o precedente deve se formar com uma 
discussão próxima da exaustão, o padrão passa a ser vinculante para os Ministros do Tribunal que o 
formou. É impensável naquelas tradições que a qualquer momento um ministro tente promover um 
entendimento particular (subjetivo) acerca de uma temática, salvo quando se tratar de um caso diferente 
(distinguishing) ou de superação (overruling). Mas nestas hipóteses sua fundamentação deve ser idônea 
ao convencimento da situação de aplicação. 4.º – Aplicação discursiva do padrão (precedente) pelos 
tribunais inferiores (stare decisis vertical): as decisões dos tribunais superiores são consideradas 
obrigatórias para os tribunais inferiores (“comparação de casos”): o precedente não pode ser aplicado de 
modo mecânico pelos Tribunais e juízes (como v.g. as súmulas são aplicadas entre nós). Na tradição do 
common law, para suscitar um precedente como fundamento, o juiz deve mostrar que o caso, inclusive, 
em alguns casos, no plano fático, é idêntico ao precedente do Tribunal Superior, ou seja, não há uma 
repetição mecânica, mas uma demonstração discursiva da identidade dos casos. 5.º – Estabelecimento de 
fixação e separação das ratione decidendi dos obter dicta da decisão: a ratio decidendi (elemento 
vinculante) justifica e pode servir de padrão para a solução do caso futuro; já o obter dictum constituem-
se pelos discursos não autoritativos que se manifestam nos pronunciamentos judiciais “de sorte que 
apenas as considerações que representam indispensavelmente o nexo estrito de causalidade jurídica entre 
o fato e a decisão integram a ratio decidendi, onde qualquer outro aspecto relevante, qualquer outra 
observação, qualquer outra advertência que não tem aquela relação de causalidade é obiter: um obiter 
dictum ou, nas palavras de Vaughan, um gratis dictum”. 6.º – Delineamento de técnicas processuais 
idôneas de distinção (distinguishing) e superação (overruling) do padrão decisório: A ideia de se 
padronizar entendimentos não se presta tão só ao fim de promover um modo eficiente e rápido de julgar 
casos, para se gerar uma profusão numérica de julgamentos. Nestes termos, a cada precedente formado 
(padrão decisório) devem ser criados modos idôneos de se demonstrar que o caso em que se aplicaria um 
precedente é diferente daquele padrão, mesmo que aparentemente seja semelhante, e de proceder à 
superação de seu conteúdo pela inexorável mudança social – como ordinariamente ocorre em países de 
common law.” 
A relevância do tema a que se propôs enfrentar se justifica na medida em que o 
que se vê, na prática, é “o posicionamento absolutamente restritivo que os Tribunais 
vêm adotando em relação à recorribilidade das decisões proferidas em consonância com 
os paradigmas firmados”15, em uma tendência de engessamento do Direito e de 
supressão de discussões sobre teses jurídicas já decididas, a despeito da existência de 
razões peculiares que recomendariam as departures do common law – a exemplo do 
distinguinshing –, o que é agravado em razão da dificuldade de promoção da formação 
de padrões decisórios realmente panorâmicos. 
Nesse ponto, teríamos a aprender com o common law que uma decisão não nasce 
como se precedente fosse; são os juízes de casos futuros que, instados a se manifestarem 
sobre decisões passadas, podem invocar tais decisões na qualidade de precedentes. 
Porém, uma das características peculiares do ordenamento jurídico 
brasileiro é a que permite, mediante a técnica recursal, o julgamento para a 
formação de precedentes. E se assim adotamos a formação de julgados, devemos 
consolidar modificações que garantam que o Tribunal, desde o primeiro 
julgamento, busque um esgotamento discursivo do caso levando em consideração 
todos os argumentos relevantes daquele caso. 
Sabe-se e aprendemos com o common law que o juiz do primeiro caso apenas 
pretendia resolver a situação que lhe fora submetida (o que não quer dizer que, ao 
decidir, ele não tenha se preocupado em prolatar uma decisão que pudesse ser útil no 
futuro). A própria noção do que seja o precedente (uma atividade reconstrutiva do 
passado) torna possível a novos juízes darem novos sentidos ao texto, derivando dessa 
assertiva a possibilidade se de promover o distinguishing, ou até mesmo se ampliar 
(widening) ou reduzir (narrowing) o precedente, a depender das circunstâncias e dos 
padrões de identificação que forem estabelecidos entre os casos – mas todas essas 
atividades extrapolam a mera citação do texto de uma decisão passada qualquer, de 
enunciados sumulares ou mesmo de teses estabelecidas.16 
Em outras palavras, jamais o precedente será anunciado de forma completa 
e única. É a partir das distinções, das ampliações e das reduções que os 
precedentes são dinamicamente refinados pelo Judiciário (sempre a partir das 
contribuições de todos os sujeitos processuais), à luz de novas situações e contextos, 
 
15 NUNES, Dierle; FREIRE, Alexandre; GODOY, Daniel Polignano; CARVALHO, Daniel Corrêa Lima 
de. Precedentes: alguns problemas na adoção do distinguinshing no Brasil. In Revista Libertas, UFOP, 
v. 1, nº 1, jan-jun/2013, p. 21. 
16 RAMIRES, Maurício. Op. cit., p. 73. 
a fim de se delimitar a abrangência da norma extraída do precedente. Se, de um 
lado, é verdade que o precedente originário estabelece o primeiro material 
jurisprudencial (não se ignora o texto legal e a doutrina) sobre o qual se 
debruçarão os intérpretes dos casos subsequentes, com o passar do tempo, uma 
linha de precedentes se formará a partir daquele primeiro precedente, 
confirmando-o, especificando-o e conferindo-lhe estabilidade,17 e a técnica da 
distinção (distinguishing) desempenha uma importante função nesse processo de 
maturação do direito jurisprudencial. 
Ademais, deve-se, sempre, levar em consideração que cada caso específico 
colocado sob apreciação do Judiciário dificilmente será completamente novo, e 
certamente não será o último, o que induz ao questionamento sobre a pertinência de se 
tentar resolver todos os casos trabalhando por atacado ou por amostragem e com a 
pretensão de que o texto do enunciado, da ementa ou das teses formadas consiga, de 
antemão, abarcar todas as situações da vida possíveis, e, pior, sem o esgotamento da 
matéria e sem a abertura do espaço processual adequado para a discussão dos fatos 
subjacentes ao caso em análise face aos precedentes e enunciados sumulares que se 
pretende aplicar ou afastar – posturas como essas eram incentivadas (ou, para dizer o 
mínimo, toleradas) pelo CPC/1973, mas o CPC/2015 busca promover uma 
readequação da prática judiciária à luz do modelo democrático de processo, para o 
que não pode ser interpretado a partir de velhos hábitos. 
O novo CPC não prescinde de que o direito jurisprudencial seja aplicado sempre 
à luz de todos os fatos que integram o caso em análise e também dos casos sumulados 
ou que deram origem às teses e precedentes invocados – se pelas partes, constitui ônus 
destas estabelecer padrões de analogia ou de distinção; se pelo magistrado, este deverá 
facultar às partes o momento processual adequado para as partes se manifestarem, sob 
pena de violação do contraditório, após o que, levando em consideração os argumentos 
apresentados, procederá, de forma fundamentada, às analogias e/ou contra-analogias. 
Portanto, trabalhar com precedentes (ou súmulas e teses) constitui um processo 
de individualização do Direito (o que é diuturnamente ameaçado pelo formalismo dos 
enunciados sumulares e das teses estabelecidas pelos tribunaissuperiores, sem 
 
17 MACÊDO, Lucas Buril. Precedentes judiciais e o direito processual civil. Editora Jus Podivm: 
Salvador, 2015, p. 363. 
seguimento dos pressupostos democráticos contra-faticamente18 impostos no 
CPC/2015,19 na medida em que incentivam a desconsideração das peculiaridades dos 
casos concretos) e de universalização da regra estabelecida no precedente (ou nos casos 
sumulados) a exigir do intérprete constante atenção à dimensão subjetiva (construída 
processualmente, em especial na fase probatória) do caso concreto, sem a qual restará 
prejudicada sua conciliação com a dimensão objetiva do Direito. 
Nesse processo, é preciso indagar-se quando e em que medida determinado caso 
é subsumível no precedente, e este questionamento diz diretamente com o nível de 
generalização a ser buscado tanto no precedente como no caso presente, a fim de serem 
estabelecidas as analogias e as contra-analogias que definirão acerca da aplicabilidade 
daquele a este. 
 
 
4. ANALOGIAS E CONTRA-ANALOGIAS. APLICAÇÃO DO PRECEDENTE E 
DISTINGUISHING. ENCONTRANDO PADRÕES DE SEMELHANÇA E 
DISTINÇÃO. 
 
Raciocinar por precedentes é, essencialmente, raciocinar por comparações. 
Comparam-se situações, fatos, hipóteses, qualidades e atributos, e, ao serem feitas as 
comparações, analogias e contra-analogias são elaboradas para que se possa concluir se 
tais comparações são fortes o suficiente para que coisas diferentes sejam tratadas de 
forma igual, ou se são fracas o bastante para que coisas diferentes não sejam tratadas de 
forma desigual – aliás, por mais complexa e controvertida seja a noção de “justiça”, 
dificilmente se conseguirá ensaiar alguma conceituação fundamentada sem enfrentar 
a questão da igualdade e da diferença. 
Uma analogia consiste em indicar similaridades entre atributos de dois ou mais 
“entes” a fim de que, embora diferentes entre si (mas compartilhando de determinadas 
características), seja-lhes atribuído igual tratamento, a depender da quantidade e da 
relevância (qualidade) das similaridades existentes. Caso se conclua que a dois fatos 
deva ser atribuída a mesma consequência, quer dizer que se raciocinou por analogia; 
 
18 NUNES, Dierle José Coelho. A função contra-fática do direito e o Novo CPC. Revista da AASP. São 
Paulo, abr. 2015. 
19 Para a devida compreensão das normas fundamentais e da interpretação do Novo CPC cf. THEODORO 
JR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre; PEDRON, Flávio. Novo Código de Processo Civil: 
Fundamentos e sistematização. Rio de Janeiro: GEN Forense, 2015. 
caso se entenda que a ambos os fatos devam ser atribuídas consequências distintas, o 
raciocínio foi realizado por contra-analogia (ou por distinguishing, para utilizarmos o 
jargão específico do common law). 
Em outras palavras, no raciocínio por precedentes, a analogia e o distinguishing 
(disanalogie ou contra-analogia) colocam-se como técnicas que, conquanto situadas em 
extremos opostos, fundam-se essencialmente na realização de comparações, definindo a 
aplicabilidade de determinado precedente ao caso concreto, à luz da coerência e da 
integridade do Direito. Nesse sentido, Misabel Derzi e Thomas Bustamante entendem 
que “a decisão de aplicar cada precedente a um novo caso concreto é [...] presidida e 
informada por uma ponderação de princípios, que se encontra na base do processo de 
comparação de casos por meio de analogias e contra-analogias”20. 
 É possível classificar a técnica da distinção (distinguishing) tomando por base 
um sentido amplo e outro estrito: a distinção em sentido amplo consiste no processo 
argumentativo ou decisional por meio do qual o raciocínio por contra-analogias se 
manifesta; a distinção em sentido estrito refere-se ao resultado do processo 
argumentativo, quando se chega a efetivamente diferenciar dois casos ou duas situações, 
afastando-se a aplicação de determinado precedente.21 
A estruturação pela doutrina e jurisprudência pátrias de técnicas de distinção 
(distinguishing) a partir do CPC/2015 impõe-se como decorrência lógica da 
concretização do modelo constitucional de processo no marco da convergência de 
tradições jurídicas (que deve ser lida sob a luz da Constituição e das normas 
fundamentais da nova legislação22) e da utilização do direito jurisprudencial como fonte 
normativa e instrumento para a manutenção de um ordenamento jurídico coerente e 
uniforme, atributos que remontam, em última análise, à integridade do Estado como 
garantidor de um sistema jurídico único, pois apenas assim será possível conciliar a 
dimensão subjetiva de cada caso com a dimensão objetiva do direito que se pretende 
aplicar. 
Com isso não se quer dizer que o direito jurisprudencial, ao cumprir o seu papel 
de unificação do Direito como um todo, torne o sistema excessivamente rígido e 
 
20 DERZI, Misabel de Abreu Machado. BUSTAMATE. Thomas da Rosa de. O efeito vinculante e o 
princípio da motivação das decisões judiciais: em que sentido pode haver precedentes vinculantes no 
direito brasileiro? In Novas Tendências do Processo Civil – Estudos sobre o projeto do novo Código de 
Processo Civil. Editora JusPodivm: Salvador, 2013, p. 353. 
21 MACÊDO, Lucas Buril. Op. cit., p. 356. 
22 THEODORO JR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre; PEDRON, Flávio. Novo Código de 
Processo Civil: Fundamentos e sistematização. cit. 
engessado. Rupturas (departures) são autorizadas, mas devem ser especialmente 
fundamentadas e em harmonia com a concepção de integridade do Direito, pois, como 
aprendemos em Dworkin: 
 
o direito é estruturado por um conjunto coerente de princípios sobre a 
justiça, a equidade e o devido processo legal, e pede-lhes que os 
apliquem nos novos casos que se lhes apresentem, de tal modo que a 
situação de cada pessoa seja justa e equitativa segundo as mesmas 
normas.23 
 
Mesmo em sistemas jurídicos que não estejam sustentados firmemente sobre o 
precedente (e o Brasil já caminha há bom tempo no sentido de fortalecimento de seu 
direito jurisprudencial), sua importância deve ser reconhecida, na medida em que “uma 
aplicação integrativa e coerente do direito deve, necessariamente, levar em conta o 
modo pelo qual determinado tribunal ou como os outros tribunais do país vêm 
decidindo determinada matéria”24. 
O distinguishing qualifica-se como uma das modalidades de rupturas 
(departures), e tanto maior será sua importância (e necessidade) no ordenamento 
jurídico de determinado país quanto maior for a autoridade conferida ao direito 
jurisprudencial; caso contrário, menor será o espaço normativo em que poderão transitar 
os sujeitos processuais na construção da resposta correta a ser dada ao caso em exame. 
Inclusive, durante o maior período de rigidez do direito inglês (1898-1966), 
quando nenhum tribunal, nem mesmo a House of Lords, estava autorizado a superar 
(overrule) os precedentes já estabelecidos, a técnica da distinção (distinguishing) era de 
extrema importância para o abrandamento daquela rigidez, temperando o elevado grau 
de força do stare decisis e limitando a aplicação de precedentes considerados 
inadequados, ultrapassados ou injustos. 
É particularmente interessante a capacidade de a exceção confirmar a regra, isto 
é, a autoridade de um precedente sobressai-se mesmo quando o juiz decide não segui-lo 
(desde que seja uma overt departure, isto é, uma ruptura explícita em que se leve em 
consideração o precedente, caso contrário se poderá estar diante de uma decisão per 
incuriam, passível de reforma justamente por não ter respeitado e levado em 
consideração determinado precedente), porque é nesse momentoque recai sobre o ato 
 
23 DWORKIN, Ronald. O império do Direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo, 2ª ed., Martins Fontes: São 
Paulo, 2007, p. 291. 
24 STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. 5ª ed., 
rev., mod., ampl., Saraiva: São Paulo, 2014, p. 376. 
decisório o ônus argumentativo de romper com o precedente estabelecido – quanto 
maior for sua autoridade, maior será o ônus argumentativo, cujo grau de 
desincumbência é inversamente proporcional ao nível de reprovação que recai sobre a 
decisão (e também sobre o juiz). 
Mais do que isso, ao se afastar de determinado precedente por ocasião de 
eventual distinção, não se está a questionar sua validade, eficácia, legitimidade ou a 
hierarquia do tribunal que o formou, mas apenas a afirmar que se trata de direito 
não aplicável à espécie. Até mesmo por isso é que, diferentemente do overruling, a 
distinção (distinguishing) pode ser realizada independentemente do nível hierárquico 
dos órgãos prolatores da decisão e do precedente.25 
No entanto, o distinguishing não pode ser usado de forma inconsistente. Nos 
países de common law não é incomum (o que não isenta de reprovação) os magistrados 
forçarem o distinguishing para se afastarem de determinado precedente 
reconhecidamente ruim (bad law) mas que, pela autoridade e hierarquia que ostenta, não 
pode ser overruled (revogado) ou afastado de outra forma. Trata-se de uma prática 
arbitrária que deteriora paulatinamente a força do precedente, quando o caminho correto 
seria a promoção do overruling. Caso o órgão julgador do caso em análise não detenha 
poderes para tanto, é recomendável que o precedente seja aplicado e que se faça constar 
da fundamentação decisória as razões pelas quais tal precedente seria inadequado, ou 
que se registre eventual ressalva de entendimento.26 
O importante é que, com a aplicação do precedente, a parte que se sentir 
prejudicada terá acesso à via recursal, que constitui o local adequado para ser 
estabelecido o debate processual acerca da pertinência de se promover, ou não, o 
overruling. Desse modo, não serão gerados padrões de diferenciação inconsistentes (o 
que poderia, a longo prazo, comprometer a legitimidade e a credibilidade da técnica, 
que passaria a ser vista com suspeita, diminuindo a sua força argumentativa e 
 
25 Nesse sentido, confira-se o Enunciado nº 174 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “a 
realização da distinção compete a qualquer órgão jurisdicional, independentemente da origem do 
precedente invocado”. 
26 Pontue-se que, segundo Resolução 106, de 06.04.2010, que dispõe sobre os critérios objetivos para 
aferição do merecimento para promoção de magistrados e acesso aos Tribunais de 2º grau, é levada em 
consideração a técnica decisória de ressalva, em termos: “Art. 10. Na avaliação do merecimento não serão 
utilizados critérios que venham atentar contra a independência funcional e a liberdade de convencimento 
do magistrado, tais como índices de reforma de decisões. Parágrafo único. A disciplina judiciária do 
magistrado, aplicando a jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais 
Superiores, com registro de eventual ressalva de entendimento, constitui elemento a ser valorizado para 
efeito de merecimento, nos termos do princípio da responsabilidade institucional, insculpido no Código 
Ibero-Americano de Ética Judicial (2006).” 
normativa) e os precedentes incorretos serão revogados da forma constitucional e 
processualmente adequada. 
 
4.1. Distinguishing within a case e distinguishing between cases 
 
Da aplicação do distinguishing podem resultar duas consequências: ou se cria 
uma exceção à regra jurisprudencial estabelecida, reduzindo o seu campo de incidência, 
ou se limita a aplicação dessa regra em razão da existência de especificidades (que 
podem ser até mesmo contextuais) que desautorizam o mesmo tratamento jurisdicional 
do caso precedente ao caso presente. 
A primeira etapa para a aplicação do distinguishing é o descobrimento do que 
restou decidido no precedente, o que remonta à discussão (tão cara ao common law) do 
que constitui a ratio decidendi. 
Descobrir a ratio de um precedente constitui, em essência, tarefa de reconstrução 
do passado e de atribuição de sentido normativo ao texto (à decisão ou ao enunciado 
sumular, considerados os precedentes que lhe deram origem), a fim de se definir qual é 
a norma jurisprudencial cuja aplicabilidade ao caso presente será discutida na etapa 
posterior. Essa tarefa apenas pode ser realizada pelos sujeitos processuais, caso a caso, e 
em contraditório (lembrando que o contraditório, segundo se defende, deve ser lido à 
luz da teoria normativa da comparticipação e do policentrismo processuais).27 
Trata-se do que Neil Duxbury chama de distinguishing within a case 
(distinguindo no caso precedente), que consiste em separar os fatos do precedente que 
são materialmente relevantes daqueles que são irrelevantes, pois é a partir dessa 
distinção que a norma jurisprudencial será definida.28 A questão se resume ao 
questionamento do que vale (ou deve valer) como um precedente. 
Edward Levi ensina que a “forma básica do raciocínio jurídico é o raciocínio 
por exemplos”; trata-se de um raciocínio de caso a caso que constitui “um processo de 
três etapas, descrito pela doutrina do precedente, em que uma preposição descritiva do 
 
27 THEODORO JR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre; PEDRON, Flávio. Novo Código de 
Processo Civil: Fundamentos e sistematização. cit. NUNES, Dierle. Processo jurisdicional democrático. 
Op. cit. 
28 DUXBURY, Neil. The nature and authority of precedent. Cambrigde University Press, 2008, p. 113. 
primeiro caso é transformada em uma regra de direito e, então, aplicada a uma situação 
similar posterior”.29 
Os precedentes são constituídos de (assim como a lei) textos abertos à 
interpretação e dotados de autoridade. Incumbe ao aplicador do Direito interpretá-lo e 
extrair-lhe o elemento dotado de força normativa, que pode ter diferentes graus, desde o 
mais forte, em que a norma é vinculante, salvo razões que recomendam o seu 
afastamento por ser distinguível do caso presente, ou mesmo superável pela via do 
overruling, até o mais fraco, quando o precedente terá força meramente ilustrativa – e 
quanto mais forte o elemento normativo for, mais relevantes se tornam as rupturas, tanto 
pelo distinguishing como pelo overruling, e mais se exigirá do magistrado ao 
fundamentar a sua decisão de seguir, ou não, o precedente. 
De acordo com Thomas Bustamante, a multiplicidade de significados que 
parcela da doutrina atribui à ratio decidendi parte do equivocado pressuposto de que 
existe apenas uma ratio decidendi em cada decisão, e que todo o restante seria 
dispensável.30 Segundo o citado autor: 
 
é nas razões que os juízes dão para justificar suas decisões que devem 
ser buscados os precedentes, e a ausência dessas razões ou a sua 
superação por outros argumentos mais fortes compromete sua 
aplicação. As normas extraídas dos precedentes judiciais devem, 
todas, ser enunciadas sob a forma de enunciados universais do tipo 
‘sempre que se verifiquem os fatos operativos (OF), então devem se 
aplicar as consequências normativas (NC)’.31 
 
Esta forma de perceber o precedente também pode ser encontrada em Geoffrey 
Marshall, segundo o qual “a ratio talvez deva ser considerada um conceito 
essencialmente controvertido, porque ele não é puramente descritivo mas também 
 
29 LEVI, Edward H. An introduction to legal reasoning. The University of Chicago:Chicago, 1949, p. 1-
2. 
30 BUSTAMANTE, Thomas. BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Teoria do precedente judicial: a 
justificação e a aplicação de regras jurisprudenciais. Editora Noeses: São Paulo, 2012, p. 271-272. Há 
dois exemplos em que fica claro o acerto da posição do autor: (I) na fundamentação, o magistrado 
anuncia uma regra geral e uma exceção, sendo o caso resolvida por meio da aplicação da exceção; (II) 
distinguindo entre regra geral e exceção, o caso, agora, é resolvido com a aplicação da regra geral. Não se 
poderia dizer que, no primeiro caso, a regra geral seria obiter dictum, ou que, no segundo, a exceção 
também seria obiter dictum. Da mesma forma, o autor afirma que há decisões despidas de discoverable 
ratio e que, por isso, carecem de vinculatividade. Seria o caso, por exemplo, de, em um julgamento 
colegiado, haver convergência de votos com relação à parte dispositiva mas divergência na 
fundamentação. Nesta situação, pode-se buscar ratios decidendi nos votos isolados de cada magistrado, 
mas não no acórdão como um todo. Embora seja possível sustentar que as ratios decidendi dos votos 
isolados constituem, em si, precedentes, a sua autoridade será menor. Ibidem, p. 272-273. 
31 BUSTAMANTE, Thomas. Op. cit., p. 270. 
valorativo ou normativo [prescriptivo, portanto] em sua força”.32 De modo similar, 
Lenio Streck e Georges Abboud afirmam que a ratio decidendi constitui-se do 
“enunciado jurídico a partir do qual é decidido o caso concreto”, isto é, a “regra jurídica 
utilizada pelo Judiciário para justificar a decisão do caso”, devendo ser, 
necessariamente, analisada à luz da questão fático-jurídica (caso concreto) que ela 
solucionou.33 
Como os autores do presente artigo já haviam sustentado em outra oportunidade: 
 
o caráter normativo da ratio decidendi não exime, portanto, o 
intérprete do precedente de nele selecionar os fatos relevantes a serem 
extraídos para comporem a norma que servirá de ponto de partida para 
casos futuros. O enunciado universal não está pronto e acabado no 
precedente, aguardando que alguém o aplique sem maiores 
dificuldades em um caso análogo. A sua elaboração depende, 
substancialmente, da seleção dos fatos considerados relevantes para o 
deslinde da controvérsia, e isto constitui tarefa dos participantes do 
diálogo processual, que debaterão sobre a aplicabilidade de 
determinado precedente com base naquilo que deve e não deve ser 
considerado relevante, inexistindo fórmula apriorística para resolver 
esta questão.34 
 
Realizada essa distinção entre os fatos relevantes e os irrelevantes do precedente 
para a compreensão de qual é a norma jurisprudencial cuja aplicabilidade será discutida, 
adentra-se na segunda etapa, que, segundo Duxbury, pode ser chamada de 
distinguishing between cases (distinguindo entre casos).35 
Tendo em vista que jamais um caso será igual ao outro, o distinguishing pode ser 
sempre realizado em maior ou menor grau, e, embora necessária, mais importante do 
que a discussão acerca da diferença material entre os fatos do precedente e do caso 
presente é a discussão valorativa acerca desses fatos, isto é, o debate sobre a relevância 
normativa das comparações entre esses fatos e sobre em que medida tais comparações 
são substanciais e podem levar à aplicação da norma jurisprudencial ou à sua rejeição. 
Ao se aplicar o distinguishing, afirma-se que o estabelecimento de uma distinção 
normativa consubstancia uma exceção direta ao precedente, ao passo que uma distinção 
 
32 MARSHALL, Geoffrey. What is binding in a precedent. In Interpreting precedents: a comparative 
study. Edited by D. Neil MacCormick and Robert S. Summers, Aldershot: Ashgate, 1997, p. 512-513. 
33 STRECK, Lenio Luiz. ABBOUD, Georges. O que é isto – o precedente judicial e as súmulas 
vinculantes? 2ª ed., rev., atual., Livraria do Advogado: Porto Alegre, 2014, p. 46. 
34 NUNES, Dierle. HORTA, André Frederico. Precedentes? significados e impossibilidade de aplicação 
self service. Artigo disponível em <http://justificando.com/2014/10/30/precedentes-significados-e-
impossibilidade-de-aplicacao-self-service/>. Acesso em 28 de dezembro de 2014. 
35 DUXBURY, Neil. Op. cit., p. 113. 
fática constitui uma exceção indireta. Embora a consequência de ambas as exceções seja 
a mesma (o afastamento do precedente), o raciocínio implicado na demonstração de 
cada uma delas é diferente, pelo que a classificação da exceção em direta e indireta não 
perde seu sentido prático. 
No primeiro caso (exceção direta), exclui-se do âmbito de aplicação da norma 
jurisprudencial determinado universo de casos que antes por ela estava abrangida, em 
razão de circunstâncias especiais; essa operação é conhecida, na lógica, como redução 
teleológica. No segundo caso (exceção indireta), chega-se à conclusão de que a norma 
jurisprudencial resta inalterada, mas a situação em exame não constitui hipótese de 
incidência da referida norma, de modo que suas consequências não podem ser aplicadas 
(exatamente porque os fatos que nela não estão compreendidos); trata-se de uma forma 
de raciocínio que, por sua vez, é denominada de argumento a contrario.36 
 
4.2. A redução teleológica. 
 
A redução teleológica parte da premissa segundo a qual as normas jurídicas 
(incluídas as jurisprudenciais) são condicionantes superáveis, possuindo exceções 
implícitas cuja descoberta fica a cargo do intérprete. À vista de determinadas razões, 
normalmente movidas por um senso de justiça diante de uma situação específica e 
mediante a introdução de uma cláusula implícita, estabelece-se uma exceção à regra, 
reduzindo o seu campo de aplicação e retirando-lhe o seu caráter definitivo para a 
solução de um caso. 
Assim, se um tribunal decidiu que no caso de Ana vs Beatriz a consequência X 
deveria ser aplicada por ocasião dos fatos A, B e C e os mesmos fatos A, B e C 
ocorreram no caso João vs Henrique, em princípio a consequência X também deveria 
ser atribuída a esse segundo caso. No entanto, se o tribunal, distinguindo ambos os 
casos, concluir que a solução X, encontrada para o primeiro, deve ser aplicada não 
apenas se A, B e C ocorrerem como também o fato adicional D e não havendo D no 
segundo caso (mas apenas no primeiro, cujo elemento normativo antes não havia sido 
formulado de forma a expressar D), então quer dizer que esse último não deverá ser 
regido por X, dada a maior especificidade do primeiro caso e cujo âmbito de aplicação 
 
36 BUSTAMANTE, Thomas. Op. cit., p. 471-473. 
foi reduzido (alguns poderiam sustentar que se trata de aplicação combinada do 
distinguishing com o narrowing37). 
Em síntese, ao acrescentar novas condições necessárias para se chegar a X e 
considerando a interligação entre a norma jurisprudencial de determinado precedente e 
os fatos que lhe deram origem, o tribunal modificou a norma jurisprudencial oriunda do 
primeiro caso. 
Deve-se frisar que tal forma de raciocínio deve ser usada com bastante cuidado, 
pois é censurável a postura do magistrado que, recusando-se a reconhecer a inserção 
de um caso no âmbito de aplicação de determinado precedente, cria, artificialmente, 
uma distinção sem diferença relevante. Trazendo conhecimentos da matemática, 
Maurício Ramires explica que esse tipo de abordagem é o que se denomina de monster-
barring (exclusão do monstro)38, em que se preserva a verdade de algum teorema pela 
força bruta e, “no que respeita à interpretação de precedentes, significa negar a 
existência de um padrão de identificação entre casos sem verdadeira razão para isso”39. 
Há também outra abordagem viciosa, um pouco mais sofisticada, chamada de 
exception-barring (exclusão da exceção)40, em que, embora se reconheçaa 
plausibilidade de um contraexemplo ao teorema, modifica-se a regra de forma ad hoc 
para não se sacrificar o teorema por completo, o que acaba por abalar a confiança no 
 
37 O narrowing consiste em uma técnica menos conhecida na aplicação do direito jurisprudencial. Richard 
M. Re classifica as técnicas utilizadas no raciocínio por precedentes a partir de duas perguntas: 
primeiramente, deve-se indagar se na melhor leitura do precedente em questão ele se aplica ao caso 
presente. Em seguida, deve-se perquirir se a corte aplicou o precedente ao dito caso. Seguir (follow) um 
precedente é aplicá-lo a um determinado caso quando a sua melhor interpretação assim o recomenda; 
restringir (narrow) um precedente significa não aplicar um precedente, embora a sua melhor interpretação 
assim o recomendasse; estender (extend) um precedente consiste em aplicar um precedente mesmo 
quando uma leitura mais conservadora não sugira tal aplicação; e distinguir (distinguish) um precedente 
significa não aplicar um precedente, porque a sua melhor interpretação assim não o recomenda. Há uma 
quinta técnica, que, pela sua especialidade, situa-se fora dessa classificação: trata-se do overruling. O 
mesmo autor ensina que, na utilização do narrowing, a leitura que o intérprete faz de determinado 
precedente reduz o seu campo de incidência. Nesse caso, o precedente permanece no sistema jurídico, 
mas de uma forma alterada, de modo que sua aplicação seja negada a determinados casos (zone of 
application) aos quais deveria originalmente ser aplicado. RE, Richard M. Narrowing Precedent in the 
Supreme Court. Columbia Law Review, 114 Colum. L. Rev. 1861, UCLA School of Law Research Paper 
No. 14-20, 2014, p. 1863 e 1869. 
38 Suponha a proposição de que a soma dos ângulos de qualquer triângulo é 180º. No entanto, alguém 
demonstra que a soma dos ângulos de um triângulo desenhado na superfície de uma esfera é maior do que 
180º. O monster-barrer irá se limitar a afirmar que a regra (mais especificamente a locução de qualquer 
triângulo) não contempla triângulos desenhados sobre a superfície de esferas, e a suposta exceção não 
constitui, em verdade, uma exceção, mas, sim, uma monstruosidade. 
39 RAMIRES, Maurício. Op. cit., p. 132. 
40 Partindo da mesma proposição sobre triângulos, o exception-barrer modificaria o enunciado original, 
cuja redação passaria a ser a soma dos ângulos de qualquer triângulo que não é desenhado na superfície 
de uma esfera é 180º. 
teorema original, porque não se sabe se, no futuro, outras modificações serão 
formuladas. 
No contexto jurídico, Ramires fornece um elucidativo exemplo dessa forma 
viciosa de raciocínio, extraído do Judiciário norte-americano. No caso Oregon vs Smith, 
julgado pela Suprema Corte, o Estado de Oregon havia negado o seguro desemprego a 
dois americanos nativos, pois tinham sido demitidos por usarem peiote, uma droga 
alucinógena proibida, embora historicamente utilizada por povos nativos em seus rituais 
tradicionais. Um desses americanos, Smith, com amparo na 1ª Emenda à Constituição, 
alegou que a negativa do seguro desemprego violava sua liberdade religiosa, o que foi 
rejeitado pelo Justice Scalia, ao fundamento de que a Suprema Corte nunca havia 
decidido que as crenças religiosas de um indivíduo o eximissem de obedecer à lei. 
No entanto, a Corte já havia, sim, estabelecido uma série de precedentes sobre a 
matéria, como no caso West Virginia Board of Education vs Barnette, quando se decidiu 
que crianças testemunhas de Jeová não poderiam ser obrigadas a saudar a bandeira dos 
Estados Unidos da América em escolas públicas, ou como no caso Sherbert vs Verner, 
em que se determinou que não se poderia negar o seguro-desemprego a uma mulher 
adventista demitida por se recusar a trabalhar aos sábados. 
Ocorre que o Justice Scalia não ignorou os precedentes estabelecidos, mas 
entendeu que em todos eles a liberdade religiosa estava conjugada com outras proteções 
constitucionais, como o direito de os pais determinarem a educação dos próprios filhos. 
A solução adotada foi, então, alterar o precedente, incluindo-lhe uma nova (e 
questionável) condicionante, pela qual o indivíduo não teria de seguir uma obrigação 
legal que se contrapusesse às suas convicções religiosas, desde que essa liberdade viesse 
secundada por outra garantia constitucional41. 
A lição que se pode tirar desse exemplo é que a redução teleológica não deve ser 
empreendida de forma leviana. Para se evitar os tipos de abordagem de que se deu 
notícia, em que o intérprete cria distinções de forma artificial, devem ser buscados 
parâmetros normativos que limitem a redução teleológica, a fim de que não seja 
utilizada de forma discriminatória. Postura diversa negaria a própria premissa 
comparticipativa do CPC/2015 que desautoriza a adoção de um privilégio cognitivo ao 
aplicador-juiz. 
 
41 RAMIRES, Maurício. Op. cit. P. 133-134. 
É necessário, portanto, que as distinções realizadas na redução teleológica sejam 
consistentes à luz do princípio da igualdade, uma vez que, por via do princípio em 
questão, “o que a ordem jurídica pretende firmar é a impossibilidade de desequiparações 
fortuitas ou injustificadas”42, devendo-se perquirir acerca do elemento tido como 
discriminatório, para, em seguida, analisar se é racionalmente justificável o tratamento 
desigual à luz do elemento discriminatório adotado e, enfim, indagar se essa 
justificativa guarda harmonia, ou não, com a Constituição43 em conformidade com o 
debate processual, em contraditório.44 
 
4.3. O argumento a contrario. 
 
No argumento a contrario, por sua vez, conclui-se que os fatos do caso presente 
não se encontram inseridos no campo de aplicação da norma do caso precedente com 
relação ao qual se pretende promover o distinguishing, isto é, a conclusão a contrario se 
impõe quando se verifica que o caso presente não constitui hipótese de incidência do 
precedente, cujas consequências restarão inaplicadas (se a norma N se aplica a X e a 
apenas X, então N não se aplica a Y). 
Em última instância, a ideia por detrás desse tipo de argumento – e que justifica 
seu nome – é a de que afirmar algo sobre determinada coisa pode ser interpretado como 
dizer o contrário de outra coisa. Assim, caso se decida que determinada norma não se 
aplica a uma situação nela não prevista, é possível se inferir que a situação nela não 
prevista é distinta da situação prevista na norma, o que poderá ser demonstrado à luz de 
argumentos interpretativos e de comparações.45 
Para o sucesso desse tipo de raciocínio, deve-se presumir o caráter relativamente 
fechado do ordenamento jurídico (a falta de menção a determinado fato nas regras 
jurídicas não representa falta de regulação desse mesmo fato) e se partir da premissa da 
ausência de condições suficientes alternativas para a conclusão negada pelo argumento 
a contrario. 
 
42 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O Conteúdo jurídico do princípio da Igualdade. 3ª edição, 
atualizada, Malheiros: São Paulo, 2009, p. 18. 
43 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 21-22. 
44 Que explicaremos em breve em outra sede. 
45 JANSEN, Henrike. In view of an express regulation: Considering the scope and soundness of a 
contrario reasoning. Informal Logic, Vol 28, Nº 1, 2008, p. 50. 
Com Thomas Bustamante aprendemos duas formas de reconstrução do 
argumento a contrario a fim de verificar a sua correção lógica: uma simples e outra 
complexa. 
A forma simples parte da análise do significado dos conectores dos pressupostos 
de fato às consequências jurídicas que lhe são atribuídas, isto é, deve-se examinar qual é 
o tipo de relaçãose-então, que pode ser de três espécies: (1) implicação material ou 
extensiva, em que as hipóteses são meramente suficientes para as consequências; (2) 
replicação ou implicação intensiva, na qual a relação da hipótese é necessária para sua 
consequência; e (3) equivalência ou implicação recíproca, quando a hipótese é 
necessária e suficiente para a consequência. Fora de (2) e de (3), isto é, quando se tratar 
de uma implicação material ou extensiva, o argumento a contrario não terá utilidade e 
será mero sofisma.46 
Bustamante, com apoio em Klug, desenvolve uma fórmula para descrever o 
argumento a contrario nas duas situações em que é útil. No caso em que as 
consequências jurídicas C somente tenham lugar quando se deem as hipóteses H (isto é, 
se tratar de uma replicação ou implicação intensiva), então as consequências C nunca 
terão lugar quando as hipóteses H não estejam presentes, o mesmo valendo se as 
hipóteses são ao mesmo tempo necessárias e suficientes para as consequências C (o 
caso da equivalência ou implicação recíproca). Embora não se possa dizer que o 
argumento a contrario seja interpretativo em si mesmo, ele depende da interpretação, 
especialmente quando se analisa a relevância do conector e se a relação é de suficiência, 
de necessidade, ou de ambas.47 
Ao se aplicar o argumento a contrario, vale o mesmo alerta feito para a redução 
teleológica: toda diferença é uma questão de critério, mas o raciocínio não pode se 
perder em critérios artificiais, que configurarão error in procedendo ou in judicando, 
passível de correção mediante interposição de recurso. 
A segunda forma do argumento a contrario é dita complexa ou contextual pois, 
diferentemente da forma mais simples (que tem por base apenas uma norma), refere-se à 
relação entre as normas gerais e específicas de um ordenamento jurídico.48 Nesse caso, 
a ausência de regulação de uma situação fática em determinado precedente implica, 
necessariamente, a aplicação de outra norma jurídica, mais geral e capaz de reger um 
 
46 BUSTAMANTE. Thomas da Rosa de. Op. cit., p. 488-494. 
47 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Op. cit., p. 494-495. 
48 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Op. cit., p. 495-497. 
número maior de situações. Vale dizer, “o uso do argumento a contrario para distinguir 
um caso C de um precedente judicial P significa [...] a afirmação de uma regra geral 
segundo a qual os casos não previstos em P serão regulados de forma distinta”49. 
Um exemplo hipotético pode ajudar na compreensão: suponha-se uma norma 
jurídica N1, que estabeleça o amplo acesso ao Poder Judiciário em caso de lesão, ou 
ameaça de lesão, a direito; suponha-se também uma norma N2, segundo a qual inexiste 
interesse de agir quando a parte, valendo-se da via jurisdicional, formula pedido em face 
da administração pública com relação ao qual o órgão administrativo competente não 
tenha se negado a concedê-lo na via própria. Se a parte demonstrar que, a despeito de ter 
formulado o pedido na via administrativa, esgotando todos os atos que poderia praticar 
no sentido de satisfazer o seu interesse, a administração pública quedou-se inerte, é de 
se aplicar a norma N1 (a regra geral de acesso à justiça, com a outorga, ao final, de uma 
sentença de mérito), porque se conseguiu demonstrar a necessidade da via jurisdicional 
em razão da ineficiência do procedimento administrativo (a omissão do órgão público) e 
da possibilidade de lesão a direito em decorrência dessa inércia. 
 
4.4. Analogias e contra-analogias: síntese. 
 
Embora haja uma importante diferença teórica entre o raciocínio por analogia e 
o argumento a contrario (o primeiro pressupõe lacunas no ordenamento e uma 
pluralidade de alternativas a partir da qual se buscará construir a solução para o caso; o 
segundo parte da premissa de que o ordenamento jurídico é fechado, isto é, de que não 
existem lacunas), há duas questões de ordem prática que (assim como na redução 
teleológica) os aproximam e os tornam tão relevantes para o raciocínio por precedentes. 
A primeira questão reside em que constituem formas de argumentação 
eminentemente comparativas, pois o intérprete deve comparar os elementos essenciais 
do caso precedente (no contexto brasileiro, incluem-se também os casos sumulados e as 
teses estabelecidas pelos tribunais), buscando estabelecer padrões de semelhanças ou 
distinções; a segunda questão (que se relaciona com a primeira) consubstancia-se na 
exigência de que o intérprete proceda a um cuidadoso juízo de adequabilidade de 
princípios, pois, como explica Bustamante com amparo em Bankowski, “a solução de 
um caso em que se cogita da analogia está no estabelecimento de ponderações para o 
 
49 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Op. cit., p. 502. 
fim de justificar ou dispensar analogias e diferenciações (disanalogies)”, sendo que “a 
noção de identidade (sameness) invoca um juízo sobre a qualidade das semelhanças 
entre casos concretos, e isso só pode ser aferido por meio dos princípios fundamentais 
do Direito” – aliás, a própria escolha entre a analogia e o argumento a contrario deve 
ser motivada em razões fortes o suficiente para que uma ou outra forma de raciocínio 
seja adotada.50 
A afirmação de que cada caso é um caso, apesar de não estar incorreta, não pode 
obscurecer uma outra verdade, segundo a qual a cada experiência sentida (e o 
precedente não deixa de ser um determinado tipo de experiência) diminui-se o grau de 
imprevisibilidade, pois o sujeito que experimenta ganha um novo horizonte dentro de 
algo que para ele pode tornar-se uma nova experiência. 
A lição, extraída da filosofia gadameriana, transmite a ideia de que a atividade 
interpretativa não parte de um grau zero, pois o horizonte do intérprete já é possuidor de 
algum sentido (até por isso não se pode falar em caso absolutamente novo). Por isso se 
diz que o precedente diminui o imprevisível e acrescenta algo à experiência 
jurídica, estabelecendo uma força gravitacional (Dworkin) que pode vir a 
influenciar o julgamento de outros casos. 
Assim, se cada precedente, ainda que seja o primeiro de sua linha, é decidido 
com base em argumentos de princípios (o Direito rejeita casuísmos), ao se raciocinar 
por precedentes e estabelecer padrões por meio de analogias e contra-analogias, dever-
se-á verificar se os mesmos princípios presentes na individualidade do caso passado 
encontram-se presentes no caso em exame, e isto constitui o núcleo da aplicabilidade do 
direito jurisprudencial.51 
 
 
5. O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: O QUE ESPERAR? 
 
 Para utilizarmos a expressão de Lenio Streck52, o art. 926 do CPC/2015 constitui 
a chave de leitura do direito jurisprudencial no Brasil. O citado dispositivo estabelece 
que “os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e 
 
50 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Op. cit., p. 535. 
51 RAMIRES, Maurício. Op. cit., p. 76-77. 
52 STRECK, Lenio. Novo CPC terá mecanismos para combater decisionismos e arbitrariedades? Artigo 
publicado em 18 de dezembro de 2014, no sítio eletrônico Consultor Jurídico: 
<http://www.conjur.com.br/2014-dez-18/senso-incomum-cpc-mecanismos-combater-decisionismos-
arbitrariedades#_ftnref>. 
coerente”. Até o substitutivo da Câmara dos Deputados, a redação do dispositivo 
contemplava apenas a estabilidade da jurisprudência (tal como o CPC/1973 já o fazia), 
não mencionando a integridade e a coerência. 
Enquanto o primeiro atributo é autorreferente e, sem maiores compromissos com 
o contexto do todo da prática jurídica ou com o sistema de princípios inaugurado pela 
Constituição, dizapenas com os julgados passados e com a manutenção de uma 
linearidade e uniformidade decisória, os dois últimos – que devem ser compreendidos à 
luz da filosofia dworkiana – guardam um “substrato ético-político para sua 
concretização”53, pois promovem “a união da vida moral e política dos cidadãos”54. 
 Com efeito, a integridade exige uma coerência de princípios e insiste em que: 
 
o direito – os direitos e deveres que decorrem de decisões coletivas 
tomadas no passado e que, por esse motivo, permitem ou exigem a 
coerção – contém não apenas o limitado conteúdo explícito dessas 
decisões, mas também, num sentido mais vasto, o sistema de 
princípios necessários a sua justificativa.55 
 
 A integridade e a coerência consubstanciam, então, atributos dotados de 
consciência histórica, uma vez que “esse sistema de princípios deve justificar tanto o 
status quanto o conteúdo dessas decisões anteriores”56. 
 Decidir à luz da integridade e coerência representa muito mais do que 
garantir a estabilidade. Jurisprudência meramente estável é uma jurisprudência 
que se basta e, embora se decida de acordo com o que já se decidiu, não há 
preocupação em se decidir conforme a Constituição, seus princípios, a legalidade, 
ou mesmo em harmonia com o que os outros juízes e tribunais vêm decidindo. É 
possível decidir reiteradamente em um sentido equivocado, injusto, que viole o Direito, 
e, ainda assim, afirmar que se está dando cumprimento à ideia de estabilidade, pois o 
referencial é tão somente o sujeito (solipsista), e não a comunidade (de princípios). 
 Por sua vez, decidir de forma coerente é decidir para e no sistema jurídico e 
nos princípios que o definem (não basta apenas respeitar o que se decidiu 
anteriormente – isto é ser estável –; é preciso ser coerente com o contexto histórico e 
jurídico em que se está inserido), e decidir de forma íntegra é identificar direitos e 
 
53 STRECK, Lenio. Por que agora dá para apostar no projeto do novo CPC! Artigo publicado em 21 de 
outubro de 2013, no sítio eletrônico Consultor Jurídico: <http://www.conjur.com.br/2013-out-21/lenio-
streck-agora-apostar-projeto-cpc>. 
54 DWORKIN, Ronald. Op. cit., p. 230. 
55 DWORKIN, Ronald. Op. cit., p. 273. 
56 DWORKIN, Ronald. Op. cit., p. 274. 
deveres “a partir do pressuposto de que foram criados por um único autor – a 
comunidade personificada –, expressando uma concepção coerente de justiça e 
equidade”57. Ainda segundo o filósofo norte-americano, o direito como integridade 
exige que: 
 
um juiz ponha à prova sua interpretação de qualquer parte da vasta 
rede de estruturas e decisões políticas de sua comunidade”, devendo-
se perguntar “se ela poderia fazer parte de uma teoria coerente que 
justificasse essa rede como um todo.58 
 
Na leitura que Streck faz de Dworkin: 
 
a integridade exige que os juízes construam seus argumentos de forma 
integrada ao conjunto do direito. Trata-se de uma garantia contra arbi-
trariedades interpretativas. A integridade limita a ação dos juízes; mais 
do que isso, coloca efetivos freios, através dessas comunidades de 
princípios, às atitudes solipsistas-voluntaristas. A integridade é uma 
forma de virtude política. A integridade significa rechaçar a tentação 
da arbitrariedade59. 
 
Sobre esse papel de manutenção da integridade jurídica que o precedente 
desempenha em determinada comunidade, Ramires sustenta que há duas coisas que o 
juiz contemporâneo não pode fazer: a primeira, desconhecer o todo das práticas e 
decisões, escrevendo (para utilizar a linguagem metafórica do romance em cadeia) o seu 
“capítulo” como se tivesse total discricionariedade; a segunda, copiar o capítulo 
antecedente, o que representaria uma quebra de continuidade – a integridade, portanto, 
representa um ônus adicional no exercício da atividade jurisdicional. 
Assim, há certas condições constituintes desse ônus para que a integridade e a 
coerência sejam preservadas: a pesquisa por precedentes não deve estar viciada 
(vedação ao confirmation bias60); essa pesquisa deve levar em consideração o todo, não 
 
57 DWORKIN, Ronald. Op. cit., p. 271-272. 
58 DWORKIN, Ronald. Op. cit., p. 294. 
59 STRECK, Lenio. Por que agora dá para apostar no projeto do novo CPC!, op. cit. 
60 Sobre essa propensão que contamina o raciocínio do intérprete, vale a pena conferir o artigo escrito em 
outra sede por um dos autores do presente trabalho em coautoria com Alexandre Bahia. Segundo se 
demonstra, o juiz que adota uma postura de confirmation bias tem o seu raciocínio distorcido, “de uso e 
confirmação de todo material (v.g. provas, julgados) que atesta uma versão dos fatos (que acredita) e 
negligencia e desprezo a tudo que a contradiz”. NUNES, Dierle. BAHIA, Alexandre. Processo e 
República: uma relação necessária. Artigo publicado no seguinte link: 
http://justificando.com/2014/10/09/processo-e-republica-uma-relacao-necessaria. Acesso em 18 de 
fevereiro de 2015. Confira-se, ainda, o seguinte trecho, extraído do artigo citado: “Estudos empíricos 
(psicológicos e jurídicos), realizados com magistrados americanos, demonstram que o juiz sofre 
propensões cognitivas que o induzem a usar atalhos para ajudá-lo a lidar com a pressão da incerteza e do 
devendo ser fragmentária; não se deve esquecer de questionar as especificidades do caso 
presente e do caso que deu origem ao precedente em análise; e a utilização de 
precedentes não deve substituir um estudo sincero e aprofundado da doutrina e da 
evolução das práticas judiciais.61 
Na manutenção da estabilidade, integridade e coerência da jurisprudência (art. 
927), os juízes e tribunais deverão observar “as decisões do Supremo Tribunal Federal 
em controle concentrado de constitucionalidade” (inc. I); “os enunciados de súmula 
vinculante” (inc. II); “os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de 
resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e 
especial repetitivos” (inc. III); “os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal 
Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria 
infraconstitucional” (inc. IV); “a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais 
estiverem vinculados” (inc. V). 
Esse rol não é exaustivo, não excluindo, portanto, que as premissas estabelecidas 
no art. 926 sejam buscadas em outros tipos de decisão, desde que eles exprimam 
princípios úteis ao desenvolvimento do raciocínio jurídico em outros casos, uma vez 
que o raciocínio por precedentes é sempre relevante quando a decisão passada tiver 
aptidão para constituir indício formal da viabilidade de determinada interpretação do 
Direito – o que, por certo, não se limita ao disposto nos incisos do art. 927. 
O art. 926 do CPC funciona, portanto, como uma linha mestra para a formação, 
aplicação e o desenvolvimento do direito jurisprudencial no Brasil, cujas técnicas de 
aplicação, de distinção e de superação devem partir das premissas nele estabelecidas – a 
estabilidade, a integridade e a coerência. 
Embora o dispositivo se refira apenas aos tribunais, os magistrados de primeira 
instância encontram-se igualmente jungidos a ditas premissas, devendo zelar para que 
 
tempo inerentes ao processo judicial. É evidenciado que mesmo sendo experiente e bem treinado, sua 
vulnerabilidade a uma ilusão cognitiva no julgamento solitário influencia sua atuação. Um exemplo 
singelo encontrado nas pesquisas, que aclara esta situação, é a propensão do magistrado que indefere uma 
liminar a julgar, ao final, improcedente o pedido. Por um efeito de bloqueio ficou demonstrado que

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