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Abordagens da poética na Antiguidade Clássica

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INSTITUTO DE HUMANIDADES E LETRAS – IHL 
CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS 
 
DISCIPLINA: TEORIA DA LITERATURA II 
PROFESSOR: João Batista Pereira 
PERÍODO: 2013.1 
 
ABORDAGENS DO TEXTO POÉTICO NA ANTIGUIDADE CLÁSSICA 
 
A discussão em torno das bases literárias que alicerçam o estudo dos gêneros data da 
Antiguidade Clássica, notadamente com as leituras filosóficas de Platão e Aristóteles. Relembrar 
os conceitos que embasam as perspectivas platônicas e aristotélicas são importantes porque 
remetem àquilo que inaugura a distinção entre literatura e história ou, ainda, entre poesia e 
História. 
 
Platão e o lugar da poesia 
 
 Por que Platão e Aristóteles, filósofos do Séc. V a.C, têm importância quando se fala em 
texto poético em pleno Séc. XXI? Pensemos que as considerações sobre a arte literária e sua 
relação com a sociedade existem desde o nascimento das primeiras formas de expressão: o 
poema ou narrativa oral, que inauguram uma forma de o homem transfigurar a realidade 
através de uma representação. Sendo a literatura uma forma de ‘ver’ o universo que o circunda, 
ela não pode ser compreendida distanciada do seu contexto de produção. Ela é, portanto, uma 
forma de representação do mundo e do próprio sujeito. É através dessa representação pela 
palavra que se identifica o meio social e, sobretudo, busca-se compreendê-lo. Isso começou a 
ser sistematizado desde a Antiguidade Clássica. 
 Platão (427, a.C), filósofo grego, discípulo de Sócrates, dedicou-se a estudar a 
importância da palavra e formulou uma teoria segundo a qual, a palavra não criava objetos 
‘originais’, mas apenas cópias distintas daquilo que seria a verdadeira realidade, produzindo 
apenas uma ‘imitação’. O que Platão entendia por imitação? Ele considera como genuíno apenas 
o mundo das ideias, ou seja, tudo aquilo que os sentidos nos transmitem são apenas reflexos das 
ideias. Para explicar o sentido de imitação, Platão recorre a três exemplos: Deus, o carpinteiro e 
o pintor. Pensando num objeto como uma cama, no campo das ideias, Deus estaria em primeiro 
plano porque Ele é o criador da ideia da cama, o carpinteiro estaria em segundo porque cria o 
seu produto tendo a ideia como modelo e em terceiro, o pintor que toma como modelo a cama, 
perceptível ao sentido, feita pelo carpinteiro e imita-a em seu quadro. Nessa ordem, o pintor, ou 
o artista, seria inferior ao carpinteiro, pois este fabrica camas de verdade e o carpinteiro, por sua 
vez, inferior a quem criou a ideia eterna da cama, Deus. O poeta, aquele que se utiliza da palavra 
para representar uma ideia, pertenceria à categoria do imitador e não à do artífice ou do criador, 
porque cria um mundo de aparência e não de essência, uma mimese, portanto, no sentido de 
imitação da imitação: 
Este é o ponto crucial da argumentação platônica iniciada em 596 a.C. A 
relação entre conhecimento (cujo objeto é o ser) e poesia não se reduz à mera 
oposição, mas se estabelece hierarquicamente. A questão que se coloca é de 
graus de participação do ser: a “ideia” da coisa, a coisa em particular e a coisa 
particular representada pela pintura e/ou pela poesia são os três graus do ser. 
(...) Sendo assim, as obras dos poetas que têm como matéria não a ideia, mas o 
modo como as coisas se apresentam aos sentidos, estariam no terceiro nível, 
seriam uma “aparência da aparência”, por isso, “apartadas três graus do ser”. 
Sendo assim, do ponto de vista ontológico, os objetos confeccionados pelos 
artesãos têm maior valor do que as obras dos poetas, pois essas últimas 
participam menos do ser, têm menos realidade. (GUINSBURG, 2006, p. 380) 
Veja as principais ideias contidas na obra: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 A República (437.a.C) de Platão é um diálogo 
no qual Sócrates e seus interlocutores tentam 
encontrar, através do processo de argumentação, 
uma definição de justiça em acordo com o projeto 
ético e político, de formação do indivíduo para a 
construção de uma cidade modelo, sendo 
reconstruída a ordem dos guardiões e proposta a 
figura do governante filósofo. É um texto que se 
edifica pelos nexos entre poesia e filosofia, duas 
forças educativas contrapostas, com suas trocas e 
contrariedades. 
 Ao longo do Diálogo, vai se estruturando um 
projeto que visa ao equilíbrio entre os homens na 
sociedade e nos poderes que governam a cidade. Para 
Platão, a edificação de uma cidade perfeita deve-se, 
primordialmente, à figura do governante e, para 
tanto, é preciso que ele passe por um processo de 
formação que o torne apto a defender a cidade. Esse 
processo educativo do jovem que almeja tornar-se 
líder inclui “desde o seu ambiente físico e dons 
naturais até o controle das expressões literárias às 
quais está exposto, a música e a ginástica 
reorientadas para modelar as formas anímicas e 
corporais adequadas ao paradigma da cidade”. 
(FRANCO, 2006, p. 19 – grifos nossos) 
 
Como sabemos, toda a formação do homem grego se dá com base na poesia. É por meio 
da poesia que as crianças são educadas, o conhecimento é transmitido e se formam os futuros 
cidadãos. A poesia era o veículo de divulgação da história que propagava os feitos heroicos, as 
sagas épicas e, principalmente, os mitos. A poesia era a maior ferramenta de propagação do 
saber filosófico ou mesmo das coisas mais simples do cotidiano daquele povo. O mito, difundido 
pela poesia, na concepção de Platão, incutia o medo e o temor no homem, características 
impróprias a um governante, por isso, a preocupação de Platão se dava exatamente pela 
capacidade que a poesia tinha não de formar o cidadão, mas sim de deformá-lo. Platão é 
cuidadoso em não apenas dizer que a filosofia haveria de ocupar a função da poesia, mas tenta 
paulatinamente provar a inutilidade da poesia ou, melhor ainda, que essa produz patologias na 
alma humana: 
Segundo Platão, a poesia causa como que um entorpecimento do raciocínio 
ao afrouxar as armas que a razão fornece (medir, calcular e pesar), 
trazendo á alma uma perturbação interna. Do ponto de vista moral, isso 
tem implicações práticas, pois desvia o homem de uma conduta orientada 
pela razão e o impele, em contrapartida, a agir conforme as inclinações 
sensíveis e passionais. (GUINSBURG, 2006, p. 392) 
 
Por isso a mimese foi depreciada por este filósofo; ela era a imitação da imitação. Como 
não visava à verdadeira essência dos objetos ela é falsa e prejudicial ao discurso ideal. Na 
República, Platão expulsa os poetas porque imitam, artisticamente, o que é percebido na 
realidade. A poesia é negativa porque trabalha com a imitação e, assim sendo, tem o poder de 
desvirtuar as coisas e as pessoas, afetando inclusive o caráter do próprio poeta imitador. Para a 
construção da cidade modelo idealizada por Platão, advoga-se como ponto principal a formação 
pedagógica dos governantes. Seriam os governantes os responsáveis por toda e qualquer 
mudança e melhoria na vida dos gregos, para tanto, deveriam, desde a mais tenra idade, ser 
preparados para isso, possuindo uma formação filosófica, calcada na verdade, o que, segundo 
ele, era exatamente o contrário àquilo que pregava a poesia. A luta de Platão é, portanto, a da 
verdade contra a aparência. A poesia, ao contrário da filosofia, não se compromete com a 
verdade, ilude-se com as aparências e, nesse processo, eleva as piores partes da alma 
colocando-as no governo do homem, lugar que deve ser ocupado pelo que há de melhor, a parte 
racional. Contudo, Platão entende que o lugar da poesia na República deve limitar-se à música e 
aos ditirambos, sem a função pedagógica ou educativa, apenas dedicada ao lúdico e ao prazer. 
“A poesia estraga o espírito dos que a ouvem, se eles não possuírem o remédiodo 
conhecimento da verdade.” (PLATÃO, 2006, p. 595). 
Sabe-se, contudo, que o ataque que Platão faz à poesia, na verdade tem como alvo o 
poeta Homero: 
Este problema converte-se forçosamente num ataque a Homero, entre 
outras coisas, porque todos amam este poeta e, portanto, se 
compreenderá melhor quanto é sério o problema levantado, se o ataque 
incidir sobre ele (...) Mas não é só por se acentuar por isso o paradoxo 
filosófico que Homero é posto como alvo do ataque, mas sim, por outras 
duas razões: Platão enuncia a primeira no início de seu estudo, onde diz 
que Homero é o mestre e o senhor da tragédia. É contra a poesia trágica 
que é dirigida a força principal do ataque, pois é nela que se manifesta mais 
vigoroso o elemento “patético” impulsionador da ação que a poesia exerce 
sobre a alma. A segunda razão é Homero ter de ocupar necessariamente o 
lugar central em qualquer debate sobre as pretensões educativas da poesia. 
(JAEGER, 2003, p.980-981) 
 
 O que Platão desconsidera na poesia é justamente aquilo que a caracteriza, ou seja, o 
poder de despertar a sensibilidade, o sentimento, a imaginação, a comparação e, sobretudo, o 
poder de representar sem a necessidade de fidelidade ao objeto imitado. Para melhor 
compreendermos a crítica que Platão faz à poesia, vamos ler um trecho d’A Odisséia, de 
Homero. 
 
 
 
 
 
 
 
Aristóteles e os gêneros literários 
 
 Discípulo de Platão, Aristóteles (384-322 a.C.), um dos maiores filósofos da Grécia Antiga 
exerce, desde o Séc. IV até os nossos dias, enorme influência nos estudos literários. É de Platão 
que Aristóteles herda a palavra mimese, refutando, contudo, o conceito platônico, para 
enaltecer justamente o valor mimético da arte, frente à verdade preestabelecida. Se Platão 
desmerecia a poesia por seu caráter mimético, imitativo, que desconsiderava a verdade, 
(...) Dito isso, Atena de olhos verde-mar 
rumou para o Olimpo, onde, segundo dizem, 
têm os deuses sua sede segura e eterna; não a 
abalam os ventos, nem jamais se molha de 
chuva nem se avizinha a neve; o céu, ao invés, 
se abre sereno e sem nuvens e uma alva 
claridade a inunda. Deleitam-se ali os deuses 
bem aventurados todos os dias. Lá foi ter a 
deusa de olhos verde-mar, quando acabou de 
falar à donzela. (HOMERO, 2010, p.72) 
 
 
incutindo no homem a sensibilidade, e a possibilidade do mal, Aristóteles defende a poesia 
como uma produção da subjetividade humana, retirando dela a significação de ‘imitação’ do 
mundo exterior para fornecer-lhe ‘possíveis’ interpretações do real através de ações, 
pensamentos e palavras, de experiências existenciais imaginárias. A mimese em Aristóteles 
afasta-se da perfeição e da verdade para afirmar-se como a representação do que ‘poderia ser’, 
assumindo o caráter fabular das criações poéticas. 
 A Poética de Aristóteles representa o primeiro tratado sobre teoria da literatura do 
Ocidente. É o discurso literário que se identifica exemplarmente com a noção de mimese 
poética. Já na Introdução da obra ele se refere à epopeia, ao poema trágico, à comédia e ao 
ditirambo identificando-os “de modo geral, como imitações.” (ARISTÓTELES, 2007, p.19). Das 
três principais caracterizações dos gêneros literários pretendidas por Aristóteles, (o épico, o 
lírico e o dramático) interessa-nos, aqui, mais de perto a poesia. Aristóteles absorve o uso da 
palavra como caminho para elevar a imitação a um novo patamar e prossegue a discussão 
iniciada com Platão a respeito da verdade e da ficção. Afinal, o que vem a ser o real e o ficcional 
na obra de arte? Ele afirma que imitar é ‘natural ao homem desde a infância’ e que, nesse 
processo, não há apenas a reprodução fiel do objeto imitado. Por meio de palavras, entra em 
jogo na arte da imitação a subjetividade e a intencionalidade do artista, sendo, portanto, a 
imitação um processo de recriação e não de reprodução. Aristóteles, ao contrário de Platão, vê 
um valor positivo na mimese. Ele chegava a considerar os historiadores menos sérios do que os 
poetas, porque aqueles se referiam ao particular, enquanto estes ao universal. 
Após essa breve leitura em torno da mimese, chegamos à verossimilhança, conceito útil 
no estudo da teoria literária, com ênfase na teoria do texto poético. Vejamos como Ligia Militz 
da Costa (2003) os apresenta como síntese no quadro abaixo: 
 
 
 
 
 
 
- O conceito aristotélico de mimese não significa mera imitação ou reprodução da “realidade”; 
- a mimese poética (literária) é uma representação que resulta de um processo específico de 
construção a partir de determinadas regras e visando a determinados efeitos; 
- ela compõe-se de elementos estruturais definidos, dos quais o mais importante é o mito. 
- a construção mimética é presidida por um critério fundamental: a verossimilhança; 
-a verossimilhança situa a mimese nas fronteiras ilimitadas do “possível”: 1º) o “possível”, e 
não o verdadeiro, como objeto temático da mimese; 2º) o “possível” lógico, causal e 
necessário, como modo de arranjo interno, solidário das ações do mito; 
- tudo é verossímil ou possível na mimese, até o inverossímil, desde que motivado, isto é, 
simulado como admissível; 
A partir do pensamento aristotélico que, entre outros objetivos, pretendeu um 
recenseamento de regras, com a normatização de modelos com características precisas, e com 
base nessas regras, seria possível aprender a fazer poesia, surgem as teorias do fazer poético 
pós-aristotélicas. Um ponto de partida importante é lembrar que, para Platão, a possibilidade de 
se atingir o mundo das ideias não poderia se dar através da poesia, pois ela apela à imaginação 
e, desse modo, deturpa e desvirtua o próprio poeta, deixando transparecer toda a sua 
fragilidade. Já Aristóteles considerava que a imitação era natural ao ser humano e que, portanto, 
a arte representa uma experiência especial de relação entre o homem e o mundo. Neste 
embate, o pensamento aristotélico vigorou por muito tempo, sobretudo a sua caracterização 
dos gêneros literários, sistematizada mais tarde com a poesia, a epopeia, o poema trágico, a 
comédia e o ditirambo, ressaltando um ponto comum entre eles, qual seja, a imitação. 
O estudo aristotélico sobre os gêneros literários compreende a epopeia e a tragédia 
como a imitação de seres superiores e a comédia como a imitação de pessoas inferiores, tendo a 
comédia um valor artístico diminuído. Apesar de falar sobre música e melodia, Aristóteles não se 
refere ao poema lírico n’A Poética. Sobre a tragédia, afirma que ela 
 
É a representação duma ação grave, de alguma extensão e completa, em 
linguagem exornada, cada parte com o seu atavio adequado, com atores 
agindo, não narrando, a qual, inspirando pena e temor, opera a catarse 
própria dessas emoções. (ARISTÓTELES, 2004, P.24). 
 
Na épica, ressaltavam-se os feitos individuais de um herói, mas esse herói contava 
sempre as histórias de um povo, de uma comunidade, de uma cidade. O poeta nunca falava em 
seu próprio nome, veja como exemplo A Odisseia de Homero. A subjetividade, portanto, era 
desconsiderada como componente artístico, ainda que se encontrem raros poemas que tratem 
de um lirismo amoroso e de uma voz realmente individual, como o caso da poeta Safo de Lesbos 
(séculos VII-VI a.C.), uma mulher aristocrata que nasceu na ilha de Lesbos e dirigia sua poesia, de 
caráter eminentemente amoroso, a outras mulheres. Safo é a primeira mulher a fazer poesia 
importante na história da cultura ocidental. Veja abaixo um fragmento de poema de Safo de 
Lesbos: 
 
 
 
Basta-me ver-te e ficam mudos 
os meus lábios, ata-se 
A minha língua, um fogo sutil 
corre sob a minha pele, 
Tudo escurece ante o meu 
olhar, zunem-me os ouvidos, 
Escorre pormim o suor, 
acometem-me tremuras e fico 
Mais pálida que a palha: dir-se-
ia que estou morta. 
 
 
 
 
Perceba a subjetividade contida nos versos de Safo através da expressividade e da 
utilização vocabular que intenta expor os próprios sentimentos, numa demonstração de 
fragilidade, incoerente com as regras que constituíam a construção da épica e do poema trágico, 
que traduziam o sentimento de um povo, marcado pela coragem, bravura e abnegação de um 
herói que punha a comunidade em primeiro lugar em detrimento aos seus próprios 
sentimentos. 
Apesar de a poesia de Safo e de outros poetas clássicos que primaram pela subjetividade 
e expressividade, o condicionamento às regras de estruturação estética e o privilégio aos 
gêneros épicos e trágicos perdurou ainda por longo tempo, sofrendo uma ruptura somente com 
o advento do Romantismo. A poesia de Safo inaugura um lirismo praticamente ignorado por 
Aristóteles. O gênero lírico, além de estabelecer uma relação com o ritmo, a melodia, a música, 
designa também emoções, expressão de sentimentos, pela utilização de um sujeito aparente, 
traduzido pelo uso de 1ª pessoa que se propõe a apresentar um estado da alma. O lirismo da 
poética de Safo influencia sobremaneira a poesia latina que floresce durante a época do 
imperador Augusto (63 a.C. – 14 d.C.), primando pela imaginação e mantendo uma distância do 
modelo grego que se empenhava em apresentar e discutir as instituições sociais, políticas e 
jurídicas. Anteriormente à época de Augusto, já se disseminava entre poetas como Horácio, 
Virgílio, Ovídio e Catulo um lirismo que representava uma ruptura com os padrões gregos de 
poesia, sobretudo porque começava a se formar um novo ideal de sociedade pautado pela 
liberdade. Veja o que diz Barbosa (2002) a respeito dessa mudança de estilo entre os latinos: 
O fim das guerras civis, que tinham traumatizado a sociedade romana com 
a eliminação de homens de grande prestígio, e o advento da Pax Romana 
fizeram renascer as esperanças de uma nova era; não é, pois, de se 
estranhar que a primeira geração de poetas desse momento histórico, 
principalmente Horácio e Virgílio, tenham se entusiasmado com a nova 
ordem estabelecida, e tenham se empenhado e se comprometido com um 
ideário de reconstrução do mundo romano. O novo regime trazia 
tranquilidade e segurança e reduzia com sua constituição 
fundamentalmente monárquica, a liberdade política e a cidadania, criando 
condições propícias para que vingasse o desengajamento, descompromisso 
e a alienação. Em pouco tempo se produziram mudanças profundas de 
comportamento. O individualismo, já há certo tempo estimulado e 
cultivado por doutrinas do mundo helenístico, encontrou condições ideais 
para derrubar antigos ídolos e valores, antes prestigiados, como o apego à 
tradição, à atividade política, a glorificação na guerra ou nos tribunais. Com 
a queda desses valores, surgem outros, como os cultos ao amor, ao 
pacifismo, ao absenteísmo e, particularmente com Ovídio, ao mundanismo, 
à galantería e uma grande alegria de viver. (BARBOSA, 2002, p. 43-44) 
 
 
Chama a atenção sobre o lirismo de Ovídio (43 a. C) a idealização que ele faz da mulher e 
das relações amorosas. Em sua poesia, se faz presente um elemento emblemático: a imaginação. 
Ovídio inaugura um novo tipo de poema, de versos metrificados em dístico elegíaco em que se 
registram as vozes de um amante-poeta tomado de amor ardente por uma mulher, numa 
relação tensa, marcada por ciúmes, brigas, infidelidades, reconciliações calorosas, que fazem do 
amante um ser insatisfeito e infeliz, com a agravante de não poder romper esse círculo (Cf. 
OVÍDIO, 1994, p.12). Em A arte de amar, Ovídio compõe um tratado poético sobre as formas de 
se conquistar uma mulher. Veja trechos em que ele se reporta à arte da conquista e do 
comportamento das mulheres. 
A obscuridade da noite dissimula os defeitos e é indulgente com as 
imperfeições, e nessas horas, qualquer mulher parece bela. Para julgares a 
beleza das pedras preciosas ou da lã tingida de púrpura, o dia é o melhor 
conselheiro; adota-o também para julgares as feições e as linhas do corpo. 
(OVÍDIO, 1994, p. 33) 
 
(...) o homem não sabe dissimular e a mulher esconde muito melhor os seus 
desejos. Ora, se o sexo forte não tomar a dianteira, a mulher vencida 
tomará para si este papel. (OVÍDIO, 1994, p. 38) 
 
E promete sem timidez, pois as promessas prendem as mulheres! (OVÍDIO, 
1994, p. 47) 
 
O coração das mulheres é muito variável; acharás mil gênios diferentes; 
emprega, pois, mil modos diferentes para conquistá-las. (OVÍDIO, 1994, p. 
52) 
 
Tampouco é conveniente usar o mesmo método para todas as idades; uma 
velha corça descobre a armadilha de longe; se te mostrares muito sabido 
para uma noviça ou muito atirado para uma pudica, elas desconfiarão de ti 
e se afastarão. Com isso, muitas vezes, a mulher que teme entregar-se a um 
homem de bem, se deixa cair vergonhosamente nos braços de quem não a 
merece. (OVÍDIO, 1994, p. 52) 
 
Se teus atos, apesar de feitos às escondidas, virem a ser descobertos, 
mesmo assim nega-os até o fim. Não te mostres mais submisso nem mais 
carinhoso que o costumeiro; esses são indícios certos de culpabilidade. 
(OVÍDIO, 1994, p. 67) 
 
Observe que a temática proposta por Ovídio é outra, diferentemente da dos gregos. Há 
agora a liberdade de falar dos sentimentos, e, principalmente de expô-los em forma de manual. 
Obviamente, não se pode deixar de notar a carga de preconceitos e até mesmo o teor pejorativo 
na apresentação da figura feminina e na concepção das relações amorosas. Entretanto, não 
podemos ser anacrônicos e temos que considerar o pensamento grego vigente e seu contexto 
social que impunha determinadas regras de comportamento. É importante perceber que o 
sentimento amoroso é compreendido em tal concretude que o poeta se vê capaz de abarcar 
todas as nuances de aparição, dotando-o de tal materialidade que o impele a defini-lo: 
 
O amor é uma espécie de serviço militar. Arredai-vos homens covardes! 
Não são os pusilânimes que devem levar os estandartes. Nos campos do 
prazer, nossas provações são a noite, o inverno, as longas marchas, 
caminhos fragosos. Terás muitas vezes que suportar a copiosa chuva e, 
morto de frio, terá de dormir sobre a terra nua. (OVÍDIO, 1994, p. 61) 
 
Horácio, juntamente com Ovídio e Virgílio formam a tríade responsável por disseminar os 
conceitos de arte, poesia e gêneros literários no mundo latino. Para Horácio “Não basta serem 
belos os poemas; têm de ser emocionantes, de conduzir os sentimentos do ouvinte onde 
quiserem” (HORÁCIO, p.58). No tratado denominado A arte poética, apesar de ser considerado 
um herdeiro da tradição grega, ele distancia-se de Aristóteles quando encara a poesia como 
história sagrada, sendo imitação não da realidade, mas uma imitação modificada dos temas 
antepassados. Supõe-se nesse recurso explicitado por Horácio a intromissão da subjetividade do 
poeta a interferir no processo de transmissão e narração dos fatos históricos. 
Como traço característico o gênero lírico desenvolvido por esses poetas pressupõe a 
utilização de termos como “eu”, “aqui” e “agora”, valorizando o tempo presente, a brevidade, o 
tom emotivo do sujeito. A lírica volta-se para a efemeridade e fugacidade do tempo. Esse tema é 
recorrente na Antiguidade Clássica e se difundiu de maneira mais intensa nos escritores 
românticos, destacando como carpe diem. Em Roma, o gênero lírico iniciou-se com Catulo e é 
dele o exemplo mais acabado: o poema 5. Embora ele traga esse poema de maneira explícita a 
representação do carpe diem, a lírica de Horácio desperta mais atenção que a de Catulo e as 
modulações horacianas encontraram numerosos intérpretes. (ACHCAR, 1994) Horácio publicouas Odes entre os anos 30 e 23 a. C e elas são consideradas o ponto culminante de seu esforço 
lírico. O teor das Odes gira em torno da juventude, do amor, dos prazeres do vinho, da alegria de 
viver. As ideias horacianas serão retomadas mais tarde pela poesia de todas as épocas e de 
todas as estéticas literárias. Vejamos o poema de Catulo dedicado à Lésbia e a Ode 11 de 
Horácio: 
 
Poema 5 Ode 11 
 
Vivamos, minha Lésbia, e amemos, 
E as graves vozes velhas 
- todas – 
Valham para nós menos que um vintém. 
Os sóis podem morrer e renascer: 
Quando se apaga nosso fogo breve 
Dormimos uma noite infinita. 
Dá-me pois mil beijos, e mais cem, 
E mil, e cem, e mil, e mil e cem. 
Quando somarmos muitas vezes mil 
Misturaremos tudo até perder a conta: 
Que a inveja não ponha o olho de 
agouro 
No assombro de uma tal soma de beijos 
 
 
Não interrogues, não é lícito saber a mim ou a ti 
que fim os deuses darão, Leucônoe. Nem tentes 
os cálculos babilônicos. Antes aceitar o que for, 
quer muitos invernos nos conceda Júpiter, quer este 
último 
apenas, que ora despedaça o mar Tirreno contra as 
pedras 
vulcânicas. Sábia, decanta os vinhos, e para um breve 
espaço de tempo 
poda a esperança longa. Enquanto conversamos terá 
fugido despeitada 
a hora: colhe o dia, minimamente crédula no porvir. 
 
 
 
 Através da leitura dos poemas, você pôde perceber o grau de subjetividade contido em 
cada um deles e o apelo ao carpe diem, presente e difundido desde a Antiguidade, encontrando-
se em muitas estéticas literárias, sobretudo no Barroco e no Romantismo. Leia, a seguir, dois 
poemas; o primeiro intitulado Carpe diem de Mário Faustino, poeta piauiense, morto em 1962, e 
o segundo de Gregório de Matos, poeta baiano, ícone da poesia barroca no Brasil, morto em 
1696, dedicado a “uma formosíssima Maria”. Compare-os e identifique neles as marcas da 
poesia lírica desenvolvida pelos poetas latinos. 
 
 
 
Carpe Diem A uma formosíssima Maria 
 
Que faço deste dia, que me adora? 
Pegá-lo pela cauda, antes da hora 
Vermelha de furtar-se ao meu festim? 
Ou colocá-lo em música, em palavra, 
Ou gravá-lo na pedra, que o sol lavra? 
Força é guardá-lo em mim, que um dia assim 
Tremenda noite deixa se ela ao leito 
Da noite precedente o leva, feito 
Escravo dessa fêmea a quem fugira 
Por mim, por minha voz e minha lira. 
 
(Mas já de sombras vejo que se cobre 
Tão surdo ao sonho de ficar — tão nobre. 
Já nele a luz da lua — a morte — mora, 
De traição foi feito: vai-se embora.) 
 
Discreta e formosíssima Maria, 
Enquanto estamos vendo a qualquer hora 
Em tuas faces a rosada Aurora, 
Em teus olhos e boca o Sol, e o Dia: 
 
Enquanto com gentil descortesia 
O ar, que fresco Adônis te namora, 
Te espalha a rica trança voadora, 
Quando vem passear-te pela fria: 
 
Goza, goza da flor da mocidade, 
Que o tempo trata a toda ligeireza 
E imprime em toda flor sua pisada. 
 
Ó não aguardes que a madura idade 
Te converta essa flor, essa beleza, 
Em terra, em cinza, em pó, em sombra, em 
nada. 
 
 
 
REFERÊNCIAS: 
 
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