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Análise linguística de expressões nordestinas em canções

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ANÁLISE LINGUÍSTICA DE EXPRESSÕES NORDESTINAS EM CANÇÕES
Roberta Gomes BATISTA 1[1: Graduanda da Universidade Federal do Ceará. Fortaleza-CE. rogomes_10@hotmail.com ]
Rute dos Santos ALVES 2[2: Graduanda da Universidade Federal do Ceará. Fortaleza-CE. rutesantos085@gmail.com]
 Laura Moreira dos Santos OLIVEIRA 3 [3: Graduanda da Universidade Federal do Ceará. Fortaleza-CE. oliveira_laura02@hotmail.com]
Resumo: A variação linguística é um fenômeno da língua que evidencia as influências regionais e históricas sobre os diferentes modos de falar. Este artigo pretende analisar a variação linguística retratada nas canções Asa Branca e A Volta da Asa da Branca de Luiz Gonzaga, descrevendo a ocorrência do falar sertanejo nas canções. Para a fundamentação teórica dessa pesquisa serão utilizadas contribuições de autores como Coelho et al (2015), Bortoni-Ricardo (2004), Bagno (2000/2005), Aragão (2013) e outros. A temática será abordada de maneira mais aprofundada dentro da análise fonético-fonológica. Os resultados obtidos explicitam que nas canções de Gonzaga há uma variação diatópica, também conhecida como variação geográfica. Concluímos então, que as canções apresentam a diferença na linguagem dos habitantes do Nordeste em comparação às outras regiões do Brasil, denotando assim características do falar sertanejo que ocorrem com frequência em Asa Branca e A Volta da Asa Branca. 
Palavras-chave: variação linguística; canções de Luiz Gonzaga; falar sertanejo. 
Abstract: The linguistic variation is a tongue phenomenon that evidences the regional and historic influences about the different talking ways. This article seek to analyze the linguistic variation portrayed in the Asa Branca and A Volta da Asa Branca songs, from Luiz Gonzaga, describing the occurrence of the sertanejo in songs. This research uses the contributions from authors like Coelho et al (2015), Bortoni-Ricardo (2004), Bagno (2000/2005), Aragão (2013) and others for theoretical foundation. The thematic will be approached in a deeper way on the phonetic-phonological analyses. The results obtained explicit that there is a diatopic variation, also known as geographic variation, in Luiz Gonzaga’s songs. We conclude, then, that the songs shows the difference in the inhabitants language from Nordeste comparing to others Brazilian regions, denoting that the sertanejo’s speaking features occur with frequency in Asa Branca and A Volta da Asa Branca. 
Keywords: linguistic variation; Luiz Gonzaga’s songs; sertanejo speaking.
Introdução 
Neste trabalho, buscamos fazer uma análise linguística de expressões nordestinas em canções, mais especificadamente a variação linguística retratada nas canções Asa Branca (1947) de autoria de Humberto Teixeira e A Volta da Asa Branca (1950) que tem como compositor Zé Dantas, produzidas e amplamente difundidas com a parceria do famoso “Rei do Baião”: Luiz Gonzaga. 
O objetivo geral dessa pesquisa é analisar as variações linguísticas empregadas nas duas canções gravadas por Luiz Gonzaga: Asa Branca e A Volta da Asa Branca. De modo específico, visamos descrever a ocorrência do falar sertanejo nas canções. Interessou-nos saber por meio de quais expressões se manifesta o regionalismo nas canções. A relevância da nossa pesquisa deve-se principalmente ao fato de sermos nordestinos e por isso, buscamos valorizar a nossa cultura e o nosso dialeto. 
Luiz Gonzaga, durante sua carreira de mais de 35 anos dedicado ao povo nordestino, conseguiu consagrar o famoso Forró Pé de Serra e deixou um grande legado para as futuras gerações. Gonzaga é oriundo do sertão nordestino, Pernambuco, e desde sua infância vivenciou as dificuldades enfrentadas no interior. Filho de Januário José dos Santos, um agricultor e também restaurador de sanfonas e outros instrumentos musicais, que lutou para sustentar a sua família e foi um influente colaborador para o sucesso de Gonzaga. As canções de Luiz Gonzaga difundiram-se amplamente e até hoje são respeitadas e admiradas, como fazendo parte da identidade cultural do povo nordestino. 
	A canção Asa Branca (1947) foi composta por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira e marca o auge do sucesso de Gonzaga. Essa música é considerada o “hino” nordestino, que se expandiu nas zonas rurais, depois nas zonas urbanas do Brasil e posteriormente para o cenário internacional. Asa Branca já foi cantada por diversas vozes – Lulu Santos, Fagner, Fábio de Melo –, mas nessa pesquisa pretendemos analisá-la de acordo com o jeito de falar empregado por Luiz Gonzaga, para assim evidenciarmos a variação linguística do dialeto nordestino.
	A Volta da Asa Branca (1950) surgiu como uma espécie de “resposta” à Asa Branca (em termos linguísticos, é perceptível a intertextualidade presente entre as duas canções) e foi composta com a parceria de Zé Dantas e Luiz Gonzaga. Assim como na canção Asa Branca, há também nesta uma forte presença do regionalismo, resultante da origem dos compositores. 
É notável que as canções difundidas por Luiz Gonzaga e abordadas na temática desse trabalho possuem diversos aspectos em comum, mesmo sendo de anos e compositores distintos. Uma característica presente nas composições é a expressividade, pois ao atentar-se às letras é perceptível o uso de um dialeto que possui uma identidade própria, e é por meio desse dialeto que os falantes mostram sua cultura, seus costumes e sua diversidade.
Cada país possui uma ou mais línguas oficiais que são consideradas como sendo o “padrão” a ser usado. No entanto, dentro de cada país existem regiões específicas que além de usarem a língua padrão também possuem seus dialetos, gírias e pronúncias. Podemos citar como exemplo de divergências na língua, o Nordeste. Bortoni-Ricardo (2004) observa marcas de sua regionalidade, como na pronúncia das vogais /e/ e /o/ mais abertas quando veem numa sílaba pretônica e por possuírem expressões como “tomar de conta”. Todo esse processo de formação e valorização da linguagem “culta” é resultado da junção de aspectos econômicos e históricos que estão enraizados em nossa cultura desde muito cedo.
	No panorama atual podemos citar alguns trabalhos que também tratam da variação linguística do Nordeste, como é o caso do que foi intitulado “A variação linguística retratada nas canções de Luiz Gonzaga” de Bezerra (2013). Importante enfatizar também que autores como Aragão (2013) já trabalham na vertente dos falares nordestinos, servindo de fundamentação teórica para esse artigo. É possível dizer que esta linha de pesquisa encontra-se em constante crescimento, incitando o conhecimento de novos pesquisadores, o que é positivo para a construção do saber já que a sociedade terá mais um paradigma quebrado. 
No trabalho de Silva (2014) acontece uma análise fonética das mesmas músicas contempladas no nosso trabalho, porém enveredando pelos caminhos da Estilística mais especificamente os conceitos ligados a Bally, que iam além dos parâmetros definidos por Saussure e observavam o envolvimento afetivo que existia nas expressões. Silva (2014) elaborou um artigo completo e suficiente para atender o objetivo proposto, no entanto pretendemos partir para o viés da variação linguística, baseando-se em pesquisas já iniciadas.
Diversos trabalhos já foram feitos sobre o nosso tema, nenhum deles, porém seguiu a nossa perspectiva, pois esperamos com esse estudo, observar e identificar as variações linguísticas de expressões nordestinas presentes nas canções de Luiz Gonzaga e mostrar como estas foram incorporadas pela sociedade, ganhando sucesso tão rapidamente. Pretendemos evidenciar de maneira sucinta a variação linguística retratada nas canções Asa Branca e A Volta da Asa Branca.
	Para a fundamentação teórica desse artigo serão úteis principalmente contribuições de autores como Coelho et al (2015), Bortoni-Ricardo (2004), Bagno (2000/2005) e Aragão (2013), dentre outros. Buscamos tratar mais detalhadamente de uma questão da Sociolinguística – a variação linguística – e usamos como exemplo as canções de Luiz Gonzaga,que são permeadas por expressões nordestinas.
Sociolinguística: variedade, variação, variável e variante
	A Sociolinguística, subárea da ciência Linguística, desempenha o papel de estudar a relação entre a sociedade e a língua. Apesar de ser um ramo novo, vem se expandindo no Brasil e motivando várias pesquisas científicas. Ao fazermos uma linearidade histórica, percebemos que desde a língua-mãe – o latim – até hoje, passamos por mudanças transformadoras. Coelho et al (2015) expõe estudos da Sociolinguística e descreve conceitos introdutórios essenciais para o entendimento da área, por isso utilizaremos como fundamentação dessa pesquisa. 
	Variedade linguística pode ser definida basicamente como as formas diversas de manifestação da fala em determinada língua. Essas diferentes maneiras de falar podem ser influenciadas por fatores sociais, culturais, históricos e regionais. Existem múltiplas classificações do termo, dentre as quais podemos destacar: o dialeto (a forma como determinada comunidade usa a língua), o socioleto (advém das experiências socioculturais de determinado grupo de falantes) e o idioleto (maneira que cada indivíduo se expressa por meio da fala). 
	Segundo Bortoni-Ricardo (2004) existe mais prestígio nos dialetos de uma comunidade que possui maior poder político e econômico, e por isso é vista como a mais bonita, correta e culta, enquanto as comunidades mais pobres são inferiorizadas e possuem seus dialetos vistos como “ruins”. Bezerra (2013) analisa essa situação atentando para o papel que a mídia possui sobre a construção desses tabus, já que na maioria das vezes apresenta personagens do interior como iletrados. Nas canções Asa Branca e A Volta da Asa Branca predomina o dialeto de caráter nordestino, e é notável a variação linguística. 
A variação linguística é o processo pelo qual duas formas podem ocorrer no mesmo contexto com o mesmo valor referencial/representacional, isto é, com o mesmo significado. Para um sociolinguista, o fato de em uma comunidade, ou mesmo na fala de um único indivíduo, conviverem tanto a forma ‘tu’ quanto a forma ‘você’ não pode ser considerado marginal, acidental ou irrelevante em termos de pesquisa e de avanço de conhecimento. A variação é inerente às línguas, e não compromete o bom funcionamento do sistema linguístico nem a possibilidade de comunicação entre os falantes – o que podemos perceber quando observamos que as pessoas à nossa volta falam de maneiras diferentes, mas sempre se entendendo perfeitamente (COELHO et al, 2015, p. 16).
	Vale ressaltar que existem vários tipos de variações linguísticas: situacionais ou diafásicas, geográficas ou diatópicas, sociais ou diastráticas e diacrônicas. Situacionais ou diafásicas são aquela no qual a ocasião é que determina a maneira como se dirigir ao interlocutor (formal ou informal), como por exemplo, a linguagem utilizada em uma entrevista de emprego e em uma conversa com um grupo de amigos. Geográficas ou diatópicas são as variações que ocorrem devido às diferenças de regiões, ou seja, uma mesma palavra que apresenta definições diferentes, mas o significado permanece o mesmo. E sociais ou diastráticas são as que se referem aos grupos sociais, seja a linguagem empregada por médicos, advogados, surfistas, metaleiros e etc. 
	Para Coelho et al (2015) faz-se necessário estabelecer uma distinção entre variante e variável. Na visão geral, podemos definir variante como aquilo que é alvo de mudança e variável como sendo a representação linguística que denota variantes provenientes da observação. A fim de facilitar a compreensão desses dois termos da Sociolinguística, vejamos o exemplo de Coelho et al:
Pensemos na palavra ʻpeixeʼ. Temos duas pronúncias possíveis para essa palavra: peixe e pexe. Note-se que, independentemente da pronúncia, o significado referencial/representacional da palavra se mantém: tanto peixe quanto pexe se referem a um animal vertebrado, aquático, que respira por brânquias. Logo, nesse exemplo, estamos diante de duas variantes de uma variável: o ditongo [ey] e a vogal [e]. Elas são intercambiáveis, ou seja, podem ser trocadas uma pela outra, sem prejuízo da manutenção do significado referencial/representacional. Se pensarmos no ditongo [ey] na palavra ʻpeitoʼ, será que temos o mesmo caso? Vejamos. Se pronunciarmos [e] no lugar de [ey], teremos a palavra ʻpetoʼ, que não tem o mesmo significado de ʻpeitoʼ. ʻPetoʼ, de acordo com o dicionário Houaiss, tem quatro acepções e nenhuma delas coincide com o significado de ʻpeitoʼ, que é uma parte do corpo. Nesse caso, portanto, o ditongo [ey] e a vogal [e] não são variantes de uma mesma variável, pois se trocarmos uma pronúncia pela outra não manteremos o mesmo significado referencial/representacional (2015, p. 18).
	Em síntese, esses quatros conceitos – variedade, variação, variável e variante – são de suma importância para a análise das canções de Luiz Gonzaga, pois entendendo-os é possível estabelecer as bases de análise para o estudo linguístico das canções e assim, mostrar a variação linguística que está presente. 
Homogeneidade e heterogeneidade da língua
	Existe a crença em nossa sociedade de que a língua é homogênea e estática, não permitindo mudanças ou a aceitação das diversidades que fogem do “padrão” já imposto nos livros, gramáticas, meios de comunicação e outros. Segundo Bagno e Rangel (2005), dentro dessa crença, a “língua” é uma entidade homogênea e monolítica, que precisa ser “protegida” do mau uso e do abuso que o indivíduo pode vir a fazer contra ela, sendo a variação vista apenas como um erro. Apesar dos estudos linguísticos terem avançado durante os últimos anos, com a Sociolinguística pronta para refutar essa definição de homogeneidade, essa crença ainda está enraizada na cultura brasileira, tratando a linguagem como dicotômica entre o “correto” e o “incorreto”. 
Para agravar esse quadro, esse modelo idealizado de “língua certa” recebe, da parte de seus defensores e dos não especialistas, a designação de “norma culta”. Ora, essa mesma expressão é empregada, em muitos trabalhos científicos, para designar o conjunto de regularidades gramaticais detectáveis no uso efetivo da língua por parte dos “falantes cultos” – cidadãos urbanos com escolaridade superior completa – em suas interações sociais (BAGNO e RANGEL, 2005, p. 72).
	É possível entender, então, que a língua está longe de ser imutável, pois está em constante variação, o que é natural, pois o ser humano passa por modificações com o passar do tempo. Bagno e Rangel (2005) ressaltam que essa mudança não deve ser vista como melhor nem pior, mas apenas como uma mudança para a adequação do sistema linguístico às interações sociais, sendo que estas se alteram ao longo dos anos. Portanto, a língua é heterogênea e variável, sendo essa característica mais acentuada em regiões distantes das metrópoles. Bortoni-Ricardo (2004) acredita que a principal causa é que nesses polos industriais a imprensa, os escritores e as escolas cumprem o papel de monitoradores, baseando-se, principalmente, nos livros de gramática normativa para exercer o domínio sobre a fala e a escrita.
	Um meio de validar a heterogeneidade da língua é observando não apenas os diversos dialetos, mas também os gêneros textuais que possuem sua própria estrutura e diferenciam-se uns dos outros. Bagno (2000) nos mostra que em um mesmo jornal pode acontecer de estarem diversos gêneros em sua composição, como charges, manchetes, cartas ao leitor e etc. 
	Portanto, negar que a língua é múltipla/rica em seus dialetos, pronúncias e gírias é o mesmo que cortar os galhos de uma árvore gigantesca cheia de frutos. Aragão (2013) nos diz que a língua é constituída por partes heterogêneas que juntas formam um todo homogêneo, não sendo possível ocultá-las. Assim, a partir de novos estudos dialetológicos e sociolinguísticos sobre essas variações de níveis regionais e sociais pode-se ter um alcance maior no conhecimento das línguas. 
Uma política de educação lingüística (sic) coerente com os avanços teóricos das ciênciasda linguagem tem de se valer de tudo o que já se sabe acerca dos fenômenos de variação no português brasileiro em sua relação com os fenômenos de mudança lingüística (sic). Espera-se, pois, uma educação lingüística (sic) que ofereça estratégias para um tratamento da variação lingüística (sic) que não se limite a fenômenos de prosódia (“sotaque”) ou de léxico (“aipim”, “mandioca”, “macaxeira”), mas que evidencie o fato de que a língua apresenta variação em todos os seus níveis, e que essa variação da língua está indissoluvelmente associada à variação social (BAGNO e RANGEL, 2005, p. 73). 
Muitas vezes as canções causam estranhamento, pois alguns ouvintes não possuem familiaridade com os dialetos da região nordestina. A grande maioria da população brasileira não tem acesso à informação sobre a heterogeneidade da língua e para fugir de um “erro” gramatical, acabam se aprofundando em outro, que possui resultados ofensivos, como é o caso da exclusão e falta aceitação da diversidade linguística. 
Variações fonético-fonológicas
	A princípio, faz-se importante citar Sá e Sobreira (2014) que enfatizam que “variações fonético-fonológicas são variações relacionadas a pronúncia de determinados fonemas da língua. Essa variação pode ser explicada pelo fator da miscigenação da população desde os tempos do Brasil colônia.”
	Além do aspecto fonético-fonológico existem as variações lexicais, morfológicas e sintáticas. Porém, nesse artigo pretendemos analisar as canções Asa Branca e A Volta da Asa Branca através de alguns fenômenos fonético-fonológicos, que explicaremos a seguir, para assim chegarmos aos resultados que almejamos. Mas também teremos uma pequena evidência para as variações lexicais, que são as mudanças que a língua sofre dependendo do contexto geográfico. De forma sintetizada, variações lexicais são as diferentes maneiras que cada região adota para denominar um mesmo objeto, como por exemplo: dindin, sacolé, gelinho, chope ou chup-chup. Todas as definições se referem a uma sobremesa que se assemelha a um picolé e é preparado dentro de sacos plásticos. 
	O processo de iotização acontece quando os fonemas /l/ (consoante oral, sonora, lateral, dorso-palatal) e /h/ (consoante vibrante, sonora, nasal, dorso-velar) perdem suas características na palavra e são substituídos por uma vogal ou uma semivogal semelhante, como por exemplo: olhei se torna “oiei”, filho se torna “fio” e assim por diante. Trazendo para o contexto nordestino, isso pode marcar uma variação diatópica. 
	A apócope pode ser entendida como um fenômeno que acontece quando um fonema no final da palavra é suprimido. No Brasil, é possível observar esse evento em palavras que possuem o fonema /r/ no final de sua composição, por exemplo, em verbos que, geralmente, estão no infinitivo, como cantar que passa a ser “cantá”, vender que se torna “vende”, além de outras palavras presentes no vocabulário brasileiro. 
	A prótese é um fenômeno que acontece constantemente na língua e nas variações do português brasileiro, principalmente em dialetos regionais e consiste num acréscimo de um fonema no início da palavra. Uma de suas formas mais comuns é a presença de um a-protético, como em: voar > avoar, lembrar > alembrar. 
	Rotacismo é o fenômeno que acontece na língua portuguesa, em alguns dialetos, em que há a troca do /l/ pelo /r/. Esse fenômeno aconteceu nas primeiras mudanças do latim, como por exemplo, na palavra “blanco” que tornou-se branco. Percebe-se que a língua portuguesa adere melhor os sons róticos, ao invés de outras, como o /l/, e isso se deve ao fato de que a maioria das palavras usadas possuem seu encontro consonantal com /r/. É possível que esse fenômeno aconteça em final de sílaba, como por exemplo, calma que pode vir a ser “carma”, ou em encontros consonantais, em que a palavra flores é falada “frores”. 
	Os processos fonológicos por transposição estão inseridos na categoria de processos fonológicos segmentais, que são alterações nos fones ou fonemas. Sendo assim, o processo por transposição acontece quando um segmento muda de posição na mesma palavra. E isso pode ocorrer de três maneiras: a transposição de vogais, consoantes ou de elementos suprassegmentais. Para exemplificar a primeira categoria indicada, temos as palavras “caderneta” e “dentro” que após sofrerem o fenômenos de transposição tornam-se “cardeneta” e “drento”. A partir desses conceitos, faremos nossa análise das canções de Gonzaga.
Análise e resultados
	No ano de lançamento das canções, 1947 e 1950, o Nordeste passava por um momento difícil e que já faz parte da nossa história: a seca. Talvez, esse seja o principal motivo que fez com que os sertanejos adotassem as músicas de Gonzaga como um “hino”, pois retratavam o sofrimento do povo da maneira mais real possível. O contexto histórico é de suma importância para esta pesquisa, mas optamos por dar ênfase à questão da variação linguística. Nosso trabalho teve caráter qualitativo.
	O corpus abordado pela pesquisa consiste em abordar apenas duas músicas do imenso material de Luiz Gonzaga: Asa Branca e A Volta da Asa Branca. Almejamos mostrar que cada região/pessoa possui um linguajar único e que isso constitui sua identidade cultural.
	Para realizar essa pesquisa tivemos que ouvir atenciosamente as canções por meio de LPs e CDs, com o intuito de obter a letra original e fiel à composição, já que o teor das músicas consiste no nosso objeto de estudo principal. Através da escuta é possível identificar as expressões nordestinas presentes em Asa Branca e A Volta da Asa Branca para assim estabelecermos uma comparação, discussão e análise à luz de teorias linguísticas.
	Optamos por não transcrever as canções na sua totalidade, mas sim as partes mais importantes. Abaixo as músicas nas suas formas originais, seguidas pela a análise através dos conceitos fonético-fonológicos. 
Asa Branca 
Luiz Gonzaga 
Composição: Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira 
V1 Quando oiei [iotização] a terra ardendo 
V2 Quá [apócope] fogueira de São João 
V3 Eu preguntei [transposição] a Deus do céu, uai
V4 Por que tamanha judiação. 
V5 Que braseiro, que fornaia [iotização],
V6 Nem um pé de prantação [rotacismo] 
V7 Por farta [rotacismo] d'água perdi meu gado 
V8 Morreu de sede meu alazão. 
V9 Inté [variação lexical] mesmo a asa branca 
V10 Bateu asas do sertão 
V11 Intonce [variação lexical] eu disse adeus Rosinha
V12 Guarda contigo meu coração. 
V13 Hoje longe muitas légua
V14 Numa triste solidão
V15 Espero a chuva cair de novo 
V16 Pra eu vortá [rotacismo/apócope] pro meu sertão. 
V17 Quando o verde dos teus oio [iotização]
V18 Se espaiá [iotização/apócope] na prantação [rotacismo] 
V19 Eu te asseguro não chore não, viu 
V20 Que eu vortarei [rotacismo], viu
V21 Meu coração. 
A Volta da Asa Branca
Luiz Gonzaga
Composição: Luiz Gonzaga/Zé Dantas
V1 Já faz três noites
V2 Que pro norte relampeja 
V3 A asa branca 
V4 Ouvindo o ronco do trovão.
 
V5 Já bateu asas 
V6 E vortou [rotacismo] pro meu sertão 
V7 Ai, ai eu vou me embora 
V8 Vou cuidar da prantação [rotacismo]. 
V9 A seca fez eu desertar da minha terra 
V10 Mas felizmente Deus agora se alembrou [prótese] 
V11 De mandar chuva 
V12 Pr'esse sertão sofredor 
V13 Sertão das muié [iotização] séria 
V14 Dos homes trabaiador [iotização].
 
[...]
V15 Sentindo a chuva 
V16 Eu me arrescordo [prótese] de Rosinha 
V17 A linda flor 
V18 Do meu sertão pernambucano 
V19 E se a safra 
V20 Não atrapaiá [iotização/apócope] meus pranos [rotacismo]
V21 Que que há, o seu vigário 
V22 Vou casar no fim do ano.
	Em Asa Branca percebemos a presença da iotização em “oiei”, “fornaia”, “oio” e “espaiá” (versos 1, 5, 17 e 18). Notamos que o fonema /lh/ vocalizou-se em /i/, o que geralmente é comum acontecer na linguagem rural. Vale ressaltar que na palavra “espaiá” também pode ocorrer o fenômeno apócope, já que há uma supressão no final do termo. Do mesmo modo é com o “quá” (verso 2) e “vortá” (verso 16), no qual respectivamente, são suprimidoso fonema /l/ e /r/. Ainda analisando o “vortá” (verso 16), percebemos que assim como em “prantação”, “farta” e “vortarei” (versos 6/18, 7 e 20) estes podem ser analisados através do fenômeno denotado rotacismo, em que o /l/ é alterado para /r/. No verso 3, “preguntei” caracteriza-se como um processo fonológico por transposição, evidenciando uma variação não-padrão. E por fim, “inté (verso 9) e “intoce” (verso 11) são variações lexicais, pois são falados de maneiras diferentes dependendo da região, mas sempre com o mesmo significado. 
	Em A Volta da Asa Branca a iotização acontece em “muié”, “trabaiador” e “atrapaiá” (versos 13, 14 e 20), seguindo o mesmo raciocínio da Asa Branca. Em “atrapaiá” também pode ocorrer o fenômeno apócope. “Vortou”, “prantação” e “pranos” (versos 6, 8 e 20) evidenciam o rotacismo. E por fim, aparece nessa canção o fenômeno denominado prótese, percebido nas palavras “alembrou” (verso 10) e “arrescordo” (verso 16) marcado nitidamente pela presença de um a-protético. 
	É perceptível que os fenômenos fonético-fonológicos analisados estão presentes de forma explícita nas duas canções, caracterizando uma variação diatópica, que remete ao jeito de falar nordestino. Destacar as palavras que possuem tais fenômenos nas canções facilita a compreensão de variação, variedade, variante e variável, que nesse caso são influenciadas por um fator regional. 
Considerações finais 
	As canções usadas nesse artigo se enquadram na variação linguística geográfica ou diatópica, pois marca a diferença na linguagem dos habitantes do Nordeste em comparação as outras regiões do Brasil. Esse tipo de variação ocorre até dentro da mesma região, como por exemplo, na diferença da fala existente entre pessoas da capital e do interior.
A variação linguística é uma realidade da linguagem humana e objeto de estudo de muitos teóricos renomados que refletem sobre os aspectos da heterogeneidade da língua. Esses estudos são de alta relevância, especialmente no Brasil, que apresenta uma realidade sócio-cultural (sic) diversificada e uma gênese marcada por heranças linguísticas de culturas diversas (BEZERRA, 2013, p.4).
		Através das análises das canções e baseado nas afirmações de Bezerra (2013) chegamos à conclusão de que há uma variação diatópica ou geográfica, que descreve a ocorrência do falar sertanejo em Asa Branca e A Volta da Asa Branca. Ao realizar a descrição fonético-fonológica fica explícita a evidência de expressões nordestinas nas canções, marcadas por variações linguísticas. 
REFERÊNCIAS
BEZERRA, S. M. F. A variação linguística retratada nas canções de Luiz Gonzaga. 2013. 19f. Artigo (Graduação em Letras) – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal da Paraíba, Campina Grande – PB, 2013.
BAGNO, M. Dramática da língua portuguesa: tradição gramatical, mídia e exclusão social. São Paulo: Loyola, 2000. 327 p.
BAGNO, M.; RANGEL, E. Tarefas da educação linguística no Brasil. RBLA – Revista Brasileira de Linguística Aplicada, Belo Horizonte, v. 5, n. 1, p. 63-81, jan.-jun. 2005.
BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em Língua Materna: a Sociolinguística em sala de aula. São Paulo: Parábola, 2004. 108 p. 
COELHO, I. L., et al. Para conhecer sociolinguística. São Paulo: Contexto, 2015. 176 p.
SÁ, M. S.; SOBREIRA, M. F. M. O falar sertanejo presente na música nordestina. Revista Philologus, Rio de Janeiro, ano 20, p. 1772-1781, set.-dez. 2014. 
SILVA, D. S. A estilística do nordestino: a representação do falar do sertanejo na canção “A volta da asa branca”, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. Miguilim – Revista Eletrônica do Netlli, Crato, v. 3, n. 1, p. 04-14, jan.-abr. 2014.

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