Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Capítulo 7 A FERA FAMINTA E O BEBÊ FEIO N o fin al da déc ada de 1980 e in íc io de 1990, en quan to um a Disn ey A n im ation em ascen são osten tava um a n otável fileira de sucessos – A pequena sereia, A Bela e a Fera, Aladdin, Rei Leão – , com ecei a ouvir um a frase ser usada repetidam en te n as sa las dos ex ecutivos da sua sede em Burban k: “V ocê precisa a lim en tar a Fera .” Com o você deve se lem brar, a Pix ar havia assin ado um con trato para desen volver um sistem a gráfico para a Disn ey – o Com puter A n im ation Production System , ou CA PS, que iria criar e geren c iar células de an im ação. Com eçam os a trabalhar n o CA PS quan do a Disn ey estava produzin do A pequena sereia; assim , eu estava em lugar privilegiado para ver que o suc esso do film e levou à ex pan são do estúdio e à n ecessidade de m ais projetos de film es para justificar (e oc upar) o crescen te quadro de pessoal. Em outras pa lavras, eu era testem un ha da criação da Fera da Disn ey – e com “Fera” quero dizer qualquer grupo gran de que precise ser a lim en tado de form a in in terrupta c om n ovos m ateria is e recursos para poder fun cion ar. Devo dizer que n ada disso estava acon tecen do por acaso ou por m otivos errados. M ichael Eisn er, CEO da W alt Disn ey Com pan y, e Jeffrey K atzen berg, presiden te do c on selho, haviam se com prom etido a reviver a an im ação depois do lon go período de in ação que se seguiu à m orte de W alt . O resultado foi um floresc im en to artístico que utilizou os ta len tos de artistas len dários que estavam n o estúdio havia décadas, bem com o de ta len tos m ais n ovos. O s film es que eles produziam n ão só con tribuíam en orm em en te para a em presa em term os econ ôm icos, m as tam bém torn aram -se im ediatam en te ic ôn icos n a cultura popular e, por sua vez, m otivaram a ex plosão de an im ação que viria a possibilitar a produção de Toy Story pela Pix ar. M as o sucesso de cada n ovo film e da Disn ey tam bém fazia outra coisa: criava fom e por m ais. À m edida que a in fraestrutura do estúdio cresc ia para com ercia lizar e prom over cada film e de sucesso, a n ec essidade de m ais produtos só se ex pan dia . A s apostas eram sim plesm en te a ltas dem ais para perm itir que todos aqueles fun cion ários ficassem in ativos em suas m esas. Se você pergun tasse n a Disn ey n a época , teria problem as para achar a lguém que acreditava que film es an im ados eram produtos que poderiam ou deveriam ser feitos n um a lin ha de m on tagem , apesar da ex pressão “a lim en tar a Fera” con ter em si essa ideia . N a verdade, as in ten ções e os va lores das pessoas de alto n ível que trabalhavam n a produção eram certam en te adm iráveis. M as a Fera é poderosa e pode superar até m esm o os in divíduos m ais dedicados. À m edida que a Disn ey ex pan dia sua program ação de lan çam en tos, sua n ecessidade por produção aum en tava a pon to de ela abrir estúdios de an im aç ão em Burban k, n a Flórida , Fran ça e A ustrá lia , só para satisfazer seu apetite. A pressão para c riar – depressa – passou a ser a ordem do dia . É c laro que isso acon tec e em m uitas em presas, n ão só em H ollyw ood, e seu efeito n ão preten dido é sem pre o m esm o: a redução da qualidade em todos os aspectos. Depois do lan çam en to de O Rei Leão em 1994, com faturam en to bruto de 952 m ilhões de dólares, o estúdio com eçou seu len to declín io. N o in íc io, foi difíc il deduzir por que t in ham oc orrido a lgum as m udan ças de lideran ça , m as a m aior parte das pessoas a in da estava lá e elas a in da t in ham ta len to e desejo de realizar gran des trabalhos. N ão obstan te, in felizm en te, a seca que se in ic iava iria durar pelos 16 an os seguin tes. De 1994 a 2010, n en hum n ovo film e an im ado da Disn ey chegaria ao topo da parada de sucessos. Creio que isso ten ha sido um resultado direto dos fun cion ários pen sarem que sua tarefa era a lim en tar a Fera . A o ver as prim eiras m an ifestaç ões daquilo n a Disn ey, sen ti urgên cia de en ten der os fatores oc ultos que estavam por trás. Por quê? Porque eu sen tia que, se c on tin uássem os a ter suc esso, aquilo que estava acon tecen do n a Disn ey A n im ation quase certam en te tam bém iria acon tecer con osco. A origin alidade é frágil. E em seus prim eiros m om en tos em gera l ela está lon ge de ser bon ita . É por isso que c ham o os prim eiros esboços de n ossos film es de “bebês feios”. São versões em m in iatura feias dos adultos que virão a ser. Eles são rea lm en te feios: desajeitados e a in da n ão form ados, vuln eráveis e in com pletos. Eles prec isam ser n utridos – n a form a de tem po e paciên cia para que cresç am . Isso sign ifica que têm dific uldades para coex istir com a Fera . A ideia do bebê feio n ão é fác il de aceitar. T en do visto film es da Pix ar e deles gostado, m uitas pessoas assum em que eles vieram ao m un do tota lm en te “cresc idos”. N a verdade, fazer c om que cheguem até esse pon to en volve m eses ou an os de trabalho. Se você assistisse aos prim eiros c arretéis de qualquer um de n ossos film es, a feiura fic aria dolorosam en te c lara . M as o im pulso n atura l é de c om parar os prim eiros carretéis c om os film es ac abados – assim , n ossa tarefa é proteger n ossos bebês de julgam en tos apressados. Devem os proteger os n ovos. A n tes de c on tin uar, quero dizer a lgo a respeito do term o proteção. Preocupo- m e porque ele tem um a c on otaç ão m uito positiva , im plican do que qualquer coisa que é protegida parece m erec er proteção. M as n em sem pre esse é o caso. Em algun s c asos, a produç ão ten ta proteger processos que são con fortáveis e fam iliares, m as n ão fazem sen tido; os departam en tos jurídic os são c on hecidos pelo ex c esso de c autela em n om e da proteção de suas em presas de possíveis am eaç as ex tern as; as pessoas em buroc racias costum am ten tar proteger o status quo. N esses c on tex tos, a proteç ão é usada para prom over um a agen da con servadora ( com “c ” m in úsc ulo) : n ão perturbe aquilo que já ex iste. À m edida que um a em presa torn a-se bem -sucedida , esse c on servadorism o gan ha forç a e um a en ergia ex c essiva é dirigida para a proteção daquilo que fun cion ou até agora . A ssim , quan do defen do a proteç ão do n ovo, estou usan do a pa lavra com um sen tido um pouco diferen te. Estou dizen do que, quan do a lguém tem um a ideia origin al, ela pode ser desajeitada e m al defin ida , m as tam bém é o oposto daquilo que está estabelec ido – e esse é precisamente seu aspecto mais estimulante. Se a ideia , n esse estado vuln erável, for ex posta a pessoas n egativistas, que n ão con seguem com preen der seu poten cia l ou carec em de paciên c ia para deix á- la evoluir, poderá ser destruída . Parte do n osso trabalho é proteger o n ovo de pessoas que n ão en ten dem que, para que a gran deza surja , é prec iso haver fases sem m uita gran deza . Pen se n um a lagarta tran sform an do-se em borboleta – ela sobrevive som en te porque fic ou protegida n um c asulo. Em outras pa lavras, sobrevive porque está protegida daquilo que poderia prejudic á- la . Está protegida da Fera . A prim eira bata lha da Pix ar com a Fera foi em 1999, depois do lan çam en to de dois film es de sucesso, quan do estávam os in ic ian do a produção daquele que esperávam os que fosse n osso quin to film e, Procurando Nemo. Lem bro-m e da in trodução in ic ia l de A n drew Stan ton a respeito de M arlin , um peix e palhaç o superprotetor, e sua busca por N em o, seu filho sequestrado. Estávam os em outubro e n os reun im os n um a sa la lotadapara ouvir A n drew fa lar sobre sua história . Sua apresen tação foi m agn ífic a . A n arrativa , de ac ordo com sua descrição, seria en trem eada por um a série de flashbacks ex plican do o que tin ha acon tecido para torn ar o pai de N em o tão preocupado e superprotetor do seu filho (a m ãe de N em o e seus irm ãos, disse A n drew , havia sido m orta por um a barracuda) . Em pé n a fren te da sa la , A n drew c osturou duas histórias: o que estava acon tec en do n o m un do de M arlin , duran te a épica busc a que ele em preen de depois que N em o é apan hado por um m ergulhador, e o que estava acon tecen do n o aquário em Sydn ey, on de N em o tin ha ido parar com um grupo de peix es tropic ais den om in ado “A Gan gue do T an que”. A história que A n drew queria con tar ia ao coração da luta por in depen dên cia que m uitas vezes m olda o relac ion am en to en tre pai e filho. A lém disso, era en graçada. Q uan do A n drew term in ou sua apresen tação, ficam os um m om en to em silên c io. En tão, John Lasseter fa lou por todos quan do disse: “V ocê m e con quistou n a palavra peixe.” N aquele pon to, o fan tasm a de Toy Story 2, que havia cobrado um preço devastador de n ossos fun cion ários, a in da estava forte em n ossas m em órias. Forçados até o pon to de colapso, t ín ham os sa ído daquele film e c om um a c lara com preen são de que aquilo que havíam os feito n ão era saudável para n ossa em presa e n ossos fun cion ários. T ín ham os jurado n ão repetir aqueles erros em Monstros S.A. e , n a m aior parte dos casos, n ão o fizem os. M as n ossa determ in ação tam bém sign ificou que Monstros S.A. acabou levan do c in co an os para ser feito. Logo depois, estávam os ativam en te em busc a de m an eiras para m elhorar e acelerar n osso processo. Era óbvio que um a gran de parcela de n ossos custos provin ha do fato de n un c a pararm os de m ex er n os roteiros dos n ossos film es, m esm o m uito tem po depois de in ic iada a produç ão. N ão era preciso ser gên io para ver que se con seguíssem os chegar logo a um acordo sobre a história , n ossos film es seriam m uito m ais fác eis – e baratos – de fazer. A quela passou a ser n ossa m eta – fin a lizar o roteiro antes de in ic iarm os a produção. Depois da ex c elen te apresen tação de A n drew , Procurando Nemo parec ia o projeto perfeito para testar n ossa n ova teoria . Q uan do dissem os a A n drew para ir em fren te, estávam os con fian tes de que fix ar a história n o in íc io iria produzir n ão só um film e fen om en al, m as tam bém um a produç ão econ om ic am en te efic ien te. Em retrospec to, perc ebo que n ão estávam os apen as ten tan do ser m ais efic ien tes. Esperávam os evitar a parte con fusa ( e às vezes in c ôm oda) do proc esso criativo. Estávam os ten tan do elim in ar erros ( e, c om isso, a lim en tar n ossa Fera com efic iên cia) . É c laro que isso n ão ac on teceria . E todos aqueles flashbac ks que havíam os adorado n a apresen taç ão de A n drew ? Eles se m ostraram con fusos quan do os vim os n os prim eiros c arretéis – n um a reun ião do Ban co de Cérebros, Lee Un kric h foi o prim eiro a c ham á-los de críptic os e im pression istas e pediu por um a estrutura n arrativa m ais lin ear. Q uan do A n drew fez um a ten tativa , surgiu um ben efíc io in esperado. A n teriorm en te, M arlin havia parec ido an tipático porque foi prec iso m uito tem po para se desc obrir a razão pela qual ele estava sen do um pai tão sufocan te. A gora , c om um a abordagem m ais cron ológic a , M arlin estava m ais sim pático. A lém disso, A n drew c on statou que sua in ten ç ão de c osturar dois en redos con c orren tes – a ação n o ocean o versus a ação n o aquário – era m uito m ais c om plicada do que ele havia im agin ado. A história da Gan gue do T an que, preten dida origin alm en te com o im portan te, passou a ser secun dária . E aquelas foram apen as duas de m uitas m udan ç as difíceis que foram feitas duran te a produção c om o problem as im previstos – e n ossas m etas de um a história predeterm in ada e um a produç ão sim plificada foram para o espaç o. A pesar de n ossas esperan ç as de que Procurando Nemo seria o film e que m udaria n ossa m an eira de operar, acabam os fazen do duran te a produç ão tan tos a justes quan to havíam os feito em qualquer outro film e an terior. O resultado, é c laro, foi um film e de que n os orgulham os m uito, que teve o segun do m aior faturam en to bruto de 2003 e o m aior de todos os film es de an im aç ão da história . A ún ica coisa que n ão fiz foi tran sform ar n osso processo de produç ão. N a époc a , m in ha c on clusão foi de que a fin a lização da história an tes da produção com eç ar a in da era um a m eta vá lida – apen as a in da n ão a havíam os atin gido. Porém , à m edida que con tin uam os a fazer film es, acabei acreditan do que m in ha m eta n ão só era pouc o prática , m as tam bém in gên ua. In sistin do n a im portân c ia de c olocar logo n ossos patos em fila , t ín ham os chegado perigosam en te perto de adotar um a fa lác ia . T orn ar o proc esso m elhor, m ais fác il e m ais barato é um a aspiraç ão im portan te, a lgo em que sem pre trabalham os – mas não é a meta. Fazer um film e ótim o é a m eta . V ejo isso repetidas vezes em outras em presas. Um a subversão n a qual sim plificar o processo ou elevar a produç ão suplan ta a m eta suprem a, com cada pessoa ou grupo pen san do que está fazen do a coisa c erta – quan do, n a verdade, desviou-se do curso. Q uan do a efic iên cia ou a c on sistên cia do flux o de trabalho n ão é equilibrada por outras forças c om pen satórias igualm en te fortes, o resultado é que n ovas ideias – n ossos bebês feios – n ão recebem a aten ç ão e a proteção de que prec isam para brilhar e am adurec er; são aban don ados. A ên fase está em fazer projetos m ais seguros que im itam rea lizações com provadam en te bem -sucedidas, apen as para m an ter a m áquin a – qualquer m áquin a – em fun cion am en to (veja O Rei Leão 1, um esforço direto para DV D lan çado em 2004, seis an os depois de O Rei Leão 2: O Reino de Simba) . Esse t ipo de pen sam en to produz film es previsíveis e n ão origin ais, porque im pede a ferm en tação orgân ica que a lim en ta um a in spiração verdadeira . M as a lim en ta a Fera . Q uan do fa lo a respeito da Fera e do Bebê, pode parecer tudo bran co e preto – que a Fera é toda m á e o Bebê, todo bom . N a verdade, a rea lidade está em algum pon to n o m eio. A Fera é gluton a, m as tam bém é um a m otivadora valiosa . O Bebê é puro e in c orrupto, cheio de poten cia l, m as tam bém é caren te e im previsível e pode m an tê- lo acordado à n oite. O segredo está n a sua Fera e seus Bebês coex istirem pacificam en te, e isso ex ige que você m an ten ha várias forças em equilíbrio. Com o equilibrar essas forças que parecem tão discordan tes, em especia l quan do a luta parece tão in justa? A s n ecessidades da Fera parec em superar as do Bebê todas as vezes, um a vez que o verdadeiro va lor dele m uitas vezes é descon hecido ou duvidoso e pode perm an ecer assim por m eses. Com o con ter a Fera , con trolan do seu apetite, sem coloc ar em risco n ossas em presas? Isso porque toda em presa prec isa da sua Fera . A fom e dela se traduz em prazos e urgên cia . Isso é bom , desde que a Fera seja m an tida em seu lugar. E essa é a parte difíc il. M uitos fa lam da Fera com o se ela fosse um a criatura ávida e irrefletida , in sisten te e fora do n osso con trole. M as n a verdade qualquer grupo que faz um produto ou gera receitas pode ser con siderado um a parte da Fera , in c lusive m arketing e distribuição. Cada grupo opera de acordo com sua própria lógica e m uitos n ão têm respon sabilidade pela qualidade do que é produzido, n em um a boa com preen são do seu im pacto sobre essa qualidade. O problem a de m an ter o processo em an dam en to e o din heiro fluin do sim plesm en te n ão é deles. Cada grupo tem suas próprias m etas e ex pectativas e age de ac ordo com seus apetites. Em m uitas em presas, a Fera requer tan ta aten ção que adquire um poder ex cessivo. A razão: ela é dispen diosa , respon den do pela gran de m aioria dos custos da m aior parte dos custos. A m argem de lucro de qualquer em presa depen de, em gran de parte, da eficác ia c om a qual ela usa seu pessoal. O s trabalhadores de lin ha de m on tagem de um a em presa autom otiva , que são pagos quer a lin ha esteja ou n ão em m ovim en to; os fun cion ários dos estoques n os depósitos da A m azon , que vão trabalhar in depen den tem en te do n úm ero de com pradores que estão on -lin e n o dia; os espec ia listas em ilum in ação ( que selec ion am um en tre dezen as de ex em plos n o m un do da an im ação), que precisam esperar que m uitos outros fun cion ários c on cluam suas tarefas n um a determ in ada cen a para poder in ic iar seu trabalho. Se as in efic iên c ias forç am qualquer pessoa a esperar por tem po dem ais, se a m aioria dos seus fun cion ários n ão está em pen hada n o trabalho que gera sua receita , você c orre o risc o de ser devorado de den tro para fora . A solução, é c laro, é a lim en tar a Fera , ocupar seu tem po e sua aten ção, pon do em ação seus ta len tos. Porém , m esm o quan do você faz isso, ela n ão pode ser sac iada . Um a das iron ias cruéis da vida é que, quan do se trata de alim en tar a Fera , o sucesso só cria m ais pressão para se apressar e ter suc esso n ovam en te. Essa é a razão pela qual em m uitas em presas a program ação ( isto é, a n ecessidade de produtos) gera a produção, em vez da força das ideias. N ão estou dizen do que são as pessoas que c om põem a Fera que são o problem a – elas estão fazen do o que podem para rea lizar aquilo que as m an daram fazer. A pesar das boas in ten ções, o resultado é problem ático: a lim en tar a Fera passa a ser o foco cen tra l. É c laro que a Fera n ão floresce som en te n as em presas de an im ação ou de film es. N en hum a em presa criativa está im un e. M as todas as Feras têm um a coisa em com um . Com frequên cia , as pessoas en c arregadas delas são as m ais organ izadas da em presa – pessoas preoc upadas com fazer as coisas da m an eira certa e den tro do orçam en to, com o seus chefes esperam que faç am . Q uan do essas pessoas e seus in teresses torn am -se dem asiado poderosas – quan do n ão há forç as com pen satórias sufic ien tes para proteger as n ovas ideias – , as coisas dão errado. A Fera assum e. O segredo para evitar isso é o equilíbrio. V ejo as trocas en tre os diferen tes partic ipan tes de um a em presa c om o cen tra is para seu sucesso. A ssim , quan do fa lo a respeito de dom ar a Fera , o que quero de fato dizer é que m an ter as n ec essidades dela em equilíbrio c om as n ecessidades de outras facetas m ais criativas da sua em presa irá torn á- lo m ais forte. Darei um ex em plo do que quero dizer, t irado da em presa que m elhor con heço. Em an im ação, tem os m uitos com pon en tes: en redo, arte, orçam en to, tecn ologia , fin an ças, produção, m arketin g e produtos de con sum o. A s pessoas den tro de cada um têm prioridades im portan tes – e m uitas vezes con flitan tes. O esc ritor e o diretor querem con tar a história de m aior efeito possível; o design er de produç ão quer que o film e seja belo; os diretores técn icos querem efeitos im pecáveis; o pessoal de fin an ças quer m an ter os orçam en tos den tro dos lim ites; o m arketin g quer um gan cho fac ilm en te ven dável aos espectadores em poten c ia l; o pessoal de produtos de c on sum o quer person agen s com apelo para tran sform ar em brin quedos de pelúcia e para im prim ir em lan cheiras e cam isetas; os geren tes de produç ão ten tam m an ter todos satisfeitos – e im pedir que a em presa escape ao con trole. E assim por dian te. Cada grupo se con cen tra n as suas próprias n ecessidades, o que sign ifica que n in guém tem um a visão c lara de com o suas decisões a fetam outros grupos; c ada grupo está sob pressão para que se desem pen he bem , o que quer dizer atin gir as m etas declaradas. Em partic ular n os prim eiros m eses de um projeto, essas m etas – que n a verdade são subm etidas n a rea lizaç ão de um film e – costum am ser m ais fác eis de articular e ex plicar do que o film e em si. M as se o diretor for capaz de con seguir tudo o que quer, provavelm en te irá acabar com um film e lon go dem ais. Se o pessoal de m arketin g con seguir seu objetivo, farem os som en te um film e que im ita suc essos an teriores – em outras pa lavras, fam iliar para os espectadores, m as provavelm en te um fracasso criativo. A ssim , cada grupo ten ta fazer a coisa certa , m as cada um está pux an do n um a direção diferen te. Se qualquer um desses grupos “ven ce”, n ós perdem os. N um a cultura doen tia , cada grupo acredita que, se seus objetivos superarem as m etas dos outros grupos, a em presa estará m elhor. N um a cultura sadia , todos os partic ipan tes recon hecem a im portân cia de se equilibrar os desejos con corren tes – eles querem ser ouvidos, m as n ão têm de ven cer. Suas in terações – que ocorrem n atura lm en te quan do pessoas ta len tosas rec ebem m etas c laras – produzem o equilíbrio que buscam os. M as isso só ac on tece se todos en ten derem que atin gir o equilíbrio é a m eta cen tra l da em presa . Em bora a ideia de equilíbrio sem pre pareça boa, ela n ão capta a n atureza din âm ica do que sign ifica atin gir o equilíbrio. N ossa im agem m en tal de equilíbrio é a lgo distorc ida , porque ten dem os a igualá- lo à im obilidade – o calm o equilíbrio de um pratican te de ioga equilibran do-se n um a pern a só, um estado sem m ovim en to aparen te. Para m im , os ex em plos m elhores de equilíbrio vêm dos esportes, com o quan do um jogador de basquete dribla um defen sor ou um surfista pega um a on da. São respostas ex trem am en te din âm icas a am bien tes em rápida m udan ça. N o con tex to de an im ação, diretores con taram -m e que veem seu en gajam en to n a produção de um film e com o sen do ex trem am en te ativo. “Parece que, psicologicam en te, é bom esperar que esses film es sejam problem áticos”, con tou-m e Byron H ow ard, um de n ossos diretores n a Disn ey. “É c om o a lguém que diz: ‘T om e con ta deste tigre, m as cuidado c om seu traseiro, porque eles são tra içoeiros.’ Sin to que m eu traseiro está m ais seguro quan do espero que o t igre seja tra iç oeiro.” N a opin ião do diretor Brad Bird, toda organ ização criativa – seja um estúdio de an im ação ou um selo de gravadora – é um ecossistem a. “V oc ê prec isa de todas as estaç ões”, diz ele. “V ocê precisa de tem pestades. É com o um a ecologia . Con siderar ótim a a ausên cia de con flitos é com o dizer que um dia en solarado é ótim o. Um dia assim é quan do o sol ven c e a chuva . N ão há con flito. V oc ê tem um ven cedor c laro. M as, se todos os dias forem de sol e n ão chover, as coisas n ão irão c rescer. E se fizer sol todo o tem po – se n em tiverm os n oites – , n ada irá ac on tecer e o plan eta irá secar. O segredo é ver o con flito com o essen cia l, porque é assim que sabem os que as m elhores ideias serão testadas e irão sobreviver. N ão pode haver som en te luz do sol.” É tarefa da gerên cia descobrir com o a judar osoutros a ver os con flitos com o sen do saudáveis – com o cam in hos para o equilíbrio, que n os ben efic ia n o lon go prazo. Estou aqui para dizer que isso pode ser feito – m as é um trabalho in fin dável. Um bom geren te sem pre deve estar em busc a de áreas n as quais o equilíbrio foi perdido. Por ex em plo, à m edida que am pliam os n osso pessoal de an im ação n a Pix ar, que tem o im pac to positivo de perm itir que façam os um trabalho de m elhor qualidade, tam bém há um im pacto n egativo que tem os de en fren tar: as reun iões torn aram -se m aiores e m en os ín tim as, com cada partic ipan te ten do um a parcela proporc ion alm en te m en or do film e fin a l (o que pode sign ificar sen tir-se m en os va lorizado) . Em resposta , criam os subgrupos m en ores, n os quais departam en tos e in divíduos são en corajados a sen tir que têm voz ativa . Para fazer c orreções com o essa – para restabelecer o equilíbrio – , os geren tes precisam ser diligen tes a respeito de prestar aten ção. N o c apítulo 4, fa lei a respeito de um m om en to-chave n o desen volvim en to da Pix ar, quan do em barc am os n a produção de Toy Story 2, quan do n os dem os con ta de que n ão queríam os prom over um a cultura n a qual a lgun s trabalhadores eram con siderados de prim eira c lasse e outros de segun da, on de algun s fun cion ários t in ham um alto padrão e outros eram efetivam en te relegados à equipe B. Para a lgun s, isso pode ter soado vagam en te com o idealista , m as era apen as outra m an eira de dizer que acreditam os n a preservação do equilíbrio em n ossa cultura . Se a lgun s fun cion ários, públicos ou m etas são vistos c om o m ais im portan tes, n ão pode haver equilíbrio. Im agin e um a pran c ha de equilíbrio – um a tábua cujo cen tro se apoia sobre um cilin dro. O truque é colocar um pé em cada ex trem o a deslocar seu peso para atin gir o equilíbrio en quan to o c ilin dro rola sob seu corpo. N ão con heç o ex em plo m elhor de equilíbrio e de habilidade para geren ciar duas forças con corren tes, a esquerda e a direita . M as, em bora eu possa ten tar lhe ex plicar com o fazê- lo, m ostrar vídeos e sugerir m étodos para com eç ar, n un ca poderia ex plic ar plen am en te como c hegar ao equilíbrio. Isso você apren de som en te fazen do – perm itin do que seu con scien te e seu subcon scien te descubram quan do em m ovim en to. Para determ in adas tarefas, n ão ex iste outra m an eira de apren der, a n ão ser fazen do – colocan do-se n o lugar in stável e sen tin do com o fazer. Digo sem pre que os geren tes de em presas criativas devem segurar de leve as m etas e se agarrar firm em en te às in ten ções. O que isso quer dizer? Q uer dizer que devem os ser abertos a m udan ças em n ossas m etas à m edida que recebem os n ovas in form aç ões ou som os surpreen didos por coisas que pen sávam os saber, m as n ão sabíam os. Desde que n ossas in ten ções – n ossos valores – perm an eç am c on stan tes, n ossas m etas podem m udar, se n ecessário. N a Pix ar, procuram os n un c a hesitar em n ossa ética , n ossos va lores e n ossa in ten ção de c riar produtos origin ais e de qualidade. Estam os dispostos a a justar n ossas m etas à m edida que apren dem os, lutan do para ac ertar n ão n ecessariam en te n a prim eira vez. Com o para m im essa é a ún ic a m an eira de estabelecer outra coisa que é essen c ia l para a criatividade: um a cultura que protege o que é n ovo. Fiz parte, por m uitos an os, de um com itê que lia e selec ion ava estudos a serem public ados n a SIGGR A PH , a con ferên c ia an ual sobre com putadores que m en c ion ei n o c apítulo 2. Esses estudos ex pun ham ideias que troux essem avan ços para a área . O com itê era c om posto de m uitos dos m ais im portan tes partic ipan tes da área e eu c on hec ia todos; era um grupo que levava m uito a sério a tarefa de selec ion ar estudos. Em cada reun ião, eu via que parec ia haver dois t ipos de revisores: a lgun s busc avam fa lhas n os estudos e tratavam de elim in á- los, e outros que buscavam e prom oviam boas ideias. Q uan do os “prom otores de ideias” viam fa lhas, m ostravam -n as gen tilm en te, n o espírito de aperfeiç oar o estudo – e n ão o evisc eran do. É in teressan te n otar que os “m atadores de estudos” n ão estavam c on scien tes de que estavam servin do algum a outra agen da (que para m im era , m uitas vezes, m ostrar aos colegas o quan to seus padrões eram a ltos) . A m bos os grupos achavam que estavam protegen do o proc esso, m as só um deles en ten dia que, buscan do a lgo n ovo e surpreen den te, estava oferecen do a proteção m ais va liosa . O feedback n egativo pode ser divertido, m as va le m en os que apoiar um a c oisa n ão com provada e dar espaç o para que ela c resç a . Espero que voc ê n ote que n ão estou a firm an do que a proteç ão do n ovo deve sign ificar seu isolam en to. A ssim c om o adm iro a efic iên c ia da lagarta em seu casulo, eu n ão acredito que produtos c riativos devam ser desen volvidos n o vácuo (esse foi um dos erros que c om etem os n o film e a respeito de sapos c om pés azuis) . Con heço pessoas que gostam de guardar suas joias só para si m esm as en quan to lhes dão polim en to. M as perm itir esse t ipo de com portam en to n ão é proteger. N a verdade, pode ser o oposto: um frac asso para proteger seus fun cion ários deles m esm os. Porque, se a história serve de guia , a lgun s estão ten tan do polir um tijolo. N a Pix ar, proteç ão sign ific a en cher as reun iões c om protetores de ideias, c om pessoas que com preen dem o processo difíc il e efêm ero de desen volver o n ovo. Sign ific a dar apoio ao n osso pessoal, porque sabem os que as m elhores ideias em ergem quan do torn am os segura a solução de problem as. ( Lem bre-se: pessoas são m ais im portan tes do que ideias.) Fin alm en te, n ão proteger o n ovo para sem pre. Em a lgum pon to, o n ovo deve se en caix ar c om as n ec essidades da em presa – c om seus m uitos públic os e tam bém c om a Fera . En quan to n ão se perm itir à Fera passar por c im a de tudo o m ais, en quan to n ão perm itirm os que ela in verta n ossos va lores, sua presen ç a pode ser um im pulso para o progresso. Em algum pon to, a n ova ideia tem de sa ir do c asulo de proteção e ir para as m ãos de outras pessoas. Esse proc esso de en gajam en to n orm alm en te é c on fuso e pode ser doloroso. Um a vez, depois que um dos n ossos fun cion ários de efeitos especia is pediu dem issão, ele en viou-m e um e-m ail c om duas rec lam aç ões. Em prim eiro lugar, ele n ão gostava do fato de a sua fun ç ão en volver a elim in ação de m uitos problem in has c ausados pelo n ovo softw are. Em segun do lugar, estava desapon tado porque n ão assum íam os m ais riscos técn ic os em n ossos film es. A iron ia era que seu trabalho era de a judar a resolver problem as ocorridos prec isam en te porque estávamos assum in do um im portan te risco téc n ico im plan tan do n ovos sistem as de softw are. A c on fusão que ele havia en c on trado – razão para sua dem issão – era , n a verdade, causada pela c om plex idade de ten tar fazer a lgo de n ovo. Fiquei surpreso porque ele n ão com preen dia que assum ir riscos im plic ava a disposição para lidar com a c on fusão criada por eles. En tão: quan do oc orre aquele m om en to m ágic o em que passam os da proteç ão para o em pen ho? É com o pergun tar à m am ãe pássaro c om o ela sabe que está n a hora de em purrar seu filhote para fora do n in ho. Ele terá força para voar sozin ho? Irá descobrir com o usar suas asas n a desc ida ou irá choc ar-se com a terra? N a verdade, lutam os c om essa pergun ta em todos os filmes. H ollyw ood usa a ex pressão luz verde para in dic ar o m om en to, n o desen volvim en to de um projeto, em que o estúdio dec ide ofic ia lm en te que ele é viável ( e m uitos projetos perm an ec em atolados n o “in fern o do desen volvim en to”, n un c a em ergin do para en fren tar o m un do) . Porém , n a história da Pix ar, desen volvem os som en te um film e que n ão con seguiu c hegar a ser c on c luído. Um dos m eus ex em plos favoritos de com o a proteç ão pode fac ilitar o en gajam en to provém n ão de um film e da Pix ar, m as do n osso program a de estágios. Em 1998, dec idi que a em presa deveria se ben efic iar com um program a de verão – c om o aqueles de m uitas em presas criativas – que iria trazer para a Pix ar joven s brilhan tes por dois m eses, para apren der trabalhan do com pessoal ex perim en tado de produç ão. M as quan do ex pus a ideia aos geren tes de produção, eles agradeceram , m as recusaram . N ão tin ham in teresse n a c on tratação de estagiários. Pen sei in ic ia lm en te que era porque estavam oc upados dem ais para perder tem po c uidan do de un iversitários in ex perien tes e lhes en sin an do os truques do ofíc io. M as quan do aprofun dei m in ha an álise ficou c laro que a resistên c ia n ão era um a questão de tem po, m as de din heiro. Eles n ão queriam a despesa adic ion al de pagar os estagiários. Seu orçam en to era apertado e eles preferiam gastar com pessoas ex perim en tadas. T in ham pouc o tem po e poucos rec ursos, e a Fera estava fam in ta . Sua reaç ão era um a form a de proteção, m otivada pelo desejo de proteger o film e e dedic ar cada dólar a fazer dele um suc esso. M as aquela posiç ão n ão ben efic iava a em presa c om o um todo. Program as de estágios são m ec an ism os para iden tific ar ta len tos e ver se pessoas de fora se en c aix am n o trabalho. A lém disso, pessoas n ovas trazem n ovas en ergias. Para m im , aquilo parecia bom para todos. Supon ho que eu poderia sim plesm en te ter orden ado que n ossos geren tes de produção ac resc en tassem o custo dos estagiários aos seus orçam en tos. M as isso iria tran sform ar aquela n ova ideia em in im iga , provoc an do ressen tim en tos. Em vez disso, decidi torn ar os estagiários um a despesa corporativa – eles estariam à disposição, sem c usto ex tra , de qualquer departam en to que quisesse ac eitá- los. N o prim eiro an o, a Pix ar c on tratou oito estagiários, que foram colocados n os departam en tos técn ico e de an im ação. Eles estavam tão an siosos por trabalhar, eram tão esforç ados e apren diam tão depressa que n o fim cada um deles estava rea lizan do trabalhos rea is de produção. Sete deles voltaram depois de form ados a trabalhar c on osc o em tem po in tegra l. Depois disso o program a c resc eu um pouc o a cada an o e, todos os an os, m ais e m ais geren tes aderiram ao program a. N ão era apen as que os estagiários a liviavam a carga de trabalho assum in do projetos. O en sin o dos proc essos da Pix ar fazia com que n ossos fun c ion ários an alisassem com o faziam as c oisas, o que levou a m elhoram en tos para todos. Depois de a lgun s an os, ficou c laro que n ão precisávam os m ais fin an ciar os estagiários com fun dos corporativos; à m edida que o program a provava ser vá lido, as pessoas se dispun ham a absorver os c ustos em seus orç am en tos. Em outras pa lavras, o program a de estágios in ic ia lm en te precisou de proteção, m as depois livrou-se dessa n ec essidade. N o últim o an o tivem os dez m il c an didatos para c em vagas. Q uer se trate do n úcleo da ideia para um n ovo film e ou de um n ovo program a de estágios, o n ovo precisa de proteç ão. Situações n orm ais n ão precisam . O s geren tes n ão precisam se esforçar para proteger ideias ou m an eiras de operar já c on sagradas. O sistem a se in c lin a a favor do operador. O desafian te prec isa de apoio para en con trar um a base sólida . E a proteção do n ovo – do futuro, n ão do passado – deve ser um esforç o c on sc ien te. Sem pre pen so em um dos m eus m om en tos favoritos em qualquer film e da Pix ar, quan do A n ton Ego, o tem ido c rít ic o de gastron om ia em Ratatouille, en trega seus com en tários sobre o Gusteau’s, o restauran te dirigido por n osso herói, R em y, um rato. Dublado pelo gran de Peter O ’T oole, Ego diz que os ta len tos de R em y “desafiaram m eus prec on c eitos a respeito da boa c ozin ha... [e] abalaram m eu ín tim o”. Sua fa la , redigida por Brad Bird, tam bém m e abalou – e até hoje m ex e com igo quan do pen so a respeito do m eu trabalho. “De várias m an eiras, o trabalho de um c rít ic o é fác il”, diz Ego. “A rriscam os m uito pouc o, m as gozam os de um a posição sobre aqueles que oferec em seu trabalho e sua autoestim a ao n osso julgam en to. Prosperam os com c rít ic as n egativas, que são divertidas de esc rever e de ler. M as a am arga verdade que n ós, crít icos, tem os que en fren tar é que o gran de esquem a de c oisas, o lix o m édio, tem provavelm en te m ais sign ificado que n ossas c rít ic as que o qualific am com o ta l. M as ex istem vezes em que um c rít ic o rea lm en te se arrisc a: n a desc oberta e n a defesa do n ovo. M uitas vezes o m un do é c ruel c om n ovos ta len tos e n ovas c riações. O n ovo prec isa de am igos.”
Compartilhar