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0 0 - Agronegócio, Contexto Econômico

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AULA 1 
AGRONEGÓCIO: CONTEXTOS 
ECONÔMICO, SOCIAL E 
POLÍTICO 
Prof. Gustavo Felipe Olesko 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
O agronegócio é reconhecido, internamente e internacionalmente, como 
um setor da economia brasileira que gera dividendos consideráveis para as contas 
da União. É o setor da produção que desde a década de 1990 aumentou sua 
importância econômica, política e social no país e passou por diversas crises 
econômicas (1991-1992, 1998-1999, 2007-2008, 2016-2019) quase ileso. 
Nesta aula, buscaremos sistematizar um breve histórico da agricultura 
capitalista brasileira – denominada agronegócio a partir do início nos anos 1990 –
, sua reestruturação produtiva e sua nova face. 
TEMA 1 – A ORIGEM DO TERMO AGRONEGÓCIO 
O agronegócio hoje é comumente considerado como sinônimo de 
agricultura capitalista no Brasil. Contudo, a origem do conceito é um pouco mais 
ampla e menos homogênea do que se compreende no país. Sua origem 
conceitual remonta aos Estados Unidos, ao modelo de atividades agropecuárias 
desenvolvidas em grandes e médias propriedades, em sua maioria de domínio 
familiar (family farms). Agronegócio, portanto, designaria, a princípio, um conjunto 
de ações de cunhos produtivo, comercial e financeiro relacionados à agricultura e 
à pecuária (Sauer, 2008, p. 14). 
A noção de que existe uma cadeia produtiva que é permeada de negócios 
(trocas, manufatura de cultivos, transformação de renda da terra em capital etc.) 
é o que traça o entendimento geral de agronegócio: um sistema que envolve 
desde a plantação até o produto já finalizado (seja manufaturado ou in natura) que 
chega à mesa do consumidor. Entretanto, antes de entrar no histórico da inserção 
do conceito no Brasil, precisamos fazer algumas diferenciações entre os 
significados de agronegócio na origem (Estados Unidos) e no destino (Brasil). 
Apesar de Sauer (2008) apresentar o agribusiness estadunidense como um 
modelo baseado na grande propriedade que tem em vista a exportação, 
acabamos concordando com Oliveira (1981) e Vergopoulos (1977) no que tange 
a estrutura fundiária estadunidense: ela é na realidade formada por grandes e 
médias propriedades, as quais são de domínio familiar. São, portanto, um 
emaranhado de pequenas empresas que funcionam com base em controle e 
trabalho familiar, ainda que contem com trabalho assalariado. Podemos entender 
então que o agribusiness ianque é fundamentado em numerosas fazendas 
 
 
3 
familiares, que se assemelham em termos de administração e renda a empresas 
familiares de pequeno e médio porte, as quais se baseiam no domínio da terra e 
no título de propriedade. 
Ainda que haja um processo lento e gradual que ruma à concentração de 
terras, ele não pode ser comparado à concentração que existe no Brasil. Outros 
pontos de destaque são que a cadeia produtiva do agribusiness dos Estados 
Unidos, muito voltada ao processo industrial alimentar (apesar de existir também 
grande exportação de commodities), é também dependente de generosos 
subsídios dos governos federais e estaduais, e a própria estrutura fundiária do 
país é um produto antigo, oriundo do Homestead Act, que remonta ao governo de 
Lincoln, que realizou uma reforma agrária ainda no século XIX (Amin, 1977). 
Diferentemente da origem conceitual, o agronegócio brasileiro é, antes de 
tudo, a face moderna do antigo sistema latifundiário colonial, ou seja, a baseado 
na exploração do trabalho alheio (antes, do negro escravizado; hoje, do camponês 
subordinado ou do assalariado), do latifúndio (grande extensão de terra) e da 
produção para exportação. Logo, não é uma estrutura de base familiar, em que o 
domínio está nas mãos da família, mas, sim, um modelo mais próximo ao da 
grande empresa capitalista. Como ensina Martins (2015), no Brasil as figuras do 
proprietário de terra e do capitalista se fundem em somente uma pessoa: um 
sujeito que é, ao mesmo tempo, pertencente a duas classes sociais distintas, rivais 
em teoria, no modo de produção capitalista. 
Foi no início dos anos 1990 que o conceito passou a ser importado por 
parte da agricultura capitalista brasileira, que buscava uma nova modernização. 
Novamente, Sauer (2008, p. 16-17) nos serve de fonte para explicitar que o 
objetivo da introdução do termo agronegócio no Brasil era distanciar a porção da 
agricultura capitalista, que buscava ser produtiva, da velha estrutura do 
latifundista, que mantinha a terra improdutiva, servindo-lhe apenas como capital 
imobilizado e fonte hipotecaria. Todavia este agronegócio moderno tem ainda 
grande relação com o latifúndio improdutivo: sua base é a mesma, e sua 
territorialização se confunde em muitos pontos. 
TEMA 2 – TERRITORIALIZAÇÃO DO AGRONEGÓCIO NO BRASIL 
É de longa data a estruturação fundiária brasileira baseada no tripé grande 
propriedade, trabalho contratado e exportação. Sua origem se confunde com 
o próprio desenvolvimento do Brasil ainda como colônia e posteriormente como 
 
 
4 
Império, seguindo durante todo o período republicano. Ainda que conte com 
algumas diferenças substanciais, é fato que a concentração de terras é um 
elemento central na formação territorial nacional, na economia e na ocupação 
populacional do país. 
Indo além, o aspecto mais importante do setor primário na economia 
brasileira é o de domínio dos grandes proprietários de terra sobre o Estado 
brasileiro: existiu e ainda existe uma grande trava ao desenvolvimento industrial 
nacional graças ao predomínio do monopólio de acesso à terra (Olesko, 2017, p. 
89). Isso ocorre porque a concentração de terras nas mãos de poucos acaba 
gerando dificuldades no abastecimento das cidades, encarecendo alimentos. Isso 
gerou, historicamente, dificuldades na formação de indústrias competitivas devido 
ao preço do trabalho (os salários tinham de ser maiores para pagar os alimentos, 
que eram caros). Esse processo, grosso modo, ainda é vigente. 
Isso é histórico. Moreira (2012) e Motta (2012) citam que a concentração 
de terras no Brasil é um processo que data ainda da formação territorial do país. 
Está muito atrelada ao sistema sesmarial, que criava o embrião da noção de terra 
como reserva de valor e a posterior transformação da terra como capital 
imobilizado com intuito especulativo (Motta, 2012). Explicando de modo didático, 
no Brasil é historicamente menos arriscado e mais rentável ter a terra como 
garantia do pagamento de hipotecas, as quais são investidas em títulos do tesouro 
nacional ou no mercado financeiro, do que investir em produção. Como cita Lima 
(2016): 
A manutenção das condições de dominação é algo que ainda se 
perpetua no tempo e no espaço. O velho discurso pregado como forma 
de manutenção das condições favoráveis a sobrevivência e perpetuação 
dos poderes de uma tradicional elite agrária, se reelabora a fim de se 
adequar a uma nova forma de dominação do espaço, pautada na 
territorialização do agronegócio. (Lima, 2016, p. 76) 
O autor cita que há uma perpetuação, uma continuidade do domínio do 
agronegócio no que toca ao velho latifúndio. Podemos traçar então que o 
agronegócio nacional é um herdeiro, uma porção do latifúndio improdutivo que se 
modernizou, passou a ser produtivo, mas que ainda tem as mesmas raízes 
políticas e históricas que seu antecessor. 
Sua territorialização não é, consequentemente, nova. É uma atualização 
do latifúndio improdutivo. Como Toussaint (2002) explana, devemos ter em mente 
que dentro das classes sociais existem também diferenças e fissuras; essa é uma 
delas. Podemos ver, inclusive, embates políticos entre os setores produtivos do 
 
 
5 
agronegócio e os proprietários fundiários de latifúndios improdutivos, na disputa 
pelo controle da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), do Ministério da 
Agricultura e Pecuária (MAPA) e até mesmo do Estado brasileiro nas eleições 
presidenciais. 
Tanto o agronegócio quanto o velho latifúndio utilizam os espaços com 
interessesde geração de capital; contudo, as práticas, os modos como essa 
produção é realizada, são muito diferentes entre essas porções da agricultura 
capitalista. E, como vimos anteriormente, os processos de construção e aplicação 
do conceito de agronegócio no Brasil são recentes. Ele mostram diferenças 
estruturais existentes no cerne da classe dos proprietários fundiários, além de 
diferenças de foco produtivo, como veremos no próximo tema. 
TEMA 3 – DE AGROINDÚSTRIA PARA AGRONEGÓCIO 
Trabalhando com o foco na porção produtiva da classe dos grandes 
proprietários de terra, alcançamos o agronegócio. Todavia, não devemos 
entender o processo como uma simples mudança de nome. Há também uma 
modificação na própria essência do processo da agricultura capitalista nacional. 
Delgado (2012) oferece uma importante contribuição ao apresentar a 
modificação do foco da agricultura capitalista do início dos anos 1980: uma 
mudança gradual da ideia de agricultura capitalista como sinônimo de 
agroindústria para sinônimo de agronegócio. Se na aparência isso tem pouca 
importância, o autor ressalta que a prática é, sim, muito distinta. O foco do governo 
federal durante o período da ditadura militar (1964-1985) era o fomento à 
industrialização do país e, para tanto, entendia-se que a base deveria ser a 
agroindústria, ou seja, a produção de produtos industrializados de origem 
primária, como alimentos processados etc. O objetivo era uma produção que 
ficasse retida dentro das fronteiras nacionais e fosse comprada pelas indústrias 
brasileiras. O que circulava então entre os produtores era moeda nacional, e era 
preciso um grande investimento para gerar capitais, obtidos por meio da extração 
de renda da terra. 
O agronegócio nasceu com um objetivo essencialmente diferente: 
direcionar a produção do mercado interno para o mercado externo. Isso trouxe ao 
país montantes significativos de moeda estrangeira (majoritariamente dólares) e 
deu ao produtor segurança, uma vez que não era o mercado interno que regia sua 
produção, mas, sim, o mercado externo, que remunerava melhor devido à taxa de 
 
 
6 
câmbio e que oferecia também maior flexibilidade em termos de destinos. Isso 
tornou o setor menos refém de crises econômicas nacionais (como a do fim da 
ditadura e início do período democrático). 
Assim, podemos entender que o agronegócio se territorializa nas mesmas 
terras do latifúndio improdutivo e da agroindústria do século XX, contudo 
modificando seu foco de produção, deixando de equilibrar mercado interno e 
mercado externo e passando a privilegiar apenas o mercado externo, 
especializando-se ao extremo. Isso perpassa duas motivações econômicas: a 
passagem do capitalismo protecionista com protagonismo do Estado, vigente na 
ditadura militar, para a introdução e a hegemonia do neoliberalismo a partir dos 
anos 1990; e a conclusão da assim chamada modernização conservadora no 
campo brasileiro, que acabou por estruturar a economia do agronegócio. 
Etges (1989) traça sua análise sobre esse fato. Os capitais financeiro, 
industrial e agrocapitalista subordinam o campesinato nas esferas de sua renda 
e de seu trabalho. Isso se dá por meio da territorialização do capital no campo. As 
relações sociais são especializadas e, portanto, o capital também se espacializa 
por meio da subordinação da renda da terra camponesa. Nesse caso, ele não 
necessita tomar as terras desses camponeses, mas, sim, a renda da terra que 
produzem, e é pelo monopólio já citado que alcançam tal objetivo. Esse é também 
um dos gérmens do agronegócio: se antes o latifúndio era constituído muitas 
vezes de terra grilada ou conseguida por meio de expropriação camponesa, agora 
o agronegócio consegue auferir renda subordinando o campesinato, agindo, 
portando, na legalidade. 
O Estado brasileiro seguiu tendo um papel central na relação entre o 
desenvolvimento e a consolidação dessa nova face da agricultura capitalista no 
país. Uma de suas funções principais era suprimir/reprimir o campesinato perante 
a influência da classe dos proprietários de terra (Oliveira, 1981). O acesso à terra 
era raro, e até meados dos anos 1980 deixou o campesinato refém dos 
latifundiários ou agroindustriais; atualmente, ela está nas mãos do agronegócio e 
sua cadeia produtiva. O avanço da agroindústria durante o regime militar foi então 
nada mais que uma face mais atualizada e produtiva que a daquela existente 
anteriormente, do grande latifundiário que usava de suas terras como ferramentas 
de poder político e econômico, utilizando-as para ter acesso ao mercado de 
créditos, sem, contudo, colocar dinheiro no processo produtivo. Seguindo essa 
lógica, o agronegócio é a nova face desse processo. 
 
 
7 
Ainda sobre o Estado, Etges (1989) cita que o papel dele vai além disso 
tudo. Como as desigualdades são necessárias para a expansão do capital, o 
capital se apropria delas com o objetivo de torná-las funcionais para sua 
reprodução ampliada. Fica evidente como a territorialização do capital no campo 
é possível e ocorre devido ao Estado como articulador desse mesmo capital. A 
espacialização dessa exploração é vital para sua futura reprodução ampliada. 
TEMA 4 – A MODERNIZAÇÃO CONSERVADORA DO CAMPO NACIONAL 
Modernização conservadora é a expressão utilizada para denominar o 
processo pelo qual o campo brasileiro passou durante o período da ditadura 
militar. Grosso modo, denomina-se modernização conservadora o processo de 
aumento considerável do uso de tecnologias agrárias no campo brasileiro, em 
especial na agricultura capitalista, em que toda uma gama de técnicas, saberes e 
investimentos foram feitos com o intuito de aumentar a produtividade das 
propriedades, sem, contudo, modificar a estrutura fundiária nacional. E, para 
compreender esse processo histórico, é indispensável entender de onde vem o 
conceito de raiz: 
O termo modernização conservadora foi cunhado primeiramente por 
Moore Junior [...] para analisar as revoluções burguesas que 
aconteceram na Alemanha e no Japão na passagem das economias pré-
industriais para as economias capitalistas e industriais. Neste sentido, o 
eixo central do processo desencadeado pela modernização 
conservadora é entender como o pacto político tecido entre as elites 
dominantes condicionou o desenvolvimento capitalista nestes países, 
conduzindo-os para regimes políticos autocráticos e totalitários. (Pires; 
Ramos, 2009, p. 2) 
Ao versar sobre os exemplos de Japão e Alemanha, os autores apresentam 
o caráter difuso do processo de ascensão do capitalismo industrial em ambos 
países. Diferentemente de França, Estados Unidos e Reino Unido, em que 
revoluções burguesas modificaram a estrutura de classe, na Alemanha e no Japão 
tais processos não ocorreram. Como afirma Vergopoulos (1977), o capitalismo 
industrial francês nasceu da Revolução Francesa (1789), quando a classe 
burguesa, aliada à classe camponesa, acabou com a nobreza e a aristocracia, 
criando as bases para o Estado burguês moderno, ou seja, para a reforma agrária 
a fim de gerar alimentos baratos e fixar pessoas no campo e, assim, controlar o 
exército de reserva para a indústria nascente nas cidades. Vergopoulos (1977) 
ainda cita o caso da Guerra Civil estadunidense (1861-1865), em que se postou o 
exército da União, nortista, do centro industrial do país e abolicionista, contra o 
 
 
8 
exército sulista (confederado), produtor agrário do país, centrado no latifúndio e 
na produção de algodão, escravocrata. Foi a vitória do exército da União que 
possibilitou a extensão da reforma agrária no país, a destruição do grande 
latifúndio e a explosão da indústria. O caso inglês segue a mesma linha, com a 
vitória liberal na revolução gloriosa, a instalação da monarquia parlamentar e a 
transformação dos landlords (grandes proprietários) em financiadores da indústria 
do Reino Unido. 
Processo diferente ocorreu na Alemanha e no Japão ainda no séculoXIX. 
Em ambos os países, o fomento para a indústria adveio de cima, das classes 
dominantes, para baixo. Foram os junkers, grandes latifundiários da porção 
oriental da Prússia, os aliados e financiadores do boom industrial, primeiramente 
do Reino Prussiano e, posteriormente, do Império Alemão recém unificado (1871). 
No Japão, o processo se desenvolveu sob o imperador Meiji. A era Meiji foi o 
período de 1867 a 1912, em que o país se industrializou de modo acelerado por 
meio do incentivo imperial às famílias e aos clãs que, historicamente, eram 
grandes proprietários de terras. Esses casos mostram que o capitalismo industrial 
nasceu do monopólio e não da concorrência, como foram os casos de Estados 
Unidos, França e Reino Unido. Ou seja, de uma modernização conservadora, sem 
revoluções, guerras ou rupturas na ordem vigente. 
No campo brasileiro, processo semelhante ocorreu, como afirma Canuto 
(2004). Não se modificou a estrutura fundiária do país, altamente concentrada nas 
mãos de poucos. Então, o que foi modernizado? Pires e Ramos (2009) citam que 
foi modernizado todo o arcabouço tecnológico e reforçado o apoio estatal à 
produção na agricultura. Olesko (2017) afirma que um marco do apoio estatal 
durante o período da ditadura militar brasileira foi a fundação da Empresa 
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em 1972, com grandes 
financiamento e investimento em desenvolvimento técnico científico da 
agricultura. 
A Embrapa, mais do que apenas coletar dados e estatísticas sobre a 
produção agropecuária, faz pesquisas sobre toda a cadeia produtiva do setor 
primário. Cabe a ela desenvolver agrotóxicos, sementes, técnicas aperfeiçoadas 
de plantio, estudos de cultivos mais adequados para as especificidades climáticas 
e dos solos do país etc. A empresa foi – e ainda é – a ferramenta governamental 
que auxiliou – e ainda auxilia – de maneira importantíssima as produções agrícola 
 
 
9 
e pecuária nacionais. Podemos cravar que foi ela uma das gestoras do embrião 
do que viria a ser o pujante agronegócio brasileiro a partir dos anos 1990. 
Entretanto, o fomento se deu somente à técnica. Ficou restrito ao 
investimento na Embrapa e não a um projeto amplo de regularização fundiário e 
de execução de uma reforma agrária no país. O que se viu foi a manutenção da 
classe dos proprietários de terra como senhores absolutos da grande maioria das 
terras no país como a passagem a seguir demonstra: 
O Brasil possui uma área territorial de 850 milhões de hectares. Desta 
área total, as unidades de conservação ambiental ocupavam 102 
milhões de hectares, as terras indígenas 128 milhões de hectares, e área 
total dos imóveis cadastrados no INCRA aproximadamente 420 milhões 
de hectares. Restavam ainda outros 30 milhões de hectares dessa área 
total, ocupada pelas águas territoriais internas, áreas urbanas e 
ocupadas por rodovias, e posses que deveriam ser regularizadas, e 
outros 170 milhões de hectares de terras devolutas, a grande maioria 
cercada ilegalmente, particularmente, pelos grandes proprietários. 
Há entre os 420 milhões de hectares cadastrados, um total de 4,2 
milhões de imóveis. Esta concentração fundiária indica que a área média 
nas grandes propriedades é de 2.700 hectares, enquanto que nas 
pequenas é de 25 hectares, ou seja, mais de 100 vezes menor. Entre as 
grandes propriedades, o INCRA ao aplicar a Lei 8629 de 1993, 
encontrou 120 milhões de hectares de terras improdutivas, o que 
equivalia a 70% do total. (Oliveira, 2007, p. 150) 
Em outras palavras, podemos compreender que cabe ao agronegócio 
cerca de somente 30% das grandes propriedades do país, uma vez que 70% são 
improdutivas. Foi nessas terras, nesses 30%, que se aplicou a modernização 
conservadora. 
TEMA 5 – CONJUNTURA ECONÔMICA 
Em qual contexto econômico o agronegócio se ergueu como grande via de 
entrada de capitais estrangeiros no Brasil? Qual é o seu papel hoje na conjuntura 
nacional? Essas são duas perguntas essenciais a ser respondidas quando se 
versa sobre a conjuntura econômica do desenvolvimento desse setor da 
economia nacional. 
Destarte, devemos ter a plena noção de que, de uma maneira ou de outra, 
o país vive sob a égide do neoliberalismo – mais intensamente como nos anos 
FHC e Temer; ou menos, como nos governos do PT – desde o início dos anos 
1990. Com isso posto, o agronegócio assume seu caráter agroexportador de 
commodities, caráter este que alcançou seu ápice nos governos petistas por meio 
da manutenção dos preços dessas commodities durante um período considerável. 
Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostram que, em 2018, a 
 
 
10 
participação da indústria no PIB do Brasil alcançou sua menor participação, 
somente 11,3% (CNI, 2019). Isso se deve a dois processos: primeiro, a dificuldade 
de competição da indústria brasileira frente a seus concorrentes estrangeiros, 
especialmente indústrias chinesas e outras multinacionais. Essa dificuldade teve 
sua expressão máxima com a abertura comercial do governo Collor, que ceifou 
muitas indústrias nacionais devido à defasagem tecnológica em comparação com 
as concorrentes estrangeiras. O segundo processo diz respeito ao crescimento da 
participação do setor primário – crescimento este que alcançou 7% em meados 
de 2018 – puxado principalmente pelo agronegócio, que contribui para a queda 
da participação industrial. 
Isso ocorre porque há uma grande possibilidade de geração de renda para 
os proprietários do agronegócio, e de maneira muito mais facilitada do que para o 
setor industrial, como analisa Oliveira (2007, p. 43): 
A renda da terra é uma categoria especial na Economia Política, porque 
ela é um lucro extraordinário, suplementar, permanente, que ocorre tanto 
no campo como na cidade. O lucro extraordinário é a fração apropriada 
pelo capitalista acima do lucro médio. Na indústria ele é eventual, devido 
ao avanço tecnológico, entretanto na agricultura ele é permanente, pois, 
por exemplo, existem diferenças entre a fertilidade natural dos vários 
tipos de solos. 
A renda da terra é também denominada renda territorial ou renda 
fundiária. Como ela é um lucro extraordinário permanente, ela é, 
portanto, produto do trabalho excedente. Esclarecendo melhor, o 
trabalho excedente é a parcela do processo de trabalho que o 
trabalhador dá ao capitalista, além do trabalho necessário para adquirir 
os meios necessários à sua subsistência. 
A possibilidade dessa extração é constante no agronegócio, e, devido à 
manutenção das taxas de exportação de commodities pelo Brasil, mesmo em 
tempos de crise esse setor da economia se torna o porto seguro do investimento 
privado e uma garantia para o Estado, que honra suas dívidas, muitas vezes, 
graças à entrada de capitais que o agronegócio proporciona. Apesar disso, há 
sempre um limite na exploração. O avanço da fronteira agrícola cria, como explica 
Delgado (2012, p.118), uma superexploração, tanto do trabalho (assalariado ou 
camponês) quanto da natureza e seus recursos. A fim de manter seus ganhos e 
ampliá-los, o agronegócio tem uma grande questão a superar. E isso traz à tona 
as motivações que o fazem ser tão interessante para os investimentos de capitais, 
como veremos em breve. 
 
 
 
11 
REFERÊNCIAS 
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agricultura). In: AMIN, S.; VERGOPOULOS, K. A questão agrária e o 
capitalismo. Tradução de Beatriz Resende. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1977. 
CANUTO, A. Agronegócio: a modernização conservadora que gera exclusão pela 
produtividade. Revista NERA, ano 7, n. 5, ago./dez. 2004. Disponível em: 
<http://revista.fct.unesp.br/index.php/nera/article/view/1466/1442>. Acesso em: 
19 jul. 2019. 
DELGADO, G. C. Do capital financeiro na agricultura à economia do 
agronegócio: mudanças cíclicas em meio século (1965-2012). 1. ed. Porto 
Alegre: UFRGS, 2012. 
ETGES, V. E. Sujeição e resistência: os camponesesgaúchos e a indústria do 
fumo. Dissertação (Mestrado em Geografia Humana) – Departamento de 
Geografia, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de 
São Paulo, São Paulo, 1989. Disponível em: 
<https://seer.ufrgs.br/bgg/article/view/40173>. Acesso em 19 jul. 2019. 
LIMA, F. V. Territorialização do agronegócio e resistência camponesa. Mercator, 
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<http://www.scielo.br/pdf/mercator/v15n1/1984-2201-mercator-15-01-0073.pdf>. 
Acesso e19 jul. 2019. 
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MOTTA, M. M. M. Direito à terra no Brasil: a gestação do conflito (1795-1824). 
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OLIVEIRA, A. U. Agricultura e indústria no Brasil. Boletim Paulista de Geografia, 
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12 
_____. Modo capitalista de produção, agricultura e reforma agrária. São 
Paulo, FFLCH, 2007. Disponível em: <http://gesp.fflch.usp.br/sites/gesp.fflch.usp
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Agência de Notícias CNI, 19 mar. 2019. Disponível em: 
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PIRES, M. J. S.; RAMOS, P. O termo modernização conservadora: sua origem e 
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SAUER, S. Agricultura familiar versus agronegócio: a dinâmica sociopolítica 
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<https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/92407/1/sge-texto-30.pdf>. 
Acesso em: 19 jul. 2019. 
TOUSSAINT, E. A bolsa ou a vida: a dívida externa do Terceiro Mundo – as 
finanças contra os povos. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2002. 
VERGOPOULOS, K. Capitalismo disforme (o caso da agricultura no capitalismo). 
In: AMIN, S.; VERGOPOULOS, K. A questão agrária e o capitalismo. Tradução 
de Beatriz Resende. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1977. 
 
AULA 2 
AGRONEGÓCIO – CONTEXTOS 
ECONÔMICO, SOCIAL E 
POLÍTICO 
Prof. Gustavo Felipe Olesko 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
O espaço agrário brasileiro é marcado pela contradição: de um lado, a 
agricultura de ponta e, do outro, uma agricultura tocada pelo trabalho familiar. A 
contradição se expande quando se leva em conta que a agricultura de ponta 
produz normalmente cultivos para a exportação, enquanto é a agricultura menos 
tecnificada aquela que abastece a mesa do brasileiro comum. Antes de tudo, 
devemos ter em mente o que é aquele espaço. 
Milton Santos (1926-2001), o geógrafo mais reconhecido do Brasil e um 
dos mais importantes pensadores dessa ciência, em escala mundial, traça que o 
espaço geográfico é um acúmulo desigual de tempos (Santos, 2004) e que, além 
disso, é um conjunto indissociável de sistemas de ações e sistema de objetos, o 
que chamou de fixos e fluxos (Santos, 2006). Isso significa que o espaço 
geográfico não é um mero palco onde as atividades econômicas acontecem, onde 
a história passa, onde a cultura se realiza e onde as sociedades se desenvolvem. 
Ele, o espaço, é, portanto, produzido. 
Logo, o espaço agrário brasileiro é um sistema de ações que vão desde 
ações governamentais, passando pelas do agronegócio e alcançando as do 
campesinato. E um sistema de objetos, cunhados naturalmente, como as matas, 
florestas, rios etc.; ou pela humanidade, como as lavouras, estradas etc. E isso 
tudo se desenvolve de modo desigual. Ou seja, a porção do espaço sob poder do 
agronegócio, seu território, se realiza de uma maneira enquanto nos territórios 
camponeses isso ocorre de modo distinto. É esse o conceito básico para 
compreendermos o desenvolvimento desta aula. 
TEMA 1 – A PRODUÇÃO DO AGRONEGÓCIO 
Como já visto anteriormente, a transformação da agricultura capitalista 
brasileira, durante a década de 1980, culmina finalmente, nos anos 1990, com o 
agronegócio (como conceito e prática) superando e substituindo a agroindústria, 
no Brasil. Como afirma Sauer (2008), mais que uma mudança nos termos é uma 
mudança na estratégia de produção: da prioridade antes dada ao mercado 
nacional, com alguns setores, somente, exportando, o foco é passado totalmente 
para a exportação. 
Com isso, o agronegócio passa de produtor para a indústria nacional para 
produtor para o mercado global. A globalização, sob os governos neoliberais, 
 
 
3 
chega a seu ápice durante as décadas de 1990 e 2000, com a queda de diversas 
barreiras comerciais e a ascensão da China como grande mercado consumidor, 
em escala global, de matérias-primas e commodities. 
As commodities são as matérias-primas de origem agrícola, vegetal ou 
mineral. Grosso modo, em um linguajar econômico, são produtos que, por si 
mesmos, não possuem valor, mas somente preço, uma vez que valor só possuem 
produtos oriundos do trabalho humano, uma vez que este é que gera valor. À 
primeira vista pode parecer confuso, mas, do ponto de vista econômico, podemos 
elencar que, retirando custos de insumos, maquinário, mão de obra etc., o preço 
de uma commodity seria nulo, uma vez que ninguém produziu um jazigo de 
hidrocarbonetos, que ninguém fez o cultivo de soja (grosso modo, após plantada, 
ela iria brotar de um modo ou de outro, o trabalho humano apenas maximiza ao 
extremo a sua produção) etc. 
No que tange às commodities, é importante saber que sua cotação se dá 
no mercado mundial, ou seja, são produtos cotados – sempre – em dólar. Isso 
leva a uma caracterização muito particular do capitalismo no campo, que conta 
com a consideração de três pontos essenciais: 
[...] a produção de commodities, as Bolsas de Mercadorias e de Futuro 
e os monopólios mundiais. A produção de commodities (mercadorias) 
para o mercado mundial tornou-se o objetivo primeiro da produção 
mundial de alimentos. Isto quer dizer que se produz para quem tem 
poder de compra esteja ele onde estiver no mundo. Ou seja, a produção 
de alimentos não tem mais o objetivo primeiro de abastecer a população 
do estado nacional onde ele é produzido. O exemplo da produção do 
trigo no Brasil é exemplar. O Brasil tornou-se o primeiro país importador 
deste grão do mundo (11 milhões de toneladas). A produção nacional de 
trigo não tem ultrapassado a 3,5 milhões de toneladas. Porém, quando 
os preços internacionais estão altos, exporta-se para o mundo o trigo 
que o país produziu e que não suficiente para o seu próprio 
abastecimento (Oliveira, 2008). 
A passagem anterior exemplifica, muito bem, com o caso do trigo, como 
funciona o mercado de commodities: cotadas em dólar, é padrão que seja muito 
mais rentável sua exportação mesmo que o mercado interno necessite do produto. 
Isso leva então a o agronegócio produzir o que o mercado global busca e o que é 
mais rentável. Faz aproximadamente três décadas que a soja se tornou a principal 
commodity exportada pelo país, mas não a única. A Tabela 1 explicita a soja como 
grande produto exportado do agronegócio nacional, mas também mostra o 
conjunto do que é produzido, com certos destaques. 
 
 
4 
Tabela 1 – Produtos exportados pelo agronegócio, em montante e valores, em 
2018 
Agrupamento Agronegócio 
Transação Exportação 
Ano 2018 
Setor(es) Valor (US$) Peso (kg) 
PLANTAS VIVAS E PRODUTOS DE FLORICULTURA 12.316.060 3.147.502 
LÁCTEOS 58.245.167 23.099.469 
PRODUTOS APÍCOLAS 101.612.43628.557.228 
PRODUTOS HORTÍCOLAS, LEGUMINOSAS, 
RAÍZES E TUBÉRCULOS 206.601.880 305.623.881 
PESCADOS 261.112.322 39.512.750 
PRODUTOS OLEAGINOSOS (EXCLUINDO A SOJA) 270.029.325 489.706.693 
RAÇÕES PARA ANIMAIS 278.143.965 282.390.506 
BEBIDAS 312.317.997 210.186.637 
CHÁ, MATE E ESPECIARIAS 328.854.765 130.651.112 
CACAU E SEUS PRODUTOS 365.005.432 78.969.670 
ANIMAIS VIVOS (EXCETO PESCADOS) 623.543.732 235.723.321 
PRODUTOS ALIMENTÍCIOS DIVERSOS 694.204.747 425.944.697 
DEMAIS PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL 770.722.532 380.239.930 
FRUTAS (INCLUINDO NOZES E CASTANHAS) 975.424.745 877.506.439 
DEMAIS PRODUTOS DE ORIGEM VEGETAL 1.285.125.836 567.224.061 
COUROS, PRODUTOS DE COURO E PELETERIA 1.844.942.282 462.953.941 
FUMO E SEUS PRODUTOS 1.988.179.127 460.999.890 
FIBRAS E PRODUTOS TÊXTEIS 2.004.723.643 1.025.667.022 
SUCOS 2.352.226.935 2.584.674.183 
CEREAIS, FARINHAS E PREPARAÇÕES 4.800.587.134 25.511.246.188 
CAFÉ 4.961.897.381 1.917.843.316 
COMPLEXO SUCROALCOOLEIRO 7.432.745.166 22.679.473.821 
PRODUTOS FLORESTAIS 14.150.976.014 24.653.129.916 
CARNES 14.700.679.454 6.580.985.302 
COMPLEXO DA SOJA 40.905.592.900 101.871.009.994 
TOTAL 101.685.810.977 191.826.467.469 
Fonte: Adaptado de Brasil, 2019. 
Podemos traçar que os seis últimos produtos – soja, carnes, produtos 
florestais (pínus, eucalipto e pasta para papel), etanol, café e sucos 
(especialmente o mercado da laranja) – são os principais produtos exportados 
pelo agronegócio nacional. 
TEMA 2 – LOGÍSTICA E ESCOAMENTO: COMO SE REALIZA A EXPORTAÇÃO 
DAS COMMODITIES 
Todas aquelas commodities em destaque têm um destino certo: a 
exportação. É o processo pelo qual o agronegócio sobrevive, uma vez que, 
 
 
5 
exportando, é possível aumentar a quantidade de renda recebida, já que esta é 
obtida em dólar. A mesma soja produzida no Paraná ou Mato Grosso do Sul 
compete com a soja de Córdoba, na Argentina, ou com a do Tennessee, nos EUA. 
Dois são os fatores principais para sua competitividade e a maior extração de 
renda da sua produção: a produtividade por hectare e o preço do frete. 
Pegando por exemplo a soja, a produtividade nacional (Embrapa, 2019) 
beira as 57 sacas por hectare, enquanto o segundo maior produtor mundial, os 
EUA, tem produtividade de 53 sacas por hectare (Conab, 2018). A diferença é 
pequena, e ainda mais quando se leva em conta a diferença dos custos dos 
modais de escoamento de ambos os países: nos EUA, predomina a ferrovia, 
enquanto no Brasil há um predomínio do transporte rodoviário, mais caro. O que 
diferencia o Brasil é o custo do trabalho, muito baixo, o que deixa ambos em 
competição aberta pelo mercado. 
O foco no modal rodoviário surgiu no Brasil nos anos 1950, como Castro 
(2003) elucida. Foi a opção para o fomento industrial nacional nascido do plano 
de Juscelino Kubitschek que trouxe ao país montadoras de automóveis 
estrangeiras. Então, para fomentar essas indústrias, era necessário criar 
demanda. Integrou-se o Brasil pelas rodovias, ao invés da manutenção e 
expansão da malha ferroviária que o país já possuía. 
No seio dessa expansão, estava o projeto de industrialização nacional. Este 
vai ao encontro do mesmo processo pelo qual a agricultura capitalista da época 
passava: sua modernização conservadora, com o intuito de construir uma 
agroindústria forte para o país. Nos anos 1990, isso se modifica. O projeto de 
industrialização é abandonado, porém diversas de suas ações seguem marcadas 
no espaço nacional e uma das suas marcas mais visíveis é a grade malha viária 
e a dependência do país para com o transporte rodoviário, como cita novamente 
Castro: 
A relação entre o desenvolvimento da atividade agrícola e os transportes 
é ainda pouco entendida. No entanto, os reclames de agricultores e 
produtores em geral localizados em áreas mal servidas de infraestrutura 
de transporte não deixariam dúvida da importância desses serviços para 
o bom funcionamento da atividade. 
[...] há que se considerar a circularidade dessa relação: o crescimento 
das atividades econômicas justifica novos investimentos em 
infraestrutura de transporte, que, por seu turno, possibilita novos 
investimentos para a expansão da produção. 
 Apesar das dificuldades inerentes a esse tipo de estudo, espera-se que 
os resultados alcançados tenham permitido enfatizar a interdependência 
entre os transportes e a produção agropecuária, e mensurar os impactos 
das reduções de custo de transporte sobre o crescimento dessa 
produção. As extensões desejáveis deste estudo incluem a expansão da 
 
 
6 
malha de transporte considerada de modo a incluir os modais ferroviário 
e hidroviário, bem como a estrutura de armazenagem e outros serviços 
logísticos (Castro, 2003, p. 238-239). 
O que o Castro (2003) demonstra é que existe uma relação umbilical entre 
aumento da produção e melhoria/expansão da infraestrutura de transporte e que 
a expansão da produção deveria expandir então a malha (o que não ocorre). O 
escoamento ainda é centralizado na malha rodoviária e há uma urgência de 
investimentos na malha hidroviária e na malha ferroviária. A diminuição de custos 
é também um fator importante, porém a velocidade do frete e a diversificação 
também são de interesse do Estado e dos produtores. Se os portos brasileiros 
passam por diversas atualizações e melhorias, a malha rodoviária não segue o 
mesmo sentido. E esse é um dos principais gargalos do agronegócio brasileiro. 
TEMA 3 – DESTINOS E CONCORRENTES 
Os destinos da produção do agronegócio são os mais diversos; contudo, 
há uma centralidade na exportação para a China e o bloco da União Europeia, 
que se destacam do restante dos destinos. O Gráfico 1 mostra, de um modo geral, 
uma lista de países que compram os produtos brasileiros e sua participação 
percentual em nossas exportações. Nele constam somente os dados específicos 
dos países que têm mais de 1% da participação no destino dos produtos. A malha 
de destinos é muito diversa, uma vez que, no sistema-mundo, há também uma 
divisão internacional do trabalho que se dá nas diferentes porções do espaço. 
 
 
 
 
7 
Gráfico 1 – Participação percentual de alguns países em nossas exportações de 
commodities em 2018 
 
Fonte: Adaptado de Brasil, 2019. 
Os destinos das exportações de commodities mencionados no Gráfico 1 
nos mostram alguns elementos interessantes para a análise. Como Oliveira 
(2008) versa, o comando da produção agrícola mundial está nas mãos do capital 
financeiro e são seus ditames que norteiam a produção. O Brasil produz para 
China e União Europeia aquilo que estes não cultivam, especialmente soja. Em 
troca, o Brasil acaba por importar desses países grandes quantidades de produtos 
manufaturados, inclusive de origem agrícola, com valores agregados muito 
maiores, dificultando assim o equilíbrio da balança comercial nacional. É o que 
0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40%
(PAIS) - CHINA
(BLOCO) - UNIÃO EUROPEIA 28 - UE 28
(PAIS) - ESTADOS UNIDOS
(PAIS) - HONG KONG
(PAIS) - IRÃ
(PAIS) - JAPAO
(PAIS) - COREIA DO SUL
(PAIS) - ARABIA SAUDITA
(PAIS) - VIETNA
(PAIS) - TAILANDIA
(PAIS) - ARGENTINA
(PAIS) - EGITO
(PAIS) - TURQUIA
(PAIS) - INDIA
(PAIS) - EMIR.ARABES UN.
(PAIS) - CHILE
(PAIS) - INDONESIA
(PAIS) - BANGLADESH
(PAIS) - RUSSIA,
OUTROS
%
 
 
8 
Marcos (2008) denomina de uma agricultura de mercado, que segue as 
necessidades dos países que dominam o capital financeiro. 
O papel do Brasil no sistema-mundo globalizado e interconectado é, 
portanto, o de fornecedor de commodities agrícolas a preço baixo, especialmente 
para aqueles que não as produzem: no caso, China e União Europeia. É notável 
a pequena presença dos EUA na balança de destinos das nossas exportações. 
Isso se dá uma vez que o país também é um grande produtor de commodities e 
importa do Brasil somente produtos os quais não produz, especialmente os típicos 
do clima tropical. É, antes de tudo, um concorrente de peso no desenvolvimento 
do agronegócionacional. 
Mendonça (2013) e Oliveira (2008, 2012) discorrem sobre o papel dos 
concorrentes do Brasil no bojo da exportação de commodities agrícolas. Isso 
ocorre, pois o crescimento das compras dos maiores destinos mundiais da soja, 
por exemplo, de União Europeia e China, não é infinito. Há um limite e o 
crescimento desordenado da produção pode gerar inclusive uma diminuição do 
preço da produção. Tendo isso em mente, podemos traçar que Argentina e EUA 
são os grandes concorrentes brasileiros no que tange aos cultivos de cereais e 
cana, além de a Austrália ser um grande player no tocante ao gado. Cada país 
conta com uma estrutura muito diferenciada de sua cadeia do agronegócio e o 
diferencial brasileiro é mais que os subsídios estatais (como é o caso do 
agronegócio dos EUA), mas sim a superação da contradição do dispêndio de 
capital para a aquisição de terras, uma vez que a maioria destas é de origem 
grilada, como nos alerta Oliveira (2007). 
Em vias de iniciar a terceira década do século XXI, o agronegócio brasileiro 
encontra-se na encruzilhada: melhorar suas técnicas agrícolas e aumentar a sua 
produtividade; ou diversificar a produção, por meio de uma reforma agrária 
inclusiva (como aquelas ocorridas nos EUA e Japão, ainda no século XIX) e que 
gere um novo ciclo de produtividade e industrialização ao país. 
TEMA 4 – AGRICULTURA CAMPONESA E SEU FUNCIONAMENTO 
Em primeiro lugar, devemos ter em mente quem é o camponês. O 
campesinato é uma classe do modo de produção capitalista, como elenca Oliveira 
(2007), e não um resquício de outro modo de produção. Igualmente, não está 
fadado ao fim, como diversos intelectuais, de neoclássicos a liberais, de marxistas 
a funcionalistas etc. chegaram a cravar. Shanin (1990) nos ensina que o 
 
 
9 
campesinato é criado e recriado no próprio modo de produção capitalista como 
uma classe social, classe esta que é sempre a mais explorada e subordinada 
pelas outras classes, seja a dos proprietários fundiários, seja a dos capitalistas ou 
seja até mesmo a dos assalariados (Moura, 1986). 
Para o agronegócio, a terra é somente a porção do espaço que lhe serve 
para a extração de renda; já para o campesinato ela é local de vida, cultura, 
trabalho etc. Para o agronegócio, a terra é trabalhada pela mão de obra 
assalariada, ou seja, por terceiros contratados para nela trabalharem. Já para a 
agricultura camponesa, o trabalho é, em sua grande maioria, realizado por e para 
as famílias dos agricultores. 
Os objetivos centrais da produção camponesa são, logo, a manutenção do 
bem-estar familiar (Shanin, 1983). Ou seja, a sua produção é voltada para 
satisfazer as necessidades familiares. Aparentemente, isso levaria a uma 
produção somente para o autossustento; porém, as necessidades familiares não 
podem ser limitadas somente a necessidades nutricionais, deve-se ir além. Como 
Chayanov (1985) já enumerava, as necessidades familiares mudam de região 
para região e de tempos em tempos. Hoje, podemos traçar que internet, meio de 
transporte, lazer, roupas, além de víveres ligados à produção, são também 
necessidades das famílias camponesas. Assim sendo, grande parte do 
campesinato vende não só o excedente de sua produção para o autossustento, 
mas também tem uma porção de suas terras destinadas à produção para o 
mercado. 
O campesinato e, consequentemente, a agricultura camponesa estão 
ancorados em alguns pontos-base: a autonomia relativa perante o mercado, a 
pequena propriedade, o trabalho familiar, a produção em pequena escala e 
diversificada, a alta produtividade (devido à pequena propriedade) e a importância 
na reprodução da família. Entre outros elementos, isso leva à produção de 
policulturas alimentares. 
É então por intermédio de uma agricultura pouco tecnificada, com uso de 
agrotóxicos básicos, tratores comunitários (quando existentes) que o campesinato 
produz cultivos alimentares básicos para o país. Em pequenas propriedades, com 
mão de obra familiar, é necessária a diversificação produtiva, uma vez que, caso 
algum cultivo obtenha um baixo preço no mercado, o rendimento da família não 
seja muito afetado, graças à diversidade de sua produção. Além disso, boa parte 
acaba por produzir somente cultivos destinados ao mercado interno, cotados 
 
 
10 
portando em real e que variam de região para região, conforme a lei básica da 
oferta e demanda. Além disso, há um fator importante na produção camponesa e 
em seu escoamento: o papel dos atravessadores, aqueles sujeitos que compram 
diretamente das famílias para posterior venda nas centrais de abastecimento. 
A importância da agricultura camponesa, logo, se dá justamente pelo fato 
antes elencado: a produção de alimentos para o mercado interno. Uma vez que o 
preço desses alimentos é cotado em moeda nacional, tem um mercado volátil, 
varia regionalmente; e que sua produção requer um cuidado maior de planta para 
planta (o que é prejudicado na agricultura mecanizada, em grandes propriedades), 
isso faz com que a produção de alimentos seja dispensada pelo agronegócio e 
fique nas mãos do campesinato a alimentação nacional. Para esses agricultores, 
não importa a renda obtida, mas sim a manutenção de suas famílias. 
TEMA 5 – MERCADO NACIONAL: O MERCADO CAMPONÊS? 
Como apresentado no item anterior, podemos notar que cabe ao 
campesinato a produção dos alimentos que vão até a mesa do brasileiro. O 
Gráfico 2 demonstra no que a agricultura camponesa (denominada como familiar 
pela base de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE) e a 
agricultura capitalista (designada não familiar pelo IBGE) diferem, muito, em seus 
produtos. 
 
 
 
11 
Gráfico 2 – Comparação entre a agricultura familiar e a não familiar 
 
Fonte: Adaptado de IBGE, [201-]. 
Contudo, devemos nos atentar ao fato de que os alimentos na mesa do 
brasileiro não são sempre in natura. Há um processo de longo prazo de uma 
padronização alimentar, ou seja, a criação de um padrão de consumo globalizado. 
Cadeias de fast food são a expressão máxima disso, porém esse processo não 
se limita a elas. Ploeg (2008) analisa o que chama de impérios alimentares. Para 
o pensador, o desenvolvimento capitalista passa a monopolizar também os 
hábitos alimentares da população e ele dá como exemplo a ampla gama de 
alimentos produzidos à base de milho (salgadinhos, junkie food) e de soja 
(bolachas recheadas, guloseimas doces), o que centraliza um padrão alimentar 
em poucos cultivos. Indo além, podemos levar em conta a gama de produtos 
congelados, cuja oferta cresce a cada dia, e que se tornam inclusive carro-chefe 
da maior multinacional brasileira do agronegócio, a BRF. 
Esse processo, em comparação a outros países, no Brasil ainda é muito 
inicial, datando do início do século XXI, enquanto a Europa Ocidental e os EUA já 
passam por ele, em um lento e longo desenvolvimento, desde, no mínimo, os anos 
1950. É, portanto, urgente o estabelecimento de uma nova face para o 
agronegócio. Porém, ainda devemos levar em conta que o agronegócio subordina 
 
 
12 
o campesinato, uma vez que a fonte dos alimentos congelados são os produtos 
comprados diretamente dessas famílias camponesas (Olesko, 2017). 
Devemos, então, compreender que a dinâmica do mercado brasileiro ainda 
é dependente dos cultivos camponeses, cujos trabalhadores, todavia, não ficam 
com a maior parte do que é pago pelos seus produtos, cabendo ao atravessador 
essa captura da renda. Existe, logo, uma grande possibilidade, no Brasil, tanto 
para a diminuição do preço dos alimentos, por meio da compra direta dos cultivos 
camponeses, quanto para uma reestruturação de parte do agronegócio, que pode 
vir a se voltar mais para o mercado interno, mediante processamento de alimentos 
etc. 
 
 
 
13 
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Estatísticas de Comércio Exterior do Agronegócio Brasileiro.Brasília, 2019. 
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AULA 3 
AGRONEGÓCIO: CONTEXTOS 
ECONÔMICO, SOCIAL E 
POLÍTICO 
Prof. Gustavo Felipe Olesko 
2 
O agronegócio, como face moderna do antigo latifúndio, no que tange aos 
aspectos econômicos, é apenas uma das faces desse grupo: existe também, 
desde a formação do Brasil como entidade política, ainda como colônia e 
posteriormente já independente, primeiramente imperial e como república na 
sequência, uma centralidade da participação dos grandes proprietários de terra 
nos rumos políticos. 
O papel predominante na política nacional desses grandes proprietários 
não é, portanto, recente; não é também ultrapassado ou, ainda, não é conectado 
à ideia de propriedade da terra como símbolo de poder. A terra é, antes de tudo, 
uma garantia de poder financeiro, o qual possibilita a entrada e a ação de seu 
dono no jogo político. Tivemos, na história política brasileira, presidentes 
latifundiários que se enquadram nos mais distintos espectros políticos. Por 
exemplo, Fernando Collor de Mello, bisneto de um senhor de engenho, alinhado 
à vertente política do liberalismo econômico, de direita; ou ainda João Goulart, 
grande latifundiário do Rio Grande do Sul, criador de gado, o qual foi inclusive o 
maior fornecedor de animais para a então empresa estadunidense de carne 
bovina (hoje brasileira, pertencente à BrF) Swift, alinhado, porém, ao trabalhismo, 
à esquerda do espectro político. 
O que devemos compreender, portanto, é que a terra como propriedade é 
um equivalente de capital. A terra é a garantia que se dá ao banco para ter acesso 
ao crédito hipotecário, o que permite a inserção do dono da propriedade no 
mercado financeiro, no investimento em ações, e o investimento na própria 
fazenda, em indústrias etc. Junto disso advém um poder econômico muito grande, 
o qual se transmuta certas vezes na entrada desses sujeitos na política. Ao longo
desta aula, buscaremos traçar uma análise pautada na história e na geografia da
política da agricultura capitalista.
TEMA 1 – DESENVOLVIMENTO DO CAPITALISMO NO BRASIL 
O desenvolvimento do capitalismo Brasil teve uma trajetória muito 
particular. Gorender (1994) cita que o Brasil já nasce, ainda como colônia, inserido 
no modo de produção capitalista. Nasce, portanto, já na exploração do trabalho 
alheio como motor do desenvolvimento (no caso, o trabalho do negro 
escravizado). Mas não é isso que define o modo de produção capitalista e seu 
funcionamento no país; o que o define, podemos dizer a grosso modo, é o 
 
 
3 
esquema do latifúndio de terras, ancorado na tríade grande propriedade de terra, 
trabalho alheio e monocultura (Martins, 2015). 
Assim sendo, ambos os autores acima elencados e mais incisivamente 
Coggiola (2007) rechaçam a construção teórica de que o Brasil, em seu 
nascimento, tinha um tipo de produção feudal. O país foi, desde seu início, 
capitalista, e sua economia foi moldada, desde o princípio, com um caráter 
monopolizador e pouco inclusivo: 
O sistema colonial de distribuição de terras foi responsável pela 
formação do latifúndio; e conspirou contra a pequena propriedade. Ao 
contrário das colônias inglesas, no Brasil os pequenos proprietários não 
tinham incentivo da metrópole, mesmo na legislação. Sem pequena 
propriedade, sem qualquer industrialização sistemática, o latifúndio 
constituía a unidade econômica básica da colônia. A sociedade estava 
sendo moldada de acordo com a economia; os grandes proprietários 
rurais monopolizaram as riquezas, o prestígio e o domínio sobre a massa 
popular, composta por poucos homens livres, índios, mestiços e negros 
escravizados. 
[...] A economia primária de exportação, agitada pela independência (ou 
seja, a falência do monopólio comercial exercido pelo país colonizador) 
consolidou o latifúndio. Em vez de favorecer o acesso a terras e 
pequenas propriedades (como a Homestead Act nos EUA), a Lei de 
Terras, aprovada no Brasil em 1850, favorecia a propriedade de grande 
porte. A lei norte-americana propiciava a ocupação de terras, a brasileira 
dificultava. (Coggiola, 2007, p. 4, tradução nossa) 
Com esse desenvolvimento sendo pautado pela grande propriedade, 
sendo a compra de terras exclusiva a uma certa “proto” elite, uma vez que a 
compra se efetuava somente e diretamente com a Coroa portuguesa, limitou-se o 
acesso à terra. A inexistência de uma classe média, uma pequena burguesia e 
um campesinato articulados (como existentes nos EUA) impossibilitou a pequena 
propriedade camponesa em número considerável, ficando estes às margens do 
sistema latifundiário (Martins, 2015). Se nos EUA a independência foi gerada pela 
união de uma burguesia nascente, latifundiários e pequenos camponeses, no 
Brasil o mesmo processo ocorreu sem rupturas: foi de uma elite agrária 
subserviente a Coroa portuguesa para uma elite agrária dona de si. 
Este processo se seguiu ao longo do século XX. Como Coggiola (2007) 
novamente apresenta, o início dos anos 1930 é marcado pela crise econômica 
resultante do capitalismo liberal com o crash da bolsa de valores de Nova Yorkem 1929. 
 
 
 
 
4 
TEMA 2 – PODER POLÍTICO DO AGRONEGÓCIO: RAÍZES 
A independência, nos ensinam Gorender (1994) e Coggiola (2007), no caso 
brasileiro, estava muito mais atrelada à questão do declínio da exportação para a 
metrópole (Portugal, em crise devido às guerras napoleônicas junto com o 
restante da Europa) do que uma luta por autonomia econômica e política, como 
foi o caso estadunidense, que buscava se livrar das tarifas impostas pela Coroa 
britânica e poder negociar livremente no mundo seus produtos (Purdy; Karnal, 
2007). Tanto isso fica evidente que a relação Brasil – Reino Unido cresce de 
maneira constante após 1822 com o processo de independência. O Reino Unido 
passa a vender suas manufaturas no país, e a elite agrária vende sua produção 
(ainda pequena) para esse país e consegue suas hipotecas em bancos britânicos. 
Outra intelectual, Motta (2012), nos ensina que o poder dos grandes 
latifundiários se manteve ao longo do século XX. Surgido como elencado acima 
com base ainda do Brasil Colônia, sua força se manteve constante ao longo do 
século passado e se mantém ainda neste curto século XXI. Seu poder advém do 
grande montante de dinheiro que possuem e têm disponível, o qual existe 
garantido pelas grandes propriedades que possuem. Com isso, há uma grande 
força política, uma vez que sua presença no Estado é necessária para atender 
aos interesses de sua classe e isto nasce ainda no Brasil Colônia. 
Em nome da Coroa, instituía-se um documento de propriedade, sem 
comprovação alguma em relação à medição e demarcação das terras e 
o cultivo, apenas um parecer anexado ao requerimento, no qual o juiz ou 
tabelião atestava a medição e demarcação das terras anteriormente 
feitas. O encaminhamento burocrático havia pressuposto que o sesmeiro 
tivesse de fato cumprido as determinações dos alvarás e provisões 
régias. Em outras palavras, a Chancelaria reconhecia um direito e 
referendava um processo anterior que, em tese, correspondia ao 
cumprimento das determinações expressas na lei. Nesse sentido, a 
despeito do adensamento dos conflitos e denúncias que chegavam ao 
Conselho Ultramarino, a concessão mantinha-se atrelada à noção de 
que ela era – antes de tudo – uma concessão política, e não territorial. 
A Coroa consagrava um documento – a carta de sesmaria -, 
expressão do poder dos terratenentes que, ao se submeterem aos 
procedimentos legais para a concessão, tiveram por graça um 
documento de propriedade. (Motta, 2012, p. 145, grifo nosso) 
A origem da carta sesmarial – “embrião” da propriedade de terra, origem 
da concentração de renda, terra e poder – emitida pela Coroa, era política, ou 
seja, quem obtinha a carta tinha ligações com a Corte, uma vez que a carta era 
um equivalente ao direito de propriedade, sejam essas ligações políticas, troca de 
favores, sinal de gratidão por algum serviço prestado ao Rei ou semelhante. O 
 
 
5 
que se destaca aqui é que não era possível a um colono pobre, por exemplo, como 
demonstra Motta (2012), obter acesso à terra, à sesmaria. Cabia a este, somente 
a posse. O processo de sesmaria então era um meio de dotar de poder econômico 
uma elite que não possuía no Brasil riquezas. 
Isso se seguiu ao longo do desenvolvimento do país. Com a independência 
e o Império, já em sua constituição de 1824, a propriedade privada se torna 
absoluta, ou seja, indivisível e de poder exclusivo de seu dono (Olesko, 2019). 
É um grande trunfo da classe dos proprietários de terra. Com a lei de terras 
de 1850, nada muda, somente são legalizadas as posses de grandes porções de 
terra sem documentos comprobatórios. Isso ocorre até o Estatuto da Terra de 
1964 (Coggiola, 2007), quando a propriedade deixa de ser absoluta, porém, o 
poder absoluto não é esmorecido, somente há um afrouxamento. 
Com todo o desenvolvimento ocorrido ao longo do século XX na economia 
nacional, o grande proprietário se atualiza, como já vimos, passando pela 
agroindústria e chegando até a sua forma atual: a do agronegócio. 
Essas passagens todas mostram somente que ocorreram transformações 
de caráter produtivo, contudo que não retiraram desses sujeitos seu poder político, 
forjado ainda no Brasil colonial. A produção da força política desses sujeitos do 
campo é antiga e sua ação no Estado Brasileiro perpassou diversos períodos da 
história da política nacional: dos governos neodesenvolvimentistas do PT aos 
governos de centro direita de FHC, com Dom Pedro II no Império, na política da 
República Velha e nos anos Vargas. 
TEMA 3 – PODER POLÍTICO DA AGRICULTURA CAPITALISTA NO MUNDO 
O Brasil aparentemente se faz como país único no mundo no que toca à 
força da agricultura capitalista na política. Todavia isso não é uma realidade. Na 
grande coletânea de Huber e Safford (1995), ambos mostram como o poder da 
agricultura capitalista (não somente no Brasil, mas na América Latina como um 
todo) é muito forte. Há uma presença forte em praticamente todos os países latino-
americanos de uma força política que advém do poder dos latifundiários (os 
terratienentes como são nomeados no restante do continente) e que dita os rumos 
do Estado e da economia destes países. 
Shumway (2008), ao versar sobre a Argentina, mostra como o país 
perpassou ao largo de sua história por disputas constantes entre os grandes 
proprietários agrários e uma nascente burguesia urbana, resultando no século XX 
 
 
6 
em dois golpes militares e em diversos conflitos sociais e problemas econômicos 
de grande envergadura devido a essa disputa, a qual, durante o século XXI, foi 
dominada indiretamente por esses terratienentes: primeiramente com o 
Kirchnerismo e depois com Maurício Macri (Wahren, 2016). Ocorreu então 
naquele país um domínio indireto da classe da agricultura capitalista: ainda que 
os governos não sejam propriamente formados por ruralistas, são estes que 
dominam as decisões do Estado. 
Processo semelhante passa a Colômbia, situação que Mondragón (2012) 
esmiúça: trata-se não só um conflito, mas de uma guerra civil de fato, havendo, 
de um lado, o Estado (dominado por grandes latifundiários) e, do outro, o 
campesinato (em parte servindo de exército para o narcotráfico). O conflito ocorre, 
dentre outras motivações, pelo fato de existir uma concentração de renda e de 
terras nas mãos de poucos sujeitos, os quais superexploram o trabalho camponês 
e ainda acabam por sufocar qualquer possibilidade de desenvolvimento de uma 
indústria local. 
Por fim, outro caso emblemático é analisado pelo mexicano Bartra (2011), 
segundo o qual a revolução mexicana de 1910 realizou sim uma pequena 
distribuição de terra, contudo o país viveu por décadas sob o domínio do Partido 
Revolucionário Institucional (PRI) e do Partido da Ação Nacional (PAN) durante o 
século XX. Os partidos eram dominados direta ou indiretamente por um classe de 
grandes proprietários rurais, os quais nem sempre eram ligados, entretanto, à 
produção agrária, uma vez que muitos deles têm ligações com mineração, 
petróleo, gás natural etc. 
Há também um conflito latente entre o campesinato nacional e o Estado, 
uma vez que ainda que muitos tenham terras, são sujeitos às mais diversas 
ausências do governo. São sujeitos aos mais variados tipos de exploração, o que 
resultou em dois processos distintos: uma hipertrofia da cidade do México (capital) 
e uma grande migração para os EUA, isso tudo causado pela grande 
concentração de renda existente no país. 
Esses três países, por exemplo, servem para notarmos como existe um 
padrão semelhante de concentração de poder, renda e terra nas mãos de uma 
classe. A Argentina começa a se modernizar tardiamente, somente a partir dos 
anos 2000, enquanto no México e Colômbia tal fato não acontece. Sendo assim, 
temos no Brasil e na Argentina uma classe da agricultura que se difere dentro de 
 
 
7 
si: de um lado, o arcaísmo da propriedade improdutiva voltada para a 
especulação; de outro,o agronegócio moderno, exportador de commodities. 
TEMA 4 – REFORMA AGRÁRIA 
A reforma agrária é um processo no qual a terra é dividida e distribuída para 
os que precisam dela para trabalhar, ou seja, o campesinato. Segundo Amin e 
Vergopoulos (1977), o processo da Reforma Agrária serviu para melhorar a 
distribuição de renda de diversos países e para, inclusive, fomentar a 
industrialização. Os Estados Unidos de Lincoln, a recém-unificada Alemanha de 
Bismark e o Japão do fim do século XIX são apenas alguns dos exemplos mais 
marcantes que os autores nos trazem para mostrar que, nesses países, o 
capitalismo industrial triunfou e se desenvolveu de maneira forte e constante 
graças à distribuição de renda, contudo no Brasil esse processo não ocorreu: 
A raiz do desenvolvimento capitalista moderno no Brasil está em seu 
caráter rentista. Isto quer dizer que a concentração da propriedade 
privada da terra atua como processo de concentração da riqueza e do 
capital. Seu desenvolvimento se faz, principalmente, através da fusão 
em uma mesma pessoa do capitalista e do proprietário de terra. Embora 
este processo tenha sua origem na escravidão, e em particular na 
passagem do trabalho escravo para o trabalho livre, foi a partir da 
segunda metade do século XX que esta fusão ampliou-se 
significativamente. Assim, a chamada modernização da agricultura não 
atuou no sentido da transformação dos latifundiários em empresários 
capitalistas, mas, ao contrário, transformou os capitalistas industriais e 
urbanos, sobretudo do Centro-Sul do país, em latifundiários. (Oliveira, 
2011, p. 1) 
O capitalismo nacional tem, portanto, segundo Oliveira (2011), um caráter 
rentista, que vive de juros, não um viés produtivo. Como também já colocamos, 
somente 30% dos grandes proprietários de terra podem ser compreendidos como 
pertencentes ao agronegócio; os outros 70% são proprietários que não produzem 
e normalmente vivem de hipotecar suas terras e investir o dinheiro obtido em 
especulação. As consequências disso são brutais para a economia nacional: 
concentração de renda, expansão limitada do mercado consumidor, decadência 
da indústria, hipertrofia do setor de serviços e aumento da dependência externa. 
A reforma agrária realizada nos países centrais, segundo nos ensinam 
Amin e Vergopoulos (1977), trouxe o benefício de um barateamento da cesta 
básica desses países, o que diminuiu o salário urbano (uma vez que trabalhadores 
e trabalhadoras conseguem comprar muito com pouco dinheiro), o que acarreta 
num aumento da taxa de lucro do empresário, possibilitando a este fazer novos 
 
 
8 
investimentos em produção, o que produz um ciclo virtuoso da economia. Esse 
processo segue até os dias atuais, com força especialmente na Alemanha e no 
Japão. 
Diferentemente do que o senso comum apregoa, reforma agrária não é 
sinônimo de política socialista, tanto que a primeira grande reforma de distribuição 
de renda foi a realizada pelos EUA a partir de 1862 com o Homestad Act, a qual 
acelerou de maneira impressionante o próprio capitalismo daquele país, pois 
gerou a possibilidade de abastecimento barato para as cidades, não criando 
chances de concentração de renda e bolsões de pobreza nas cidades e no campo 
e apaziguou também as lutas – agora sim – sindicais em defesa do socialismo. 
Novamente, como Coggiola (2007) nos ensina, o reflexo disso na atualidade é a 
ausência de um grande partido de esquerda nos EUA, e ainda assim nenhum 
grande capitalista daquele país defende a grade propriedade e sim a manutenção 
dos farmers médios e pequenos, com seu trabalho supertecnificado sim, mas 
familiar. 
Logo, a luta por uma reforma agrária não é, automaticamente, a luta contra 
o agronegócio. É uma luta contra a grande propriedade improdutiva, contra o 
capitalismo rentista, e a favor da distribuição de renda e do meio produtivo. 
TEMA 5 – POLÍTICA E AGRONEGÓCIO: A CHAMADA BANCADA RURALISTA 
A atualidade do poder político da classe dos grandes proprietários 
fundiários é ainda importante e destaca-se não somente no Brasil, mas também 
em outros países da América Latina. Hoje, na segunda década do século XXI 
chegando perto de seu fim, vemos um processo em que seu poder político retorna 
às raízes. Em outras palavras, se durante 15 anos houve um período de concílio 
de classes nos Estados da América Latina, hoje há uma ruptura com as classes 
populares e um conflito que ocorre entre as próprias elites. 
No caso brasileiro, destaca-se o processo iniciado ainda com o segundo 
mandado de Dilma Rousseff, a qual trouxe já para seu governo elementos do 
liberalismo, como seu ministro da Fazenda. Esse processo passou ainda pela 
ascensão de seu vice, Michel Temer, ao poder e já em 2018, com a eleição de 
Jair Bolsonaro para presidente. Foi então um pêndulo que estava na centro-
esquerda até chegar na extrema direita, sempre com o apoio dos ruralistas, os 
quais, após a crise de 2015, anseiam por recuperar perdas financeiras com novos 
 
 
9 
empreendimentos no campo (Olesko, 2019). O mesmo se deu na Argentina, como 
mostram Gras e Hernandez (2016). 
Todavia Bruno (2002, 2016), em suas diversas análises, mostra como, de 
uma maneira ou de outra, o poder político desse grupo no Brasil nunca diminuiu. 
Alguns políticos se fazem presentes há anos no Congresso Nacional, desde a 
Constituinte de 1998; outros entram mais tardiamente e com novas visões. Nossa 
análise do poder dessa classe e de seus conflitos internos pode ser resumida nos 
confrontos entre a grande empresária rural Kátia Abreu, ministra de governos da 
centro-esquerda do PT, ex-presidente da Confederação Nacional da Agricultura e 
Pecuária (CNA) e Ronaldo Caiado, histórico político de Goiás, líder da já extinta 
União Democrática Ruralista (UDR), governador de seu estado e grande 
articulador dos grandes proprietários rurais. 
Esses dois políticos de grande envergadura nacional representam duas 
faces da classe dos ruralistas: a face moderna, produtiva, exportadora 
representada pelo agronegócio, por Abreu e a face tradicional, rentista, mais 
ancestralmente politizada, representada por Caiado. Ambos se fazem presentes, 
ora juntos, ora em conflito aberto e em posições contrárias de todos os governos 
presidenciais do Brasil desde 1988. A presença dessa classe nas tomadas de 
decisão da política nacional é, portanto, constante. 
A UDR foi um movimento sempre presente no Congresso Nacional. Como 
Bruno (1996) cita, teve sua origem nos proprietários agroindustriais surgidos 
durante a Ditadura Militar. Com a sua mutação em agronegócio, hoje chamamos 
de bancada ruralista essa força política na Câmara e no Senado do país. Essa 
bancada não age mais em um bloco totalmente coeso como o fazia nos tempos 
de UDR, pois agora existem divergências internas como aquela que tomamos por 
exemplo acima. Porém, devemos ter em mente que o poder dos grandes 
proprietários fundiários, modernos ou arcaicos, exportadores de commodities ou 
rentistas de suas terras, progressistas os reacionários no tocante dos costumes, 
tem, enfim, sua força e presença de maneira muito grande dentro do Estado 
brasileiro e de suas instituições políticas, sociais, jurídicas, culturais e 
econômicas. 
 
 
 
 
 
10 
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11 
(Doutorado em Geografia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas 
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AULA 4 
AGRONEGÓCIO: CONTEXTOS 
ECONÔMICO, SOCIAL E 
POLÍTICO 
Prof. Gustavo Felipe Olesko 
 
 
2 
CONVERSA INICIAL 
Existem diversos elementos centrais na produção do espaço agrário, e um 
deles é o trabalho. É preciso considerar vários tipos de trabalho no campo no 
Brasil e no mundo, e esse será o nosso foco de análise. As diversas faces do 
trabalho rural vão desde o trabalho nada fragmentado do camponês até a 
expressão máxima da agricultura capitalista, com o trabalhador assalariado que 
maneja um grande trator com tecnologia de ponta em uma grande fazenda de 
agronegócio, altamente produtiva. Não é somente um grupo que produz o espaço, 
como já vimos anteriormente, mas todos eles: os mais distintos grupos e classes 
sociais, que, com suas particularidades, produzem o espaço e os territórios com 
base em suas lógicas de vida, que se expressam passando, de uma maneira ou 
outra, pelo trabalho. 
TEMA 1 – TRABALHO COMO ELEMENTO FUNDADOR 
Um ponto central nas relações de produção agrárias existentes dentro do 
modo de produção capitalista é o trabalho. Sem ele não há geração de renda com 
a terra, nem produção de capital na circulação. Diferentemente da cidade, onde o 
que predomina é o trabalho alienado, ou seja, aquele em que não se tem o 
domínio total do processo, no campo existe uma relação intrínseca entre trabalho 
e produto, efetivada das mais diversas formas. 
Lukács (1979) esmiúça que o trabalho, como categoria central da 
humanidade, faz com que a roda da história se movimente. Em outras palavras, o 
ser humano é humano porque realiza, por meio do trabalho, uma mediação entre 
sociedade e natureza de maneira constante e indissociável. É no trabalho que a 
humanidade se autorrealiza como tal. 
A essência do trabalho consiste precisamente em ir além dessa fixação 
dos seres vivos na competição biológica com seu mundo ambiente. O 
momento essencialmente separatório é constituído não pela fabricação 
de produtos, mas pelo papel da consciência, a qual, precisamente aqui, 
deixa de ser mero epifenômeno da reprodução biológica. (Lukács, 1979, 
p. 4) 
Em outras palavras, o trabalho, para o ser humano, não é mera reprodução 
biológica, como seria o trabalho de uma abelha, por exemplo, no processo de 
feitura do mel, ou ainda, na construção de barragens por castores. É um processo 
que se modifica ao longo do tempo e dos territórios. O trabalho na lavoura de um 
campo no Brasil, mesmo com toda a tecnologia disponível e a globalização que 
 
 
3 
busca homogeneizar o mundo, é diferente do trabalho em uma lavoura na Rússia, 
por exemplo. 
Indo além, o trabalho é o ponto central do modo de produção capitalista em 
diversos aspectos, do cultural ao econômico. É cultural, pois aquele que trabalha 
carrega junto de si o orgulho de uma relação que o leva a defender seu posto de 
trabalho (no caso urbano) ou seu modo de trabalho (como fazem os camponeses). 
É econômico, pois somente o trabalho gera valor; capital é trabalho morto, 
trabalho acumulado, que subsiste pelo processo de “sugar” o sangue do trabalho 
em si mesmo, sendo assim uma relação totalmente entrelaçada (Grespan, 2012). 
Tendo em mente que é o trabalho que dá sentido não somente à 
humanidade, mas ao próprio modo de produção capitalista, podemos entender 
que o espaço agrário é aquele no qual o trabalho se faz mais “vivo”. Há nesse 
espaço o trabalho camponês, o trabalho assalariado, o trabalho realizado pelos 
povos e comunidades tradicionais, e também a especulação financeira em torno 
desse mesmo trabalho. 
TEMA 2 – TRABALHO CAMPONÊS AUTÔNOMO 
O trabalho do campesinato na terra está totalmente atrelado à questão 
dicotômica de relação social; ou seja, ele é ao mesmo tempo uma classe social 
do modo de produção capitalista e um modo de vida (Shanin, 2008). Sendo assim, 
a família camponesa tem, em seu cerne e como objetivo central de sua existência 
a manutenção de si mesma. Isso é possível somente por meio do trabalho na 
terra. 
Porém, a terra para o campesinato é território de vida, e também de 
reprodução social, cultural, econômica e histórica; portanto, a terra para o 
camponês é simbolicamente o lugar de autonomia e de exercício de seu saber, e 
que é parte de um processo mais amplo, que está ligado a uma percepção própria 
da natureza e do ser humano. Esse saber se mostra de maneiras distintas em 
diferentes espaços. Exemplo disso é o sindicato rural, no qual há um trabalho 
político por parte dos camponeses, enquanto que no sítio ocorre um trabalho 
agrícola, em que o “saber-fazer” é vital. 
Vale destacar que o saber camponês, em seu âmago, envolve a ideia de 
que não há natureza sem o ser humano, ou seja, ela é dependente deste 
(Woortmann; Woortmann, 1997). 
 
 
4 
A produção é central para a reprodução social do grupo camponês, e se 
efetiva pelo trabalho, que é uma junção de relações sociais (simbólicas ou não) e 
de forças produtivas. O campesinato exerce poder, pois detém um saber. O saber 
técnico é fundamental para a reprodução da estrutura social; logo, saber é poder. 
O campesinato em especial se diferencia do operariado por, além de outras 
razões, não se separar de seus meios de produção e nem do “saber produzir” 
(Woortmann; Woortmann, 1997). Em outras palavras, podemos compreender que 
a vida do campesinato não é “fragmentada”, como a vida do trabalhador urbano 
ou do empresário, também urbano. Seu local de trabalho, lazer e vida se 
confundem, sendo, de maneira geral, praticamente um só. 
Ao trabalhar a terra, o camponês realiza outro trabalho: o ideológico, pois 
além de ações técnicas, o trabalho também é um processo de ações simbólicas. 
Logo, além de produzir o cultivo, produz cultura. 
Outro ponto importante é a questão da terra. Para os camponeses, os 
direitos sobre a terra não passavam pelo cartório. Ou seja, a terra era de quem 
trabalhava. Não havia o entendimento de que seria necessário ter

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