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ISSN: 978-85-7822-205-5 A REPRODUÇÃO CAMPONESA E O MANEJO SUSTENTÁVEL DA MANIPUEIRA Autor: Jonas Emanuel da Rocha Antão Graduando em Geografia Licenciatura pela Universidade Federal de Sergipe Bolsista PIBIC/Voluntario Jonasemanuel96@hotmail.com Orientadora: Núbia Dias dos Santos (UFS/DGE) Introdução Os homens se organizam em classes sociais que coabitam no mesmo espaço. A primeira classe é aquela que vende a sua força de trabalho (proletários), a segunda que compra (burgueses). A terceira classe, a camponesa é peculiar, pois nela existe os que vendem a sua força de trabalho, os que a compram sem explorar, e os que nem a vendem e nem compram, mas aplica a sua força de trabalho na sua propriedade produzindo alimentos para a nação, sendo também antagônica aos burgueses latifundiários. O camponês é um sujeito sem igual. Das três classes sociais é a única que superou as transformações espaciais ao longo do tempo permanecendo enquanto classe diferenciada das demais. Sua maneira única de reprodução social é um duro golpe às relações capitalistas de produção. O campesinato é na sua natureza uma classe unida, sustentável e lutadora. O capitalismo busca deturpar esse modo de ser e fazer camponês, buscando destruir a unicidade singular que existe entre o camponês-natureza. A reprodução camponesa se desdobra de modo heterogêneo que, em sua essência caminha na direção oposta à lógica da sociedade capitalista. Isto ocasiona um conflito político ideológico no espaço agrário. As relações capitalistas não são harmônicas com a natureza, pois a natureza é vista como mero recurso que deve ser extraído e transformado. O campesinato partindo na contra mão do desenvolvimento irracional do capital busca uma unicidade homem natureza, que em virtude das armadilhas capitalistas pode ser desfragmentada. Enquanto os latifundiários buscam na terra a acumulação de riquezas e cultivos de commodities agrícolas, os camponeses alimentam a nação, como ressoou através das vozes de milhares de camponeses no pavilhão da Vera Cruz no I Congresso do MPA, “se o campo não Planta? A cidade não janta!”. Assim, os camponeses plantam diversas variedades alimentícias, como batata, feijão, tomate, banana, maracujá, mandioca... A mandioca que depois do desprendimento do trabalho nas casas de farinha produz um dos alimentos mais consumidos pelos nordestinos, a farinha de mandioca. ISSN: 978-85-7822-205-5 Em Sergipe é no município de Lagarto/SE que a mandiocultura se destaca na lógica camponesa. Na produção de farinha ocorre a geração de resíduos, como a manipueira, um liquido tóxico, e, ao mesmo tempo, rico em nutrientes (MAGALHÃES et. al., 2013). Ao ser descartado de modo inadequado na natureza, a manipueira ocasiona sérios problemas ambientais, como a contaminação do solo e da água. Ao ser manejada de forma correta suas substancias podem ser aproveitadas ampliando o desenvolvimento econômico dos camponeses, pois, a manipueira tem grande quantidade de potássio e nitrogênio elementos essenciais para a agricultura (PAIXÃO E SILVA, 2009, p 1). Este trabalho objetivou através do estudo do espaço lagartense conhecer qual o destino que a manipueira recebe, pois o manejo correto da manipueira beneficia o camponês, reduzindo o impacto humano na natureza. Este artigo integra a pesquisa Pelo Espaço do homem camponês: estratégias de reprodução social no Território Centro-Sul Sergipano e, busca à luz de Santos (2012); Marques, (2008); Oliveira, (2001); Lopes, (2012); Paixão e Silva, (2009) dentre outros, estudar essa classe e do seu par antagônico para compreender o Espaço do Homem Camponês, analisando a realidade do campesinato mandiocultor lagartense e suas estratégias para continuar se reproduzindo com sustentabilidade. A Classe Camponesa: Contextualização Histórica e Conceitual O campesinato é uma classe historicamente mais antiga que o operário, sendo esta uma classe anterior ao movimento da reconstrução das cidades e a revolução industrial e início da Era Moderna. Participantes ativos nas revoluções que estremeceram as monarquias europeias originam-se no período medieval e resistiram a passagem pelos modelos escravocrata, mercantil e capitalista, reafirmando a sua força e resistência perante as transformações do espaço mundial (MARQUES, 2008). O campesinato europeu se desenvolveu com forte enraizamento cultural, sendo que, as terras comunais ou a própria propriedade permitia que o camponês vivesse na terra natal. Haviam entre eles, aqueles detentores da posse da terra e os que mesmo não tendo a posse, trabalhavam nas terras comunais. Estes sujeitos não tinham a necessidade de se deslocar de um lado a outro na busca de terra ou de trabalho para garantir o seu sustento. Construíram uma identidade territorial de forma diferenciada no Brasil (MARQUES, 2008). No Brasil, o campesinato foi desenvolvido no seio de uma sociedade colonial, situada na periferia do mundo capitalista sob as rédeas do latifúndio escravista. Os camponeses brasileiros, desde a invasão portuguesa no século XV, foram colocados em ISSN: 978-85-7822-205-5 marcha constante, em uma peregrinação que não permitiu o enraizamento territorial, marcando-os por uma mobilidade espacial dura e acentuada (MARQUES, 2008, p.4). O processo de acumulação de terra gerou um processo migratório que levou milhares de seres humanos a se dirigirem para as áreas urbanas ou para outras propriedades, criando uma grande massa de pobres e miseráveis que tende a crescer. Num movimento contraditório, as pessoas expulsas das terras têm a certeza que seus filhos não poderão crescer na terra de origem, e nem trabalhar na terra dos pais, cabendo somente um caminho: a estrada, que pode levá-lo para a cidade, ou para a luta pela reconquista da terra uma vez que lhe foi tirada (OLIVEIRA, 2001, p. 188). Essa realidade se estende até a atualidade. Os camponeses brasileiros não tiveram/têm direito a terra, são constantemente retirados das propriedades, nunca tendo o direito real a posse da terra. A solução é a migração para outras regiões do país em busca da sobrevivência e da posse da terra almejada. Enquanto os camponeses europeus construíam laços de identidade com o território, os camponeses brasileiros “são marcados por uma mobilidade espacial”, tendo identidade, mas não território. (MARQUES, 2008) O território brasileiro serve a um mercado que desde o seu descobrimento se caracteriza como agroexportador. Onde os latifúndios buscam exportar grupos de alimentos ou não, como, cana, café, carne, soja. Essa lógica de mercado favorece o desenvolvimento capitalista que a partir do crescimento exorbitante do seu capital, exclui milhares de sujeitos das terras, extraindo a liberdade e o valor do trabalho dos camponeses, em busca de aumentar a riqueza própria. (OLIVEIRA, 2001; ANTÃO, SANTOS, SANTOS, 2015). O camponês produz os alimentos consumidos pela sociedade, lutando e garantindo a soberania alimentar (MPA, 2015 49 ). Destarte, são os camponeses a classe que faz frente ao movimento de dominação capitalista, buscando um movimento igualitário de acesso à terra através de lutas permanentes contra os latifundiários, sendo advindas de outros períodos históricos que no Brasil tem mais de quinhentos anos. O sujeito camponês possui uma história de lutas no campo, como também parte expressiva nos estudos das ciências sociais, relacionado a “disputas políticas e teóricas travadas em torno da interpretação da questão agrária brasileira e das direções tomadas pelo desenvolvimento capitalista no campo”. (MARQUES, 2008, p. 2)49 Informação obtida no Primeiro Congresso do MPA realizado em São Bernardo do Campo/SP em Outubro de 2015. ISSN: 978-85-7822-205-5 O sujeito que carrega esse conceito são homens que possuem uma história de lutas na sociedade diferentemente de outros conceitos como pequeno agricultor ou agricultura familiar. Marques (2008, p.3), afirma que o camponês, tem uma “densidade histórica nos remete a um passado de lutas no campo e ao futuro como possibilidade”. Segundo Shanin apud Marques (2008, p. 3), “o campesinato é, ao mesmo tempo, uma classe social e um “mundo diferente”, que apresenta padrões de relações sociais distintos - ou seja, o que também podemos denominar de modo de vida”. Esse modo de vida é um risco que muitos latifundiários não querem correr, pois o escamoteamento dessa identidade torna-se necessária vista que, o desenvolvimento do capital não ocorre simultaneamente com este modo de ser e fazer camponês, mas o avanço de um e a destruição do outro. Os camponeses desenvolvem espaços heterogêneos e múltiplos, tendo características sociais e culturais próprias, que podem ser denominadas de relações não capitalistas. Que são encarnadas em tradições, sistemas de valores, ideias e formas institucionais (THOMPSON apud MARQUES, 2008, p. 3, FÉLIX, 2013) O campesinato apresenta laços fortes com a terra, que é o seu principal meio de produção e reprodução. Essa forma de relacionar com a natureza é antagônica aos valores e visão de mundo da sociedade capitalista de produção. É esse antagonismo entre ideias a respeito da terra que proporciona o conflito que permite o desenvolvimento contraditório e combinado da realidade, tornando o espaço dinâmico, transformando em um campo ímpar de batalhas (MARQUES, 2008, p. 3). Esta torna-se a razão pela qual, ocorre a luta ideológica em declarar o termo camponês como atrasado e a busca constante em soterrá-lo. O campesinato é uma classe social que tem uma dupla identidade. A primeira é uma classe que através da produção de alimento abastece a sociedade, servindo “aos interesses capitalistas”. A segunda é a força revolucionaria que surge na crise, pois ocorre um forte estranhamento em relação a sociedade de produção capitalista (MARQUES, 2008, p. 3). As relações entre camponês e burgueses latifundiários, campesinato e capitalismo são reproduzidos por meio das contradições que são travadas no decorrer do tempo-espaço agrário, que permitem uma organização dos camponeses que, atende aos interesses do capital, concomitantemente, a confronta (MARQUES, 2008). “Se, por um lado, o mercado domina o campesinato, por outro, ele não o organiza” TAUSSIG (apud MARQUES, 2008, p. 3). A classe camponesa tem a ética como base para todas as relações, apresentando “terra, trabalho e família como valores morais” que se associam a “categorias nucleantes ISSN: 978-85-7822-205-5 intimamente relacionados”, estão organizados em torno de princípios “centrais a honra, a hierarquia e a reciprocidade”, como afirma Woortmann (apud MARQUES, 2008, p. 3). Essas duas classes estão enraizadas numa longa luta histórica que no Brasil chega-se a mais de meio milênio, ocorrendo ao longo destes anos situações peculiares diferentes do restante do mundo. No Brasil, o empresário e o latifundiário se fundiram em um mesmo sujeito, unificando o capital do campo e da cidade (Oliveira, 2001, p. 186). A fusão entre o capital e a terra num mesmo individuo, favorece a concentração de poder econômico e político. Assim, através da concentração política (Estado), ocorre a legalização de atos que irão desfavorecer as classes, proletária e camponesa. Como ocorreu com a criação da Lei de Terras, em 1850, favorecendo os grandes latifundiários. A concentração do poder político permitiu no século XIX, a modernização da agricultura, que consolidou a fusão entre capital Urbano e Rural, permitido e ampliado via Estado um movimento contraditório, transformando os capitalistas industriais em grandes latifundiários (OLIVEIRA, 2001). Essa unificação é favorecida por meio da intervenção do Estado através dos incentivos fiscais da Sudene e da Sudam com o dinheiro do povo brasileiro. A fusão favorecida pelo Capital estatal, permitiu o desenvolvimento de latifúndios com dimensões exorbitantes, “nunca registradas na história da humanidade”. (OLIVEIRA, 2001, p. 186) No Brasil, a fusão favorecida pelo Estado, desenvolveu um movimento contraditório, que ao contrário do que aconteceu na Europa, no movimento de superação Feudal, a burguesia brasileira não desenvolveu um movimento contra o latifúndio e os latifundiários, como destaca (OLIVEIRA, 2001, p. 186), “ao invés de a burguesia atuar no sentido de remover o entrave (a irracionalidade) que a propriedade privada da terra traz ao desenvolvimento do capitalismo, atua-se no sentido de solidificar, ainda mais, a propriedade privada da terra”. Assim a propriedade da terra é inerente a lógica capitalista brasileira. (OLIVEIRA, 2001). A união do latifundiário e o burguês, privado e Estado, proporcionou conforme o autor, grandes áreas que somando as 27 maiores propriedades corresponde a uma área equivalente ao Estado de São Paulo (OLIVEIRA, 2001). Essas grandes propriedades estão concentradas nas mãos de poucos, funcionando como “reserva de valor, ora como reserva patrimonial” (OLIVEIRA, 2001, p. 187). Essas duas reservas são garantias para o acesso aos sistemas financeiros e as políticas governamentais, que ao mesmo tempo em que torna-se ISSN: 978-85-7822-205-5 garantia de riqueza para os proprietários, gera um gigantesco número de pobres(OLIVEIRA, 2001). A visão dos “magnatas da terra” não é produzir alimento mas, acumular e ampliar a riqueza sem trabalhar. Para isso, retira e exclui milhares de camponeses que sem-terra, vendem sua força de trabalho, sujeitando-se ao burguês, as vezes necessitando deixar os pilares de honra e liberdade para atender ao patrão. O conflito entre essas duas classes resultou num movimento, que podemos taxar como o fim do camponês para o bem do burguês e sua rápida substituição pelo agricultor familiar foi a saída encontrada para proteger os latifúndios do país. A produção familiar que estivesse “totalmente integrada ao mercado, sem apresentar qualquer conflito ou contradição em relação ao desenvolvimento capitalista”, este é o papel do Agricultor familiar (MARQUES, 2008, p.6). Destarte, agricultor familiar tornou-se sinônimo de trabalhador escamoteado do capital fornecedor das bases nutricionais da sociedade capitalista de produção, a sua função passou a garantir o “abastecimento alimentar abundante, a preços estáveis, contribuindo assim para o processo de formação dos novos padrões de consumo característicos da expansão capitalista posterior à Segunda Guerra Mundial” (ABRAMOVAY apud MARQUES, 2008, p.6). A tentativa de destruir a identidade camponesa fracassou, movimentos como o dos Sem Terra (MST), Liga Camponesa (internacional) e o Movimentos dos Pequenos Agricultores (MPA), demostram-se como frentes com pautas diferentes, mas se articulam entre si com objetivos comuns, como a luta pela recampesinização, soberania alimentar e liberdade. Ao mencionar os camponeses deve-se acompanhar dessa classe o termo segurança alimentar. São as pequenas propriedades camponesas que alimentam parte considerável dos brasileiros. As grandes propriedades são produtoras de cana, soja ou a produção pecuária visando as mesas de outras nações. A propriedade camponesa supera a produção alimentícia das propriedades capitalistas se for levado em consideração que “a mesma realidade aparece nos dados referentes ao valor da produção agropecuária, pois asunidades com área de até 100 hectares produziram 46,5% do total, ou seja, 18% da área agrícola gera quase a metade da riqueza oriunda do campo. (OLIVEIRA, 2001, p. 189). As dificuldades que os camponeses superam, demostra a força que a classe tem, sendo segundo Oliveira, (2001, p. 189), são responsáveis por produzir mais de 50% de ISSN: 978-85-7822-205-5 produtos para alimentação como: a produção de batata-inglesa, feijão, mandioca, tomate, banana, cacau, café, caju, coco, guaraná, pimenta- do-reino, uva e a maioria absoluta dos hortigranjeiros. Tendo somente acesso a 5% dos créditos do governo, ficando com apenas 30% do total”. Demostrando a capacidade camponesa de administrar a sua propriedade, além da contribuição econômica e social serem superiores a produção capitalista. É portanto, a classe de luta constante e incessável que está em permanente luta pelos direitos e na preservação dos conquistados. Uns na busca constante pela terra outros na luta constante em permanecer na terra. Em ambos os casos a classe busca somente ter o direito de serem produtores de alimentos para abastecer a sociedade brasileira e para sobreviverem da sua própria força de trabalho sem exploração. A produção de mandioca no mundo, Brasil. O Brasil em se tornou em 2009 “o terceiro maior produtor mundial de mandioca” produzindo em torno de 25,5 milhões de toneladas, ficando atrás da Nigéria, com 36,8 milhões de toneladas. Tem-se o “ranking dos maiores produtores de mandioca: Tailândia, Brasil, Indonésia, República Democrática do Congo (R. D. do Congo), Angola, Gana, Índia, Vietnã e Tanzânia, respectivamente” (SEDETEC, 2011, p. 3). O país se configurou como o maior produtor de mandioca, perdendo a liderança para a Nigéria, depois caiu para a terceira posição ultrapassado pela Indonésia. “A produção brasileira de mandioca havia se estabilizado na faixa dos 25 milhões de toneladas, porém na safra de 2012/13 a redução foi mais acentuada por conta da forte seca no Nordeste” (DERAL, 2013). O volume de produção da mandioca e a área plantada (em hectares) estão intimamente ligados ao preço do produto, assim, quando os preços caem, tanto o volume de produção quanto a área plantada sofre diminuição (SEDETEC, 2011, p.4). Essa redução atinge as mesas dos brasileiros e principalmente dos nordestinos, visto que, de “2004 até o ano de 2008 a farinha de mandioca ultrapassou a porcentagem da participação do macarrão com ovos, alcançando 0,67% de participação contra 0,57% destes itens”. (SEDETEC, 2011, p. 6) O Nordeste se caracteriza como o segundo maior produtor de mandioca, perdendo para a Região Norte. Em 2014 atingiu uma produção de 5.668.126 milhões de toneladas, Sul, Sudeste e Centro-Oeste (IBGE, 2014; SEDETEC, 2011). Tem a mandioca como um dos diversos cultivos que é produzido, pois a região tem a “tradição do sistema de policultivo, ou seja, além do plantio de mandioca, outras culturas de ciclo curto são mantidas pelos ISSN: 978-85-7822-205-5 agricultores”. A região também se destaca no consumo desse produto e os seus derivados (SEDETEC, 2011, p. 9-10). Em Sergipe é o município de Lagarto que se destaca na produção estadual, sendo o espaço de estudo desta pesquisa, torna-se necessário aprofundar os estudos sobre o espaço lagartense. Formação Espacial e Características do Município de Lagarto/Se O município de Lagarto encontra-se no território centro sul sergipano, fazendo divisa “ao Norte com os municípios de Pedra Mole e Macambira; ao Sul com os municípios de Riachão do Dantas e Boquim; ao Leste com os municípios de São Domingos, Campo do Brito, Itaporanga d’Ajuda e Salgado; e a Oeste com Simão Dias” (TAVARES; VIEIRA JUNIOR, 2012, p. 12). O município Lagarto compõe uns dos 75 municípios sergipanos, sendo o terceiro mais antigo de Sergipe. Como os demais municípios foi a Igreja a pioneira na dominação do território que é datada de 1540, visto que existiam cerca de dois mil índios que habitavam as terras onde hoje é Lagarto (IBGE, 20-?). A publicação do Cinform municípios (2002, p. 122), narra a história do território que em 1590, ano da invasão de Sergipe por Cristóvão de Barros as terras foram tomadas dos índios e entregue em forma de sesmaria para Gaspar d’Almeida, Gaspar de Meneses, Antonio Gonçalves de Santana e Muniz Álvares, este construiu grandes fazendas. O primeiro povoado foi construído a seis quilômetros da sede atual, que após um surto de varíola forçou os habitantes a mudarem para um local mais elevado, onde hoje encontra-se a praça da Nossa Senhora da Piedade. Nesse local drenava um riacho que tinha algumas rochas em forma de lagarto, dando nome a povoação. Em 1658 Lagarto tornou-se um dos três distritos militares que serviram como base para proteger a província contra a invasão Holandesa (CINFORM MUNICÍPIOS, 2002). Na atualidade, Lagarto tem papel importante dentro do contexto socioeconômico sergipano. Destarte, Lagarto tem uma população estimada em 94.861 habitantes que desde a década de 1990 vem em crescimento constante seguindo os patamares estadual e nacional. O contingente populacional permite o desenvolvimento do município que tem a força de trabalho necessária para ocupar os postos de trabalho mas, não se aplica na agricultura, pois a falta de trabalhadores é uma reclamação constante dos donos de propriedades. A população lagartense está distribuída nos três setores da economia, no qual o de serviços correspondem a mais da metade do Produto Interno Bruto (PIB), da mesma forma ISSN: 978-85-7822-205-5 que ocorre com Sergipe e no Brasil. Seguido pela indústria que ocupa a segunda posição e agropecuária a terceira. A maior porcentagem do PIB lagartense refere-se aos serviços ofertados no município que corresponde a 73% do total. A indústria produz 17% das riquezas do município, o restante 10% do PIB corresponde a Agropecuária. A variável que corresponde ao PIB demostra uma economia diversificada, que não depende somente de um setor econômico. Neste trabalho, iremos nos ater a produção rural de produtos, dentre os vários cultivos produzidos no município será a mandioca e qual a importância deste cultivo para o espaço lagartense. Conforme a PAM - Pesquisa Agrícola Municipal realizada pelo IBGE, no ano de 2014, em Sergipe é o município de Lagarto que concentra a maior área plantada de mandioca, 8.410 hectares (IBGE, 2014; SEDETEC, 2011). No estado é o município de Itabaiana “responsável por 70% da comercialização de farinha de mandioca consumida em Sergipe” (SEDETEC, 2011, p. 12) O rendimento médio da mandioca nos últimos anos vem demostrando estabilidade nos tocante da produção, durante dez anos vem estável os períodos de 2003 à 2014 a produção de Mandioca foi equivalente 1.900 quilogramas por hectare não ocorrendo percas drásticas. Porém não alcançou o pico de produção que ocorreu em 1993 quando foram produzidos 20.800 quilogramas por hectare. O aumento da área da produção veio acompanhado com a queda no valor da produção, que no ano anterior havia atingindo o maior valor de produção da história desde o início do plano real em 1996. A queda em 2013 para 2014 foi de R$ 34.352 (tinta e quatro mil trezentos e cinquenta e dois reais), gerou um prejuízo visto que a área de plantio foi ampliada. As lavouras de mandiocas são denominadas de lavouras temporárias pelo IBGE, sendo assim, algumas propriedades são classificadas como propriedades caraterísticas por cultivar lavouras temporárias. No entanto, o IBGE não especifica que tipo de lavoura, sendo assim as plantações de fumo também são enquadradas neste perfil junto com os alimentícios. A produção de mandioca e seuprocessamento nas casas de farinhas auxilia a renda de várias pessoas, alimentado vários lares brasileiros. No entanto, na fabricação da farinha ocorre a liberação de um líquido tóxico denominado de manipueira. Ao ser descartada diretamente na natureza essa substância torna-se nociva para o homem, ser inerente a natureza. ISSN: 978-85-7822-205-5 A interação homem-natureza é intensa, os camponeses estão limitados aos meios físicos, químicos e biológicos. Pelo trabalho esses mesmos limites tornam-se pela consciência humana oportunidades que podem romper barreiras, abrindo oportunidades e aumentando os limites com o manejo da manipueira (LOPES, 2012). A Manipueira: O Manejo no Espaço do Homem Camponês Lagartense O homem lagartense é além de um habitante, construtor dos seus espaços, interagindo com a natureza, seja de forma harmônica ou conflitante. (SANTOS, 2010, p. 64- 65). O meio conflitante que os homens camponeses interagem com a natureza é o descarte da manipueira no meio ambiente, contaminando o ambiente e a saúde humana, além dos impactos nas espécies animais. O nome manipueira é originário do tupi-guarani significa o que brota da mandioca, se caracteriza como um resíduo líquido originário da prensagem da raiz da mandioca. Contém elevada toxidade por apresentar como componente o glicosídio (linamarina) altamente solúvel em água e do ácido cianídrico (BRANCO apud SANTOS et. al., 2012), “tóxico dos mais poderosos e que pode afetar células nervosas. Este glicosídio combina-se com a hemoglobina do sangue, sendo inibidor da cadeia respiratória” (CEREDA et al apud SANTOS at. al., 2012, p 262) Porém, a manipueira é forte aliado, caso manejado de forma correta, na adubação, ração, construção de tijolos, fertilização e como pesticida, ampliando a capacidade de reprodução camponesa, que ao utilizar a manipueira amplia a possiblidade de ampliar os recursos e conciliar a produção e não prejudicar a natureza (PAIXÃO E SILVA, 2009). Dos oito produtores entrevistados dois afirmaram desconhecer os riscos que a manipueira causam ao meio ambiente. Seis afirmaram conhecer os danos ao meio ambiente e a saúde animal. Porém, nenhum entrevistado percebeu que ao poluir a natureza, também contamina a si mesmo, visto que o homem faz parte da natureza. Assim, é conhecido pelos camponeses que a manipueira “serve como adubo” (entrevistado 1, 2015). Ao ser manejada de forma correta a manipueira diluída em água aplicada no solo oito dias antes do plantio, fortalece a composição de nutrientes para a terra, principalmente o potássio. Deve-se evitar o consumo direto do animal, visto que o entrevistado 02 afirmou que “Os animais não podem tomar direto. A manipueira é veneno” mas o mesmo, alertou que ISSN: 978-85-7822-205-5 existe casos que “estão dando para o gado”, mas, para poderem oferecer ao gado só “depois de cinco dias” após a extração da manipueira evitando intoxicação. Os entrevistados 03 e 04 demostraram que a manipueira era tida no tempo deles como veneno e “hoje é usado para alimentar os animais”, demostrando a dinamicidade do espaço geográfico ao longo do tempo. Percebe-se a partir da fala dos entrevistados que existe uma consciência que a manipueira ocasiona riscos a saúde animal e ao meio ambiente. Como também, apontam como aproveitar a manipueira na alimentação animal, como adubo. Todavia, nenhum revelou como esses problemas podem atingi-los. Considerações A manipueira é conhecida pelos camponeses lagartense que dos oito produtores entrevistados, seis conheciam os riscos e como utilizar de forma sustentável a manipueira. Somente houve três destinos citados para a manipueira, o primeiro como adubo, o segundo como alimento animal e o terceiro para aplicar nas laranjeiras. A manipueira tem diversas utilidades que somente pode ser aplicada se o conhecimento a respeito do seu manejo for transmitido pelos sujeitos. O uso da manipueira como fertilizante, adubo, pesticida natural pode reduzir os gastos com produtos industrializados, reduzindo a entrada de influências capitalistas que possam alterar o modo de ser, saber e fazer camponês, passando a agredir a natureza, ampliando o afastamento entre homem e natureza. A manipueira se caracteriza como elemento que amplia a luta camponesa, possibilitando o fortalecimento contra o modelo capitalista, principalmente os camponeses lagartense que podem utilizar a manipueira para reduzir os gastos econômicos na lavoura e preservar o meio ambiente. Referencias ANTÃO, J. E. R; SANTOS, L. V. dos; SANTOS, R. J. As Relações Entre Camponês- Natureza Mediante As Políticas Públicas No Cultivo Do Milho, No Município De Simão Dias. III Encontro Nacional e IX Fórum Estado, Capital, Trabalho: As inracionalidades do Capital nos tempo e espaço da Barbárie. Anais. São Cristóvão. 2015. CINFORME MUNICÍPIOS. Histórico dos municípios: Um jeito diferente de conhecer Sergipe, 2002. ISSN: 978-85-7822-205-5 FÉLIX, Ingrid Michelle Coelho Sampaio. Uma breve discussão em torno do conceito de Campesinato. In: Simpósio Baiano de Geografia Agrária e Semana de Geografia da UESB: O campo baiano na relação Estado, Capital, Trabalho: Espaço de contradições, espaço de lutas. 1, 2013, Vitória da Conquista. Simpósio Baiano de Geografia Agrária e Semana de Geografia da UESB: O campo baiano na relação Estado, Capital, Trabalho: Espaço de contradições. 2013. GOVERNO DE SERGIPE. Secretaria de estado do desenvolvimento econômico e da ciência e tecnologia. Plano de desenvolvimento preliminar do arranjo Produtivo local da mandioca no agreste e centro-sul Sergipano. SEDETEC. Aracaju/SE. 2011. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Censo Agropecuário do Brasil Disponível em <http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela/listabl.asp?c=263&z=t&o=11>. Acesso em: 05/12/2015. ______- IBGE. 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