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A Argumentação nas Decisões Judiciais TEXTO

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A Argumentação nas decisões judiciais 
								 Paulo Roberto Soares Mendonça
 Demonstração x Argumentação 
	Para que se possa compreender melhor a Teoria da Argumentação de Chaim Perelman é fundamental que se conheça bem a distinção entre argumentação e demonstração, que representa um de seus pilares. 
	A demonstração é típica de uma lógica formal,que adquire grande projeção no século XIX, com a ascensão do paradigma positivista, que defendia a adoção, no estudo das ciências sociais e humanas do mesmo método utilizado nas ciências naturais e exatas. Segundo essa visão, os fenômenos sociais poderiam ser analisados sob os mesmos parâmetros metodológicos da fisica ou da química, por exemplo. 
	Quando se trata de demonstração, as conclusões resultam de um cruzamento 
entre juízos hipotéticos e mecanismos de comprovação prática. Tais mecanismos seguem uma receita predeterminada de operações lógicas, que independem do campo de estudo (matemática, fisica, antropologia, direito ou biologia, por exemplo). O importante é exatamente a comprovação de que, com a repetição de certos procedimentos, previamente determinados, serão observadas certas conseqüências necessárias, a partir das quais se formarão regras. Segundo Perelman13, demonstração é "um cálculo feito de acordo com normas previamente estabelecidas". 
	A chamada prova demonstrativa normalmente é imutável, desde que mantidas as mesmas condições ambientais e adotados os procedimentos previamente estabelecidos. Em função disso, essa prova independe de qualquer tipo de adesão por parte daqueles perante os quais ela se realiza, sendo válida por si só. Em um processo de demonstração, basta indicar os pressupostos metodológicos que levaram a uma determinada conclusão, sem uma preocupação maior com os conteúdos axiológicos e de experiência que possam porventura tê-Ia influenciado. 
	Este é um princípio perfeitamente aplicável às ciências naturais e exatas, pois tanto a demonstração de uma fórmula matemática, quanto a realização de uma reação química independem dos conteúdos valorativos ou padrões culturais daqueles que as observam. O sistema resultante de tais processos apresenta uma absoluta coerência entre suas premissas e conclusões, sendo, portanto, concebido corno um sistema formal. 
	Todavia, quando se trata das chamadas ciências humanas e sociais, os resultados obtidos são profundamente influenciados pelo meio em que a pesquisa é realizada. Justamente neste ponto, se observa a grande limitação do uso da demonstração, como método de abordagem das ciências sociais. 
	O processo argumentativo apresenta natureza bastante diversa do processo demonstrativo, a começar pelo fato de que a demonstração prescinde de um interlocutor para que suas premissas sejam tidas como válidas. Seguidas as regras fixadas, a demonstração é tida como eficaz, desde que os resultados atendam à hipótese previamente estabelecida. Daí dizer-se que o processo pertinente à demonstração pode ser realizado até por uma máquina. 
	Por outro lado, a argumentação pressupõe um "encontro de mentes", no dizer de Perelman14, isto é, uma relação entre atores diferentes, para que se torne efetiva. Daí surgem as figuras do orador e do auditório. O orador é aquele que se dirige, oralmente ou mesmo por escrito, a um interlocutor determinado, o chamado auditório ou audiência, que pode ser formado por uma ou mais pessoas, das quais se busca a adesão a uma idéia proposta. Essa adesão é a finalidade maior do processo argumentativo, estando a eficácia do mesmo ligada diretamente a eIa. Só há que se falar em argumentação quando há uma inequívoca identidade entre a tese proposta e o auditório, de modo a criar um vínculo entre o orador e seus interlocutores. 
	A argumentação se mostra bem mais adequada ao estudo das ciências' humanas e sociais, por não trabalhar com uma lógica puramente formal, adotando procedimentos flexíveis fundados em uma necessária interação entre o orador e o auditório. Diferentemente da demonstração o discurso argumentativo destina-se a um auditório específico, cuja adesão é de vital importância. Em conseqüência disso, a argumentação tende a variar, conforme a composição do auditório e a natureza dos valores nele dominantes. 
Requisitos da Argumentação
	a) REGRAS BÁSICAS – na argumentação é necessário que se estabeleçam determinadas normas que disciplinem a relação entre o orador e o auditório, a fim de que o processo de comunicação possa acontecer de maneira tal que.permita uma efetiva troca de informações e uma satisfatória compreensão pelo auditório da tese proposta pelo orador. As normas podem até fazer parte do cotidiano daquele grupo, sendo implicitamente aceitas por todos, apesar de não expressamente formuladas; contudo, a sua existência é fundamental. 
	b) LINGUAGEM COMUM – a linguagem utilizada deve ser compreensível por todos os membros do auditório. A argumentação lança mão da linguagem falada ou escrita, de complexidade variável, conforme o tipo de auditório a que se destina. Já a linguagem demonstrativa se apresenta de maneira puramente formal, dedutiva, podendo ser simbólica (fórmulas físicas e matemáticas, por exemplo), mas certamente padronizada e continuamente reproduzida de modo idêntico, em face de qualquer auditório. 
	c) TRIUNFO DE UMA CAUSA – enquanto a demonstração tem a pretensão de formar um conhecimento "verdadeiro", a argumentação tem como finalidade precípua a aceitação hegemônica de uma tese, por parte do auditório. 
	A tradição formalista ocidental da ''unicidade da verdade"15 mergulhou a retórica no ostracismo a partir da Era Moderna, sobretudo em razão de uma tendência racionalista de restringir a abordagem científica a esquemas matemáticos e de lógica formal. A Teoria da Argumentação reabilita a retórica, dentro do debate científico e principalmente no campo do Direito. 
	Segundo Perelman16, um argumento não é aceito por ser verdadeiro e sim porque é socialmente útil, justo ou razoável. O processo argumentativo também difere do demonstrativo, quando este último admite a existência de conhecimentos imutáveis e dotados de uma certeza científica. As teses argumentativas norrnalmente são admitidas em um local determinado, durante um certo período de tempo. Assim sendo, todo conhecimento resultante desse tipo de processo pode ser a qualquer momento contraposto de maneira eficiente, perdendo o seu caráter hegemônico. 
	Na esfera da argumentação não existem teses falsas ou verdadeiras, uma vez que não se trata de um "jogo de soma-zero", em que há proposições absolutamente coerentes e proposições totalmente falsas. Em verdade, tese opostas podem estar interligadas em alguns aspectos ou até mesmo apresentar uma esfera de complementação, em relação àqueles pontos em que não se contradizem. 
	d) PERMEABILIDADE DO AUDITÓRIO – é importante, ainda, que exista uma permeabilidade do auditório, para o conhecimento da tese proposta pelo orador. Se não há, por parte do auditório, qualquer ânimo de permitir a exposição de idéias pelo orador ou mesmo disposição para o seu conhecimento, torna-se impossível o estabelecimento de qualquer processo retórico. 
	Nenhum argumento se estabelece sem a aceitação do auditório ou apenas através do uso da força. Nessa última hipótese, sequer se poderia cogitar de um processo argumentativo, mas apenas de uma imposição de idéias, pois é da essência da argumentação a contraposição de teses, a dúvida, o questionamento. Já no caso da demonstração, se trabalha com uma pretensão de certeza, sendo totalmente irrelevante a forma como se dá a relação entre emissor e receptor de certa informação. 
e) DISCURSO COMPATÍVEL COM O AUDITÓRIO – deve-se estar atento para o fato de que o processo decisório está submetido a outras variáveis, além do simples exercício retórico. A própria argumentação sofre limitações de ordem institucional e cultural, de vez que o sucesso desse tipo de prática pressupõe a aceitação da decisão por parte daqueles a quem ela se destinae, para tanto, torna-se necessário que o discurso utilizado esteja de acordo com as expectativas dos ouvintes. Daí, a relevância de uma incursão pelas condições psicológicas e sociais do ambiente onde se trava o processo argumentativo, a fim de buscar as razões que justificam o triunfo de determinada tese. 
	É fundamental que o orador funde o seu discurso em premissas majoritariamente aceitas pelo auditório, mesmo que suas conclusões venham a ser diferentes daquelas nele dominantes. Esta exigência está intimamente ligada à permeabilidade da audiência ao discurso do orador. Sem que se estabeleça plenamente a comunicação entre os agentes, não há como persuadir o auditório da conveniência da proposta do orador. - - -- . 
	Em se tratando de argumentação, a receptividade do auditório é imprescindível e, para tanto, a tese proposta deve ser compatível com os valores dominantes naquele grupo cultural, mesmo que a sua eventual aceitação posterior resulte na mudança de tais valores. Em função disso, a argumentação é dotada de flexibilidade podendo ser encurtada, ampliada ou mesmo modificada, a partir das reações daqueles a quem se destina o discurso. Por outro lado, quando se fala de demonstração, as conclusões são postas de modo imutável e sua essência independe de qualquer forma de manifestação da audiência. 
Instrumentos da Argumentação
	Tendo comentado os requisitos básicos do processo argumentativo, torna-se importante destacar algumas ferramentas de que lança mão o orador, a fim de tornar a sua tese aceitável. 
	Por um lado, o orador se utiliza de fatos, verdades e presunções; por outro, de valores e hierarquias. 
	Quanto a fatos e verdades, estes representam justamente aqueles pressupostos aceitos hegemonicamente pelo auditório e que serão expressos pelo orador como senso comum ou um tipo de consenso prévio. Sua utilização funciona mais ou menos como um mecanismo de aproximação entre o orador e a audiência, algo indispensável no contexto da argumentação. Por outro lado, o uso de fatos e verdades não constitui uma tarefa tão simples quanto se poderia eventualmente imaginar, havendo necessidade de uma coerência absoluta entre os fatos apresentados no auditório. Na falta da mencionada coerência, a habilidade do orador deve ser de tal monta, que conduza o auditório a uma dissociação mental entre fatos apresentados e as verdades, não obstante a sua inegável ligação prática. 
	Presunções são ''verdades formais", que não demandam prova a seu favor, muito embora a prova contrária seja sempre possível no processo argumentativo. As presunções estão bastante presentes na matéria jurídica, sendo em muitos casos inclusive criadas por normas jurídicas. Elas são fundadas normalmente no senso comum, isto é, naquelas conseqüências via de regra observadas, quando se verificam determinados fatos.

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