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Leptospirose: Doença Febril Aguda

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Leptospirose 
	Doença febril aguda causada por Leptospira interrogans. Acomete quase todos os estados brasileiros, sendo um problema de saúde pública. Na maioria das vezes, se manifesta apenas com síndrome febril, parecendo com a dengue clássica. Porém, em alguns casos pode se apresentar como doença grave e potencialmente fatal – doença de Weil, com icterícia, hemorragias e insuficiência renal aguda. 
	Atualmente são conhecidas duas formas de Leptospira: L. interrogans e L. biflexa. Essa última não é patogênica. As leptospiras são microrganismos aeróbios obrigatórios e podem permanecer em solos úmidos ou na água por semanas a meses. O rato é seu principal reservatório, sendo um portador definitivo, universal e são. Hospedeiros acidentais são os homens e outros mamíferos. A leptospira é capaz de penetrar ativamente pequenas abrasões cutâneas ou pela mucosa (oral, faríngea e ocular). Infecção se dá pelo contato da pele ou mucosa com a urina contaminada. As enchentes e chuvas fortes são importantes formas de transmissão, não só pelo contato da água da chuva com os humanos, mas também pelo aumento de roedores peridomicilares nessa época, facilitando o contato dos homens com a urina do rato. 
	Existem algumas profissões que aumentam o risco de contaminação pela leptospirose, tais como: trabalhadores de abatedouro de gado, trabalhadores da rede de esgoto, limpadores de fossa e lixeiro, lavradores, pescadores, colhedores de arroz, escavadores de tuneis e mineradores, operários de construção civil, criadores de animais e veterinários. Algumas atividades recreacionais, como natação em represa contaminada é fator de risco. Animais domésticos contaminados também transmitem pela urina. 
	Após a penetração pela pele, as leptospiras alcançam a corrente sanguínea, se multiplicam e disseminam para órgãos e sistemas, caracterizando a fase de leptospiremia. A leptospira se difunde pelo tecido conjuntivo atingindo o líquor e humor aquoso, sem causar reação inflamatória exuberante nessa fase. Ocorre uma lesão direta do endotélio, causando uma capilarite generalizada e ocorre adesão das leptospiras à membrana das células	, determinando lesão ou disfunção celular. Isso pode causar hemorragias, comuns em casos graves da doença. A síndrome febril, provavelmente é causada pelas citocinas liberadas por fatores de virulência das leptospiras. Na forma grave – síndrome de Weil – os órgãos mais afetados são: fígado, rim, pulmao, coração e músculo esquelético. No fígado, há sinais de Colestase e hiperplasia de células de Kuppfer. Disfunção hepática predomina nitidamente na excreção biliar, justificando as elevações de bilirrubina. Nos rins pode haver nefrite intersticial e necrose tubular. Hemorragias petequeais podem ser visualizadas em sua superfície. Atualmente, a disfunção pulmonar é principal causa de morte, desde que a diálise começou a ser utilizada. Ocorre uma capilarite difusa, levando extravasamento de liquido e sangue para os alvéolos. Surgem infiltrados hemorrágicos no pulmao que podem causar hemoptise ou insuficiência respiratória. Coração é afetado com uma miocardite mononuclear (semelhante à febre reumática) e pode levar à insuficiência cardíaca. Miosite é um achado frequente, mesmo na forma anictérica. Os músculos apresentam necrose hialina focal, miócitos vacuolados e infiltrados mononucleares. A segunda fase da leptospirose inicia quando surgem anticorpos IgM antileptospira, sendo a fase imune. 
	O período de incubação varia de 7-14 dias. Cerca de 90-95% dos casos provavelmente apresentam apenas com uma síndrome febril, semelhante à influenza ou dengue clássica. Esta é a forma anictérica. Em 5-10% dos casos, paciente evolui para a forma íctero-hemorrágica ou síndrome de Weil, manifestando-se com icterícia, insuficiência renal aguda e hemorragia. A maioria dos casos da forma anictérica passa despercebida, por isso, a maioria dos registros no Brasil é da forma grave. 
	A forma anictérica apresenta síndrome febril aguda, de início súbito, tal como uma gripe forte. Doença tem curso bifásico. Fase da leptospiremia de 4-7 dias e fase imune de 4-30 dias. Na primeira fase, da leptospiremia, os sintomas são mais proeminentes e característicos. Febre alta, calafrios, cefaleia frontal e retro orbitária, náuseas, vômitos e intensa mialgia (com predomínio na panturrilha, dorso e abdome). A febre é do tipo remitente. Palpação da panturrilha é dolorosa e o olho vermelho é um achado frequente. Outros sintomas ocorrem com menor frequência, como diarreia, tosse seca, dor de garganta, erupção cutânea (rash eritematoso na região pré-tibial). A fase imune começa com o recrudescimento da febre, porem de menor intensidade. Pode ocorrer meningite asséptica e uveíte, que são complicações decorrentes das reações de hipersensibilidade. Alterações liquóricas estão presentes em 80% dos casos. As queixas são cefaleia intensa, vômitos e eventual estado confusional. Hemiplegia e mielite podem ocorrer muito raramente. Líquor revela pleocitose linfocítica (mononuclear). O hemograma costuma apresentar leucocitose com desvio para esquerda. Plaquetopenia é um achado frequente. Hematócrito pode estar normal, elevado ou levemente reduzido e o VHS geralmente está aumentado. Enzimas musculares, como CPK podem estar aumentadas. 
	A forma íctero-hemorrágica é a mais grave. Definida pelo aparecimento de icterícia, disfunção renal aguda e diátese hemorrágica. O quadro inicia-se igualmente ao da fase leptospirêmica da anictérica. Após 4-9 as complicações começam a aparecer. A febre simplesmente persiste, podendo diminuir ou até piorar. É comum hepatomegalia e esplenomegalia. Hemograma é semelhante da forma anictérica, porém com leucocitose mais acentuada e um VHS bem elevado. Há uma maior frequência de plaquetopenia. A icterícia tem uma característica, é meio alaranjada. É chamada de icterícia rubínica. As transaminases se elevam pouco. Insuficiência renal aguda é comum com elevação das escorias nitrogenadas (ureia e creatinina). O encontro de IRA oligúrica com potássio sérico normal é típico de leptospirose. Fenômenos hemorrágicos aparecem em quase metade dos casos e são caracterizados por petéquias, equimoses ou até hemorragia pulmonar e gastrointestinal. Os sangramentos são causados pelas vasculites cutâneas e mucosas, sendo agravadas pela plaquetopenia. A hemorragia mais temível é a pulmonar, sendo de uma capilarite pulmonar hemorrágica grave, manifestando com tosse, dispneia e hemoptise. Miocardite apresenta com mudança da repolarização ventricular e arritmias cardíacas (extrassístoles e fibrilação atrial). Uma minoria evolui para insuficiência cardíaca e choque cardiogênico. 
	O diagnóstico se da por cultura ou exames sorológicos, em conjunto com o quadro clínico. É confirmado o diagnóstico quem preenche qualquer um dos critérios:
Sinais e sintomas clínicos compatíveis associados a um ou mais dos seguintes exames laboratoriais:
Teste Elisa IgM reagente.
Soroconversão na reação de microaglutinação, entendida como uma primeira amostra não reagente e uma segunda amostra com titulação maior.
Aumento de quatro vezes nos títulos de microaglutinação de uma amostra para outra com intervalo de 14-21 dias.
Quando não tiver duas amostras: títulos maiores que 1800 confirmam diagnóstico.
Isolamento da leptospira ou exame de DNA de leptospira patogênica por PCR.
Imunohistoquímica positiva para leptospirose em pacientes suspeitos que evoluíram para óbito. 
A cultura pode ser feita com sangue ou líquor na primeira semana, mas não tem boa sensibilidade. Os exames sorológicos são os mais utilizados na prática, porém nenhum costuma ser positivo nos primeiros sete dias. O padrão ouro é a microaglutinação, mas é realizado apenas em centros de referência, como a Fiocruz. 
A terapia antibiótica visa reduzir a intensidade e duração dos sintomas e reduzir a morbimortalidade da forma grave. A terapia antibiótica deve ser iniciada o quanto antes, de preferência nos primeiros cinco dias do inicio do sintoma. A droga de escolha é penicilina G cristalina. Podeser usadas a ampicilina e tetraciclina. Em pacientes alérgicos a penicilina ou com lesão renal e icterícia é indicado o cloranfenicol. Tetraciclina e doxicilina é contraindicado em crianças menores de 9 anos e em grávidas. Para a forma grave também é indicado o tratamento de suporte, como hidratação venosa para reposição da volemia e do potássio e acompanhamento da função renal e pulmonar. Quando indicada, deve ser realizada diálise peritoneal. Hemodiálise deve ser evitada devido ao risco de sangramento. 
As medidas profiláticas são divididas em gerais e individuais. Dentre as gerais temos programas de controle ao vetor (rato), campanhas educacionais sobre a forma de contágio, medidas de saneamento básico, medidas concretas que evitem enchentes durante o período da chuva e vacinação de animais domésticos contra leptospirose. Dentre as medidas individuais temos a quimioprofilaxia, com doxicilina. Sua indicação é controversa e só se aplica a um grupo que irá se expor a uma provável fonte de contaminação.

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