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www.hermespardini.com.br 1 PROVAS DE FUNÇ‹O TIREOIDIANA 1. INTRODUÇ‹O Nos últimos 40 anos, ocorreu uma melhora substancial na sensibilidade e especificidade dos testes tireoidianos principalmente com o desenvolvimentos dos métodos imunométricos não isotópicos. Avaliaremos a utilidade clínica e os possíveis fatores de interferência nas dosagens do TSH (hormônio tireotrópico), T4 (tiroxina) e T3 (triiodotironina). 2. FATORES PRÉ-ANAL¸TICOS 2.1. Variáveis Fisiológicas A função tireoidiana pode ser determinada diretamente pela medida dos seus hormônios (T4 e T3) ou indiretamente através da ação desses hormônios na secreção de TSH. Se a unidade hipotálamo-hipofisária funciona normalmente, as concentrações de TSH estarão inversamente relacionadas à função tireoidiana. A medida do TSH é mais sensível para a detecção da disfunção tireoidiana. Isto ocorre por dois motivos: o primeiro é que a sua concentração sérica e do T4 têm uma relação log-linear tal que pequenas anormalidades no T4 irá produzir uma resposta amplificada do TSH (fig. 1); o segundo motivo é que estudos conduzidos em gêmeos demonstram um setpoint determinado geneticamente para o T4, dessa forma nos estágios precoces da disfunção tireoidiana a anormalidade do TSH será anterior à do T4. Figura 1 – Relação entre as concentrações séricas do TSH e do T4 livre. Deve-se reconhecer que a dosagem isolada do TSH pode apresentar-se inadequada em algumas situações: anormalidade da função hipotálamo-hipofisária; fase precoce da correção do hipotireoidismo e do hipertireoidismo, tumores produtores de TSH e drogas que influenciam a secreção do TSH. 2.2. Fatores Demográficos e Individuais O período neonatal, infância e senilidade apresentam alterações na função tireoidiana assim como os estados de desnutrição (baixos níveis de T3). Para outras variáveis como gênero, raça, fase do ciclo menstrual, tabagismo, exercício, jejum e estação do ano não se observaram diferenças clinicamente significativas. Deve-se lembrar que a gestação produz um aumento na TBG (proteína transportadora de T4) falseando os níveis de T4 total. 2.3. Variação Biológica As variações intra-individuais dos hormônios tireoidianos são muito estáveis num período de 1 a 4 anos. O mesmo não ocorre com as variações inter-individuais. Veja a tabela abaixo: Tabela – 1 Marcadores de Função Tireoidiana Hormônio Período entre as avaliações % CV* % CV** T4T e T4L 1 semana 6 semanas 4 anos 3,5 5,3 7,3 10.8 13,0 14,8 T3T e T3L 1 semana 6 semanas 4 anos 8,7 5,6 15,1 18,0 14,8 19,2 TSH 1 semana 6 semanas 4 anos 19,3 20,6 21,2 19,7 53,3 45,0 CV = Coeficiente de variação *Intraindividual; **Interindividual As flutuações diurnas do TSH ocorrem dentro da faixa de referência do exame. 2.4. Variáveis Patológicas Medicamentos Os glicocorticóides em grandes quantidades podem reduzir o nível sérico do T3 e inibir a secreção do TSH. A dopamina inibe a secreção do - 2 - TSH e pode, também, reduzir o seu nível aumentado no hipotireoidismo primário a valores normais em pacientes hospitalizados. Fenitoína e carbamazepina causam uma redução nos níveis de T4T e T4L (para o T4L quando se utiliza um método de detecção direto – ultrafiltração por exemplo - esse efeito não é observado). O propranolol, eventualmente, pode causar uma elevação do TSH devido à sua ação de inibir a conversão periférica do T4 em T3. A amiodarona pode levar ao hipotireoidismo e ao hipertireoidismo em indivíduos predispostos. O lítio causa hipotireoidismo em 5 a 10% dos usuários, principalmente naqueles com anticorpos positivos. Em alguns casos pode causar hipertireoidismo. Furosemida e heparina podem inibir a ligação do T4 às proteínas séricas in vitro. Doença não tireoidiana Em pacientes hospitalizados as provas de função tireodiana podem não mostrar utilidade. Confira a figura 2. Figura 2 Outras Interferências: T4 em soro é estável por meses quando armazenado a 4o C e por anos quando congelado a –10o C. O TSH é estável por vários anos no soro congelado. Hemólise, lipemia e hiperbilirrubinemia não produzem interferência significativa nos imunoensaios. Entretanto, os ácidos graxos livres podem deslocar o T4 das proteínas de ligação o que, em parte, explicaria os baixos níveis de T4T freqüentemente vistos no eutireoidiano doente. Os anticorpos heterofílicos são encontrados com moderada freqüência no soro dos pacientes. Podem criar valores falsamente baixos ou altos dependendo da metodologia utilizada pelo laboratório. O valor inadequado não precisa ser necessariamente anormal, apenas inapropriadamente normal. É importante o contato do médico assistente com o laboratório para a correta suspeição desses casos. O armazenamento do soro a –20o C é recomendado se o ensaio for demorar mais do que 24 horas para ser realizado. 3. DOSAGEM DE T3 E T4 TOTAIS Tecnicamente é mais fácil mensurar as concentrações totais dos hormônios tireoidianos do que as frações não ligadas às proteínas. Isso ocorre devido ao fato de que as concentrações totais serem mensuradas em nanomoles, enquanto a fração livre é medida em picomoles. Existem grandes diferenças entre os métodos de dosagem para T4T e T3T. Essas diferenças ocorrem devido à falta de ensaios padronizados de referência para T4T e T3T. Além disso, existem diferenças quanto à sensibilidade do instrumento, quanto ao soro humano e a matriz do calibrador. Concentrações anormais de T4T e T3T são comumente encontradas como o resultado de anormalidades das proteínas de ligação e não à disfunção tireodiana. Alguns pacientes contêm outras proteínas anormais como auto-anticorpos contra hormônios tireoidianos que alteram a dosagem dos hormônios tireoidianos totais. 4. DOSAGEM DE T3 E T4 LIVRES Os testes para a fração livre dos hormônios tireoidianos são realizados por métodos de detecção indireta, que requerem dois testes separados, ou técnicas de imunoensaio direto. 4.1. Métodos indiretos • ¸ndice utilizando a medida da TBG: índices utilizando a medida da TBG (por exemplo, T4T/TBG) são raramente utilizados por não mostrarem utilidade diagnóstica superior aos índices indiretos utilizando a taxa de ligação do hormônio tireoidiano. • Resina ligadora de hormônio tireoidiano/T3 Retenção: nesse ensaio uma quantidade conhecida e marcada de T3 é adicionada ao soro do paciente. A amostra é então incubada com um agente ligador não específico (uma resina, por exemplo). Após o equilíbrio, a resina é separada do soro e a quantidade de T3 marcado capturado pela resina é medida. A quantidade de radioatividade ligada à resina é inversamente proporcional ao número de locais de ligação disponíveis no soro. Veja a tabela abaixo: Dosagem de T4 T3 Retenção Condição ↑ ↑ Hipertireoidismo ↓ ↓ Hipotireoidismo ↑ ↓ Hiper-TBGnemia ↓ ↑ Hipo-TBGnemia Obs: estes testes podem produzir, ocasionalmente, índices de T4 livre inapropriadamente anormal quando os pacientes têm alteração muito pronunciadas das proteínas de ligação (extremos de concentração anormal de TBG, hipertiroxinemia disalbuminêmica familiar, - 3 - auto-anticorpos contra hormônios tireoidianos e o eutireoidiano doente). 4.2. Métodos diretos A dosagem direta dos hormônios tireoidianos pode ser realizada por métodos absolutos ou comparativos. Os métodos absolutos requerem um isolamento físico da fração livre da fração ligada às proteínas antes de empregar um imunoensaio sensível. Esse isolamento é conseguido através de uma câmara de diálise, uma técnica de ultrafiltração ou pelo usode uma coluna de adsorção. Como são métodos trabalhosos e caros, estão restritos a alguns centros de pesquisa. Os métodos comparativos baseiam-se, usualmente, na captura do hormônio livre por anticorpo anti-hormônio específico. São métodos mais simples e que permitem a automação. A quantificação dessa captura pode ser feita por radioatividade, fluorescência ou quimioluminescência. São realizados em uma ou duas etapas. A utilização da determinação livre e não total do hormônio tireoidiano melhora a acurácia diagnóstica na detecção do hipo ou hipertireoidismo. No entanto, para validação das faixas de referência usualmente empregadas, deve-se levar em consideração a possibilidade de interferências possíveis: a síndrome do eutireoidiano doente; a hipertiroxinemia disalbuminêmica familiar; a possibilidade da presença de anticorpos anti-T4 e anti-T3 e os anticorpos heterofílicos. Todas essas situações podem interferir no ensaio, trazendo confusão para sua interpretação. Os resultados inusitados são encontrados devido à presença de substâncias que são falsamente detectadas pelos anticorpos (reação cruzada); auto-anticorpos endógenos; interferências por drogas e anticorpos heterofílicos. 5. DOSAGEM DE TSH Houve uma grande melhora na metodologia da dosagem do TSH, possibilitando a sua utilização como teste de rastreio para as disfunções tireoidianas. Apesar dessa grande melhora na sua sensibilidade e especificidade, os ensaios para TSH não estão isentos de algumas interferências. Por exemplo, pacientes com hipotireoidismo central ocasionado por disfunção pituitária ou hipotalâmica, secretam isoformas com glicosilação anormal e reduzida atividade biológica que são medidas como concentrações paradoxalmente normais de TSH pela maioria dos métodos. De outra forma, concentrações séricas normais de TSH podem ser vistas quando pacientes têm hipertireoidismo por tumores produtores de TSH, que parecem secretar isoformas de TSH com elevada atividade biológica. Outras possibilidades de interferência são os anticorpos heterófilos e a contaminação da amostra por heparina; o primeiro levando a valores falsamente elevados e o segundo a valores falsamente baixos. Um conceito importante ao analisar a sensibilidade do teste de TSH é sua sensibilidade funcional, calculada como o limite máximo de 20% para o coeficiente de variação inter-ensaio. Essa sensibilidade funcional seria o menor valor clinicamente relevante do teste. Anormalidade transitórias do nível de TSH podem ser encontradas em pacientes hospitalizados. Deve-se ter precaução na sua análise nessa condição. Os níveis de TSH são caracteristicamente mais altos na idade neonatal e valores apropriados de referência devem ser utilizados. De uma forma geral os ensaios de TSH são menos suscetíveis a interferência do que os ensaios para T4L. 6. REFER¯NCIAS 1. Stockigt JR. Serum Thyrotropin and Thyroid Hormone Measurements and Assessment of Thyroid Hormone Transport. In Braverman LE, Utiger RD eds. Werner & Ingbar’s The Thyroid – A Fundamental Clinical Text 8th ed. Lippincott Williams & Wilkins/Wolters Kluwer Company. Philadelphia. 2000: 376-92. 2. Moore WT, Eastman RC. Laboratory Evaluation of Diseases of the Thyroid. In Moore WT, Eastman RC eds. Diagnostic Endocrinology 2nd ed. Mosby St Louis. 1996:177-209. 3. Laboratory Medicine Practice Guidelines. Laboratory Support for the Diagnosis and Monitoring of Thyroid Disease. Demers LM, Spencer CA eds. National Academy of Clinical Biochemistry 2000. 4. Surks MI, De-Fesi CR. Normal Serum Free Thyroid Hormone Concentrations in Patients Treated with Phenytoin or Carbamazepine. A Paradox Resolved. JAMA 1996; 275: 1495-8. 5. Dayan CM. Interpretation of Thyroid Function Tests. Lancet. 2001; 357: 619-24. 6. Kricka LJ. Human Anti-Animal Antibody Interferences in Immunological Assays. Clin Chem. 1999; 45: 942-56. 7. Ladenson PW, Singer PA, Ain KB et. al. American Thyroid Association Guidelines for Detection of Thyroid Dysfunction. 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