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UNIDADE 1 – ÉTICA E RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL AULA 2 – Valores e Reflexões: concebido, percebido e vivido / Ética e Responsabilidade Socioambiental Solidariedade orgânica e mecânica De acordo com Regina Moraes (2014), falar sobre ética e responsabilidade social em épocas de capitalismo chamado selvagem, requer que analisemos os fatos a partir de uma percepção de conjunto. E neste ponto surge o conceito de solidariedade orgânica, que simboliza que todos nós estamos comprometidos ou associados na extensa divisão social do trabalho, ao redor do mundo. Por exemplo: Eu não planto café, nem transporto o café para o mercado, nem trabalho no mercado, mas todos os dias tomo café, cujo pó alguém comprou para me servir o café, seja no trabalho ou em casa. Este é um pequeno exemplo, mas imagine toda a solidariedade orgânica que envolve o mundo. Dependemos uns dos outros, nesta cadeia produtiva sem fim, ao redor do planeta. O sociólogo Émile Durkheim estudou a solidariedade orgânica e a divisão do trabalho ligadas a esta solidariedade. Em suas pesquisas verificou que a modernidade nos trouxe uma indústria com muitas tecnologias, o que permitiu que o trabalho se dividisse ao longo de uma cadeia produtiva, que se perde de vista através das redes e fronteiras. Criou-se a terceirização, quarteirização e os trabalhadores perderam os sentidos do que estão fazendo nesta cadeia produtiva tão complexa, gerando o que Durkheim chama de anomia, ou seja, um trabalho sem o sentido de enriquecer a identidade da pessoa, um trabalho que se funda no lucro. Mas tudo isto não deve ser estudado como uma caça às bruxas, não existem culpas, mas uma cultura capitalista, muitas vezes irresponsável e antiética que se dissemina ao redor do planeta. Convém, neste momento, que cada um de nós faça uma reflexão sobre nossos próprios atos. A vida cotidiana é demarcada pela vida em grupo. Estamos o tempo todo nos relacionando com outras pessoas. Mesmo quando ficamos sozinhos, a referência de nossos devaneios são os outros: pensamos em nossos amigos, na próxima atividade – que pode ser assistir à aula de inglês ou realizar nova tarefa no trabalho (que, provavelmente, envolverá mais de uma pessoa); pensamos no nosso namoro, em nossa família. Raramente encontraremos uma pessoa que viva completamente isolada, mesmo o mais asceta dos eremitas levará, para o exílio voluntário, suas lembranças, seu conhecimento, sua cultura. Talvez seja por isso que nossas vidas encontram sempre certa regularidade, que é necessária para a vida em grupo. As pessoas vivem, em nossa sociedade, em campos institucionalizados. Geralmente moram com suas famílias, vão à escola, ao emprego, à igreja, ao clube; convivem com grupos informais, como o grupo de amigos da rua, do bar, do centro acadêmico ou grêmio estudantil etc. Em alguns casos, a institucionalização nos obriga a conviver com pessoas que não escolhemos. Quando conhecemos nossa primeira classe no ensino médio ou na universidade, descobrimos que vamos conviver com um grupo de 20, 30 ou 40 pessoas com as quais – como geralmente acontece – não tínhamos nenhum contato. A essa forma de convívio que independe da nossa escolha chamamos solidariedade mecânica. A afiliação a um grupo independe da nossa vontade no que diz respeito à escolha de seus integrantes. A solidariedade orgânica é a forma de convívio na qual nos afiliamos a um grupo porque escolhemos nossos pares. É o caso do grupo de amigos que se reúne nos finais de semana para jogar futebol ou que decide formar uma banda. A afinidade pessoal é levada em consideração para a escolha do grupo. Nos grupos em que predomina a solidariedade mecânica, geralmente formam-se subgrupos que se caracterizam pela solidariedade orgânica, como é o caso das “panelinhas” em sala de aula ou do grupo de amigos em uma fábrica ou um escritório. Os valores morais de uma cultura não são naturais, apesar de assim parecerem para muitos. Eles são construídos. Os valores morais são aqueles que regulam a convivência dos integrantes de uma cultura, estejam eles codificados em seus grandes livros ou fazendo parte de seu senso comum. A ética é a disciplina que reflete sobre os caminhos e os descaminhos dos valores da nossa cultura. Vivemos hoje uma sociedade de moral individualista, onde a competição é a palavra de ordem e onde o culto ao sucesso pessoal se tornou um valor máximo. Contudo, para não ficarmos paralisados num pessimismo fatalista, é bom lembrarmos de exemplos muito relevantes na contramão dessa tendência. Afinal, ao lado do imenso individualismo incentivado hoje em nossa cultura, registra-se também o desenvolvimento de resistências a essa cultura, que tomam a forma de grupos comunitários reunidos em prol da qualidade social da vida e da luta por direitos continuamente desrespeitados. O processo de conscientização em torno da necessidade desses valores de cooperação não se completa antes da ação: ele ganha corpo durante as ações comunitárias desenvolvidas, ou seja, à medida que estas são concretamente vivenciadas pelo grupo e refletidas por seus integrantes, através de uma atitude dialógica. A reflexão que move os integrantes de tais grupos surge da prática, devendo retornar a ela sempre para que o discurso de intervenção não se torne engessado em torno de uma visão desligada dos obstáculos e dos impasses que continuarem a ser registrados. Obstáculos e impasses não nos deveriam fazer descrer do valor da resistência; devem, sim, alimentar novas reflexões e novas pesquisas da literatura sobre os desafios encontrados.
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