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Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 1 1. A Vida em Sociedade 1.1 Introdução Nosso ponto de partida será o conceito de Sentimento Jurídico, que foi explicado de forma brilhante no ano de 1872 na Sociedade Jurídica de Viena em conferência proferida por Rudolf Von Ihering1. Em síntese, podemos extrair de suas palavras que: “A luta pelo Direito é um dever do interessado para consigo próprio.” “A defesa do direito é um dever para com a sociedade.” O Sentimento Jurídico quando em equilíbrio é uma garantia de uma sociedade justa, consequentemente, de um Estado forte e soberano. “A força de um povo corresponde à força do seu sentimento jurídico. Cultivar o sentimento do Direito na nação é, portanto, cultivar o vigor e a força do Estado. Por esta cultura não entendo, está claro, a cultura teórica da escola e do ensino, mas a realização prática dos princípios da justiça em todas as relações da vida” Assim, podemos entender que cada pessoa deve lutar; cada operador do direito deve garantir a aplicação da norma de forma a viabilizar uma sociedade realmente fraterna, solidária e comprometida com o respeito à dignidade da pessoa humana. Muito mais do que simples operadores do Direito, cada um de nós deve ser um agente transformador da realidade social e no final ter a certeza de que, além de uma passagem por esta vida, fomos importantes e contribuímos em algum momento para melhorar o mundo. Outro estudioso e pensador jurídico chegou a afirmar: “Quanto a mim, depois de ter estado entre os livros algumas horas, senti sempre a necessidade de escancarar uma janela. Provavelmente é este o segredo daquele pouco que eu consegui fazer no campo da ciência. Tive sempre a sensação de que, para o meu saber, contavam mais os homens do que os livros e mergulhei na vida.” (Francesco Carnelutti2). Então: vamos mergulhar na vida?! A vida em sociedade é muito difícil e isto é um fato! 1 Saiba um pouco mais da vida deste importante jurista – clique aqui e inicia sua pesquisa 2 Saiba um pouco mais da vida deste importante jurista – clique aqui e inicia sua pesquisa Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 2 O homem com suas necessidades, os seus desejos ilimitados, entra em atrito com o seu semelhante e com o meio no qual vive - cujos bens são limitados – e, pretendendo para si os bens e, o pior, pretendendo fazer sua vontade em detrimento da vontade do próximo, na maioria das vezes, age sem respeitar os limites, valores e princípios necessários para a sobrevivência da própria sociedade. Assim, inegável que nos relacionamentos intersubjetivos surjam os conflitos de vontades (ou interesses) que, por sua vez, comprometem a estrutura de nossa sociedade e, por que não dizer, de nossa própria espécie e de nosso planeta. As normas surgem com o objetivo de evitar os conflitos de interesses, tutelando determinados bens, que em razão de tal proteção, são alçados a categoria de bens juridicamente relevantes. Por outro lado, é inerente ao ser humano achar que a sua vontade deve prevalecer frente à pretensão do outro. A falta de determinados valores, que fogem a ciência jurídica, torna necessária a regulamentação da vida em sociedade. Como consequência temos: 1. Direitos e deveres / ônus e bônus 2. Normas legais que surgem com o objetivo de regular a vida em sociedade. 3. Normas legalizadas, positivadas, pelos líderes (representantes) da sociedade em razão da legitimidade formal que possuem e de observância geral por parte do grupo social que visa regular; sob pena de cumprimento forçado por imposição do Estado-Juiz (Poder Judiciário). Nossa Constituição Federal em seu artigo 1º fala dos princípios fundamentais – Soberania, Cidadania, Dignidade da Pessoa, Poder do Povo, etc. No artigo 3º preceitua os objetivos de construir uma sociedade livre, justa e solidária, visando o bem estar de todos, acabando com as desigualdades sociais, por fim, no artigo 5º garante o direito de ação e assegura o contraditório e a ampla defesa, independente do pagamento de custas, além do devido processo legal, dentre outros importantes princípios. Como regra temos que a pessoa – titular de direitos e obrigações - vive e respeita as limitações impostas pelos preceitos morais, religiosos e legais. Todos nós temos a capacidade de compor nossos conflitos diretamente com outros indivíduos pelo diálogo. Podemos realizar uma composição (acordo, transação) Podemos renunciar nossos direitos ou ainda nos submeter à vontade alheia sem opor resistência, visto que legítima a pretensão manifestada. Podemos, em casos excepcionais, exercer a autotutela (por exemplo: nos casos de legitima defesa, estado de necessidade e força maior – excludentes da ilicitude), uma vez que, como regra, encontra-se vedada pelo ordenamento pátrio e constitui crime previsto no artigo 345 do Código Penal. Quando não ocorre a pacificação, por atuação das partes envolvidas, ainda no chamado campo material (A x B), em razão de não se poder fazer justiça, o que seria tipificado como exercício arbitrário das próprias razões, aquele que se sente prejudicado recorre ao Poder Judiciário (responsável pela aplicação das normas Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 3 abstratas ao caso concreto – que têm por função típica dizer o Direito – função de prestar a tutela jurisdicional). Assim, se estamos diante de pretensões resistidas em relação ao mesmo bem juridicamente tutelado, podemos afirmar que: se as partes não chegam à composição do conflito e se não houver a possibilidade do exercício da autotutela, estamos frente ao conflito de interesses qualificado por pretensões resistidas, isto é, da lide ou do litígio. Lide ou litígio – é o conflito de interesses qualificado pela pretensão resistida. Exemplo: A quer um determinado objeto (bem jurídico) e B também o quer e resiste à pretensão de A. Considerando que a regra veda o exercício arbitrário das próprias razões, o Estado-Juiz deverá declarar na hipótese concreta quem tem razão. Para que possa atuar, na prática, o Poder Judiciário se utiliza das normas de Direito Processual. Assim, podemos concluir que não havendo a possibilidade de uma das partes envolvidas no conflito fazer valer o seu direito pela força e não sendo possível a autocomposição, isto é, a atuação da vontade das partes na solução da crise jurídica apresentada na hipótese concreta (submissão, renúncia e acordo), só resta um caminho como regra, frente ao monopólio estatal da atividade jurisdicional, qual seja: O Processo. Processo – é o caminho – é o meio pelo qual o Estado-Juiz compõe a lide (julgamento) – função jurisdicional = declarar o direito Procedimento - é a forma de caminhar, é a maneira como os atos do processo se materializam e se desenvolvem. Autos do Processo – materialização do conjunto de atos processuais praticados rumo à sentença. 1.2 Espécies de Tutela Diante do fato concreto podemos recorrer ao Estado-Juiz para pleitear as seguintes espécies de tutela: Conhecimento ou cognição Através de tal espécie de tutela, o que se busca é a declaração do direito aplicável ao caso concreto – atividade intelectiva do órgão investido da função jurisdicional que, após verificar as teses apresentadas pelas partes e analisar o conjunto probatório constante dos autos, irá formar o seu livre convencimento e motivar a sua decisão; solucionando o conflito deduzido em juízo (lide) e resolvendo a demanda proposta (desde que satisfeitos determinados pressupostosprocessuais e atendidas as condições do exercício do direito de ação). A nomenclatura utilizada nesta espécie de tutela é Autor e Réu. Podemos utilizar ainda os termos: demandante e demandado, respectivamente, para aquele que propõe a ação (polo ativo da demanda) e em face de quem a mesma é proposta (polo passivo da demanda). Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 4 Execução Na tutela de execução, as nomenclaturas utilizadas são: Credor e Devedor ou Exequente e Executado. O que se objetiva com a mesma é a garantia de satisfação, através de atos materiais do Estado-Juiz, seja em processo autônomo de execução, seja na fase de cumprimento de sentença (modulo específico da Tutela Cognitiva), do que consta do título executivo extrajudicial ou da parte dispositiva da sentença. Cautelar A Tutela Cautelar constitui Tutela Diferenciada – espécie do gênero Tutelas de Urgência e tem por escopo resguardar e proteger a eficácia do processo de conhecimento ou de execução. Assim, o requerente da medida poderá, utilizando referida tutela, garantir a satisfação e a entrega da tutela específica pleiteada (ou a ser pleiteada) por parte do requerido, em processo autônomo de cognição ou execução. Neste momento, ainda que de maneira incipiente, podemos afirmar que a atividade Jurisdicional tem por escopo: Declarar, resguardar e satisfazer o direito, com vistas à pacificação com justiça, entregando a tutela específica, seu equivalente jurisdicional e, em última hipótese, a tutela substitutiva caracterizada pelas perdas e danos. O Direito exerce uma função ordenadora na sociedade, isto é, coordena os interesses que se manifestam na vida social de modo a organizar a cooperação entre as pessoas e compor os conflitos que se verificarem entre seus membros. As diversas situações que se apresentam diariamente entre as pessoas, perante os bens pretendidos por elas e perante o próprio direito que regula suas vidas é sempre motivo de tensão individual e social. A tarefa da ordem jurídica é exatamente a de harmonizar as relações sociais intersubjetivas, a fim de ensejar a máxima realização dos valores humanos com o mínimo de sacrifício e desgaste. 1.3 Conflitos São caracterizados por situações em que uma pessoa, pretendendo determinado bem para si, não pode obtê-lo, uma vez que: aquele que poderia satisfazer a sua pretensão não a satisfaz; o próprio direito proíbe a satisfação voluntária do Direito. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 5 Formas de Solução dos Conflitos de Interesses 1. Autotutela ou Autodefesa Na chamada autotutela ou autodefesa temos a ausência de juiz distinto das partes e a resolução do conflito ocorre pela imposição da vontade de uma delas à outra. Tal prática encontra-se vedada por nosso ordenamento jurídico e a sua utilização, como veremos em breve, constitui exceção à regra insculpida no artigo 5º, XXXV, de nossa Carta Magna – que consagra o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional3. Autotutela Crime Indivíduo: art. 345 CP – “exercício arbitrário das próprias razões” Agentes investidos de Autoridade pelo Estado: art. 350 CP – “abuso de poder” 2. Autocomposição Por outro lado, pode ocorrer numa determinada situação, caracterizada como conflito de interesses, que as partes envolvidas cheguem a uma solução que resolva a referida pendência. Assim, a autocomposição ocorrerá sempre que por vontade de uma das partes envolvidas no conflito ou de ambas a crise apresentada se solucionar. Podemos conceber três formas de solução, todas envolvendo condutas praticadas pelas próprias partes envolvidas no conflito, são elas: a) Renúncia desistência da própria pretensão b) submissão desistência ao oferecimento de resistência à pretensão do outro c) Acordo ou transação solução encontrada através de concessões recíprocas 3. Heterocomposição Com o fortalecimento da noção de Estado a autotutela é vedada e o Estado chama para si a função de declarar o direito aplicável ao caso concreto. 3 Ao definir Jurisdiçao, o prof. Cândido Rangel Dinamarco nos apresenta a exata extensão de referido princípio, vejamos: “A atividade dos órgãos do Estado destinada a formular e atuar praticamente a regra jurídica concreta que, segundo o direito vigente, disciplina determinada situação jurídica”. Por força de dispositivo constitucional, no Brasil essa atividade é privativa do Poder Judiciário, único órgão apto a formular decisões dotadas da força da coisa julgada. DINAMARCO, Cândido Rangel. Manual de Direito Processual Civil. 2. ed. São Paulo: Forense, 2000, p. 07 Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 6 Não obstante a possibilidade das partes envolvidas num determinado conflito optarem pela arbitragem, como forma de solução do conflito de interesses, tal modalidade alternativa de pacificação dos conflitos, não configura a regra; razão pela qual, passaremos a analisar, ainda que em linhas gerais, o chamada atividade jurisdicional do Estado-Juiz. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 7 2. A Função Jurisdicional e seus escopos 2.1 Introdução Pela jurisdição, os juízes agem em substituição às partes, que não podem fazer justiça com as próprias mãos (autodefesa proibida 345 CP); a elas, que não mais podem agir, resta a possibilidade de fazer agir, provocando o exercício da função jurisdicional. Considerando que a jurisdição se exerce através do processo, pode-se provisoriamente conceituar este como instrumento por meio do qual os órgãos jurisdicionais atuam para pacificar as pessoas conflitantes, eliminando os conflitos e fazendo cumprir o preceito jurídico pertinente a cada caso que lhes é apresentado em busca de solução. O que distingue a jurisdição das demais funções do Estado (legislativa, administrativa) é precisamente a finalidade pacificadora com que o Estado a exerce e o seu caráter substitutivo ao fazer atuar a norma abstrata de forma concreta no conflito apresentado, substituindo a vontade das partes pelo comando exarado pelo órgão jurisdicional. Assim a Pacificação é o escopo magno da jurisdição e, por consequência, de todo o sistema processual. É um escopo social, uma vez que se relaciona com o resultado do exercício da jurisdição perante a sociedade e sobre a vida gregária dos seus membros e felicidade pessoal de cada um. Demais escopos da jurisdição: 1. Social - Educação para o exercício dos próprios direitos e respeito aos direitos alheios. 2. Político - Preservação do valor liberdade, a oferta de meios de participação nos destinos da nação e do Estado e a preservação do ordenamento jurídico e da própria autoridade deste. 3. Jurídico - A atuação da vontade concreta do direito. 2.2 Da Autotutela à Jurisdição Como vimos anteriormente, as relações intersubjetivas envolvem, muitas das vezes, resolver conflitos. Alguns interessam ao ordenamento jurídico que, em sua função ordenadora, busca definir as regras que serão aplicadas a fim de regular nossas condutas. Ao se organizar politicamente o Estado chamou para si a função de resolver os conflitos de interesses, proibindo, consequentemente, a Justiça Privada (autotutela). Assim, o exercício das próprias razões, via de regra, constitui crime cuja tipificação encontra-se no Código Penal Brasileiro. Exercício arbitrário das próprias razões Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 8 Art. 345 - Fazerjustiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa. Como afirmamos anteriormente a autotutela encontra-se vedada, isto é, proibida pelo ordenamento jurídico. Contudo, em determinadas hipóteses, em razão da impossibilidade do Estado fiscalizar e se fazer presente em todos os conflitos de interesses de nossa sociedade, poderá aquele que se sentir prejudicado por outrem utilizar, por exceção, de sua própria força ou dos meios necessários para fazer valer a sua vontade. Podemos citar algumas hipóteses, meramente exemplificativas, asseguradas pelo ordenamento jurídico que, ao lado das hipóteses de legitima defesa e estado de necessidade, possibilitam a resolução do conflito de forma parcial, isto é, pelo próprio interessado, vejamos: Das Árvores Limítrofes Art. 1.283. As raízes e os ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do prédio, poderão ser cortados, até o plano vertical divisório, pelo proprietário do terreno invadido. Dos Efeitos da Posse Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado. § 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse. Do Penhor Legal Art. 1.467. São credores pignoratícios, independentemente de convenção: I - os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis, jóias ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem consigo nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que aí tiverem feito; II - o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos aluguéis ou rendas. Art. 1.468. (...) Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 9 Art. 1.469. Em cada um dos casos do art. 1.467, o credor poderá tomar em garantia um ou mais objetos até o valor da dívida. Art. 1.470. Os credores, compreendidos no art. 1.467, podem fazer efetivo o penhor, antes de recorrerem à autoridade judiciária, sempre que haja perigo na demora, dando aos devedores comprovante dos bens de que se apossarem. Art. 1.471. Tomado o penhor, requererá o credor, ato contínuo, a sua homologação judicial. Pela exposição apresentada, forçoso concluir que o sistema da autotutela constitui uma exceção, cujas hipóteses encontram especificação no próprio ordenamento jurídico, não constituindo, via de regra, uma forma legítima ou autorizada de solução dos conflitos. Por outro lado, verificamos que o conflito pode ser solucionado de forma legítima pelas próprias partes. Logo, as vontades dos sujeitos – titulares dos direitos – envolvidos no conflito podem ser direcionadas à sua resolução, seja em razão da renúncia, da submissão ou da transação. Contudo, não havendo a possibilidade da autotutela e não existindo a autocomposição, restaria apenas a heterocomposição como forma de solução da controvérsia. Podemos entender a heterocomposição como a modalidade de resolução dos conflitos prestada por terceiro, sujeito imparcial, que se coloca em situação de sobreposição às partes e, após a análise dos fatos, decide em substituição as vontades originárias o comando que incidirá a resolver o litígio. Preferimos falar em terceiro imparcial apenas para incluir na heterocomposição ao lado da atividade jurisdicional a arbitragem, consagrada em lei específica, que atua como verdadeira Jurisdição por delegação4. Podemos conceituar Jurisdição5 como o poder-dever do Estado de aplicar o direito ao caso concreto submetido pelas partes, através da atividade exercida pelos seus órgãos investidos; conhecendo, resguardando e entregando (satisfazendo) a tutela específica, o seu equivalente jurisdicional ou uma tutela substitutiva, num prazo razoável e com o menor custo para as partes envolvidas e para o próprio Estado-Juiz. 4 Humberto Theodoro Júnior entende que a arbitragem é um meio de solução da lide mediante decisão confiada a “pessoas desinteressadas, mas não integrantes do Poder Judiciário”. Destaca que a instuição do juízo arbitral implica renúncia à via judiciária para solução da lide. (Curso de Direito Processual Civil, 40 ed. vol. 1, item 3.6, p.36 - Forense) 5 Para José Frederico Marques, jurisdição é a função exercida pelo Estado “para compor processualmente conflitos litigiosos, dando a cada um o que é seu segundo o direito objetivo.” (Manual de DPC 9 ed. vol. 1, p. 97) Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 10 2.3 Finalidades e Características da Jurisdição Podemos verificar, dentre outros escopos, três finalidades precípuas ligadas aos aspectos jurídico, social e político: A Composição de litígios, através da aplicação e especialização das normas gerais de conduta ao caso concreto (escopo jurídico); A pacificação social (escopo social) e A realização da Justiça (escopo político) Como características do instituto destacamos: A atuação concreta do direito e a substitutividade, isto é, a atuação no lugar das partes e de forma obrigatória. O Estado-Juízo ou Estado-Juiz, ao analisar o conflito de interesses ou as crises jurídicas, com a sua declaração (decisão lato senso) cria um comando que vincula as partes e deve ser observado - substituindo as vontades originariamente sustentadas (as teses do demandante e do demandado) e que funciona como "lei" a solucionar de forma concreta a crise jurídica. 2.4 Princípios da Atividade Jurisdicional Para uma melhor compreensão de determinado tema, devemos buscar conhecer e interpretar de maneira sistemática os princípios que servem de alicerces ao referido instituto. No que concerne à atividade jurisdicional podemos destacar os seguintes princípios norteadores do instituto: INAFASTABIILIDADE DO CONTROLE JURISDICIONAL - Previsto no artigo 5º, inciso XXXV, de nossa Constituição Federal, consagra a atividade jurisdicional como o único6 caminho possível para a solução da lide, ao preceituar que: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; 6 Há que se destacar que embora exista a possibilidade da utilização da autotutela e da arbitragem (verdadeiro equivalente jurisdicional), a primeira encontra vedação expressa em nosso ordenamento e a segunda tem sua aplicação limitada, seja pela própria lei que a regulamenta, seja ainda pela falta de interesse e conhecimento dos sujeitos envolvidos no conflito. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 11 INEVITABILIDADE: uma vez ativada pelas partes, a jurisdição é forma de exercício do Poder Estatal, e o cumprimento de suas decisões não pode ser evitado sob pena de cumprimento coercitivo (cumprimento de sentença). INDECLINABILIDADE: tem o Estado o deverde solucionar os conflitos de interesses quando provocado. Consequência lógica da imposição de que os cidadãos observem as normas legais. Aqui vale uma lembrança: o exercício arbitrário das próprias razões constitui crime (artigo 345 do Código Penal Brasileiro) e somente quando autorizado pela lei poderá o indivíduo valer-se da autodefesa. Nossa Constituição garante que nenhuma lesão ou ameaça a direito será excluída da apreciação do Poder Judiciário elevando à categoria de Direito Fundamental o acesso à Justiça. Assim, a atividade jurisdicional pode ser considerada como um Poder/Dever do Estado-Juiz e, uma vez provocado, ele deverá solucionar a lide - desde que presentes as condições da ação e os pressupostos processuais - mas isso será tema específico de outra aula - Teoria da Ação! INVESTIDURA: o Estado atua através de seus órgãos. Somente os agentes investidos do poder estatal - de aplicar o direito ao caso concreto (julgar) - é que podem exercer a jurisdição. INDELEGABILIDADE: o agente que exerce a jurisdição não pode delegar tal função e, uma vez provocado, deverá julgar e, ainda que encontre lacuna na norma, deverá socorrer-se da analogia, dos costumes e dos princípios gerais do direito - artigo 126 do Código de Processo Civil. Outro princípio que podemos conceber é o PRINCÍPIO DA INÉRCIA: a jurisdição não pode ser exercida de ofício pelos agentes detentores da investidura, dependendo de provocação das partes. Esta é a regra em nosso ramo do Direito. No Direito Processual Civil vigora o princípio do dispositivo, da demanda, da ação ou, em outras palavras, da inércia da jurisdição. Vamos ao penúltimo princípio que analisaremos nesta aula, qual seja: o PRINCÍPIO DA ADERÊNCIA. Pelo princípio da aderência, o exercício da jurisdição, por força do princípio da territorialidade da Lei processual, deve estar sempre vinculado a uma prévia delimitação territorial. Seja em razão da Soberania das Nações, seja em razão de critérios que delimitam a atuação dos órgãos judicantes. Mais adiante vamos abordar algumas formas de delimitação da atividade jurisdicional. Vamos analisar o nosso último princípio - UNICIDADE. A jurisdição enquanto poder/dever é una e indivisível e retrata a própria Soberania de nossa Nação. Quando falarmos de competência analisaremos o instituto sob o aspecto de sua funcionalidade e verificaremos algumas divisões, repartições administrativas entre seus diversos órgãos, o que caracteriza DESCONCENTRAÇÃO do poder jurisdicional - Todo magistrado, devidamente investido na atividade judicante - tem jurisdição... mas, nem todos têm competência para apreciar determinadas crises jurídicas. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 12 Agora vamos falar das espécies de jurisdição Num primeiro momento podemos conceber a jurisdição considerando o tipo de pretensão submetida ao Estado-Juiz. Assim teríamos: Jurisdição Penal (aquela que envolve pretensões de natureza penal) e Jurisdição Civil (obtida por exclusão), isto é, não sendo pretensão de natureza penal, podemos afirmar tratar- se de natureza civil. Esta por sua vez poderá estar afeta ao Direito material do trabalho ou apenas ao direito material civil (jurisdição civil estrito senso - exercida por exclusão: salvo penal e trabalhista). Podemos considerar uma segunda forma de analisar/classificar o instituto - Quanto ao grau em que a mesma é exercida. Assim teríamos: Jurisdição Inferior. Exercida pelo 1º órgão judicante que conhece da crise jurídica e que por isso mesmo afirmamos tem competência originária para a causa e Jurisdição Superior. Exercida pelo órgão jurisdicional que tem competência recursal - reexame da matéria. Uma pergunta: Podemos afirmar que grau de jurisdição é sinônimo de instância? Alguns com veemência defenderão que sim... Eu afirmo que não... Mas isso será melhor compreendido na análise de nossos exercícios. Agora o nosso ponto de partida para classificarmos o instituto é o órgão que exerce a atividade jurisdicional. Assim temos: Jurisdição Especial: aquela exercida por órgãos que julgam apenas determinadas pretensões. Por exemplo: Justiça do Trabalho; Militar e Justiça Eleitoral; e Jurisdição Comum: Exercida por órgãos que julgam pretensões de qualquer natureza (salvo aquelas vinculadas à Jurisdição Especial). Para maioria da doutrina estariam classificadas em tal categoria/espécie a Justiça Comum Estadual e Federal. Nosso foco agora está na submissão ou não às normas, isto é, ao direito positivado. Assim teríamos: Jurisdição de Direito: aquela cuja atividade do magistrado estaria vinculada aos limites da lei; sendo essa a regra. Veja depois o que preceitua o artigo 127 do Código de Processo Civil. E teríamos ainda hipóteses em que o julgamento se daria pela Jurisdição de equidade, aquela em que o Juiz estaria, até certo ponto, liberado dos critérios da legalidade estrita, permitindo-se que seja atribuído ao caso concreto a solução que o juiz reputar mais justa, ainda que se deixe de aplicar o direito objetivo. Vamos agora ao último critério de classificação que adotamos em nosso esquema. Vamos falar agora da Jurisdição Contenciosa e da Jurisdição Voluntária. Inicialmente devo advertir que o tema ainda envolve debates acirrados na doutrina. Podemos conceber Jurisdição Contenciosa como a atividade inerente ao Poder Judiciário, com o Estado-Juiz atuando substitutivamente às partes na solução dos conflitos, mediante a prolação de sentença de mérito que aplique o direito ao caso concreto - quando presente as condições da ação e os pressupostos processuais, visto que existindo vício formal o processo será extinto de forma anômala, isto é, sem cumprir os reais escopos da atividade jurisdicional. Por outro lado, podemos conceituar a Jurisdição Voluntária como sendo a Administração Pública de Interesses Privados. Na hipótese, ora analisada, a participação do Estado-Juiz se faz necessária, a fim de chancelar e dar validade ao negócio jurídico que as partes pretendem realizar. Chamamos a atenção, novamente, para o fato de que tal "fiscalização" ocorre quando o objeto da composição for relevante para a ordem jurídica e que nem todas as composições realizadas serão objeto de apreciação do Poder Judiciário. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 13 Basta imaginar e lembrar as hipóteses de autocomposição que caracterizam soluções parciais permitidas pelo ordenamento jurídico. Vejamos alguns Lembretes A lei nº 11.441/07 - envolve a DESJUDICIALIZAÇÃO de alguns dos procedimentos especiais de Jurisdição Voluntária - artigo 1124-A do CPC. Nas hipóteses do artigo 267 do CPC, mesmo diante de situações que envolvam a Jurisdição Contenciosa, não haverá apreciação do mérito em razão da existência de vício formal - sentença anômala, processual ou terminativa. Na Jurisdição Contenciosa temos: Lide, Partes, Sentença de Mérito, Função Jurisdicional, CABE AÇÃO RESCISÓRIA (485 CPC) e, se tudo der certo, temos coisa julgada material. Na Jurisdição Voluntária ou Graciosa temos: Acordo de Vontades, Interessados, o que se busca é a homologação do negócio jurídico, podemos entender como atribuição meramente administrativa - CABE AÇÃO ANULATÓRIA (486 CPC) e a coisa julgada será apenas formal. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 14 3. Competência 3.1 Introdução Podemos afirmar que a jurisdição sofre apenas uma limitação e que esta se caracteriza quando pretendemos que os nossos comandos judiciais sejam aplicados e obedecidos por outros povos, outras nações, tão soberanas quanto a nossa. Esseé o limite de nossa atividade jurisdicional - a territorialidade de nossos país ou daquilo que podemos entender como território brasileiro. Por outro lado, para fins de administração da Justiça, e aplicação da norma, temos critérios que delimitam a área segura para a atuação do magistrado e sempre que ultrapassá-los ele estará numa área de desconforto - tecnicamente poderemos afirmar que ele será incompetente. Podemos concluir que, para a existência da relação jurídica de direito processual há que se buscar um órgão investido de jurisdição. E, para a validade da mesma, há que se verificar se a atuação de referido órgão obedece aos critérios que delimitam a atividade judicante. Podemos definir competência com a delimitação da Jurisdição. 3.2 Critérios que fixam a competência Os critérios utilizados para a fixação da competência envolvem dois sistemas distintos. O primeiro - que tem por base os critérios Matéria e Função ou Hierarquia - contempla regras cogentes, de interesse público, cujo descumprimento tem como consequência a nulidade dos atos praticados, que por isto mesmo, deve ser reconhecido de ofício pelo magistrado, não estando sujeito a prazo preclusivo ou grau de jurisdição (artigo 267 §3º e 301 §4º). Aqui falamos em Incompetência Absoluta - que deve ser arguida em preliminar de contestação - momento e forma adequada. Mas que até mesmo em ação rescisória poderia ser levantado. O outro, que tem por base os critérios Valor e Território, cujo interesse está relacionado às partes, revelando disponibilidade, permite a modificação pela vontade das partes ou por sua inércia. Sendo vedado, atualmente, ao magistrado declinar da competência sem a devida provocação da parte interessada, o que se dá através de exceção - defesa de natureza processual -prevista no artigo 304 CPC - diga-se: sujeita a preclusão. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 15 4. Direito de Ação 4.1 Introdução Para que possamos assegurar nossos direitos, dispomos do direito de ação assegurado na Constituição e consagrado pelo princípio do acesso á justiça. Desta forma, verificaremos em nossos estudos que o direito de ação enquanto garantia fundamental pode ser conceituado como um direito público, subjetivo, autônomo e abstrato de se obter um pronunciamento judicial sobre uma situação controvertida. Lembrete: Ação é uma posição jurídica capaz de permitir a qualquer pessoa a prática de atos tendentes a provocar o exercício, pelo Estado, da função jurisdicional, existindo ainda que inexista o direito material afirmado. O poder da ação se revela ao longo de todo o processo, sendo exercido toda vez que é exercida alguma posição jurídica ativa no processo. Podemos concluir que é o direito a um pronunciamento estatal que solucione o litígio, fazendo desaparecer a incerteza ou a insegurança gerada pelo conflito de interesses, pouco importando qual seja a solução a ser dada pelo juiz. 4.2 Evolução do conceito de ação Várias teorias explicam ao conceito de ação, em nossos estudos vamos focar nas seguintes teorias: Teoria Imanentista ou Civilista: A ação é imanente ao Direito (a todo direito correspondente uma ação que o assegure – Art. 75 CC/16, 80,I e 83 II, III CC/02 ) atualmente superada em razão da Autonomia do Direito Processual Civil. Direito autônomo e concreto: A ação só existe quando existir o direito material, direito à sentença favorável (Wach, Bülow e Hellwing). Direito Potestativo – A ação é direito autônomo e concreto, porém se dirige contra o adversário, não contra o Estado (Chiovenda). Direito Autônomo e Abstrato: A ação não tem relação alguma de dependência com o Direito Material controvertido (é a mais aceita ). Teoria eclética: revela a necessidade do preenchimento dos requisitos do provimento final (condições da ação). Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 16 4.3 Incidência das Teorias Excluída a teoria Imanentista e a Teoria do Direito Potestativo, as demais são complementares, uma vez que tratam do mesmo conceito (ação) sob pontos de vista diferentes, vejamos: Teoria abstrata da ação: vê na ação o poder de provocar a atuação do Estado-Juiz. Todos têm poder de ação de forma Incondicionada – assegurado pelo ordenamento Constitucional. Teoria Eclética: revela a ação como o poder de obter um provimento de mérito, poder este que só estaria presente se o autor preenchesse as condições da ação (267 VI CPC). a) Possibilidade jurídica do pedido -> Inexistência de vedação da análise do pedido no plano processual. b) Interesse de agir – Necessidade/utilidade da providência jurisdicional solicitada. c) Legitimidade para a causa – Pertinência subjetiva abstrata com o direito material (ativa e passiva) Teoria Concreta da Ação: vê na ação o direito de obter no processo o resultado favorável, só existindo se o demandante tiver razão no plano do Direito substancial. 4.4 Classificação das Ações Após a edição da Lei nº. 11.232, de 22 de dezembro de 2005, cuja vigência se deu a partir do dia 23 de junho de 2006, podemos afirmar que a satisfação do julgado, isto é, o cumprimento da sentença se dará em fase contínua à fase de cognição pura (até a sentença), na qual o magistrado garantirá a entrega da tutela específica, seu equivalente ou ainda o substituto legal. Desta forma, numa concepção clássica das tutelas podemos conceber três formas distintas de se provocar o Estado-Juízo e consequentemente finalidades específicas de acordo com a ação pleiteada, são elas: Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 17 Ação de Cognição (conhecimento) – tem por escopo buscar a declaração (lato senso) e o reconhecimento do direito tutelado, bem como o cumprimento, isto é, a satisfação do comando exarado pelo Estado-Juízo. Ação de Execução – visa à satisfação do credor que possui título líquido, certo e exigível. Ação Cautelar – Visa o acautelamento do processo, isto é, resguardar a eficácia do instrumento (processo principal) de conhecimento ou de execução. No que concerne aos efeitos da Tutela de Cognição, podemos vislumbrar uma classificação quinaria para as ações que buscam o reconhecimento da tutela jurisdicional adequada, são eles: 1. Declaratória 2. Constitutiva 3. Condenatória a) Meramente Condenatória b) Mandamental c) Executiva (lato senso) 4.5 Elementos da Ação A importância do estudo dos elementos da ação justifica-se em razão da segurança jurídica que deve ser perquirida no exercício da busca pelo direito aplicável ao caso concreto (tutela jurisdicional específica). Somente após a análise e compreensão dos elementos que compõem a ação podemos evitar a propositura de causas com identidade de elementos e de forma simultânea em juízo (litispendência) e ainda o reexame daquelas que já foram objeto de decisão (coisa julgada). Os fenômenos da conexão, continência e prevenção visam, igualmente, evitar decisões controvertidas e conflitantes. Se idênticos os três elementos da ação teremos o controle impeditivo da análise judicial de demandas. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 18 4.5.1 Elemento Subjetivo da Ação Caracterizado pelas partes. Quem pede e aquele em face de quem é requerida uma providência jurisdicional. São aqueles que participam da relação jurídica processual contraditória desenvolvida perante o juiz. Autor – deduz a sua pretensão em juízo Réu – resiste a tal pretensão(podendo, nas ações de caráter dúplice, formular pretensão em seu benefício). 4.5.2 Elemento Causal da Ação Caracterizado pela Causa de Pedir (causa petendi). São os fatos e fundamentos jurídicos que levam o autor a procurar o juiz. É a descrição do conflito de interesses e sua repercussão jurídica na esfera patrimonial ou pessoal do autor. Divide-se em: Causa Remota ou fática: é a descrição fática do conflito de interesses. O fato constitutivo do direito do autor. (a causa mais antiga da qual toda relação jurídica se origina). Causa Próxima ou Jurídica: é a descrição da consequência jurídica gerada pela lesão ao Direito do autor. 4.5.3 Elemento Objetivo da Ação Resta caracterizado como a providência a medida esperada por parte do requerente, a providência que será determinada pelo Estado-Juízo após a análise e tramitação do feito, divide-se em: Imediato – É a exigência formulada contra o Estado-juiz, visando à obtenção da tutela jurisdicional, a qual pode ser de cognição, executiva ou cautelar. A condenação, a declaração ou a constituição do direito. Relacionado ao Direito Processual Mediato – É a exigência formulada em face do Réu para que este se submeta à pretensão de direito material que o autor diz ter sido desrespeitado. O bem jurídico almejado. Direito substancial ou material (ex. receber o pagamento) Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 19 5. Processo e Procedimento 5.1 Introdução Verificamos anteriormente que nem sempre é possível se chegar a uma solução satisfatória do conflito, seja pela imposição da vontade do sujeito que se julga titular de um direito ou ainda pela atuação das vontades dos titulares dos interesses em conflito. Noutras palavras, nem sempre será possível a autotutela ou a autocomposição. Desta forma, há que se garantir um sistema que busque pacificar a sociedade resolvendo e amenizando a existência de situações que comprometam a segurança jurídica necessária ao convívio pacifico e harmonioso da sociedade. Nossa Constituição assegura como direito fundamental o acesso à Justiça, consagrando, dentre outros princípios que iremos relembrar, o Devido Processo Legal. Desta forma, forçoso concluir ser imprescindível para que alguém seja punido e privado de sua liberdade ou de seus bens haja uma persecução através de um sistema previamente definido pela norma. Sendo assim, configura o processo o caminho, o instrumento que a parte dispõe para fazer valer o direito em tese violado e desrespeitado por outro que, igualmente, resiste a uma pretensão em face de sua vontade. Em seu aspecto extrínseco podemos conceber a noção de procedimento, isto é, a forma como se vai caminhar para determinado objetivo. . Como a parte deverá atuar nas várias fases processuais objetivando a tutela de seu interesse. Em outras palavras: o procedimento revela como a parte deverá se portar para alcançar uma sentença de mérito satisfatória a sua pretensão. 5.2 Espécies de Tutelas (processos) Conhecimento ou cognição: Livro I do CPC – a jurisdição será provocada visando o conhecimento da matéria, a declaração do direito aplicável ao caso concreto e o cumprimento da sentença. Execução: Livro II do CPC – A parte poderá requerer ao Estado-Juiz que, através de meios coercitivos, faça valer o comando contido no título executivo extrajudicial. Cautelar: Livro III do CPC – a jurisdição será provocada visando à proteção do instrumento (processo), resguardando assim a efetividade do mesmo. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 20 5.3 Relação Jurídica Processual Podemos definir a relação jurídica processual como aquela que se estabelece entre autor, juiz e réu - relação angularizada (para alguns triangular). A relação jurídica se estabelece entre os três, embora existam outros participantes do processo, por exemplo: assistente, perito, escrevente. Assim, podemos afirmar que: sujeitos da relação jurídica processual são as partes (demandante e demandado) e o juiz, e sujeitos do processo são todos aqueles que praticam atos e influenciam na dinâmica do procedimento. A formação da relação se dá em duas etapas: 1ª) Proposta a ação (art. 263 CPC) – relação linear – autor e juiz 2ª) Após a citação (decorrido o prazo da resposta) – artigos 219, 263 e 267 § 4º do CPC. Cuidado: Artigo 285-A – Relação linear com possibilidade de julgamento com resolução do mérito (pela improcedência), cabendo RETRATAÇÃO do juiz. Características da Relação Jurídica Processual: É autônoma – não se confunde com a relação jurídica que se discute no processo = Direito material. Não se confunde com o processo = conjunto de atos complexos. Atividade -> Fim. Trilateral – dela participam autor, réu e o órgão judicante. Pública – o juiz nela figura como o órgão do poder Estatal. Complexa – há recíprocos direitos, deveres e ônus. Dinâmica – desenvolve–se progressivamente até um ato final. Observações Complementares: O Estado e as partes estão, no processo, interligados por uma série muito grande e significativa de liames jurídicos, sendo titulares de situações jurídicas em virtude das quais se exige de cada um deles a prática de certos atos do procedimento ou lhes permite o ordenamento jurídico essa prática. Através da relação jurídica, o direito regula não só os conflitos de interesse entre as pessoas, mas também a cooperação que estas devem desenvolver em benefício de determinado objetivo comum. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 21 O processo é uma entidade complexa, podendo ser encarado sob o aspecto dos atos que lhe dão corpo e da relação entre eles (procedimento) e igualmente sob o aspecto das relações entre os seus sujeitos (relação processual). 5.4 Partes da Relação Jurídica Processual Partes: São os sujeitos parciais do processo. Autor e Réu -> Demandante e Demandado. Regra: Quem formula o pedido em juízo é o próprio titular (em tese) da pretensão, do direito que diz ter sido violado / desrespeitado. Nesta hipótese podemos afirmar que estamos diante da legitimidade ordinária para causa. Por outro lado, nem sempre tal identidade será mentida. Temos hipóteses em que o demandante não guarda qualquer relação com o direito material em tese violado, mas que a lei permite sua atuação em nome próprio na defesa de interesses (direitos) alheios, nesta hipótese configuração a legitimidade extraordinária para a causa. 5.5 Litisconsórcio Aprendemos que o esquema básico, mínimo, da Relação Jurídica Processual envolve dois sujeitos parciais – demandante e demandado - e um sujeito que representa o órgão investido na função jurisdicional e, portanto, imparcial. O Código de Processo Civil regula hipóteses nas quais tal esquema mínimo poderá sofrer alterações no que diz respeito à Cumulação Subjetiva. Podemos conceber facilmente hipóteses em que um ou mais autores demandem em face de um ou mais réus buscando a satisfação do direito material em tese violado. Tal possibilidade recebe pelo sistema normativo vigente a especificação de litisconsórcio. Conceito: podemos conceber o conceito de litisconsórcio, com apoio nas lições de Cândido Dinamarco, como a situação caracterizada pela coexistência de duas ou mais pessoas do lado ativo ou passivo da relação processual, ou em ambas as posições. A justificativa apresentada para a possibilidade / necessidade da formação do litisconsórcio está ligada aos princípios da economia processual (redução de gastos) e ao da segurança jurídica (evitardecisões contrárias por juízos diferentes). Podemos classificar os vários tipos de litisconsórcios tendo em vista os seguintes aspectos: sujeitos envolvidos na relação jurídica processual; tempo de sua formação; obrigatoriedade de sua formação e alcance dos seus efeitos. O sistema de classificação aqui adotado visa apenas facilitar o estudo do operador do direito, sendo certo que, a exemplo de outros critérios de classificação, as espécies apontadas estão interligadas e se exteriorizam de forma concomitante nas relações jurídicas. Como sugestão para fixação dos conceitos que serão abordados, apresentamos um quadro (anexo I) contendo, segundo critérios específicos, cada uma das espécies de litisconsórcio, a explicação do seu significado, um exemplo Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 22 prático de cada tipo encontrado e, por fim, a tipificação legal, o fundamento, para o exemplo apresentado. Posteriormente ao estudo da classificação, passamos à análise da dinâmica do litisconsórcio no âmbito da relação jurídica processual. Preceitua o art. 48 do CPC o Princípio da Independência dos litisconsortes, com aplicação no litisconsórcio comum ou simples, mas incompatível com o sistema do unitário. Logo, a independência é relativa. Como exemplo de tal independência, temos a possibilidade da escolha do advogado e da apresentação de defesa de forma individual e diferenciada pelos litisconsortes. Contudo, no que diz respeito ao litisconsórcio unitário, tal independência cessa nas seguintes hipóteses: atos e omissões que beneficiarem a um dos l litisconsortes, a todos beneficiarão (provas e recursos, art. 509 do CPC); omissões não prejudicam os outros litisconsortes, o mesmo ocorrendo com os demais atos prejudiciais (confissão, art. 350 do CPC); art. 49 do CPC – todos devem ser intimados, mas cada um pode promover o andamento do feito, independentemente; art. 191 do CPC – prazo em dobro. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 23 6. Petição Inicial 6.1 Conceito Podemos conceituar a petição inicial como o instrumento da demanda, isto é, o meio através do qual noticiamos nossa pretensão ao Estado-Juízo com a finalidade de obtermos o justa composição da lide. Ao analisarmos referido instrumento, podemos destacar que a elaboração de referida peça técnica aborda os seguintes aspectos: PARA QUEM SE PEDE COMPETÊNCIA QUEM PEDE LEGITIMIDADE CAPACIDADE EM FACE DE QUEM SE PEDE LEGITIMIDADE CAPACIDADE O MOTIVO PELO QUAL SE PEDE CAUSA DE PEDIR O QUE PEDE PEDIDO COMO PROVAR O QUE SE PEDE PROVAS QUAL O VALOR DO QUE PEDE VALOR DA CAUSA Para a validade do processo, devemos observar critérios de validade do procedimento, desta forma, para fins didáticos, podemos conceber fases do chamado Devido Processo Legal. A saber: a) Fase Postulatória – momento caracterizado pela elaboração e apresentação das teses do demandante e do demandado. Embora, ao longo da atividade jurisdicional as partes, sujeitos parciais da demanda, formulem os mais diversos requerimentos, podemos destacar a Petição Inicial e as atitudes do demandado (“respostas”) como o momento específico para a realização das postulações. b) Fase Ordinatória – Após a oportunidade de resposta, que se dá com a citação de forma válida, os autos do processo serão encaminhados ao magistrado com a finalidade de verificar a necessidade ou não das chamadas Providências Preliminares. De forma simples, podemos conceituar referido momento processual como a fase destinada a analisar e preparar o feito para a resolução de acordo com o estado do processo. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 24 c) Fase Instrutória ou Probatória – Havendo necessidade de dilação probatória, o magistrado determinará a produção de provas e possibilitará o contraditório em relação as mesmas. Vale lembrar que já no momento da propositura da ação e quando da resposta as provas devem estar especificadas e no que concerne a prova documental devidamente anexada aos autos. d) Fase Decisória – Momento que tem por escopo decidir a lide. 6.2 Propositura da Ação O artigo 263 do CPC considera proposta a ação no momento em que a peça é despachada ou distribuída (onde houver mais de um Juízo competente para a propositura da ação). Proposta a ação, quatro hipóteses podem ocorrer, são elas: a) Mandar emendar a inicial (art. 284 CPC) b) Indeferimento da Petição Inicial (295 CPC) c) Julgamento Liminar da Lide (285-A CPC) d) Determinar a citação (285 CPC) Os requisitos da Petição Inicial vêm especificados no Código de Processo Civil nos artigos 282, 39,I, 283 e 257. 6.3 Análise dos Tipos de Pedido Podemos afirmar que o pedido é a conclusão da exposição dos fatos e dos fundamentos jurídicos. Constitui o objeto da demanda, aquilo que se pretende obter com a prestação da tutela jurisdicional reclamada. O objeto do pedido desdobra-se em objeto imediato, providência jurisdicional solicitada, e objeto mediato, que constitui o bem jurídico pretendido. O artigo 286 CPC informa que o pedido deve ser certo ou determinado. Melhor seria ter utilizado o conectivo “E”, visto que, em última análise, o pedido deve ser certo E determinado, como será analisado abaixo. Pedido certo: É pedido expresso, pelo menos no que diz respeito ao gênero do objeto pretendido. Pedido determinado: é o pedido cujo objeto foi individuado quanto à quantidade e à qualidade. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 25 O Artigo 286, em sua parte final, conceitua o chamado Pedido Genérico. Podemos conceituar o mesmo como o pedido certo quanto à existência, quanto ao gênero, mas ainda não individuado no que respeita à quantidade/qualidade. É o certo determinável. No artigo 287 do CPC (que pode ser combinado com o artigo 461 do mesmo diploma legal) vislumbramos o Pedido Cominatório que é caracterizado como o meio indireto para coagir o réu a cumprir obrigação de fazer, não fazer ou entregar coisa. Por Pedido Alternativo (artigo 288 do CPC) entendemos aquele que pode ser satisfeito por mais de uma forma pelo demandado (geralmente em razão da natureza da obrigação de direito material) Pedido Subsidiário é uma modalidade de pedido alternativo, com uma diferença: enquanto o pedido alternativo refere-se ao objeto mediato, que pode ser escolhido inclusive na fase da execução, o pedido subsidiário refere-se ao objeto imediato, à tutela jurisdicional, na qual a prestação já fica definida. Ex.: o autor formula mais de um pedido em ordem sucessiva, a fim de que o juiz conheça do posterior, se não puder acolher o anterior (artigo 289 do CPC). Como veremos em nosso encontro trata-se de espécie de cumulação imprópria. O Pedido de Prestações periódicas (ou de trato sucessivo) vem descrito no artigo 290 do CPC e permite ao juiz incluir na condenação as prestações periódicas ou de trato sucessivo, ainda que o autor não tenha requerido. O artigo 291 do CPC preceitua o Pedido de Prestação Indivisível ao regular o recebimento da prestação indivisível, aplicando-se também à hipótese de solidariedade ativa. Ex.: CC – artigos 260 e 267, qualquer credor pode cobrar a dívida inteira. Por fim, como objeto de nossos estudos, temos a possibilidade da cumulação de demandas prevista no artigo 292 do CPC que se caracteriza pela possibilidade de se formular mais de um pedido contra o réu, a fim de que o juiz conheça a ambos conjuntamente. Tal cumulação, chamadatecnicamente de cumulação própria, se divide em: a) Cumulação simples – pedidos absolutamente independentes. Ex.: cobrança de duas dívidas oriundas de fatos diferentes. b) Cumulação sucessiva – os pedidos guardam relação de dependência. Ex.:investigação de paternidade c/c petição de herança. Por fim, encerrando este tópico, vale a leitura complementar dos artigos 293 e 264 do Código de Processo Civil, que tratam respectivamente da forma de se interpretar os pedidos e da possibilidade de modificação do mesmo. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 26 7 A Tutela Jurisdicional e o “Inimigo Tempo” Considerando que não podemos realizar a autodefesa, proibida pelo ordenamento jurídico como vimos e o fato de que nem sempre vamos obter uma composição pelas próprias partes; Considerando ainda que, não podemos obter uma sentença de mérito – que resolva a lide – sem o devido processo legal – dialético e sob o crivo do contraditório; Considerando por fim, que o procedimento e os atos do mesmo demandam tempo; Fica a seguinte pergunta: Como tornar o processo um meio efetivo e eficaz de pacificação social? Como obter a justa composição da lide, com a entrega da tutela específica, sem ofender a ampla defesa e o contraditório? Para responder as indagações anteriores, passamos à analise das chamadas tutelas de urgência. 7.1 Tutelas de Urgência – Breve análise Para amenizar os efeitos nocivos que o tempo impõe ao procedimento, podemos utilizar as tutelas diferenciadas: Cautelares e Antecipatórias. As tutelas cautelares visam garantir a “justiça” e a eficácia prática da futura (provável sentença). Apesar de não satisfazerem a pretensão noticiada nos autos, resguardam e protegem o processo principal no qual se discute a lide – o mérito. Na verdade, tais medidas visam aparelhar o processo de meios adequados e suficientes para que possa desenvolver-se regularmente e caracterizando-se como processo justo São medidas que dão apoio ao processo e, por tal razão, caracterizadas como o “instrumento do instrumento”. Sob o foco da atividade cognitiva do magistrado, permitem que com base num juízo de probabilidade – fundamentado na fumaça do bom direito e no perigo da demora da entrega da prestação jurisdicional – possa o órgão judicante – adotar medidas temporárias que colaborem para a efetividade e eficácia da tutela jurisdicional. As cautelares vêm previstas a partir do artigo 796, em livro próprio, no Código de Processo Civil. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 27 Outra espécie de tutela diferenciada preocupada com a efetividade e eficácia da tutela jurisdicional e com os efeitos nocivos do “inimigo tempo” é a tutela antecipada, que passamos a analisar em linhas gerais neste momento. As medidas antecipatórias, têm por escopo antecipar os efeitos materiais do provimento final (sentença). Elas antecipam, integrando ao patrimônio jurídico do requerente, no todo ou em parte, exatamente o bem da vida postulado pelo mesmo. Realizam, desde logo, embora provisoriamente, a pretensão contida no processo, logo são satisfativas. Oferecem ao sujeito, em sua vida exterior ao processo, o mesmo resultado que ele espera obter ao fim do procedimento, ou parte deste resultado e de seus efeitos. Dão apoio às pessoas e estão contidas no próprio instrumento em que se busca a resolução da lide. Sob o foco da analise cognitiva do magistrado, trabalham com um juízo de verossimilhança – fundamentado na prova inequívoca, no fundado receio de dano de difícil reparação ou irreparável ou, alternativamente, abuso do direito de defesa. Desta forma, inegável que “a demora na obtenção do bem significa a sua prevenção no patrimônio do réu. quanto maior for a demora do processo, maior será o dano imposto ao autor e, por consequência, maior será o benefício conferido ao réu.” (Luiz Guilherme Marinoni) 7.2 Tutela Cautelar Podemos entender por Ação Cautelar o direito público, subjetivo e abstrato, assegurado constitucionalmente, de se provocar a tutela jurisidiconal cautelar que tem por finalidade proteger e resguardar a eficácia dos processos de cognição e de execução. Por sua vez, Processo Cautelar é o instrumento utilizado para garantir o devido processo legal na busca pela proteção da efetividade da atividade jurisdicional. Processo é o caminho utilizado para a busca da tutela jurisdicional. Medida Cautelar é o que se pretende obter do Estado-Juiz no exercício da tutela jurisdicional; a proteção almejada. Exemplo: arresto, sequestro etc. (artigos 813 e seguintes do CPC) Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 28 7.2.1 Características da Tutela Cautelar Instrumentalidade de Segundo Grau: Se considerarmos que o processo é um instrumento que visa garantir um direito, seja através do reconhecimento (declaração) e de sua posterior satisfação (cumprimento); ou ainda, em razão da existência da certeza, liquidez e exigibilidade da qual se reveste o título. Podemos conceber que as tutelas cautelares têm por escopo instrumentalizar o próprio instrumento (instrumentalidade hipotética ou instrumentalidade ao quadrado para alguns doutrinadores seria a nomeclatura correta), isto é, o processo cautelar aparelha e instrumentaliza a efetividade das tutelas de cognição e de execução respectivamente. Autonomia/Acessoriedade: Há uma autonomia procedimental, ou seja, deverá haver a Petição Inicial, a Citação do Réu, a Contestação, a Réplica, e por fim a Sentença. (art. 796 do CPC). No entanto, não devemos esquecer que ele só existe para satisfazer outro processo, sendo assim, ele é dependente do Processo Principal.Se o Processo Cautelar for extinto, isso não significa que o Principal também deverá ser, ou que não venha existir. Porém, se o Principal extinguir-se, automaticamente ocorrerá o mesmo com o Cautelar (art. 810 do CPC).Vale desde já a advertência que nos casos de reconhecimento da prescrição ou da decadência a decisão no processo cautelar afetará, consequentemente, o processo principal – configurando, pois, as duas hipóteses descritas exceção a regra descrita. Temporalidade (Provisoriedade): O Processo Cautelar não é definitivo, nasce tendo por fundamento determinadas circunstâncias que, se ao cessar, finalizam com a medida concedida. Ademais, vale lembrar que as cautelares não são, na sua essência, satisfativas. Revogabilidade (Modificabilidade): A medida cautelar sempre poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo (art. 807 do CPC). Poderá também ser substituída por caução real ou fidejussória (art. 805 do CPC). Urgência: Existe o “periculum in mora”, ou seja, o perigo da demora. Dessa forma, poderá o Juiz determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra, lesão grave e de difícil reparação (art. 798 do CPC). Há que se consignar que o perigo aqui destacado guarda relação direta com a própria tutela principal, isto é, o escopo é analisar se existe perigo para efetividade da tutela dita principal. Sumariedade da Cognição - O Processo Cautelar é mais rápido que o Procedimento Comum Ordinário e Sumário. Cognição é a análise dos argumentos através das provas. No Procedimento Cautelar há o pressuposto do “fumus bonis iuris”, ou seja, a fumaça do bom direito. O Juiz não faz uma análise profunda dos fatos ocorridos no processo, pois a ação é sumária, rápida. Dessa forma,a análise não é plena, exaustiva e muito menos, profunda. (art. 801, IV do CPC) Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 29 Inexistência Da Coisa Julgada Material - A coisa julgada material é a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a Recurso Ordinário ou Extraordinário. (art. 467 do CPC). Na coisa julgada formal, como não houve julgamento do mérito, nada impede que o autor intente de novo a ação, podendo assim haver o Recurso. (Salvo as hipóteses descritas no art. 268 do CPC). A ÚNICA hipótese em que a Ação Cautelar faz coisa julgada material, como já destacado anteriormente, é quando o Juiz acolhe a DECADÊNCIA ou a PRESCRIÇÃO. Fungibilidade: Interpretando sistematicamente os artigos 2º, 128 e 460 do CPC, verificamos que o magistrado deverá, via de regra, julgar nos limites do que foi requerido pelas partes (princípio da demanda, princípio da inérica da jurisdição e princípio da congruência). Assim, podemos concluir que o Juiz proferirá sentença após apreciar todo o pedido, podendo acolhê-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte (art. 159 do CPC), sendo proibido ao Juiz proferir sentença favorável ao autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantia superior ao objeto diverso do que lhe foi demandado (art.160 do CPC). Ao estudarmos os princípios que norteiam as cautelares e a sua fundamentação, verificaremos que, frente ao caso concreto, o juiz poderá determinar as medidas cautelares que entender adequadas, ainda que o pedido não seja exatamente o da tutela deferida. 7.2.2 Pressupostos da Tutela Cautelar Periculum in mora (perigo da demora): ocorre quando há risco iminente de perecimento, destruição, deterioração ou qualquer risco que prejudique a eficácia do processo principal. O dano deve ser provável. Fumus boni iuris (fumaça do bom direito): significa indícios de um direito, presunção de legalidade (onde há fumaça há fogo). Este pressuposto significa a possibilidade ou probabilidade de existência do direito invocado pelo autor da ação cautelar. 7.2.3 Classificação das Medidas Cautelares Preparatória ou Antecedente/Incidental: preparatórias são aquelas que antecedem a propositura da ação principal, enquanto as incidentais são aquelas que surgem no curso do processo principal (art. 800 CPC). Típicas ou Nominadas: são as ações cautelares reguladas sob a denominação de “procedimentos cautelares específicos”, que podem ser subdividas em quatro espécies: a) medidas sobre bens; b) medidas sobre provas; c) medidas sobre pessoas; d) medidas conservativas e outras não cautelares. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 30 Atípicas ou Inominadas: são aquelas deixadas pelo legislador ao Poder Geral de Cautela do Juiz, disposto no art. 798 CPC. 7.2.4 Eficácia da Medida Cautelar Quando cessa a eficácia da medida cautelar? Se a parte não intentar ação no prazo de 30 dias contados da data da efetivação da medida cautelar, quando esta for concedida em procedimento preparatório; se não for executada dentro de 30 dias; se o Juiz declarar extinto o processo principal, com ou sem o julgamento do mérito. Vale ressaltar que conservam sua eficácia no prazo de 30 dias, contados da data de sua efetivação quando for concedida em procedimento preparatório e na dependência do processo principal, mas, podem a qualquer tempo, ser revogadas ou modificadas (art. 807 do CPC). O indeferimento da medida não impede que a parte intente a ação, nem influi no julgamento desta, exceto se o Juiz, no procedimento cautelar, acolher as alegações de decadência ou de prescrição do direito do autor (art. 810 do CPC). Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 31 8 Das respostas do Réu A Relação Jurídica Processual é dialética, desta forma, podemos concluir que tem como princípio norteador o contraditório. A Constituição Federal consagra o Princípio do Devido Processo Legal em seu artigo 5º, inciso LIV CRFB, segundo o qual “Ninguém será privado de sua liberdade e de seus bens sem o devido processo legal”. Assim, podemos entender a resposta da réu (demandado) como uma reação ao estímulo que lhe é feito pela citação. De conformidade com o artigo 297 Código de Processo Civil, três são as espécies de resposta, a saber: contestação exceção reconvenção Vale lembrar que o prazo para oferecimento da resposta consta de referido dispositivo, podendo o réu oferecer, no prazo de 15 (quinze) dias, em petição escrita, dirigida ao juiz da causa, contestação, exceção e reconvenção. Devemos ressaltar que na contagem do prazo duas regras devem ser observadas: 1. O prazo para resposta só se inicia depois de esgotado todo o procedimento citatório. Art. 241 CPC. Normalmente é da juntada aos autos do mandado cumprido. Art. 241. Começa a correr o prazo: (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993) I - quando a citação ou intimação for pelo correio, da data de juntada aos autos do aviso de recebimento; (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993) II - quando a citação ou intimação for por oficial de justiça, da data de juntada aos autos do mandado cumprido; (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993) III - quando houver vários réus, da data de juntada aos autos do último aviso de recebimento ou mandado citatório cumprido; (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993) IV - quando o ato se realizar em cumprimento de carta de ordem, precatória ou rogatória, da data de sua juntada aos autos devidamente cumprida; (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993) V - quando a citação for por edital, finda a dilação assinada pelo juiz. (Redação dada pela Lei nº 8.710, de 24.9.1993) 2. Nos casos de litisconsórcio, deve ser obedecido o princípio da simultaneidade: o prazo se inicia ao mesmo tempo para todos os litisconsortes. Pode até terminar em momentos distintos (Ex. Fazenda Pública x particulares). A regra é o prazo de 15 dias. EXCEÇÕES: art. 191 CPC – litisconsortes com diferentes procuradores; Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 32 8.1 Da Contestação Podemos conceituar contestação como a principal espécie de resposta do réu. Nela o réu deve alegar todas as matérias de fato e de direito que possam influenciar o convencimento do juiz no sentido da improcedência do pedido do autor. Caso o Réu não conteste a ação o artigo 319 do CPC informa que reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor. Isso decorre do fato do demandado não ter impugnado especificamente as alegações do autor e, consequentemente, não ter tornado os fatos controvertidos, sendo certo que, independem de prova os fatos tidos como incontroversos (artigo 334, III do CPC). A regra é que na contestação o demandado requeira a improcedência do pedido autoral (sentença declaratória negativa) Mas, vale ressaltar que há uma hipótese em que a contestação amplia o objeto litigioso do processo. Isso se dá nas ações de caráter dúplice, nas quais se permite ao demandado formular pedido a seu favor - : pedido contraposto. Temos algumas previsões decorrentes da lei, a saber: procedimento comum sumário – art. 278, § 1º, CPC; juizados especiais cíveis – art. 31 CPC ações possessórias – art. 922 CPC. 8.2 Conteúdo da Contestação Sendo a contestação peça de resistência por excelência, podemos conceber duas esferas de defesas: Processuais (que buscam invalidar o processo quanto a sua forma) e Defesas de Mérito(que atacam o próprio conteúdo material da lide). As defesas processuais visam a impedir o exame do mérito da causa. O artigo 301 do CPC apresenta as chamadas questões preliminares que devem ser analisadas antes do mérito da causa. Apenas a titulo exemplificativo temos: a incompetência absoluta do juízo; a falta de condição da ação e a inobservância dos pressupostos processuais. As defesas de mérito atacam a questão “de fundo”, o mérito da causa, isto é, a causa de pedir remota e os seus fundamentos. Se dividem em defesas de mérito diretas e indiretas. Defesas de mérito diretas: são as que negam a ocorrência do fato constitutivo do direito do autor ou de seus efeitos. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 33 Defesas de mérito indiretas: Não se discute o fato constitutivo nem a produção de seus efeitos. Em tal modalidade o demandado alega outros fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor 8.3 Princípios específicos da contestação PRINCÍPIO DA EVENTUALIDADE / DA CONCENTRAÇAÕ DA DEFESA. Art. 300 CPC. Segundo esse princípio, o réu deve apresentar na contestação TODAS as matérias de defesa. Assim, na contestação, na eventualidade de um primeiro argumento não ser aceito, alega-se um segundo, assim sucessivamente, tendo em vista que, na eventualidade de o juiz não acolher um, oferece-se um outro. Art. 300. Compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito, com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir. ÔNUS DA IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FATOS Art. 302 CPC: o réu tem o ônus (não a obrigação) de impugnar especificamente os fatos alegados pelo autor, sob pena de serem presumidos como verdadeiros. Esse ônus não atinge o advogado dativo, o MP e o curador especial. Além disso, podem fazer contestação por negativa geral / genérica / negativa genérica. Não precisam impugnar especificamente os fatos alegados pelo autor. Art. 302. Cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo: I - se não for admissível, a seu respeito, a confissão; II - se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público que a lei considerar da substância do ato; III - se estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto. Parágrafo único. Esta regra, quanto ao ônus da impugnação especificada dos fatos, não se aplica ao advogado dativo, ao curador especial e ao órgão do Ministério Público. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 34 9. Direito Probatório - Teoria Geral das Provas Podemos entender como prova qualquer elemento que contribua para a formação da convicção do magistrado acerca da existência de determinado fato. No que concerne à prova, podemos conceber que a valoração realizada pelo magistrado diz respeito a sua convicção, isto é, a um juízo de persuasão racional de acordo com os elementos probatórios constantes dos autos. Assim, convicção (critério subjetivo) não se confunde com certeza (critério objetivo). Na análise ponderada dos fatos alegados pelas partes pode o magistrado, na sistemática do Direito Processual Civil, contentar-se com a Verdade Formal, isto é, com os elementos probatórios constantes dos autos. Temos como objeto da Prova os fatos alegados pelas partes, relevantes para a causa e que, consequentemente, irão contribuir para a formação do livre convencimento motivado do magistrado. Vale lembrar que, por regra, não existe a necessidade de se provar o Direito alegado. Contudo, o artigo 337 do CPC especifica hipóteses nas quais cabe à parte a prova do alegado (ônus da prova). Toda prova produzida nos autos de uma relação jurídica processual apresenta dois destinatários distintos, a saber: Destinatário Direto – Aquele a quem se procura convencer a respeito da tesa levantada nos autos do processo: O Estado-Juízo Destinatário Indireto – Aquele que suportará as consequências do resultado da demanda e que, por isso mesmo, deve poder exercer o contraditório e a ampla defesa em relação à produção das provas a fim de comprovar a veracidade da tese sustentada perante o órgão responsável pela atividade jurisdicional: O Sujeito Parcial da Demanda – a parte. Ressalte-se que a prova trazida para o “mundo dos autos” configura elemento de convicção do magistrado, razão pela qual, independentemente do fato de beneficiar ou prejudicar aquele que a requereu e/ou produziu, o magistrado poderá considerá- la, visto que este será sempre o destinatário direto da mesma (Princípio da Comunhão das Provas). 9.1 Valoração da Prova 1. Sistema das Ordálias ou Juízo dos Deuses 2. Sistema da Prova Legal 3. Sistema da Íntima Convicção do Magistrado 4. Sistema da Persuasão Racional do Juiz (Livre Convencimento Motivado) Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 35 9.2. Procedimento Probatório Podemos conceber o procedimento probatório através da analise de quatro fases distintas, a saber: 1ª Fase: Proposição da Prova (PI e Resposta) 2ª Fase: Admissão da Prova (Decisão de Saneamento) 3ª Fase: Produção da Prova (Regra: AIJ. Cuidado: Prova Documental – 396 CPC e Pericial – Fase Instrutória) 4ª Fase: Valoração da Prova (no momento de sentenciar) 9.3 Ônus Probatório Aspecto Subjetivo: quem prova o quê; Aspecto Objetivo: o que se deve provar. O artigo 333 do Código de Processo Civil distribui o ônus da prova (aspecto subjetivo) afirmando ser do Autor o ônus de provar o fato constitutivo do seu direito e ao Réu o ônus de comprovar os fatos modificativos, extintivos ou impeditivos do direito do autor; sem prejuízo do ônus da contraprova por parte do Autor e do Réu a respeito dos fatos alegados por seu ex-adverso. Quanto ao aspecto objetivo das provas, vale lembrar que o magistrado irá se posicionar a respeito das questões ou pontos controvertidos da demanda. Assim, somente os fatos alegados por uma das partes e impugnados pela outra, quando relevantes ao deslinde da causa, serão objeto de cognição por parte do magistrado. Por outro lado, o artigo 334 do Código de Processo Civil informa quais os fatos independem de prova. Pela Teoria da Carga Dinâmica da Prova, buscando a isonomia de tratamento às partes na relação jurídica processual, pode o magistrado trabalhar com a chamada “inversão do ônus da prova”. Prof. Antônio Jorge Béze – Direito Processual Civil 36 10. Questões para análise da Turma Grupo 01 01) Se, no curso da demanda, o juiz identificar a ausência de um dos litisconsortes necessários, poderá o mesmo determinar de ofício a sua inclusão no processo? 02) Três empresas A, B e C formalizam um contrato com a empresa X que tem por objeto o fornecimento de matéria-prima para que elas possam produzir, em conjunto, determinado bem de consumo. A empresa A se sente prejudicada suspeitando haver nulidade no contrato firmado. Assim, propõe demanda em face da empresa X pedindo a anulação do instrumento firmado. Pergunta-se: Pode a empresa A propor a ação sozinha? 03) Qual a natureza jurídica da decisão que limita o litisconsórcio multitudinário? Sob qual fundamento poderá o magistrado, de ofício, limitar o número de litigantes? 04. Antônio e Carlos, na qualidade de acionistas, ajuizaram ação de conhecimento, pelo procedimento comum ordinário, em face de ALKA S/A, tendo por objeto imediato a declaração e o reconhecimento
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