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Hermenêutica Aula 03

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DESCRIÇÃO
As teorias da argumentação e sua relação com a moral e o Direito.
PROPÓSITO
Compreender as teorias da argumentação e suas proposições na
construção de critérios racionais para as práticas morais e jurídicas é
importante para sua formação, pois facilitará o exercício da aplicação
e justificação de normas morais e jurídicas em situações concretas.
PREPARAÇÃO
Antes de iniciar o conteúdo deste tema, tenha à mão um dicionário
de lógica e argumentação.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Identificar os principais elementos conceituais das teorias da
argumentação de Chaïm Perelman
MÓDULO 2
Reconhecer os principais elementos conceituais das teorias da
argumentação de Robert Alexy e Klaus Günther
INTRODUÇÃO
Aprenderemos a identificar os principais elementos teóricos de
algumas das teorias da argumentação que tiveram forte influência
nos debates morais e jurídicos na atualidade. No módulo 1,
estudaremos a Nova retórica dos filósofos Chaïm Perelman (1912-
1984) e Lucie Olbrechts-Tyteca (1899-1987). No módulo 2,
reconheceremos os elementos das teorias da argumentação de
Robert Alexy (discurso jurídico como caso especial do discurso
prático geral) e Klaus Günther (discursos de justificação e discursos
de aplicação na moral e no Direito).
MÓDULO 1
 Identificar os principais elementos conceituais das teorias da
argumentação de Chaïm Perelman
APRESENTAÇÃO
Antes de introduzirmos o pensamento filosófico de Chaïm Perelman,
cabe apresentar um pouco de sua biografia.
Chaïm Perelman foi um filósofo, de nacionalidade belga, que nasceu
em Varsóvia, capital da Polônia. Em 1944, Perelman se tornou
professor de lógica e metafísica na Universidade Livre de Bruxelas.
Também foi coordenador da faculdade de Letras e diretor da Escola
de Ciências da Educação, e escreveu muitos artigos sobre a lógica
da Matemática.
Ao longo de sua carreira, também foi secretário-geral da Federação
Internacional das Sociedades de Filosofia, presidente da Sociedade
Belga de Filosofia e da Sociedade Belga de Lógica e Filosofia da
Ciência. Foi, ainda, membro do corpo governante da Universidade
Hebraica e secretário-geral da Sociedade de Amigos Belgas da
Universidade Hebraica.
 
Foto: Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos/
Wikimedia Commons/ Licença CC BY-SA 4.0
 Chaïm Perelman.
Em suas últimas obras, Perelman se dedicou aos temas da justiça e
às formas do raciocínio discursivo e dedutivo. As principais estão
traduzidas para a língua portuguesa: Tratado da argumentação: a
nova retórica (1996), escrito em conjunto com Lucie Olbrechts-
Tyteca; Retóricas (1999); Lógica jurídica (2000); Ética e Direito
(2002).
LUCIE OLBRECHTS-TYTECA
javascript:void(0)
Lucie Olbrechts-Tyteca foi coautora do Tratado da
argumentação: a nova retórica em conjunto com Chaïm
Perelman. Sua contribuição para o desenvolvimento da retórica
foi marcante, tendo ocupado posições em organizações civis
hebraicas.
 SAIBA MAIS
Além de suas obras principais, numa busca refinada na internet, em
língua portuguesa, podemos encontrar pelo menos 49 mil referências
sobre Perelman. Lido nos programas de pós-graduação, em eventos
acadêmico-científicos, bem como pelos juízes em suas práticas nos
tribunais, não seria equivocado afirmar que sua obra encontra
espaço no pensamento jurídico brasileiro, estando ao lado de outros
filósofos e juristas como Hans Kelsen (1881-1973), Herbert L. A. Hart
(1907-1992), Ronald Dworkin (1931-2013), Robert Alexy, Manuel
Atienza, entre outros.
NOVA RETÓRICA: UM LUGAR
PARA A RAZÃO
Neste módulo sobre as teorias da argumentação, queremos mostrar
a você que a argumentação possui uma estrutura racional que
vai além da forma científica e que exige uma compreensão acerca
dos valores.
 
Fonte: Shutterstock.com
Se observarmos as práticas jurídicas em sua dinâmica social,
poderemos ver que o raciocínio dedutivo e o formalismo da aplicação
da norma são suficientes para satisfazer às expectativas dos
cidadãos em relação às suas instituições formais e aos valores com
os quais podem se engajar. O sentido das práticas jurídicas
institucionais, sejam elas decisões judiciais ou proposições
legislativas, não consegue ser apreendido em sua completude pela
demonstração científica, tampouco pelo silogismo dedutivo. Porém,
se a demonstração científica não é conformável às práticas jurídicas,
poderíamos afirmar que estamos, então, num ambiente irracional?
Para responder a esse questionamento, as teorias da
argumentação, jurídicas ou não, visam demonstrar que as práticas
jurídicas, embora não se apoiem única e exclusivamente em
raciocínios dedutivos, são passíveis de outra racionalidade: a
racionalidade discursiva da argumentação.
Uma primeira e central resposta é dada com a Nova retórica de
Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca (1996) que, nos próprios
termos de seus autores, constitui “uma ruptura com a concepção da
razão e do raciocínio, oriunda de Descartes, que marcou com seu
cunho a Filosofia ocidental dos três últimos séculos”.
A Nova retórica pretende demonstrar que a razão pode percorrer
caminhos diferentes, em que seja possível a articulação dos valores,
evitando, por um lado, sua negação (neutralidade cientificista), e, por
outro, o relativismo, mantendo o cognitivismo segundo o qual os
valores possuem o predicado de verdade.
O prefácio de Michel Meyer à edição brasileira de 2002 resume:
Entre o ‘tudo é permitido’ e a ‘racionalidade lógica é a própria
racionalidade’, surgiu a Nova retórica e, de um modo geral, toda a
obra de Perelman. Como atribuir à Razão um campo próprio, que
não se reduz à lógica, demasiado estreita para ser modelo único,
nem se submete à mística do Ser, ao silêncio wittgensteiniano, ao
abandono da Filosofia em nome do fim – aceito por Perelman – da
metafísica, em proveito da ação política, da literatura e da poesia? A
retórica é esse espaço de razão, onde a renúncia ao fundamento, tal
como o concebeu a tradição, não se identificará forçosamente à
desrazão. [...] A Nova retórica é, então, o ‘discurso do método’ de
uma racionalidade que já não pode evitar os debates e deve,
portanto, tratá-los e analisar aos argumentos que governam as
decisões.
A Nova retórica é, ao mesmo tempo, uma teoria da argumentação,
mas, também, da razão colocada diante do pluralismo de valores que
nos permite ir além dos limites impostos pela ciência e lógica formal.
Ao mesmo tempo, não nega a possibilidade de racionalidade
ancorada nos valores dos indivíduos que vivem em sociedade. Como
ela, podemos ter uma racionalidade que se certifica a partir das
razões dadas pelos indivíduos que utilizam a força não coercitiva do
melhor argumento – portanto, uma alternativa ao irracionalismo.
Importante destacar que o Direito não pode ser demonstrado única e
exclusivamente pelo silogismo dedutivo, tampouco pelas evidências
empíricas reveladas pelos fatos brutos da natureza. Embora
saibamos a estrutura do raciocínio válido no âmbito de uma
argumentação jurídica ou política, tomam corpo e forma as questões
jurídicas que possuem em sua substância elementos valorativos que
não se deixam reduzir ao cálculo racional da lógica dedutiva.
Para resgatar a racionalidade dos valores, bem como estruturar um
método capaz de organizar sua constituição, a Nova retórica retoma
a Retórica aristotélica entendendo que esta não conseguiu
visualizar adequadamente o papel dos valores no discurso
epidíctico.
Aristóteles divide os gêneros do discurso em três:
I
O judicial, voltado para a análise dos fatos, cujo tempo é o passado.
javascript:void(0)
II
Deliberativo e político, voltado para o bem-estar da comunidade.
III
O epidíctico, voltado para os aspectos cerimoniais e apologéticos de
situações presentes.
Segundo a Nova retórica , o discurso epidíctico não foi
suficientemente explorado por Aristóteles, na medida em que o
discurso deixou de verificar que sua centralidade está pautada nos
valores. O discurso judicial é circunscrito pelos fatos; o políticopelas
possibilidades ou não de aumentar o bem-estar da comunidade; e
ambos apresentam limites no que tange à relação entre orador e
público. Tais limites são mediados pela objetividade dos fatos que
sustentam o conteúdo dessas modalidades de discurso. Todavia, o
discurso epidíctico traz uma relação diferente entre o orador e o
auditório. Nele o auditório se relaciona diretamente com o orador, à
medida que, no tempo presente, o público precisa avaliar o discurso
do orador.
Nessa relação direta, não existe o limite da “objetividade” dos fatos,
das evidências, mas, sim, uma liberdade de avaliar se esses valores
foram ou não organizados de forma racional. Uma vez que o
discurso epidíctico não está sujeito às questões passadas do fato,
nem às questões futuras do bem-estar, a audiência precisa julgar
aqui e agora se o discurso do orador é válido ou não. Assim, os
destinatários do discurso, o auditório, são centrais na construção dos
elementos persuasivos do orador.
javascript:void(0)
javascript:void(0)
A Nova retórica considera que:
Ao contrário da demonstração de um teorema de geometria, que
estabelece de uma vez por todas um vínculo lógico entre verdades
especulativas, a argumentação do discurso epidíctico se propõe a
aumentar a intensidade da adesão a certos valores, sobre os quais
não pairam dúvidas quando considerados isoladamente, mas que,
não obstante, poderiam não prevalecer, contra outros valores que
viessem a entrar em conflito com eles. O orador procura criar uma
comunhão em torno de certos valores reconhecidos pelo auditório,
valendo-se do conjunto de meios de que a retórica dispõe para
amplificar e valorizar. [...] Os discursos epidícticos apelam com mais
facilidade a uma ordem universal, a uma natureza ou a uma
divindade que seriam fiadoras dos valores incontestáveis. Na
epidíctica o orador se faz educador. (PERELMAN; OLBRECHTS-
TYTECA, 2002).
AUDITÓRIO
Para quem o orador, que exerce o papel de educador, articula a
ordem universal dos valores? Qual é o seu público? Quem é o
destinatário de seu discurso? A Nova retórica considera que
existem dois tipos de audiências, de auditórios: particular e
universal.
Para a particular, temos que todo argumento é dirigido a uma
audiência específica em que o orador tem de escolher quais são os
fatos, as informações e as abordagens que irão gerar a maior
aderência possível. Por sua vez, o auditório universal tem como
conteúdo os valores e sua ordem. Ambos os auditórios não se
constituem em algo fixo, pois dependem do orador, do conteúdo, dos
propósitos, da audiência.
Auditório particular
Audiência específica a quem o orador endereça os argumentos.
Audiência física que está presente.
Fatos, verdades e presunções.

Auditório universal
Potencial para escutar e concordar com o discurso do orador.
Formada pelo maior número possível de pessoas razoáveis e
competentes para concordar.
Valores.
Confira a seguir um exemplo de auditório particular:
EXEMPLO
Podemos agora verificar um público específico, tal qual uma turma
de alunos a quem um professor se dirige; um grupo de pacientes a
quem o médico realiza sua clínica; um grupo de mecânicos a quem
um piloto de Fórmula 1 passa um rádio; os eleitores a quem se dirige
o político; o tribunal a quem se dirige o advogado.
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O auditório universal é uma construção mental e que não se
confunde com a imagem de assembleia ou de uma vastidão de
pessoas. É importante que as razões trazidas sejam universais, que
tenham em sua estrutura a universalização dos argumentos. A
questão está em endereçar as razões ao público universal. O
auditório universal modela o discurso do orador em dois aspectos: o
primeiro é que passa a ser um mecanismo heurístico que calibra
as escolhas dos argumentos selecionados pelo orador; o segundo
é que passa a ser um critério de seleção da qualidade do discurso
que precisa ter aderência à qualidade do público. Ao propor
argumentos passíveis de universalização, é possível chegar a uma
racionalidade universal capaz de persuadir o maior público possível.
Agora, entenda como o discurso é direcionado no auditório universal:
EXEMPLO
Um argumento endereçado à associação de desportos marítimos
pode ser convincente para esses atletas específicos. Certamente,
não fará sentido para todos os cidadãos ou para aqueles que não
estão relacionados com desportos marítimos. Todavia, nada impede
que um discurso dirigido a um auditório particular carregue potenciais
argumentos para um auditório universal. Então, no mesmo exemplo,
se estivermos falando da liberdade individual da prática de desporto
marítimos, ou seja, da escolha em torno da possibilidade de praticar
desportos, nada nos impede de ter razões universais sendo
articuladas.
javascript:void(0)
Mas o que torna possível o endereçamento de razões aos
auditórios?
Tanto auditórios particulares quanto universais são possíveis porque
entre orador e público existe uma rede de significados comuns sobre
os quais é possível fazer inferências, resgatar sentidos, compreender
palavras, vocabulário etc. Essa rede comum, na tradução em língua
portuguesa, é compreendida como contato de espíritos, aquilo que
Perelman e Olbrechts-Tyteca entenderam ser uma linguagem
comum.
 
Fonte: Shutterstock.com
Para que haja uma relação entre orador e auditório é necessário que
essa rede de significados comuns esteja compartilhada, caso
contrário a comunicação certamente se tonará sem sentido e não
será possível estabelecer as condições de exercício da
racionalidade, ou seja, da retórica.
Podemos verificar a quebra de comunicação utilizada na Nova
retórica com o seguinte exemplo:
EXEMPLO
Na obra Alice no País das Maravilhas , Alice, personagem central da
história de Lewis Carroll, não consegue estabelecer uma
conversação com seus interlocutores porque, entendem Perelman e
Olbrechts-Tyteca, não há entre o País das Maravilhas e o nosso
mundo (mundo de Alice) regras comuns.
ARGUMENTAÇÃO E SEUS
PONTOS DE PARTIDA
A Nova retórica faz uma distinção entre demonstração e
argumento.
Demonstração
Visa produzir verdade por meio do raciocínio consequente entre
premissas e conclusões, as quais podem ser produzidas num
exercício solitário do cientista ou lógico, sem a necessidade de
conhecer as fontes ou as pessoas envolvidas na construção desse
raciocínio. O que interessa é a verdade do sistema, sua forma, sua
capacidade de prever, o rigor formal de seus axiomas, a ausência de
ambiguidade de seus termos. Nesse aspecto, então, a demonstração
pode ser inteiramente um constructo do lógico formal, do cientista ou
do lógico.

javascript:void(0)

Argumento
Leva em consideração os aspectos psicológicos e sociais, sob pena
de perder seus efeitos ou seu objeto. Como sustentam Perelman e
Olbrechts-Tyteca, o argumento visa à adesão dos espíritos e, por
isso mesmo, pressupõe a existência de um contrato intelectual. Só é
possível a argumentação, conforme vimos, se houver uma
comunidade efetiva dos espíritos que esteja de acordo, antes de
mais nada e em princípio, sobre a comunidade intelectual.
Feita a presente distinção, podemos ver que o argumento parte de
um quadro comum de significados compartilhados entre os
participantes da argumentação. Toda argumentação parte de
premissas aceitas pelo público, de um ponto de concordância, de
uma base comum, que Perelman e Olbrechts-Tyteca entendem ser
dividida em duas categorias: a primeira lida com fatos, verdades e
presunções; a segunda lida com valores, hierarquias e lugares ou
topos . Com a primeira categoria, podemos afirmar que existem
pontos de partida que lidam com a realidade. Com a segunda
categoria, podemos dizer que existem pontos de partida que lidam
com o preferível.
 Atenção! Para visualizaçãocompleta da tabela utilize a rolagem
horizontal
Demonstração Argumento
javascript:void(0)
javascript:void(0)
Ponto de partida da
realidade
Pontos de partida do preferível
Verdades Hierarquias
PresunçõesLoci do preferível (Loci
communes )
 Categorias da argumentação. 
Fonte: Davi José de Souza da Silva
DEMONSTRAÇÃO
- Solipsista (pode ser pensada sozinha)
- Axiomática
- Matemática
- Verdade
ARGUMENTO
- Intersubjetivo
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javascript:void(0)
javascript:void(0)
javascript:void(0)
javascript:void(0)
javascript:void(0)
- Social
- Psicológico
- Persuasão/Adesão
PONTO DE PARTIDA DA
REALIDADE
Fatos
- Ideias discretas aceitas universalmente.
PONTOS DE PARTIDA DO
PREFERÍVEL
Valores
- Ideias ou posições que são universais como generalizações,
mas que só tem aderência a certas audiências quando aplicadas
sob certas circunstâncias. Valores podem ser concretos ou
abstratos. Concretos servem mais à manutenção das condições
e abstratos, à mudança das condições.
VERDADES
- Princípios ou ideias que são sustentados universalmente e que
sistematizam fatos.
HIERARQUIAS
Sistemas que relacionam coisas de diferentes ou homogêneos
tipos.
PRESUNÇÕES
Concepções que espelham a expectativa universal das
audiências sobre o que é a natureza e a realidade.
LOCI DO PREFERÍVEL (LOCI
COMMUNES )
- Correspondem aos Topoi aristotélicos e constituem hierarquias
baseadas em coisas comuns ou diferentes.
Importante destacar os lugares-comuns (Loci communes ) ou
Topoi . São quadros gerais organizativos, “premissas de ordem geral
que permitem fundar valores e hierarquias”. Para a Nova retórica os
lugares-comuns nos ajudam a “justificar a maior parte das nossas
escolhas”. Perelman e Olbrechts-Tyteca organizam seis categorias
de lugares-comuns:
LUGARES DE QUANTIDADE
Afirmam que alguma é melhor que a outra por razões quantitativas.
LUGARES DA QUALIDADE
Contestam a virtude do número.
LUGARES DA ORDEM
Afirmam a superioridade do anterior sobre o posterior.
LUGARES DO EXISTENTE
Afirmam a superioridade do existente, real, sobre o que é possível,
eventual ou impossível.
LUGAR DA ESSÊNCIA
Afirma que o que é mais próximo do ideal é superior ao que se
aproxima menos.
LUGAR DA PESSOA
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javascript:void(0)
javascript:void(0)
javascript:void(0)
javascript:void(0)
javascript:void(0)
Favorece o valor da vontade e do indivíduo.
PRESENÇA E COMUNHÃO
O argumento é um empreendimento intersubjetivo, ou seja, depende
da ligação entre pessoas. Diferentemente da demonstração, em que
o lógico-matemático pode, de forma solitária, realizar suas deduções,
na argumentação é necessário que haja uma ligação entre o orador
e o auditório.
Já pudemos ver que essa ligação começa pela rede de comunicação
compartilhada entre eles, como a fábula Alice no País das
Maravilhas nos mostrou. Assim, a argumentação reforça a rede de
comunicação existente. Considerando a diversidade de pontos de
partida, sejam eles os dados da realidade ou os valores, é
necessário que o orador faça escolhas quando pretende persuadir
seu auditório. Essas escolhas devem ser suficientes para que o
orador gere presença e comunhão com o auditório.
PRESENÇA
A presença consiste em conseguir ganhar a atenção plena do
auditório diante do discurso, conduzindo-a para que leve em
consideração os elementos relevantes da argumentação.
Poderíamos dizer, numa linguagem mais atual, que a presença é a
capacidade do orador de prender a atenção do público de modo a
conduzir seu foco para os elementos relevantes do diálogo
persuasivo.
Para que a presença se efetive, é necessário que o orador saiba
dispor de maneira precisa quais elementos trará para o discurso. Tais
elementos precisam criar uma conexão com o público.
Na Nova retórica , a presença atua de modo direto sobre a nossa
sensibilidade, sendo um dado psicológico que exerce uma ação no
nível da percepção. O que está presente na consciência adquire uma
importância que a prática e a teoria da argumentação devem levar
em conta.
Veja, a seguir, exemplos de criação de presença:
EXEMPLO
Vejamos a história bíblica do encontro de Moisés com Javé. Ao se
manifestar por meio da sarça de fogo, que inibia Moisés de ver a
força de Javé, o efeito da presentificação preparou Moisés para que
pudesse receber a mensagem. No filme O lobo de Wall Street , o
personagem Jordan Belfort, antes de iniciar uma venda, apresenta
ao público, a um destinatário específico, uma caneta. Prendendo a
atenção do ouvinte com a visão da caneta esferográfica, afirma:
“venda-me esta caneta”. O clima, a ambiência e as imagens de um
Ted Talk prendem a atenção do público e para a mensagem.
javascript:void(0)
COMUNHÃO
Quando a conexão psicológica é estabelecida com o público,
podemos falar em , que ocorre quando orador e auditório passam a
compartilhar crenças comuns, valores e sentimentos, gerando uma
identificação.
Quando o orador comunga dos mesmos sofrimentos, das
experiências, vivências e inquietações, há maior possibilidade de
persuadir o auditório em função do estabelecimento da relação de
identidade entre orador e público.
Veja, a seguir, um exemplo de comunhão:
EXEMPLO
Um técnico consagrado como Bernadinho tem bastante relação de
identidade com jogadores e profissionais do esporte em geral. Mas,
também, por ter vivido em ambientes competitivos e de muito
estresse, Bernadinho tem a mesma comunhão com o mundo
empresarial e de executivos. Veja, a mesma pessoa é capaz de
gerar comunhão em diferentes grupos, porque sua vivência, história,
suas crenças e atitudes podem ser compartilhadas.
LIGAÇÃO E DISSOCIAÇÃO
Conforme pudemos ver até aqui, o argumento é uma forma de
expressão da racionalidade discursiva existente entre o orador e o
javascript:void(0)
auditório. Nessa tarefa é necessário que o orador crie conexões com
o auditório. Para poder criar tais conexões é preciso organizar o
discurso de modo que reste fortalecido no sentido de que as
premissas apresentadas possam levar às conclusões indicadas.
Nesse processo, devem ser estabelecidos esquemas argumentativos
que sejam sólidos e capazes de mobilizar o auditório para a
conclusão defendida.
Por isso, a Nova retórica dedica uma parte de seu estudo à análise
da estrutura dos argumentos, considerados em si como maneira de
explicitar em que bases podem ser criados.
Ligação
Dá-se quando um esquema argumentativo, do ponto de vista de sua
estrutura interna, reforça reciprocamente suas partes, ou seja, cada
elemento contribui para a força do outro elemento (E¹ + E² +
E³....En).
Para a Nova retórica , a ligação está presente em esquemas
argumentativos nos quais seus elementos internos visam se reforçar
reciprocamente, promovendo entre esses elementos uma
valorização positiva ou negativa. A ligação promove o reforço
sistemático do argumento, gerando solidez.

Dissociação
Está presente quando visamos deslocar o sentido de reforço mútuo,
gerando uma força de deslocamento, repulsão e criação de novo
sentido.
 ATENÇÃO
Ligação e dissociação, entende a Nova retórica , constituem, para
efeitos psicológicos, os dois lados da mesma moeda. Para gerar
ligação entre dois elementos de um argumento, é necessário gerar
uma dissociação em relação a um aspecto não desejado pelo orador.
Sem exaurir a temática e não deixando de contextualizar, a Nova
retórica busca apresentar e introduzir esses esquemas
argumentativos para orientar os praticantes do discurso.
ESQUEMAS DE LIGAÇÃO
Focaremos no primeiro e mais explícito esquema de ligação
argumentativa, sobretudo para ligar você aos estudos de lógica e
retórica: o argumento quase-lógico, semelhante aos argumentos
lógico-dedutivo ou comparável às inferências da lógica formal.
Nessa modalidade, há muita semelhança entre o argumento e a
demonstração formal da lógica dedutiva. Todavia, a complexidade
desses argumentos não se deixa reduzir à estrutura da
demonstração lógico-formal.
 ATENÇÃO
Para tornar persuasivo o argumento, há todo um trabalho, por parte
do orador, de tornar os elementos do argumento semelhantes aos
elementos do silogismo dedutivo.
Nesse esforço é que reside, justamente, sua natureza não lógica,
pois, para sustentaro formalismo, o orador terá de fazer escolhas,
reduções, simplificações, ampliações, todas dependentes de um
acordo geral de pano de fundo passível de problematização pelo
auditório.
Quando explicitadas essas “incoerências”, “insuficiências” ou
“reduções simplificadoras”, contestáveis, no esquema de
argumentação quase-lógico, entram em cena argumentos de
autoridade ou ad hominem para sustentar sua “persuasão”:
“O rigor da demonstração é evidente”, “veja como é matemática a
conclusão”, “estar contra essa exposição é contrariar a lógica” etc.
A seguir, confira o exemplo de um esquema quase-lógico:
EXEMPLO
“P1: A santidade da vida constitui-se um valor intrínseco”; “P2: por
isso, todos os seres viventes devem ter sua vida protegida”; logo,
“devemos aprovar leis que protejam animais humanos e não
humanos”. Perceba que existe uma série de elementos nessa
argumentação que dependem de acordos prévios sobre fatos da
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realidade e sobre valores que demandam muito mais argumentação
do que a forma silogística pode abarcar.
Os demais esquemas de ligação, que não poderemos esgotar aqui,
podem ser classificados como:
ESQUEMAS QUE APELAM À
ESTRUTURA DA REALIDADE
Buscam estabelecer uma relação de ligação entre os fenômenos da
realidade e as conclusões que visam defender. Esquemas que
apelam à estrutura da realidade irão trabalhar os dados, fatos e as
sequências de fatos para estruturar suas conclusões. Nesse sentido,
a Nova retórica apresenta tais esquemas em:
Ligações de sucessão: a causalidade dos fatos irá resultar em
revelar causas primeiras, consequências, efeitos etc.
Ligações de coexistência: visam reunir realidades de níveis
diferenciados para que uma dê sustentação à outra.
Diferentemente da ligação de sucessão, que visa demonstrar a
série sucessiva de fenômenos como consequente e inevitável –
por isso explicativa –, a ligação de coexistência visa gerar uma
linha de explicação em que diferentes ordens estão relacionadas,
sendo uma determinante da outra. Um primeiro exemplo dado
por Perelman e Olbrechts-Tyteca (1996) é a da relação entre
essência e aparência. Todavia, nossos autores consideram a
relação entre pessoa e ato uma ligação de coexistência
fundante.
ESQUEMAS QUE ESTABELECEM A
ESTRUTURA DO REAL
Nesses esquemas as ligações de sucessão e coexistências serão
articuladas para fundamentar os acordos sobre os fatos. No
esquema anterior, se partiam de “fatos já existentes”; neste, procura-
se formular o acordo sobre o que podem ser considerados fatos na
argumentação. Aqui são centrais três conhecidas formas nossas:
A argumentação por exemplo: procuramos resolver o desacordo
em torno de um fato, trazendo seus elementos para o caso em
dissenso;
A argumentação por ilustração e modelo: visa dar suporte,
ampliar a força persuasiva de um argumento, aumentando,
assim, a aderência ao acordo;
A argumentação por analogia: visa estabelecer relações entre os
termos, entidades, elementos, do argumento visando ampliar a
adesão à sua concordância.
ESQUEMAS DE DISSOCIAÇÃO
Se esquemas de ligação visam reforçar a estrutura dos argumentos,
as técnicas de dissociação visam evidenciar que determinadas
associações não podem ser feitas, isto é, que certos elementos do
argumento não deveriam ser unidos, mas sim ficar separados,
distintos ou não associados.
Porém, muito mais do que dividir (decompor, analisar), as técnicas
de dissociação visam à restruturação profunda dos elementos do
argumento, procurando recompô-los com outro significado. Não se
trata apenas de dividir, separar, decompor, mas de decompor para
recompor um novo elemento argumentativo capaz de gerar
persuasão.
A dissociação das noções, como a concebemos, consiste num
remanejamento mais profundo, sempre provocado pelo desejo de
remover uma incompatibilidade, nascida do cotejo de uma tese com
outras, trata-se de normas, fatos ou de verdades. Algumas soluções
práticas possibilitam resolver a dificuldade no plano exclusivo da
ação, evitar que a incompatibilidade se apresente, diluí-la no tempo,
sacrificar um dos valores que entram em conflito, ou os dois. A
dissociação das noções corresponde, nesse plano prático, a um
compromisso, mas conduz, no plano teórico, a uma solução que
valerá igualmente no futuro porque, ao reestruturar nossa concepção
do real, ela impede o reaparecimento dessa mesma
incompatibilidade. (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA; 2002).
Então, como o argumento dissociativo se dá? Confira a seguir um
caso prático da Filosofia moral:
EXEMPLO
Diante da crença moral de que matar um ser humano é errado, ao
mesmo tempo admitimos que a legítima defesa é moralmente
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permissível. Nesse caso, estamos diante de uma incompatibilidade:
como matar um ser humano pode ser errado moralmente e a legítima
defesa parece ser razoável? Uma das formas de conseguir resolver
essa incompatibilidade é entender a vida como um bem sob o qual
tenho um direito. Em circunstâncias normais, o direito à vida não
pode ser de forma alguma ameaçado por um terceiro. Mas, se a
minha vida é ameaçada por alguém, posso, então, defender meu
direito à vida contra aquele que me ameaça, uma vez que, ao
cometer um ilícito moral contra mim, aquele que me ameaça
renuncia a seu direito moral a fim de preservar sua própria vida. A
introdução das distinções em torno do direito à vida entra no
argumento para que a dissociação se opere de modo a reconciliar
aquilo que, num primeiro momento, era incompatível.
Na prática jurídica, sobretudo a judicial, os magistrados a todo
momento são levados a fazer distinções para resolver aparentes
conflitos entre as leis. Em alguns casos, essas distinções apelam a
um esquema formal de hierarquia de normas, mapeando a
possibilidade de invalidar uma norma em detrimento da outra por
meio de uma subsunção baseada na compatibilidade ou não da
norma com o ordenamento jurídico.
Contudo, em outros casos, é preciso que o magistrado interprete e
dê solução a um conflito aparente de normas, sem,
necessariamente, invalidar uma delas, mas antes preservando as
duas, ao mesmo tempo que encontra uma solução para a aparente
incompatibilidade.
 ATENÇÃO
Em nosso ordenamento jurídico temos uma diversidade de técnicas
dissociativas para as quais podem apelar os juízes diante de casos
difíceis, entendendo a Lei de Introdução às Normas Brasileira (Lei nº
12.376, de 2010) em seu art. 4º que na omissão da norma o
magistrado poderá decidir pautado na analogia, nos costumes e nos
princípios gerais do Direito.
Se nossa legislação permitiu de início a possibilidade de
reconstrução por meio da dissociação, podemos encontrar nas
práticas interpretativas dos tribunais constitucionais e superiores o
constante exercício dissociativo, à medida que, provocados,
precisam resolver sobre conflitos aparentes de normas, mantendo as
mesmas e sustentando em que casos e de que forma podem ser
compreendidas as noções que lhes sustentam.
Um caso interessante é o da Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental (ADPF) nº 187, mais conhecida como o caso
da marcha da maconha, na qual os ministros do Supremo Tribunal
Federal (STF) decidiram de forma favorável aos manifestantes.
 
Fonte: Shutterstock.com
A marcha da maconha é uma manifestação de cidadãos no mundo
inteiro em favor de mudança das leis em torno do uso da maconha,
sobretudo clamando pela sua legalização, regulamentação do
comércio e seu uso. Ocorre que, no ordenamento jurídico penal
brasileiro, a norma do art. 287 do Código Penal afirma que constitui
crime “fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de
crime: Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa”. Dessa
maneira, manifestar-se a favor da legiferação da economia, do uso,
da medicina etc. envolvendo a maconha constituiria apologia ao
crime?
Eis então que a procuradoria-geral da República demandou que o
referido dispositivo fosse interpretado conforme a Constituição de
modo que as manifestações nãofossem proibidas. O dispositivo
previsto no art. 287 do Código Penal Brasileiro tipifica a apologia ao
crime ou a um criminoso.
Aqui começa o exercício dissociativo do STF:
 
Foto: Fernando2jr/Wikimedia Commons/Domínio Público
MINISTRO CELSO DE MELLO
Em primeiro lugar, por meio do voto do ministro Celso de Melo,
houve uma caracterização da marcha como um evento cultural que
reúne uma série de atividades musicais, literárias, cinematográficas,
discursivas, políticas etc. Em segundo lugar, entendeu à época
decano que debater a descriminalização de um fato não pode ser
constituído um ilícito penal, sendo compreendida a marcha como um
movimento dos cidadãos que não pode ser limitado, ainda que suas
ideias sejam contrárias às da maioria ou pareçam ruins.

 
Foto: Superior Tribunal de Justiça STJ/Wikimedia Commons/licença
CC BY 2.0
MINISTRO LUIZ FUX
Na mesma linha, porém, complementando, o ministro Luiz Fux
entendeu por criar critérios segundo os quais a caracterização da
marcha poderia ser considerada um movimento dos cidadãos na sua
liberdade de expressão. Assim, indicou que as marchas devem ser
pacíficas, que não podem utilizar armas, tampouco incitar a violência,
e que devem ser informadas às autoridades públicas, indicando data,
horário, local e objetivo do evento.
Podemos então perceber que o exercício dissociativo faz parte do
cotidiano do exercício da magistratura. O Direito está repleto de
problemas, conflitos, incompatibilidades, apresentando aos seus
praticantes, a todo momento, a possibilidade de exercer esquemas e
técnicas de dissociação. Estas, muitas vezes, são realizadas para:
Excluir a tipicidade penal de determinado fato;
Excluir a tipicidade tributária de um fato na arena tributária;
Caracterizar uma justa causa na seara trabalhista;
Caracterizar ou descaracterizar um ato como ilícito ou não,
dando ensejo à indenização;
Modular ou não um entendimento acerca dos contratos.
Podemos, então, encerrar com um exemplo do Direito privado:
EXEMPLO
É possível dizer que a função social dos contratos exerce um
papel heurístico de análise de cláusulas contratuais, à medida que
modulam seu exercício para que nenhuma das partes se beneficie
ilicitamente com ganhos que não poderiam ser suportados,
tampouco que haja afetação da sociedade em geral, devendo o
contrato distribuir seus ganhos para além das partes contraentes.
A NOVA RETÓRICA COMO UM
CONVITE À RECONSTRUÇÃO
RACIONAL DAS NOSSAS
PRÁTICAS MORAIS
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Ao final deste módulo, queremos uma vez mais destacar que a Nova
retórica tem por objetivo fundamental apresentar que o mundo
prático, das nossas questões em sociedade, não pode ser
reduzido à investigação empírica da natureza e sua ferramenta
clássica, a lógica formal.
A vida cotidiana moral, política e jurídica abraça nuances muito mais
abrangentes e significativas que a mera regularidade formal da
natureza, o que hoje nem ao menos representa a visão mais
adequada do exercício da realização da ciência, uma vez que
também depende de acordos sobre fatos e valores.
Se os acordos são necessários para que possamos compreender
fatos e valores, será que tais acordos seriam meramente
voluntaristas, dependentes das vontades das partes, sem
objetividade alguma? A Nova retórica apresenta para todos nós a
forma pela qual é possível pensar uma racionalidade discursiva que
seja capaz de articular nossos problemas, nos dando uma
objetividade com a qual podemos lidar, à medida que nos vemos
envolvidos em práticas recíprocas de justificação. A obra de
Perelman e Olbrechts-Tyteca é uma leitura indispensável para o
desenvolvimento da formação de cidadãos e juristas.
 
Fonte: Shutterstock.com
A Nova retórica poderia ser considerada um exercício de
reconstrução da racionalidade das nossas práticas morais cotidianas.
No vídeo a seguir, o especialista Davi José de Souza da Silva
descreve a Nova Retórica de Chaïm Perelman como uma teoria da
argumentação que pretende dar racionalidade ao discurso acerca
dos valores na moral e no Direito.
VERIFICANDO O
APRENDIZADO
1. NA NOVA RETÓRICA , CHAÏM PERELMAN E LUCIE
OLBRECHTS-TYTECA (1996) CONSIDERAM QUE
ARISTÓTELES NÃO LEVOU SERIAMENTE
DETERMINADA MODALIDADE DE DISCURSO.
ASSINALE A SEGUIR A ALTERNATIVA QUE
CORRETAMENTE INDICA QUAL FOI ESSA
MODALIDADE.
A) Deliberativo
B) Judicial
C) Epidíctico
D) Dialético
E) Sofístico
2. LEVANDO EM CONTA A DISTINÇÃO ENTRE
DEMONSTRAÇÃO E ARGUMENTAÇÃO, PODEMOS
AFIRMAR QUE NA NOVA RETÓRICA :
A) Demonstrações científicas são adequadas para fundamentar
nossos acordos morais.
B) Argumentos possuem estrutura lógica, por isso são capazes de
dizer a verdade sobre o mundo.
C) A lógica dedutiva do silogismo é capaz de captar o sentido das
nossas práticas morais.
D) A estrutura argumentativa não se restringe à mera descrição dos
fatos, captando o sentido dos valores em dada comunidade.
E) A racionalidade científica depende, em sua demonstração, de um
empreendimento investigativo coletivo.
GABARITO
1. Na Nova retórica , Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca
(1996) consideram que Aristóteles não levou seriamente
determinada modalidade de discurso. Assinale a seguir a
alternativa que corretamente indica qual foi essa modalidade.
A alternativa "C " está correta.
 
Na Nova retórica , a modalidade de discurso que Aristóteles deveria
ter considerado é o epidíctico. Por estar situado no presente, permite
que se estabeleça uma relação atual entre orador e auditório de
modo a possibilitar um debate sobre os fatos e valores que importam
para a comunidade diante de uma situação concreta.
2. Levando em conta a distinção entre demonstração e
argumentação, podemos afirmar que na Nova retórica :
A alternativa "D " está correta.
 
A argumentação ultrapassa a lógica científica porque é capaz de
captar fenômenos distintos que não se reduzem à causalidade
natural.
MÓDULO 2
 Reconhecer os principais elementos conceituais das teorias
da argumentação de Robert Alexy e Klaus Günther
APRESENTAÇÃO
O objetivo deste módulo é identificar e reconhecer alguns dos
principais elementos de duas teorias da argumentação jurídica para
que possamos melhorar nossa compreensão acerca dos fenômenos
sociais e jurídicos. Para isso, apresentaremos dois autores que
possuem teorias acerca da argumentação aplicadas ao Direito.
Diferentemente de Perelman e Olbrechts-Tyteca, esses dois
pensadores não estavam formulando uma teoria geral da
argumentação para explicar como nossos acordos sobre valores
podem ser racionais – na vida em sociedade, na política ou no
Direito.
As teorias que abordaremos aqui, de Robert Alexy e Klaus Günter,
foram apresentadas inicialmente para resolver problemas específicos
do Direito e que poderiam ser reunidas de forma didática num
questionamento: como as decisões judiciais podem ser
consideradas racionais?
ROBERT ALEXY
 
Fonte: Foto: Contrib32523/Wikimedia Commons/CC BY-SA 4.0
 Robert Alexy.
Alexy é, de longe, um dos mais influentes e ricos pensadores do
Direito de tradição romano-germânica. Sua obra tem alcance em seu
país de origem, Alemanha, e nos países continentais europeus,
como Espanha e Portugal, e na América Latina, tendo grande
impacto em nosso país, na Argentina, no Peru etc.
Desde 2008, Robert Alexy tem recebido uma série de títulos de
Doutor Honoris Causa , muitos deles em universidades brasileiras,
como a Universidade Federal do Piauí, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Universidade Federal do Rio de Janeiro,
Universidade do Estado do Amazonas e Universidade Federal de
Roraima.
Neste módulo veremos, principalmente, os pontos centrais expressos
por Robert Alexy na sua tese de doutorado, já citada, a Teoria da
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argumentação jurídica , daqui em diante denominada TAJ.
ROBERT ALEXY
Nascido em 1945 na cidade de Oldenburgo, tem uma carreira
acadêmica de ampla envergadura. Graduado em Direito e
Filosofia pela Universidade Georg-August em Göttingen,Alemanha, em 1978 obteve o título de doutor em Filosofia com a
obra Teoria da argumentação jurídica (2001). Em 1984, obteve
a livre-docência com a sua tese Teoria dos direitos
fundamentais (2015). Alexy hoje ocupa a cadeira de Direito
público e Filosofia do Direito da Universidade Christian-Albrechts
de Kiel (Alemanha).
PROBLEMA DA JUSTIFICAÇÃO
DAS SENTENÇAS JURÍDICAS
Robert Alexy (2001) apresenta o problema de plano: como justificar
as decisões dadas pelos juízes em suas sentenças?
Tal questionamento é ampliado quando se enxerga a insuficiência
dos métodos de raciocínio lógico-formal diante dos desafios da
decisão judicial. A aplicação dedutiva de normas encontra muitas
dificuldades diante de pelo menos quatro problemas apontados por
Robert Alexy:
I
A linguagem jurídica é imprecisa, portanto, cheia de ambiguidades,
vaguezas, indeterminações etc.
II
Normas jurídicas entram em conflitos – vimos com Perelman e
Olbrechts-Tyteca que uma norma pode ter exatamente o sentido
contrário da outra.
III
Casos novos e novas situações podem surgir e não estar previstos
em uma norma jurídica prévia.
IV
Casos especiais, situações únicas, ímpares, em que podem
demandar novas decisões, diferente das que foram dadas até aqui.
O desafio é conseguir sistematizar a justificação das decisões
judiciais. A primeira tentativa de sistematização se deu com o
estabelecimento de cânones interpretativos. Porém, mesmo que
esses cânones tenham se desenvolvido (utilizados até hoje, por
exemplo, “normas penais são interpretadas restritivamente”), os
estudiosos da metodologia jurídica (o que poderíamos chamar,
atualmente, de hermenêutica jurídica) não conseguiram chegar a um
acordo sobre a quantidade de regras interpretativas, se possuem
alguma hierarquia, qual a sua natureza, sua utilização de forma
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prioritária etc. Uma segunda tentativa se deu com a conclusão de
que seria impossível tratar da decisão judicial e avançar
possibilidades de justificação do processo decisório dos juízes sem o
apelo aos valores.
Essa segunda tentativa de resposta introduziu de maneira bastante
conclusiva a ideia de que não há como decidir casos sem que se
recorram a valores. Porém, mesmo com a introdução do valor como
elemento da decisão judicial, muitas dúvidas sobrevieram, por
exemplo: como se dá a relação entre os valores e os cânones
interpretativos?
Introduzir os valores nas decisões judiciais não diminuiu a demanda
por justificação, levando a questionamentos centrais feitos por
Robert Alexy (2001), como veremos a seguir.
Até que pontos os valores são necessários no julgamento?
Como os julgamentos de valor se relacionam com os cânones da
interpretação jurídica e da dogmática?
Os julgamentos de valor podem ser racionalmente justificáveis?
Mas será que a introdução dos valores nas decisões judiciais levaria
necessariamente a um subjetivismo? Três repostas a esse problema
foram dadas.
PRIMEIRA TENTATIVA
SEGUNDA TENTATIVA
TERCEIRA TENTATIVA
PRIMEIRA TENTATIVA
Segundo Robert Alexy, deu-se com a possibilidade de justificar as
decisões judiciais com valores universais ou com valores específicos
de uma comunidade. Porém, o problema de como justificar as
decisões judiciais permanece ante a multiplicidade de valores,
comunidades e fatos.
SEGUNDA TENTATIVA
Deu-se com a possibilidade de justificar os valores das decisões
judiciais fazendo referência ao próprio ordenamento jurídico. Todavia,
a multiplicidade das normas, de sua hierarquia, de momentos e fatos
também traz imensa dificuldade para que se encontre uma
metodologia capaz de dar conta da justificação das decisões judiciais
baseada em valores.
TERCEIRA TENTATIVA
A última tentativa levantada por Robert Alexy é o apelo a uma ordem
valorativa “objetiva” e “transcendente”, portanto atemporal, com o
jusnaturalismo. Nesse caso, o problema ainda permanece: como
saber qual dos valores deve ser utilizado na ordem suprapositiva?
Por último, caberia apenas aos dados empíricos, mas estes não são
passíveis de fundar normas.
UMA TEORIA ANALÍTICO-
NORMATIVA
Para tentar solucionar o problema de justificação com base em
valores de decisões judiciais, Robert Alexy propõe conceber a
atividade jurídica como um discurso prático. Discurso porque é uma
atividade essencialmente linguística, argumentativa; prático porque
trata de normas, ou seja, do estabelecimento de padrões coercitivos
para a conduta. Alexy (2001) concebe então que o “discurso jurídico
é um caso especial do discurso prático geral”.
Como discurso, poderíamos pensar que o discurso jurídico pode ser
visualizado em pelo menos três possibilidades:
EMPÍRICO
ANALÍTICO
NORMATIVO
EMPÍRICO
Visa descrever o discurso em frequência, relevância, motivações,
situações e outros elementos que podem caracterizar o discurso do
ponto de vista dos fatos. Nessa abordagem, deve ser estudado por
cientistas sociais.
ANALÍTICO
Dedica-se à análise da estrutura do discurso pelo ponto de vista da
lógica.
NORMATIVO
Visa propor critérios justificatórios para a prática judicial.
Considerando essas três formas de abordagem, Alexy entende que
sua teoria é uma proposta analítico-normativa. Analítica porque
pretende demonstrar a estrutura interna dos discursos jurídicos como
um caso especial do discurso prático geral. Normativa porque visa
prescrever em que situações, circunstâncias e regras uma decisão
judicial pode ser justificada. Para isso, pretende desenvolver os
“critérios em que pode ser considerada racional uma decisão judicial”
(ALEXY, 2001). Uma vez que o discurso jurídico é um caso especial
do discurso prático, Robert Alexy já nos diz que uma das primeiras
implicações dessa constatação é o fato de que o discurso jurídico
opera sobre circunstâncias limitadoras determinadas pelo próprio
ordenamento jurídico. O ordenamento jurídico possui limites
impostos por si mesmo, devendo a decisão judicial, como caso
especial do discurso prático geral, atender a esses constrangimentos
impostos pelo ordenamento.
Um segundo aspecto a ser enfrentado pela TAJ concerne à relação
entre discurso jurídico e discurso prático geral, entre argumentação
jurídica e argumentação prática geral. Nesse sentido, estamos diante
da relação entre Direito e moral, aqui traduzidos em termos de teoria
da argumentação. Segundo Robert Alexy (2001), essa relação tem
sido descrita em pelo menos três possibilidades:
TESE DA SUBORDINAÇÃO
TESE DA SUPLEMENTAÇÃO
TESE DA INTEGRAÇÃO
TESE DA SUBORDINAÇÃO
A justificação das decisões judiciais é fundamentada no argumento
prático geral, sendo o argumento jurídico meramente subordinado a
este, uma forma de legitimação secundária ao argumento prático.
TESE DA SUPLEMENTAÇÃO
Os argumentos jurídicos têm limites e quando os alcançam passam a
ser suplementados por argumentos morais.
TESE DA INTEGRAÇÃO
Quando são combinados argumentos jurídicos e argumentos morais.
DISCURSO JURÍDICO COMO
CASO ESPECIAL DO
DISCURSO PRÁTICO
Um discurso prático é um argumento sobre normas morais. Assim,
um conselho, “você deveria estudar mais hermenêutica”, faz parte de
um discurso prático. Uma regra proibindo entrar de sapatos em casa
é um discurso prático. Uma orientação médica é um discurso prático.
Uma norma de trânsito é um discurso prático.
Trata-se de discurso no âmbito de uma conversação que se
comunica por meio de uma linguagem comum. Trata-se de prático
no sentido de que estabelece regras para o comportamento dos
agentes. Padrões de conduta.
Mas em que condições podemos considerar válida a formulação
desses discursos que afetam nosso comportamento?
A teoria de Alexy é uma teoria justificatória, porque se preocupa em
investigar em quais condições podemos considerar válido um
discurso prático geral. Mas qual é a forma desse discurso prático
geral?
REGRAS DO DISCURSO PRÁTICO
GERAL
Robert Alexy (2001) entende em primeiro lugar as regras básicas:
“Nenhum orador pode se contradizer.”“Todo orador pode afirmar apenas aquilo em que crê.”
“Todo orador que aplique um predicado F a um objeto tem de
estar preparado para aplicar F a outro objeto que seja
semelhante a Z em todos os aspectos importantes.”
“Diferentes oradores podem não usar a mesma expressão com
diferentes significados.”
Somadas às regras básicas do discurso prático geral, temos as
regras da racionalidade do discurso prático geral. Nesse caso,
Alexy (2001) quer nos demonstrar quando um discurso prático geral
pode ser considerado racional, portanto, válido. Assim:
“Todo orador tem de dar razões para o que afirma quando lhe
pedem para fazê-lo, a menos que possa citar razões que
justifiquem uma recusa em dar justificação” – Regra geral de
justificação.
e.1. “Qualquer pessoa pode participar de um discurso.”
Da regra geral de justificação decorrem, ainda, as regras que regem
a liberdade de discussão:
e.1.1 “Todos podem transformar uma afirmação num problema.”
e.1.2 “Todos podem introduzir qualquer afirmação no grupo.”
e.1.3 “Todos podem expressar suas atitudes, seus desejos e
necessidades.”
e.1.4 “A liberdade de discurso é importante no discurso prático.”
Por último, a regra que visa proteger o discurso de qualquer
coerção:
“Nenhum orador pode ser impedido de exercer os direitos
estabelecidos por qualquer tipo de coerção interna ou externa.”
Somadas, (e) e (f) podem ser consideradas o que Robert Alexy
(2001) denomina de regras de racionalidade do discurso.
Existem ainda as “regras para partilhar a carga da argumentação”,
que irão distribuir os encargos de justificar o discurso; as “regras de
justificação” (ALEXY, 2001), conjunto de regras que testa a validade
das regras sendo aplicadas, e que, em sua maioria, constitui testes
de generalização; as “regras de transição” (ALEXY, 2001), para
resolução de problemas tais como questões de fato, previsão de
consequências etc. Considerando que discurso jurídico é um caso
especial do discurso prático geral, resta explicitar as suas regras,
lembrando que há uma conexão com o discurso moral.
REGRAS DO DISCURSO JURÍDICO
Visto o discurso prático geral, Robert Alexy (2001) parte para definir
as regras do discurso jurídico. Assim, a primeira consideração é a de
que a argumentação jurídica se diferencia em relação à
argumentação prático geral no sentido de que a primeira possui uma
ligação com as normas jurídicas, sendo caracterizada por ligar-se de
alguma forma “com a lei válida”. A consequência dessa ligação é que
o discurso jurídico possui certas limitações impostas pelo
ordenamento jurídico, e tais limitações, segundo Alexy (2001), não
estão abertas ao debate. Dessa maneira, Alexy está nos
demonstrando que os cânones e elementos jurídicos existentes na
ordem positiva, seja na legislação, seja na dogmática jurídica,
restringem o campo de atuação do discurso jurídico – limitações que
o discurso prático geral não tem.
O discurso jurídico precisa se justificar de tal forma que consiga ser
considerado pertinente ao ordenamento jurídico. Por isso, Robert
Alexy (2001) indaga:

[...] A EXIGÊNCIA DE CORREÇÃO, NA
VERDADE, TAMBÉM SURGE NO
DISCURSO JURÍDICO, MAS ESSA
EXIGÊNCIA, DIFERENTEMENTE DO
DISCURSO PRÁTICO GERAL, NÃO SE
PREOCUPA COM A RACIONALIDADE
ABSOLUTA DA AFIRMAÇÃO
NORMATIVA EM QUESTÃO, MAS
APENAS COMO MOSTRAR QUE PODE
SER RACIONALMENTE JUSTIFICADA
NO CONTEXTO DE VALIDADE DA
ORDEM JURÍDICA PREVALECENTE?
A teoria do discurso jurídico como caso especial do discurso prático
visa responder a esse questionamento. Para tanto, Robert Alexy
(2001) apresenta os seus traços. Vejamos seus elementos principais.
Em primeiro lugar, Alexy entende que um discurso jurídico precisa
ser justificado duplamente:
Justificação interna
De um ponto de vista interno, precisa demonstrar que seus
argumentos são corretos se suas premissas levam às conclusões
defendidas – assim, um argumento jurídico precisa ter justificação
interna.

Justificação externa
Saber se as premissas escolhidas pelo argumento são em si
justificáveis, sem considerar a relação com as conclusões, é a tarefa
para as regras da justificação externa.
Na sequência dos argumentos de Robert Alexy, comecemos pelas
regras de justificação interna. Tais regras dizem respeito à estrutura
do silogismo jurídico e à forma pela qual pode ser considerado
racional. Na formulação básica de todo e qualquer silogismo temos
que uma norma jurídica pode enunciar:
p¹: Todo guarda de trânsito deve usar identificação.
p²: Marco Antônio é guarda de trânsito; logo, deve usar distintivo.
Robert Alexy justifica racionalmente a lógica interna do argumento
apresentado aqui, baseando-se em algumas regras:
REGRA 1
REGRA 2
REGRA 3
REGRA 4
REGRA 1
Primeiramente, temos o princípio da universalizabilidade que
fundamenta a justiça formal segundo a qual não é possível tratar
casos desiguais de maneira desigual. O quantificador [todo]
presente no silogismo impõe um elemento de universalizabilidade
que alcança a exigência normativa de se tratar igualmente todos os
casos que estejam na mesma categoria (ALEXY, 2001).
REGRA 2
Por conseguinte, surgem duas outras regras: “ao menos uma norma
universal precisa ser aduzida na justificação de um argumento
jurídico”.
REGRA 3
E “um julgamento jurídico precisa seguir logicamente ao menos uma
norma universal juntamente com outras afirmações”.
REGRA 4
Mas é possível que uma primeira demonstração não seja suficiente,
sobretudo considerando casos difíceis: “tantos
passos/desenvolvimento quanto possíveis devem ser articulados”
para que as regras anteriores sejam passíveis de serem aplicadas na
justificação de decisões judiciais (ALEXY, 2001).
Consideradas em conjunto, pode-se afirmar que essas regras da
justificação interna da decisão judicial formam a racionalidade interna
do argumento judicial. Sua estrutura reunida compõe o que Alexy
(2001) denomina “regras e formas da justiça formal”. Todavia, essas
regras não garantem plenamente a racionalidade das decisões
judiciais. É preciso um segundo passo: as regras de justificação
externa.
Para Robert Alexy (2001), no processo de justificação racional de
uma decisão judicial, suas premissas podem ser de três tipos:
Baseadas no Direito positivo, na lei;
Baseadas em afirmações empíricas;
Premissas que não são baseadas na lei nem nas afirmações
empíricas.
Esses tipos de argumentos não são estanques e podem se
relacionar. Por isso, Alexy organiza as formas de justificação externa
em seis grupos: (i) estatuto; (ii) dogmática; (iii) precedente; (iv) razão;
(v) fatos; e (vi) formas específicas de argumentos jurídicos.
Trataremos de quatro deles a seguir:
(I) ESTATUTO
Lida com a questão empírica trazida ao discurso judicial. Quando se
fala em questão empírica, está se falando de questões pertinentes às
normas jurídicas, quando foram produzidas, quais são superiores a
outras, se uma norma atual revoga uma passada etc. Trata-se da
empiria da norma. Quais fatos deverão ser considerados na relação
de pertinência ou não das normas. É impossível descrever todas as
situações e os elementos da empiria que podem ser aduzidos a um
discurso jurídico. Ao mesmo tempo, existem limitações temporais.
Por último, o discurso jurídico não se reduz aos dados da empiria.
Para resolver a relação entre a empiria e as decisões judiciais,
cânones de interpretação foram desenvolvidos pela prática e teoria
jurídica. Alexy (2001) os enumera:
Argumentos semânticos: quando um argumento é justificado
em função de seu significado fazer parte da compreensão
daquela comunidade sobre determinado termo.
Argumentos genéticos: quando uma interpretação é justificada
por fazer parte da intenção do legislador.
Argumento histórico: quando a história jurídica do caso é
trazida para justificar ou não um argumento.
Argumento comparativo: quando justifica decisões atuais com
decisões do passado ou de outro ordenamento jurídico.
Argumento sistemático: quando justifica uma decisão com
base na posição de umanorma ou na relação que ela tem com
outras normas.
Argumento teleológico: quando justifica uma decisão judicial
com base em determinados fins.
Para dar racionalidade discursiva a esses cânones, Robert Alexy
(2001) propõe as regras descritas a seguir.
Saturação: todos os argumentos pertencentes aos cânones
devem ser saturados, ou seja, esgotados (REGRA 5).
Precedência da vontade da lei ou do legislador: os argumentos
pertinentes à vontade da lei ou do legislador devem ter
precedência sobre outros argumentos, devendo haver
justificação quando não for o caso (REGRA 6).
Argumentos de diferentes formas devem obedecer a regras de
pesagem (REGRA 7).
Todos os argumentos produzidos sobre as condições de
liberdade do discurso jurídico podem contar como pertencentes
ao cânone jurídico e merecem a devida consideração (REGRA
8).
(II) DOGMÁTICA
A dogmática jurídica representa, para Robert Alexy (2001), a ciência
do Direito em seu sentido mais estrito, concernente a pelo menos
três atividades:
Descrever a lei em vigor, denominada descritiva-empírica;
Conceituar e sistematizar a lei, denominada lógica-analítica;
Propor soluções aos problemas jurídicos, denominada
normativa-prática.
Para que as proposições dogmáticas sejam consideradas racionais
no momento do discurso jurídico, a TAJ considera que “toda
proposição dogmática tem de ser justificada com recurso, ao menos
um argumento prático geral, sempre que estiver sujeita a dúvida”
(REGRA 9); “Toda proposição dogmática tem de ser capaz de passar
num eixo sistemático tanto no sentido mais estreito quanto num
sentido mais amplo” (REGRA 10); e “sempre que argumentos
dogmáticos forem possíveis, eles devem ser usados” (REGRA 11).
(III) PRECEDENTES
Um precedente é uma decisão judicial anterior que estabelece o
padrão de decisão para o caso vinculando todas as decisões
judiciais que possuam os mesmos critérios para que decidam da
mesma maneira ou impondo a todas as decisões judiciais que
possuam critérios análogos o ônus de justificar por que decidirão de
forma diferente. Robert Alexy (2001) considera que usar os
precedentes atende ao princípio da universalizabilidade, à medida
que é uma exigência da justiça formal tratar casos com os mesmos
critérios de modo igual. A TAJ considera que, se um precedente vier
a ser utilizado, duas regras devem ser seguidas: “se um precedente
pode ser citado a favor ou contra uma decisão, ele deve ser citado”
(REGRA 12); “quem desejar partir de um precedente fica com o
encargo do argumento” (REGRA 13).
(IV) FORMAS ESPECIAIS DO
ARGUMENTO JURÍDICO
Alexy (2001) entende que são formas especiais do argumento
jurídico os seguintes casos: analogia, argumentos e contrário,
argumentum a fortiori e argumentum ad absurdum . Já estudamos
neste tema a analogia, que é o oposto ao argumento e contrário, pois
apela para as diferenças e não para as semelhanças. O argumento a
fortiori é um clássico argumento jurídico, pautado na ideia de que
uma razão mais forte deve prevalecer, também conhecido pelo
brocardo “quem pode no mais, pode no menos”. Assim, por exemplo,
“se estou autorizado a fazer reforma na casa, por força do contrato
de aluguel, então estou autorizado a pintar as suas paredes”, pois
“se posso reformar uma casa, posso pintar suas paredes”. O
argumento ad absurdum , diante de um argumento, pode ser
descartada uma das suas conclusões pelas consequências
esdrúxulas ou ridículas. Para essas formas de argumento, a TAJ
entende que uma decisão judicial, se pautada nelas, será racional
quando “formas especiais de argumento jurídico têm de ser razões
para serem afirmadas plenamente, isto é, devem alcançar a
saturação”.
Conhecidas as regras, fizemos um resumo para você. Tal resumo
está na obra original de Robert Alexy (2001).
REGRAS DO DISCURSO JURÍDICO
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Regras da justificação interna
1.1 Ao menos uma norma universal tem de ser aduzida na
justificação de um argumento jurídico.
1.2 Um julgamento jurídico tem de seguir logicamente ao
menos uma norma universal juntamente com outras
afirmações.
1.3 Sempre que houver uma dúvida se a é um T ou um M,
deve ser apresentada uma regra que resolva a questão.
1.4 O número de passos e de decomposição requerido é
aquele número que torna possível o uso de expressões cuja
aplicação em dado caso não admita mais disputas.
1.5 Devem ser articulados tantos passos de decomposição
quantos forem possíveis.
Regras da justificação externa
2.1 Não existe elaboração para regras e formas especiais.
2.2 Regras e formas de interpretação.
2.2.1 Regras de interpretação semântica
2.2.1.1 Em razão de W¹, R’ tem de ser aceito como
uma interpretação de R’.
2.2.1.2 Em razão de W², R’ não pode ser aceito
como uma interpretação de R’.
2.2.1.3 É possível fazer ambos, aceitar ou não
aceitar R’, como uma interpretação de R, desde que
nem W¹ nem W¹ se mantenham.
2.3 Regras para os cânones
2.3.1 Saturação, todo argumento que pertença aos
cânones deve ser saturado.
2.3.2 Argumentos que dão expressão à vontade da lei e
do legislador têm precedência sobre os demais
argumentos, mesmo se houver razões para que a
precedência seja revogada.
2.3.3 Argumentos de diferentes formas devem se
conformar às regras de pesagem.
2.3.4 Todo argumento possível que possa ser proposto
de tal modo que não possa ser cotado como um dos
cânones da interpretação deve obter a devida
consideração.
2.4. Regras da argumentação dogmática
2.4.1 Regra geral para os precedentes.
2.4.1.1 Se um precedente puder ser citado a favor ou
contra uma decisão, ele deve ser citado.
2.4.1.2 Quem quiser partir de um precedente fica com o
encargo do argumento.
2.5 Formas especiais de argumentos jurídicos
2.5.1 Formas de argumentos jurídicos especiais devem ter
razões para ser citadas por completo, isto é, tem de chegar à
saturação.
Identificar o discurso jurídico com um caso do discurso prático geral
é uma forma de dar racionalidade às decisões judiciais, retirando
delas a possível acusação de subjetivismo. A análise de Robert
Alexy nos dá um quadro em que podemos nos orientar de maneira
racional. Evidentemente, suas proposições são passíveis de crítica,
mas, ao fazê-las, já admitimos o jogo da argumentação – portanto,
passamos a acreditar que é possível fundamentar as decisões
judiciais de modo racional.
No vídeo a seguir, o especialista Davi José de Souza da Silva
descreve o pensamento de Alexy sobre a justificativa das decisões.
KLAUS GÜNTHER
Nesta última etapa do nosso módulo sobre teorias da argumentação
jurídica, veremos os principais elementos teórico-conceituais da obra
Teoria da argumentação no Direito e na moral: justificação e
aplicação (2004), do jurista alemão Klaus Günther. É
reconhecidamente um filósofo e jurista preocupado com uma
diversidade de temas, desde o Direito penal até as formas de
justificação da decisão judicial. Neste módulo traremos suas
contribuições para a teoria da argumentação, nos concentrando,
sobretudo, na argumentação jurídica.
A obra é apresentada pelo professor Luis Moreira (GÜNTHER,
2004), que nos explica sua organização:
KLAUS GÜNTHER
Considerado um membro da terceira geração da Escola de
Frankfurt, Klaus Günther é professor na Göethe-Universität, em
Frankfurt am Main, na Alemanha.
1ª PARTE
2ª PARTE
3ª PARTE
4ª PARTE
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1ª PARTE
É dedicada ao problema da aplicação na ética do discurso – Klaus
Günther indaga se seria possível que discursos de fundamentação
fossem substituídos por discursos de aplicação.
2ª PARTE
Aborda o problema de aplicação de normas no desenvolvimento da
consciência moral.
3ª PARTE
Estuda o processo de adequação na moral, no qual são analisados
os problemas de colisão de normas e os elementos de uma lógica da
adequação na argumentação moral.
4ª PARTE
É dedicada à análise das argumentações de adequação no Direito,
em que se analisa as formas de diferenciação entre Direito e moral
na ética do discurso e o problema da indefinição dasnormas
jurídicas.
Klaus Günther (2004) prefacia sua obra nos afirmando que sua tese
principal é a de que não é possível abdicar da razão prática. Por
razão prática podemos entender a moralidade como sistema
normativo capaz de fornecer princípios e regras orientadores do
comportamento e da conduta.
Quando Klaus Günther nos diz que não é possível abrir mão da
razão prática, ele está nos informando que sem a moral, no contexto
da aplicação do Direito, sobretudo da decisão judicial, não
poderemos dar decisões que possam atender às expectativas das
partes interessadas na realização da justiça.
Por isso, Klaus Günter retoma o exemplo do caso Riggs versus
Palmer (que chamaremos de exemplo 1):
EXEMPLO 1
O herdeiro Elmer E. Palmer, sabendo que seu avô modificaria o
testamento, não lhe deixando herança, cometeu assassinato, tirando
a vida de seu avô. O caso ocorreu no estado de Nova York, nos
Estados Unidos, e à época não existia uma norma jurídica positiva,
uma lei, um decreto etc. que proibisse um indivíduo que mata seu
“genitor” de herdar seus bens. Apesar do processo criminal, Elmer
estaria, por ausência de previsão legal positiva, habilitado a receber
a herança. As tias de Elmer ajuizaram ação para invalidar o
testamento deixado por seu pai, solicitando a exclusão do sobrinho
do testamento. A Corte de Apelações do Estado de Nova York
entendeu que Elmer não poderia herdar se beneficiando de seu
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crime, recorrendo ao princípio geral de que ninguém pode se
beneficiar de sua própria torpeza.
Klaus Günther retoma esse caso para nos dizer que, sem a utilização
da razão prática, esse caso não poderia ter sido resolvido. Para
Günther, a relação entre moral e Direito será fundamental, pois o
Direito será subordinado à moral. Todavia, não apenas na busca ou
definição de princípios corretos para os casos a moralidade será
necessária. No momento da aplicação também será necessária, pois
o “senso de equidade não se revela apenas em seguir princípios
corretos, mas também em aplicá-los de forma imparcial
considerando todas as condições especiais” (GÜNTHER, 2004).
Com isso, Günther está querendo nos dizer que não bastam apenas
discursos de justificação, mas é necessário também que consigamos
estabelecer discursos de aplicação da moral e do Direito.
Em outras palavras, apenas critérios que estabeleçam a
racionalidade do argumento de fundamentação da decisão, ou seja,
que informam que a Decisão D é racional em função de R, não são
suficientes, pois é preciso saber se a racionalidade R é adequada
para o caso C.
Vejamos outro exemplo:
EXEMPLO 2
Imagine que você se comprometeu com uma agenda de trabalho a
estar no escritório às 20h, porém, no caminho para o compromisso,
você encontrou uma pessoa ensanguentada na rua e parou para
ajudá-la. Percebamos que, nesse caso concreto, você está diante da
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obrigação de comparecer ao escritório e, ao mesmo tempo, de salvar
alguém em perigo. Nesse caso, qual decisão seria mais adequada
ao caso? Atentemos para o fato de que não é a justificação das
regras de salvamento ou de cumprimento de promessas que está em
causa, mas sim de qual norma parece mais apropriada ao caso
concreto.
Para demonstrar a necessidade de adequação, Günther inicia com a
distinção entre discursos de justificação e discursos de
aplicação.
Nos discursos de justificação o que se procura fazer é encontrar o
critério que estabelece quando uma norma moral pode ser
considerada válida. Günther resgata a ética do discurso de Jürgen
Habermas para sustentar que uma norma moral é válida quando
obedece ao princípio de universalização (PU) da ética do discurso.
Assim, para que compreendamos:
Para a ética do discurso, uma norma é considerada válida quando
pode contar com a concordância de todos aqueles diretamente
atingidos por ela.
Esse critério de validade exige um teste de universalização em que o
critério é a inclusão do maior número de participantes envolvidos na
justificação da norma. Todavia, ainda que PU seja realizado,
podemos considerar que, em algum momento, não conseguirá incluir
a todos, tampouco nas deliberações sobre ele conseguirá incluir
todas as situações possíveis em que o caso se aplique. Dessa
maneira, ainda haverá espaço para indeterminação da validade da
norma, bem como da sua aplicação.
Para resolver o problema de aplicação, Günther, então, concebe que
é possível ter uma versão “fraca” de PU. Essa versão fraca
consistiria em entender as limitações temporais, espaciais, físicas,
relacionais etc. Decidir pela validade de uma norma na versão forte
de PU significa que teríamos de emular muitos cenários para que
fosse considerada válida para todos os casos possíveis, e
consideradas todas as coisas possíveis. Tal possibilidade não só é
inverossímil como também representaria, num cenário ideal, um
ônus cognitivo impossível de ser realizado. Günther (2004) propõe
uma versão fraca de PU segundo a qual uma norma pode ser
considerada válida se “[...] as respectivas consequências e os
respectivos efeitos colaterais, que resultem de seu cumprimento
geral para a satisfação dos interesses de cada indivíduo, possam ser
aceitos por todos os envolvidos (e preferidos aos efeitos das
conhecidas opções de regulamentação)”.
 
Fonte: Shutterstock.com
 
Fonte: Shutterstock.com
Na visão de Günther, essa formulação mais fraca introduz a ideia de
imparcialidade na fundamentação. Ao fazer isso, abre-se o caminho
para definir quais são os critérios da imparcialidade, o que levaria a
um princípio da aplicação imparcial de normas. A versão fraca de
PU passa a justificar normas prima facie que demandam a
consideração imparcial de todos os envolvidos no caso, testando os
seus interesses, dada uma situação específica. Por isso, para
Peterson (1996), “o sentido pleno da razão prática imparcial é
completado apenas quando se pode determinar o sentido de
adequação dos discursos imparciais de aplicação, de modo a testar
a adequação de normas levando em consideração todas as
características de uma situação concreta”. Concordamos que na
visão de Günter sobre a imparcialidade, os discursos de justificação
são baseados numa “relação de interesses”, enquanto os discursos
de aplicação são baseados numa “relação situacional” (PETERSON,
1996).
Como considerar os discursos de aplicação?
 RESPOSTA
O discurso de aplicação, na teoria de Günther, passa a operar a
possibilidade de combinar a validação universal com as propriedades
situacionais do caso concreto. Günther traz o contexto para dentro
do debate da argumentação, sem perder de vista o critério de
validade de PU, que é a consideração de todos os atingidos. A
imparcialidade, introduzida pela necessidade de avaliar os interesses
recíprocos, passa a ser um critério que depende de uma descrição
mais completa possível do contexto de aplicação da norma. Assim,
as normas precisam ser ponderadas prima facie , diante do caso.
No caso concreto, se estivermos diante da aplicação aparente de
duas normas ao mesmo caso, Günther propõe como metodologia
duas soluções.
Colisão interna
Nesta metodologia, duas normas aparentam ser conflitantes. Diante
de uma situação, devemos aplicar PU na versão fraca e verificar qual
norma deixa de atender ao interesse de todos os envolvidos. Assim,
a norma que viola o interesse dos envolvidos é considerada inválida.

Colisão externa
Esta metodologia corresponde à necessidade de considerar os fatos
e as circunstâncias que têm relevância para o caso, sem que haja a
invalidade de uma das normas, pois a adequação determinará a
aplicação de uma norma e o afastamento da outra.
Em ambos os casos, é necessário que haja uma descrição
situacional completa que leve em consideração as características do
caso de modo que seja demonstrada a sua relevância moral. O
exemplo dado por Günther para verificar a necessidade de uma
descrição situacional que gere relevância e adequação moral é o
aparente conflitoentre o amigo que promete ir à festa e deixa de
fazê-lo, porque precisa salvar alguém que aparece para ele enfermo.
Então, se Marco prometeu ir à festa de Flávia, mas, no dia da festa,
no caminho, precisou salvar Luis Antônio, que estava à beira da
morte na avenida, cabe dizer que Marco descumpriu a promessa que
fizera a Flávia? Marco entrou num ilícito moral? A reposta ao
questionamento dependerá da capacidade de descrever essa
situação de maneira a destacar as propriedades morais relevantes
do caso, que atraem prima facie a aplicação daquela que é a norma
mais adequada para o caso.
O último teste então se dá quando a norma adequada ao caso está,
também, coerente com o conjunto de normas válidas do
ordenamento jurídico. Exerce esse princípio formal de coerência
uma força holística entre os discursos de aplicação e os discursos de
justificação. Podemos concluir, então, acompanhando Keberson
Bresolin (2016), que em Günther:
A adequabilidade depende da descrição situacional completa do
caso, da seleção das características relevantes do caso, da
seleção de normas relevantes para o caso e de sua aplicação
prima facie num sentido holístico entre relevância e adequação;
Os discursos de justificação buscam a validade das normas;
Os discursos de aplicação buscam indicar a norma adequada
para o caso, considerando as circunstâncias relevantes;
Com um PU “fraco”, normas podem ser consideradas válidas
quando atendem aos interesses recíprocos de todos;
Segundo o princípio formal da coerência, a norma adequada
deve estar em coerência formal com as demais normas do
sistema jurídico.
VERIFICANDO O
APRENDIZADO
1. NA TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO DE ROBERT
ALEXY, PODEMOS CONSIDERAR QUE O QUE
JUSTIFICA, DO PONTO DE VISTA INTERNO, O
DISCURSO JURÍDICO É O PRINCÍPIO:
A) Da inclusão
B) Da racionalidade
C) Da veracidade
D) Da pertença
E) Da universalizabilidade
2. NA TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO, EM KLAUS
GÜNTHER, HÁ UMA ÉTICA QUE SUSTENTA SUAS
FORMULAÇÕES:
A) Ética das virtudes
B) Ética utilitarista
C) Ética consequencialista
D) Ética do discurso
E) Ética das preferências
GABARITO
1. Na teoria da argumentação de Robert Alexy, podemos
considerar que o que justifica, do ponto de vista interno, o
discurso jurídico é o princípio:
A alternativa "E " está correta.
 
Um discurso é justificável internamente se atende ao princípio da
universalizabilidade, que estabelece que “há uma obrigação de tratar
de certo modo todas as pessoas que pertencem à mesma categoria”
(ALEXY, 2001).
2. Na teoria da argumentação, em Klaus Günther, há uma ética
que sustenta suas formulações:
A alternativa "D " está correta.
 
A teoria ética que sustenta a teoria da argumentação de Klaus
Günther é a teoria do discurso do filósofo alemão Jürgen Habermas.
São válidas todas as normas que passam pelo teste do PU, segundo
o qual são consideradas válidas todas as normas cujo consentimento
seja dado por todos aqueles diretamente atingidos por elas.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Visitamos três das principais teorias da argumentação que têm forte
impacto sobre o nosso pensamento moral e jurídico.
Como pudemos ver, a racionalidade prática não se deixa reduzir a
uma forma lógica e demonstrativa. Nesse aspecto, para garantir uma
objetividade em nossos debates morais e jurídicos, faz-se necessário
estabelecer critérios capazes de serem recursivamente criticados e
justificados perante os indivíduos e a sociedade.
Esperamos que com as teorias da argumentação aqui apresentadas
o seu senso crítico fique mais aguçado diante dos necessários
debates que você fará ao longo de sua jornada como cidadão
político, indivíduo ético e profissional.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. São Paulo:
Landy Editora, 2001.
ALEXY, Robert. Teoria discursiva do Direito. Organização de
Alexandre Travessoni Gomes Trivisonno. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2014.
ATIENZA, Manuel. As razões do Direito: teorias da argumentação
jurídica. São Paulo: Landy Editora, 2003.
ATIENZA, Manuel. O Direito como argumentação. Lisboa: Escolar
Editora, 2014.
BRESOLIN, Keberson. Klaus Günther e a nova perspectiva sobre
a teoria da argumentação: justificação e aplicação. In: Revista
Conjectura, Caxias do Sul, v. 21, n. 2, p. 338-361, maio/ago. 2016.
FRANKLIN, Mitchell. The philosophy and legal philosophy of
Chaïm Perelman. In: Buffalo Law Review, n. 261, 1970. Consultado
em meio eletrônico em: 8 dez. 2020. 
GROSS, Alan G.; DEARIN, Ray D. Chaïm Perelman. Albany: State
University of Nova York Press, 2002.
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no Direito e na moral:
justificação e aplicação. São Paulo: Landy Editora, 2004.
MARTINS, Argemiro Cardoso Moreira; OLIVEIRA, Cláudio Ladeira
de. A contribuição de Klaus Günther ao debate acerca da
distinção entre regras e princípios. In: Revista Direito GV 3, v. 2,
n. 1, p. 241-254, jan./jun. 2006. [Resenha].
PEDRON, Flávio Quinaud. A contribuição e os limites da teoria de
Klaus Günther: a distinção entre discursos de justificação e
discursos de aplicação como fundamento para uma reconstrução da
função jurisdicional. In : Revista da Faculdade de Direito, Curitiba, n.
48, p. 187-201, 2008.
PERELMAN, Chaïm; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da
argumentação. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
PETERSON, Victor. Review essay: moral application discourses.
In : Philosophy & Social Criticism, v. 22, n. 1, p. 115-124, 1996.
EXPLORE+
Aprofunde os estudos sobre a teoria da argumentação de Chaïm
Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca lendo os artigos indicados a
seguir. 
GAMBA, Juliane Caravieri Martins; MONTAL, Zélia Maria
Cardoso. A eterna busca pela justiça: de Aristóteles a Chaïm
Perelman. In: Semina: Ciências Sociais e Humanas, Londrina,
v. 29, n. 1, p. 3-22, jan./jun. 2008. 
SILVEIRA, Regina Yara Martinelli. Retórica antiga e nova
retórica: Chaïm Perelman e os sofistas. In: Reflexão,
Campinas, v. 31, n. 89, p. 75-82, jan./jun. 2006.
Aprofunde os seus estudos sobre as teorias de Robert Alexy e
Klaus Günther: 
BRESOLIN, Keberson. A “coerência” em decisões no Direito
e na moral na teoria da argumentação de Klaus Günther. In:
Pensando: Revista de Filosofia, v. 7, n. 14, 2016. 
SOARES, Marcos Antônio Striquer; LIMA, Priscila Rosa.
Decisão judiciária: estudo do pensamento de Robert Alexy. In:
Revista de Direito Público, Londrina, v. 7, n. 2, p. 3-16, maio/ago.
2012.
Para estudar um pouco mais sobre as implicações do caso Riggs
versus Palmer no Direito brasileiro, leia o artigo O caso Riggs
vs. Palmer como um ‘modelo’ adequado para decidir sobre os
direitos fundamentais no panorama da constitucionalização do
Direito no Brasil .
CONTEUDISTA
Davi José de Souza da Silva
 CURRÍCULO LATTES
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