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O Arco e a Lira (verso e prosa) Octavio Paz

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f: A L\RA
OAIDJ Q,h VIo 'Tht:.
VERSO E PROSA
o ritmonãoé apenaso elemento1,11aisantigoe perma-
nentedalinguagem,comotambémnãoé difícilqueseja
anteriorà própriafala.Em certosentido,pode-sedizer
quealinguagemnascedoritmoou,pelomenos,quetodo
ritmoimplicaouprefiguraumálinguagem.Assim,todas
asexpressõesverbaissãoritmo,semexclusãodasfor-
masmaisabstratasou didáclcasdaprosa.Comoentão
distinguirprosae poema?Destemodo:o ritmosedá
espontaneamenteemtodaformaverbal,massónopoe-
masemanifestaplenamente.Semritmonãohá.poem~~
sócomritmonãoháprosa.O ritmo.é".condIçãodopoe-
ma,aopassoqueé inessencialparaa prosa.Pelaviolên-
ciadarazãoaspalavrassedesprendemdoritmo;essa
violênciaracionalsustentaa prosa,impedindo-adecair
nacorrentedafalaondenãovigoramasleisdodiscurso
e simasdeatraçãoe repulsa.Masessedesenraizamen-
tonuncaé totalporque,docontrário,a linguagemseex-
tinguiria.E comelao própriopensamento.A linguagem,
porinclinaçãonatural.tendea serritmo.Comoseobe-
decessema umamisteriosalei degravidade,aspalavras
retomamespontaneamenteà poesia.No fundodetoda
prosacircula,maisou menosrarefeitapelasexigências
dodiscurso,a invisívelcorrenterítmica.E o pensamen-
to,namedidaemqueélinguagem,sofreo mesmofascí-
nio.Deixaro pensamentoemliberdade,divagar,é re-
gressaraoritmo;asrazõessetransformamemcorrespon-
dências,ossilogismosemanalogias,e a marchaintelec-
tualemfluir deimagens.O prosador,porém,buscaa
coerênciae a claridadeconceptual.Por isso,resisteà
correnterítmicaquefatalmentetendea semanifestar
emimagense nãoemconceitos.
A prosaé umgênerotardio,filhodadesconfiançado
pensamentoanteas tendênciasnaturaisdo idioma.A
poesiapertencea todasasépocas:é a formanaturalde
expressãodoshomens.Nãohápovossempoesia,mas
existemos quenãotêmprosa.Portanto,pode-sedizer
queaprosanãoéumaformadeexpressãoinerenteàso-
ciedade, ao passo que é incou.~~Q.(veL~~2CJ~.!~J)~i.a_~.~._~~~_.
sociedade._s~m.canções,mitosououtrasexpre~.sõ~sP9é-
t~.Ç.~.~..A poesiaignorao progressooua evolução,e suas
origense seufim seconfundemcomos da linguagem.
A prosa,queé primordialmenteuminstrumentodecrí-
ticaeanálise,exigeumalentamaturaçãoe s6seproduz
apósumalongasériedeesforçostendentesa dominar
afala.Seuavançosemedepelograudedomíniodopen-
samentosobreaspalavras.A prosacresceemlutaper-
manentecontraasinclinaçõesnaturaisdoidioma,e seus
gênerosmaisperfeitossãoo discursoe a demonstração;
nosquaiso ritmoe seuincessanteir evir cedemlugarà
marchadopensamento.
Enquantoo poemaseapresentacomoumaordemfe-
chada,a prosatendea semanifestarcomoumaconstru-
çãoabertaelinear.Valérycomparouaprosacomamar-
chaea poesiacoma dança.Narrativaqudiscurso,his-
tóriaou demonstração,a prosaé umdesfile,umaver.
dadeirateoriade idéiasou fa~os.A figurageométrica
quesimbolizaa prosaé a linha:reta,sinuosa,espiraIa-
da,ziguezagueante,massempreparadiantee comumà.
metaprecisa.Daí queos arquétiposda prosasejamo
discursoeanarrativa,a especulaçãoe a história.O poe.
ma,pelocontrário,apresenta-secomoum círculopu
umaesfera- algoquesefechasobresi mesmo,uni-
versoauto-suficientenoqualo fimé tambémumprincí-
82 83
piQquevolta,serepetee serecria.E essaconstantere-
petiçãoe recriaçãonãoé senãoo ritmo,maréquevai
e quevem,quecaie selevanta.O caráterartificialda
prosasecomprovacadavezqueo prosadorseabando-
naaofluirdoidioma.Tãologosevoltasobreseuspas-
sos,à maneirado poetaou do músico,e sedeixase-
duzirpelasforçasdeatraçãoe repulsadoidioma,viola
asleisdopensamentoracionale penetrano âmbitode
ecose,correspondênciasdopoema.Foi is'soqueocorreu
comboapartedoromancecontemporâneo.O mesmose
podeafirmardecertosromancesorientais,comoOscon-
tosdeGenji,daSenhoraMurasaki,ouo célebreroman-
ce chinêsO sonhodo aposentovermelho.A primeira
lembraProust,o autorquemaislongelevoua ambigüi-
dadedo romance,sempreoscilanteentrea prosae o
ritmo;,o conceitoe a imagem;o segundoé umavasta
alegoriaquedificilmentesepodechamarderomancesem
quea palavrapercaseusentidohabitual.Na realidade,
asúnicasobrasorientaisqueseaproximamdoquecha-
mamosderomancesãolivrosquevacilamentreo apó-
logo,a pornografiae a descriçãodecostumes,comoo
ChinPingMei.
Sustentarqueo ritmoé o núcleodopoemanãoquer
dizerqueestesejaumconjuntodemetros.A existência
deumaprosacarregadadepoesiae a demuitasobras
corretamente"versificadase absolutamenteprosaicasre-
velama falsidadedessaidentificação.Metroe ritmonão
sãoamesmacoisa.Osret6ricosantigosdiziamqueo rit-
moé o paidamétrica.Quandoummetroseesvaziade
conteúdoe seconverteemformainerte,meracascaso-
nora,o ritmocontinuaengendrandonovosmetros...O
ritmoé inseparáveldafrase,nãoé composto56depa-
lavrassoltasnemé s6 medidae quantidadesilábica,
acentose pausas:é imagemesentido.Ritmo,imageme
significadoapr~sentam-sesimultaneamentenumaunida-
de indivisívele compacta:a frasepoética,o verso.O
metro,pelocontrário,é medidaabstratae independen-
tedaimagem.A únicaexigênciadometroé quecada
versotenhaassílabas~osacentosrequeridos.Tudopode
serditoemhendecassílabos:umafórmuladematemá-
tica,umareceitaculinária,o cercodeTróiae umasu-
cessãodepalavrasdesconexas.Pode-seinclusiveprescin-
dirdapalavra;bastaumafileiradesílabasouletras.Em
si mesmo,o metroé medidavaziadesentido.O ritmo,
pelocontrário,jamaisseapresentasozinho;nãoémedi-
damasconteúdoqualitativoe concreto.Todoritmover-
baljá contémemsi a imageme constitui,realoupoten-
cialmente,umafrasepoéticacompleta.
O metronascedoritmoe a eleretorna.Noprincípio,
asfronteirasentreume outrosãoconfusas.Posterior-
mente,o metrosecristalizaemformasfixas.Instantede
esplendor,mastambémdeparalisia.Isoladodofluxoe
dorefluxodalinguagem,o versosetransformaemme-
didasonora.Ao momentodeacordosegue-seoutrode
imobilidade;depois,sobrevéma disc6rdiae noseiodo
poemaseestabeleceumaluta:a medidaoprimea ima-
gemou.estarompeo cárceree regressaà falaa fim de
serecriaremnovosritmos.O metroé medidaqueten-
dea seseparardalinguagem;o ritmojamaissesepara
dafalaporqueéapr6priafala.O metroéprocedimento,
maneira;o ritmoé temporalidadeconcreta.Umhende-
cassílabodeGarcilasonãoé idênticoa umdeQuevedo
ou G6ngora.A medidaé a mesma,maso ritmoé di-
ferente.A razãodessasingularidade.'encontra-se,em
castelhano,naexistênciadeperíodosrítmicosnointerior
decadametro,entrea primeirasílabaacentuadae an-
tesdaúltima.O períodorítmicoformao núcleodover-
soenãoobedeceà regularidadesilábica,masà pancada
84 8S
dosacentose à combinaçãodestescomascesurase as
sílabasfracas.Çadaperíodo,por suavez,é composto
pelomenosdeduascláusulasrítmicas,formadastam-
bémporacentostônicosecesuras.tiA representaçãofor-
maldoverso",diz TomásNavarroemseutratadode
MétricaespanoIa,"resultadeseuscomponentesmétri-
cose gramaticais;a funçãodoperíodoé essencialmente
rítmica;desuacomposiçãoe dimensõesdependequeo
movimentodoversosejalentoourápido,graveouleve,
serenoouconturbado."O ritmoinfundevidaaometro
e outorga-lheindividualidade.1
A distinçãoentremetroe ritmoproíbechamarde
poemasumgrandenúmerodeobrascorretamentever-
sificadasque,porpurainércia,constamcomotaisnos
manuaisdeliteratura.Obras,comoOscantosdeMaldo-
ror,Aliceno País dasMaravilhasouEl jardínde10ssen-
derosquesebifurcansãopoemas.Nelasa prosasenega
asimesma;asfrasesnãosesucedemobedecendoauma
ordemconceitualounarrativa,massãopresididaspelas
leisda imageme doritmo.Há umfluxoe refluxo'de
imagens,acentose pausas,sinalinequívocodapoesia.
O mesmosedevedizerdoversolivrecontemporâneo:
oselementosquantitativosdometrocederamlugaràuni-
daderítmica.Em algumasocasiões- por exemplo,na
poesiafrancesacontemporânea- a ênfasetransferiu-se
doselementossónorosparaosvisuais.Maso ritmoper-
manece;subsistemaspausas,asaliterações,asparono-
másias,o choquederuídos,o fluxoverbal.O versolivre
é umaunidaderítmica.D.H. Lawrencediz quea uni-
dadedoversolivreé dadapelaimageme nãopelame-
didaexterna.E citaos versículosde Walt Whitman,
quesãocomoa sístolee a diástoledeumpeitopode-
roso.E assimé: o versolivreé umaunidadee quase
sempresepronunciade umas6 vez.Por isso,a ima-gemmodernaserompenosmetrosantigos:nãocabeha
medidatradiCionaldasquatorzeouonzesílabas,o que
nãoocorriaquandoosmetroserama expressãonatural
dafala.Quasesempre'osversosdeGarcilaso,Herrera,
FrayLuisou qualquerpoetadosséculosXVI e XVII
constituemunidadesporsi mesmos:cadaversoé tam-
bémumaimagemou umafrasecompleta.Entreessas
formaspoéticase a linguagemdeseutempo,haviauma
relaçãoquedesapareceu.O mesmoocorrecomo verso
livrecontemporâneo:cadaversoé umaimageme nãoé
necessáriosuspendera respiraçãoparadizê-los.Porisso,
nãoraroa pontuaçãoé desnecessária.As vírgulase os
pontossobram;o poemaé umfluxoe refluxorítmico
depalavras.Contudo,o crescentepredomíniodo inte-
lectuale dovisualsobrea respiraçãorevelaquenosso
versolivreameaçaseconverter,comoo alexandrinoe
o hendecassílabo,emmedidamecânica.Issoéparticular-
1 EmLinguisticsandpoetics,Jakobsondizque"far frombeinganabstract,
theoretlcalscheme,"meter- ar in moreexpticittermes,versedesign-
underUesthestructureof anysingleUne- or, in logicalterminology,any
8ingleverse'instance... The versedesigndeterminestheinvariantfeatures
of the verseinstancesand setsup the limit of variations".Em seguida,
citao exemplodoscamponesessérviosqueimprovisampoemascommetros
fixos e os recitamsemjamaisse equivocaremcom a medida.:e possível
que,de fato,os versossejammedidasinconscientes.ao menosem certos
casos(o octossflaboespanhotseriaum deles).Comtudoisso,a observação
de Jakobsonniio invalidaa diferençaentremetroe versoconcreto.A rea.
lidadedo primeiroé ideal.é umapautae, portanto,é umamedida,uma
abstração.O versoconcretoé único:Resueltaen polvoya, massiempre
hermosa(Lopede Vega)é um hendecassílaboacentuadona sextasílaba,
comoY en unode misojoste l1agaste(SanJuan de Ia Cruz) e comoDe
ponderosavanapesadumbre(Góngora).Impossívelconfundi.tos:cadaum
temum ritmo diverso.Em suma,teríamosde considerartrêsrealidades:
o ritmo do idiomanesteou naquelelugar e em determinadomomento
hist6rico:osmetrosderivadosdo ritmodo idiomaou adaptadosde outros
sistemasdeversificação:e o ritmodecadapoeta.Esteúltimoé o elemento
distintivoe aqueleque separaa literaturaversificadada poesiapropria-
mentedita.
86
87
mentecertonoqueserefereà poesiafrancesacontem-
porânea.i
Osmetrossãohist6ricos,aopassoqueo ritmosecon-
fundecoma pr6prialinguagem.Nãoé difícildistinguir
emcadametroos elementosintelectuaise abstratose
os maispuramenterítmicos.Naslínguasmodernasos
metrossãocompostosporumdeterminadonúmerode
sílabas,duraçãocortadaporacentostônicose pausas.
Osacentose aspausasconstituema partemaisantigae
maispuramenterítmicadometro;aindaestãopróximos
dapancadadotambor,dacerimôniarituale doscalca-
nharesdançantesquebatemnochão.O acentoé dança
e rito.Graçasaoacento,o metrosepõedepée é uni-
dadedançante.A medidasilábicaimplicaumprincípio
deabstração,umaretóricae umareflexãosobrea lin-
guagem.Duraçãopuramentelinear,tendea seconver-
teremmecânicapura.Os acentos,aspausas,asalitera-
ções,oschoquesouuniõesinesperadasdeumsomcom
outroconstituema parteconcretae permanentedome-
tro.As linguagensoscilamentrea prosae o poema,o
ritmoe o discurso.Emalgumasé visívelo predomíI1;io
rítmico;emoutrasobserva-seumcrescimentoexcessivo
doselementosanalíticose discursivos,àsexpensasdos
rítmicose imaginativos.A lutaentreastendênciasna-
turaisdoidiomae asexigênciasdopensamentoabstrato
exprime-senosidiomasmodernosdo Ocidenteatravés
dadualidadedosmetros:numextremo,versificaçãosi-
lábica,medidafixa; rio pólooposto,o jogolivredos
acentose daspausas.Línguaslatinase línguasgermâni-
casoAs nossastendema fazerdo ritmomedidafixa.
Nãoéestranhaessainclinação,poissãofilhasdeRoma.
A importânciada versificaçãosilábica'revelao impe-
rialismododiscursoe dagramática.E essepredomínio
damedidaexplicatambémqueascriaçõespoéticasmo-
dernasemnossaslínguassejamrebeliõescontrao siste-
madeversificaçãosilábica.Em suasformasatenuadas
a rebeliãoconservao metro,massublinhao valorvi-
sualdaimagemou introduzelementosquerompemou
alternama medida:a expressãocoloquial,o humor,a
frasemontadasobredoisversos,asmudançasdeacen-
tose depausasetc.Emoutroscasosa revoltaseapre-
sentacomoumregressoàsformaspopularese espontâ-
neasdapoesia.E emsuastentativasmaisextremaspres-
cindedometroe escolhecomomeiodeexpressãoa pro-
saouoversolivre.Esgotadosospoderesdeconvocação
e evocaçãodarimae dometrotradicionais,o poetare-
montaa corrente,embuscada linguagemoriginal,an-
teriorà gramática.E encontrao núcleoprimitivo:o
ritmo.
O entusiasmocomqueospoetasfrancesesacolheram
o Romantismoalemãodeveservistocomoumarebelião
instintivacontraa versificaçãosilábicae o queelasig-
nifica.Noalemão,comonoinglês,o idiomanãoé uma
vítimadaanáliseracional.O predomíniodosvaloresrít-
micosfacilitoua aventurado pensamentoromântico.
Anteo racionalismodoSéculodasLuzes,o Romantismo
esgrimeumafilosofiadanaturezae do homemfunda.
danoprincípiodeanalogia:','Tudo"- dizBaudelaire
emL'art romantique-, "no espiritualcomononatu-
ral, é significativo,recíproco,correspondente...tudo
é hieroglífico... e o poetaé apenaso tradutor,aquele
quedecifra..." Versificaçãorítmicae pensamentoana-
lógicosãoasduasfacesdeumamesmamoeda.Graças
aoritmopercebemosessacorrespondênciauniversal,me-
lhordizendo:essacorrespondêncianãoé outracoisase-
nãoa'manifestaçãodoritmo.Voltaraoritmosubenten.i Sobreritmosverbaise fisiológicos.vero ApêndicelI.
88 '89"
deumamudançadeatitudediantedarealidade.E, ao
inverso,adotaroprincípiodeanalogiasignificaregressar
aoritmo.Ao afirmarospoderesdaversificaçãoacentual
anteosartifíciosdometrofixo,o poetaromânticopro-
clamao triunfodaimagemsobreo conceitoe o triunfo
daanalogiasobreo pensamento16gico.
Essesnomesevocamumsistemadeversificaçãooposto
aoquesepoderiachamardetradiçãonativainglesa:o
versobrancodeMilton,maislatinoqueinglês,e o he-
roieeOllplet,recursofavoritodePope.Sobreesteúlti.
mo,Drydendiziaqueit boundsandcireunseribesthe
Faney.A rimaregulaa fantasia,é umdiquecontraa
enchenteverbal,umacanalizaçãodo ritmo.A primeira
metadedenossoséculofoi tambémumareaçãoHlatina"
emdireçãocontráriaaoséculoanterior,deBlakee do
primeiroYeats.(Digouprimeiro"porqueessepoeta,
comoJuanRam6nJiménez,é váriospoetas.)A reno.
vaçãodapoesiainglesamodernadeve-seprincipalmente
a doispoetase a umficcionista:EzraPound,T.8.Eliot
e TamesJoyce.Apesarde suasobrasseremmuitodi-
ferentes.umacaracterísticacomumasune:todassão
umareconquistadaherançaeuropéia.Parecedesneces-
sárioacrescentarquesetratasobretudodaherançalati.
na:poesiaprovençale italianaemPoundjDanteeBau.
delaireemEliot.Em Joyceé maisdecisivaa herança
greco-Iatinae medieval:nãoemvãoelefoi umfilhore-
beldedaCompanhiadeJesus.Paraostrêsa voltada
tradiçãoeuropéiaseinicia- e culmina- comuma
revoluçãoverbal.A maisradicalfoi a deJoyce,cria-
dordeumalinguagemque,semdeixardesero inglês,
étambémtodososidiomaseuropeus.Eliote Poundusa-
raminicialmenteo versolivrerimado,à maneiradeLa-
forgue;emseusegundomomentoregressarama metros
e estrofesfixos,e então,conformenoscontao pr6prio
A evoluçãodapoesiamodernaemfrancêse eminglês
é umexemplodasrelaçõesentreritmoverbale criação
poética.O francêsé umalínguasemacentostônicose
osrecursosdapausae dacesuraossubstituem.No in-
glêso querealmentecontaé o acento.A poesiainglesa
tendea serpuroritmo:dança,canção.A francesa:dis-
curso,"meditaçãopoética".Na Françao exercícioda
poesiaexigeir contraastendênciasdalíngua.No inglês,
abandonar-seà corrente.O primeiroé o menospoético
dosidiomasmodernos,o menosinesperado;o segundo
abundaemexpressõesestranhase cheiasde surpresa
verbal.Daíquea revoluçãopoéticamodernatenhasen-
tidosdiversosemambososidiomas.
e ariquezarítmicadoinglêsquedáo caráterpróprio
aoteatroelisabetano,àpoesiadosHmetafísicos"e à dos
românticos.Não obstante,comcertaregularidadede
pêndulo,surgemreaçõesdesignocontrário,períodosem
quea poesiainglesabuscaseinserirdenovona tradi-
çãolatina.1PareceociosocitarMilton,Drydene Pope.
1 Não é de estranhar:ahistóriadaInglaterrae dosEstadosUnidospode
servistacomoumacontínuaoscilação-nostalgiae repulsa- quealterna-
damenteosaproximae distanciadaEuropa.ou,maisexatamente,domundo
latino.Enquantoosgenn8nicos,inclusiveemsuasépocasdemaiorextravio,
nuncadeixaramde sesentireuropeus,nos inglesesé manifestaa vontade
de ruptura,desdea GuerradosCemAnos.A Alemanhaprossegueenfei.
tiçada,parao beme parao mal,peloespectrodo SacroImpérioRomano-
Gennânicoque, maisou menosabertamente,inspirousuasambiçõesde
hegemoniaeuropéia.A Grã-Bretanhajamaispretendeufazerda Europaum
impérioe seop~sa todasas tentativas- venhamda direitaou da esquer-
da,invoquemonomedeCésaroudeMarx- decriarumaordempolítica
quenão sejaa do instável"equilíbriode poderes".A históriada cultura
germânic8,com maiorênfaseaindado que sua históriapoUtica,é uma
apaixonadatentativade consumara fusãoentreo germânicoe o latino.
Nãoé necessáriocitarGoetheja mesmapaixãoanimaespíritostãoviolenta.
mentegermânicoscomoNovalise Nietzscheou pensadoresaparentemente
tão distanciadosdessaespéciede preocupaçãocomoMarx.
90 91
Pound.o exemplode Gautierfoi determinante.Todas
essasmudançassefundamentaramemoutra:a substi-
tuiçãodalinguagem"poética"- ouseja,o dialetoli-
teráriodospoetasdo fim doséculo- peloidiomade
todososdias.Nãoa estilizadalinguagem"popular",à
maneirade Juan Ram6nJiménez,AntonioMachado,
GarcíaLorcaou'Alberti,afinaldecontasnãomenosar-
tificialqueo idiomadapoesia"culta",mM a falada
cidade.Nãoa cançãotradicional:a conversação,a lin-
guagemdasgrandesurbesdonossoséculo.Nissoa in-
fluênciafrancesafoi deterrninante.Contudo,as razões
quemoveramospoetasinglesesforamexatamentecon-
tráriasàs.queinspiraramseusmodelos.A irrupçãode
expressõesprosaicasnoverso- queseiniciacomViç-
torHugoeBaudelaire- e a adoçãodoversolivree do
poemaempro~aforamrecursoscontraa versificaçãosi-
lábicae contraa poesiaconcebidacomodiscursorima-
do.Contrao metro,contraa linguagemanalítica:ten-
tativadevoltarao ritmo,chaveda analogiaou cor-
respondênciauniversal:Nalínguainglesaa reformateve
umasignificaçãooposta:nãocederà seduçãorítmica,
mantervivaa consciênciacrítica,mesmoi1õsmomentos
demaiorabandono.1Nume noutroidiomaos poetas
procuramsubstituira falsidadedadicção"poética"pela
imagemconcreta.Mas,enquantoosfrancesesserebela-
ramcontraa abstraçãodoversosilábico,\ ospoetasde'
línguainglesaserebelaramcontraa vaguidãoda poe-
siarítmica. .
Thewastelandfoi julgadoumpoemarevolucioná-
do.porboa'partedacríticainglesae estrangeira.Não
obstante,s6à luzdatradiçãodoversoinglêsé possível
entendercabalmentea significaçãodessepoema.Seu
temanãoé simplesmentea descriçãodogeladomundo
moderno,masa nostalgiadeumaordemuniversalcujo
modeloé a ordemcristãdeRoma.Daí queseuarqué-
tipopoéticosejaumaobraqueé a culminânciae a ex-
pressãomaisplenadessemundo:A divinacomédia.À
ordemcristã- querecolhe,transmutae dáumsenti-
dodesalvaçãopessoalaosvelhosritosdefertilidadedos
pagãos- Eliotopõea realidadedasociedademoderna,
tantoemsuasbrilhantesorigensrenascentistas,quanto
emseusórdidoe fantasmagóricodesenlacecontemporâ-
neo.Assim,ascitaçõesdopoema- suasfontesespiri-
tuais- podemserdivididasemduaspartes.Ao mun-
dodesalvaçãopessoale cósmicaaludemascitaçõesde
Dante,Buda,SantoAgostinho,osupanixadeseosmitos
devegetação.A segundametadesesubdivide,porsua
vez,emduas:a primeiracorrespondeaonascimentode
nossaidade;a segunda,à suasituaçãopresente.Porum
lado, fragmentosde Shakespeare,Spencer,Webster,
MarveIl,nosquaisserefleteo luminosonascimentodo
mundomoderno;poroutro,Baudelaire,Nerval,o fol-
cloreurbano,a línguacoloquialdossubúrbios.A vi-
talidadedosprimeirosserevelanosúltimoscomovida
desalmada.A visãodeElizabethdaInglaterrae deLord
Robertnumbarcoengalanadocomvelasdesedae ban-
deirasairosas,comoumailustraçãode umquadrode
Ticianoou deVeronese,resolve-sena imagemdafun-
cionáriapossuídapor umgalãvulgarnumfim dese-
mana.
A essadualidadeespiritualcorrespondeoutranalin-
guagem.Eliotsereconhecedevedordeduascorrentes:
os elisabetanose os simbolista(sobretudoLaforgue).
Ambasservem-lheparaexpressara situaçãodomundo
1 Issoexplicaa escassainfluênciado Surrealismona Inglaterrae nos
Estados,Unidosduranteesseperíodo.Emcompensação,essainfluênciaé
decisivana poesiadelínguainglesacontemporAneae se iniciamaisou
menosporvoltade1955. ' .
92 93
contemporâneo.Comefeito,o homemmodernocomeça
a falarpelabocadeHam1et,Pr6speroe algunsher6is
deMarloweeWebster.Mascomeçaafalarcomoumser
sobre.humano,es6comBaudelaireseexprimecomoum
homemcaídoe umaalmadividida.O quetomaBau-
deIaireumpoetamodernonãoé tantoa rupturacoma
ordemcristãquantoaconsciênciadessaruptura.Moder-
nidadee consciênciaambígua:negaçãoe nostalgia,
prosa e lirismo. A linguagemde Eliot recolhe
estaduplaherança:despojosde palavras,fragmen-
tosdeverdades,o esplendordoRenascimentoinglêsalia.
doà misériae à aridezdaurbemoderna.Ritmosque-
brados,mundodeasfaltoe deratosatravessadoporre-
lâmpagosdebelezacaída.Nessereinodehomensocos,
ao ritmosucedea repetição.As guerraspúnicassão
tambéma primeiraguerramundial;confundidos,pre-
sentee passadodeslizamparaumacavidadequeé uma
bocaque.tritura:ahist6ria.Maistarde,essesmesmosfa-
toseessasmesmaspessoasreaparecem,desgastadas,sem
perfis,flutuandoà derivasobreumaáguacinzenta.To-
dossãoaquelee aqueleé nenhum.Essecaosrecupera
significaçãotãologoo situamosfrenteaouniversodesal-
vaçãorepresentadoporDante.A consciênciadeculpa
é tambémnostalgia,consciênciado exílio.Dante,po-
rém,nãonecessitaprovarsuasafirmações,e suapala-
vrasustentasemesforço,comoo taloaofruto,o signi-
ficadoespiritual:nãohárupturaentrepalavraesentido.
Eliot,aocontrário,deverecorrerà citaçãoe aocal/age.
O florentinoseap6iaemcrençasvivase compartilha-
das;o inglês,conformeindicao críticoC. Brooks,tem
portemaUa reabilitaçãodeumsistemadecrençasco-
nhecidomasdesacreditado/lIPodemosagoracompre-
J
t Vero livroT.S.Eliot:a study01hiswritingbyseveralhands,Lon-
dres.1948.
94
enderemquesentidoo poemadeElioté tambémuma
reformapoética,nãosemanalogiascomasdeMilton
e Pope.B umarestauração,masrestauraçãode algo
contraquea Inglaterra,desdeo Renascimento,serebe-
lou:Roma.
Nostalgiadeumaordemespiritual,as imagense os
ritmosdeThewastelandnegamo princípiodaanalo-
gia.O lugardestaé ocupadopelaassociaçãodeidéias,
destruidoradaunidadedaconsciência.A utilizaçãosis-
temáticadesseprocessoé um dosmaioresacertosde
Eliot.Desaparecidoo mundodevalorescristãos- cujo
centroé justamentea analogiauniversal,ou correspon-
dênciaentrecéu,terrae inferno-, nadarestaaoho-
mem,excetoa associaçãofortuitaecasualdepensamen-
tose imagens.O mundomodernoperdeuo sentidoe o
testemunhomaiscrudessaausênciadedireçãoé o au-
tomatismodaassociaçãodeidéias,quenãoestáregido
pornenhumritmoc6smicoouespiritual,maspeloacaso.
Todoessecaosdefragmentoseruínasseapresentacomo
a antítesedeumuniversoteol6gico,ordenadoconforme
os valoresda Igrejaromana.O homemmodernoé o
personagemdeEliot.Tudolheéestranhoe emnadaele
fe reconhece.B a exceçãoquedesmentetodasasana-
logiase correspondências.O homemnãoé árvore,nem
planta,nemave.Estás6emmeioà criação.E quando
tocaumcorpohumano,nãoroçaumcéu,comoqueria
Novalis,maspenetranumagaleriadeecos.Nadamenos
românticoqueessepoema.Nadamenosinglês.A con-
trapartidadeThe wastelandé a Commediae seuan-
tecedenteimediato,As floresdo mal.Seránecessário
acrescentarqueo títulooriginaldolivrodeBaudelaire
eraLimbosequeThewastelandrepresenta,dentrodo
universodeEliot,segundodeclaraçãodopr6prioautor,
nãoo Inferno,maso Purgat6rio?
95
Pound,il migliorfabbro,é o mestredeEliote a
elesedeveo "simultaneísmo"deThewasteland,pro-
cessodequeusaeabusaemseusCantos.Diantedacrise
moderna,ambosospoetasvolvemosolhosparao pas-
sadoe atualizama história:todasasépocassãoesta
época.MasEliotdesejaefetivamenteregressare reiris-
talarCristo;Poundserve-sedo passadocomooutra
fonnadefuturo.Perdidoo centrodoseumundo,lança-
seatodasasaventuras.DiversamentedeEliot,éumrea-
cionário.nãoumconservador.Na verdade,Poundnun-
cadeixoudesernorte-americanoe é o legítimodescen-
dentedeWhitman,ouseja,éumfilhodaUtopia.Por
isso,valore futurosetomamsinônimosparaele:é va-
liosotudoaquiloquecontémumagarantiade,futuro.
Valetudoaquiloqueacabadenascereaindabrilhacom
aluzúmidadoqueestámaisalémdopresente.O Che-
Kinge ospoemasdeAmault,justamenteporseremtão
antigos,sãotambémnovos:acabamde ser desenter-
rados,sãoo desconhecido.ParaPounda históriaé mar-
cha,nãocírculo.SeembarcacomOdisseunãoé para
regressara 1taca,masporsededeespaçohistórico:para
ir além,sempreparaalém,parao futuro.A erudição
dePoundé umbanqueteapósumaexpediçãodecon-
qUista;a deEliot,a buscadeumapautaquedêsentido
à história,fixaçãoaomovimento.Poundacumulaas
citaçõescomumar heróicodesaqueadordetúmulos;
Eliot ordena-ascomoalguémquerecolherelíquiasde
umnaufrágio.A obrado primeiroé urnaviagemque
talveznãonos'leveapartealguma;a deEliot,urnabus-
cadacasaancestral.
Poundestáenamoradodasgrandescivilizaçõesclás-
sicasou,maispropriamente,decertosmomentosque,
nãosemarbitrariedade,consideraarquetípicos.Os Can-
tos sãouma atualizaçãoem termosmodernos- urna
presentificação- deépocas,nomeseobrasexemplares.
Nossomundoflutuasemdireção;vivemossobo impé-
rio daviolência,mentira,agiotageme grosseriaporque
fomosamputadosdo passado.Poundnospropõeuma
tradição:Confúcio,Malatesta,Adams,Odisseu... A
verdadeé quenosoferecetantase tãodiversasporque
elemesmonãotemnenhuma.Por isso,vai da poesia
provençalà chinesa,deSófoclesa Frobenius.Suaobra
todaéumadramáticabuscadessatradiçãoqueelee seu
paísperderam.Masessatradiçãonãoestavano pas-
sado;averdadeiratradiçãodosEstadosUnidos,talcorno
semanifestaemWhitman,erao futuro:a livresocie-
dadedoscamaradas,a novaJr.rusalémdemocrática.O
grandeprojetohistóricodosfundadoresdessanaçãofoi
malogradopelosmonopóliosfinanceiros,o imperialis-
mo,o cultodaaçãopelaação,o ódioàsidéias.Pound
sevoltaparaa históriae interrogaos livrose as pe-
drasdasgrandescivilizações.Seeleseextravianesses
grandescemitériosé porquelhefazfaltaumguia:uma
tradiçãocentral.A herançapuritana,conformeEliotviu
muitobem,nãopodiaserumaponte:elamesmaé ruptu-
ra,dissidênciadoOcidente.
Diantedodesmedidodesuapátria,Poundbuscauma
medida- semsedarcontadequetambémeleé des-
medido.O heróidosCantosnãoé o astuciosoUlisses,
sempredonodesi mesmo,nemo mestreKung,queco-
nheceo segredodamoderação,masum serexaltado,
tempestuosoe sarcástico,aomesmotempoesteta,pro-
fetae clown:Pound,o poetamascarado,encarnaçãodo
antigoheróida tradiçãoromântica.~ o contráriode
urnacasualidadequea obraanterioraosCantosseam-
paresobo títulodePersonae:a máscaralatina.Nesse
livro,quecontémalgunsdosmaisbelospoemasdosé-
culo,Poundé Bertrandde Bom,Propércio,Li-Po -
96 97
semnuncadeixardeserEzraPound.O mesmoperso-
nagem,o rostocobertopor umasucessãonãomenos
prodigiosadeantifaces,atravessaaspáginasconfusase
brilhantes,lirismotransparenteegalimatias,dosCantos.
Essaobra,comovisãodomundoe dahist6ria,carece
deumcentrodegravidade;masseupersonagemé uma
figuragravee central.:Breal,aindaquesemovimente
numcenárioirreal.O temadosCantosnãoé a cidade
nemo bem-estarcoletivo,e sima antigahist6riadapai-
xão,condenaçãoe transfiguraçãodo poetasolitário.:B
o últimograndepoemaromânticoda línguainglesae
talvezdoOcidente.A poesiadePoundnãoestána li-
nhadeHomero,VirgJ.1io,Dantee Goethe:talveztam-
pouconadePropércio,Quevedoe Baudelaire.:npoesia
estranha,discordantee íntimaaomesmotempo,como
a dosgrandesnomesdatradiçãoinglesae ianque.Para
n6s,latinos,lerPoundé tãosurpreendentee estimulan-
tecomoparaeleterásidolerLopedeVegaouRonsard.
OssaxõessãoosdissidentesdoOcidentee suascria-
çõesmaissignificativassãoexcêntricasemrelaçãoà tra-
diçãocentraldenossacivilização,queé latino-germâni-
ca.DiversamentedePoundeEliot- dissidentesdadis-
sidência,'heterodoxosembuscadeumaimpossívelor-
todoxia~.editerrânea-, Yeatsnuncaserebeloucontra
suatradição.A influênciade pensamentose poéticas
inusitadose estranhosnãocontradiz,antessublinha,seu
essencialromantismo.Mitologiairlandesa,ocultismohin-
due simbolismofrancêssãoinfluênciasdetonalidades
e intençõessemelhantes.Todasessascorrentesafirmam
a identidadeúltimaentreo homeme a natureza;todas
seproclamamherdeirasdeumatradiçãoe deumsa-
ber'perdidos,anterioresa Cristoe a Roma;emtodas,
enfim,reflete-seummesmocéupovoadodesignosque
s6o poetapodeler.A analogiaéa linguagemdopoeta.
98
Analogiaéritmo.Yeatscontinuaa linhadeBlake.Eliot
marcao outrotempodo compasso.No primeirotriun-
famosvaloresrítmicos;nosegundo,osconceituais.Um
inventaouressuscitamitos,é poetanosentidooriginal
dapalavra.O outroserve-sedosantigosmitosparare-
velara condiçãodohomemmoderno.
Concluo:a reformapoéticadePound,Eliot,Wallace
Stevens,Cummingse MarianneMoorepodeservista
comoumare-latinizaçãoda poesiade línguainglesa.g
reveladorqueessespoetasfossemoriundosdosEstados
Unidos.O mesmofenômenoseproduziuumpoucoan-
tesnaAméricaLatina:àsemelhançadospoetasianques,
querecordaramàpoesiainglesasuaorigemeuropéia,os
"modernistas"hispano-americanosrenovarama tradição
européiadapoesiade línguaespanhola,queforaque-
bradaouesquecidanaEspanha.A maioriadospoetas
anglo-americanostentou.transcendera oposiçãoentre
versificaçãoacentualeregularidademétrica,ritmoe dis-
curso,analogiae análise,sejapelacriaçãodeumalin-
guagempoéticacosmopolita(Pound,Eliot,Stevens),seja
pela americanizaçãoda vanguarda'.-européia(Cum-
mingse WilliamCarlosWilliams).Os primeirosbusca-
ramnatradiçãoeuropéiaumclassicismo;os segundos,
umaantitradição.WilliamCarIosWilliamspropôs-sea
reconquistaro HAmericanidiom",mitoquedesdea épo-
cadeWhitmanreapareceumaououtraveznaliteratu-
raanglo-americana.Sea poesiadeWilliamsé,decerto
modo,umretornoa Whitman,é necessárioacrescentar
quesetratadeumWhitmanvistocomosolhosdavan-
guardaeuropéia.O mesmosedevedizerdospoetasque
nosúltimosquinzeouvinteanosseguiramo caminhode
Williams.Esseepisódioparadoxalé exemplar:os poe-
taseuropeus,particularmenteos franceses,.viramem
Whitman- tantoem seuversolivre quantoem sÜa
99
exaltaçãodocorpo- umprofetae ummodelodesua
rebeliãocontrao versosilábicoregular;hojeosjovens
poetasinglesese anglo-americanosbuscamnavanguar-
dafrancesa(Surrealismoe Dadá)e,emgraumenor,em
outrastendênctas- Expressionismo,alemão,Futuris-
morussoe algunspoetasdaAméricaLatinae daEspa-
nha- o mesmoqueos europeusbuscaramemWhit-
manoNooutroextremodapoesiacontemporâneaanglo-
americana,W.H. Auden,JohnBerrymane RobertLo-
welltambémolhamparaa Europa,maso quenelapro.
curam- já quenãoumaimpossívelreconciliação- é
umaorigem.A origemdeumanormaque,segundoeles,
a própriaEuropaperdeu.
Depoisdo quefoi dito,quasenãoé precisosees-
tendersobrea evoluçãoda poesiafrancesamoderna.
Bastarámencionaralgunsepisódioscaracterísticos.Em
primeirolugar,a presençadoRomantismoalemão,mais
comofermentoquecomoinfluênciatextual.Embora
muitasidéiasdeBaudelairee dossimbolistasjá seen-
contrassememNovalise emoutrospoetase filósofos
alemães,nãosetratadeumempréstimoe simdeumes-
tímulo.A Alemanhafoi umaatmosferaespiritual.Em
algunscasos,porém,houveo transplante.Nervalnão
s6traduziue imitouGoethee váriosromânticosmeno-
res:umadasQuimeras("Délfica")é diretamenteiJ).spi-
radaem"Mignon":KennstdudasLand,wodieZitronen
blühn... A cançãolíricadeGoethetransforma-senum
sonetohermétic~queé umverdadeirotemplo(nosen-
tidodeNerval:lugardeiniciaçãoe deconsagração).A
contribuiçãoinglesatambémfoi essencial.Os alemães
deramà Françaumavisãodo mundoe umafilosofia
simbólica;osingleses,ummito:aimagemdopoetacomo
umdesterrado,emlutacontraos homense os astros.
Maist~rdeBaudelairedescobririaPoe.Umadescoberta
quefoi umarecriação.O infortúniofundaumaestética
naquala l;xccção,a belezairregular,é a verdadeirare-
gra.O estranhopoetaBaudelaire-Poemina,assim,as
baseséticase metafísicasdoCtassicismo.Emcompensa-
ção,excctocomoruínasilustresoupaisagenspitorescas,
a Itáliae a Espanhadesaparecem.A influênciadaEs-
panha.decisivanosséculosXVI e XVII, é inexistente
no séculoXIX. LautréamontcitadepassagemZorilla
(leu-o?)e HugoproclamaseuamorpornossoRoman-cero.Nãod~ixadesersingularessaindiferença,quan-
dosepensaquea literaturaespanhola- particularmen-
teCalderón- impressionouprofundamenteosromânti-
cosalemãeseingleses.Suspeitoquearazãodessasatitu-
desdivergentesé a seguinte:enquantoos alemãese os
inglesesvêem110Sbarrocosespanhóisumajustificaçãode
suaprópriasingularidade,ospoetasfrancesesprocuram
algoquea Espanhanãopoderialhesdar,massima Ale-
manha:umprincípiopoéticocontrárioà suatradição.
O contágioalemão,comsuaênfasenacorrespondên-
ciaentresonhoerealidadeesuainsistênciaemvera na-
turezacomoumlivrodesímbolos,nãopodiasecircuns-
creverà esfera'dasidéias.Seo verboé o duplodocos-
mo,o campoda experiênciaespiritualé a linguagem.
Hugoéo primeiroque'atacaa prosódia.Ao tornarmais
flexívelo alexandrino,preparao adventodoversolivre.
Entretanto,devidoà naturezadalíngua,a reformapoé-
ticanãopodiasereduziraumamudançadosistemade
versificação.Essamudança,alémdisso,erae é'impos-
sível.:f:possívelmultiplicarascesurasno interiordo
versoe praticaro en;ambement:faltarãosempreos
apoiosrítmicosdaversificaçãoacentu~1.O versolivre
francêsdistingue-sedo deoutrosidiomaspor seruma
combinaçãodediversasmedidassilábicase nãodeuni-
100
,
(J)
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101
dadesrítmicasdiferentes.Porisso,Claudelrecorreà as-
sonânciae Saint-JohnPerse,à rimainteriore à alitera-
ção.Daíquea reformatenhaconsistidona intercomu-
nicaçãoentreprosae verso.A poesiafrancesamodern~
nascecoma prosaromânticae seusprecursoressão
Rousseaue Chateaubriand.A prosadeixadesera serva
da razãoe torna-sea confidenteda sensibilidade.Seu
ritmoobedeceàsefusõesdocoraçãoe aossaltosdafan-
tasia.Logoseconverteempoema.A analogiaregeo uni-
versodeAurélia;e osesboçosdeAloysiusBertrande
Baudelairedesembocamna vertiginosasucessãode vi-
sõesdeAs iluminações.A imagemarrebentaa prosa
comodescriçãoou narrativa.Lautréamontconsumaa
ruínadodiscursoedademonstração.Nuncafoi tãocom-
pletaa vingançadapoesia.Abria-seo caminhoparali-
vroscomoNadja,LepaysandeParis,UncertainPlu-
me... O versosebeneficiadeoutramaneira.O primei-
ro a aceitarelementosprosaicosé Hugo;depois,com
maiorlucideze sentido,Baudelaire.Nãosetratavade
umareforma'rítmica,masdainserçãodeumcorpoes-
tranho- humor,ironia,pausareflexiva- destinadoa
interrómpero trotedassífabas.O aparecimentodopro-
saísmoé um"alto",umacesuramental;suspensãodo
ânimo,suafunçãoéprovocarumairregularidade.Esté-
,ticada paixão,filosofiada exceção.O passoseguinte
foi a poesiapopulare sobretudoo versolivre.S6que,
peloquesedisseacima,aspossibilidadesdoversolivre
eramlimitadas.EliotobservaquenasmãosdeLaforgue
esteeraapenasumacontraçãoou distorçãodoalexan-
drinotradicional.Porummomentopareceuquenãose
podiair maisalémdopoemaemprosae doversolivre.
O processohaviachegadoa seutermofinal.Mas em
1897,umanoantesdesuamorte,Mallarmépublicaem
umarevistaUncoupdedês;amaisn'abolirale hasard.
A primeiracoisaquesurpreendeé a disposiçãotipo-
gráficadopoema.Impressasemcaracteresdediversos
tamanh0se espessuras- versais,negritos,bastardi-
nhos-, aspalavrassereúnemousedispersamdeuma
maneiraqueestálongedeserarbitrária,masquenãoé
habitualnemnaprosanemnapoesia.Sensaçãodese
depararanteumcartazouanúnciodepropaganda.Mal-
larmécomparaessadistribuiçãoaumapartitura:La dif-
férencedecaracteresd'imprimerie... dictesonimpor-
tanceà l'emissionorale."Aomesmotempoadverteque
não,setratapropriamentedeversos- traits sonores
réguliers-, masdesubdivisionsprismatiquesde I'Idée.
Músicaparao entendimentoe nãoparao ouvido;mas
umentendimentoqueouveevêcomossentidosinterio-
res.A idéianãoé umobjetoqa razão,masumareali-
dadequeo poemarevelanuma'sériedeformasfugazes,
istoé,umaordemtemporal.A idéia,sempreiguala si
mesma,nãopodesercontempladàemsuatotalidadepor-
queo homemé tempo,movimentoperpétuo:o queve-
moseouvimossãoasusubdivisões"daIdéiaatravésdo
prismadopoema.Nossaapreensãoéparciale sucessiva.
E é, alémdisso,simultânea:visual(imagenssuscitadas
pelotexto),sonora(tipografia:recitaçãomental)e es-
piritual(significadosintuitivos,conceituaise emotivos).
Maisadiante,namesmanotaqueprecedeo poema,o
poetanosconfiaquenãofoi estranhaà suainspiração
amúsicaescutadaemconcertos.E paratornarmaiscom-
pletasuaafirmação,acrescentaqueseutextoinaugura
umgêneroqueseráparao antigoversoo queé a sin-
foniaemrelaçãoà músicavocal.A novaforma,insinua
ele,poderáservirparaos temasdaimaginaçãopurae
paraosdointelecto,enquantoo versotradicionalconti-
nuarásendoo domíniodapaixãoe dafantasia.Porúlti-
mo,nosofereceumaobservaçãocapital:seupoemaé
102 103
umatentativadereuniãode porsuitesparticulii'eset
cheresà notretemps,leverslibreetlepoemeen1'ose."
Emboraa influênciadeMallarmétenhasido.:entral
nahistóriadapoesiamoderna,dentroe foradaFran-
ça,nãocreioquetenhamsidoexploradastodasasvias
queessetextoabreà poesia.Talveznessasegundame-
tadedoséculo,graçasà invençãodeinstrumentoscada
vezmaisperfeitosdereproduçãosonoradapalavra,a
formapoéticainiciadaporMallarmévenhaa sedesdo-
braremtodaa suariqueza.A poesiaocidentalnasceu
aliadaà música;depoisasduasartessesepararame,
cadavezquesetentoureuni-Ias,o resultadofoi a que-
relaouaabsorçãodapalavrapelosom.Assim,nãopen-
sonumaaliançaentreasduas.A poesiatemsuaprópria
música:a palavra.E essamúsica,conformeMallarmé
mostra,é maisvastaquea doversoe daprosatradi-
cionais.Demaneiraalgosumária,masqueé testemunho
desualucidez,Apollinaireafirmaqueosdiasdo'livro
estãocontados:"La typographieterminebrillammentsa
camere,à l'auroredesmoyensnouveauxdereproduc-
tionquesontIecinémaetlephonographe."Nãocreiono
fimdaescritura;creioquecadavezmaiso poematen-
deráa serumapartitura.A poesiavoltaráa serpala-
vrapronunciada.
Uncoupdedêsencerraumperíodo,o dapoesiapro-
priamentesimbolista,e abreoutro:o dapoesiacontem-
porânea.DuasviaspartemdeUncoupdedês:umavai
de Appolinaireaossurrealistas;outra,de Claudela
Saint-JohnPerse.O cicloaindanãoseencerroue, de
umaououtramaneira,a poesiadeRenêChar,Francis
Pongee YvesBonnefoysealimentadatensão,uniãoe
separação,entreprosaeverso,reflexãoe canto.Apesar
desuapobrezarítmica,graçasa Mallarméalínguafran-
cesadesdobrounessemeioséculoaspossibilidadesvir-
tualmentecontidasno Romantismoalemão.Ao mesmo
tempo,porcaminhodiversododapoesiainglesa,mas
comintensidadesemelhante,é palayraquerefletesobre
simesma,consciênciadeseucanto.Enfim,apoesiafran-
cesadestruiua ilusóriaarquiteturadaprosae mostrou
quea sintaxeseapóianumabismo.Devastaçãodoque
tradicionalmentesechamade "espíritofrancês":aná-
lise,discurso,meditaçãomoral,ironia,psicologia,etudo
o mais.A rebeliãopoéticamaisprofundadoséculoope-
rou-senolugaremqueo espíritodiscursivoseapodera-
raquasetotalmentedalíngua,a talpontoqueestapare-
ciadesprovidadepoderesrítmicos.Nocentrodeumpovo
raciocinadorbrotouumbosquede imagens,umanov'a
ordemdecavalaria,armadadospésà cabeçacomarmas
envenenadas.A cemanosdedistânciado Romantismo
alemão,a poesiavoltoua combaternasmesmasfrontei-
ras.E essarebeliãofoi primordialmenterebeliãocontra
o versofrancês:contraa versificaçãosilábicae o dis-
cursopoético.
O versoespanholcombinademodomaiscompletoque
o francêse o inglêsa versificaçãoacentualea silábica.
Mostra-seassimeqüidistantedosextremosdessesidio-
mas.redro HenríquezDrenadivideo versoespanhol
emduasgrandescorrentes:a versificaçãoregular- fun-
dadaemesquemasmétricose estróficosfixos,nosquais
cadaversosecompõedeumdeterminadonúmerodesí-
labas- e a versificaçãoirregular,naqualnãoimporta
tantoa medida,maso golperítmicodosacentos.Assim
sendo,osacentostônicossãodecisivosmesmonocasoda
maispura.versificaçãosilábicae semelesnãoháverso
emespanhol.A liberdaderítmicaseampliaemvirtude
dofatodeosmetrosespanhóisnãoexigirem,narealida-
de,a acentuaçãofixa; inclusiveo maisestrito,o h~n-
104 105
decassílabo,admitegrandevariedadedegolpesrítmicos:
nassílabasquartae oitava;nasexta;naquartae nasé-
tima;naquarta;naquinta.Acrescente-seo valorsilá-
bicovariáveldasesdrúxulase dosagudos,a dissolução
dosditongos,assinalefasedemaisrecursosquepermi-
temmodificaracontagemdassílabas.Naverdade,nãose
tratapropriamentededoissistemasindependentes,mas
deumasócorrentenaqualsecombatemese.separam,se
alternamesefundemas~ersificaçõessilábicaseacentuaI.
A lutaquea versificaçãoregulare a rítmicatravam
nasentranhasdalínguaespanholanãoseexpressacomo
oposiçãoentrea imageme o conceito.Entren6sa dua-
!idaderevela-secomotendênciaparaa históriae incli-
naçãopelocanto.O versoespanhol,qualquerqueseja
a sualongitude,consistenumacombinaçãodeacentos
..:.-passosdedan~- emedidasilábica.eumaunidade
riaqual~éãbraça~doiscontrários:umqueé dançae
outroqueé narrativalinear,marcha,nosentidomilitar
dapalavra.Nossoverse.tradicional,o,octossílabo,éum
versoa cavalo,feitoparatrotare pelejar,mastambém
paradançar.A mesmadualidadese'observanosmetros
maiores,hendecassílabose alexandrino~,queservirama
Berceoe Ercillaparanarrare a SanJuandeIa Cruze
Danoparacantar.Nossosmetrososcilamentrea dança
e o galope,e nossapoesiasemovimenta~ntredoisp6:-
10s:o Romanceroe o Cânticoespiritual.'Oversoespa-
nholpossuiumanaturalfacilidadeparacontarsucessos
her6icosoucotidianos,comobjetividade,precisãoe so-
briedade.Quandosedizqueo traçodistintivodenossa
poesiaépicaé o realismo,compreende-sequeesserea-
lismoingênuo,eportantodenaturezamuitodiversado
moderno,sempreintelectuale ideol6gico,coincidecom
o caráterdo ritmoespanhol?Versosviris,octossílabos
e alexandrinos,mostramumairresistívelvocaçãoparaa
crônicae paraa narrativa.O romancenosconduzsem-
prea narrar.Em'plenoapogeuda"poesiapura",ar-
rastadopeloritmodooctossílabo,GarcíaLorcaretorna
ao aned6ticoe não temeincorrerno pormenordes-
critivo.Essesepis6diose essasimagensperderamo seu
valoremcombinaçõesmétricasmaisirregulares.Alfon-
so Reyes,ao traduzira llíada,nãotemoutroremédio
senãovoltarao alexandrino.Em compensação,nossos
poetasfracassamquandotentama narrativaemversos
livres,comosenotaemlongase desconjuntadaspas-
sagensdoCantogeraldePabloNeruda.(Emoutrosca-
sosacertaplenamente,comoem"AlturasdeMacchu
Picchu";essepoemanãoé, porém,descriçãonemnar.
rativa,e simcanto.)Daríofracassoutambémquando
quiscri~rumaespéciedehexâmetroparasuastentati-
vasépicas.Nãodeixadeserestranhaessacaracterística
modalquandosepensaquenossapoesiaépicamedieval
é irregulare quea versificaçãosilábicainicia-secoma
lírica,noséculoXV. Sejacomofor,os acentostônicos
exprimemnossoamorpelagalhardiae pelaelegânciae,
maisprofundamente,pelafúriadançante.Os acentos
espanh6isnoslevama concebero homemcomoumser
extremosoe aomesmotempocomolugarde encontro
dosmundosinferiorese superiores.Agudos,graves,es-
drúxulos,bisesdrúxulos- pancadassobreo courodo
tambor,palmas,gritos,clarins:a poesiade língua~s-
panholaé dançafestivae fúnebre,dançaeróticae vôo
místico.Quasetodososnossospoemas,inclusiveosmís-
ticos,podemsercantadose dançados,comodizemque
dançavamosseusosfil6sofospré-socráticos.
EssaduaIidadeexplicaasantítesese contrastesfre-
qüentesemnossapoesia.Seo barroquismoé jogodinâ-
mico,cIaro-escuro,oposiçãoviolentaentreistoe aquilo,
~omosbarrocospor fatalidadedo idioma.Naprópria
106 W7

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