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98 ASPECTOS HEMATOLÓGICOS E BIOQUÍMICOS EM MUARES NATURALMENTE INFECTADOS PELA Bulkholderia mallei SilvanaSuelyAssisRABELO1*, RinaldoAparecidoMOTA1, Eliezer Silva doNASCIMENTO SOBRINHO2,Arildo Pinto da CUNHA2, João Barbosa da SILVANETO2, MiriamNogueira TEIXEIRA1,Pierre Castro SOARES1,Adriano da Silva CARNEIRO2,Antônio Tadeu VASCONCELOS3, Francisco José SILVA3 RESUMO: Estudaram-se os aspectos hematológicos e bioquímicos em mua- res naturalmente infectados pela Burkholderia mallei. Foram constituídos três grupos de animais: Grupo 1 (G1): composto por 30 animais sadios e sorologica- mente negativos para o mormo; Grupo 2 (G2): composto por 30 animais sorolo- gicamente positivos para o mormo e sem sintomatologia aparente da doença e Grupo 3 (G3): composto por 30 animais sorologicamente positivos e com sinto- mas sugestivos do mormo. Foram realizados hemogramas e dosagens bioquí- micas: billirubinas séricas, aspartato amino transferase (AST), gama glutamil transferase (GGT), creatina kinase (CK), fosfatase alcalina (FA), desidrogenase láctica (LDH), uréia e creatinina. Observou-se variação significativa para as vari- áveis: VG, Hb e os índices hematimétricos: VCM, HCM, indicando anemia normo- cítica, normocrônica no G3. O leucograma revelou leucocitose com neutrofilia e desvio à esquerda, além de monocitose, linfocitopenia e eosinopenia, compatí- veis com infecções bacterianas agudas ou crônicas. Para as variáveis da bioquí- mica sérica não se detectou diferença significativa entre os grupos. Concluiu-se que os achados hematológicos e bioquímicos não são ferramentas suficientes para confirmar o diagnóstico da doença, mas podem auxiliar na indicação para a realização de testes mais sensíveis para o diagnóstico do mormo. Termos de Indexação: bilirrubinas, creatinina, enzimas hepáticas, hemograma, mormo, muares, uréia. HAEMATOLOGICAL AND BIOCHEMICAL ASPECTS OF MULES NATURALLY INFECTED BY Bulkholderia mallei ABSTRACT: The hematological and biochemical aspects were studied in mules naturally infected by Burkholderia mallei - Brasil. Three experiment groups were created, being: G1 (n=30) with negative serum for glanders; G2 (n=30) with positive serum for glanders but which had not developed the symptoms and G3 (n=30) with positive serum for glanders and which suggestive symptoms. Hematological tests and biochemical measuring were done (serum bilirrubin, aspartate amino transferase, alanine amino transferase, gama glutamil transferase, creatinokinase, alkaline phosphatase, lactic dehidrogen, blood urea nitrogen and creatinin). On the hematological test therewas a significant variation for: packed cell, hemoglobin, VCM, and HCM in G1, G2 and G3, showing normocytic normochromic anaemia in G3. The leukogram showed neutrophilic leukocitosis left switch monocytosis, linphopenia and eosinopenia compatible with acute or chronic bacterial infection. There was no significant difference of the serum biochemical elements among 1 Professor Ajunto Doutor do Departamento de Medicina Veterinária da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Av. Dom Manuel de Medeiros, s/n, CEP: 52171-900, Recife-PE, BRASIL. E-mail: silvanarabelo@bol.com.br *Autor para correspondência 2 Discentes do Curso de Medicina Veterinária – UFRPE – Bolsistas PIBIC – CNPq 3 Fundação de Hematologia e Hemoterapia do Estado Pernambuco - HEMOPE. Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v.7, nos 2 e 3, p. 98-105 - maio/dezembro, 2004 99 the investigated groups. The hematological and biochemical findings were not enough to diagnose glanders alone, but can be suggestive for more precise tests for the diagnosis of glanders. Index Terms: creatinin, glanders, hemogram, hepatic enzymes, mules, bilirrubin. INTRODUÇÃO O Mormo é uma das mais antigas do- enças infecto-contagiosas dos eqüídeos, causada por um bacilo denominado Burkholderiamallei (YABUUCHI et al., 1992). Responsável por alta morbidade e letalidade, ocorre em diferentes partes do mundo (JUBB et al., 1993). No Brasil, após anos sem relatos da doença, Langenneger et al. (1960) descreveram detalhadamente um foco de mormo, ocorrido na região de Campos, Rio de Janeiro. Após um período de aproximadamente 30 anos sem registro da doença no país, Mota et al. (2000) rela- taram os aspectos microbiológicos, epide- miológicos, clínicos, patológicos e de diag- nóstico em eqüídeos dos Estados de Per- nambuco e Alagoas. Na clínicamédica veterinária, os exa- mes laboratoriais são importantes recursos para um diagnóstico mais seguro, orientan- do o prognóstico e a indicação terapêutica, com os valores de referência, consideran- do-se diferentes fatores como sexo, idade e raça que servem para detectar estados patológicos e, por conseguinte, diagnosti- car alterações. Estudos realizados por Al-Kafawi et al. (1977) naArábia; Bazargani et al. (1996) no Iran, Krishna et al. (1992) na Índia, Muhammad et al. (1998) no Paquistão e Mota et al., (1999) no Brasil, demonstraram que os eqüídeos infectados com o mormo apresentam usualmente um quadro de leu- cocitose com neutrofilia, linfocitopenia, monocitopenia e eosinopenia, além de fibrinogênio elevado. Verifica-se também diminuídas concentrações de eritrócitos e hemoglobina. Considerando a importância que a en- fermidade assume para criações de eqüídeos da região nordeste do país e a grande lacuna existente entre a última co- municação de focos da enfermidade que culminou com grande escassez de dados na literatura, objetivou-se estudar os parâ- metros hematológicos e bioquímicos séricos de eqüídeos naturalmente infecta- dos pela Burkholderia mallei. MATERIAL E MÉTODOS Este estudo foi realizado na Mesorre- gião Mata do Estado de Pernambuco que apresenta clima quente e úmido, com ele- vadas temperaturas e chuvas abundantes e os solos de massapé que tornaram esta região ideal para o desenvolvimento da la- voura canavieira. As propriedades estuda- das foram engenhos produtores de cana de açúcar, que utilizavam os muares e eqüi- nos exclusivamente como animais de tra- ção e sela para o trabalho e beneficiamen- to da cana-de-açúcar. Foram utilizados 90 muares adultos, sem distinção de raça e sexo, criados em regime semi-intensivo e alimentados com pastagem nativa, capim de corte, broto da cana-de-açúcar e melaço. Os animais não recebiammineralização nem vermifugação. Todos os animais estudados foram prove- nientes de propriedades com histórico de doença respiratória e submetidos anterior- mente à prova de Fixação de Complemen- to para diagnóstico sorológico do mormo. Para realização da pesquisa foram forma- dos três grupos compostos igualmente por 30 animais, sendo que o Grupo 1 (G1) foi constituído por animais sadios e sorologi- camente negativos para o mormo; o Grupo 2 (G2) composto por animais sorologica- mente positivos para o mormo e sem sin- tomatologia clínica aparente dessa enfer- midade e o Grupo 3 (G3) composto por animais sorologicamente positivos para o mormo e com sintomatologia clínica suges- tiva da doença. Aspectos hematológicos e bioquímicos em muares... Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v.7, nos 2 e 3, p. 98-105 - maio/dezembro, 2004 100 Após a prévia realização dos exames clínicos e sorológicos dos animais, de acor- do com Speirs (1999), para a formação dos grupos experimentais, foram colhidas amostras de sangue mediante venopunção da jugular, utilizando-se agu- lhas descartáveis. O sangue obtido foi dividido em quatro alíquotas. A primeira em tubos com capacidade para 5mL, contendo 0,05 mL de uma solução aquo- sa a 10% de sal dissódico de etilenodiaminotetracetato (EDTA), para a realização dos exames hematológicos. A segunda, contendo cinco mililitros, em tu- bos revestidos com papel alumínio sem anticoagulante para a dosagem das bilirru- binas. A terceira e a quarta amostras, con- tendo 10mL de sangue sem anticoagulante, utilizadas para a determinação das dosa- gensbioquímicas no soro. Para realização dos exames, utilizou- se a técnica manual e compreenderam as seguintes determinações, segundo Jain (1986): contagem de hemácias e leucócitos totais utilizando-se o método do hemocitô- metro; hemoglobina (Hb) pelo método da cianometahemoglobina; volume globular (VG) realizado pelo método domicrohema- tócrito e os índices hematimétricos. A contagemdiferencial dos leucócitos foi realizada em esfregaços sangüíneos, corados pelo método de panótipo, realizan- do-se leitura em objetiva de imersão (100x), de acordo com descrição de Jain (1986). Com as alíquotas de soro foram rea- lizados os seguintes testes: proteína séri- ca total, albumina, aspartato amino trans- ferase (AST), desidrogenase láctica (LDH), fosfatase alcalina (FA), gama glutamil trans- ferase (GGT), creatina kinase (CK), bilirru- bina total e suas frações (BT, BD e BI), além da uréia e creatinina, utilizando-se Kits di- agnósticos (Biosystem), com leitura efetu- ada em fotocolorímetro (COBAS MIRA PLUS). Os dados foram testados, inicialmen- te, quanto à sua normalidade, mediante o teste de Kolmogorov-Smirnov. As variáveis estudadas foram descritas por meio das respectivas medidas estatísticas: médias, medianas, desvios-padrão e percentis. Para verificar o comportamento das variá- veis em função da condição clínica, reali- zou-se Análise de Variância (Estatística F) e seu respectivo nível de significância (P) para dados paramétricos, e teste de Kruskall-Wallis para dados não- paramétricos, para amostras independen- tes. O teste de Student-Newman-Keuls foi utilizado para o contraste entre as médias, adotando-se o nível de significância (P) de 5% (Sampaio, 1998). Os dados foram pro- cessados em programa estatístico SAS – Statistical Analisys Sistem (SAS INSTITU- TE, 2000). RESULTADOS E DISCUSSÃO Os dados obtidos para o conjunto de variáveis do eritrograma de muares sadios (G1), sorologicamente positivos sem sin- tomatologia (G2) e com sintomatologia (G3) encontram-se na Tabela 1. As variáveis que apresentaram varia- ção significativa (P<0.05) foram hematócri- to, hemoglobina, VCM, HCM, enquanto que as demais não foram significativas ao nível de P<0,05. S.S.A. RABELO et al. Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v.7, nos 2 e 3, p. 98-105 - maio/dezembro, 2004 101 Verificou-se que os contrastes de mé- dias emedianas para o hematócrito, hemo- globina, VCM, HCM mostraram diferenças significativas para o grupo G3, além de que os dados obtidos foram menores em rela- ção ao G1. Para as variáveis hemácias e hemoglobina, os valores médios encontra- ram-se reduzidos quando se comparou os valores obtidos para o grupoG3 comos dos grupos G1 e G2. Quando se comparou o achado do G3 com o G1, verificou-se que a anemia ob- servada era do tipo normocítica normocrô- mica. O mecanismo mais provável para a ocorrência deste tipo de anemia pode ser a deficiência na eritropoiese observada em processos infecciosos crônicos ou inflama- tórios (DUNCAN et al., 1994). Outro aspec- to que deve ser considerado nos quadros de doença crônica e caquetizante é o de animais subnutridos, sem mineralização, sem vermifugação e com medidas sanitá- rias inadequadas, podendo ocasionar pos- síveis falhas secundárias extramedulares na produção de hemácias. Segundo Al-Kafawi et al. (1977), os achados de anemia sugerem que a bacté- ria do mormo reduz a atividade eritropoiéti- ca da medula óssea. Estes mesmos auto- res citaram ainda, a possibilidade de a me- dula óssea ser um sítio adverso dos efei- tos da B. mallei e sugerem estudos que comprovem este possível efeito. Fritz et al. (1999) promoveram infecção experimental em hamsters com amostras virulentas deB.mallei e relataram que ocor- reram freqüentes lesões histológicas da medula óssea, relacionadas a mielite piogranulomatosa, necrose e redução do tecido mielóide e eritropoiético com a pro- gressão da doença. Este achado é muito relevante e provavelmente possa explicar, em parte, alguns fenômenos hematológicos observados neste estudo, como a redução dos valores de hemácias, do hematócrito e da hemoglobina. Contudo, para confirmar esta hipótese é necessária a realização do mielograma e exames histológicos da me- dula óssea em muares naturalmente infec- tados, nas fases aguda e crônica da doen- ça. Com relação à contagem de eritrócitos os achados desse estudo concordam com aqueles descritos porAl-Kafawi et al. (1977) e Krishma et al. (1992), que relataram re- dução desta contagem em casos crônicos domormo, enquanto queMuhammad et al. (1998) citaram apenas o decréscimo da Tabela 1 – Valores médios e desvios-padrão do eritrograma demuares sadios (G1), mu- ares sorologicamente positivos para o mormo sem sintomatologia (G2) e muares sorologicamente positivos para o mormo com sintomatologia (G2), criados no Estado de Pernambuco – Brasil Aspectos hematológicos e bioquímicos em muares... Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v.7, nos 2 e 3, p. 98-105 - maio/dezembro, 2004 102 hemoglobina e do hematócrito em casos de mormo. Quando foram comparados os resul- tados obtidos neste estudo com aqueles relatados por Reed e Bayly (2000) e Radostits et al. (2002), nas infecções res- piratórias causadas pelo Streptococcus equi, verificou-se uma semelhança quanto à série vermelha, onde os autores citaram que pode ocorrer anemia devido ao efeito hemolítico da estreptolisina O (hemólise imunomediada) ou pela anemia da doença crônica. Contudo, nos casos de mormo, o mecanismo do desenvolvimento da anemia ainda não está totalmente esclarecido. Os contrastes de médias e medianas para os valores referentes ao leucograma (Tabela 2) são significativos para a maioria das variáveis, exceto para os linfócitos reati- vos. Em relação ao grupo G3, as médias e as medianas para as variáveis leucócitos, bastonetes, segmentadosemonócitos foram significativamente maiores em relação aos demais grupos. Estas mesmas variáveis, com exceção dos monócitos, foram análo- gas, entre os animais do G1 e G2. Já em relação aos valores dos linfóci- tos e eosinófilos, os respectivos valores do G3 foram significativamente menores (P<0,05) em relação aos dos grupos G1 e G2, os quais também foram análogos. Quanto aos basófilos, o G2 mostrou uma significativa variação em relação aos dois outros grupos (G1 e G3) (Tabela 2). Menores valores médios de leucócitos, bastonetes e segmentados foram observa- dos nos animais dos grupos G1 e G2, em relação ao G3, ou seja, em animais com sorologia positiva acompanhada de sinto- mas, a contagem dessas células é mais elevada, enquanto que para os linfócitos a observação é inversa (Tabela2). Jain (1993) apontou, dentre outras cau- sas, as infecções bacterianas como res- ponsáveis por leucocitose que geralmente está relacionada à neutrofilia. A neutrofilia resulta de uma transferência aumentada das células do pool marginal para o circu- lante, diminuição da migração das células para os tecidos e aumento da produção e liberação dos neutrófilos pela medula ós- sea. Ainda, de acordo com Meyer et al. (1995), nas inflamações agudas intensas e naquelas estabelecidas onde se enqua- dram os animais do G3, a neutrofilia ocor- reu pelo estímulo e demanda tecidual con- tínuos e elevada produção e liberação de neutrófilos para suprir a demanda tecidual. Tabela 2 – Valores médios e desvios-padrão, medianas e percentis (P25; P75) do leuco- grama de muares sadios (G1), muares sorologicamente positivos para o mormo sem sintomatologia (G2) e muares sorologicamente positivos para o mormo com sintomatologia (G3), criados no Estado de Pernambuco – Brasil S.S.A. RABELO et al. Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v.7, nos 2 e 3, p. 98-105 - maio/dezembro, 2004 103 Estudos realizados por Al-Kafawi et al. (1977), Krishma et al. (1992), Bazargani et al. (1996) e Mota et al. (2000), em eqüinos commormo,relataram leucocitose por neu- trofilia, assim como ocorre em outras do- enças bacterianas de eqüídeos. Contudo, apesar da diferença estatisticamente sig- nificativa observada neste estudo para as variáveis leucócitos, bastonetes e segmen- tados, esses achados não são suficientes para caracterizar o perfil dos animais com mormo, uma vez que podem ocorrer varia- ções no perfil leucocitário nas diferentes fa- ses da doença (AL-KAFAWI et al.,1977) e outras doenças infecciosas bacterianas (JAIN, 1993; FELDMANet al., 2000). As médias obtidas por Al-Kafawi et al. (1977) para leucócitos e segmentados em eqüinos árabes na fase crônica do mormo foram de 13,88x10³/mm³ e 10,21x 10³/mm³ de sangue, respectivamente. Os valores médios obtidos neste estudo para estas duas variáveis do leucograma de muares do G3 foram superiores àqueles relatados por estes autores. Os achados do leucograma de eqüídeos do G3 também são compatíveis com as anormalidades hematológicas ob- servadas em eqüinos com garrotilho e re- latados por Reed e Bayly (2000) e Radostist et al. (2002), que observaram leucocitose por neutrofilia. Com relação aos monócitos verificou- se uma monocitose quando se comparou os resultados obtidos nos grupos G1 e G3. Os resultados obtidos neste estudo diferem daqueles relatados por Al-Kafawi et al. (1977), que não observaram diferença sig- nificativa para esta variável do leucograma quando comparam o grupo controle com o grupo cronicamente infectado. Neste caso, amonocitose pode ser jus- tificada, segundo Jain (1993), pela evolução da doença quando osmonócitos são reque- ridos para realizarem a fagocitose de debris celulares e células mortas. Pode ocorrer nas bacteremias, doenças supurativas, necrose tecidual e doenças piogranuloma- tosas nas quais o mormo se enquadra (DUNCAN et al., 1994). Os animais do G3 apresentaram uma significativa redução na média de linfócitos quando comparada às médias dos grupos G1 e G2 (Tabela 2). Resultados semelhan- tes foram obtidos porAl-Kafawi et al. (1977), que relataram decréscimo significativo de linfócitos no grupo infectado quando com- parado ao grupo controle. De acordo com Duncan et al. (1994), as causas de linfopenia incluem infecção bacteriana e rompimento da arquitetura de nódulos lin- fáticos em casos de inflamação. Estudos realizados por Fritz et al. (1999 e 2000) relataram extensas perdas de teci- do linforreticular no baço, nódulos linfáticos e medula óssea. Esses achados histológicos na infecção experimental de hamsters e camundongos machos e fême- as, respectivamente, caracterizaram lesões microscópicas em órgãos linfóides em todo o curso da doença. Os autores acreditam que essas lesões são secundárias à infec- ção pela B. mallei e que estas reduzem significativamente a habilidade do orga- nismo em responder à infecção. Apesar de não se ter real izado exames histológicos nos órgãos linfóides neste estudo, acredita-se que tais lesões tam- bém ocorram na infecção natural como relatado por Mota et al. (2000), e que es- tas possam contribuir para a redução da contagem de linfócitos circulantes obser- vada neste estudo. Ainda com relação aos eosinófilos, ob- servou-se média inferior para o grupo G3 quando comparado ao G1 e G2 (Tabela 2). Estes achados são compatíveis com aque- les descritos porAl-Kafawi et al. (1977) que não observaram eosinófilos e basófilos nos esfregaços sangüíneos em animais na fase crônica da doença. Quanto aos basófilos, estas células não foram observadas na leucometria diferencial de muares do G3, concordando com o autor supracitado. Para o conjunto de variáveis da bioquí- mica sérica (Tabela 3), a BT, BD, BI, AST, ALT, GGT, BD, FA, LD, CK uréia e creatini- na não apresentaram variação significativa entre os grupos. Todas as variáveis da bio- química sangüínea estudadas para os três Aspectos hematológicos e bioquímicos em muares... Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v.7, nos 2 e 3, p. 98-105 - maio/dezembro, 2004 104 grupos apresentaram-se dentro dos limites da normalidade para a espécie eqüina, de acordo com Kaneko (1989) e Boggin et al. (1989). Não foi possível realizar um estudo comparativo com os muares, pois não se encontraram referências na literatura con- sultada para valores bioquímicos nesta es- pécie, nem tampouco trabalhos que fazem referência às possíveis alterações na bio- química sérica de eqüídeos natural ou ex- perimentalmente infectados com a B. mallei, sendo este estudo pioneiro neste tipo de avaliação. Estes achados levam a crer que os animais do G3 não apresenta- vam lesões hepáticas, renais e muscula- res a ponto de comprometer a atividade enzimática, detectáveis no momento da realização deste estudo. CONCLUSÕES A infecção natural pela Burkholderia mallei desencadeia alterações no hemograma de muares caracterizando um quadro compatível com processo inflama- tório agudo ou crônico sem, contudo, inter- ferir no perfil bioquímico dos parâmetros estudados. Para uma melhor avaliação dos parâ- metros bioquímicos de eqüídeos com mormo é necessário que se realize a ino- culação experimental da B. mallei em ani- mais desta espécie para realizar determi- nações seriadas durante todo o curso da doença. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AL-KAFAWI, A.A.; AL-ANI, F.K.; AL-BASSAM, L.S. et al. Haematological changes in Arabian horses infected with glanders. Veterinary Re- cord, London, n.19, p.427-427, 1977. BAZARGANI, T. T.; TADJBAKHSH,H.; BADII,A.; ZAHRAEI, T. The outbreak of glanders in some racehorses in three states of Iran. Journal of Equine Veterinary Science, Wildomar, v.16, n.6, p.232-6, 1996. BOGGIN,A.; OTTO, C.; YBAÑEZ, P. Patologia Clínica Veterinária do Instituto Interamerica- no de Cooperação Técnica. Assunción: GTZ/ IICA, 1989. 192 p. Tabela 3 – Valores médios e desvios-padrão, medianas e percentis (P25; P75) dos cons- tituintes bioquímicos séricos demuares sadios (G1), muares sorologicamente positivos para o mormo sem sintomatologia (G2) e muares sorologicamente positivos para o mormo com sintomatologia (G3), criados no Estado de Per- nambuco – Brasil S.S.A. RABELO et al. Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v.7, nos 2 e 3, p. 98-105 - maio/dezembro, 2004 105 DUNCAN, J.R.; PRASSE, K.W.; MAHAFFEY, E.A.Veterinary Laboratory Medicine.3Ames: Ed. Iowa, 1994. 299 p. FELDMAN, B.F.; ZINKL, J.G.; JAIN, N.C. Shalm’s Veterinary Hematology. 5. ed. Philadelphia: LippincottWilliams&Wilkins, 2000. 1344 p. FRITZ, D.L.et al. The hamster model of intraperitoneal Burkholderia mallei (glanders). Veterinary Pathology, Baltimore, v.36. n.4. p. 276-291, 1999. FRITZ, D.L.et al. 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