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Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 1 1 Introdução A Engenharia de Perfuração é a área da Engenharia de Petróleo que cuida da cons- trução de poços de petróleo. Ela abrange todas as atividades necessárias para a construção de um poço até o momento de entregá-lo à equipe de Produção. Tais atividades envolvem grandes investimentos financeiros que são efetuados princi- palmente pelas companhias Operadoras1. No passado, pequenas companhias inde- pendentes focavam seus investimentos em poços terrestres (onshore) por apresen- tarem custos mais baixos relativos às atividades de exploração, perfuração e pro- dução, enquanto que as grandes companhias Operadoras focavam tanto poços ter- restres quanto poços marítimos (offshore), estes últimos com elevados índices de investimentos associados. Hoje em dia os custos das atividades de perfuração e produção tornaram-se tão grandes que, em algumas áreas (como as do pré-sal), grandes empresas formam consórcios para dividirem os custos, os lucros e os ris- cos associados com tais atividades. Neste caso, a companhia com a maior propor- ção no consórcio, normalmente. (há casos em que uma empresa com menor parce- la pode ser declarada Operadora) é dita como sendo a Operadora daquela área, en- quanto que as demais são ditas solidárias. Muitas habilidades especializadas são necessárias para se perfurar um poço com segurança. Da mesma forma que em indústrias mais complexas (como a automobi- lística), muitas empresas evoluíram para prestar serviços especializados. Grupos especializados dentro das próprias companhias também evoluíram neste sentido. O pessoal da engenharia de poços é um destes grupos. O papel do engenheiro de poço é não apenas, perfurar o poço, mas também garan- tir que os objetivos do poço sejam atingidos que é a coleta de dados (cascalhos, perfis a cabo, testemunhagem, etc) para um poço exploratório e acompanhar os testes do poço que verificam a viabilidade da produção. O trabalho deste engenhei- ro é baseado em observações de outros poços de correlações na mesma área e em experiência prévia, pois não há como saber precisamente que tipo de formação e seu regime de pressão se irá perfurar. Durante a perfuração, podem-se inferir in- formações sobre a formação com base em dados como taxa de penetração da broca 1 Empresa constituída sob as leis de determinado país com a qual se celebram contratos de concessão ou parti- lha de produção para a exploração e produção de petróleo ou gás natural. É a companhia detentora dos direi- tos de propriedade ou arrendadora que gerencia as operações, como exploração, perfuração e produção de óleo ou gás (Fonte: FERNANDEZ Y FERNANDEZ, E.; PEDROSA JR., O.A. E PINHO, A.C. Dicionário do Petróleo em Língua Portuguesa: Exploração e Produção de Petróleo e Gás – Uma Colaboração Brasil, Portugal e Angola. Lexicon, 1ª. Edição, 2009.). Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 2 e o tipo de cascalho que chega à superfície, além de dados de LWD2. Sensores de LWD colocados acima da broca podem fornecer melhores informações e mais rá- pidas do que os cascalhos, que levam certo tempo pra atingir a superfície. Um poço numa nova área é dito poço exploratório pioneiro e este se torna um poço descobridor se encontrar formações com indícios de hidrocarbonetos. Poços ex- ploratórios adjacentes têm por objetivo aumentar o conhecimento do poço pionei- ro com indícios de hidrocarbonetos descobertos (principalmente o volume e, por- tanto, se será economicamente viável o desenvolvimento da nova descoberta). Por outro lado, o objetivo de poços produtores é o de desenvolver um campo já desco- berto. Geralmente, a equipe de geólogos e geofísicos recomenda a posição dos po- ços exploratórios (pioneiros, pioneiros adjacentes, de extensão) enquanto que o pessoal da Engenharia de Reservatórios recomenda a posição dos poços de desen- volvimento para melhor drenar o reservatório de um campo. O pessoal da Enge- nharia de Poços realiza o projeto preliminar e a estimativa de custos da perfuração do poço proposto. Geralmente, a perfuração é feita por uma companhia contratada (ou “Drilling Contractor”3). Quando é tomada a decisão de perfurar um poço, o pes- soal da Engenharia de Poços prepara um projeto mais detalhado, chamado de Pro- grama de Poço, com todas as especificações necessárias. Após o início das operações, os recursos humanos, equipamentos e materiais para perfurar o poço são fornecidos por: 1) a companhia Operadora do campo de petró- leo, 2) a companhia contratada para perfurar o poço (Drilling Contractor) e 3) as várias companhias de serviços especializados. De acordo com a Lei 9.478, de 6 de agosto de 1997, todas as operações são de responsabilidade da Operadora do cam- po, que é fiscalizada por autoridades regulatórias locais (neste caso a ANP). Neste sentido, o Art. 44 da referida Lei, que trata do Contrato de Concessão estabelece que: Art. 44. O contrato estabelecerá que o concessionário estará obrigado a: I - adotar, em todas as suas operações, as medidas necessárias para a conservação dos reservatórios e de outros recursos naturais, para a segurança das pessoas e dos equipa- mentos e para a proteção do meio ambiente; II - comunicar à ANP, imediatamente, a descoberta de qualquer jazida de petróleo, gás natural ou outros hidrocarbonetos ou de outros minerais; 2 LWD – Logging While Drilling (perfilagem durante a perfuração ou perfilagem contínua): medição das pro- priedades da formação durante a perfuração, ou logo após, por meio de ferramentas integradas no conjunto de fundo de poço. Tem a vantagem de medir as propriedades da formação antes da invasão profunda de fluido de perfuração (FERNANDEZ Y FERNANDEZ et al., 2009). 3 Empresa que é proprietária e opera as plataformas (ou sondas) de perfuração. O Drilling Contractor cobra, geralmente, uma taxa diária pelo uso do seu equipamento (sonda) e recursos humanos (pessoal), acrescidos de despesas extraordinárias. Desta forma, o custo do poço é uma função primária do tempo que se leva para perfurar e completar um poço (Fernández y Fernándes et al., 2009). Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 3 III - realizar a avaliação da descoberta nos termos do programa submetido à ANP, apre- sentando relatório de comercialidade e declarando seu interesse no desenvolvimento do campo; IV - submeter à ANP o plano de desenvolvimento de campo declarado comercial, conten- do o cronograma e a estimativa de investimento; V - responsabilizar-se civilmente pelos atos de seus prepostos e indenizar todos e quais- quer danos decorrentes das atividades de exploração, desenvolvimento e produção con- tratadas, devendo ressarcir à ANP ou à União os ônus que venham a suportar em conse- quência de eventuais demandas motivadas por atos de responsabilidade do concessioná- rio; VI - adotar as melhores práticas da indústria internacional do petróleo e obedecer às normas e procedimentos técnicos e científicos pertinentes, inclusive quanto às técnicas apropriadas de recuperação, objetivando a racionalização da produção e o controle do declínio das reservas. A Figura 1.1 mostra uma organização típica das operações de perfuração de poços. Os engenheiros de perfuração recomendam os procedimentos de perfuração a se- rem adotados para se perfurar o poço de forma segura e econômica. Porém, em muitos casos é necessário alterar o projeto original devido a circunstâncias não previstas durante a fase de projeto, uma vez que se está lidando com a natureza. Estas modificações são também de responsabilidade do engenheirode perfuração. O representante da Operadora chamado de Fiscal Embarcado (ou Company Man), utilizando o programa do poço, toma as decisões “on site” no que diz respeito à condução das operações e serviços necessários, sempre com apoio do pessoal em terra da Operadora. A operação da sonda e a supervisão dos trabalhadores é função do Superintendente da Plataforma (ou OIM – Offshore Installation Ma- nager) da companhia de perfuração ajudado pelo Encarregado de Sonda (ou Tool Pusher) s Sondadores, nesta ordem hierárquica. A Tabela 1.1, mostrada a seguir descreve as atividades, funções e responsabilida- des dos agentes envolvidos no desenvolvimento do programa do poço e na execu- ção das operações de perfuração do poço para o devido cumprimento deste pro- grama. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 4 Figura 1.1. Organização típica das operações de perfuração de poços. Tabela 1.1. Atividades e funções que cada empresa executa no contexto das operações de perfuração de poços. Atividades/funções Companhia Operadora do campo Companhia de serviços Companhia contratada para perfuração Observações: Efetuar e coordenar os estudos geoló- gicos do campo a ser explorado X Os dados geológicos são os dados mais valiosos que as Operadoras possuem, pois eles influenciam diretamente no sucesso da campanha exploratória, além de definir o volume das reservas de hidrocarbonetos. Em geral, estes dados são tratados como “segredo de estado” pelas Operadoras. Efetuar e desenvolver o projeto do poço de petróleo X X O projeto do poço é efetuado com base nos dados geológicos e dados de poços de correlação operados pela compa- nhia. Especificar técnicas e procedimentos de perfuração X X As técnicas e procedimentos devem refletir as melhores práticas da indús- tria. Companhia de óleo (operadora) Companhia contratada (Drilling contractor) Engenharia de poços Técnico de perfuração Sonda 2 Sonda 1 Sondador (driller) Plataformista (tool pusher ou roughneck) Equipe de área (rig crew) Torrista (derrick man) Projeto do poços Engenheiro fiscal Geologia Engenharia de Produção Engenharia de Reservatórios Gerência de manutenção Superintendência de perfuração Superintendência de perfuração Companhias de serviços Fluidos Monitoração do poço Perfuração direcional Brocas Consultores Cimentação Avaliação da formação Equipamentos de poço Controle de poço Outros serviços Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 5 Atividades/funções Companhia Operadora do campo Companhia de serviços Companhia contratada para perfuração Observações: Contratar ferramentas para perfura- ção (tubos em geral, revestimentos, brocas, etc.), serviços de perfuração (direcional, cimentação, perfilagem, etc.) e sondas de perfuração. X As ferramentas, serviços e sondas são contratados pela Operadora através de contratos de serviços celebrados com as companhias de serviços e drilling con- tractors. Fornecer as ferramentas utilizadas para as operações de perfuração. X X Todos os insumos para perfurar o poço são especificados pela Operadora do campo no projeto do poço. Tubos, como tubos de perfuração, co- mandos, estabilizadores e outros simi- lares fazem parte do equipamento da sonda, enquanto que equipamentos de perfuração direcional, motores de fun- do, e simulares são fornecidos pelas companhias de serviços. Fornecer os serviços de perfuração de poços especificados pela Operadora no projeto do poço X X Todos os serviços para perfurar o poço são especificados pela Operadora do campo no projeto do poço. Enquanto que serviços de manuseio de tubos e operação da sonda são forneci- dos pelo Drilling Contractor, serviços de cimentação e perfilagem (entre outros) são fornecidos pelas companhias de serviço. Fornecer os meios para perfurar o poço (sonda de perfuração) de acordo com o projeto do poço e técnicas de perfuração especificados pela Opera- dora do campo. X As sondas são especificadas, principal- mente, por sua capacidade de operar em uma determinada lâmina d’água, profundidade máxima a ser alcançada pelo poço e capacidade de pressão do BOP. Fornecer a tripulação da sonda para as operações de manobras de tubos da coluna de perfuração, de revestimen- tos e de riser, e brocas. X A operação da sonda e a supervisão dos trabalhadores é função do encarregado da sonda ou tool pusher e, às vezes, do OIM (Offshore Installation Manager) da companhia de serviços de perfuração. Executar as operações de perfuração de acordo com o projeto de poço e técnicas de perfuração especificados pela Operadora do campo. X X Enquanto que o sondador (Drilling Contractor) é responsável por operar a torre de perfuração e colunas de tubos dentro da torre, representantes das companhias de serviços são responsá- veis pela operação de suas ferramentas (e.g.: ferramentas de perfuração direci- onal). Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 6 Atividades/funções Companhia Operadora do campo Companhia de serviços Companhia contratada para perfuração Observações: Supervisionar as operações de perfu- ração e respectivos serviços, verifi- cando se os mesmos estão de acordo com o projeto de poço e técnicas de perfuração especificados pela Opera- dora do campo. X Esta função é efetuada pelo Fiscal Em- barcado da sonda, empregado regular da Operadora do campo. Há sempre um Fiscal Embarcado da sonda a bordo das unidades de perfuração. Efetuar a análise dos dados adquiri- dos pelas ferramentas de perfuração (MWD4, LWD5, PWD6, etc.) X X Os dados coletados pelas ferramentas de perfuração são de propriedade das empresas Operadoras e, juntamente com os dados geológicos, são de suma importância para caracterizar correta- mente uma formação. Assentar os revestimentos previstos no projeto do poço X O manuseio de elementos tubulares dentro da torre de perfuração é de responsabilidade do Drilling Contractor. Efetuar os serviços de cimentação dos revestimentos assentados, X X Após descer a coluna de revestimento dentro do poço, é necessário cimentar esta coluna junto à parede do poço. Esta operação é efetuada por pessoal especi- alizado das companhias de serviço. Algumas Operadoras possuem pessoal especializado nesta operação e que, eventualmente, participam das opera- ções. Testar a qualidade das operações de cimentação. X X Após a secagem do cimento, é de res- ponsabilidade da companhia que efetu- ou o serviço de cimentação testar a qualidade desta operação. Algumas Operadoras possuem pessoal especializado nesta operação e que, eventualmente, participam das opera- ções. 4 MWD – Measure While Drilling (medição durante a perfuração): medição realizada por intermédio de ferra- mentas usadas na perfuração, para transmitir para a superfície em tempo real, informações dos sensores loca- lizados perto da broca. Este tipo de dado permite o controle da trajetória direcional em tempo real. 5 LWD – Logging While Drilling (perfilagem durante a perfuração ou perfilagem contínua): medição das pro- priedades da formação durante a perfuração do poço, ou logo após, por meio de ferramentas integradasno conjunto de fundo de poço. Tem a vantagem de medir as propriedades da formação antes da invasão profunda de fluido de perfuração. 6 PWD – Pressure While Drilling (medição da pressão de fundo de poço durante a perfuração): ferramenta que permite o acompanhamento em tempo real da pressão no fundo do poço. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 7 Atividades/funções Companhia Operadora do campo Companhia de serviços Companhia contratada para perfuração Observações: Supervisionar as operações e aprovar o resultado dos testes de qualidade da cimentação. X Esta função é efetuada pelo Fiscal Em- barcado da sonda. Há sempre um Fiscal Embarcado a bordo das unidades de perfuração. Modificar os procedimentos de perfu- ração e/ou o projeto do poço devido a circunstâncias não previstas. X De acordo com a ANP, a Operadora de campos de petróleo é a única responsável por efetuar e desenvolver o projeto do poço. As demais companhias podem suge- rir alterações no projeto e nos procedi- mentos se as operações originais apresen- tarem riscos aos seus equipamentos. Estas alterações devem ser analisadas e aprova- das pela Operadora, através do Fiscal Embarcado. Fornecer o BOP7 X Cada sonda de perfuração já é equipada com um BOP que deve ser adequado à realização do projeto do poço. Detectar kicks (fluxo indesejável de fluidos da formação para dentro do poço durante as operações de perfu- ração) X X A cabine do sondador concentra a maioria dos painéis de controle e instrumentos utilizados para monitorar as condições normais de perfuração e de controle de poço. Serviços de mud logging8 auxiliam na monitoração das condições do poço. Qualquer situação anormal deve ser co- municada ao Fiscal Embarcado. Determinar o fechamento do BOP em caso de confirmação de kick. X X O projeto do poço deve prever as opera- ções e métodos de controle de poço, na eventualidade de um kick. No caso de confirmações de um kick por parte do drilling contractor, o Fiscal Embarcado deve ser imediatamente avisado. Caso o drilling contractor identifique operações que apresentem riscos reais para o seu pessoal e equipamento, ou caso o Fiscal Embarcado não esteja presente, este pode determinar o fechamento do BOP, toman- do para si a responsabilidade desta opera- ção. 7 BOP: Blowout Preventer ou Preventor de erupção – conjunto de válvulas de segurança instaladas na cabeça do poço para evitar a ocorrência de uma erupção (blowout) na superfície. 8 Método para determinar a presença ou ausência de óleo ou gás em várias formações penetradas pela broca. O fluido de perfuração e os cascalhos são continuamente testados no seu retorno para a superfície, e o resultado desse teste é correlacionado com a profundidade ou origem. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 8 Atividades/funções Companhia Operadora do campo Companhia de serviços Companhia contratada para perfuração Observações: Determinar o método de controle de poço (e.g.: método do sondador, mé- todo do engenheiro, bullheading ou qualquer outro método especializa- do). X O projeto do poço deve prever as opera- ções e métodos de controle de poço, na eventualidade de um kick. Estes métodos e operações são compatíveis com a resis- tência mecânica e hidráulica das forma- ções atravessadas pela trajetória do poço. Realizar as operações de controle do poço em segurança respeitando os limites de pressão impostos pelo projeto do poço utilizando o método do sondador, método do engenheiro, bullheading ou qualquer outro método especializado. X X As operações de circulação do kick são efetuadas pela prestadora de serviços de sondagem, mais especificamente, pelo sondador, sob supervisão atenta do En- carregado da Sonda e do Fiscal Embar- cado. Estas operações podem ser efetua- das com sucesso e segurança utilizando a lama disponível a bordo da sonda. Fluido de perfuração é bombeado para o fundo do poço por dentro da coluna de perfura- ção. A pressão no fundo do poço é manti- da constante e maior que a pressão da formação através do controle da válvula de choque9 na linha de saída do circuito de circulação de fluidos (linha de choque do BOP). Executar operações de controle de Blowout na eventualidade da total perda de controle do poço. X X X As operações de controle de blowout são efetuadas em parceria pela própria Ope- radora (que detém o conhecimento do local), por empresas e pessoal especiali- zados (que possuem equipamentos e técnicas específicas para cada caso), e pelo Drilling Contractor, que detém as sondas a serem utilizadas nas operações. Supervisionar toda e qualquer opera- ção de controle de poço e/ou de blo- wout. X A Operadora é sempre responsável por toda e qualquer operação executada a bordo da unidade de perfuração. De forma mais ampla, o processo de perfuração é precedido pela prospecção sís- mica da área a ser perfurada, aliado ao fato de que a ocorrência de hidrocarbone- tos no subsolo está associada à existência de bacias sedimentares e à ocorrência de um sistema petrolífero. Uma bacia sedimentar é uma região que sofre lento abatimento (ou subsidência), gerando uma depressão que é preenchida por sedimentos. Esses sedimentos po- 9 Válvula utilizada nas operações de controle de poço e que restringe a passagem do fluido de perfuração. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 9 dem ser formados por materiais de três tipos principais: fragmentos originados pela erosão das áreas elevadas e transportados para a bacia por rios, geleiras ou ventos; materiais precipitados em corpos d'água dentro da bacia, anteriormente transportados como íons em solução; e estruturas que fizeram parte de corpos de animais ou plantas, como fragmentos de cochas, ossos, ou recifes de corais inteiros. Como as bacias afundam lentamente, sedimentos mais novos são depositados so- bre os mais antigos, que ficam preservados da erosão que predomina na superfície do planeta. O resultado é uma pilha de rochas (formadas pelas transformações que ocorrem aos sedimentos depois de soterrados) de diferentes idades, que revelam a história da região em cada etapa do tempo em que houve subsidência e acumula- ção de sedimentos. Como as camadas mais profundas depositam-se primeiro, po- de-se estabelecer a cronologia dos eventos (Wicander e Monroe, 2009). A Figura 1.2 identifica as bacias sedimentares brasileiras. Figura 1.2. Bacias sedimentares do Brasil (fonte: Serviço Geológico do Brasil - http://www.cprm.gov.br/gis/tect_fanerozoicas.htm - acesso em 15/12/2010). Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 10 Já um Sistema Petrolífero é um conceito que engloba todos os elementos (Rochas e Fluídos) e processos geológicos (Formações) essenciais para a existência de uma acumulação de hidrocarbonetos. Para a ocorrência de um sistema petrolífero atu- ante, são necessários cinco elementos fundamentais: 1) Geração (pressupõe a exis- tência de uma rocha geradora), 2) Migração (através de falhas geológicas ou fratu- ras), 3) Acumulação (pressupõe a existência de uma rocha-reservatório), 4) Trapas ou armadilhas (pressupõe a existência de rochas selantes) e, finalmente, 5) Crono- logia dos acontecimentos listados anteriormente. Porém, para se comprovar efeti- vamentea existência do prospecto e o volume da acumulação, é necessário a per- furação de um poço. Um prospecto objetiva quantidades comerciais de petróleo. O método sísmico mais utilizado atualmente na área de petróleo é a Sísmica de Reflexão. Este método fornece alta definição das feições geológicas em subsuperfí- cies propícias à acumulação de hidrocarbonetos, a um custo relativamente baixo (90% dos investimentos em prospecção são aplicados em sísmica de reflexão). As imagens das estruturas e camadas geológicas em subsuperfície são apresentadas nas mais diversas formas e disponibilizadas para análise dos especialistas. O levan- tamento sísmico inicia-se com a geração de ondas elásticas, através de fontes arti- ficiais, que se propagam pelo interior da Terra, onde são refletidas e refratadas nas interfaces que separam as rochas de diferentes constituições petrofísicas, e retor- nam a superfície, onde são captadas por sofisticados equipamentos de registro. A Figura 1.3 exemplifica este método. O resultado desta prospecção são linhas sísmi- cas bi-dimensionais (2D) ou tri-dimensionais (3D) que são interpretadas pelos geólogos (Figura 1.4). O produto final é a seção geológica e a sísmica interpretada (Figura 1.5). Figura 1.3. Sísmica de Reflexão. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 11 Figura 1.4. Sísmica 2D e sísmica 3D. Figura 1.5. Seção sísmica interpretada. Tais dados apenas indicam indícios (fortes ou fracos) da existência de hidrocarbo- netos no subsolo. Enquanto que os dados sísmicos indicam as feições que possuem todas as características de rocha reservatório (esta pode, eventualmente, possuir somente água), a comprovação do sistema petrolífero indica que naquela locação pode haver óleo. Porém, a comprovação só é feita mediante a perfuração de um poço descobridor. 1.1 Fundamentos Pode-se definir a perfuração de poços como sendo um método para a produção de furos através do movimento circular contínuo de uma ferramenta de corte (broca) utilizada para quebrar e remover a rocha no fundo do furo. A broca é fixada e rota- cionada por uma coluna constituída fundamentalmente por seções de tubos de aço (coluna de perfuração), conectados um a um na medida em que a perfuração pro- Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 12 gride. O processo de remoção dos cascalhos (pedaços da rocha quebrados pela broca) se dá através da circulação de um fluido de perfuração através da broca até a superfície do poço. As brocas são ferramentas cortantes utilizadas para criar furos cilíndricos (os po- ços, propriamente ditos). Existe uma infinidade de tipos e desenhos de brocas que serão abordadas com mais detalhes no Capítulo 8 deste livro. A broca é conectada na extremidade de uma coluna de perfuração rotativa responsável por transmitir torque e força axial (peso) para permitir a progressão da perfuração. Os cascalhos resultantes do processo de remoção de rocha do fundo do poço preci- sam ser eficientemente removidos a fim de permitir o progresso das operações de perfuração. Desta forma, o processo de limpeza do fundo do poço se dá através da circulação de um fluido de perfuração, que tem como outras funções (além da fun- ção de limpeza): 1) resfriar a broca, 2) lubrificar a broca, 3) prover pressão hidros- tática dentro do poço a fim de manter estáveis as paredes do furo e 4) exercer no fundo do poço uma pressão hidrostática maior que a pressão de poros da formação a fim de evitar a produção inesperada e descontrolada de hidrocarbonetos. A pres- são hidrostática exercida por uma coluna de fluido no fundo de um poço é uma função da profundidade deste poço e da densidade do fluido: 0p p gh (0.1) O fluido de perfuração mais comum que existe é a própria água do mar. Os primei- ros trechos (fases) de um poço offshore, por exemplo, são perfuradas com água do mar e retorno de cascalho para o solo marinho. Após a instalação do BOP (esta operação será descrita com mais detalhes na seção 2.4 deste texto) o interior do poço fica isolado do ambiente marinho e o retorno do fluido de perfuração se dá para a plataforma, onde o cascalho é separado do fluido em separadores. A partir deste ponto em diante, é possível misturar aditivos no fluido de perfuração para aumentar sua densidade, aumentando assim a pressão hidrostática no fundo do poço. O aditivo densificante mais comum que existe é a Barita (Sulfato de Bário – BaSO4). Tais aditivos deixam o fluido de perfuração com um cheiro característico e uma coloração de barro. Vem daí o termo “lama de perfuração” (drilling mud). É comum utilizar este termo em sondas para se identificar os tanques de lama, as bombas de lama e a própria lama (fluido de perfuração). Uma vez que o poço é perfurado as paredes devem ser protegidas de forma que se possa continuar a perfuração em profundidades maiores. Para tanto, as paredes do poço são revestidas por tubos metálicos conectados um a um chamados de reves- timentos. Os revestimentos, por sua vez, precisam ser cimentados dentro do poço através de uma operação de cimentação. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 13 De forma geral, são necessários cinco elementos para se perfurar um poço: 1) bro- ca, 2) rotação, 3) peso sobre a broca, 4) limpeza do poço e 5) cimentação. Guarda- das as devidas proporções, poder-se-ia fazer uma analogia entre a perfuração de poços e um dentista executando uma obturação. Da mesma forma, o dentista ne- cessita de uma ferramenta cortante (a broca) para abrir um furo no dente. Uma turbina de ar comprimido proporciona a rotação da broca e o próprio dentista aplica a força sobre a broca com as mãos. Água injetada sob pressão através da broca proporciona resfriamento e limpeza da obturação. Após a abertura da obtu- ração e limpeza do dente, o dentista cimenta o furo com amálgama de prata. Da mesma forma que um dente possui terminações nervosas que, ao serem atingi- das pela broca, causam dor ao paciente, um poço de petróleo pode apresentar um comportamento anômalo que pode levar ao seu descontrole. Como mencionado anteriormente, uma das funções do fluido de perfuração é a de exercer no fundo do poço uma pressão hidrostática maior que a pressão de poros da formação a fim de evitar a produção inesperada e descontrolada de hidrocarbonetos. Quando a pres- são hidrostática no fundo do poço cai abaixo da pressão de poros na formação, os fluidos ali contidos começam a escoar para dentro do poço. Este influxo indesejável de fluidos para dentro do poço é chamado de Kick. Figura 1.6. Analogia entre a perfuração de poços e o dentista: perfuração (esq.) e blowout (dir). O kick pode ser constituído por: água da formação, óleo ou gás. Em geral, óleo e água são considerados fluidos incompressíveis. Assim, a situação mais temerosa e que exige maior cuidado é quando ocorre um influxo de gás (kick de gás) para den- tro do poço. Isto por que o gás é extremamente compressível. O kick de gás, ao mi- Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 14 grar para a superfície por diferença de densidade, se expande rapidamente fazen- do com que um grande volume de gás atinja a plataforma. Um kick, seja de água, óleo ou gás, pode ser detectado e controlado através de téc- nicas específicas para este fim. Após o controle do kick, o poço volta a sua condição de estabilidade com a pressão hidrostática no fundo do poço maior que a pressão de poros. Quando um kick não é controlado, este pode migrar até a superfície de forma des- controlada causando um acidente que pode ter consequências fatais: o Blowout. Além de sérios danosmateriais, o blowout pode causar vítimas fatais. Um blowout ocorrido em 6 de julho de 1988 na plataforma Piper Alpha, operando no Mar do Norte matou 167 pessoas (Taylor ET al., 1991). A Piper Alpha era uma plataforma de produção de petróleo operada pela Occidental Petroleum Ltd. e Texaco, proprie- tária de 22% das ações. Somente 62 membros da tripulação sobreviveram. Mais recentemente, em 20 de abril de 2010, um blowout ocorrido na plataforma semi- submersível DeepWater Horizon, da Transocean e operada pela BP no Golfo do Mé- xico em uma lâmina d’água de 1.500 metros, matou 11 tripulantes e levou ao afun- damento da plataforma causando um vazamento de óleo descontrolado que perdu- rou por mais de 3 meses (Avery, 2010). Figura 1.7. A plataforma DeepWater Horizon em chamas um dia após o blowout. A plataforma começa a adernar. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 15 Figura 1.8. A DeepWater Horizon ainda em chamas na noite do primeiro dia após o blowout já visivelmente adernada. Ela afundaria no dia seguinte rompendo o riser de perfuração e causando um grande vazamento que perdurou por mais de 3 meses. Desta forma, o objetivo das operações de perfuração de poços é perfurar um poço com segurança, seguindo normas e procedimentos adequados estabelecidos pelas indústrias, entidades regulatórias e ambientais, sem causar instabilidades das for- mações (colapso, fraturamento) e sem permitir influxo de fluidos da formação (água, óleo, gás), evitando kicks e blowouts. 1.2 História da perfuração Os hidrocarbonetos no subsolo têm origem em organismos aquáticos, vegetais e animais que proliferaram nos mares, apresentando uma lenta, porém, constante degradação bacteriológica. Esta matéria orgânica decomposta migrou para cama- das superiores do subsolo e se concentrou em rochas permeáveis que atuavam como um reservatório. O conjunto dos produtos proveniente desta degradação é hidrocarbonetos e gases que futuramente seriam conhecidos como petróleo (o “óleo de pedra” ou o “ouro negro”), um produto que daria um impulso extraordiná- rio ao desenvolvimento econômico da humanidade, mas que, em contrapartida, seria o pomo da discórdia que levaria muitos povos à guerra. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 16 1.2.1 No Mundo Na localidade de Hit, na Mesopotâmia, às margens do Rio Eufrates, cerca de 3.000 anos a.C., uma substância natural rica em carbono e hidrogênio, lodosa, semi- sólida, chamada betume, também conhecida como asfalto, exuda à superfície atra- vés de fendas e fissuras. Acredita-se que o betume tenha sido largamente utilizado desde 5000 a.C. como argamassa nas construções de Babilônia e até mesmo na mu- ralha de Jericó. Há registros de sua utilização no Egito, até como coadjuvante no processo de mu- mificação. O betume é utilizado também como impermeabilizante e na pavimenta- ção de estradas. Apesar de ser altamente inflamável é pouco utilizado para a ilumi- nação e, como ocorreria mais tarde nos Estados Unidos, é muito usado como medi- camento. Acredita-se que o betume serviria também como poderosa arma de guerra já que relatos de Homero na Ilíada falam de ataques a embarcações com bolas de fogo que não podiam ser apagadas. Relato similar também é feito quando do ataque de Ciro, o rei da Pérsia, à cidade de Babilônia. Na china (200 anos A.C.), ao escavarem poços em busca de sal, os chineses desco- brem óleo e gás que eram queimados para evaporar salmoura, produzindo assim, o sal. Os poços de sal na china chegavam a cerca de 200 metros de profundidade e bambu era utilizado para se penetrar o subsolo com uma ferramenta bastante rús- tica na ponta. Há relatos de que, por volta do século 10, longas linhas de bambu conectavam poços de óleo com salinas. No Oriente Médio, uma rudimentar indústria petrolífera se estabeleceu por volta do século 8, quando as ruas da nova cidade de Bagdá foram pavimentadas com pi- che derivado do petróleo, que era acessível a partir de campos naturais naquela região. No século 9, petróleo era destilado na Pérsia pelo alquimista Muhammad Zakariya Razi, produzindo subprodutos utilizados em lâmpadas de querosene. Marco Polo em sua viagem à China, passa pela Armênia e na fronteira com a Geór- gia observa e relata em seu Livro das Maravilhas uma grande fonte da qual "sai um licor semelhante ao óleo, em tal abundância que podem carregar-se cem navios de uma só vez". Marco Polo nota ainda que o óleo era utilizado para queima e servia também para untar os camelos protegendo-os de doenças. Estranhamente, o conhecimento sobre o petróleo ficaria restrito ao Oriente e, com raras exceções, não chegava ao Ocidente. Tal fato talvez se explique porque as ocorrências de betume ficavam além das fronteiras do Império Romano, sendo relatadas apenas como curiosidade, não sendo transmitido às futuras nações oci- dentais. Mas há relatos que dão conta, a partir da Idade Média, da ocorrência de Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 17 petróleo em algumas localidades da Europa, sendo os poços cavados manualmente pelos camponeses. A técnica do refino chegou à Europa transmitida pelos árabes, mas o petróleo é usado apenas como uma panacéia por antigos monges e médicos. 1.2.2 O Poço de Drake A história da perfuração de poços moderna com fins comerciais tem início com a revolução industrial no final do século XVIII. Os trabalhadores procuravam melho- res meios de iluminar seus lares após voltarem para casa de um exaustivo dia de trabalho. Adicionalmente, a utilização crescente de máquinas a vapor utilizadas pelas indústrias também demandava óleos lubrificantes de boa qualidade. A primeira atividade de perfuração de poços adequadamente documentada ocor- reu em uma localidade próxima a Charleston, Na Virgilia Ocidental, Estados Uni- dos, e foi efetuada por David e Joseph Ruffner. Utilizando um processo de percus- são (Figura 1.9), os irmãos Ruffner iniciaram seu poço em 1806 e terminaram em 1808 atingindo uma profundidade de quase 60 pés (cerca de 20 metros), dos quais 40 pés eram de rocha. Tratava-se de um poço de sal. Este poço chegou a ser reves- tido com madeira para prevenir a contaminação da salmoura com água doce. A coluna de perfuração utilizada foi forjada por ferreiros locais seguindo idéias for- necidas pelos irmãos Ruffner. O desenho desta coluna gerou um padrão que foi seguido por outros projetos de perfuração posteriores (Bommer, 2008). A perfuração comercial de poços de petróleo teve início nos Estados Unidos, no noroeste da Pensilvânia, em 1853. Neste ano, um advogado de Nova Iorque cha- mado George Henry Bissell observou por acaso em uma viagem ao interior da Pen- silvânia “óleo de pedra” borbulhando nos mananciais ou vazando nas minas de sal das florestas daquela região. Alguns poucos barris eram obtidos por métodos bem primitivos, escumando o óleo que ficava na superfície dos mananciais e dos córre- gos ou embebendo-o em trapos e cobertores. Era conhecido como "Óleo de Sêneca" em homenagem aos índios da localidade, que transmitiram aos brancos o conhe- cimento de sua utilidade como remédio tanto para os homens como para os ani- mais. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 18 Figura 1.9. Ilustração mostrando o processo de perfuração percussiva dos irmãos Ruffner. Mais tarde George Bissell vai rever sua antiga faculdade, Dartmouth College, e eis que uma garrafa colocada em cima de um armário na sala de um professor chama- lhe a atenção. Na garrafa há uma amostra daquele mesmo óleo de pedra da Pensil- vânia, muito utilizado como remédio. Ele sabia que aquele líquidonegro e viscoso era inflamável e, num lampejo, concebeu a idéia de que o óleo poderia ser utilizado não como remédio, mas sim como iluminante. Naquela época o mundo e especialmente os Estados Unidos viviam uma grande crise relacionada com a iluminação. A explosão populacional e a Revolução Indus- trial aumentaram sobremaneira a necessidade de um iluminante que até então se baseava no uso de um simples pavio impregnado de alguma gordura animal ou óleo vegetal. Os mais abastados usavam o óleo de baleia, de melhor qualidade, mas de preço mais alto. Porém, os cachalotes do Atlântico já estavam em processo de dizimação e os preços com isso se elevavam muito (Bommer, 2008). Havia outros produtos como o canfeno, um derivado da terebintina que soltava muita fumaça e às vezes costumava explodir na casa das pessoas. As ruas e algu- mas casas eram iluminadas pelo chamado gás urbano, destilado do carvão que era Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 19 colocado nos lampiões. Mas o gás era caro e pouco confiável e em 1854 o canaden- se Abraham Gesner desenvolveu um processo para extrair óleo do carvão ou do asfalto. Gesner chamou o produto de "querosene" de "keros" e "elaion", palavras gregas que significam "cera" e "óleo". Mas o problema principal ainda persistia, ou seja, o custo era muito elevado e a quantidade produzida insuficiente. Bissell sabia que sua idéia só vingaria se ele conseguisse resolver estes dois pro- blemas: um óleo iluminante que pudesse existir em grande quantidade e que pu- desse ser fabricado a baixo custo. Ele levou sua idéia adiante e tratou de conseguir investidores, convencendo-os de que estavam diante de uma grande e rendosa descoberta. Seu entusiasmo era tanto que conseguiu arrecadar o suficiente para contratar um renomado professor de química da Universidade de Yale que faria uma pesquisa na região e analisaria detalhadamente o produto. Os resultados fo- ram amplamente favoráveis. O óleo podia ser levado a vários níveis de ebulição e com isto ser refinado, obtendo como subproduto um óleo iluminante de altíssima qualidade. Em 1856, após observar figuras de torres de perfuração sendo utilizadas para a mineração de sal, Bissell teve a idéia de utilizar a mesma tecnologia associada à tecnologia dos irmãos Ruffner para perfurar poços de óleo. A empresa criada por George Bissell e mais um sócio, James M. Townsend, a Senecal Oil Company, contra- tou um ferroviário aposentado chamado Edwin Laurentine Drake para perfurar seu primeiro poço na localidade de Titusville, na Pensilvânia. Dentre vários fatores, o fato do acesso fácil às ferrovias da época influenciou na escolha de Drake, ao qual foi dado o título de Coronel para impressionar os trabalhadores e moradores da- quela localidade (Bommer, 2008). Drake contratou William A. Smith, um ferreiro e experiente perfurador de poços de sal, para ser seu sondador (driller). Eles foram para campo na primavera de 1858. Uma das primeiras ações de Drake e Smith foi fincar um pequeno comprimento de um tubo oco para revestir o solo macio do local da perfuração, assegurando a inte- gridade do poço. Até hoje em dia, todos os poços se iniciam da mesma forma: com o assentamento do revestimento condutor (Bommer, 2008). Após esta atividade, Drake e Smith construíram sua torre de perfuração ao redor da cabeça do poço (Figura 1.10). Em 27 de agosto de 1859, o poço de Drake, após inúmeras dificuldades durante a perfuração, encontrou óleo a cerca de 21 metros de profundidade (69 pés). Era o início da exploração comercial de petróleo. O poço de Drake produzia cerca de 25 barris de óleo por dia (cerca de 4 m3 por dia). Por volta de 1871, aquela área já produzia 5,8 milhões de barris por ano (Tarbel, 1963). Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 20 Figura 1.10. “Coronel” Edwin L. Drake (dir.) e seu amigo William A. Smith (esq.), um farmacêutico de Titusville, em frente ao seu histórico poço em 1861. A foto mostra a segunda torre e casa de máquinas. A primeira foi des- truída em um incêndio em 1859. O processo de percussão utilizado por Drake e Smith para perfurar seu poço, con- sistia em “martelar” uma coluna de tubos solo adentro até uma determinada pro- fundidade. A Figura 1.11 mostra um diagrama da torre de perfuração da época, bem como as ferramentas rudimentares utilizadas por esta tecnologia. As notícias sobre o sucesso do poço de Drake e Smith rapidamente correram os Estados Unidos, Canadá e outros países. O interesse em perfurar poços de petróleo era grande na Califórnia, na costa oeste americana, onde a população crescia rapi- damente por causa da corrida ao ouro. O primeiro poço comercial foi perfurado em 1866 na localidade de Rancho Ojai, na costa central da Califórnia. O poço atingiu cerca de 168 metros (550 pés) e produzia entre 15 e 20 barris de petróleo por dia. O poço foi considerado um sucesso e promoveu a perfuração de muitos outros po- ços naquele estado (Bommer, 2008). A Figura 1.12 mostra a praia de Huntington Beach repleta de torres de perfuração no princípio do século XX. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 21 Figura 1.11. Torre de perfuração por percussão (dir.) e trabalhador em fren- te às ferramentas da coluna de perfuração (esq.). (Fonte: http://www.lloydminsterheavyoil.com/cable.htm) Figura 1.12. Torres de perfuração na praia de Huntington Beach, Califórnia. (Fonte: http://theocnow.com/2011/04/20/huntington-beach-oil-wells) 1.2.3 O Poço de Lucas A dependência americana ao óleo continuou cada vez mais crescente impulsionan- do a indústria do óleo e, consequentemente, a perfuração de novos poços em quase todos os estados. No Texas não foi diferente. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 22 No final do século XIX, Spindletop (hoje em dia, Big Hill) era uma pequena colina ergendo-se 4,5 metros acima das planícies circundantes. Exsudações de gás que ocorriam com freqüência na superfície do domo entravam em ignição com muita facilidade. Uma pessoa em especial ficou muito interessada em Spindletop era Patillo Higgins, um corretor de imóveis e geólogo autodidata, que vivia naquela área. Higgins acre- ditava que poderia haver óleo e gás a cerca de 305 metros abaixo do domo. Ele en- tão comprou as terras no todo do domo, e com a ajuda de mais alguns investidores perfurou dois poços secos. O insucesso deveu-se a uma espessa formação de areia que os sondadores chamaram de running quicksand (areia movediça). A formação era tão solta (não-consolidada) que os poços desmoronavam com freqüência, antes mesmo que se pudessem ser revestidos ou perfurados por completo através da perfuração por percussão(Bommer, 2008). Desencorajado, mas ainda certo da existência de hidrocarbonetos naquela região, Higgins prometeu arrendar as terras para aquele que conseguisse perfurar um po- ço de 305 metros de profundidade. Um engenheiro de minas austríaco, Anthony Lucas, ofereceu-se para realizar a ta- refa. Após visitar a locação, Lucas concluiu que a formação era um domo salino e contratou a empresa Hamil Brothers of Corsicana para perfurar um poço, que teve início em 27 de outubro de 1900. O equipamento utilizado pela Hamil Brothers era uma sonda rotativa, enquanto que a grande maioria dos sondadores utilizava son- das percussivas. Diferentemente das sondas percussivas, as sondas rotativas utili- zavam um fluido de perfuração para resfriar a ferramenta cortante (a broca), pre- venir desmoronamentos e limpar o fundo do poço. Nas sondas percussivas, como aquela utilizada por Drake e Smith, o fluido de perfuração não era necessário.Isto selou o destino deste tipo de sonda para sempre. Em Spindletop, a Hamil Brothers começou utilizando água como fluido de perfura- ção. Mas logo, os sondadores perceberam que a água sozinha não forneceria a pressão hidrostática necessária para manter a integridade da formação. Eles, en- tão, cavaram uma lagoa artificial (pond ou pit) ao lado da sonda e misturaram água com argila, formando uma lama (mud). As partículas de argila misturadas na água aumentavam a densidade do fluido resultante propiciando maior pressão hidrostá- tica no fundo do poço. Além disso, parte das partículas de argila se aderia à parede do poço formando uma película protetora (mud cake), da mesma forma que o re- boco em uma parede de alvenaria. Este reboco protegia a formação, principalmen- te na região de areia, evitando assim o desmoronamento da formação. No começo de janeiro de 1901, o novo poço atingiu a profundidade especificada de 305 metros. No dia 10 de janeiro, os trabalhadores da sonda iniciaram uma mano- Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 23 bra para a troca da broca, quando repentinamente, o poço começou a “cuspir” lama para fora com enorme vazão. Um gêiser de óleo logo sucedeu o fluxo de lama, atin- gindo uma altura de cerca de 60 metros acima da torre de 18 metros! Lucas obser- vou o poço de uma distância segura e estimou que este fluía a uma vazão de 48 mil barris por dia (Bommer, 2008). Tudo leva a crer que, ao iniciarem a manobra para a troca da broca, ocorreu um pistoneio no fundo do poço, da mesma forma que em um êmbolo de seringa, redu- zindo a pressão no fundo do poço, causando um kick. O poço logo entrou em blo- wout, mas felizmente ninguém ficou ferido. A localidade de Spindletop produziu quantidades jamais observadas de óleo naque- la época, mostrando assim a efetividade das sondas rotativas. Ficou provado que este tipo de equipamento poderia perfurar poços que a as sonda percussivas não podiam. Figura 1.13. O Poço de Lucas à esquerda e Spindletop em 23 de abril de 1903 (Fontes: https://www.e-education.psu.edu/egee120/node/224 e http://peakoil.com/forums/viewtopic.php?f=7&t=51884) 1.2.4 O Oriente Médio As descobertas de óleo nos Estados Unidos logo mostraram ao mundo em crescen- te industrialização as vantagens do uso de óleo como combustível em substituição ao carvão mineral. A maior vantagem era na quantidade de energia armazenada cadeias de hidrocarbonetos que constituem o petróleo. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 24 Em 1911, a marinha britânica começou a usar óleo combustível em seus navios de guerra, permitindo o reabastecimento no mar. Porém, os Estados Unidos possuíam uma grande reserva se óleo enquanto que os britânicos não. Os britânicos, então, formaram a Anglo-Persian Oil Company para explorar petróleo em suas colônias no Oriente Médio. A Anglo-Persial Oil Company foi a percussora da Brithsh Petroleum, hoje BP. Este empresa fez acordos com a Pérsia (hoje Irã) para a exploração co- mercial de óleo e gás e logo descobriu um grande campo de óleo em Masjed Solei- man em 1908. Este foi o maior campo descoberto até então no mundo. Em pouco tempo a Anglo-Persial Oil Company tornou-se a maior produtora de óleo do mundo. Da mesma forma que o poço de Lucas demonstrou nos Estados Unidos, os grandes campos de petróleo do Oriente Médio puderam ser desenvolvidos graças à perfu- ração rotativa. 1.2.5 A Perfuração Offshore10 A indústria da perfuração offshore teve início há mais de 100 anos nas águas do Oceano Pacífico. Em 1896, o prolífico campo de Summerland na Califórnia já havia sido perfurado em toda sua extensão até as praias que o circundavam. A busca por mais óleo levou o empresário Henry L. Williams e seus associados à construção de um píer com quase 100 metros de extensão dentro do Pacífico. Neste píer foi mon- tada uma sonda de perfuração percussiva. No ano de 1897, este primeiro poço offshore passou a produzir em escala comerci- al, levando outras 22 empresas que atuavam na região a construírem mais 14 píe- res e mais de 400 poços nos cinco anos seguintes. O campo de Summerland produ- ziu por mais de 25 anos. Em 1911, a Gulf Refining Co. abandonou o uso de píeres. Esta empresa utilizou uma frota de balsas, rebocadores e bate-estacas flutuantes para construir a plataforma Ferry Lake nº1, na localidade de Caddo Lake na Louisiana, EUA. Quando o primeiro poço começou a produzir 450 barris por dia, a Gulf Refining passou a construir pla- taformas a cada 200 metros em uma área lacustre de aproximadamente 40 mil quilômetros quadrados. Foi a primeira vez que a perfuração offshore foi realizada sem um píer de conexão com a terra firme. 10 Fonte para este capítulo: http://sites.google.com/site/petroleumhistoryresources/Home/offshore-oil- history. Último acesso em 14/05/2011. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 25 Figura 1.14. Píeres no campo de Summerland, Califórnia, em 1906. (Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Oil_field) Em 1938, a Pure Oil Co. e a Superior Oil Co. uniram-se para construir uma estrutura offshore no Golfo do México para instalar uma sonda, apenas dos muito desafios relativos à logística, engenharia e telecomunicações. Estas empresas contrataram uma empresa de engenharia e construção de Houston, Texas, chamada Brown & Root Marine Operator, Inc., para construir um deck de madeira medindo 100 por 60 metros que seria instalado em uma lâmina d’água rasa (cerca de 5 metros) a uma distância de 1 milha da costa da Louisiana. Utilizando critérios de projetos para construções em terra, a plataforma foi fixada utilizando 300 pilares de madei- ra tratada (pinheiro) que penetraram cerca de 5 metros no solo marinho. Esta pla- taforma foi destruída por um furação em 1940, sendo reconstruída logo em segui- da. Em 1946, a Magnolia Petroleum (posteriormente comprada pela ExxonMobil) per- furou uma localidade distante 18 milhas da costa americana no Golfo do México em lâmina d’água de 6 metros. No começo de 1947, a Superior Oil iniciou a construção de uma plataforma de pro- dução em lâmina d’água de 7 metros a uma distância de 18 milhas da costa da Louisiana, mas foi a Kerr-McGee Oil Industries (adquirida posteriormente pela Anadarko Petroleum) como operadora que terminou a construção do histórico Ship Shoal Block 32, em outubro de 1947. Tratava-se de uma embarcação móvel com todas as instalações para perfuração e produção que foi rebocada até a localidade, que ficava fora do alcance visual da costa americana. Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 26 Figura 1.15. Localidade de Caddo Lake em 1913 (Fotografia de Joyce L. Alig, "Our Post Card Past: Grand Lake St. Marys Ohio," Passport to History Series, Book VIII, Mercer County Historical Society, Inc., Celina, Ohio, 2001) Figura 1.16. Ship Shoal Block 32 (Fonte: http://offshoreindustry.blogspot.com) A tecnologia de plataformas continuou evoluindo. Plataformas fixas continuaram sendo construídas para lâminas d’água até 30 metros (100 pés), quando surgiu a necessidade de desenvolver campos em águas mais profundas do Golfo do México. Foi quando surgiram as primeiras unidades auto-eleváveis de perfuração. A primeira unidade semi-submersível surgiu de uma observação de campo em 1961. A Blue Water Drilling Company era a proprietária e operadora de uma plata- forma submersível Blue Water 1 operando no Golfo do México para a Shell Oil Company. Como os flutuadores (pontoons) não possuíam capacidade de flutuação suficiente para suportaro peso da sonda e seus demais componentes, decidiu-se Engenharia do Petróleo – POLI/COPPE/EQ – UFRJ | Introdução 27 rebocar a plataforma até a locação da perfuração de forma semi-submersa com um calado entre a parte de cima dos flutuadores e a parte de baixo do deck de perfura- ção. Percebeu-se, porém, que os movimentos da sonda nesta configuração eram muito pequenos tornando-a muito estável. Desta forma, a Blue Water Drilling e a Shell decidiram em conjunto operar esta plataforma na configuração semi- submersa ancorada. A primeira plataforma semi-submersível construída especifi- camente para este fim foi a Ocean Driller em 1963. Desde então, muitas sondas se- mi-submersíveis tem sido construídas para a indústria da perfuração offshore. Figura 1.17. A Plataforma Blue Water 1 que originou as modernas sondas semi-submersíveis. (Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Blue_Water_Rig_No._1.JPG) 1.2.6 No Brasil 1.3 Sobre este texto
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