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Vazão Sólida Litorânea

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Vazão Sólida Litorânea
Resumo
Introdução
A dinâmica do movimento dos sedimentos costeiros começou a ser mais intensamente estudada a partir de 1950. Sob o ponto de vista da Engenharia Costeira a importância do tema é muito grande para a solução de problemas práticos relevantes, como o assoreamento de bacias portuárias e as erosões de praias em áreas de elevado valor social e/ou econômico. Não muito tempo atrás a maioria das obras costeiras era feita por tentativas, devido à insuficiência do conhecimento relativo à mecânica dos processos litorâneos.
Os processos litorâneos ligados à morfologia costeira e do fundo do mar resultam da combinação de forças naturais (ligadas a ondas, correntes, ventos e tectônicas) e antrópicas (ligadas à ação humana, principalmente através de obras de Engenharia Costeira) nas formações geológicas expostas. Muito frequentemente a costa é formada por material arenoso, que responde muito rapidamente a estas ações por meio do fenômeno de transporte de sedimentos. As costas rochosas respondem geralmente muito mais lentamente a estas influências e por isso interessam mais aos geólogos do que aos engenheiros civis.
A contínua ação dos movimentos do mar sobre a costa, que determina o clima de ondas e a intensidade e direção das correntes varia em muitas escalas de tempo, desde segundos até milênios. Também o suprimento de sedimentos é irregular no tempo e no espaço. Portanto, a qualquer instante a formação e composição granulométrica da costa e do fundo do mar apresentam um padrão complexo que tende para um equilíbrio dinâmico, o qual se insere num período mais amplo correspondente à era geológica.
Assim, o equilíbrio das praias é, normalmente, um equilíbrio dinâmico, isto é grandes quantidades de areia encontram-se normalmente em movimento, mas de tal forma que a quantidade de material que entra numa área e intervalo de tempo dados é igual, em média, à quantidade que dela sai no mesmo intervalo de tempo. A posição da linha média da costa é relativamente estável por um período de meses ou anos, enquanto a posição instantânea sofre oscilações de curto período.
As praias são erodidas, engordam ou permanecem estáveis dependendo do balanço entre o volume de sedimentos suprido e disponível e o volume de sedimentos retirado pelo transporte, resultante principalmente da ação de ondas e correntes nas direções longitudinal e transversal à praia.
A área de interesse destes estudos está compreendida entre o ponto ao largo onde as ondas em águas pouco profundas começam a movimentar os sedimentos do fundo e o limite em terra dos processos marinhos ativos. Este último é usualmente definido por um campo de dunas ou uma linha de rochedos.
As obras de Engenharia Costeira, alterando o regime natural de transporte de sedimentos, rompem, em geral, o equilíbrio estabelecido num litoral, embora em todos os projetos procure-se interferir minimamente na linha de costa estabelecida. Erosões ou assoreamentos excessivos podem afetar a integridade estrutural ou a utilidade funcional de uma obra costeira. Frequentemente a falta de material ocorre em algum local, como erosões indesejáveis em praias, e em outros locais a superabundância de material pode ser problemática, como o assoreamento de um canal navegável.
Assim, é indispensável ao Engenheiro Civil que se ocupa de trabalhos marítimos conhecer, com relativa precisão, o modo e a intensidade com que se processa o caminhamento das areias. Desta forma, a escolha da solução mais adequada, tendo em vista atender um determinado objetivo, será feita com maior segurança; bem como poderá evitar-se ou resolver-se com maior eficácia os problemas resultantes da ruptura do equilíbrio dinâmico existente anteriormente à obra.
A questão do movimento dos sedimentos marinhos é extraordinariamente complexa em virtude do número dos parâmetros envolvidos. Comparativamente a previsões similares em rios, os cálculos em Engenharia Costeira tendem a ser de uma ordem de magnitude mais difíceis. Os movimentos oscilatórios da água sob as ondas e as várias correntes envolvidas na zona de arrebentação são muito complexos e aumentam grandemente as variáveis a considerar, sem pensar no desconhecimento de leis gerais do movimento dos sedimentos, que nem para as correntes unidirecionais foram ainda consolidadas. Além disso, assumem importância nada transcurável os dados geográficos e geológicos de base, como a natureza e a estabilidade dos materiais expostos à ação marinha, os aportes fluviais e em geral a morfologia e estratigrafia da costa.
Ao abordar-se o movimento dos sedimentos no mar é necessário distinguir, antes de tudo, as zonas antes e depois da arrebentação, já que as características e a intensidade dos movimentos aluvionares são bastante diferentes.
Os movimentos que se produzem antes da onda arrebentar são, em geral, movimentos de vaivém, relativamente bem definidos e com uma resultante sempre de pequena intensidade. Ao contrário, os movimentos aluvionares produzidos durante e após a arrebentação são extraordinariamente complexos. As quantidades de areias postas em movimento nesta zona são, em geral, muito grandes, resultando importante o seu conhecimento por parte do Engenheiro Costeiro, pois boa parte das obras costeiras situamse nesta área.
O movimento dos sedimentos na zona de arrebentação realiza-se basicamente em duas direções, resultando movimentos aluvionares muito diferentes quanto às suas características e consequências.
O transporte que se processa na direção mar-costa, nos dois sentidos, isto é sensivelmente perpendicular (transversal) às batimétricas, é o responsável pelas alterações do perfil da praia como resultado da ação das ondas em ataque frontal. Neste transporte o perfil procura adaptar-se às condições climáticas existentes. Se bem que as quantidades de areia movimentadas possam ser surpreendentemente grandes, a resultante anual é praticamente nula e a praia oscila entre duas situações extremas de "bom tempo" e de "mau tempo".
O transporte que se processa na direção paralela à praia, isto é sensivelmente paralelo (longitudinal) às batimétricas, é consequência do ataque oblíquo das ondas, o que gera na zona de arrebentação uma corrente responsável pelo carreamento de material nesta direção. Trata-se de movimento num só sentido ou, pelo menos, de resultante indicando um sentido predominantemente nítido, do que se conclui que o equilíbrio numa praia sujeita a este movimento deverá ser forçosamente dinâmico. O rompimento deste equilíbrio poderá vir a causar problemas importantes, quer de assoreamentos indesejáveis, quer de erosões mais ou menos graves. Este movimento de sedimentos constitui-se no denominado transporte sedimentos litorâneo longitudinal.
O estudo destes dois transportes é feito separadamente, isto é: ao se estudar o transporte litorâneo pressupõe-se que o perfil de equilíbrio esteja formado.
Mesmo assim, dada a complexidade do escoamento na zona de arrebentação, não se tem aí o transporte de sedimentos completamente definido. Existem basicamente duas questões. A primeira é a descrição hidrodinâmica da corrente longitudinal, agente motriz do fenômeno, e a outra é o próprio mecanismo do transporte de sedimentos, ou seja, as leis físicas capazes de descrever o movimento dos grãos sob a ação do escoamento, se por arrastamento ou suspensão e quais os limites dos mesmos.
Vários estudos sobre o transporte litorâneo já foram realizados, quer na natureza, quer em laboratório. Existem estudos experimentais que procuram ligar diretamente o volume de material transportado com as características das ondas atuantes, enquanto outros estudam o transporte de sedimentos com base nas características dos agentes transportadores (correntes de arrebentação e ondas).
Com base nestes conhecimentos o Engenheiro Costeiro poderá avaliar mais adequadamente a eficiência e o impacto da construção de estruturas, dragagens, engordamento de praias e outras obras que são realizadas na zona costeira para limitar ou reverter erosões ou deposições. Estasobras muitas vezes superpõem-se a um equilíbrio dinâmico da costa, resultando numa nova condição de equilíbrio, que pode ou não ser desejável. Assim, as obras costeiras podem afetar os processos litorâneos por:
Mudança na taxa e/ou características dos sedimentos supridos à costa;
Ajustamento no nível do fluxo de energia das ondas em direção à costa;
Diretamente interferindo com o processo de transporte de sedimentos costeiro.
Como exemplos do primeiro caso podem ser citados: a construção de uma barragem que retenha sedimentos de um rio que desemboca a barlamar de uma costa, e, portanto, prive a mesma do aporte de sedimentos; colocação periódica de areia diretamente na praia para engordá-la. Exemplos do segundo e terceiro casos são, respectivamente: construção de um quebra-mar destacado que intercepta a aproximação das ondas à praia, reduzindo consequentemente o transporte de sedimentos ao longo da mesma e induzido pelas ondas; construção de um espigão atravessando a zona de arrebentação e interrompendo diretamente as correntes ao longo da praia, que são induzidas pelas ondas, e o transporte de sedimentos.
Para o progresso do conhecimento sobre os processos litorâneos dispõe-se, por um lado, da Hidrografia, Oceanografia Física, Mineralogia e Sedimentometria, de outro lado utilizam-se a experimentação em modelo físico ou na natureza, com meios técnicos modernos: computadores, traçadores radioativos e aparelhos de medida autônomos do mar.
Grande quantidade de dados foi acumulada quanto ao transporte de sedimentos costeiro, através de investigações de campo e laboratório. Embora os dados sejam úteis nas tentativas de entender os processos litorâneos, os fenômenos são complexos e difíceis de medir e muito é entendido em senso qualitativo. Portanto, muito esforço ainda é necessário para estudar o mecanismo do movimento dos sedimentos nos processos costeiros.
Agentes Transportadores
As correntes que interessam ao transporte sólido marítimo são, em geral, correntes associadas à onda. Dentre elas, convém destacar:
Correntes longitudinais (“longshorecurrents”) provocadas pela rebentação oblíqua das ondas. Essas correntes tem, em média, uma direção paralela à praia e manifestam-se quase exclusivamente entre a linha de rebentação e a costa. A sua intensidade, que chega a atingir 3 ou 4 nós, é função das características da onda (obliqüidade, altura e período) e das características da praia (declive e rugosidade);
Correntes de concentração “rip-currents”, correspondentes ao retorno, concentrado em determinados locais, da água lançada em direção à costa através da linha de rebentação;
Correntes de difração provocadas por diferença de transporte em massa em zonas vizinhas e dirigidas no sentido da zona onde esse transporte é maior para as zonas onde ele é menor;
Corrente de transporte de massa da própria onda, antes de rebentar (onda de Stokes, onda solitária etc.).
As ondas constituem o principal agente de movimentação do material sólido. A sua ação direta é de importância relativamente pequena e manifesta-se por intermédio da corrente de transporte de massa antes de rebentação que é sempre de pequena intensidade. Pelo contrário, a ação indireta das ondas, que se manifesta através da criação de uma forte turbulência na rebentação e da geração de correntes, desempenha um papel importantíssimo no transporte de material.
As correntes oceânicas são, em geral, de pequena intensidade e manifestam-se, em regra, a certa distância da costa pelo que a sua influência no transporte litoral é, em geral, insignificante.
As correntes de maré são, normalmente, fracas em costa aberta e, em geral, só assumem importância na proximidade das embocaduras de estuários ou lagunas, onde desempenham então um papel preponderante na modelação dos fundos.
Finalmente, podemos apontar ainda o vento como agente transportador de areias na zona imersa das praias.
Movimento do material sólido
No estudo da movimentação dos materiais por ação das ondas, é costume distinguir dois tipos diferentes de movimentos: os transversais e os longitudinais. Trata-se, no fundo, de uma esquematização que tem por fim tornar-se mais clara a compreensão dos fenômenos.
Os chamados “movimentos transversais” são movimentos que se processam em uma direção sensivelmente perpendicular às batimétricas. Trata-se de movimentos ao longo do perfil da praia, ora no sentido mar-costa, ora no sentido inverso, mediante os quais, o perfil procura adaptar-se às condições de ondulação existentes.
Se bem que, as quantidades de areia movimentadas possam ser surpreendentemente grandes, a resultante anual é praticamente nula e a praia oscila, por assim dizer, entre duas situações extremas, de “inverno” e de “verão”.
Os movimentos longitudinais manifestam-se em uma direção sensivelmente paralela à praia e são, sobretudo, devidos à rebentação oblíqua. Para ondas de direção constante, os movimentos longitudinais processam-se em um só sentido, mas, mesmo nas praias sujeitas a ondas de direção variável, existe, em geral, um sentido de predominância nítida.
Foi já referido que, mediante os movimentos transversais, a praia procura constantemente a posição de equilíbrio correspondente à ondulação atuante e às características dos sedimentos. Também já foi referido que, embora os volumes movimentados possam ser surpreendentemente grandes, o saldo anual, em ano normal, é sensivelmente nulo e a praia oscila entre duas posições extremas, designadas corretamente por “perfil de verão” e “perfil de inverno”.
De fato, é corrente que as ondas de bom tempo, de declividade normalmente pequena, provoquem o enchimento das praias e as ondas de temporal, em geral de grande declividade, provoquem erosão.
O jogo dos movimentos transversais não é igual todos os anos, visto que a ondulação também varia de ano para ano. Nessas condições, pode acontecer que, em ocasião de mau tempo, as areias sejam levadas até profundidades de onde já não possam ser removidas para terra pela ação das ondas de menor altura, resultando daí, um emagrecimento geral da praia, a longo prazo.
O conhecimento das características de evolução transversal das praias torna-se necessário para a resolução de alguns tipos de trabalhos marítimos nomeadamente:
A definição da robustez de uma praia, em condições de se estabelecer os limites prováveis das máximas erosões e, conseqüentemente, as limitações a atender nas construções à beira-mar;
O cálculo do volume de areias necessário à criação de praias artificiais ou à ampliação das existentes;
A avaliação das profundidades a que se poderão efetuar dragagens nos fundos submarinos sem afetar a estabilidade das praias adjacentes. Inversamente, os locais onde se poderão lançar terras excedentes de escavações, esgotos, detritos etc;
A determinação da profundidade que terá de atingir uma obra de retenção para que o enchimento a obter não se perca por contornamento nos fundos.
Uma vez que, para um dado sedimento, a configuração do perfil transversal de uma praia é função das características da ondulação, o problema que interessaria ver resolvido é precisamente o da determinação do perfil transversal de uma praia em função das características das ondas atuantes.
Tal problema, porém, está longe de ter encontrado solução, mau grado os inúmeros estudos já realizados, quer na natureza, quer em laboratório.

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